Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | ISABEL SALGADO | ||
| Descritores: | AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO FALTA DE MANDATÁRIO MOTIVO DE SAÚDE ADIAMENTO JUSTO IMPEDIMENTO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 07/14/2022 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PROCEDENTE | ||
| Sumário: | 1. - Não se verifica comportamento imprevidente/negligente por parte da mandatária, que na medida do exigível, providenciou pela comunicação do seu impedimento face ao episódio urgente de saúde, através de telefonema do escritório no dia anterior, reiterado no próprio dia da audiência de julgamento e juntando o atestado médico no final do mesmo. 2. - Tal circunstancialismo justificava, pelo menos, a interrupção da audiência para continuar em data a agendar, com vista à audição das testemunhas indicadas pela requerida, por forma a ultrapassar a prova realizada em condições de flagrante desequilíbrio entre as partes, sem cumprimento pleno do contraditório e em desrespeito pelo disposto nos artigos 3.º n.º 3 e 415º n.º 1 do C.P.C. 3. - O tribunal incorreu em erro de julgamento na interpretação do artigo 603º n.º 1, conjugado com o artigo 140º n.º 2, ambos do C.P.C., indeferindo o requerimento de adiamento da audiência de julgamento, constituindo motivo legal para anular o julgamento e a sentença que se lhe seguiu. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes da 7ªSecção do Tribunal da Relação de Lisboa I.RELATÓRIO 1. Em apenso aos autos de RRP relativos à menor (…) veio o progenitor (…) impetrar alteração do regime em vigor da regulação do exercício das responsabilidades parentais contra a mãe da menor. Alegou em síntese que, pretende passar mais tempo com a filha, requerendo por isso que seja fixada a residência alternada, que tal seria benéfico para a criança e que também a mesma manifesta vontade em estar mais tempo com o pai. Convocados para conferência, o requerente e requerida não lograram chegar a acordo, tendo sido determinada a realização da audição técnica especializada. Concluída, os progenitores não atingiram acordo e mantiveram as respectivas posições anteriores. Ouvida a menor e realizada nova conferência sem que os progenitores alcançassem acordo, apresentaram alegações e ofereceram prova testemunhal. 2. Através de despacho datado de 17.09.2011 foi designada audiência de discussão e julgamento para o dia 24.11.2021, pelas 10 horas e continuação pelas 14 horas - “Para audiência de julgamento designo o próximo dia 24 de novembro de “2009” as 10 horas, com a audição das testemunhas do requerente e as duas primeiras do rol da requerida, sendo as demais ouvidas no período da tarde, pelas 14 horas. As testemunhas serão a apresentar –artigo 39.º, n.º 8 do RGPTC. Autoriza-se a entrega da gravação das declarações da menor a requerida. Dê cumprimento ao disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 151.º do Código de Processo Civil, contactando o(s) ilustre(s) advogado(s) interveniente(s), por qualquer via, que na eventualidade de sobreposição de agendas deverá(ão) em cinco dias comunicar esse facto ao Tribunal, “…após contacto com os restantes mandatários interessados”, nos precisos termos do n.º 2, in fine do normativo citado(…)” Existe manifesto lapso de escrita no ano que é 2011. 3. No dia aprazado , sendo cerca das 11horas, a Senhora Juiz deu início aos trabalhos, sendo transmitido pela Oficial de Justiça que a secretaria recebera no dia anterior contacto telefónico , proveniente do escritório da Ilustre Mandatária da Requerida, informando que a mesma tinha ido de urgência para o hospital e que informariam oportunamente os autos com os documentos, conforme da acta conta –““ Foi transmitido à Mm.ª Juiz de Direito, o contacto telefónico recebido por esta Secretaria Judicial, no dia de ontem, por pessoa que se identificou como sendo do escritório da Dra. …, que informou que a Ilustre Mandatária teria ido de urgência para o Hospital, sendo que assim que tivesse os documentos por parte do Hospital, informariam os presentes autos.” 4. A Senhora Juiz iniciou os trabalhos com audição do Requerente e interrompeu cerca das 12 horas. 5. Retomada a audiência, cerca das 14 horas, a Oficial de Justiça transmitiu ao tribunal que a secretaria tinha sido contactada por via telefone pela Requerida, e também pela sua Ilustre Mandatária, referindo que no dia de ontem tinha ido para o hospital pedindo no escritório para avisar , que tinha sido submetida a cirurgia de urgência ( cancro) e que o julgamento não devia realizar-se, requerendo o seu adiamento, como melhor consta da acta “...que no período entre a 13:30 horas e as 14:00 horas, foi esta Secretaria Judicial contactada primeiramente pela requerida, questionando o que se estaria a passar e porque estava a ser realizado o julgamento, uma vez que no dia de ontem foi informada pelo escritório da sua Advogada, de que a mesma tinha ido para o Hospital de Urgência e que a diligência não se iria realizar. Mais disse que o escritório lhe solicitara para contactar as testemunhas, a fim de não comparecerem à diligência e que o escritório já teria contactado o Tribunal. Disse ainda ter sido contactada telefonicamente pela testemunha arrolada nos autos, Sra…. que teria recebido uma chamada telefónica por parte do requerente, a fim de a mesma comparecer à presente diligência. Seguidamente, foi esta Secretaria Judicial, contactada pela Ilustre Mandatária da requerida, após esta ter sido contactada pela sua cliente (requerida), referindo, que teve que ir para o Hospital no dia de ontem, pedindo no escritório para avisar o Tribunal. Disse ter sido diagnosticada com cancro, tendo que ser submetida a cirurgia com urgência, que o Tribunal tinha sido avisado, que o julgamento não se deveria ter realizado, dizendo que iria impugnar a audição das testemunhas ouvidas e solicitando que não fosse dada a continuação ao julgamento na parte da tarde, comprometendo-se a enviar requerimento comprovativo da sua situação, assim que lhe fosse possível.” 