Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ISABEL FONSECA | ||
Descritores: | SOCIEDADE COMERCIAL DISSOLUÇÃO ACÇÃO DE IMPUGNAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/29/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | 1. No âmbito do procedimento administrativo de dissolução de uma sociedade comercial encetado oficiosamente pelo conservador do registo comercial, ao abrigo do disposto no art. 5º, alínea a) do Regime Jurídico da Dissolução e da Liquidação de Entidades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29 de março, instaurada ação de impugnação judicial, o regime legal subsidiário é o do processo civil. 2. No processo civil a figura da dilação só tem aplicação ao ato da citação (art. 245º do CPC). 3. O direito de impugnar judicialmente a decisão do conservador deve ser exercido no prazo de 10 dias a contar da data da notificação dessa decisão (art. 12º do referido regime), não sendo aplicável qualquer prazo de dilação. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa I. RELATÓRIO Foi instaurado procedimento administrativo com vista à dissolução da sociedade H. Lda, com fundamento na falta de registo de prestação de contas durante dois anos consecutivos, na sequência de auto de notícia elaborado em 3 de julho de 2017, tendo sido proferida, em 1 de fevereiro de 2018, decisão do Conservador da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, que concluiu como segue: “Pelo supra exposto, decido o presente procedimento administrativo procedente por provado e consequentemente, declaro a dissolução e o encerramento da liquidação da entidade comercial H., Lda., nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 11º e 12º, ambos do RJPADLEC. Notifique-se os diversos interessados, da presente decisão, de que dispõem do prazo de 10 dias para impugnar judicialmente a presente decisão, nos termos do artigo 12º do RJPADLEC. Decorrido o prazo de dez dias, sem que a presente decisão tenha sido impugnada judicialmente, proceda-se à feitura do registo de dissolução e encerramento da liquidação da entidade comercial em análise, com a consequente extinção da mesma”. Não se conformando JC. na sua qualidade de sócio e gerente da referida sociedade veio impugnar judicialmente essa decisão, apresentando alegações, com conclusões. Para tanto e em síntese, invoca: - Em 22.02.2018 foi notificado, via correio registado, de que havia sido “... proferido o despacho final no procedimento administrativo de dissolução / liquidação da entidade H., LDA, com o NIPC …, ao qual foi atribuído o procedimento n° 2357/2017, com a decisão de dissolução e encerramento da liquidação, e o consequente cancelamento da matrícula da mesma, nos termos de publicação realizada por aviso electrónico no sítio oficial das publicações”; - Em 25.10.2017 havia sido efetuada uma outra notificação, nos termos da qual lhe tinha sido comunicado que fora “instaurado o procedimento administrativo de dissolução/liquidação da sociedade “H., LDA”, com o NIPC ..., ao qual foi atribuído o procedimento n° 2357/2017, pelo facto descrito na publicação realizada por aviso electrónico no sítio oficial das publicações.”; - Ou seja “(...) durante dois anos consecutivos, a sociedade não proceder ao registo da prestação de contas, nos termos do disposto na alínea a) do artigo 5.° do RJPADLEC.”; - Mais sendo notificados os “(…)sócios, gerentes e sociedade de que dispõem do prazo de dez dias a contar desta notificação para comunicar a este serviço a existência de activo e passivo da sociedade e dizerem o que se lhes oferecer, querendo, e apresentando os respectivos meios de prova. Dispõem ainda do prazo de 30 dias, a contar desta notificação, para regularizar ou para demonstrar que já se encontra regularizada a situação”; - A sociedade em causa tem atividade regular e património, sendo nomeadamente proprietária de sete prédios, de um trator e, até há poucos dias, tinha um trabalhador; - Admite que, por incúria do seu gerente, ora impugnante, não tenha cumprido a sua obrigação de registo de publicação de contas, nem tenha respondido à referida primeira notificação; - Na verdade, o impugnante é cidadão espanhol e reside habitualmente em Espanha, pelo que nada compreende da língua portuguesa; - Pelo que, aquando da receção da primeira notificação, não se apercebeu do teor da mesma nem consultou as publicações online; - Sendo que apenas há alguns dias, quando deu a ler a um conhecido português a segunda notificação, o impugnante se apercebeu da gravidade dos factos; - Altura em que apresentou a competente documentação à sociedade que executa a respetiva contabilidade, tendo-lhe solicitado que urgentemente realizasse os necessários procedimentos contabilísticos e procedesse ao registo da prestação de contas dos exercícios em falta (2011, inclusivamente, em diante); - O que esta fez no passado dia 2 de Março de 2018 em relação às prestações de contas relativas aos exercícios de 2011, 2012 e 2013, no dia 5 de Março de 2018 em relação à prestação de contas relativa ao exercício de 2014 e no dia 9 de Março de 2019 em relação às prestações de contas relativas aos exercícios de 2015 e 2016; - No que conclui que, atento o facto de a obrigação de prestação de contas relativamente ao exercício de 2017 todavia não se ter vencido, nenhuma prestação de contas se encontra agora em falta; - Em todo o caso, a Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, no procedimento tido lugar, deveria ter solicitado à ACT e aos serviços competentes da Segurança Social informações sobre eventuais registos de trabalhadores da sociedade, que existia, o qual deveria ter notificado e comunicado ao trabalhador da sociedade que o procedimento havia tido início, o que não fez e configura nulidade; - Assim como deveria ter diligenciado no sentido de obter informação acerca de ativo ou passivo da sociedade, o que não fez e configura nulidade; - Enquanto sócio e gerente da sociedade, tendo rececionado a notificação do despacho impugnando na sua residência em Espanha em 22.02.2018, o impugnante encontra-se em tempo para apresentar a presente impugnação. Em 05-02-2018 foi proferida decisão que concluiu como segue: “V. Decisão Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgando improcedente o recurso, mantenho a decisão da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa que declarou a dissolução por via administrativa e encerramento da liquidação de H., Lda. Custas pelo recorrente - artigo 527°, n°s 1 e 2, do Código de Processo Civil. Valor para efeitos de custas - nos termos do artigo 12°, n°1, alínea d), do Regulamento das Custas Processuais. Registe e notifique, sendo oportunamente cumprido o disposto no artigo 107°, do Código do Registo Comercial”. Não se conformando o impugnante apelou, formulando as seguintes conclusões: “ O recorrente, que é sócio gerente da sociedade denominada H., Lda, não se conforma com a decisão recorrida, a qual julga improcedente a impugnação contenciosa por si apresentada, mantendo, assim, a decisão da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa que havia declarado a dissolução por via administrativa e o encerramento da liquidação da sociedade. O Tribunal a quo indeferiu a pretensão do recorrente por entender que "... não havendo qualquer nulidade, anulabilidade ou irregularidade que inquine o presente procedimento, a impugnação contenciosa, necessariamente improcede, além do que, interposta findo o prazo de 10 (dez) dias contados da publicação da decisão final, é manifestamente extemporâneo.". (cfr. § 2.