Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
13766/17.0T8LSB.L1-6
Relator: ADEODATO BROTAS
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
CLÁUSULA DE EXCLUSIVIDADE
RECUSA
ÓNUS DE PROVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/03/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1–Num contrato de mediação imobiliária,celebrado com exclusividade,a remuneraçãoda mediadora não depende da celebração do contrato tido em vista, dependendo somente do cumprimento da obrigação assumida pela mediadora: encontrar pessoa genuinamente interessada e pronta a celebrar o negócio visado.

2–A esta luz, a recusapelo cliente, posteriormente à aceitação,de vender o imóvel é irrelevante para efeitos de o exonerar de pagar a remuneração: por haver exclusividade, cumprida a prestaçãopela mediadora, mantém-se intacto o direito à remuneração, na medida em que o negócio visado não se concretizou por causa imputável à ré.

3–Em matéria de repartição do ónus de prova, ao mediador compete demonstrar/provar ter conseguido a obtenção de um interessado, genuíno e pronto, que satisfaça o interesse do credor estabelecido no contrato e nos moldes em que foi concebido.
Enquanto ao cliente, para poder ficar eximido de ter de suportar a remuneraçãoacordada, terá de provarque o contrato não se concretizou em virtude de uma causa que não lhe é imputável.

(Sumário elaborado pelo Relator)

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam neste colectivo da 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:


I–RELATÓRIO


1–A Predial – Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda., instaurou acção declarativa, com processo comum, contra AF, Lda. (1.ª Ré), e B – Sociedade de Construções, Lda. (2.ª Ré), pedindo:
- A condenação das rés, como devedoras solidárias, a pagar à autora o valor de 177 120,00€, acrescido de juros de mora vincendos à taxa aplicável aos juros comerciais, até efectivo e integral pagamento.

Alegou, em síntese, a celebração com as rés de contrato de mediação imobiliária, em regime de exclusividade, o seu cumprimento do contrato com angariação de interessado na compra dos imóveis e o incumprimento, pelas rés, da obrigação de pagarem a remuneração acordada.

2- Citadas, as rés contestaram.
Alegaram, em síntese, a invalidade das cláusulas 4.ª e 5.ª do contrato de mediação imobiliária em causa, quer a anulação do mesmo por incapacidade acidental e notória do gerente das rés, JAA, com as legais consequências.

3-A ré respondeu às excepções pugnando pela respectiva improcedência.
Requereu a condenação das rés como litigantes de má-fé.

4-Foi realizado julgamento e, após vicissitudes várias, veio a ser proferida sentença, a 15/06/2021, com o seguinte teor decisório:
IV. Decisão
Atento o circunstancialismo factual assente e a fundamentação jurídica invocada, o Tribunal julga esta ação totalmente procedente, por provada na sua essencialidade, e a matéria excetiva totalmente improcedente, por não provada; em consequência, condena ambas as Rés, solidariamente, a pagarem à Autora o montante de € 177 120,00 (cento e setenta e sete mil e cento e vinte euros), acrescido de juros de mora vincendos à taxa aplicável aos juros comerciais, calculados desde a citação até efetivo e integral pagamento.
E pronuncia-se, ainda, sobre a inexistência de má-fé em juízo, por parte das Rés, absolvendo-as desse pedido de condenação formulado pela Autora.