6. O tribunal determinou o prosseguimento da audiência de julgamento, conforme despacho seguinte “Quanto à testemunha (…), sendo a mesma a apresentar e não tendo comparecido, não se mostra possível a sua inquirição. Quanto ao demais requerido verbalmente, pela Ilustre advogada da requerida, cumpre salientar o seguinte: Nos termos do art. 603º nº1 do CPC, a audiência é realizada salvo se, houver impedimento do Tribunal, faltar algum dos advogados sem que o Juiz tenha providenciado pela marcação sem acordo prévio, ou ocorrer motivo que constituía justo impedimento. Sendo que, nos diz o nº3 do mesmo preceito legal, que a falta de qualquer pessoa que deva comparecer é justificada na própria audiência ou nos 5 dias imediatos, reportando-se, porém, este normativo, para as testemunhas. Não consta ter entrado até, à data, nos presentes autos, qualquer explicação atinente quer à falta de comparência da Ilustre Causídica, assim como para a falta da requerida ou até das testemunhas que se comprometeu a apresentar. A ter aduzido, no dia de ontem, por contato telefónico encetado com a Secção, que a Ilustre Causídica não iria comparecer, porque ia a caminho do hospital podia e deveria ter feito asseverar, designadamente, através do seu escritório, por informação dirigida ao processo, ou tentar substabelecer o ato em algum colega ou, no limite, fazer chegar essa informação na manhã de hoje, à hora designada para a diligência, através da sua constituinte. Na verdade, nada foi dito, não se podendo descortinar do alegado no dia de ontem que apesar de referir ter ido ao hospital, o desfecho pudesse culminar da forma alegada, de que foi sujeita a intervenção cirúrgica de urgência; ainda assim, essa informação podia ser carreada aos autos, na manhã de hoje, nomeadamente através da sua constituinte. Assim sendo, não houve qualquer justo impedimento devidamente alegado e comprovado que nos permitisse concluir pela necessidade do adiamento do presente julgamento – bem pelo contrário, até à presente hora de almoço e salvaguardados os telefonemas efetuados neste período pela requerida e sua Ilustre Advogada, (ainda no bloco operatório), nada nos autos nos permite concluir pela necessidade de interrupção do julgamento, sem prejuízo de eventual sindicância que a Ilustre Causídica da requerida aduziu, telefonicamente, por diligenciar. Posto isto, o julgamento deverá prosseguir nos autos.” 7. ouvidas as testemunhas indicadas pelo requerente, seguindo as alegações da sua Ilustre Mandatária, o tribunal encerrou a audiência, determinando a conclusão dos autos para elaboração de sentença. 8. Por instrumento datado de 29.11.20211, a Mandatária expôs e descreveu as circunstâncias que levaram à cirurgia urgente que realizou, que no seu entender, configura justo impedimento, arguindo assim a nulidade do julgamento nos termos do art.º 195.º CPC, ou assim não se entendendo, a repetição do acto de inquirição das testemunhas por cumprimento do disposto no art.º 155.º do CPC, bem como as declarações da requerida e a inquirição das suas testemunhas. 8. O tribunal a quo, em apreciação do requerimento, reiterou não ocorrer motivo legal de adiamento da audiência e proferiu sentença, cujo dispositivo final se transcreve :« 1.A menor é confiada à guarda e cuidados de ambos os progenitores, em regime de residência alternada, semanalmente, exercendo os progenitores conjuntamente as responsabilidades parentais quanto a questões de particular importância;2.As semanas iniciar-se-ão à sexta-feira, devendo cada um dos progenitores, na semana que lhe couber passar com a menor, recolher esta no estabelecimento escolar, findas as aulas, entregando-a, igualmente, no estabelecimento escolar, uma vez finda a semana respetiva; 3.Os atos quotidianos da vida corrente e das rotinas da menor serão exercidos pelo progenitor com quem a menor estiver a residir, em cada semana. 4.Fixa-se a residência da menor na casa de ambos os progenitores, devendo cada um deles assegurar todas as despesas necessárias ao seu sustento, na semana que, com ela, estiver a residir. 5.No dia de aniversário da menor, esta almoçará ou lanchará com o progenitor não residente, nessa semana, e jantará com o progenitor residente, o que alternará no ano seguinte;6.Nos dias de aniversário dos pais e da irmã, a menor passará o dia com o aniversariante, com pernoita, o mesmo sucedendo no dia do pai e no dia da mãe, sem prejuízo das atividades extracurriculares da mesma;7.Quanto aos períodos de épocas festivas e períodos de férias mantém-se o regime já estipulado em sede de regulação das responsabilidades parentais vigente, alcançado pelo acordo homologado por sentença de 27/04/17.8.As despesas de saúde, médicas e medicamentosas, e de educação da menor, incluindo livros e material escolar e atividades extracurriculares sempre que decididas de comum acordo, serão suportadas na proporção de metade por cada um dos pais, na parte que não for comparticipada e mediante apresentação de documento comprovativo.» 2. Do Recurso Inconformada, a Requerida interpôs recurso, mais requerendo a atribuição do efeito suspensivo do recurso, contra a prestação de caução, considerando a situação dos autos, como o permite o art.º 32.º, n.º 4 do RGPTC e art.º 647.º, n.º 4 do CPC. As suas alegações finalizam com as conclusões seguintes: «1- São quatro as questões que a recorrente suscita por via do presente recurso, a saber: a injustiça da douta sentença; a ilegalidade do douto despacho de 24/11/2021 e de 08/01/2022; a nulidade da audiência de julgamento e a nulidade da douta sentença; 2- A douta sentença é injusta na medida em que foi tomada sem que a recorrente tivesse tido oportunidade de produzir a prova testemunhal por si arrolada, e assim cumprir o ónus probatório que sobre si impendia, e de exercer o contraditório relativamente à prova testemunhal produzida pelo Requerente. 3- Em consequência disso, a matéria de facto que o Tribunal a quo deu como provada teve por base unicamente os depoimentos das testemunhas da parte contrária e relativamente às quais nem se sequer foi exercido o contraditório, o que influenciou na decisão da causa. 