° de fls. 10 da decisão recorrida) O recorrente entende que o Tribunal a quo não fez a melhor interpretação das normas aplicáveis, tendo-as assim violado. Ademais, crê o recorrente que na matéria de facto dada como provada e fundamentadora da decisão, existem lacunas claras, as quais porão em causa a boa tomada da decisão final, pelo que lhe parece que a decisão em causa deve ser revogada e substituída por outra que, atendendo as suas pretensões, anule a referida decisão da C.R.C. Lisboa. QUANTO Á MATÉRIA DE FACTO Entre outras razões, a decisão recorrida indefere a pretensão do recorrente por considerar que a mesma foi interposta findo o prazo legal. (cfr. § 2.° de fls. 10 da decisão recorrida) Sucede que, como cristalinamente resulta da impugnação contenciosa apresentada, o recorrente põe em causa a data da sua notificação e, assim, a inexistência de qualquer extemporaneidade, pois que entende ter sido notificado através de comunicação postal remetida pela C.R.C. de Lisboa em 11.02.2018 e por si rececionada na sua residência em Espanha em 22.02.2018. (cfr. § 12.° de fls. 2 da decisão) Assim, salvo melhor opinião, para boa decisão da questão que lhe foi colocada seria fundamental que o Tribunal a quo tivesse incluído na matéria provada, isto é, da “Fundamentação fáctico-jurídica e conclusiva”, a data de envio e recebimento desta notificação, bem como o local para o qual a mesma foi remetida e no qual foi rececionada. O que não sucedeu. Tendo tais factos sido alegados e provados pela impugnante (cfr. docs. 1 e 2 juntos com a impugnação contenciosa), devem os mesmos ser dados como provados, sendo, em consequência, acrescentados à “Fundamentação fáctico-jurídica e conclusiva” e tidos em conta para a decisão da causa. Por outro lado, não consta desta “Fundamentação fáctico-jurídica e conclusiva” da decisão recorrida que a sociedade dos autos tem património. O que efetivamente ocorre, como o recorrente igualmente provou em sede de impugnação contenciosa. (cfr. documentos 3 a 11 juntos com a impugnação contenciosa) Em consequência do que deverá ser dado como provado que a sociedade dos autos tem património, o que, como é sabido, é essencial para a tomada ou não da decisão de liquidação, sendo tal facto também acrescentado à “Fundamentação fáctico-jurídica e conclusiva” e tido em conta para a decisão da causa. QUANTO À MATÉRIA DE DIREITO O Tribunal a quo admite que a notificação da decisão final em crise “... está prevista no artigo 11.° n.° 5, no qual se estabelece que os interessados são imediatamente notificados da decisão pela forma prevista nos n.°s 4, e 7, do art.° 8.°.” (referindo-se a disposições do RJPADLEC). (cfr. § 1.° de fls. 6 da decisão) Porém, considera como notificação apenas a publicação da decisão no Portal do Ministério da Justiça, a qual, no caso, teve lugar em 02.02.2018. Sucede que, salvo melhor opinião, atentos os teores dos citados n.° 5 do art.° 11.° e n.°s 4, 5 e 7 do art.° 8.° RJPADLEC, deverá ter-se igualmente por notificação a comunicação efetuada por correio registado nos termos deste último n.° 5. Com efeito, como é sabido, o n.° 5 do artigo 11.° determina que “Os interessados são imediatamente notificados da decisão pela forma prevista nos n.°s 4, 5 e 7 do artigo 8.°.”. Porém, o n.° 4 do artigo 8.° determina que “A notificação realiza-se através da publicação de aviso nos termos do n.° 1 do artigo 167.° do Código das Sociedades Comerciais, dando conta de que os documentos estão disponíveis para consulta no serviço de registo competente.” e o n.° 5 do mesmo diploma determina que “A realização da publicação prevista no número anterior é comunicada à entidade comercial e aos respectivos membros que constem do registo, por carta registada.” Assim, temos que os interessados devem ser imediatamente notificados da decisão do procedimento administrativo de dissolução (n.° 5 do art.° 11.° RJPADLEC) através da publicação de aviso no Portal do Ministério da Justiça para publicações societárias (n.° 4) e de carta registada (n.°s 5 e 7). É que dúvidas não haverá de que do n.° 5 do art.° 11.° decorre que os interessados são “notificados” pela forma previstas nos n.°s 4, 5 e 7 do art.° 8.° e não apenas no n.° 4. Isto é, esta norma determina que tal notificação se dê por publicação no Portal e pela comunicação postal sob correio registado. E não se diga que o legislador queria dizer outra coisa, isto é, que não queria dar à comunicação postal aos interessados a natureza de notificação, pois que tal contrariaria o disposto no art.° 9.° do Código Civil, para que se remete. Na verdade, da letra da Lei resulta claramente que a notificação aos interessados se faz pela forma prevista pelo n.° 4 do art.° 8.°, ou seja, por publicação no Portal, e pela forma prevista nos n.°s 5 e 7 do mesmo art.°, isto é, por correio registado. Se assim não se interpretar, pergunta-se: Para que serviria então a comunicação prevista nos n.°s 5 e 7 do art.° 8.° RJPADLEC? No presente caso, ainda que a decisão final do procedimento haja sido publicada no Portal do Ministério da Justiça em 02.02.2018, a respetiva notificação postal apenas foi enviada pela C.R.C de Lisboa em 11.02.2018 e rececionada pelo recorrente no seu domicílio em Espanha em 22.02.2018. Pelo que, atentas as disposições conjugadas dos n.°s 1 e 2 do art.° 113.° CPA, não pode deixar de ter-se como data da notificação 22.02.2018. Assim não tendo decidido, a decisão recorrida violou as disposições conjugadas do n.° 5 do artigo 11.° e dos n.°s 5 e 7 do art.° 8.°, ambos do RJPADLEC. Ademais, ao presente caso será de aplicar a dilação de 15 dias estipulada na alínea b) do n.° 1 do art.° 88.° CPA, que prevê o caso de interessados que residem ou se encontrem em país estrangeiro europeu, como é o caso do recorrente que, recebeu a comunicação em causa na sua residência em Espanha. Pois que as disposições do CPA referentes ao procedimento e à atividade administrativa "... são aplicáveis à conduta de quaisquer entidades, independentemente da sua natureza, adotada no exercício de poderes públicos ou regulada de modo específico por disposições de direito administrativo.” (n.° 1 do art.° 2.° CPA), como é o caso da atividade da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa. Face ao exposto, tendo a notificação sido realizada em 22.02.2018 e sendo legalmente prevista dilação de 15 dias, o prazo de 10 dias para impugnação judicial que é legalmente conferido ao impugnante nos termos do transcrito n.° 1 do art.° 12.° RJPADLEC, apenas se terá iniciado em 09.03.2018. Pelo que a apresentação da impugnação contenciosa em 14.03.2018 o foi perfeitamente em tempo. Assim não tendo decidido, para além de, como antes se deixou dito, ter violado as disposições conjugadas do n.° 5 do artigo 11.° e dos n.°s 5 e 7 do art.° 8.°, ambos do RJPADLEC, a decisão recorrida violou igualmente a alínea b) do n.° 1 do art.° 88.° CPA. Pelo que deve ser revogada e substituída por outra que, atento o disposto no n.° 5 do artigo 11.° e nos n.°s 5 e 7 do art.° 8.°, ambos do RJPADLEC e na alínea b) do n.° 1 do art.° 88.° CPA, considere que a impugnação contenciosa foi apresentada em tempo. E quanto à matéria em causa: O Tribunal a quo não interpreta convenientemente a Lei, não tendo minimamente em conta a ratio legis do RJPADLEC. Com efeito, a dissolução administrativa prevista no RJPADLEC não tem caráter sancionatório, antes constituindo um meio encontrado pelo legislador para fazer mais facilmente cessar as muitas sociedades que apenas têm existência registal, não existindo já na prática, isto é, não tendo atividade, sede física, trabalhadores, bens, o que não sucede com a impugnante. E isto decorre cristalinamente do § 9.° do Preâmbulo do Decreto-Lei n.