5–Inconformadas, as rés interpuseram o presente recurso, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:
A)–Vem o presente recurso de Apelação interposto da Mui Douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, que decidiu sobre o mérito da causa, com a consequente condenação de ambas as Rés, solidariamente, a pagarem à Autora o montante de 177.120,00 Euros (Cento e Setenta e Sete Mil Cento e Vinte Euros), acrescido de juros de mora vincendos à taxa aplicável aos juros comerciais, calculados desde a citação até efectivo e integral pagamento, o qual tem assim por objecto, para além da reapreciação da prova produzida, a apreciação das seguintes questões:
i)-Se a Autora logrou demonstrar os factos concretos constitutivos do seu direito de crédito invocado, em relação a ambas as Rés (cfr. artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil);
ii)-Se os contratos subjacentes aos presentes autos são anuláveis por incapacidade do legal representante das Rés, JAA, ainda que por incapacidade acidental do referido gerente quando os negociou/subscreveu (cfr. artigo 257.º do Código Civil);
iii)-Se há lugar à exclusão de determinadas cláusulas do contrato celebrado em 20 de Abril de 2016, por violação dos deveres de informação/esclarecimento por parte da Autora, o que passaria pela aplicação do regime jurídico resultante do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro (cláusulas contratuais gerais).
B)–Face à prova carreada e produzida nos autos, andou mal o Tribunal a quo ao considerar como provados os seguintes factos: 14 a 22, 24, 26, 27, 29, 31, 34, 35, 38, 39, 40, 42 a 46, da matéria dada como provada;
C)–Por outro lado, o Tribunal a quo deveria ter dado como provados os seguintes factos: I III, V, VII, VIII, IX, X, XI, XII e XIII, da matéria dada como não provada;
D)–Salvo o merecido respeito, o Tribunal a quo não ponderou toda a prova produzida nos autos para formar a sua convicção, tendo desconsiderado os depoimentos de algumas das testemunhas inquiridas e valorizado, sem o recurso a outro elemento probatório, as declarações de parte da Autora para dar alguma matéria de facto como provada;
E)–Verifica-se assim a desconformidade da decisão com a prova produzida nos autos, pelo que, a decisão de facto deve ser alterada em função dessa reapreciação, assim como, a consequente decisão de mérito;
F)–Quanto à matéria de facto do ponto 14 “Em meados de Outubro de 2015, as sociedades Rés contactaram a Autora, tendo-lhe manifestado o interesse em contratar os seus serviços de mediação imobiliária consistentes na identificação de interessados na aquisição conjunta dos dois prédios;” conforme resultou das declarações do próprio representante legal da Autora SM (gravação em suporte digital no ficheiro 20200220144445 _19328837_2871024, no dia 20/02/2020, com início às 15:30:00 horas) e do depoimento da testemunha LL (gravação em suporte digital ficheiro 20200219150532_19328837_2871024, no dia 19/02/2020, com início às 14:17:26), ficou apenas provado que a Autora contactou as Rés no sentido de lhes propor os seus serviços de mediação;
G)–Quanto aos factos “15. Após a celebração do contrato referido no ponto 11 supra, o gerente da Autora, de modo a obter informações acerca dos imóveis, reuniu, por diversas vezes, com o gerente das Rés, JAA, e com os arquitectos contratados pelas Rés, a fim de elaborar, apresentar e acompanhar junto da Câmara Municipal de Lisboa o projecto de operação urbanística conjunta para os prédios dos autos;” e “18. No início de Março de 2016, a Autora voltou a ser contactada pelas Rés, reiterando o seu interesse em vender os bens imóveis, e pediram àquela empresa que desenvolvesse esforços adicionais na procura de interessados na aquisição;”, que deveriam ter sido dados como não provados, a única testemunha relevante para o caso, ou seja o Senhor NM (gravação em suporte digital ficheiro 20200219164111 _ 19328837 _
2871024, no dia 19/02/2020, com início às 16:27:12 horas), trabalhador da Autora e amigo do representante legal da Autora, referiu que nunca esteve presente nas supostas reuniões entre o representante legal da Autora e os arquitectos, bem como que nunca conversou com o representante legal das Rés ou sequer que esteve presente nas negociações;
H)–Pelo exposto, o Tribunal a quo suportou-se sobretudo nas declarações de parte do representante legal da Autora para considerar os dois pontos referidos como provados, sendo que as declarações de parte, como meio probatório, requerem o auxílio de outros meios probatórios, sejam eles documentais ou testemunhais, para sustentar a prova de determinada factualidade, sobretudo quando esta aproveita a própria parte;
I)–Quanto à factualidade vertida nos pontos “20. A Autora voltou a reunir-se com os arquitectos indicados pelas Rés e solicitou aos mesmos informações actualizadas quanto ao estado do projecto apresentado na Câmara Municipal de Lisboa para os prédios urbanos;” e “21. Juntamente com os arquitectos, a Autora reuniu com os técnicos e responsáveis do departamento de urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa;” salvo o devido respeito, não ficou provado, quer através de prova testemunhal quer através da prova documental, que a Autora reuniu com os arquitectos ou técnicos e responsáveis do departamento de urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa para a discussão do projecto referente aos dois imóveis identificados nos autos, pois a testemunha MC (gravação em suporte digital ficheiro 20200219160150_19328837_2871024, no dia 19/02/2020, com início às 15:40:13 horas) limitou-se a referir que tinha várias reuniões na Câmara Municipal e que acompanhava outros projectos de outros clientes da Autora, e a testemunha LL com o representante legal da Autora (gravação em suporte digital ficheiro 20200220165800_19328837_2871024, no dia 20/02/2020, com início às 16:09:39 horas), também afirmou que não se recordava de qualquer reunião na Câmara, designadamente no que diz respeito ao projecto referente aos dois imóveis em questão;
J)–Ainda relativamente à referida matéria, as testemunhas MC e LL, em sede de depoimento, também não confirmaram que as comunicações electrónicas e anexos, juntas aos autos como documento n.º 12, 17, 25 e 26, diziam respeito aos imóveis da propriedade das Rés;
K)–Em relação aos factos “16. A Autora visitou os prédios e contactou diversos operadores imobiliários, tendo-lhes apresentado os referidos prédios urbanos e as condições do negócio de compra e venda propostas pelas Rés;”, “19. Em 18 de Março de 2016, a Autora publicitou os imóveis acima identificados no portal imobiliário “Casa Sapo”;”, “22. Ao longo de Março de 2016, com o intuito de obter interessados na aquisição dos prédios acima identificados, a Autora contactou directamente diversos investidores em prédios urbanos em Lisboa, publicitando a venda dos imóveis;” e “24. A Autora efectuou diligências com vista a obter todas as informações referentes à capacidade construtiva e comercial dos imóveis, bem como aos custos que o desenvolvimento do projecto apresentado teria junto da Câmara Municipal de Lisboa;”, também não ficou provado qual o trabalho de promoção efectivamente desenvolvido pela Autora, sendo que esta na petição inicial limitou-se a alegar de forma genérica que contactou investidores e os documentos n.º 10 e 11, juntos com a Petição Inicial, também não permitem fazer prova de que o único anúncio, gratuito e no portal Casa Sapo, em questão dizia respeito aos imóveis da propriedade das Rés, pela que a factualidade em causa deve ser dada como não provada;
L)–Como também alegado pela testemunha NM (gravação em suporte digital ficheiro 20200219164111_19328837_2871024, no dia 19/02/2020, com início às 16:27:12 horas), a Autora nunca entrou nos prédios em questão, pelo que nem terá visitado os mesmos com potenciais clientes;
M)–Conforme decorreu também do depoimento da referida testemunha NM, a Autora, pelo menos até à apresentação da proposta por parte da sociedade T – Arquitectos, Lda., para além de existirem ónus e encargos nos dois imóveis, não tinha todos os elementos necessários para apresentar um negócio fazendo uso da maior exactidão e clareza quanto às características, preço e condições de pagamento dos imóveis em causa, ou seja não estava em condições de desenvolver qualquer actividade de promoção e angariação de um interessado efectivo para a compra dos imóveis;
N)–Sendo que, a testemunha LL (gravação em suporte digital ficheiro 20200220165800_19328837_2871024, no dia 20/02/2020, com início às 16:09:39 horas) e o representante legal da Autora SM (gravação em suporte digital ficheiro 20200220144445 _19328837_2871024, no dia 20/02/2020, com início às 15:30:00 horas) confirmaram a existência de um contrato de arrendamento, bem como um ónus de inalienabilidade registado a favor do Município de Lisboa;
O)–A Autora, ora Recorrida, ao fazer constar dos contratos de mediação imobiliária que os imóveis se encontravam livres de ónus e encargos e ao não dar conhecimento dos mesmos aos potenciais compradores, actuou com ligeireza e incumpriu deveres essenciais da sua actividade, sendo que nos termos da lei, um mediador imobiliário não pode publicitar um imóvel sem ter todos os elementos necessários e confirmação da correcta e actual situação do imóvel em causa;
P)–Em relação à factualidade constante do ponto 26 “A Autora informou o gerente das Rés do referido no ponto 25 e inquiriu o mesmo acerca da possibilidade de renegociação das condições de venda constantes do contrato referido no ponto 11 supra;”, mais uma vez o Tribunal a quo apoiou-se exclusivamente nas declarações de parte do representante legal da Autora, sendo que não existe nos autos qualquer outro elemento que possa corroborar tal alegação, pelo que a mesma deve ser dada como não provada;
Q)–Relativamente aos factos dos pontos “27. Em abril de 2016, a Autora deu a conhecer os bens imóveis e o negócio de compra e venda pretendido pelas Rés à investidora T – Arquitectos, Lda., tendo o legal representante da Autora reunido, por diversas vezes, com os representantes desta sociedade, a fim de procederem à análise das características dos prédios, do estado do projeto junto da Câmara Municipal de Lisboa, bem com às condições do negócio de compra e venda;” e “29. Posteriormente, a Autora organizou uma reunião entre os representantes da T – Arquitectos, Lda., o legal representante da Autora e os arquitetos responsáveis pelo projeto das Rés junto da Câmara Municipal de Lisboa;”, também não ficou provado que a alegada interessada tinha conhecimento da existência de um contrato de arrendamento num dos andares dos imóveis em questão, do ónus de inalienabilidade registado a favor do Município de Lisboa, o qual continua registado, bem como do estado do projecto junto da Câmara;
R)–Sendo que, a testemunha MC (gravação em suporte digital ficheiro 20200219160150_19328837_2871024, no dia 19/02/2020, com início às 15:40:13 horas), uma das arquitectas responsáveis pelo referido projecto, referiu que não se recordava da reunião tida com os representantes da T – Arquitectos, Lda.;
S)–Quanto ao ponto 31 da matéria dada como assente, “31. A Autora solicitou os elementos referidos no ponto 30 às Rés e, depois, enviou os mesmos à investidora T – Arquitectos, Lda.;”, cumpre referir que das comunicações electrónicas juntas como documento n.º 25 e 26, não resulta que elementos foram enviados, nem a que prédios diziam respeito e as testemunhas MC e LL também não conseguiram confirmar de que elementos se tratava e a que projecto diziam respeito, pelo que a matéria em causa deve ser dada como não provada;
T)–Relativamente aos factos constantes dos pontos 34, 35 e 46, também andou mal o Tribunal a quo ao dar os mesmos como provados, sendo que nenhuma das testemunhas arroladas pela Autora esteve presente nas referidas reuniões e não existe qualquer prova documental ou correspondência escrita enviada por qualquer meio de onde se possa inferir a veracidade de tais factos;
U)–Sendo que, conforme consta do documento n.º 29, junto pela Autora, contrato de mediação refere que cabia às Rés o ónus de proceder à demolição dos prédios urbanos, contudo, como demonstrado nos autos, um dos prédios já tinha sido demolido e o outro encontrava-se ainda ocupado por um arrendatário e um ónus de alienabilidade registado a favor do Município de Lisboa, pelo que o contrato foi redigido com total violação do disposto da lei que regula a mediação imobiliária;