4- Com a audição da prova testemunhal por si arrolada, a recorrente teria logrado fazer prova dos fundamentos da sua pretensão levando a que o Tribunal a quo desse diferente desfecho à questão e que versa sobre as responsabilidades parentais de uma menor de 7 anos. 5- A Requerida, ora recorrente., não se conforma com a sentença recorrida, porquanto, a mesma, omite, o que aconteceu, de facto, no dia da audiência de discussão e julgamento, designada, para o dia 24/11/2021, a qual foi realizada, sem a presença da mandatária da Recorrente, impedida de comparecer à mesma, por motivos inesperados e imprevisíveis de saúde, facto do qual o Tribunal " a quo" foi, previamente, informado, através de contacto telefónico na véspera do julgamento e comprovada no dia do julgamento já depois do término da audiência. 6- O que deveria, necessariamente, ter levado ao adiamento do julgamento, aqui em causa. 7- No dia anterior, à data designada, para o julgamento, dia 23/11/2021, pelas 14h30, deslocou-se a signatária a uma consulta médica da especialidade de cirurgia, em Vila do Conde, onde aguardava resultado de um exame que havia realizado semanas antes, atendendo à suspeita de neoplasia. 8- Estava previsto que a Mandatária da, ora Recorrente, fosse para Sintra, nessa mesma tarde, a fim de realizar o julgamento no dia seguinte, pela manhã. 9- O julgamento que ora se recorre realizou-se em Sintra, ou seja, a mais de 350 Km do local onde a mandatária reside e trabalha. 10- A mandatária foi informada pelo médico que o resultado daquele exame não foi conclusivo da dimensão das células atingidas, pelo que, se impunha uma nova biópsia com carácter urgente, atendendo à evolução da doença. 11- Essa biopsia foi feita no bloco operatório, sujeita a anestesia e a procedimento cirúrgico minucioso. 12- No imediato, e após conhecimento de que ficaria internada para realização do procedimento, pediu à sua secretária que contactasse com o tribunal para avisar que iria fazer uma cirurgia urgente e que não iria comparecer ao julgamento no dia seguinte. 13- Pediu, também, que ligasse à sua cliente, aqui recorrente, que não iria poder comparecer no julgamento, pelo que, o tribunal iria marcar nova data. 14- A Requerida, ora recorrente, avisou as testemunhas do sucedido para que não comparecessem ao tribunal na data designada, porquanto a sua mandatária havia sido operada. 15- Em nenhum momento, foram tomadas estas iniciativas com vista a fazer qualquer outra coisa que não fosse colaborar com o tribunal e com as pessoas que iriam (na perspetiva da mandatária da recorrente) em vão, para um julgamento que não iria acontecer, porquanto, a mandatária de uma das partes estava gravemente doente e IMPEDIDA (fisicamente) de se deslocar ao tribunal. 16- A MM juiz, teve conhecimento do sucedido, mas entendeu que o julgamento se devia iniciar, conforme se iniciou, por não constar nos autos, nenhum documento que comprovasse o alegado impedimento. 17- Na manhã do julgamento e após ter noticia do telefonema recebido no dia anterior, a MM juiz alega que tinha informação que a mandatária tinha ido para o hospital de urgência, mas que o tribunal não podia adivinhar o desfecho de tal situação. 18- Assim, e não havendo documento escrito iniciou os trabalhos sem a presença da mandatária, da requerida, ora recorrente e sem a prova testemunhal indicada por aquela. 19-. Ora, se o tribunal foi informado telefonicamente que no dia anterior a mandatária estaria no hospital, seria expectável que previsse que havia justo impedimento e deveria aguardar o atestado médico comprovativo da situação relatada. 20- Aliás, nesse contacto telefónico foi dito que assim que fosse possível e a mandatária obtivesse documento clinico, juntaria aos autos. 21- O procedimento cirúrgico aconteceu ao final da tarde do dia 23 e só no dia 24, aquando da alta, é que a mandatária da recorrente teve o documento clínico que comprovou a situação. 22- É certo que a mandatária faltosa não juntou o resultado dos seus exames porque não o tinha de fazer. 23- Seria atentatório à sua privacidade e aos mais elementares direitos constitucionais se tivesse de fazer prova através de documentos clínicos da esfera intima para que o tribunal confirme da veracidade de uma situação de extrema gravidade a que um mandatário se vê sujeito na véspera de uma audiência. 24- O tribunal não pôs em questão a autenticidade do atestado clinico, sendo aquele documento, prova bastante de que a mandatária não estava em condições de trabalhar e de se deslocar à comarca de Sintra para realizar um julgamento. 25- A mandatária da recorrente, agiu com zelo e boa-fé quando, perante uma situação muito delicada com a qual se viu confrontada, diligenciou de informar a situação de justo impedimento. 26- Em nenhum preceito legal se encontra a obrigação do mandatário fazer prova, por escrito, quando informa o tribunal da situação de justo impedimento. 27- O que o mandatário está obrigado a fazer é a diligenciar, pelo meio mais expedito, por fazer chegar essa informação, seja por que via for estando também incumbido da situação que alega no prazo de 5 dias. 28- Não era exigível que depois de uma cirurgia urgente a mandatária estivesse preocupada em juntar “papeis” aos autos para que acreditem na sua fragilidade clinica. Iria fazê-lo, como fez , no dia do julgamento , assim que os teve na sua posse, depois da sua alta clinica datada de 24/11/2021. 29- O atestado médico, datado de 24/11/2021, ( dia do julgamento) e que foi junto nesse mesmo dia, à tarde ,faz constar que “ … foi submetida a cirurgia em 23/11/2021, na nossa unidade de Saúde de Vila do Conde sendo aconselhável repouso de , pelo menos , 10 dias” 30- Extrai-se, assim, do aludido atestado médico, que a mandatária da requerida foi submetida a uma cirurgia, que recomendava repouso durante o período de 10 dias, no dia 23/11/2021, ou seja, no dia anterior àquele em que se encontrava agendada a audiência de julgamento. 31- O médico que efectuou o procedimento cirúrgico entendeu que, a mandatária faltosa, necessitava de pelo menos , 10 dias de repouso, depois daquela manipulação cirúrgica , sendo que, a mandatária juntou esse comprovativo , logo no dia da audiência , via citius, através de uma colega 32- É verdade que a mandatária ligou para o tribunal de tarde, no dia de julgamento , ainda no hospital a pedir que não fosse reaberta a audiência e que assim que o médico lhe emitisse o atestado comprovaria a situação nos autos. 