Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4516/22.0T8SNT-A.L1-6
Relator: JOÃO MANUEL P. CORDEIRO BRASÃO
Descritores: CONTRATO DE CRÉDITO
DEVER DE INFORMAR
MORATÓRIA
LEIS TRANSITÓRIAS COVID-19
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: - A Lei n.º 8/2020, de 10/4, ao aditar o artigo 6.º-A ao Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, veio impor aos concedentes de crédito amplos deveres de informação;
- Por força do regime citado, as instituições financeiras ficaram obrigadas a divulgar e publicitar as medidas da moratória, bem como dar conhecimento integral delas previamente à celebração de “qualquer contrato de crédito” sempre que o cliente seja uma entidade beneficiária (artigo 6.º-A, n.ºs 1 e 2);
- Ora, sendo os beneficiários portadores de informação sobre a moratória, não bastava aqueles dirigirem-se às instituições bancárias e solicitarem verbalmente a adesão à moratória, devendo fazê-lo por meio físico ou por meio eletrónico por si assinado, acompanhado de documentos comprovativos da regularidade da sua situação tributária e contributiva.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
           
I. Relatório

A Caixa Geral de Depósitos, S.A. intentou a execução sumária a que os presentes autos se mostram apensos contra J, dando à execução contrato de mútuo com hipoteca celebrado com o executado, com vista a obter a cobrança da quantia de €58.433,60, acrescida de juros de mora vincendos, calculados sobre o capital em dívida de €55.599,82, desde a data da entrada da execução, até efetivo e integral pagamento.

Citado, deduziu o executado oposição à execução, mediante embargos, para tanto alegando, em síntese, que apenas deixou de pagar as prestações do empréstimo por, na sequência da pandemia Covid-19, ter ficado desempregado, e que tentou junto da agência da exequente sita na Rua …, em Lisboa, encontrar resposta para suspender os pagamentos e beneficiar das moratórias, mas que foi informado que essa agência tinha encerrado, pelo que, sem indicação de quem passaria a ser a pessoa de contacto, ficou perdido, tendo ainda tentado, através de contacto com a pessoa que o atendia, SC, obter ajuda, mas em vão, concluindo que a exequente não lhe prestou a devida atenção, por não o ter informado do encerramento daquela agência nem ter respondido aos seus pedidos de contacto e informação, impossibilitando-o por isso de beneficiar da moratória prevista no Decreto Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, o que, afirma, constitui exceção de não cumprimento da obrigação, incorrendo a exequente com a sua conduta omissiva em abuso de direito

Recebidos os embargos, contestou o exequente pugnando pela sua improcedência, afirmando não ser verdade que a sua agência da Rua …, em Lisboa, esteja encerrada, mas que, ainda que o estivesse, o embargante sempre poderia deslocar-se a qualquer outra agência para formalizar o pedido de adesão à moratória ou para suscitar qualquer outra questão, o que não fez.

Em sede de despacho saneador, decidiu-se:

Termos em que, face ao exposto, julgo os presentes embargos improcedentes, por não provados e, em consequência, determino o prosseguimento da execução.

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Inconformado, o executado/embargante J interpôs recurso de apelação para esta Relação e formulou na sua alegação as seguintes conclusões:

a) Não foi concedida ao embargante, o que não se compreende, a possibilidade de prova dos factos que invocou como fundamento de oposição à execução, nos termos gerais do Art.º 342.º do Código Civil;
b) É verdade que é ao executado/embargante, que tem uma posição de demandado na execução, que cumpre alegar e provar os factos impeditivos ou extintivos do direito a que o exequente se arroga, mas não lhe foi dada a hipótese de o fazer!;
c) E de provar o que alegou, que entende ser constitutivo da exceção de cumprimento e da falta de informação e apoio para poder beneficiar da moratória legal;
d) Claro que a singela alegação do executado não poderia impedir nem extinguir o direito da exequente a obter o ressarcimento do seu crédito;
e) Conclui a douta decisão que foi a inércia do embargante e não qualquer omissão da exequente que o impediu de beneficiar da moratória prevista no Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, inexistindo, em consequência, qualquer abuso de direito da exequente ou razão para considerar verificada a exceção de não cumprimento da obrigação;
f) Como se pode concluir isto se nem sequer foi possível fazer a prova?;
g) A improcedência dos embargos foi, assim, objeto de uma decisão injusta e ilegal, por não ter permitido ao embargante fazer prova dos fatos alegados;
h) Decisão que não obteve sequer qualquer apreciação ou justificação;
i) Pelo que deve ser revogada e substituída por outra que lhe conceda esse direito.