V)–E nem se pode admitir, como alegado pela Autora, nem tal ficou provado, que o gerente das Rés assumiu que trataria de libertar os imóveis dos ónus e encargos existentes, pois conforme resultou da prova testemunhal produzida, nomeadamente dos depoimentos dos arquitectos MC e LL, as questões referentes aos imóveis em causa eram sobretudo discutidas com o Senhor JH, o qual à data dos factos não era gerente das Rés, nem representava ou podia vincular as Rés;
W)–Conforme resultou também do depoimento da testemunha LD e das declarações de parte do Senhor JH, o Senhor JAA, durante o ano de 2016, já necessitava de ajuda para compreender o texto de uma simples revista e raramente deslocava-se às sedes das duas sociedades, pelo que dificilmente conseguiria compreender a força e implicações do disposto no referido contrato;
X)–Em relação aos factos dos pontos “38. (…) Proposta essa que o legal representante da Autora transmitiu ao gerente das Rés, JAA, no dia seguinte;” e “39. Tal proposta foi aceite pelo gerente das Rés nos termos que constam de fls. 44v;”, salvo o devido respeito por melhor opinião, a Autora também não logrou fazer prova que o gerente das Rés aceitou a proposta apresentada pela sociedade T - Arquitectos, Lda., pelo que os mesmos devem ser dados como não provados;
Y)–Quanto à matéria dos pontos 40, 42 e 43, “40. Nessa data de 22 de Abril de 2016, a Autora comunicou à T – Arquitectos, Lda., que a proposta pela mesma apresentada havia sido aceite pelas Rés e, no dia 27 de Abril de 2016, enviou à mencionada investidora a minuta relativa ao contrato-promessa de compra e venda;”, “42. Após análise da minuta do contrato-promessa, a T – Arquitectos, Lda., comunicou à Autora que concordava com o seu teor;” e “43. No mesmo dia, o gerente da Autora reuniu com o gerente das Rés, o qual declarou que concordava com o teor da minuta do contrato-promessa e solicitou que a mesma fosse enviada ao advogado das Rés;”, o Tribunal a quo voltou a suportar-se integralmente nas declarações de parte da Autora para dar a mesma como provada;
Z)–Conforme ficou demonstrado nos autos, o Senhor JAA raramente se deslocava para fora da sua residência e também não era possível falar com este através de telefone ou telemóvel, pois tinha dificuldades auditivas, pelo que competia ao Tribunal a quo, o qual dispunha de elementos no sentido contrário, apreciar de forma crítica a veracidade de tal declaração e sustentar a sua decisão noutros meios de prova;
AA)–Salvo o devido respeito por melhor opinião, não foi produzida qualquer prova que permita concluir que as Rés tinham dado o negócio por concluído, bem como dado instruções à Autora para elaborar um contrato promessa de compra e venda;
AB)–Mais, não obstante o conteúdo do documento n.º 31, no qual a T – Arquitectos, Lda. apresenta uma proposta de aquisição, o facto é que se desconhece por completo se esta sociedade tinha um interesse efectivo na compra, pois por um lado, resulta da prova produzida e confessado pela própria Autora, que os representantes nunca reuniram com o Senhor JAA ou com qualquer outro gerente das Rés, e, por outro lado, nunca se juntou aos autos a minuta do contrato promessa de compra e venda e nem a sociedade em questão foi ouvida no âmbito do presente processo;
AC)–Salvo o devido respeito, o facto de ter sido apresentada uma aparente proposta de 3.600.00,00 Euros, a qual coincidia com o valor mencionado no segunda contrato de mediação mobiliária, não deveria ser suficiente para o Tribunal a quo concluir que a Autora logrou fazer a prova da essencialidade dos factos constitutivos do direito invocado;
AD)–Resulta da matéria apurada que, até 02 de Maio de 2016, os termos e condições do suposto contrato promessa de compra e venda do imóvel, cujo conteúdo se desconhece, não estavam integralmente acordados, nem aceites pelas Rés, nomeadamente no que diz respeito ao preço de venda e assunção dos encargos com a demolição de um dos imóveis, pelo que o Tribunal a quo não poderia ter dado como provada a existência de consenso quanto ao clausulado integral do contrato em questão, sendo que não existe nenhum documento ou correspondência entre as partes sobre o mesmo;
AE)–Da mesma forma, também não resulta da prova produzida nos autos que o gerente das Rés, Senhor JAA, contactou a Autora no sentido de confirmar a assinatura do contrato promessa de compra e venda, pelo que a factualidade constante do ponto 44 e 45, ou seja “44. A Autora enviou a minuta do contrato-promessa de compra e venda para o advogado das Rés e a assinatura desse contrato foi marcada para o dia 29 de abril de 2016 (sexta-feira), no escritório das Rés;”, na parte em que se refere à marcação da assinatura do contrato, e “45. Nessa data, o gerente das Rés contactou a Autora e solicitou o agendamento da assinatura do dito contrato para o dia 2 de maio de 2016, o que foi aceite pela investidora;”, deveria ter sido dada como não provada;
AF)–Quanto à matéria constante dos pontos III, V, VII, VIII, IX, X, XI, XII e XIII, também andou mal o Tribunal a quo ao considerar a mesma como não provada;
AG)–Quanto à questão da capacidade do gerente das Rés para compreender o conteúdo e alcance dos vários contratos apresentados nos autos, para além de o Tribunal a quo ter indeferido a realização de perícia na pessoa de JAAl, resultou do depoimento das testemunhas LD, MC e LL que, durante o ano de 2016, o Senhor JAA raramente ia à sede das sociedades, bem como que não tratava dos assuntos relacionados com as mesmas, apresentado já sinais de debilidade;
AH)–Demais, no âmbito do processo de acompanhamento com o número 4240/17.5T8OER, pelo Juízo Local Cível de Lisboa - Juiz 3, foi dado como provado o seguinte:
2.-O Requerido apresenta marcada diminuição da acuidade auditiva, perturbação mnésica relevante, com particular defeito para a memória de curto prazo e limitação motora com alteração do equilíbrio e marcha de pequenos passos
3.-Encontra-se dependente na gestão da sua medicação e receituário;
4.-Não é capaz de se deslocar a consultas de forma autónoma nem de entender e cumprir prescrições que vierem a ser determinadas;
5.-O requerido padece de deterioração cognitiva ligeira/moderada;
6.-Não tem qualquer capacidade de crítica para as suas limitações cognitivas;
7.-O Requerido encontra-se usualmente alheado da realidade à sua volta.
(…)
10.-Nos últimos anos, o Requerido tem demonstrado alheamento da actividade das sociedades.
11.-Nos últimos dois anos, reuniu-se várias vezes com os outros Sócios, alienando-se das reuniões e sem manifestar a sua opinião sobre os assuntos em discussão;”
AI)–E não obstante o relatório pericial psiquiátrico realizado ao Senhor JAA, datado de 12 de Fevereiro de 2019, ter indicado como data provável de início da incapacidade o ano de 2017, o facto é que estaremos perante um processo degenerativo gradual, ou seja que surgiu ao longo do tempo e não no início de 2017, não se podendo excluir que a incapacidade tenha surgido anteriormente;
AJ)–Relativamente ao estado do Senhor JAA durante o ano de 2016, o Senhor JH (gravação em suporte digital ficheiro 20200226142655_19328837_2871024, no dia 26/02/2020, com início às 14:04:26 horas), também declarou que o Senhor JAA, durante o ano de 2016, encontrava-se bastante deprimido e abatido em virtude da doença oncológica da sua companheira, bem como que era este quem tratava dos assuntos do pai;
AK)–Pelo que, a referida matéria de facto ser dada como provada, tanto que no âmbito do próprio processo de interdição/acompanhamento apurou-se que existia uma efectiva necessidade de acompanhamento total do Senhor JAA, nomeadamente no que diz respeito ao exercício dos actos que cabem na função de gerente das sociedades comerciais em que tal função lhe estiver atribuída e para a realização de actos jurídicos que impliquem a alienação ou oneração de bens móveis ou imóveis;
AL)–Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo ao considerar que os proprietários vendedores ao assinarem um contrato de mediação vincularam-se automaticamente à outorga de um contrato promessa de compra e venda ou ao contrato de compra e venda, viola o disposto no artigo 19.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2013 de 8 de Fevereiro, o disposto na Directiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro, relativa aos serviços no mercado interno, transposta para a ordem jurídica interna pelo Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de Julho, bem como os artigos 342.º, n.º 1 e 762.º, n.º 1, do Código Civil, verificando-se uma errada interpretação das normas aplicáveis;
AM)–Ora, da prova produzida nos autos não podemos considerar como provado (i) a validade dos contratos de mediação imobiliária juntos aos autos; (ii) o cumprimento da obrigação de mediação imobiliária por parte da Autora e que (iii) o negócio visado não se concretizou por causa imputável às Rés;
AN)–Não obstante a existência do suposto regime de exclusividade, cabia à Autora demonstrar que o interessado na compra estava pronto a celebrar o negócio visado nos moldes concebido no âmbito do contrato de mediação e que o mesmo iria satisfazer os interesses da vendedora, sendo que nem sequer ficou demonstrado nos autos que a interessada tinha conhecimento dos ónus e encargos existentes sobre os imóveis, bem como se aceitava ou não os mesmos;
AO)–Conforme decorre da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro, competia à Autora certificar-se da correspondência entre as características do imóvel objecto do contrato de mediação e as fornecidas pelos clientes e comunicar imediatamente aos destinatários qualquer facto que possa pôr em causa a concretização do negócio visado, no entanto não foi demonstrado nos autos que o interessado na compra tinha conhecimento de tais ónus, nem o que teria sido decidido pelas partes no que diz respeito à resolução dos mesmos;
AP)–Mais, a Autora também não logrou fazer prova do cumprimento da sua actividade enquanto mediadora, a qual consistia na promoção dos bens imóveis, designadamente através da sua divulgação ou publicitação, pelo que o Tribunal a quo devia ter concluído que a Autora, enquanto mediadora imobiliária, não cumpriu a sua obrigação de mediação;
AQ)–Salvo o devido respeito, também decorre da matéria de facto provada que não pode ser imputada às ora Recorrentes a causa da não concretização do negócio pretendido pela Autora;
AR)–Como dispõe o artigo 232.º do Código Civil, o contrato não fica concluído enquanto as partes não houverem acordado em todas as cláusulas sobre as quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo, sendo que, resultou claro dos autos que as Recorrentes nunca negociaram, nem assinaram qualquer contrato promessa de compra e venda, pelo que não se encontram preenchidos os pressupostos de que depende a aquisição do direito à remuneração prevista no artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro;
AS)–Relativamente à matéria que deveria ter sido dada como não provada no que diz respeito ao envolvimento do Senhor JAA nas negociações da compra e venda dos dois imóveis, bem como a matéria que deveria ter sido dada como provada relativamente à sua incapacidade para compreender o alcance das obrigações assumidas nos dois contratos de mediação mobiliária e a venda dos imóveis, o Tribunal a quo deveria ter decidido que os contratos em questão eram anuláveis por incapacidade do legal representante das Rés;
AT)–Em todo o caso, face à prova produzida em sede de audiência de julgamento, deveria ter sido determinada a exclusão de determinadas cláusulas do contrato celebrado em 20 de Abril de 2016, nomeadamente no que diz respeito à exclusividade da Autora, por violação dos deveres de informação/esclarecimento por parte da Autora, conforme disposto no Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, pois nada permite concluir que a Autora reuniu ou contactou com o gerente das Rés antes da assinatura do referido contrato, bem como que houve uma efectiva negociação do contrato de mediação imobiliária.
Nestes termos e nos melhores do direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser revogada a douta decisão proferida pelo Tribunal a quo, substituindo-a por outra que julgue a presente acção improcedente, por não provada, e as Apelantes absolvidas dos pedidos deduzidos pela Recorrida.
***