33- E nesse dia, na hora de almoço, tendo tido conhecimento através da Requerida , ora recorrente , que a audiência se havia realizado de manhã e que continuaria da parte da tarde, ainda combalida , contactou o tribunal, invocando mais uma vez a situação de justo impedimento e da sua total indisponibilidade para estar no tribunal, uma vez que, ainda não havia tido alta. 34- Pediu que o julgamento não continuasse e que fosse agendada nova data para a sua continuação. 35- O tribunal, mais uma vez teve conhecimento e fez tábua rasa dessas informações. 36- E porque a advogada da mãe, que padece de um problema de saúde grave e teve de ser intervencionada no dia anterior, de urgência, não compareceu e decidiu-se a vida da menor …, sem dó nem piedade. 37- E o tribunal justificou a falta da requerida, aqui recorrente, depois desta explanar os motivos da sua ausência, mas nem por isso, marcou nova data para ouvi-la. 38- A audiência de discussão e julgamento, independentemente de requerimento, deve ser adiada quando ocorra motivo que constitua justo impedimento de algum dos advogados das partes, devendo este comunicar tal circunstância prontamente ao tribunal e justificar até aos cinco dias imediatos à data da audiência. 39- O justo impedimento em causa é aferido segundo o conceito do n.º 1 do art.º 140º.O despacho que aprecie o motivo invocado pelo mandatário para a sua ausência, deve apenas verificar se o motivo invocado (…) constituía ou não justo impedimento nos termos do art.º 140º, n.º 1. 40- Basta a comunicação do impedimento para que a audiência seja adiada, a menos que o mandatário tenho referido expressamente a sua não oposição ao início da audiência. 41- Considerando que o motivo invocado preenche os requisitos do justo impedimento deveria ser adiada a audiência e aguardar-se a respectiva justificação até aos cinco dias subsequentes. 42- Ademais, a referida mandatária encontrava-se a mais de 350 Km do tribunal, pois tem escritório no Porto o que, inviabilizaria que pudesse substabelecer nalgum Colega para a realização da audiência de manhã, em Sintra. 43- Nem tão pouco, tem procuração conjunta para que a Requerente pudesse ser representada por outro advogado da sua confiança a quem tivesse outorgado poderes para o efeito. 44-. A MM juiz, à revelia dos ditames do direito e dos seus princípios fundamentais, elaborou sentença, como se de um processo urgente se tratasse, onde se pronunciou sobre o “incidente “suscitado pela mandatária da requerida. 45- Desrespeitou o preceituado no art.º 3.º, nº 3 do Código de Processo Civil, condenado inclusivamente, a Requerida nas custas pelo dito “Incidente”. 46- Assim, ao arrepio do que tem sido o entendimento, dos Tribunais, nesta matéria, o Tribunal "a quo", sabendo previamente do motivo que impossibilitou a comparência da mandatária da requerida ao julgamento, efetuou o mesmo, em violação do disposto, nomeadamente, no art.º 603°/1 in fine do CPC. 47- A doença súbita e inesperada dos mandatários das partes, tem sido entendida, como constituindo, justo impedimento, nos termos do art.º 140º do CPC. 48- A sentença é injusta na medida em que foi proferida sem que a requerida, tivesse tido a oportunidade de produzir as suas provas, o que, constitui uma violação dos princípios e direitos constitucionais, como seja, o princípio da proporcionalidade, o direito à prova, ao contraditório, o direito de acesso aos tribunais, o direito a um processo equitativo e até o direito de estar doente. 49- Ao efetuar o julgamento, sem a presença da advogada da requerida, que previamente informou o Tribunal "a quo" do motivo de saúde imprevisto que impossibilitou a comparência ao julgamento, violou, a Meritíssima Juiz " a quo", o princípio da igualdade das partes, previsto no art.º 4º do CPC. 50- Para proferir a sentença, o Tribunal “a quo” limitou-se apenas e tão somente a ouvir as testemunhas do Requerente, sem que a requerida tivesse tido a oportunidade de fazer a contraprova, dado que, as testemunhas da Requerida não foram ouvidas. 51- A sentença recorrida enferma de nulidade, nos termos do disposto do art.º 615º/1/ d) do C.P.C., uma vez que não conheceu de todas as questões submetidas para a apreciação ao Tribunal. 52- Violou, assim, a douta sentença recorrida, o disposto, designadamente, nos artigos 3º/3,4º, 140º, 415º, 603º e 608º do C.P.C. 53- É compreensível que o atestado médico não fosse junto de imediato, dado que, a mandatária foi submetida a procedimento cirúrgico urgente e do qual ainda não havia tido alta clinica. 54- Na própria acta de 24/11/2021, dia da audiência de julgamento, consta que foi transmitido à Mm. ª Juiz de Direito, o contacto telefónico recebido pela Secretaria Judicial, no dia anterior, por pessoa que se identificou como sendo do escritório da Dra. Cristiana de Carvalho, que informou que a Mandatária teria ido de urgência para o Hospital, sendo que assim que tivesse os documentos por parte do Hospital, informaria os presentes autos. 55- . Na mesma acta, também consta que, da parte da tarde, antes de iniciados os trabalhos agendados para aquele período do dia, que a Mandatária da requerida, contactou, mais uma vez o tribunal, via telefone, disse ter sido diagnosticada com cancro, tendo que ser submetida a cirurgia com urgência e comprometendo-se a enviar requerimento comprovativo da sua situação, assim que lhe fosse possível. 56- A MM juiz deu despacho dando conta que aquela situação não estava abrangida pelo nº 3 do art.º 603.º do CPC, porquanto, aquele normativo apenas se aplica às testemunhas. 57- Entendeu que, até aquela data e hora não tinha dado entrada nos autos qualquer explicação para a falta da mandatária, da requerida e das testemunhas que arrolou. 58- Entendeu que não houve qualquer justo impedimento devidamente alegado e comprovado que permitisse concluir pela necessidade do adiamento do presente julgamento, sem prejuízo da eventual “sindicância que a Ilustre Causídica da requerida aduziu, telefonicamente, por diligenciar”. 