A recorrida Caixa Geral de Depósitos S.A. apresentou contra alegações, nas quais deduziu as seguintes conclusões:

1. A recorrida apresenta as presentes contra-alegações no seguimento das alegações de recurso apresentada pelo recorrente que pretende ver revogada a sentença que julgou totalmente improcedentes os embargos, por não provados, e que determinou, em consequência, o prosseguimento da acção executiva.

2. Alegou o recorrente que lhe foi vedada a possibilidade de prova dos factos que invocou como fundamento de oposição à execução, nos termos gerais do Art.º 342.º do Código Civil, pelo que a decisão proferida pelo Tribunal a quo é injusta e ilegal, motivo pelo qual deverá ser substituída por outra que lhe conceda esse direito.

3. Ora, o recorrente apresentou oposição à execução, exercendo, desta forma, o contraditório na acção executiva, carreando para os autos os factos e a prova que entendeu pertinentes à defesa dos seus interesses.

4. Seguiu-se a realização de audiência prévia, em 16.02.2023, com as finalidades previstas no art.º 591º do CPC, tendo a instância sido suspensa para efeitos de acordo.

5. Não tendo sido informado da existência de qualquer acordo entre as partes, o Tribunal a quo entendeu conhecer imediatamente do mérito da causa, uma vez que o estado do processo o permitia, sem necessidade de mais provas, tendo proferido despacho saneador sentença - art.º 595, n.º 1, al. b) do CPC.

6. Com efeito, os fundamentos da oposição à execução são manifestamente singelos, não existindo, por isso, qualquer facto controvertido.

7. Ainda que assim não se entenda, o que apenas e só por mera hipótese de raciocínio se concebe e concede, entende a recorrida que a eventual produção adicional de prova não conduziria a uma decisão diferente daquela que foi tomada pelo Tribunal a quo.

8. Entendeu, e bem, a decisão recorrida que as dificuldades económicas do recorrente não podem, no plano do direito, justificar qualquer atraso ou falta de pagamento das obrigações assumidas, porquanto, ao abrigo do disposto no art.º 406º, n.º 1 do CC, os contratos devem ser pontualmente cumpridos (pacta sunt servanda).

9. Por outro lado, alegou, ainda, o recorrente que se quis dirigir à Agência da ora recorrida sita na Rua …, em Lisboa, para suspender os pagamentos e beneficiar das moratórias, mas que foi informado que essa agência tinha encerrado.

10. Nesse seguimento, alega o recorrente que ficou sem saber a quem se dirigir, concluindo que a ora recorrida não lhe prestou a devida atenção, o que impediu que beneficiasse da moratória prevista no Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, o que, afirma, constitui exceção de não cumprimento da obrigação, incorrendo a exequente com a sua conduta omissiva em abuso de direito.

11. Sucede, porém, que os beneficiários da referida moratória deveriam efectuar os respectivos pedidos por meio físico ou por meio eletrónico por si assinado, acompanhado de documentos comprovativos da regularidade da sua situação tributária e contributiva.

12. Ora, não só o recorrente não procedeu em conformidade, como não explicou por que razão não se dirigiu a outra agência da ora recorrida ou porque não lhe enviou uma comunicação escrita, por correio ou por transmissão eletrónica de dados, solicitando a adesão à moratória.

13. Competia, pois, ao recorrente, de acordo com as regras da distribuição do ónus da prova, alegar e provar os factos impeditivos ou extintivos do direito a que a ora recorrida se arroga. Com o devido respeito, tal não sucedeu.