6–A autora contra-alegou, formulando as seguintes CONCLUSÕES:
A.–Deve ser indeferido o pedido das RR. de atribuição do efeito suspensivo ao presente recurso de apelação, pois não estão preenchidos os requisitos do n.º 4 do artigo 647.º do C.P.C., isto é, “quando a execução da decisão lhe cause prejuízo considerável e se ofereça para prestar caução”;
B.–Com efeito, não se ofereceram para prestar caução, e não alegaram qualquer factualidade suscetível de integrar o conceito de prejuízo considerável;
C.–Não assiste razão às recorrentes, quando alegam terem sido incorretamente julgados os factos dados como provados nos pontos 14 a 22, 24, 26, 27, 29, 31, 34, 35, 38, 39, 40, 42 a 46, da sentença recorrida, nem tão pouco os pontos III, V, VII, VIII, IX, X, XI, XII e XIII da matéria considerada como não provada;
D.–Os referidos pontos considerados como provados foram corroborados pela prova documental e testemunhal produzida em audiência e devidamente analisada pelo Tribunal a quo, conforme supra exposto;
E.–No que toca ao ponto 14, o mesmo encontra-se corretamente julgado o que se pode retirar, inclusive, das declarações de parte de SM (no ficheiro digital 20200220144445 _19328837 _2871024.wma, entre os 04:00 e os 5:00 minutos) e do testemunho de MC (no ficheiro digital 20200219160150 _19328837 _2871024.wma, entre os 04:32 e 04:56 minutos e 05:33 e 06:03 minutos) e LL e (no ficheiro digital 20200219151748 _19328837 _2871024.wma entre os 05:36 e 06:02 minutos), que demonstraram que as RR. contactaram a A., manifestando interesse em contratar os seus serviços de mediação imobiliária sobre os imóveis em questão;
F.–Quanto aos pontos 15 e 16, ficou demonstrado o acervo de prova documental junta para a respetiva prova pela A., e que não foi, em qualquer momento, impugnado pelas RR., nomeadamente, os contratos de mediação imobiliária dos autos (fls. 42v, 43v, 87 e 88), a proposta de aquisição apresentada pela sociedade T- Arquitectos, Lda (fls. 44 e 44v), e os inúmeros e-mails (juntos como docs. 12 a 17, 19, 20, e 22 a 28 com a Petição Inicial) complementados pelas declarações de parte do gerente da A., SM, que enunciou o trajeto das diligências tidas, o seu reforço, bem como reuniões tidas na Câmara Municipal de Lisboa (entre os 18:49 a 20:45 minutos);
G.–No que toca aos pontos 16, 19, 22 e 24, estes foram demonstrados mediante junção aos autos de prova documental sobre a prestação de serviços de mediação imobiliária (remetendo-nos, aqui, para os documentos referidos em D), aos quais acrescem os Docs. 10, 11, 14 a 16, 18 a 28, e 30 a 31 juntos com a Petição Inicial) tendo ainda sido corroborados pelo depoimento da testemunha NM (sessão do dia 19/02/2020, ficheiro digital 20200219164111_19328837_2871024.wma, entre os 06:50 a 08:05 minutos, 08:55 e 09:48 minutos, 10:19 a 10:46 minutos) bem como resulta das declarações de parte do gerente da A., (entre os 18:49 e 20:44 minutos e 20:51 a 22:48 minutos) e ainda de LL aquando da sua acareação (ficheiro 20200219151748_19328837_2871024.wma, entre os 10:34 minutos e 11:26 minutos);
H.–Já os pontos 17, 21, e 25 resultam provados pela documentação junta aos autos (Docs. 13, 14 15, 23, 16, 17, 19, 30 e 31, juntos com a Petição Inicial) e que não foi impugnada pelas RR., tendo sido ainda confirmados em declarações de parte pelo gerente da A. SM, que explicou que não obteve qualquer proposta para aquisição dos imóveis pelo preço global de €3.800.000,00, mas tão só de €3.600.000,00 (entre os 20:51 a 22:48 minutos), bem como as diligências tidas a pedir informação sobre os imóveis, incluindo reuniões tidas na Câmara Municipal de Lisboa (entre os 19:23 a 20:44 e 1:14:38 a 1:15:49 minutos);
I.–Relativamente ao ponto 20, encontra-se provado pela via documental (nomeadamente o Docs. 13, que refere a reunião tida na Câmara Municipal acerca dos prédios dos autos, bem como os Docs. 15, 17, 23, 24, 25, 26 e 27 que são demonstrativos de trocas de comunicações entre a A., os arquitetos das RR., e interessados na aquisição dos prédios dos autos, com informações atualizadas sobre os prédios, todos juntos com a PI);
J.–Não se logra alcançar a impugnação feita pelas Recorrentes ao ponto 26, estando inclusive juntos aos autos não apenas o primeiro contrato de mediação imobiliária, assinado em 30 de Outubro de 2015, mas também um segundo contrato, resultante, precisamente, da renegociação das condições de venda, assinado em 20 de Abril de 2016;
K.–O depoimento da testemunha NM (ficheiro 20200219164111
_19328837_2871024.wma), corrobora o ponto 27 que as Recorrentes pretendem impugnar, de onde resultou que foram realizadas várias reuniões com a sociedade T – Arquitectos, Lda, (entre minutos 06:50 a 08:05 e minutos 10:19 a 10:46), bem como as declarações de parte de SM, de onde resultou a apresentação à interessada dos prédios dos autos, a explicação das suas características, a visita ao local com os representantes dos interessados, e as condições do negócio a propor, condicionada à demolição do segundo prédio dos autos (entre os 24:30 minutos e os 37:39 minutos), também a testemunha LL, já em sede de acareação, “recuperou a sua memória” e admitiu conhecer os representantes da T – Arquitectos, Lda e de ter reunido com estes e com o gerente da A., em relação aos prédios dos autos, objeto dos serviços de mediação imobiliária (gravação 20200220165800_19328837_2871024.wma, entre os 03:30 minutos e os 04:17 minutos), e por último esta factualidade é suportada pelos Docs. 13, 15, 17, 23, 24, 25, 26, 27, 30 e 31 todos juntos com a PI;
L.–Já o ponto 29 é corroborado pelas declarações de parte da A. (nos trechos entre os 19:25 e os 20:45 minutos, entre os 24:30 e os 25:29 minutos e entre os 27:19 e os 29:02 minutos), e pelo depoimento da testemunha LL (entre os 01:30 e os 03:19 minutos 03:30 e os 04:17 minutos da acareação);
M.–Quanto ao ponto 31, o Tribunal a quo julgou corretamente ao considerar como provado que a A. recebeu informação sobre os prédios dos autos dos arquitetos das RR., e depois remeteu-os para a T – Arquitectos, Lda, Lda, uma vez que tal resulta inequívoco dos Docs. 17, 22, 23, 24, 25, 26, 27 e 28 juntos à P.I.;
N.–Os pontos 34, 35 e 46 resultam provados das declarações de parte do A. (ficheiro 20200220144445_19328837_2871024.wma entre os 1h28:05 e 1h31:34 minutos);
O.–Toda a matéria referente aos pontos 36, 38 e 39 ficou demonstrada pelos Docs. 30, 31, e 32 juntos com a P.I., que não foram impugnados pelas ora Recorrentes, e que demonstram que a A. transmitiu à T – Arquitectos, Lda, interessada na aquisição dos prédios, as informações sobre o resultado das negociações e pediu que fosse apresentada uma proposta e o que foi, aliás, explicado pelo gerente da A. nas suas declarações de parte (ficheiro 20200220144445_19328837_2871024.wma entre os 47:31 e 48:33 minutos);
P.–Por último, os pontos 40, 42, 43, 44 e 45 resultam provados dos Docs. 30 a 33 juntos com a P.I., que não foram impugnados pelas RR., dos quais resulta, nomeadamente, a aceitação da proposta pelas RR., factos que também foram confirmados pelo gerente da A., nas suas declarações de parte, como podemos ouvir nas suas declarações de parte (ficheiro 20200220144445 19328837 _2871024.wma), nos trechos entre os 48:29 minutos e 52:31 minutos;
Q.–As RR. entendem ainda que deveriam ter sido dados como provados os pontos III, V, VII, VIII, IX, X, XI, XII e XIII da matéria considerada como não provada. Todavia, carecem de qualquer razão;
R.–O impugnado quanto aos pontos III, V, VII, VIII, IX, e XII dos factos não provados diz respeito, essencialmente, à alegação por parte das RR. que de que o gerente, JAA, estava numa situação de “incapacidade psíquica” permanente, ou incapacidade acidental, conforme o caso (pois alegam verificar-se ambas as situações);
S.–Para o efeito, indicaram como meios probatórios que supostamente determinariam uma decisão diversa da que foi proferida, o depoimento de LD (ficheiro 20200220143403 19328837_2871024.wma, com início às 13:43 horas), de MC 20200219160150_19328837_2871024.wma), e declarações de parte do gerente das RR., JH (gravadas no ficheiro 20200226142655_19328837_2871024.wma, com início às 14:04 horas);
T.–Tais meios probatórios não impõem uma decisão diversa da que foi proferida, pois LD confirmou não ter tido conhecimento direto dos factos dos autos, apenas tendo passado a namorar com JH e passado a viver na mesma casa de JAA em Outubro de 2016 (sendo que os factos dos autos dizem respeito aos anos de 2015 e primeiros meses de 2016), conforme podemos ouvir entre os minutos 03:36 e 03:54 da gravação do seu depoimento;
U.–MC, arquiteta contratada pelas RR., esclareceu de forma cabal e perentória que, à data dos factos dos autos, JAA estava perfeitamente lúcido e que era ele quem tomava as decisões em relação aos assuntos das RR., e não o seu filho, sendo também ele quem autorizava a prestação de informações sobre os prédios a mediadoras imobiliárias, como foi o caso da Autora, como podemos ouvir entre os minutos 21:27 e 22:07 e entre os minutos 37:52 e 38:12 da gravação do seu depoimento (ficheiro 20200219160150 19328837_2871024.wma);
V.–Já quanto às declarações de parte de JH (gravadas no ficheiro 20200226142655_19328837_2871024.wma, com início às 14:04 horas), o Tribunal a quo considerou que as mesmas mereceram pouca credibilidade, foram pouco rigorosas, contraditórias, e causadoras de estranheza, dada a “ausência de memória” de questões tão essenciais como a “intenção de venda dos prédios em apreço e, bem assim, o afirmado desconhecimento quanto à firma investidora interessada na compra dos bens; para além de outras incongruências por si manifestadas;
W.–Além do mais, se por um lado este gerente declarou que o seu pai, JAA não tinha capacidade para assinar os contratos de mediação imobiliária e aceitação da proposta dos autos, tal estava em total contradição com o que já havia alegado previamente, nomeadamente em assembleia geral das RR. no qual participou, no decurso de 2018, e declarou que o pai, pensava por si próprio e “pela própria cabeça” e “sabe o que faz”, tendo toda a capacidade para continuar a exercer a sua atividade de gerente das RR., conforme podemos ouvir entre os minutos 33:30 e 35:02 da gravação das suas declarações;
X.–Sendo que a capacidade do gerente, JAA, é evidenciada por vários outros factos demonstrados nos autos, nomeadamente a sua manutenção como gerente das sociedades até 2019 e sua participação direta nas assembleias gerais de 2017 e 2018, em que esteve presente e votou pessoalmente sobre os vários pontos da ordem de trabalhos (cfr. Docs. 36, 37, 38 e 39 juntos pela A. com o seu articulado de resposta às exceções, em 27 de Novembro de 2017);
Y.–Por fim, a questão da situação de incapacidade de JAA foi decidida, já, por sentença (transitada em julgado), de 2 de Fevereiro de 2019, em ação que correu os seus termos no Juízo Local Cível de Lisboa – Juiz 3 – sob o processo n.º 4240/17.5T8OER, que apenas foi intentada em Outubro de 2017;
Z.–As RR. ocultaram a existência dessa ação, da sentença proferida, bem como do relatório da perícia do INML realizada nesses autos, que apenas chegaram ao conhecimento do Tribunal nos presentes autos por requerimento da Autora, apresentado em 30/01/2020 (ref. Citius 25380674);
AA.–Esta sentença determinou que JAA “tem um diagnóstico de deterioração cognitiva ligeira/moderada que não traduzindo uma real incapacidade funcional compromete a sua autonomia em algumas áreas, (...) determinando-se que o início da incapacidade se situa no ano de 2017”, e não em data anterior, tendo o relatório pericial em que se fundamentou ditado que “A extensão das suas dificuldades, não traduzem no momento, do ponto de vista estritamente médico-legal, uma real incapacidade funcional – em termos cognitivos e intelectivos – que integre os pressupostos previstos para situações de interdição”;
BB.–Como tal, à data dos factos dos autos, em Outubro de 2015 e início de 2016, é evidente que JAA não se encontrava incapacitado de um ponto de vista psíquico, muito menos ao ponto de tal ser notório para terceiros, como foi alegado;
CC.–As. RR. também não fizeram qualquer prova quanto aos pontos X e XI dos factos não provados, ou quanto ao ponto XIII, sendo que em relação a este último a existência dos dois contratos de mediação imobiliária (um dos quais substituiu o anterior, com cláusulas alteradas em função da renegociação) demonstra claramente que não estamos perante cláusulas contratuais gerais, o que, aliás, foi também esclarecido pelo gerente da A., como podemos ouvir nas suas declarações de parte (ficheiro 20200220144445_19328837_2871024.wma), entre os minutos 07:24 e minutos 09:47 minutos, e minutos 42:03 a minutos 47:14;;
DD.–O Tribunal julgou bem o direito aplicável à factualidade provada nos autos, tendo considerado que o negócio dos autos não foi celebrado por causa imputável às próprias RR., que por motivos de índole interno, a que a A. é completamente alheia, recusou a celebração do negócio com a T – Arquitectos, Lda nos termos em que havia sido previamente “gizado pelo gerente, JAA”, que aceitou a proposta desta interessada na aquisição;
EE.–Ademais, julgou corretamente que não se verifica qualquer das exceções invocadas pelas RR. e que o contrato de mediação em vigor previa o regime da exclusividade, previsto no n.º 1 do artigo 19º da Lei 15/2013, pelo qual é devida a remuneração à mediadora, antes da conclusão e perfeição do negócio, quando o mesmo não se realize por motivos imputáveis à proprietária do imóvel.
FF.–Assim, tendo sido provada a atividade de mediação imobiliária da A., a angariação de interessado na aquisição dos prédios dos autos, a apresentação de proposta por estes e, como tal, o nexo de causalidade entre a atividade de mediadora e a proposta, bem como o regime de exclusividade previsto no contrato, o resultado só poderia ser um - condenar as RR. nos termos peticionados – o que fez;
GG.–Decisão que deve ser mantida na íntegra.
Termos em que, deve ser negado provimento ao recurso interposto pelas Rés e mantida na íntegra a decisão recorrida.
***