° 76-A/2006, nos termos do qual: "... adopta-se uma modalidade de dissolução e liquidação administrativa e oficiosa de entidades comerciais, por iniciativa do Estado, quando existam indicadores objectivos de que a entidade em causa já não tem actividade embora permaneça juridicamente existente. Esta medida é especialmente relevante tendo em conta o elevado número de sociedades comerciais criadas sem actividade efectiva na economia nacional, pois estima-se que existam dezenas, senão centenas, de milhar de empresas a estar nessas circunstâncias." e “O procedimento administrativo que agora se estabelece evita que todas essas situações, que podem ser dezenas de milhar, originem um processo judicial para cada uma delas, pois atribui a competência para a dissolução e liquidação às conservatórias, sempre com garantia do direito de impugnação judicial.". Ora, a H., Lda encontra-se, como sempre se encontrou, a exercer normalmente a sua atividade, tendo sede física e património, tendo atualmente um trabalhador e tendo as suas prestações de contas perfeitamente regularizadas. Pelo que, atenta a ratio legis do diploma, nenhuma razão há para que se mantenha a dissolução. A qual, a manter-se, servirá apenas como uma pesada sanção não prevista legalmente, sendo assim violadora do espírito do RJPADLEC. Face ao exposto, deve a decisão recorrida ser substituída por outra que declare findo o procedimento e a invalidade o registo oficioso de cessação da respetiva matrícula. Assim não se entendendo, o que se admite por mero dever de patrocínio e sem conceder, dir-se-á ainda que: Ao contrário do que expressamente se defende na decisão recorrida (cfr. § 4.° de fls. 5 da decisão recorrida), a tramitação empreendida pela Conservatória do Registo Comercial de Lisboa não observou todos os procedimentos devidos. Na verdade, nos termos do disposto na alínea c) do n.° 1 do citado art.° 9.°, "Quando o procedimento seja instaurado oficiosamente a notificação deve conter os elementos referidos no n.° 2 do artigo 8.°, excepto o que consta da alínea c), e ainda os seguintes: (...) c) Aviso de que, se dos elementos do processo não for apurada a existência de qualquer activo ou passivo a liquidar ou se os notificados não comunicarem ao serviço de registo competente o activo e o passivo da entidade comercial, o conservador declara simultaneamente a dissolução e o encerramento da liquidação da entidade comercial;". Parece inegável que daqui decorre que a Conservatória na qual corra o procedimento tem um verdadeiro dever de indagar sobre a eventual existência de ativo ou passivo Com efeito, se há duas formas distintas de a Conservatória obter informação acerca da existência de ativo ou passivo e se uma delas é a aportação da informação pelos notificados, evidente se torna que a outra forma será aquela em que a própria Conservatória atua oficiosamente de modo a obter tal informação. E a existência ou não de passivo é de capital importância para o desfecho do procedimento, pois que, se o houver, como é evidente, não pode ser decretado o encerramento da liquidação. (n.° 4 do art.° 11.° RJPADLEC) Assim, ao decidir como decidiu, não indagando previamente pela existência ou não de património da sociedade dos autos, a decisão recorrida é violadora da alínea c) do n.° 1 do art.° 9.° e do n.° 4 do art.° 11.° RJPADLEC. Pelo que deve ser substituída por outra que, cumprindo estas normas, dê sem efeito a decisão da C.R.C. de Lisboa de dissolução e liquidação da sociedade dos autos, mantendo-se esta no ordenamento jurídico como até aqui. Com o que farão V.Ex.as. Venerandos Juízes Desembargadores, a costumada JUSTIÇA!” Cumpre apreciar. II. FUNDAMENTOS DE FACTO O tribunal de primeira instância deu por provada a seguinte factualidade: 1. H., Lda., pessoa coletiva n.° …, tem sede no Monte …; 2. Tem por objeto social agricultura, pecuária, serviços relacionados com a agricultura, silvicultura, exploração florestal, exploração económica dos recursos cinegéticos, comercialização de produtos agro-pecuários, prestação de serviços agrícolas, compra a venda de imóveis rústicos e urbanos, turismo rural e o capital social de 6.000,00 €; 3. Tem dois sócios, JC. e RG; 4. JC. é também seu gerente e tem residência registada em …, Sevilha, Espanha; 5. RG tem residência registada no Monte …; 6. Por Ap. 5 de 26.04.1988 mostra-se inscrita a constituição da sociedade da mesma figurando, desde então, como seu sócio, JC.; 7. Por Av. 2 de 17.07.2017 mostra-se averbada a pendência da dissolução administrativa; 8. Por aviso publicado em 17.07.2017 no portal das publicações foi iniciado o procedimento de dissolução; 9. A comunicação do início do procedimento e da sua publicação à sociedade e aos sócios foi efetuada por carta registada, sendo a da sociedade e da sócia RG devolvidas com a menção “não atendeu”; 10. A carta dirigida ao sócio JC. foi recebida pelo próprio; 11. Não foi efetuado qualquer pedido de regularização, nem foi comunicada ou apurada a existência de ativo ou passivo a liquidar; 12. Em 04.08.2017 a Conservatória do Registo Comercial de Lisboa oficiou ao Centro Distrital da Segurança Social de Beja que informasse a existência de trabalhadores quanto à H., Lda.; 13. Em 14.08.2017 o Centro Distrital da Segurança Social de Beja informou que H., Lda. “não tem trabalhadores”; 14. Em 01.02.2018 foi proferida decisão final com a declaração simultânea da dissolução e encerramento da liquidação, a qual foi publicada no portal das publicações em 02.02.2018; 15. Em 14.03.2018 deu entrada nos serviços da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa a impugnação à decisão administrativa de dissolução e enceramento da liquidação. III. FUNDAMENTOS DE DIREITO 1. Sendo o objeto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo apelante e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – arts. 635º e 639º do CPC – salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito – art.º 5º, nº3 do mesmo diploma. No caso, ponderando as conclusões de recurso, impõe-se apreciar: - Da tempestividade da ação de impugnação judicial; - Da impugnação do julgamento de facto; - Da verificação do condicionalismo legal para a dissolução e liquidação da sociedade comercial. As questões suscitadas devem ser apreciadas ponderando o Regime Jurídico da Dissolução e da Liquidação de Entidades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29 de março [ [1] ] [ [2] ] e publicado em anexo ao diploma – anexo III –, diploma a que aludiremos quando não se fizer menção de origem, tendo por referência os arts. 143º e 144º do Cód. das Sociedades Comerciais. Impondo-se, previamente, uma breve delimitação deste regime, para perceção daquelas questões. 