14. Face ao exposto, entende a ora recorrida que a presente apelação deverá improceder, devendo manter-se a decisão recorrida, o que se requer.
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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II. Objecto e delimitação do recurso

Consabidamente, a delimitação objectiva do recurso emerge do teor das conclusões do recorrente, enquanto constituam corolário lógico-jurídico correspectivo da fundamentação expressa na alegação, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio.
De outra via, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo.
Por outro lado, ainda, o recurso não é uma reapreciação ‘ex novo’ do litígio (uma “segunda opinião” sobre o litígio), mas uma ponderação sobre a correcção da decisão que dirimiu esse litígio (se padece de vícios procedimentais, se procedeu a incorrecta fixação dos factos, se fez incorrecta determinação ou aplicação do direito aplicável). Daí que não baste ao recorrente afirmar o seu descontentamento com a decisão recorrida e pedir a reapreciação do litígio (limitando-se a repetir o que já alegara na 1ª instância), mas se lhe imponha o ónus de alegar, de indicar as razões porque entende que a decisão recorrida deve ser revertida ou modificada, de especificar as falhas ou incorrecções de que em seu entender ela padece, sob pena de indeferimento do recurso.
Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação, mas apenas – e com liberdade no respeitante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – de todas as “questões” suscitadas, e que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respectivo objecto, exceptuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.
Assim, em face do que se acaba de expor e das conclusões apresentadas, é a seguinte a questão a resolver por este Tribunal:
- determinar se, em face da factualidade alegada, foi a inércia do embargante- e não qualquer omissão da exequente - que o impediu de beneficiar da moratória prevista no Decreto Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março.

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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:
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III. Os factos

Recebeu-se, da primeira instância, o seguinte elenco de factos provados:

1- Em 22.05.2007, a exequente concedeu ao executado um financiamento de €65.000,00, destinado à aquisição por parte deste da fração autónoma designada pela letra “A”, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, do prédio urbano sito na Rua …, em Queluz, descrito na Conservatória do Registo Predial de Queluz, sob o n.º …, da freguesia de Queluz;
2- Nessa sequência, a exequente e o executado outorgaram, nesse mesmo dia, no Balcão Privativo da Caixa Geral de Depósitos, S.A., o documento escrito intitulado de “Empréstimo com Hipoteca” e o respetivo “Documento Complementar”, cujas cópias foram juntas com o requerimento executivo (cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido), através do qual o executado se confessou devedor daquela quantia de €65.000,00, que se obrigou a devolver à exequente em prestações mensais, de capital e juros, durante 35 anos, nos termos definidos naquele documento complementar;
3- A última prestação paga pelo executado à exequente foi aquela que se venceu em 22.02.2020, não tendo pago nenhuma das subsequentes;
4- Em 08.03.2022, a exequente intentou contra o executado a execução sumária a que os presentes autos se mostram apensos, dando à execução aquele contrato de “Empréstimo com Hipoteca” e o respetivo “Documento Complementar”, com vista a obter a cobrança da quantia de €58.433,60, acrescida de juros de mora vincendos, calculados sobre o capital em dívida de €55.599,82, desde essa data, até efetivo e integral pagamento.
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IV. O mérito do recurso