II–FUNDAMENTAÇÃO

1-Objecto do Recurso.

É sabido que o objecto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC) pelas conclusões (artºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 640º do CPC) pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (artº 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (artº 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida.

Assim, em face das conclusões apresentadas pelas recorrentes, são as seguintes as questões que importa analisar e decidir:
a)-A Impugnação da Matéria de Facto;
b)- A revogação da sentença.

Vejamos estas questões.

Previamente, importa ter presente a factualidade decidida pela 1ª instância.
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2-Factualidade Decidida Pela 1ª Instância.


É a seguinte a matéria de facto vinda do tribunal a quo:

1.– A Autora dedica-se à mediação de compra e venda de bens imóveis ou para a constituição de quaisquer direitos reais sobre os mesmos, para o seu arrendamento, bem como na prestação de serviços conexos, administração de imóveis por conta de outrem, atividades de consultoria para os negócios e a gestão, científicas, técnicas e similares, nomeadamente atividades combinadas de apoio aos edifícios;
2.– A Autora é titular da licença AMI n.º 1761, para a atividade de mediação imobiliária, emitida pelo Instituto da Construção e do Imobiliário (INCI);
3.– A Autora é titular da marca “Life I”, registada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial;
4.– A Autora tem como único gerente SM;
5.– As Rés dedicam-se à compra e venda e revenda de imóveis, urbanização de terrenos, construção civil e arrendamento de imóveis;
6.– Até 31 de agosto de 2017, foram gerentes da 1.ª Ré JAA, LAA e APA, a qual se obriga com a assinatura de um único gerente;
7.– Até 31 de agosto de 2017, foram gerentes da 2.ª Ré JAA e LAA, a qual se obriga com a assinatura de um gerente;
8.– A 1.ª Ré é a proprietária do prédio urbano sito na avª. B... B..., n.º …, em L____, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º … e inscrito na matriz predial urbana da freguesia das Avª. N... sob o artigo 7…
9.– A 2.ª Ré é a proprietária do prédio urbano sito na avª. B... B..., n.º…, em L_____, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º … inscrito na matriz predial urbana da freguesia das Avª. N... sob o artigo 8…;
10.– Os prédios urbanos identificados nos pontos 8 e 9 são contíguos;
11.– Encontra-se junto de fls. 87 a 88 documento subscrito pela Autora na qualidade de primeira outorgante e pelo gerente das Rés, JAA, intitulado “Contrato de Medição Imobiliária”, datado de 30 de outubro de 2015, cujo teor se dá por reproduzido e do qual consta:
“Cláusula 1ª (Identificação do Imóvel)
A Segunda Outorgante é proprietária e legítima possuidora dos prédios (…) sitos na Avª. B... B..., nºs … e … em L_____, (freguesia) Avª. N..., (concelho) L_____, descrito na Conservatória do Registo Predial de L_____ (…)”
Cláusula 2ª (Identificação do Negócio)
A Primeira Outorgante obriga-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra e venda dos imóveis acima descritos pelo preço de € 3.800.000 (Três Milhões e Oitocentos Mil Euros), sendo que qualquer alteração ao preço fixado deverá ser comunicada de imediato e por escrito à Primeira Outorgante.
(…)
Cláusula 4ª (Regime de Contratação)
A Segunda Outorgante contrata a Primeira Outorgante em regime de não exclusividade.
Cláusula 5ª (Remuneração)
1- A remuneração só será devida se a Primeira Outorgante conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato.
2- A remuneração do negócio previsto no presente contrato ocorrerá da seguinte forma:
2.1- A Segunda Outorgante obriga-se a pagar à primeira Outorgante a título de remuneração, a quantia de 3%, calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efectivamente concretizado, acrescida de IVA à taxa legal.
2.2- O pagamento da remuneração será efectuado no montante correspondente ao 50% na data de celebração do contrato-promessa, sendo o remanescente de 50% liquidado na data de celebração da escritura de compra e venda ou conclusão do negócio.
(…)”;
12.–Em 20 de abril de 2016, o gerente da Autora, SM, e o gerente das Rés, JAA, apuseram as respetivas assinaturas no documento cuja cópia consta de fls. 42v a 43v, intitulado “Contrato de Mediação Imobiliária”, cujo teor se dá por reproduzido e do qual consta:
“Cláusula 1ª (Identificação do Imóvel)
As Segundas Outorgantes são proprietárias e legítimas possuidoras dos prédios (…) sitos na Avª. B... B..., nºs … e … em L_____, freguesia das Avª. N..., descrito na Conservatória do Registo Predial de L_____ sob o nº … e nº … (…) e inscritos na matriz predial urbana com os artigos nº 7… e nº 8… da Freguesia de N... S... F..., respectivamente.
Cláusula 2ª (Identificação do Negócio)
1.–A Primeira Outorgante obriga-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra dos imóveis acima descritos, pelo preço global de € 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil euros), sendo que qualquer alteração ao preço fixado deverá ser comunicado de imediato e por escrito pelas Segundas Outorgantes à Primeira Outorgante.
2.–Os imóveis serão vendidos com o compromisso por parte das Segundas Outorgantes de que o preço global indicado no número anterior inclui a demolição dos prédios urbanos identificados na cláusula primeira, sem que existam encargos adicionais a imputar aos interessados por tal demolição.
Cláusula 3ª (Ónus e Encargos)
Os imóveis encontram-se livres de quaisquer ónus ou encargos.
Cláusula 4ª (Regime de Contratação)
1.- As Segundas Outorgantes contratam a Primeira Outorgante, sendo o Contrato de Mediação celebrado com um regime de exclusividade temporário, nos termos do número seguinte;
2.- Haverá exclusividade por um período de 15 dias a contar desde a celebração do presente contrato, considerando-se abrangidos pela exclusividade todos os interessados no negócio visado que tenham apresentado proposta dentro desse período, ainda que a conclusão perfeita do negócio, ou celebração do contrato-promessa, venha a ocorrer após aquele período;
3.- Nos termos do nº 2 do artigo 19º da Lei nº 15/2013, é devida à empresa mediadora a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário do bem imóvel.
(…);
Cláusula 5ª (Remuneração)
1.-A remuneração só será devida se a Primeira Outorgante conseguir interessado em concretizar o negócio visado pelo presente contrato, sem prejuízo do disposto nos números 1 a 3 da cláusula 4ª.
2.-A remuneração do negócio previsto no presente contrato ocorrerá da seguinte forma:
2.1- As Segundas Outorgantes obrigam-se a pagar à Primeira Outorgante a título de remuneração, a quantia de 4%, calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efectivamente concretizado, acrescida de IVA à taxa legal.
2.2- O pagamento da remuneração será efectuado no montante correspondente a 50% na data de celebração do contrato-promessa, sendo o remanescente de 50% liquidado na data de celebração da escritura de compra e venda ou conclusão do negócio.
(…)”;
13.– No dia 2 de maio de 2016, foi comunicado ao advogado das Rés e ao gerente da Autora que as sociedades Rés não pretendiam vincular-se ao negócio que havia sido gizado pelo gerente JAA;
14.–Em meados de outubro de 2015, as sociedades Rés contactaram a Autora, tendo-lhe manifestado o interesse em contratar os seus serviços de mediação imobiliária consistentes na identificação de interessados na aquisição conjunta dos dois prédios;
15.–Após a celebração do contrato referido no ponto 11 supra, o gerente da Autora, de modo a obter informações acerca dos imóveis, reuniu, por diversas vezes, com o gerente das Rés, JAA, e com os arquitetos contratados pelas Rés, a fim de elaborar, apresentar e acompanhar junto da Câmara Municipal de Lisboa o projeto de operação urbanística conjunta para os prédios dos autos;
16.–A Autora visitou os prédios e contactou diversos operadores imobiliários, tendo-lhes apresentado os referidos prédios urbanos e as condições do negócio de compra e venda propostas pelas Rés;
17.–A Autora não obteve qualquer proposta para aquisição dos imóveis pelo preço global de € 3 800 000,00;
18.–No início de março de 2016, a Autora voltou a ser contactada pelas Rés, reiterando o seu interesse em vender os bens imóveis, e pediram àquela empresa que desenvolvesse esforços adicionais na procura de interessados na aquisição;
19.–Em 18 de março de 2016, a Autora publicitou os imóveis acima identificados no portal imobiliário “Casa Sapo”;
20.–A Autora voltou a reunir-se com os arquitetos indicados pelas Rés e solicitou aos mesmos informações atualizadas quanto ao estado do projeto apresentado na Câmara Municipal de Lisboa para os prédios urbanos;
21.–Juntamente com os arquitetos, a Autora reuniu com os técnicos e responsáveis do departamento de urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa;
22.–Ao longo de março de 2016, com o intuito de obter interessados na aquisição dos prédios acima identificados, a Autora contactou diretamente diversos investidores em prédios urbanos em Lisboa, publicitando a venda dos imóveis;
23.–A Autora publicitou a venda junto da sociedade designada V… Homes, Lda., com a qual teve várias reuniões e trocou comunicações referentes aos imóveis;
24.–A Autora efetuou diligências com vista a obter todas as informações referentes à capacidade construtiva e comercial dos imóveis, bem como aos custos que o desenvolvimento do projeto apresentado teria junto da Câmara Municipal de Lisboa;
25.–A sociedade V…, Lda., a sociedade S… – Empreendimentos Imobiliários, S.A., e outros investidores contactados pela Autora, entenderam que o valor de € 3 800 000,00 para a aquisição dos dois prédios era demasiado elevado, apenas se disponibilizando para apresentar uma oferta máxima de € 3 600 000,00;
26.–A Autora informou o gerente das Rés do referido no ponto 25 e inquiriu o mesmo acerca da possibilidade de renegociação das condições de venda constantes do contrato referido no ponto 11 supra;
27.– Em abril de 2016, a Autora deu a conhecer os bens imóveis e o negócio de compra e venda pretendido pelas Rés à investidora T – Arquitectos, Lda., tendo o legal representante da Autora reunido, por diversas vezes, com os representantes desta sociedade, a fim de procederem à análise das características dos prédios, do estado do projeto junto da Câmara Municipal de Lisboa, bem com às condições do negócio de compra e venda;
28.–Na sequência dos contactos estabelecidos com a Autora, a T – Arquitectos, Lda., demonstrou interesse no negócio, tendo, no dia 8 de abril de 2016, o representante legal da Autora visitado os prédios juntamente com os representantes daquela sociedade investidora;
29.–Posteriormente, a Autora organizou uma reunião entre os representantes da T – Arquitectos, Lda., o legal representante da Autora e os arquitetos responsáveis pelo projeto das Rés junto da Câmara Municipal de Lisboa;
30.–Na sequência dessa reunião, os arquitetos responsáveis das Rés solicitaram à Autora o envio de documentos referentes ao projeto apresentado pelas Rés, bem como o envio dos ficheiros em formato dwg;
31.–A Autora solicitou os elementos referidos no ponto 30 às Rés e, depois, enviou os mesmos à investidora T  – Arquitectos, Lda.;
32.–Na sequência do aludido nos pontos 27 a 31 e do interesse manifestado pela T – Arquitectos, Lda., iniciou-se um período de negociações entre os dias 12 e 15 de abril de 2016, nas quais participou a Autora;
33.–A T – Arquitectos, Lda informou que estava disponível para apresentar uma proposta de aquisição dos imóveis, pelo preço máximo de € 3 600 000,00, na condição de a demolição do prédio correspondente ao n.º 67 ser efetuada a expensas das Rés;
34.–Na sequência do aludido no ponto 33, ocorreram duas reuniões entre a Autora e o gerente das Rés, o qual declarou que aceitava as condições ali referidas;
35.–Na reunião realizada no dia 16 de abril de 2016, foi acordada entre a Autora e o gerente das Rés, após negociação entre os mesmos, a redação final das cláusulas do contrato referido no ponto 12 supra;
36.–Em 20 de abril de 2016, a Autora comunicou à T – Arquitectos, Lda, o resultado das reuniões com as Rés e solicitou à mesma que apresentasse, querendo, a proposta de aquisição dos prédios;
37.–No dia 21 de abril de 2016, a T – Arquitectos, Lda, apresentou a proposta de aquisição dos imóveis nos termos constantes de fls. 44;
38.–(…) Proposta essa que o legal representante da Autora transmitiu ao gerente das Rés, JAA, no dia seguinte;
39.–Tal proposta foi aceite pelo gerente das Rés nos termos que constam de fls. 44v;
40.–Nessa data de 22 de abril de 2016, a Autora comunicou à T – Arquitectos, Lda., que a proposta pela mesma apresentada havia sido aceite pelas Rés e, no dia 27 de abril de 2016, enviou à mencionada investidora a minuta relativa ao contrato-promessa de compra e venda;
41.–Em 28 de abril de 2016, a pedido da T – Arquitectos, Lda, a Autora enviou a documentação respeitante aos imóveis e às Rés;
42.–Após análise da minuta do contrato-promessa, a T – Arquitectos, Lda, comunicou à Autora que concordava com o seu teor;
43.–No mesmo dia, o gerente da Autora reuniu com o gerente das Rés, o qual declarou que concordava com o teor da minuta do contrato-promessa e solicitou que a mesma fosse enviada ao advogado das Rés;
44.–A Autora enviou a minuta do contrato-promessa de compra e venda para o advogado das Rés e a assinatura desse contrato foi marcada para o dia 29 de abril de 2016 (sexta-feira), no escritório das Rés;
45.–Nessa data, o gerente das Rés contactou a Autora e solicitou o agendamento da assinatura do dito contrato para o dia 2 de maio de 2016, o que foi aceite pela investidora;
46.–O conteúdo das cláusulas do contrato referido no ponto 12 supra foi explicado ao gerente das Rés, JAA, em momento anterior à subscrição do contrato;
47.–O aludido gerente das Rés nasceu em 15 de novembro de 1931 e enviuvou por óbito da sua mulher (MPA), verificado em 21 de junho de 2016;
48.–Consta da parte conclusiva do relatório pericial psiquiátrico realizado a JAA, de 12 de fevereiro de 2019, do Instituto Nacional de Medicina Legal (cfr. fls. 196v e 197), que o mesmo “(…) tem o diagnóstico de deterioração cognitiva ligeira/moderada.
Embora com marcada diminuição da acuidade auditiva e dependente de terceiros para cuidar de si e prover algumas das suas mais básicas necessidades, consegue, aparentemente, processar minimamente a informação cognitiva à sua volta respondendo de forma adequada às situações.
A extensão das suas dificuldades, não traduzem no momento, do ponto de vista estritamente médico-legal, uma real incapacidade funcional – em termos cognitivos e intelectivos – que integre os pressupostos previstos para situações de interdição.
Todavia e por de facto existirem deficits, importa salvaguardar os seus direitos, o seu acompanhamento próximo e supervisão, apoio e tratamentos necessários pelo que integra pressupostos médico-legais de situação de inabilitação, devendo ser nomeado curador, que dele cuide e auxilie em tarefas de decisão ou aspetos em que tenha reconhecidas dificuldades.
Como medida de tratamento propõe-se que mantenha seguimento regular pelo médico de medicina Geral e Familiar, cumprindo as prescrições que aí vierem a ser determinadas.
Compilada a informação disponibilizada, e na ausência de qualquer outra, face ao diagnóstico estabelecido, propõe-se como data provável de início da incapacidade o ano de 2017”;
49.–Por sentença proferida em 2 de dezembro de 2019, pelo Juízo Local Cível de Lisboa (Juiz 3), já transitada em julgado, foi determinado o seu acompanhamento segundo o regime de 1) representação especial: (i) para os atos necessários ao exercício da função de cabeça de casal da herança da sua falecida esposa; (ii) para representação geral em processos judiciais, com poderes para substabelecer em profissional forense; (iii) para o exercício dos atos que cabem na função de gerente das sociedades comerciais em que tal função lhe estiver atribuída; (iv) para a realização de atos jurídicos que impliquem a alienação ou oneração de bens móveis ou imóveis; 2) intervenções de apoio e auxílio em cuidados pessoais e de saúde, bem como no cumprimento de prescrições médicas que vierem a ser determinadas; 3) administração total de bens;
50.–Foi declarado na sentença que o acompanhamento (a rever no prazo de cinco anos) se tornou necessário desde o início do ano de 2017;
51.–Foram, ainda, nomeados como acompanhantes os filhos de JAA, a saber, AAA e JH, ficando cometido à primeira o exercício das medidas aludidas em 1) e 3) e ao segundo, o apoio e auxílio mencionados em 2); substituindo cada um o outro nos seus impedimentos;
52.–JAA faleceu no dia 14 de janeiro de 2021, com 89 anos de idade.