2. O procedimento administrativo corre termos perante o conservador do registo comercial e pode ter início: - A pedido dos interessados identificados no art. 4º nº1, pelos fundamentos enunciados nas alíneas a) a h) e nos demais casos em que “a lei o permita”- cfr. o art. 142º do Cód. das Sociedades Comerciais (CSC); - Oficiosamente, por intervenção do conservador, pelos fundamentos enunciados no art. 5º - cfr. o art. 143º do CSC –, como aqui aconteceu, tendo o respetivo auto, datado de 03-07-2017, sido elaborado nos termos que resultam do documento de fls. 44, aí se fazendo menção, nomeadamente, à identidade da sociedade objeto do procedimento e o respetivo fundamento, a saber, o incumprimento da obrigação do registo de contas, previsto no art. 5º, alínea a); do documento de fls. 53 – anexo D – resulta que, nessa data (03-07-2017), o último registo de prestação de contas tinha sido feito em 01-10-2011, reportando-se ao exercício do ano de 2010 [ [3] ]; ou seja, à data em que foi elaborado o auto, não se mostrava registada a prestação de contas relativas aos exercícios de 2011 em diante [ [4] ]. Centrando-nos no procedimento que ao caso interessa, temos que, nos termos deste preceito, sob a epígrafe “[i]nício oficioso do procedimento”, “[o] procedimento administrativo de dissolução é instaurado oficiosamente pelo conservador, mediante auto que especifique as circunstâncias que determinaram a instauração do procedimento e que identifique a entidade e a causa de dissolução, quando resulte da lei e ainda quando” “[d]urante dois anos consecutivos, a sociedade não tenha procedido ao registo da prestação de contas” (alínea a) [ [5] ]. Atente-se que a redação da citada alínea a) vem do Decreto-Lei no 250/2012, de 23 de novembro, sendo aplicável apenas ao incumprimento do registo da prestação de contas dos exercícios económicos a partir de 2012 [ [6] ]. Os arts. 8º a 11º regem, respetivamente, o respetivo procedimento, em matérias alusivas à notificação e participação da entidade e dos interessados (art. 8º), às especificidades da notificação, participação dos interessados e solicitação de informações no procedimento oficioso (art. 9º), à indicação de liquidatários no procedimento voluntário (art. 10º) e à decisão a proferir pelo conservador do registo comercial (art. 11º). Quanto ao conteúdo da notificação, não é o mesmo nos dois tipos de procedimento. Assim, no procedimento não oficioso os interessados são notificados, nomeadamente, de que dispõem de um “prazo de 10 dias a contar da notificação, para dizerem o que se lhes oferecer, apresentando os respetivos meios de prova (art. 8º, nº2, alínea c), indicação que não está prevista para a notificação no procedimento oficioso, conforme expressamente resulta o art. 9º, nº1 [ [7] ]. Neste, a lei obriga a que sejam notificados os interessados para os efeitos do procedimento – a sociedade e os respetivos sócios e gerente –, com vista, nomeadamente, a que, em 30 dias – prazo que pode ser prorrogado até 90, a pedido dos interessados – regularizem a situação que motivou a instauração do procedimento administrativo ou demonstrem que essa regularização já se mostra efetuada [ [8] ]. Segue-se a fase do julgamento, latu sensu: sendo regularizada a situação, o conservador declara findo o procedimento; não sendo esse o caso, o conservador tem o prazo de 15 dias para prolação de decisão (art. 11º), precedida da audição das testemunhas que tiverem sido indicadas, reduzindo a escrito o depoimento respetivo, se for esse o caso. Nos termos do nº4 do art. 11º os “interessados são imediatamente notificados da decisão pela forma prevista nos nºs 4, 5 e 7 do artigo 8º, isto é, no que ao caso interessa: - A notificação realiza-se através da publicação de aviso nos termos do no 1 do artigo 167º do CSC, dando conta de que os documentos estão disponíveis para consulta no serviço de registo competente – nº4; – A realização da publicação prevista no número anterior é comunicada à entidade comercial e aos respetivos membros que constem do registo, por carta registada – nº5 A decisão do conservador pode ser judicialmente impugnada, sendo que o legislador não cuidou de fixar os termos do procedimento de impugnação, uma vez que no art. 12º, sob a epígrafe “impugnação judicial”, se limita a estipular como segue: “1 – Qualquer interessado pode impugnar judicialmente a decisão do conservador, com efeito suspensivo, no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão. 2 – A acção judicial considera-se proposta com a sua apresentação no serviço de registo competente em que decorreu o procedimento, sendo de seguida o processo remetido ao tribunal judicial competente. 3 – Após o trânsito em julgado da decisão judicial proferida o tribunal comunica-a ao serviço de registo competente e devolve a este os documentos constantes do procedimento administrativo. 4 – Todos os actos e comunicações referidos nos nºs 2 e 3 devem ser obrigatoriamente efectuados por via electrónica, sempre que tal meio se encontre disponível, em termos a definir por portaria do Ministro da Justiça”. Daqui resulta um alargamento das competências do conservador, que não surpreende num movimento que tende, nos últimos anos, a atribuir aos conservadores competências para judiciais – como acontece no domínio dos processos de inventario e de divórcio –, sem prejuízo do legislador salvaguardar o acesso ao juiz, garantido pelo art. 20º, nº1 da CRP, por via da referida possibilidade de impugnação judicial [ [9] ][ [10] ]. Delimitados, em nótula, os parâmetros do regime jurídico pertinente, ponderando o concreto fundamento de dissolução apontado no auto de notícia vejamos, então, da tempestividade da impugnação judicial por parte do apelante, questão (prévia) que é de conhecimento oficioso. Salienta-se que a análise que aqui importa fazer incide, essencialmente, sobre a fase processual posterior à decisão do conservador, ou seja, sobre a natureza da ação de impugnação judicial instaurada - para alguns, recurso jurisdicional. 3. A decisão do conservador foi proferida em 01-02-2018 e foi notificada por publicação de 02-02-2018 (número 14 dos factos assentes), assim se dando cumprimento ao disposto no art. 8º, nº4, ex vi do art. 11º, nº5, nos moldes a que supra se aludiu. Deu-se ainda cumprimento às demais exigências legais, a que já se aludiu, porquanto foi enviada carta registada com A/R ao apelante, que este recebeu em 22-02-2018, dando-lhe conhecimento de que “foi proferido o despacho final no procedimento administrativo de dissolução/liquidação da entidade (…) com a decisão de dissolução e encerramento da liquidação, e o consequente cancelamento da matrícula da mesma, nos termos de publicação realizada por aviso electrónico no sítio das publicações do Ministério da Justiça (…)”, conforme à evidência resulta do processo – cfr. o documento nº1 junto com o requerimento de impugnação judicial, a fls. 23-25 dos autos e ainda o anexo G que instrui o processo, a fls. 75-78. Saliente-se que não há qualquer divergência quanto a esta factualidade, a que esta Relação deve atender, independentemente de impugnação do julgamento de facto por parte do apelante – um dos pontos da impugnação incide precisamente sobre esta matéria, cujo aditamento é peticionado –, nos termos do art. 662º, nº1 do CPC. Considerando que a impugnação judicial foi apresentada em 14-03-2018, concluiu-se na sentença recorrida pela intempestividade dessa impugnação, juízo que o apelante questiona. Lê-se na decisão recorrida: “Quanto à contagem do prazo para a impugnação, tem sido entendido ter lugar a regra da continuidade, ou seja, dez dias contínuos, por aplicação do disposto no artigo 155°, n° 2, do Código do Registo Predial, ex vi do artigo 115°, do Código do Registo Comercial (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 26.04.2016, proferido no âmbito do processo n° 2426/15.6T8LSB, Juiz 1, deste Juízo de Comércio de Lisboa). Destarte, quer por referência à data da publicação da decisão final, quer por referência à data em que admite o recorrente ter sido notificado dessa decisão (em 22.02.018), na data em que se apresentou a deduzir impugnação (em 14.03.2018), já o prazo para tal estava expirado. Sempre se diga, ainda assim, quanto à eventual existência de dilação, atenta a residência do recorrente no estrangeiro que, dentro do regime legal aqui aplicável, o artigo 8°, n° 4, contém previsão expressa quanto à forma da notificação: Aviso no Portal do Ministério da Justiça para publicações societárias, nos termos do artigo 167°, do Código das Sociedades Comerciais (cfr. neste sentido, quanto à forma de notificação, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.10.2018, proferido no âmbito do processo n° 17577/14.4T8LSB, Juiz 4 deste Juízo de Comércio de Lisboa), sendo que o citado Portal é o sítio oficial que assegura