59- Por aqui se depreende que, os autos aguardavam o comprovativo da cirurgia, o que veio a acontecer nesse mesmo dia. 60- Não se compreende total alheamento da realidade e mistificação de algo que de tão simples é tão peculiar como a entrega de um documento “escrito” para que não se faça finca pé ao início e, posterior continuação, de um julgamento. 61- Afinal, o tribunal sempre soube e depreendeu a situação da mandatária. Deu conta que lhe “faltava “um documento escrito, por qualquer via, sem indicar, porque não existe, a norma que obriga a que a primeira comunicação com o tribunal deva ser escrita. 62- Perante o circunstancialismo descrito, não era exigível que a advogada, fizesse mais do que fez, pois, fez chegar ao Tribunal a informação, antes do início do julgamento, do seu impedimento (por telefone e depois por escrito) e juntou atestado médico, ainda nesse dia, para prova do que alegava, sendo certo que, ainda que pudesse substabelecer, encontrava-se numa comarca a mais de 350 km e a horas da diligência. 63- A situação descrita foi súbita e imprevisível, pelo que, não foi possível, à advogada faltosa entrar em contacto, em tempo útil, com um colega, que se refira, não conhece a Requerida, nem tão pouco o que se discute nestes autos. 64- Assim, ao arrepio do que tem sido o entendimento, dos Tribunais, nesta matéria, o Tribunal "a quo", sabendo previamente do motivo que impossibilitou a comparência da mandatária da requerida ao julgamento, efetuou o mesmo, em violação do disposto, nomeadamente, no art, º 603°/1 in fine do CPC. 65- A doença súbita e inesperada dos mandatários das partes é susceptível de constituir justo impedimento, nos termos do art.º 140°/1 do CPC. 66- Não foi invocado um motivo vago e indeterminado, foi explicado ao Tribunal " a quo", detalhadamente, que a advogada, se encontrava numa situação clinica grave e que iria ser sujeita a procedimento cirúrgico urgente, o que a impedia de estar presente, na audiência de julgamento ( art.º 140º/1 do CPC) 67- A realização do julgamento, sem a presença do advogado de uma das partes, que comunicou antes do início do julgamento, ao Tribunal "a quo", que, por motivo de doença súbita e inesperada, "justo impedimento", não podia ali comparecer, constitui uma nulidade, que manifestamente influenciou o exame ou a decisão da causa, nos termos do disposto, no art. ° 195º do CPC. 68- sendo violou, assim, o douto despacho recorrido, o disposto, designadamente, nos artigos 3°/3,4°,9° 140º, 195º,415°, 603° e 608º do C.P.C. 69- Deve o despacho ser revogado e com a consequente anulação do julgamento, realizado no dia 24/11/2021 e da sentença proferida, no dia 08/01/2022, com todas as demais consequências legais. Nesta conformidade, deve ser o presente recurso procedente e em consequência revogar o despacho proferido para a acta de dia 24/11/2021 e que determinou o início da audiência de julgamento, bem como a revogação do despacho de 08/01/2022 que indeferiu o justo impedimento, designando nova data para audiência final. Consequentemente, deve a sentença ora recorrida, ser declarada nula. TERMOS EM QUE dando provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, tudo em estrita conformidade com a tão douta e costumada JUSTIÇA.» * O Requerente não apresentou contra-alegações. O Ilustre Magistrado do Ministério Público apresentou resposta às alegações da Requerida, pronunciando-se pela fixação do efeito devolutivo do recurso, e sustentou, em síntese, a inexistência de justo impedimento que dite o adiamento da audiência de julgamento, bem como o acerto do julgado. * O recurso foi admitido como apelação e efeito devolutivo e mantido nesta instância por despacho da relatora. * Corridos os Vistos, cumpre decidir. 3.O Objecto do recurso Consabido que a actuação do tribunal de recurso está delimitada pelas conclusões do recorrente, (cfr. artigos. 635º, nº. 4, e 639º, nº. 1, e 608º, nº. 2 in fine, do CPC) haverá que decidir se, a audiência de discussão e julgamento realizada, deveria, ou não, ter sido adiada, por ocorrência de situação de justo impedimento da Mandatária da Requerida, sendo por consequência nula; e também nula por violação do direito de prova e do exercício do contraditório, e de todo, e em substância, produziu resultado injusto e inapropriado à defesa do superior interesse da menor. II.FUNDAMENTAÇÃO A. Os Factos O Tribunal a quo deu por provada a factualidade seguinte: 1 - (…) nasceu a … de 2014, sendo filha de (…)e de (…). 2- Por sentença datada de 27/04/17 proferida nos autos de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, convolados para divórcio por mútuo consentimento, foi homologado o acordo alcançado entre os progenitores da menor a quanto à regulação do exercício das responsabilidades parentais, nos seguintes termos: “RESIDÊNCIA E EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS1. A menor, fica entregue aos cuidados da mãe e com ela residindo, cabendo a ambos os progenitores o exercício das responsabilidades parentais da menor;2. Fixa-se a residência da menor junto da mãe; REGIME DE CONVÍVIOS 3. De 15 em 15 dias, a menor passará com o pai de 4ª feira a Domingo, indo o pai buscá-la a casa da mãe na quarta-feira, pelas 19h, e indo a mãe buscá-la a casa do pai no Domingo, pelas 19h;4. Nas semanas em que a menor não fique em casa do pai, a menor janta todas as quartas-feiras com o pai, indo o pai buscá-la a casa da mãe pelas 17h e entregá-la em casa da mãe até às 21h;5. No dia de aniversário da menor, mantém-se o regime que está fixado, e a mesma passará o fim-de-semana imediato ao seu aniversário de forma repartida (sábado com um dos pais, domingo com o outro) na companhia de um dos progenitores, rotativo anualmente, a iniciar este ano, ao sábado com a mãe;6. Nos dias de aniversário dos pais e da irmã, a menor passará o dia com o aniversariante, com pernoita, o mesmo sucedendo no dia do pai e no dia da mãe, sem prejuízo das atividades da mesma; 7. No Natal, a menor passará a véspera com um dos pais e o dia com o outro, alternadamente de ano para ano, a iniciar este ano o dia 24 com a mãe;8. No Ano Novo, a menor passará um ano com o pai e o seguinte com a mãe, a iniciar este ano com o pai;9. Na época festiva da Páscoa, a menor passará um ano com o pai e o seguinte com a mãe, a iniciar no próximo ano com a mãe;10. A menor passará metade de todos os seus períodos de férias escolares com cada um dos pais, a combinar entre as partes até 15 de março de cada ano; ALIMENTOS 11.O pai compromete-se a contribuir, a título de pensão de alimentos para a menor, com a quantia mensal de € 75,00 (setenta e cinco euros), a entregar à mãe, através transferência bancária, até ao dia 8 do mês a que respeitar, sendo esta quantia atualizável anualmente de acordo com a taxa de inflação publicada pelo INE;12.As despesas de saúde, médicas e medicamentosas, e de educação da menor, incluindo livros e material escolar e atividades extracurriculares sempre que decididas de comum acordo, serão suportadas na proporção de metade por cada um dos pais, na parte que não for comparticipada e mediante apresentação de documento comprovativo.” 