Com relevo para a decisão da causa, os factos que o Tribunal considera como não provados são os seguintes:
I.–O gerente das Rés, JAA, declarou à Autora que as duas outras gerentes (das Rés) tinham conhecimento dos termos do negócio de compra e venda e concordavam com os mesmos;
II.–O envio da minuta – comprovado no ponto 44 supra – ocorreu após o referido no ponto I não provado;
III.–Desde há vários anos que o dito gerente das Rés está completamente ausente da gestão das empresas e raramente se desloca à sua sede;
IV.–E, para além do referido no ponto III, ele apenas sai de casa para consultas médicas;
V.–Desde há vários anos que o mesmo não acompanhava o mercado imobiliário, nem os preços que se praticavam;
VI.–Esse gerente das Rés continua a exprimir-se em escudos e ignora a taxa de conversão escudo/euro;
VII.–Desde há vários anos que tal gerente das Rés está permanentemente alheado do que se passa em seu redor, não acompanhando qualquer conversa ou negociação;
VIII.–O mesmo não tinha capacidade para saber o valor de mercado dos prédios, bem como os encargos que implicava a extinção do ónus de arrendamento incidente sobre o rés do chão do n.º …da avª. B... B..., em L____, bem como os custos da demolição do prédio;
IX.–O mesmo gerente desconhecia a situação do projeto de construção apresentado na Câmara Municipal de Lisboa;
X.–Entre os meses de abril e maio de 2016, a companheira do gerente das aqui Rés, de há mais de 30 anos, encontrava-se em fase terminal por doença oncológica;
XI.–Em virtude do referido no ponto X e da preocupação daí adveniente, o gerente das Rés encontrava-se incapacitado para discernir os termos de qualquer negociação;
XII.–Tais factos – cfr. pontos X e XI – eram do conhecimento do gerente da Autora;
XIII.–As cláusulas constantes do documento referido no ponto 12 supra (provado) foram elaboradas pela Autora com o gerente das Rés, JAA, sem que tivesse havido qualquer negociação prévia dos termos das mesmas.
***

3–As Questões Enunciadas.

3.1- A Impugnação da Decisão Sobre a Matéria de Facto.

As rés/apelantes impugnam a decisão sobre a matéria de facto quanto aos pontos 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 24, 26, 27, 29, 31, 34, 35, 38, 39, 40, 42, 43, 44, 45 e 46 dos Factos Provados e, pontos III, V, VII, VIII, IX, X, XI, XII e XIII dos Factos Não Provados.

Vejamos cada um destes factos.

Ponto 14.
As rés pretendem seja alterada a redacção dada ao ponto 14 em termos de dela constar que “Em meados de Outubro de 2015, a Autora contactou as sociedades Rés, tendo-lhe manifestado o interesse em prestar os seus serviços de mediação imobiliária.”
Invocam, para fundarem a pretendida alteração a este ponto de facto, as declarações de parte do gerente da autora e o depoimento da testemunha LL.
Vejamos.

É a seguinte a redacção dada pela 1ª instância ao ponto 14 dos factos provados:
Em meados de outubro de 2015, as sociedades Rés contactaram a Autora, tendo-lhe manifestado o interesse em contratar os seus serviços de mediação imobiliária consistentes na identificação de interessados na aquisição conjunta dos dois prédios.”
A alteração que as rés pretendem na matéria de facto cinge-se a um simples aspecto: quem contactou quem. As rés defendem ter sido a autora a contactá-las; enquanto a 1ª instância, reproduzindo a alegação da autora na petição inicial, decidiu terem sido as rés quem contactou a autora com vista à contratação dos serviços de mediação imobiliária.
Pois bem, salvo o devido respeito, este facto é irrelevante para a solução das questões que se colocam nos autos que estão relacionadas com a celebração do contrato de mediação imobiliária com carácter de exclusividade, a respectiva (in)validade (por pretendida incapacidade acidental do representante das rés), ou a nulidade de certas cláusulas contratuais e, o cumprimento do contrato pela autora (encontrando interessado firme na compra e venda intermediada), aceitação desse interessado e respectiva proposta pelas rés e, posterior recusa de celebrar o contrato-promessa de compra e venda, com a consequente obrigação de pagar a remuneração contratualmente fixada.
Ora, saber quem contactou quem na aproximação das partes à celebração do contrato de mediação imobiliária é inócuo e irrelevante para a análise e decisão daquelas questões, visto que o ponto 14 dos factos provados não consubstancia um facto principal/essencial, ou complementar ou concretizador, ou sequer instrumental, da causa de pedir ou das excepções opostas.
Assim sendo, como vem sendo entendido pacificamente, se a pretendida reapreciação da matéria de facto se mostra irrelevante para a decisão das questões em discussão no recurso não deve ser objecto de reapreciação. Veja-se, v.g., o acórdão da Relação de Guimarães (de 11/07/2017, Maria João Matos) “…por força dos princípios da utilidade, economia e celeridade processual, o Tribunal ad quem não deve reapreciar a matéria de facto quando o(s) facto(s) concreto(s) objeto da impugnação for insuscetível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente”. Ver ainda o acórdão da Relação de Coimbra, de 27/01/2014 (Moreira do Carmo). Ou seja, se “por qualquer motivo, o facto a que se dirige aquela impugnação for, "segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito", irrelevante para a decisão a proferir, então torna-se inútil a atividade de reapreciar o julgamento da matéria de facto, pois, nesse caso, mesmo que, em conformidade com a pretensão do recorrente, se modifique o juízo anteriormente formulado, sempre o facto que agora se considerou provado ou não provado continua a ser juridicamente inócuo ou insuficiente. Quer isto dizer que não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objeto da impugnação não for suscetível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, antemão, ser inconsequente, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processual consagrados nos artigos 2.º n.º 1, 137.º e 138.º.” Ver ainda o acórdão da Relação de Coimbra, de 24/04/2012 (Beça Pereira) e o acórdão da mesma Relação, de 14/01/2014 (Henrique Antunes) e ainda o acórdão da Relação de Lisboa, de 26/09/2019 (Carlos Castelo Branco).
Assim, sem necessidade de outros considerandos, não se reaprecia a pretendida impugnação do ponto 14 dos factos provados.

Os Pontos 15 e 18.
As rés/apelantes pretendem que os pontos 15 e 18 dos factos provados sejam dados como não provados, argumentando que o tribunal baseou a sua convicção de dar esses factos como provados apenas nas declarações de parte do representante da autora, declarações essas que não podem considerar-se isentas. E que resulta dos depoimentos da testemunha NM que ele nunca esteve presente em qualquer reunião e, que a testemunha LL disse que nada sabia sobre se a autora estava a mediar a vendas dos imóveis da ré.
Vejamos.

Recordem-se os pontos 15 e 18:
15.–Após a celebração do contrato referido no ponto 11 supra, o gerente da Autora, de modo a obter informações acerca dos imóveis, reuniu, por diversas vezes, com o gerente das Rés, JAA, e com os arquitetos contratados pelas Rés, a fim de elaborar, apresentar e acompanhar junto da Câmara Municipal de Lisboa o projeto de operação urbanística conjunta para os prédios dos autos;
18.–No início de março de 2016, a Autora voltou a ser contactada pelas Rés, reiterando o seu interesse em vender os bens imóveis, e pediram àquela empresa que desenvolvesse esforços adicionais na procura de interessados na aquisição;
O ponto 15 encerra dois sub-pontos: diversas reuniões entre o gerente da autora com o gerente da ré, JAA (pai) e, diversas reuniões com os arquitectos que trabalhavam para as rés (MC e LL)
Antes de mais, consigna-se que foram integralmente ouvidos os depoimentos das testemunhas LL, MC e NM (prestados no dia 21/02/2020). Bem como foram integralmente ouvidos o depoimento de LD, as declarações de parte prestada pelo SM (da autora) e a acareação entre o SM e o LL (que tiveram lugar no dia 20/02/2020). E ainda as declarações de parte do representante das rés, JH, prestadas no dia 26/02/2020.
Ora bem, quanto às reuniões entre o representante da autora e o representante das rés, JAA (pai), o representante da autora confirmou ter tido mais que uma reunião com aquele gerente das rés, em casa deste.
Também a testemunha LL admitiu que, pelo menos, esteve presente numa reunião entre o SM (da autora) e o JAA (das rés) em casa deste.
MC disse ter ido a casa do Sr. JAA 3 ou 4 vezes para tratar dos assuntos relacionados com os dois imóveis.
JH, representante das rés, acabou por admitir que o SM (da autora) reuniu com o pai (JAA) em casa deste e com o LL.
No que toca às reuniões entre os arquitectos das rés (LL e MC) e o SM (da autora) para tratarem de assuntos relacionados com os projectos, incluindo reunião na Câmara, embora as testemunhas LL e MC tenham começado por mencionarem não se recordarem, acabaram por admitir terem existido essas reuniões.
Também a testemunha NM disse ter visto terem ocorridos essas reuniões – porque o escritório da autora é um open space - com os arquitectos, embora não tenha participado nelas.
Portanto, destes elementos resultam infirmados os fundamentos invocados pelas rés.
Quanto à intensificação de diligências de mediação em Março de 2016, resultam elas das declarações de parte do gerente da autora, dos depoimentos de LL e de MC, que confirmaram terem enviado à autora, por pedido desta e mediante prévia autorização do Sr. JAA, elementos (de arquitectura) relacionados com o licenciamento (LIC) e sobre o Pedido de Informação Prévia (PIP) de alterações ao projecto de construção. De resto, há documentos nos autos que o confirmam, concretamente os documentos 12 a 16 e 25 a 28.
Por conseguinte, não se vê fundamento para alterar os pontos 15 e 18.

Os pontos 20 e 21.
Entendem as rés/apelantes que estes dois pontos de facto devem ser considerados não provados porque, segundo elas, não foi produzida prova testemunhal ou documental que confirmasse esses factos. Dizem que a testemunha MC apenas referiu ter tido diversas reuniões, mas não conseguiu concretizar se eram relacionadas com o edifício dos prédios em causa. E que o mesmo aconteceu com o depoimento da testemunha LL. E que, além disso, dos documentos juntos também não permitem confirmar esses factos. Concretamente, o documento 17 que as testemunhas não o souberam explicar.
Vejamos então.

É a seguinte a redacção dada pela 1ª instância aos pontos 20 e 21:
20.– A Autora voltou a reunir-se com os arquitetos indicados pelas Rés e solicitou aos mesmos informações atualizadas quanto ao estado do projeto apresentado na Câmara Municipal de Lisboa para os prédios urbanos;
21.– Juntamente com os arquitetos, a Autora reuniu com os técnicos e responsáveis do departamento de urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa;”

Ora bem, para além das declarações de parte do representante da autora, que confirmou essa factualidade, também no depoimento da testemunha LL, embora, a princípio, tenha dito não se recordar de reuniões com o SM (da autora) acabou por admitir, na diligência de acareação, ter tido reuniões relativas ao edifício em causa nos autos e, que embora não tivesse a certeza, admitiu também ter havido reunião na câmara com o representante da autora acerca desse edifício. Mais admitiu/reconheceu ter enviado ao SM (da autora) os documentos 25, 26, 27 e 28 juntos com a petição inicial: os ficheiros não editáveis relativos ao edifício a construir nos prédios.
O mesmo se passou com a testemunha MC. Embora tenha dito que houve reuniões com o arquitecto JG, da Câmara, para tratarem de assuntos relacionados com estes e outros prédios, não se recorda se o SM esteve presente, embora admita que sim. Quanto aos documentos 25 e 26 reconhece que foram enviados do seu atelier, para o SM, porque têm prazo de validade. Mais admitiu que o Sr. JAA ou o filho, o JH, lhe deram indicação e autorização para enviar esses elementos para o SM.
Pois bem, destes elementos decorre que não existe motivo para dar os pontos 20 e 21 como não provados.