acesso público, universal e gratuito: http://publicacoes.mj.pt/. Disponível online em território nacional ou estrangeiro, donde não há que lançar mão às dilações do regime das citações no âmbito do processo civil nem sequer do procedimento administrativo. Estas regras não são aplicáveis, nem há lacuna. Logo, não vigora qualquer dilação” [ [11] ]. Vejamos. O apelante considera, em primeiro lugar, que “não pode deixar de ter-se como data de notificação 22.02.2018” e, em segundo lugar, que “será de aplicar a dilação de 15 dias estipulada na citada alínea b) do nº1 do art. 88º do CPA, que prevê o caso de interessados que residem ou se encontrem em país estrangeiro europeu, como é o caso do recorrente que recebeu a notificação em causa na sua residência em Espanha”, para concluir que o prazo para a instauração da impugnação judicial apenas se iniciou em 09-03-2018, pelo que deduziu atempadamente a impugnação, ao contrário do que se entendeu na decisão recorrida. Afigura-se-nos que não tem razão. Perante a notória insuficiência de regulação da impugnação judicial, no RJPADLEC, pergunta-se sobre o regime jurídico aplicável subsidiariamente. Não impressiona o nomem iuris do regime em causa – “procedimentos administrativos” –, porquanto, pese embora tal denominação, não se encontra no diploma qualquer referência ou remessa para o regime do Código do Procedimento Administrativo (CPA), aprovado pelo Dec. Lei 4/2015, de 07 de janeiro, impressionando, ao invés, que esteja em causa sindicar judicialmente, pelo Tribunal de Comércio [ [12] ], decisões proferidas pelo Conservador do Registo Comercial que, pese embora se constitua como um órgão da administração, vê a sua atuação perspetivada em função de normas de direito privado, tendo em vista o reconhecimento, a modificação ou a extinção de entidades de direito privado, no caso, a dissolução e liquidação de uma sociedade comercial por quotas. Considerando o campo em que nos situamos – ação de impugnação judicial da decisão do conservador– , afigura-se-nos que o sistema normativo aplicável subsidiariamente é o do processo civil e não o do CPA [ [13] ], sendo esta solução a que melhor assegura a coerência e unidade do sistema jurídico ponderando que, relativamente a outras decisões do conservador do registo comercial, no domínio de matérias conexas, como acontece com as decisões de recusa da prática de ato de registo alusivos à sociedade, nos termos requeridos pelos interessados [ [14] ], a lei prevê expressamente a sua impugnação judicial, nos moldes que decorrem do Capítulo VII (“[i]mpugnação de decisões”), mais precisamente, dos arts. 101º [ [15] ], 101º-A [ [16] ], 101º-B [ [17] ], 104º [ [18] ] e 105º [ [19] ] do Cód. do Registo Comercial. Assinala-se que da sentença proferida pelo tribunal de primeira instância cabe recurso para a Relação, com efeito suspensivo – art. 106º, nº1 (“[r]ecurso de sentença”) do Cód. do Registo Comercial –, e que do acórdão da Relação não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, “sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível” – nº2 [ [20] ]. Isto, por contraposição ao recurso hierárquico, outra forma de impugnação que, essa sim, tem como direito subsidiário o CPA, nos termos do art. 109º-A do Cód. do Registo Comercial; acrescente-se a previsão de aplicação subsidiária do código de processo Civil, prevista no art. 156º do Cód. do Registo Predial, que vale para o registo comercial ex vi do art. 115º do Cód. do Registo Comercial. Conclui-se, pois, que o regime legal subsidiário é o do processo civil, mormente quanto às regras alusivas à contagem de prazos, que têm especificidades próprias relativamente às regras constantes do CPA [ [21] ], com vista a aferir se ao prazo de 10 dias previsto no art. 12º para a impugnação judicial pode acrescer um prazo de dilação. No processo civil a figura da dilação só tem aplicação ao ato da citação. Assim, na legislação processual civil é tipificada a “dilação”, em sede de contagem de prazos alusivos à “defesa do citando” (art. 245º do CPC); a aplicação do prazo de dilação significa apenas que por força dessa estipulação, o início da contagem do prazo para a prática de ato processual se projeta para momento posterior – o prazo de dilação configura um prazo dilatório (art. 139º, nº2 do CPC) –, associado à primeira intervenção no processo, contando-se ambos como se fossem um só (art. 142º do CPC). Como se referiu no acórdão do STJ de 06-12-1995, a propósito do prazo de dilação e ainda que noutro contexto, “essa figura processual é própria do processo civil, onde, aliás, a respectiva matriz erige em figura excepcional ligada ao prazo de defesa do citando, só por arrastamento se podendo estender a outras situações” [ [22] ] [ [23] ]. Ora, no caso, o apelante já havia sido notificado anteriormente para os termos do procedimento, no seu início, reconhecendo aliás, expressamente, aquando da apresentação da impugnação judicial, a sua falta de cuidado na perceção dessa (primeira) comunicação. Concretizando, foi enviada ao apelante carta registada com A/R, que este recebeu em 25-10-2017, dando-lhe conhecimento da instauração do procedimento administrativo e respetivo fundamento – entre outros elementos – e “para comunicar a este serviço a existência de activo e passivo da sociedade e dizerem o que se lhes oferecer, querendo, e apresentando os respectivos meios de prova. Dispõem ainda do prazo de 30 dias a contar desta notificação, para regularizar ou para demonstrar que já se encontra regularizada a situação” – cfr. os números 8, 9 e 10, dos factos provados, tendo por referência essa notificação e os arts. 7º, 9º, 12º e 13º do requerimento de impugnação judicial [ [24] ] [ [25] ]. Atente-se, ainda, no conteúdo da publicação da decisão do conservador, efetuada em 17-07-2017, e que resulta de fls. 62 e 63: “Notificação: Aos credores, entidade comercial, sócios e gerentes: Pelo presente aviso, e em cumprimento do disposto no número 4 e 5 e 7 do artigo 8º do RJPADLEC e nº1 do artigo 167º do Código das Sociedades Comerciais ficam notificados os credores, a sociedade supra identificada, bem como os sócios e gerentes, de que teve início o procedimento administrativo de dissolução, pelo facto de, durante dois anos consecutivos, a sociedade não proceder ao registo da prestação e contas, nos termos do disposto na alínea a) do artigo 5º do RJPADLEX, procedimento que corre termos sob o nº 2357/2017, encontrando-se os documentos disponíveis para consulta nesta Conservatória. (…) Ficam notificados os sócios, gerentes e sociedade de que dispõem do prazo de dez dias a contar desta notificação para comunicar a este serviço a existência de activo e passivo da sociedade e dizerem o que se lhes oferecer, querendo, e apresentando os respectivos meios de prova. Dispõem ainda do prazo de 30 dias, a contar desta notificação, para regularizar ou para demonstrar que já se encontra regularizada a situação. Constitui igualmente aviso que se resultar dos elementos do processo a inexistência de activo e passivo, ou se não for comunicado no prazo estipulado a sua existência, a Conservatória declara simultaneamente a dissolução e o encerramento da liquidação; se dos elementos do processo a existência de activo e passivo a liquidar, depois da dissolução segue a liquidação sem qualquer outra notificação”. Estamos perante ato que convoca a sociedade, os sócios e o gerente para os termos do processo, intimando-os a intervirem no procedimento em curso, incluindo o oferecimento de “prova”, ou seja, em síntese, com vista a que se pronunciem e apresentem a sua defesa, em face da imputação enunciada no auto de notícia, configurando em substancia, ato equivalente à “citação”. Para além da faculdade de impugnação judicial, ficou também por esta via, ab inicio, ainda na fase do procedimento administrativo que se desenrola na conservatória, assegurado o direito de defesa e participação da sociedade visada e dos interessados, afigurando-se-nos, pois, que, no caso concreto, ficou salvaguardado o princípio do contraditório, não se limitando a notificação do apelante à fixação de prazo para a regularização da atuação. Ou seja, a notificação em causa teve uma amplitude significativa, excedendo, em larga medida, o conteúdo (mínimo) previsto na lei e a que supra se fez referência, impondo-se concluir que, nessa fase, foi perfeitamente assegurada a defesa do apelante. Retomando o que já se referiu, entendemos que a notificação para concessão de prazo ao interessado “para a regularização da situação ou para a demonstração de que a regularização já se mostra efectuada” (art. 9º, nº1, alínea b), tem como pressuposto que o interessado possa, a esse propósito, dizer o que tiver por pertinente quanto à verificação das circunstâncias que são pressupostos do início do procedimento, só assim se dando cumprimento à exigência de que o processo jurisdicional seja um due process of law. Assim sendo, ultrapassada a fase inicial do procedimento respetivo, cumpridas que foram todas as exigências legais relativas à convocação para os termos do procedimento, nomeadamente as comunicações dirigidas aos sócios, entre os quais o apelante, sócio gerente, não tem cabimento a pretensão do apelante, no sentido de aplicar a figura da dilação ao prazo que a lei lhe confere para impugnar judicialmente a decisão do conservador, na sequência de notificação dessa decisão. No máximo, podia questionar-se, em tese, a exigência de dilação aquando da primeira notificação, na fase inicial do procedimento, tendo em vista a apresentação da resposta da sociedade e/ou dos sócios. Em suma, mesmo que se aceitasse, como o apelante pretende, por economia de raciocínio, que a notificação da decisão proferida pelo conservador do registo comercial se concretizou apenas em 22-02-2018, tendo a impugnação judicial sido apresentada em 14-03-2018, foi – o de forma extemporânea, pois nessa data já se mostrava ultrapassado o prazo de 10 dias a que alude o art. 12º. Assim sendo, pelas razões apontadas, conclui-se, como a primeira instância, que é extemporânea a ação de impugnação judicial apresentada. 3. Em consequência do exposto, entendemos que se mostra prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas pelo apelante, incluindo a impugnação do julgamento de facto formulada pelo apelante. A propósito dessa impugnação, na parte relevante, já se aludiu a essa matéria, como decorre do que se expôs, aceitando-se linearmente a invocação do apelante. No mais, a impugnação prende-se com a afirmação, que o apelante pretende ver aditada à factualidade assente, a saber, que “a sociedade dos autos tem património” (sic). Compulsando a decisão proferida pela primeira instância verifica-se que o tribunal, depois de concluir que o prazo para instauração de impugnação judicial “estava expirado”, ainda assim apreciou dos demais fundamentos invocados pelo apelante fazendo-o, manifestamente, a título subsidiário [ [26] ], mas sem justificação, em nosso entender. Efetivamente, concluindo-se que a impugnação judicial foi apresentada tardiamente, sendo, pois, extemporânea, não tem cabimento apreciar das questões (de fundo) apresentadas pelo apelante, sendo que essas questões se resumem ao seguinte: - Saber se se justifica a dissolução, porquanto, segundo alega o apelante, a sociedade continua a exercer a sua atividade e está regularizada a situação alusiva à prestação de contas, ainda que em momento posterior à decisão do conservador; - Saber se o conservador, na tramitação do processo, omitiu o dever de “indagar sobre a eventual existência de ativo ou passivo”, tendo a sociedade património. Concordando-se com a apreciação feita pela primeira instância quanto à questão da (in)tempestividade da ação de impugnação judicial, não pode esta Relação, naturalmente, manter a parte dispositiva da decisão recorrida, proferida pela primeira instância, na parte em que se conclui pela improcedência do recurso, juízo que envolve uma análise do mérito da decisão do conservador, análise que não podia/devia ter sido feita, pelas razões apontadas. Em suma, impõe-se, nessa estrita medida, alterar os termos da sentença recorrida, na sua parte dispositiva, sem que daí resulte, obviamente, qualquer ganho de causa do apelante uma vez que se mantém na ordem jurídica a decisão proferida pelo conservador; trata-se, apenas, de reformular a parte dispositiva da sentença recorrida, em face do juízo de prejudicialidade aqui feito. * Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo-se a sentença recorrida, que considerou extemporânea a ação de impugnação judicial apresentada pelo sócio apelante, incidindo sobre a decisão proferida pelo conservador do registo comercial proferida em 01-02-2018. Custas pelo apelante. Notifique. Lisboa, Isabel Fonseca Maria Adelaide Domingos Ana Isabel Pessoa [1] O diploma entrou em vigor em 30 de junho de 2006. [2] Com várias alterações, sendo a última introduzida pelo Decreto-Lei no 250/2012, de 23 de novembro. [3] Pelo mesmo documento constata-se que foram, posteriormente à prolação da decisão do conservador, feitos os registos alusivos aos exercícios de 2011 a 2016, inclusive (em 02-03-2018, 05-03-2018 e 09-03-2018). [4] Quanto ao registo da prestação de contas, cfr. o art. 42º do Cód. do Registo Comercial. [5] F. Cassiano Santos interpreta os arts. 143 do CSC e 5º, nº1 do referido Regime, quanto às sociedades comerciais, do seguinte modo: “1º) as circunstâncias aí enumeradas são pressupostos do início oficioso do procedimento e não causas de dissolução; 2º) só não é assim para o caso da alínea d) do nº1 do art. 5º(por força do nº4 do art. 533): nesse caso, pressuposto e causa são coincidentes” (março de 2007 Dissolução e Liquidação Administrativas de Sociedades in Reformas do Código das Sociedades, IDET, nº3, Coimbra: Almedina, p. 155). [6] Nos termos do art. 6º (“[a]plicação no tempo), nº2 do referido Dec. Lei “[a] redação introduzida pelo presente diploma ao artigo 48.º do Código do Registo Comercial, à alínea a) do artigo 5.º e ao artigo 15.º do regime jurídico dos procedimentos administrativos de dissolução e de liquidação de entidades comerciais é aplicável apenas ao incumprimento do registo da prestação de contas dos exercícios económicos a partir de 2012. E, nos termos do seu nº3, “[a] redação introduzida pelo presente diploma ao artigo 5.º do regime jurídico dos procedimentos administrativos de dissolução e de liquidação de entidades comerciais, quanto à nova alínea j), aplica-se às entidades relativamente às quais, à data de entrada em vigor do presente diploma, já tenha sido comunicado à conservatória do registo comercial privativa a caducidade ou revogação da respetiva licença”. [7] Artigo 9.º Especificidades da notificação, participação dos interessados e solicitação de informações em procedimento oficioso 1 - Quando o procedimento seja instaurado oficiosamente, a notificação deve conter os elementos referidos no n.º 2 do artigo 8.