3-Em junho de 2019 o pai da menor casou com (…), que tem duas filhas, de 15 anos e , de 12 anos, as quais vivem com o casal, em regime de residência alternada. 4-Os dias que a menor costuma passar em casa do pai (de 4.ª feira a domingo) coincidem com a semana em que a … está na casa do requerente e da sua esposa. 5-A Menor a tem ótima relação com as filhas de (..), assim como com a filha do requerente, de um outro relacionamento, de 24 anos, (…) 6--… tem excelente relacionamento com a sua irmã … e costuma passar os fins de semana em casa do requerente, a fim de com ela privar e brincar. 7- O requerente trabalha no setor livreiro. 8- O seu agregado familiar reside em imóvel que reúne condições de habitabilidade, com mobiliário adequado ao efeito. 9- O pai, aquando do nascimento da menor, usufruiu de licença de paternidade a fim de poder com ela privar, sempre tendo assumido cuidados a prestar à filha. 10- A menor tem excelente relacionamento com o pai, gosta de estar com ele, sendo este muito brincalhão. 11- Na semana em que a menor janta consigo à 4.ª feira, sem pernoita, a menor mostra ensejo junto do pai em querer ali permanecer a dormir nessa noite. 12- O agregado familiar da mãe da menor é composto por si e pelo seu marido, a filha … e a filha do casal, a menor .. de 3 anos de idade. 13- A requerida constituiu uma empresa de consultoria informática recentemente, sediada no Porto, não tendo horários definidos e trabalhando de acordo com as suas necessidades. Por vezes, tem de se deslocar ao Porto, tentando fazê-lo quando a …está com o pai; não sendo possível, vai e regressa no mesmo dia. 14- O seu agregado familiar habita em imóvel que reúne condições de habitabilidade, com mobiliário adequado ao efeito. 15- … é sociável, mas denota alguma imaturidade e atitudes impulsivas com os seus pares. 16- Segundo informação escolar, a menor sempre foi uma criança assídua e pontual com o pai e, quando está com a mãe, tem dificuldade em cumprir horários, o que prejudica a assimilação de conteúdos abordados e na integração de atividades. 17- A comunicação entre ambos os pais quanto às questões escolares e outras de particular importância da vida da filha é deficitária. 18- De acordo com a informação escolar, a … acusou défice de sono, e confrontados com esta situação, os pais, constatou-se que o requerente tem rotinas e que a mãe, neste âmbito, por vezes, sente dificuldades. 19 - A … foi uma vez com o pai e com a madrasta a uma praia de nudismo. 20 -A mãe não pretende ver a menor exposta a tais práticas, sendo que que nunca foi equacionada ou conversada previamente, em conjunto com a mãe, tal questão, sabendo o pai que a mãe se opõe a estas práticas com menores envolvidos, o que o pai e a madrasta respeitaram, não tendo voltado a frequentar tais praias com a menina. B. Do Mérito do Recurso Das questões trazidas a este tribunal de recurso haverá, antes de mais, de conhecer da invocada nulidade da sentença proferida pelo tribunal a quo, na sequência da audiência de julgamento realizada sem a presença da Ilustre Mandatária da Requerida e também das testemunhas por ela indicadas. 1.1.O justo impedimento do Advogado como causa de adiamento da audiência de julgamento O Decreto-Lei n.º 131/2009, de 01 de Junho (alterado pelo Decreto-Lei n.º 50/2018, de 25 de Junho) consagrou o direito dos advogados ao adiamento de actos processuais em que devam intervir, em situações de maternidade, paternidade e luto. Fora destes casos especiais, a parte que invocar impossibilidade de comparência em julgamento por justo impedimento, deve alegar o concreto motivo impeditivo da comparência e oferecer a respectiva prova, salvo se, quanto a esta, alegar justificadamente estar impossibilitada de o fazer, nos termos do disposto nos artigos 140.º e 603.º do CPC. Estatui o artigo 603º, nº 1, do CPC, sob a epígrafe “realização da audiência”, que “Verificada a presença das pessoas que tenham sido convocadas, realiza-se a audiência, salvo se houver impedimento do tribunal, faltar algum dos advogados sem que o juiz tenha providenciado pela marcação mediante acordo prévio ou ocorrer motivo que constitua justo impedimento.” Do preceito se extrai que a regra passa pela realização da audiência de julgamento, e o adiamento excepcional, só podem ocorrer nas duas circunstâncias/situações ali expressamente referidas. No que diz respeito à – falta da Advogado da parte – enquanto fundamento de adiamento da audiência de julgamento dependerá de uma de duas circunstâncias, a saber, a sua data não tiver sido marcada com o acordo prévio do mesmo, ou quando ocorrer situação de justo impedimento. Quanto ao justo impedimento estabelece o artigo 140º, nº 1 do atual CPC, “o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do ato” (nº. 1) - ou seja, no caso, o evento não imputável ao mandatário que o impede de estar presente à audiência -, sendo que a parte que o alegar deverá oferecer logo a respetiva prova (nº. 2). A propósito da densificação do conceito, através da enunciação de causas capazes de concretizar o justo impedimento, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre referem que “ (…)as situações de doença súbita da parte ou do mandatário constituem justo impedimento quando configurem um obstáculo razoável e objetivo à prática do ato, tidas em conta as condições mínimas de garantia do exercício do direito em causa (…).” In Código Processo Civil Anotado, vol. 1º, Coimbra Editora, 3ª ed. 2014, págs. 275/276. Ou seja, na situação de o advogado pretender adiar o julgamento por motivo de doença súbita e inesperada que não lhe permita estar presente em audiência final, deverá, antes do início dessa diligência, requerer o seu adiamento justificando a verificação duma situação de justo impedimento; e essa prova deverá, em regra, ser aprestada no caso de doença, através do competente atestado médico, e junto com o requerimento de invocação de justo impedimento, como dispõe o artigo 140º n.