Os pontos 16, 19, 22 e 24.
Defendem as rés/apelantes que os pontos 16, 19, 22 e 24 devem ser dados como não provados. Alegam que não foi produzida prova demonstre esses factos, ou seja, que a autora não demonstrou ter efectuado actos de promoção dos prédios. A testemunha NM apenas mencionou, de forma genérica, terem sido publicados anúncios e contactados potenciais interessados e, disse que não tinham todos os elementos relativos às características dos prédios e às capacidades construtivas. Além disso, LL disse que havia um inquilino e, no contrato não é feita referência a ónus e encargos.
Vejamos.

É a seguinte a redacção dos pontos 16, 19, 22 e 24:
16.–A Autora visitou os prédios e contactou diversos operadores imobiliários, tendo-lhes apresentado os referidos prédios urbanos e as condições do negócio de compra e venda propostas pelas Rés;
19.–Em 18 de março de 2016, a Autora publicitou os imóveis acima identificados no portal imobiliário “Casa Sapo”;
22.–Ao longo de março de 2016, com o intuito de obter interessados na aquisição dos prédios acima identificados, a Autora contactou diretamente diversos investidores em prédios urbanos em Lisboa, publicitando a venda dos imóveis;
24.–A Autora efetuou diligências com vista a obter todas as informações referentes à capacidade construtiva e comercial dos imóveis, bem como aos custos que o desenvolvimento do projeto apresentado teria junto da Câmara Municipal de Lisboa;”

Uma primeira nota.
Salvo o devido respeito, afigura-se-nos que as rés laborarão em equívoco quando afirmam que a autora não demonstrou ter praticado actos de promoção dos imóveis. Ora bem, a mediadora não tem de demonstrar ter realizado actos de promoção: para obter direito à remuneração, no contrato de mediação imobiliária com exclusividade, apenas tem de demonstrar que encontrou pessoa efectivamente interessada na conclusão do negócio (artº 19º nº 2 do RJAMI, que adiante referiremos). Por isso, seria irrelevante a reapreciação da matéria de facto mencionada nos referidos pontos dados como provados.
Ainda assim e contrariamente aos que as rés pretendem, ficou suficientemente demonstrado que o gerente da autora visitou os prédios: nas suas declarações de parte mencionou mesmo que visitou os prédios com um cliente (minutos 16:50 a 17:30) e referiu mesmo o estado de degradação do edifício que ainda permanecia por demolir, já com a cobertura caída, o piso abaixo “parecia um jardim” e o rés-do-chão, onde estava uma inquilina, não tinha condições (de habitabilidade). Além disso, mencionou que revisitou os prédios com potencial cliente (19:07); e que colocaram anúncio no Portal da Sapo Casa (de resto, esse anúncio está junto aos autos como documento 10); e que a promoção foi intensificada em Março após a disponibilização das informações pelos arquitectos das rés (18:00) e mencionou quais os potenciais interessados que contactou e resulta dos documentos 16, 18, 19 e 20.
Também a testemunha NM mencionou nomes/denominações de interessados contactados e que manifestaram algum interesse, sem ser firme. Referiu ainda a publicação do anúncio no Portal Casa Sapo.
Portanto, daqui resulta que não há fundamento para alterar os pontos 16, 19, 22 e 24.

O Ponto 26.
As rés/apelantes entendem que o ponto 26 deve ser considerado não provado porque o tribunal, para o decidir, baseou-se somente nas declarações de parte do representante da autora.

Recordemos o teor do ponto 26:
26.–A Autora informou o gerente das Rés do referido no ponto 25 e inquiriu o mesmo acerca da possibilidade de renegociação das condições de venda constantes do contrato referido no ponto 11 supra.”

Pois bem, este ponto de facto está relacionado com o ponto 25, relativo a terem existido diversos interessados na compra, referidos nesse ponto, que entendiam que o preço de três milhões e oitocentos mil euros era elevado e, por isso, a autora inquiriu as rés no sentido de ser renegociado o preço.
Ora, para além das declarações do gerente da autora, que se revelaram sempre firmes, coerentes, circunstanciadas e por isso convincentes, relevam ainda os documentos 16, 18, 19 e 20, relativos aos contactos com empresas interessadas na compra e, essencialmente aquele primeiro, do gerente da Vogue, a comunicar que o preço de 3 800 000€ era elevado e propunha 3 600 000€.
Sem necessidade de mais desenvolvimentos, não se altera a decisão do ponto 16.

Pontos 27 e 29.
Pretendem as rés que os pontos 27 e 29 sejam dados como não provados por, segundo elas, a autora não conseguiu provar a realização das reuniões. Invoca os depoimentos da testemunha MC, que disse não se lembrar de reuniões e o depoimento de LL que não concretizou quaisquer reuniões.

Recorde-se a redacção desses dois pontos de facto:
27.–Em abril de 2016, a Autora deu a conhecer os bens imóveis e o negócio de compra e venda pretendido pelas Rés à investidora T – Arquitectos, Lda., tendo o legal representante da Autora reunido, por diversas vezes, com os representantes desta sociedade, a fim de procederem à análise das características dos prédios, do estado do projeto junto da Câmara Municipal de Lisboa, bem com às condições do negócio de compra e venda;
29. Posteriormente, a Autora organizou uma reunião entre os representantes da T – Arquitectos, Lda., o legal representante da Autora e os arquitetos responsáveis pelo projeto das Rés junto da Câmara Municipal de Lisboa.”

Vejamos, quanto ao ponto 27, as testemunhas MC e LL reconheceram que enviaram à autora os documentos relativos ao edifício a construir (o LIC – licenciamento anterior – e o PIP – pedido de consulta prévia para as alterações resultantes da alteração do PDM. E vimos quais foram esses documentos. A testemunha MC admitiu que esses elementos (plantas, alçados, etc.) costumam ser enviados para serem mostrados a potenciais compradores ou interessados e que, no caso, se os enviaram foi por indicação do Sr. JAA. E os documentos 22 e 23 são o reenvio ao arquitecto H, da T – Arquitectos, Lda, dos documentos disponibilizados pela arquitecta MC e projectista LL. Além disso, as declarações de parte do gerente da autora são elucidativas quanto a esses aspectos.
No que toca ao ponto 29, como decorre das declarações da testemunha LL em sede de acareação – e como de resto é transcrito pelas apelantes – reconheceu ele que, a final, conheciam (ele e a MC) o arquitecto H (da T – Arquitectos, Lda) e, admitiu terem estado em reunião com ele – a MC, ele, o SM o H e outra pessoa, “talvez sócio” – sobre os imóveis em causa nos autos.
Não se altera, por isso, a decisão sobre os pontos 27 e 29.

O ponto 31.
Entendem as rés que o ponto 31 deve ser considerado não provado porque, não se sabe qual é o conteúdo dos documentos 25 e 26 e a testemunha MC não se recorda se enviou os documentos.

É a seguinte a redacção do ponto 31:
1.–A Autora solicitou os elementos referidos no ponto 30 às Rés e, depois, enviou os mesmos à investidora T – Arquitectos, Lda .”

Analisemos. As testemunhas MC e LL confirmaram terem enviados os documentos (25 e 26) e a testemunha MC disse mesmo que se tratavam de plantas e alçados do edifício, na versão anterior (LIC) e na versão posterior (PIP) e que se os enviaram foi porque o Sr. JAA lhes pediu para enviarem esses elementos ao SM (gerente da autora). Nas declarações de parte, o gerente da autora esclareceu, cabal e convincentemente, a situação; e, dos documentos 27 e 28 decorre que o SM (gerente da autora) reenviou esses documentos ao arquitecto H, gerente da T – Arquitectos, Lda.
Mantém-se, por isso o ponto 31.

Os pontos 34, 35 e 46.
As rés pretendem que sejam dados como não provados os pontos 34, 35 e 46 porque, segundo elas, nenhuma testemunha esteve presente nas alegadas reuniões e não há prova documental que demonstre esses factos. E que também o tribunal de 1ª instância não apurou se o representante das rés tinha capacidade de perceber o conteúdo das cláusulas, nem foi demonstrado que houve acordo de demolição com a Sonangil e não ficou apurado que as rés aceitaram essas condições de demolição.
Vejamos.

Recordemos o teor dos pontos 34, 35 e 46:
34.–Na sequência do aludido no ponto 33, ocorreram duas reuniões entre a Autora e o gerente das Rés, o qual declarou que aceitava as condições ali referidas;
35.–Na reunião realizada no dia 16 de Abril de 2016, foi acordada entre a Autora e o gerente das Rés, após negociação entre os mesmos, a redacção final das cláusulas do contrato referido no ponto 12 supra.”
46.–O conteúdo das cláusulas do contrato referido no ponto 12 supra foi explicado ao gerente das Rés, JAA, em momento anterior à subscrição do contrato.

Ora bem, quanto ao ponto 34, resulta do documento 31, que o gerente das rés, em 22/04/2016, aceitou a proposta apresentada pela T – Arquitectos, Lda, apondo a sua assinatura nesse documento, com a expressão manuscrita “Aceito”, seguida da sua assinatura e da referência, manuscrita, “as gerências das (rés) A e F e da B” e do local e data, manuscritos “Lisboa, 22 de Abril de 2016”. E esses escritos foram apostos na parte inferior de um documento impresso, onde constam o logotipo da T – Arquitectos, Lda e o teor da proposta: preço de 3 600 000€, tempos de pagamento, data para a assinatura do contrato promessa, prazo para a celebração da compra e venda e, condições para a celebração do negócio: demolição do edifício e remoção de entulhos e, confirmação pela CML de que o projecto se mantém.
Ora, a letra (dizeres) e assinatura, manuscritas nesse documento, imputados ao gerente das rés, não foram impugnados. Pelo contrário, no ponto 46 da contestação as rés reconhecem expressamente que a assinatura do gerente das rés aposta no documento 31 é verdadeira por lapso manifesto, no ponto 46 da contestação escreveram “documento 1” quando o documento 1 é uma certidão de matrícula da autora e, atenta a matéria da petição inicial que pretenderam impugnar, os pontos 78 a 87, reportam-se, precisamente, à matéria da proposta da T – Arquitectos, Lda e aceitação dessa proposta pelo gerente das rés.

Quantos à reunião com o gerente das rés para acordarem as cláusulas do contrato de mediação imobiliária, o representante/gerente da autora esclareceu, convicta e convincentemente, essa reunião. Por seu lado, o actual gerente das rés, JH, nas suas declarações de parte – de resto nada convincentes e manifestamente marcadas por faltas de memória cirúrgicas – acabou por admitir que o gerente da autora ia lá a casa falar com o pai (JAA, gerente das rés) e que uma vez o viu na porta de casa e outra no escritório do Dr. F (advogado das rés).
Além disso, confrontando a proposta da T – Arquitectos, Lda, na parte relativa ao preço, à duração da proposta, às condições e aos prazos do contrato promessa, com as cláusulas do contrato de mediação imobiliária acerca do preço, período de exclusividade e inexistência de ónus/encargos, percebe-se que há correspondência ente aquela proposta da T – Arquitectos, Lda e a celebração do contrato de mediação imobiliária, o que leva à conclusão de que as cláusulas do contrato foram acordadas e assinadas pelo gerente das rés.
Mantém-se, assim, os pontos 34, 35 e 46.