O Direito
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Estabilizado o quadro factual do litígio, cumpre agora analisar juridicamente a pretensão do recorrente, à luz do mesmo.
Estamos no âmbito de procedimento de embargos à execução, através do qual o executado exerce o contraditório na ação executiva (art.ºs 728.º a 734.º, ambos do CPC).
O procedimento de embargos de executado constitui uma ação declarativa enxertada no processo executivo, que se destina a impedir que o direito à execução se efetive, seja por via da dissolução da própria instância executiva com fundamento na falta dos respetivos pressupostos processuais (inexistência ou falta de título executivo; vício grave da ação declarativa que levem à destruição do título nela constituído; exceções dilatórias por falta de outros pressupostos processuais, formais ou substanciais, da ação executiva), seja em virtude do reconhecimento da inexistência ou invalidade da obrigação exequenda (inexistência de factos constitutivos, invalidade formal ou substancial da obrigação; existência de factos impeditivos, modificativos ou extintivos da mesma).
Alega o executado que apenas deixou de cumprir o contrato de mútuo sub judice por, na sequência da pandemia Covid-19, ter ficado desempregado.
Com bem é assinalado na sentença sob escrutínio, as dificuldades económicas do embargante não podem, no plano do direito, justificar qualquer atraso ou falta de pagamento das obrigações assumidas, porquanto, conforme resulta do disposto no art.º 406.º, n.º 1, do Código Civil, os contratos devem ser pontualmente cumpridos (pacta sunt servanda), não gozando o devedor, em consequência, do chamado beneficium competentiae, ou seja, não pode exigir a redução das prestações estipuladas, ou a alteração das condições contratualmente acordadas, com fundamento na precária situação económica em que se encontra.
Mais, alegou o embargante que se quis dirigir à agência da exequente sita na Rua …, em Lisboa, para suspender os pagamentos e beneficiar das moratórias, mas que foi informado que essa agência tinha encerrado, pelo que, sem indicação de quem passaria a ser a pessoa de contacto, ficou perdido, tendo ainda tentado, através de contacto com a pessoa que o atendia, SC, obter ajuda, mas em vão, concluindo por isso que a exequente não lhe prestou a devida atenção, por não o ter informado do encerramento daquela agência nem ter respondido aos seus pedidos de contacto e informação, impossibilitando-o de beneficiar da moratória prevista no Decreto Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, o que, afirma, constitui exceção de não cumprimento da obrigação, incorrendo a exequente com a sua conduta omissiva em abuso de direito.
Analisemos os fundamentos jurídicos do recurso interposto.
Por força da Covid 19, entrou em vigor um conjunto de medidas legislativas destinadas prevenir ou suavizar, consequências sociais impactantes que a pandemia gerou ou se mostrava apta a gerar, por via da dificuldade ou mesmo impossibilidade de serem cumpridas certas obrigações pecuniárias nesse contexto temporal.
Assim, o Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, em cujo preâmbulo se lê:
«As consequências para a economia exigem a adoção de medidas urgentes tendo em vista a proteção das famílias portuguesas, em matéria de crédito à habitação própria permanente, (…)»
Dispondo o seu artigo 1º:
«1 - O presente decreto-lei estabelece medidas excecionais de apoio e proteção de famílias, empresas, instituições particulares de solidariedade social, associações sem fins lucrativos e demais entidades da economia social, por força dos impactos económicos e financeiros da contração da atividade económica decorrente da pandemia da doença COVID-19.
2 - As medidas de proteção e apoio à liquidez e tesouraria têm como finalidade o diferimento do cumprimento de obrigações dos beneficiários perante o sistema financeiro, nos termos previstos no presente decreto-lei.
3 - Para os efeitos do presente decreto-lei, a pandemia da doença COVID-19 é formalmente reconhecida como um evento excecional com consequências graves para a economia, nos termos do artigo 107.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.»
O capítulo II estabeleceu as “Medidas de apoio extraordinário à liquidez de famílias, empresas, instituições particulares de solidariedade social, associações sem fins lucrativos e demais entidades da economia social”, regulando a secção I as “Medidas de apoio e condições de acesso”.»
Dispondo o artigo 2.º que:
“Beneficiam igualmente das medidas previstas no presente decreto-lei:
a) As pessoas singulares, relativamente a crédito para habitação própria permanente que, à data de publicação do presente decreto-lei, preencham as condições referidas nas alíneas c) e d) do número anterior, tenham residência em Portugal e estejam em situação de isolamento profilático ou de doença ou prestem assistência a filhos ou netos, conforme estabelecido no Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, na sua redação atual, ou que tenham sido colocados em redução do período normal de trabalho ou em suspensão do contrato de trabalho, em virtude de crise empresarial, em situação de desemprego registado no Instituto do Emprego e Formação Profissional, I. P., bem como os trabalhadores elegíveis para o apoio extraordinário à redução da atividade económica de trabalhador independente, nos termos do artigo 26.º do referido decreto-lei, e os trabalhadores de entidades cujo estabelecimento ou atividade tenha sido objeto de encerramento determinado durante o período de estado de emergência, nos termos do artigo 7.º do Decreto n.º 2-A/2020, de 20 de março; e (…)»