º 2, 1.ª parte, do C.P.C.. Ao juiz competirá, por conseguinte, no quadro normativo indicado, recebida a comunicação e a justificação do impedimento e, eventualmente, o comprovativo da causa de justificação anunciada e descrita nessa comunicação pelo advogado, ponderar mediante um juízo casuístico sobre a seriedade e a verosimilhança do facto impeditivo da sequência da audiência final - artigos 140.º, n.º 2, 151.º, n. os 3 e 5, do CPC. 1.2.A junção do documento comprovativo e a situação em juízo. Na situação ajuizada a audiência de julgamento fora designada para o dia 24.11.2011 , estando notificados os Ilustres mandatários das partes , com a advertência para o disposto no artigo 151º do CPC, conforme despacho datado de 17.09.2021. “Para audiência de julgamento designo o próximo dia 24 de novembro de “2009” as 10 horas, com a audição das testemunhas do requerente e as duas primeiras do rol da requerida, sendo as demais ouvidas no período da tarde, pelas 14 horas. As testemunhas serão a apresentar –artigo 39.º, n.º 8 do RGPTC. Autoriza-se a entrega da gravação das declarações da menor a requerida. Dê cumprimento ao disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 151.º do Código de Processo Civil, contactando o(s) ilustre(s) advogado(s) interveniente(s), por qualquer via, que na eventualidade de sobreposição de agendas deverá(ao) em cinco dias comunicar esse facto ao Tribunal, “…após contacto com os restantes mandatários interessados”, nos precisos termos do n.º 2, in fine do normativo citado (…)” existe manifesto lapso de escrita no ano que é 2011. No dia aprazado, cerca das 11h, feita a chamada dos convocados, verificou-se que a Mandatária da Requerida não se encontrava presente, bem como a sua constituinte e as testemunhas por ela indicadas. A oficial de justiça transmitiu à Senhora Juiz que a secretaria recebera no dia anterior (23.11) contacto telefónico , a mando da Ilustre Mandatária da Requerida, informando que a mesma tinha ido de urgência para o hospital e que informariam oportunamente os autos com os documentos. Conforme consta em acta “Foi transmitido à Mm. ª Juiz de Direito, o contacto telefónico recebido por esta Secretaria Judicial, no dia de ontem, por pessoa que se identificou como sendo do escritório da Dra. …, que informou que a Ilustre Mandatária teria ido de urgência para o Hospital, sendo que assim que tivesse os documentos por parte do Hospital, informariam os presentes autos. A Senhora Juiz iniciou a audiência com a audição do Requerente e após interrupção para o almoço, continuou pelas 14 h. Retomados os trabalhos no período da tarde, a Oficial de justiça voltou a transmitir à Senhora Juiz, que a secretaria tinha sido contactada por via telefone pela Requerida, e também pela sua Ilustre Mandatária, referindo que no dia de ontem tinha ido para o hospital pedindo no escritório para avisar, que tinha sido submetida a cirurgia de urgência (cancro) e que o julgamento não devia realizar -se. A Senhora Juiz considerou que não estando até ao momento documentado o devido impedimento, a audiência prosseguia, conforme melhor consta do despacho transcrito no ponto 6 do Relatório. Vejamos. Extrai-se do aludido atestado médico junto em 24.11.2021 e já após o encerramento da audiência de julgamento, que a Ilustre Mandatária da Requerida foi submetida a intervenção cirúrgica (biopsia) no dia 24.11.2021, com a consequente impossibilidade de trabalhar pelo período de 10 dias. Intervenção cirúrgica que, de per si, é suscetível de configurar uma situação de justo impedimento, em comparecer na audiência designada para esse mesmo dia. Embora o atestado médico não relate o quadro clínico que levou a Senhora Advogada a ser submetida àquela cirurgia, a mesma alegou que aconteceu na sequência de exigência urgente daquele procedimento, na sua ida ao hospital, no dia anterior, facto transmitido via telefone por pessoa do seu escritório. Circunstâncias reiteradas através de novo contacto telefónico no final da manhã e princípio do período da tarde do dia 24.11, pela Requerida e pela própria Mandatária. Tal comunicação referia a ida ao hospital da Senhora Advogada no dia anterior com carácter de urgência e mais informando, que os documentos seriam enviados logo que fosse disponibilizado. Comunicação, que foi efectuada, presumindo-se que a própria Senhora Advogada não estaria temporariamente em condições de o fazer, mas providenciou para que a mesma fosse feita ao tribunal pelo pessoal administrativo/forense do escritório e no dia anterior à audiência designada. Ora, considerando a natureza urgente e imprevista da intervenção associada ao foro cancerígeno, cuja hora de realização é desconhecida, temos que concluir que não é razoável, exigir diligência superior à que foi tomada pela Mandatária da Requerida, comunicando o facto ao escritório, que por seu turno, informou o tribunal no dia anterior à audiência designada e juntou no final do dia o atestado médico que atesta a realização da intervenção no dia 24.11., com necessidade de repouso por 10 dias. Por outro lado, decorre da realidade das coisas, que no dia da realização da intervenção, o médico não tinha como prioridade emitir o atestado médico, antes proceder à cirurgia e, a final, avaliar a situação clínica da paciente e os efeitos advenientes na sua recuperação com eventual afectação na capacidade de trabalho. Daí que, neste circunstancialismo concreto, a falta de junção contemporânea do atestado médico, deveria ter sido sopesada pelo tribunal a quo e levá-lo, pelo menos, a suspender os trabalhos da audiência, ouvidos os presentes, aguardando por prazo curto