º, excepto o que consta da alínea c), e ainda os seguintes: a) Solicitação da apresentação de documentos que se mostrem úteis para a decisão; b) Concessão de um prazo de 30 dias, a contar da notificação, para a regularização da situação ou para a demonstração de que a regularização já se encontra efectuada; c) Aviso de que, se dos elementos do processo resultar a inexistência de activo e passivo a liquidar ou se os notificados não comunicarem ao serviço de registo competente o activo e o passivo da entidade comercial, o conservador declara simultaneamente a dissolução e o encerramento da liquidação da entidade comercial; d) Advertência de que, se dos elementos do processo resultar a existência de activo e passivo a liquidar, após a declaração da dissolução da entidade comercial pelo conservador, se segue o procedimento administrativo de liquidação, sem que ocorra qualquer outra notificação. 2 - O prazo referido na alínea b) do número anterior pode ser prorrogado até 90 dias, a pedido dos interessados. 3 - Devem ser solicitadas à Inspecção-Geral do Trabalho e aos serviços competentes da segurança social informações sobre eventuais registos de trabalhadores da entidade comercial nos dois anos anteriores à instauração do procedimento. 4 - No caso de a entidade comercial ter trabalhadores registados, a sua identificação e residência devem ser comunicadas ao serviço de registo competente no prazo de 10 dias a contar da solicitação referida no número anterior, para notificação de que o procedimento teve início, nos termos dos n.os 4 a 6 e 8 do artigo 8.º 5 - Na falta de resposta da Inspecção-Geral do Trabalho e dos serviços competentes da segurança social no prazo referido no número anterior pode o procedimento administrativo de dissolução prosseguir e vir a ser decidido sem essa resposta. 6 - A notificação aos trabalhadores da entidade comercial prevista no n.º 5, bem como, consoante os casos, aos credores da entidade comercial e aos credores de sócios e cooperadores de responsabilidade ilimitada, deve conter: a) Os elementos referidos no n.º 7 do artigo anterior; b) O aviso e a advertência a que se referem as alíneas c) e d) do n.º 1; c) A informação de que a comunicação da existência de créditos e direitos que detenham sobre a entidade comercial em causa, bem como da existência de bens e direitos de que esta seja titular, determina a sua responsabilidade pelo pagamento dos encargos com os liquidatários e peritos nomeados pelo conservador, sem prejuízo da aplicação do disposto no n.º 6 do artigo 4.º [8] F. Cassiano dos Santos, obr. cit. p. 150, alude a alguns aspetos do procedimento referindo que “o procedimento não oficioso prevê o contraditório (no oficioso, apenas é dado prazo para regularização da situação”, afirmação que, assim feita, de forma genérica, não podemos acompanhar. Entendemos que, no procedimento oficioso, o contraditório é exercido em face do auto de notícia e das circunstâncias aí concretamente enunciadas pelo conservador como justificando o início oficioso do procedimento com vista à dissolução da sociedade, parecendo-nos que a audição da sociedade e dos sócios não tem obrigatoriamente que estar limitada à indicação de prazo para a regularização da situação, pese embora o art. 9º, nº1 exclua “o que consta da alínea c) do nº 2 do art. 8º. No caso em apreço, como adiante se verá, a citação teve uma amplitude muito mais vasta. [9] Lê-se no preâmbulo do diploma que aprovou este regime: “Em 3.º lugar, o presente decreto-lei aborda a matéria da dissolução de entidades comerciais, incluindo sociedades comerciais, cooperativas e estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada. Por um lado, é criada uma modalidade de «dissolução e liquidação na hora» para as sociedades comerciais, assim se permitindo que se extingam e liquidem imediatamente, num atendimento presencial único, nas conservatórias de registo comercial, quando determinados pressupostos se verifiquem. Por outro lado, adopta-se uma modalidade de dissolução e liquidação administrativa e oficiosa de entidades comerciais, por iniciativa do Estado, quando existam indicadores objectivos de que a entidade em causa já não tem actividade embora permaneça juridicamente existente. Esta medida é especialmente relevante tendo em conta o elevado número de sociedades comerciais criadas sem actividade efectiva na economia nacional, pois estima-se que existam dezenas, senão centenas, de milhar de empresas a estar nessas circunstâncias. E essa relevância cresce tendo em conta que um número substancial dessas empresas está nessas condições por estas não terem elevado o seu capital social de 400000$00 para 1000000$00 quando a isso passaram a estar obrigadas. O procedimento administrativo que agora se estabelece evita que todas essas situações, que podem ser dezenas de milhar, originem um processo judicial para cada uma delas, pois atribui a competência para a dissolução e liquidação às conservatórias, sempre com garantia do direito de impugnação judicial. Finalmente, acolhe-se igualmente um procedimento administrativo da competência da conservatória para os casos legais de dissolução e liquidação de entidades comerciais, a requerimento de sócios e credores da entidade comercial”. [10] “O direito à tutela jurisdicional implica o direito de acesso aos tribunais – órgãos independentes e imparciais – “no sentido do direito subjectivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional” (Ac. nº363/04)” (2010 Jorge Miranda e Rui Medeiros. Constituição Portuguesa Anotada Coimbra: Almedina, Tomo I, p.433, 2ª edição). [11] O tribunal de primeira instância não cuidou de juntar ao processo cópia dos arestos que citou, como se impunha, uma vez que os mesmos não se mostram publicados, pelo menos no site do Ministério da Justiça; nesta Relação acedeu-se à decisão singular proferida em 26-04-2016 – e não acórdão –, no processo 2426/15.6T8LSB.L1 (Relator: José Ramos de Sousa), decisão que, afigura-se-nos, não tem qualquer relevância para o presente processo; quanto ao outro aresto indicado, com a identificação apontada, não se logrou localizar o mesmo. [12] Nos termos do artº 128.º, nº2 da Lei da Organização do Sistema Judiciário (Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto), compete aos juízos de comércio julgar as impugnações dos despachos dos conservadores do registo comercial, bem como as impugnações das decisões proferidas pelos conservadores no âmbito dos procedimentos administrativos de dissolução e de liquidação de sociedades comerciais. [13] Sobre a questão, inquirindo se “em face de uma dúvida interpretativa ou de uma lacuna legal, se aplicarão ou os princípios e, subsidiariamente, as normas do CPC ex vi 463º/1CPC, ou os princípios e, subsidiariamente, as normas do CPA” (p. 1383), cfr. Paula Costa e Silva /Rui Pinto, Dissolução e Liquidação Administrativas, regime jurídico dos procedimentos administrativos de dissolução e de liquidação de entidades comerciais, in Código das Sociedades Comerciais anotado, coordenação de António Meneses Cordeiro, 2011, pp.1381 a 1443. Cfr. os “[a]spectos conclusivos” enunciados na p. 1388 e a anotação ao art. 11º (pp.1416-1417) [14] Nos termos do art. 1º do Cód. do Registo Comercial (“[f]ins do registo”), o registo comercial destina-se a dar publicidade à situação jurídica dos comerciantes individuais, das sociedades comerciais, das sociedades civis sob forma comercial e dos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada, tendo em vista a segurança do comércio jurídico – nº1. Nos termos do art. 3º, nº1, estão sujeitos a registo, nomeadamente, os seguintes factos relativos às sociedades comerciais e sociedades civis sob forma comercial: a constituição (alínea a), a prestação de contas das sociedades anónimas, por quotas e em comandita por ações, bem como das sociedades em nome coletivo e em comandita simples quando houver lugar a depósito, e de contas consolidadas de sociedades obrigadas a prestá-las (alínea n), a prorrogação, fusão interna ou transfronteiriça, cisão, transformação e dissolução das sociedades, bem como o aumento, redução ou reintegração do capital social e qualquer outra alteração ao contrato de sociedade (alínea r) e o encerramento da liquidação ou o regresso à atividade da sociedade (alínea t). [15] Artigo 101.