Prevendo o artigo 5.º as condições para o acesso à moratória:
«1 - Para acederem às medidas previstas no artigo anterior, as entidades beneficiárias remetem, por meio físico ou por meio eletrónico, à instituição mutuante uma declaração de adesão à aplicação da moratória, no caso das pessoas singulares e dos empresários em nome individual, assinada pelo mutuário e, no caso das empresas e das instituições particulares de solidariedade social, bem como das associações sem fins lucrativos e demais entidades da economia social, assinada pelos seus representantes legais.»
Diploma que entrou em vigor em 27/03/2020 estando a sua vigência prevista até 30/09/2020 (artigo 14.º).       
A Lei n.º 8/2020, de 10 de abril veio alterar aquele diploma, dispondo o seu:
Artigo 1.º (Objeto) - «A presente lei procede à primeira alteração, por apreciação parlamentar, ao Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, que estabelece medidas excecionais de proteção dos créditos das famílias, empresas, instituições particulares de solidariedade social e demais entidades da economia social, bem como um regime especial de garantias pessoais do Estado, no âmbito da pandemia da doença COVID-19
Aditando ao Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, os artigos 6.º-A e 13.º-A, com a seguinte redação:
Artigo 6.º-A (Dever de prestação de informação
«1 - As instituições têm o dever de divulgar e publicitar as medidas previstas no presente decreto-lei nas suas páginas de Internet e através dos contactos habituais com os seus clientes.
2 - As instituições ficam ainda obrigadas a dar conhecimento integral de todas as medidas previstas no presente decreto-lei previamente à formalização de qualquer contrato de crédito sempre que o cliente seja uma entidade beneficiária.
3 - O Banco de Portugal regulamenta os moldes em que a prestação de informação prevista nos números anteriores deve ser efetivada.
4 - Ao incumprimento do estabelecido nos números anteriores aplicam-se as disposições previstas no n.º 2 do artigo 8.º do presente decreto-lei.»
Lei esta que entrou em vigor no dia 11/04/2020.
A Lei n.º 8/2020, de 10/4, ao aditar o artigo 6.º-A ao Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, veio impor aos concedentes de crédito amplos deveres de informação.
Por força do regime citado, as instituições financeiras ficaram obrigadas a divulgar e publicitar as medidas da moratória, bem como dar conhecimento integral delas previamente à celebração de “qualquer contrato de crédito” sempre que o cliente seja uma entidade beneficiária (artigo 6.º-A, n.ºs 1 e 2), porém, se atentarmos bem na posição do embargante/recorrente, este não se lamenta da falta de informação quanto aos termos e medidas da moratória, lamenta-se sim de não ter sido informado do encerramento de determinada agência bancária e da falta de resposta de uma alegada funcionária, que o impediu de materializar em proveito próprio os termos da moratória.
Ora, sendo os beneficiários portadores de informação sobre a moratória, como bem se sublinha na sentença posta em crise, não bastava aqueles dirigirem-se às instituições bancárias e solicitarem verbalmente a adesão à moratória, devendo antes fazê-lo por meio físico ou por meio eletrónico por si assinado, acompanhado de documentos comprovativos da regularidade da sua situação tributária e contributiva e, no caso vertente, não explica o embargante por que razão não se dirigiu a outra agência da exequente ou porque não lhe enviou uma comunicação escrita, por correio ou por transmissão eletrónica de dados, solicitando a adesão à moratória.
Em face do exposto, não vislumbramos na alegação do embargante/recorrente matéria de excepção que, uma vez demonstrada, de acordo com o regime de distribuição do ónus da prova (art.º 342º do CC), possa conduzir à procedência dos embargos. 
Concluindo: foi a inércia do embargante- e não qualquer omissão da exequente - que o impediu de beneficiar da moratória prevista no Decreto Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, inexistindo, em consequência qualquer abuso de direito da exequente ou razão para considerar alegada a excepção de não cumprimento da obrigação. 

Improcederá, pois, a apelação.
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V. Decisão                                                          

Pelo exposto, os Juízes da 6.ª Secção da Relação de Lisboa acordam em julgar totalmente improcedente a apelação apresentada, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.
Registe e notifique.

Lisboa, 23-05-2024
João Manuel P. Cordeiro Brasão
Eduardo Petersen Silva
Nuno Gonçalves