a junção do atestado, em ordem a poder aquilatar do (in) fundado impedimento da mandatária. Ou seja, o tribunal não detinha elementos para desde logo concluir pela inexistência de impedimento da Mandatária da Requerida, ou que eventualmente apontassem para uso de mero expediente dilatório, destinado a atrasar o andamento da causa; circunstância que também não se afigura supervenientemente defensável perante o teor do atestado médico apresentado. De resto, não podia olvidar, que num processo de Regulação de Responsabilidades Parentais e as especificidades inerentes, as partes têm a expectativa de ser o mesmo advogado que acompanha os contornos do litígio a intervir na decisiva audiência de julgamento, sendo certo que a procuração outorgada à mandatária não tem outros advogados constituídos. Não menos importante, deveria o tribunal a quo sopesar a circunstância de não estarem presentes as testemunhas indicadas pela Requerida, que avisadas, não compareceram, como constitui prática do conhecimento comum. Por último, como da acta de julgamento resulta, o tribunal a quo não deu sequer o contraditório à parte contrária. Cremos, pois, que o caso dos autos, se enquadra justificadamente na situação de admissibilidade de junção ulterior da prova documental do invocado impedimento por doença do Mandatário e o qual se mostra certificado através do atestado médico junto no final do dia aprazado para a audiência de julgamento. No âmbito da junção imediata ou diferida da prova documental do impedimento, Paulo Ramos Faria e Ana Luísa Loureiro formulam uma distinção pertinente - o impedimento de comparência na audiência –artigo 603º n.º 1 do C.P.C-, o impedimento da mera comunicação das circunstâncias impeditivas –artigo 151º n.º 5 do C.P.C.- e, o impedimento de oferecimento da sua prova -artigo 140º n.º 2 do C.P.C. Acerca deste específico ponto, referem que “(…) deve logo oferecer a respetiva prova, salvo se justificadamente estiver impossibilitada de o fazer. O juiz, ouvida a parte contrária, quando seja possível em tempo útil, deve deferir o adiamento se o evento invocado constituir justo impedimento e, no caso de ter sido oferecida prova, o julgar verificado (ou ser provável a sua verificação). Se o adiamento for deferido sem que tenha sido oferecida prova, esta deve ser apreciada logo que possível, já não para instrução do incidente – findo com a decisão de deferimento do adiamento –, mas para que a conduta da parte seja eventualmente apreciada nos quadros da má-fé processual (Art. 542º)”. In Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil”, Vol. I, 2.ª Ed. - 2014, pág. 571/575. Essa tem sido também a interpretação do preceito afirmada nos tribunais superiores. Assim, citando o recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-09-2020 : No proc 731/16.3T8STR.E1. S1 in www.dgsi.pt. «II.O juiz compete, uma vez recebida a comunicação e a justificação do impedimento (e, eventualmente, o comprovativo da causa de justificação anunciada e descrita nessa comunicação) pelo advogado, ponderar o acto impeditivo de acordo com a normatividade aplicável e mediante um juízo casuístico sobre a seriedade e a verosimilhança de um facto verdadeiramente inibitório do início e da sequência da audiência final (arts. 140.º, n.º 2, 151.º, n. os 3 e 5, do CPC). E acompanhando nós o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-12-2019 : Proferido nesta 7ºsecção, sendo adjuntos dois dos membros deste colectivo, no proc 11749/17.9T8LSB.L2. L1-7, disponível in www.dgsi.pt. «III– Não tendo podido o advogado comparecer a uma audiência na qual lhe competia assegurar a defesa dos interesses do seu cliente, no cumprimento do mandato forense que lhe foi conferido, devendo-se a sua imprevista ausência a imponderáveis motivos de saúde, verificados na véspera e que aconselham, em termos médicos, repouso absoluto, a lei não estabelece um regime (insensato) de absoluta indiferença pela impossibilidade objectiva de comparência do ausente, uma vez que o que está em causa é o exercício do contraditório pelas partes, não cabendo ao juiz aquilatar da maior ou menor utilidade da presença dos ilustres mandatários judiciais convocados para a diligência.» Perante o que se deixou exposto, forçoso é concluir que a situação sub judice configura um justo impedimento -doença da ilustre mandatária da requerida, comunicada atempadamente ao tribunal e, substanciada no atestado médico junto no mesmo dia, e não antes por motivo verosímil e atendível. Em síntese útil: - Não se verifica comportamento imprevidente/negligente por parte da mandatária, que na medida do exigível, providenciou pela comunicação do seu impedimento face ao episódio urgente de saúde, através de telefonema do escritório no dia anterior, reiterado no próprio dia da audiência de julgamento e juntando o atestado médico no final do mesmo; - Tal circunstancialismo justificava, pelo menos, a interrupção da audiência para continuar em data a agendar, com vista à audição das testemunhas indicadas pela requerida, por forma a ultrapassar a prova realizada em condições de flagrante desequilíbrio entre as partes, sem cumprimento pleno do contraditório, em desrespeito pelo disposto nos artigos 3.º n.º 3 e 415º n.º 1 do C.P.C; - Para concluir que o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na interpretação do artigo 603º n.º 1, conjugado com o artigo 140º n.º 2, ambos do C.P.C., indeferindo o requerimento de adiamento da audiência de julgamento, e consequentemente, verifica-se motivo legal para anular o julgamento e a sentença que se lhe seguiu. - À apreciação das restantes questões recursivas fica prejudicada. III. DECISÃO Pelo exposto, acordam os Juízes em julgar procedente o recurso e, em consequência, anulam a sentença proferida, devendo ordenar-se a renovação integral da produção de prova, permitindo que a Requerida possa contraditar os depoimentos prestados e produzir a sua prova em condições de igualdade como o Requerente, seguindo-se os demais trâmites até final. * As custas do recurso são a cargo do vencido a final, ou se não o houver, por ambas as partes, em igual proporção. Lisboa, 14.07.2022 ISABEL SALGADO CONCEIÇÃO SAAVEDRA CRISTINA COELHO |