º Admissibilidade e prazo 1 - A decisão de recusa da prática do acto de registo nos termos requeridos pode ser impugnada mediante a interposição de recurso hierárquico para o director-geral dos Registos e do Notariado ou mediante impugnação judicial para o tribunal da área da circunscrição a que pertence a conservatória. 2 - O prazo para impugnar judicialmente a decisão referida no n.º 1 é de 30 dias a contar da notificação a que se refere o artigo 50.º [16] Artigo 101.º-A Interposição de recurso hierárquico e impugnação judicial 1 - O recurso hierárquico ou a impugnação judicial interpõem-se por meio de requerimento em que são expostos os seus fundamentos. 2 - A interposição de recurso hierárquico ou a impugnação judicial consideram-se feitas com a apresentação das respectivas petições na conservatória competente. [17] Artigo 101.º-B Tramitação subsequente 1 - Impugnada a decisão e independentemente da categoria funcional de quem tiver lavrado o despacho recorrido, este é submetido à apreciação do conservador, o qual deve proferir, no prazo de 10 dias, despacho a sustentar ou a reparar a decisão, dele notificando o recorrente. 2 - A notificação referida no número anterior deve ser acompanhada do envio ou entrega ao notificando de fotocópia dos documentos juntos ao processo. 3 - Sendo sustentada a decisão, o processo deve ser remetido à entidade competente, no prazo de cinco dias, instruído com fotocópia autenticada do despacho de qualificação do registo e dos documentos necessários à sua apreciação. 4 - A tramitação da impugnação judicial, incluindo a remessa dos elementos referidos no número anterior ao tribunal competente, é efectuada electronicamente, nos termos a definir por portaria do Ministro da Justiça. [18] Artigo 104.º Impugnação judicial subsequente a recurso hierárquico 1 - Tendo o recurso hierárquico sido julgado improcedente, o interessado pode ainda impugnar judicialmente a decisão de qualificação do acto de registo. 2 - A impugnação judicial é proposta mediante apresentação do requerimento na conservatória competente, no prazo de 20 dias a contar da data da notificação da decisão que tiver julgado improcedente o recurso hierárquico. 3 - O processo é remetido ao tribunal no prazo de cinco dias, instruído com o de recurso hierárquico. [19] Artigo 105.º Julgamento 1 - Recebido em juízo e independentemente de despacho, o processo vai com vista ao Ministério Público para emissão de parecer. 2 - O juiz que tenha intervindo no processo donde conste o acto cujo registo está em causa fica impedido de julgar a impugnação judicial. [20] Essa tem sido, cremos, a prática seguida pelas Conservatórias de Registo Comercial, considerando-se que o Código de Procedimento Adminstrativo não se aplica ao procedimento registal, como se dá nota, em alguns pareceres do Conselho Consultivo do Instituto dos Registos e do Notariado, ainda que por vezes a propósito de assuntos a latere do que ora se nos coloca; cfr., por exemplo, o parecer homologado em 18-12-2015, processo C.C. 23/2015 STJ-CC, acessível in www.irn.pt. [21] Cfr. os arts. 86º, 87º e 88º do CPA. [22] Acórdão n.º 2/96, processo n.º 46249 (Relator: José Sarmento da Silva Reis), que fixou a seguinte jurisprudência: “A disciplina autónoma do processo penal em matéria de prazos prescinde da figura da dilação, pelo que a abertura da instrução tem de ser requerida no prazo, peremptório, de cinco dias, previsto no n.º 1 do artigo 287.º do Código de Processo Penal” [23] “A dilação visa garantir a possibilidade de defesa efetiva e plena em tempo útil, nos casos em que a distância geográfica entre o tribunal da ação e o local da citação, ou a modalidade desta, tornam – ou podem tornar – insuficiente o prazo perentório. Trata-se de assegurar a integralidade do prazo da contestação (ou similar), tendo nomeadamente em conta que a recente generalização da citação postal e os novos mecanismos de citação com hora certa implicam a frequência muito maior da citação quase-pessoal” (2018, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre. Código de Processo Civil Anotado, Coimbra: Almedina, vol.1º, p. 492). [24] Depois de indicar, no art. 12º, que reside em Espanha e “nada compreende da língua portuguesa”, refere no art. 13º: “Assim, aquando da recepção da primeira notificação, não se apercebeu do teor da mesma nem consultou as publicações on line”. [25] Concorda-se inteiramente com o que a primeira instância aludiu, a esse propósito, a saber: “Quanto ao aventado desconhecimento da língua portuguesa pelo recorrente, crê-se não dever assumir relevância. É o próprio recorrente a assumir que por incúria sua não cumpriu a obrigação de registo de publicação de contas (que despoletou todo o procedimento), além de nada ter empreendido após ter recebido a primeira notificação, que confirma ter ocorrido. Donde, a inércia que assumidamente revelou quanto à resposta a dar a uma notificação, que diz não ter compreendido por estar redigida em língua portuguesa, é suficiente para apenas a si próprio imputar responsabilidade por não ter procurado quem lhe lograsse explicitar (disso carecendo) o teor dessa primeira notificação, aliás, como fez da segunda notificação, mais a mais quando figura como sócio e gerente da sociedade em causa nos autos há mais de 20 anos, exigindo-se-lhe, portanto, diligência suficiente para que adoptasse um comportamento activo, no sentido de acautelar os interesses dessa mesma sociedade e não postura de alheamento e desconsideração perante um documento oficial que, frise-se, assume ter recebido”. [26] Assim: “Ainda assim, sempre se diga, ao contrário do aventado pelo recorrente, termos por certo que a tramitação empreendida pela Conservatória do Registo Comercial de Lisboa observou todos os procedimentos devidos, como seja a consulta de informações por via electrónica sobre a existência de trabalhadores nos dois anos anteriores à instauração do procedimento (solicitado no seguimento da instauração do procedimento em 04.08.2017, a qual mereceu resposta negativa em 14.08.2017), sendo que o trabalhador mencionado pelo recorrente nas suas alegações só viu o seu vínculo comunicado em 18.10.2017 (conforme documento que o próprio junta - cfr. fls. 41), além do que, era à sociedade visada que incumbia a comunicação quanto ao activo e passivo (o que não fez), nem houve qualquer pedido de regularização (de nada relevando a regularização posterior da obrigação de prestação de contas - cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 07.06.2018, proc. 169/17.5T8EPS.G1, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21.02.2018, proc. 4317/17.7T8VNG.P1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt). A terminar, sempre se diga que, em relação à aventada existência de activo para partilhar, a extinção da sociedade não determina a extinção do património. Poderão ainda os interessados conformar o exercício dos seus direitos e titular a transmissão de posições mesmo por via extrajudicial, na esteira nomeadamente do consagrado pelo artigo 164°, do Código das Sociedades Comerciais (anotando-se, é certo, que todas as certidões relativas a prédios registados em nome da sociedade registam uma ou mais penhoras). Assim sendo, apenas resta concluir que, não havendo qualquer nulidade, anulabilidade ou irregularidade que inquine o presente procedimento, a impugnação contenciosa, necessariamente improcede, além do que, interposta findo o prazo de 10 (dez) dias contados da publicação da decisão final, é manifestamente extemporânea” (sublinhado nosso). |