Os Pontos 38 e 39.
Pretendem as rés que os pontos 38 e 39 devem ser considerados não provados por, segundo entendem, não ter sido feita prova da aceitação da proposta pelo gerente das rés.
Recordemos os pontos 38 e 39:
38.–(…) Proposta essa que o legal representante da Autora transmitiu ao gerente das Rés, JAA, no dia seguinte;
39.–Tal proposta foi aceite pelo gerente das Rés nos termos que constam de fls. 44v;”
Pois bem, quanto a estes pontos, bastará recordar o que se disse acerca do ponto 34: “…resulta do documento 31, que o gerente das rés, em 22/04/2016, aceitou a proposta apresentada pela T – Arquitectos, Lda, apondo a sua assinatura nesse documento, com a expressão manuscrita “Aceito”, seguida da sua assinatura e da referência, manuscrita, às “gerências das (rés) A e F e da B” e do local e data, manuscritos, “Lisboa, 22 de Abril de 2016”. E esses escritos foram apostos na parte inferior de um documento impresso, onde constam o logotipo da T – Arquitectos, Lda e o teor da proposta: preço de 3 600 000€, tempos de pagamento, data para a assinatura do contrato promessa, prazo para a celebração da compra e venda e, condições para a celebração do negócio: demolição do edifício e remoção de entulhos e confirmação pala CML de que o projecto se mantém.
Ora, a letra (dizeres) e assinatura manuscritos nesse documento, imputados ao gerente das rés, não foram impugnados. Pelo contrário, no ponto 46 da contestação as rés reconhecem expressamente que a assinatura do gerente das rés aposta no documento 31 é verdadeira por lapso manifesto, no ponto 46 da contestação escreveram “documento 1” quando o documento 1 é uma certidão de matrícula da autora e, atenta a matéria da petição inicial que pretenderam impugnar, os pontos 78 a 87, reportam-se, precisamente, à matéria da proposta da T – Arquitectos, Lda e aceitação dessa proposta pelo gerente das rés.”
Sem necessidade de outros considerandos, conclui-se não haver fundamento para alterar os pontos 38 e 39.

Os pontos 40, 42 e 43.
As rés defendem que os pontos 40, 42 e 43 devem ser considerados não provados por a única prova produzida sobre essa factualidade foram as declarações de parte do gerente da autora.
Recorde-se o teor dos pontos 40, 42 e 43:
40.–Nessa data de 22 de Abril de 2016, a Autora comunicou à T – Arquitectos, Lda, que a proposta pela mesma apresentada havia sido aceite pelas Rés e, no dia 27 de abril de 2016, enviou à mencionada investidora a minuta relativa ao contrato-promessa de compra e venda;
42.–Após análise da minuta do contrato-promessa, a T – Arquitectos, Lda comunicou à Autora que concordava com o seu teor;
43.–No mesmo dia, o gerente da Autora reuniu com o gerente das Rés, o qual declarou que concordava com o teor da minuta do contrato-promessa e solicitou que a mesma fosse enviada ao advogado das Rés.”
Vejamos. Relativamente a esta factualidade importa relembrar que o próprio gerente das rés, nas suas declarações de parte, admitiu que o texto do contrato promessa foi enviado ao Dr. F (advogado das rés) para que ele o analisasse. De resto, no ponto 49 da contestação as rés expressamente admitem que a minuta do contrato promessa foi enviada ao advogado das rés.
Por outro lado, o gerente da autora esclareceu, de modo detalhado e convicto, sem quaisquer hesitações (apesar da instância do Ilustre Mandatário das rés) o processo de aceitação da proposta, a redacção do contrato promessas e a marcação de data e local para assinatura, o adiamento da assinatura e a posterior recusa de assinatura do contrato promessa. E do documento 32 decorre o envio da “minuta” do contrato promessa, da autora para a T – Arquitectos, Lda. E do documento 43, datado de 28/04/2016 (junto a 04/02/2019), do Dr. F (advogado das rés) para o SM (gerente da autora) aquele acusa a recepção da minuta do contrato promessa e informa que irá conferenciar com o Sr. JAA (gerente das rés). E do documento 44 decorre que o SM inquire o Dr. F sobre se as rés mantêm a recusa de não vender os prédios; e do documento 45 (de 02/05/2016) o Dr. F informa o gerente da autora de que, por ora, não tem novas instruções dos gerentes das rés.
Ora, destes elementos decorre que não há fundamento para alterar os pontos 40, 42 e 43.

Os pontos 44 e 45.
As rés pretendem que estes dois factos sejam considerados não provados porque, invocam, não foi feita prova desses factos.
Recordemos a redacção destes pontos de facto:
44.–A Autora enviou a minuta do contrato-promessa de compra e venda para o advogado das Rés e a assinatura desse contrato foi marcada para o dia 29 de abril de 2016 (sexta-feira), no escritório das Rés;
45.–Nessa data, o gerente das Rés contactou a Autora e solicitou o agendamento da assinatura do dito contrato para o dia 2 de maio de 2016, o que foi aceite pela investidora;”       
Ora, como vimos acima, resulta do documento 43 que a minuta do contrato promessa foi enviada para o Dr. F, que acusou a respectiva recepção e, de resto, o próprio gerente das rés, nas suas declarações de parte, admitiu esse facto, o que foi, igualmente, expressamente admitido no ponto 49 da contestação.
Quanto à restante factualidade em causa nesses dois pontos, foi convicta e convincentemente a factualidade relatada pelo gerente da autora; e também a testemunha NM referiu o adiamento da assinatura do contrato promessa para o dia 02/05/20216, de que se recorda por ser o dia de anos do SM, gerente da autora.
Mantém-se, assim, as redacções dos pontos 44 e 45.

Os Pontos III, V,VII, IX, X, XI, XII e XIII dos factos não provados.

As rés entendem que estes pontos de facto devem ser dados como provados.
Invocam que na sentença do processo de acompanhamento de maior, relativo ao JAA, foi provado que a data provável do início da incapacidade foi o ano de 2017 e, que dos depoimentos das testemunhas MC, decorre que o JAA já não tomava conta dos negócios, raramente ia ao escritório; e do depoimento da testemunha LD resulta que desde pelo menos 2016 o JAA estava incapacitado. E que o gerentes das rés, nas suas declarações de parte, confirmou que o seu pai já não tratava dos negócios.
Vejamos.

Recordemos estes pontos de facto:
III.–Desde há vários anos que o dito gerente das Rés está completamente ausente da gestão das empresas e raramente se desloca à sua sede;
V.–Desde há vários anos que o mesmo não acompanhava o mercado imobiliário, nem os preços que se praticavam;
VII.–Desde há vários anos que tal gerente das Rés está permanentemente alheado do que se passa em seu redor, não acompanhando qualquer conversa ou negociação;
VIII.–O mesmo não tinha capacidade para saber o valor de mercado dos prédios, bem como os encargos que implicava a extinção do ónus de arrendamento incidente sobre o rés do chão do n.º … da avª. B... B..., em L_____, bem como os custos da demolição do prédio;
IX.–O mesmo gerente desconhecia a situação do projecto de construção apresentado na Câmara Municipal de Lisboa;
X.–Entre os meses de Abril e Maio de 2016, a companheira do gerente das aqui Rés, de há mais de 30 anos, encontrava-se em fase terminal por doença oncológica;
XI.–Em virtude do referido no ponto X e da preocupação daí adveniente, o gerente das Rés encontrava-se incapacitado para discernir os termos de qualquer negociação;
XII.–Tais factos – cfr. pontos X e XI – eram do conhecimento do gerente da Autora;
XIII.–As cláusulas constantes do documento referido no ponto 12 supra (provado) foram elaboradas pela Autora com o gerente das Rés, JAA, sem que tivesse havido qualquer negociação prévia dos termos das mesmas.”

A 1ª instância fundamentou a sua decisão de considerar aquela factualidade como não provada, do seguinte modo:
Como se mencionou, e agora se reitera, em relação à matéria factual não provada nesta ação (cfr. pontos I a XIII), a sua desconsideração promanou da ausência de meios de prova suficientes passíveis de a confirmar com um mínimo de plausibilidade.
Sobre a matéria inserta nos pontos I e II, já se viu que não conheceu sustentação nas inquirições testemunhais e declarações de parte produzidas em sede de audiência final, nem em nenhuma da prova documental oferecida nos articulados (pela Autora). Em bom rigor, trata-se de factualidade advinda da petição inicial e, nessa medida, incumbiria à sociedade aqui demandante a sua comprovação no presente pleito, nos termos gerais decorrentes do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil. Em todo o caso, e como se verá infra, não ocorrem consequências, dessa indemonstração, no resultado/desfecho da demanda, sendo facticidade parca que, por si só, não tem a potencialidade de inverter tal resultado.
Quanto à matéria não provada remanescente (cfr. pontos III a XIII), careceu, no essencial, de apoio probatório, devendo sinalizar-se a circunstância de o relatório pericial indicado (do INML) mencionar a necessidade de acompanhamento a JAA apenas desde o início de 2017. Não podemos, de modo este gerente das Rés estava permanentemente alheado do que se passava em seu redor, desde há vários anos, não acompanhando qualquer conversa ou negociação (cfr. ponto VII), faltando-lhe a capacidade para conhecer o valor de mercado dos prédios em causa (cfr. ponto VIII, parte inicial) e distinguir a taxa de conversão escudo/euro (cfr. ponto VI).
Com efeito, tudo o que se logrou apurar, a esse nível, é o que consta da sentença proferida pelo Juízo Local Cível de Lisboa, datada de 2 de dezembro de 2019, bem como do relatório pericial que a sustentou a montante, este datado de 12 de fevereiro de 2019. E o mesmo foi muito claro ao consignar que, “Compilada a informação disponibilizada, e na ausência de qualquer outra, face ao diagnóstico estabelecido, propõe-se como data provável de início da incapacidade o ano de 2017”; momento posterior às outorgas dos contratos de mediação imobiliária em presença nos autos (em 30 de outubro de 2015 e em 20 de abril de 2016).
Quanto ao invocado “(…) ónus de arrendamento (…)” (cfr. ponto VIII), nenhum elemento documental foi junto que permitisse a este Tribunal esclarecer a sua efectiva existência, para tanto não bastando afirmações orais proferidas no decurso da audiência.
Por fim, para além de nenhuma prova ter sido produzida sobre o ponto XIII, urge salientar que a própria circunstância de terem sido celebrados dois contratos sucessivos, dentro de seis meses e com cláusulas alteradas, corrobora a pré-existência de negociações.

Ora bem, relativamente aos pontos III, V e VII, não foi feita prova de, desde há vários anos, que o JAA está completamente ausente da gestão das empresas, não acompanhava o mercado imobiliário e não acompanhava quaisquer conversas ou negociações. Na verdade, no depoimento da testemunha MC mencionou que foi a casa do Sr. JAA três ou quatro vezes para reunir com ele acerca deste e doutros assuntos; e que embora no dia a dia contactasse com o filho do Sr. JAA, quando era para decidir era o Sr. JAA quem decidia e, no final, disse que mesmo que o Sr. JAA “…era um grande senhor, lúcido e era ele quem decidia”.
A testemunha LL disse que estiveram em casa do Sr. JAA com o SM e falaram das alterações específicas ao projecto de arquitectura.
A testemunha LD disse que apenas conheceu o Sr. JAA desde Outubro de 2016 e, tudo o que referiu acerca do estado depressivo do Sr. JAA foi desde esse momento temporal.
Nas declarações de parte, o gerente das rés disse que era o pai (Sr. JAA) quem assinava os contratos, excepto os contratos de arrendamento; além disso, confrontado com o teor das actas das assembleias de sócios das rés reconheceu que o pai (JAA) estava bem e consciente quando o nomeou gerente das sociedades desde 24/08/2017; e, confirmou que em 2018 usou a expressão, também no âmbito da vida societária, que o pai pensava pela própria cabeça.
Destes meios de prova, resulta igualmente infirmada e, por isso não provada, a factualidade dos pontos VIII, IX, XI.
Quanto ao ponto XII, não foi produzida qualquer prova que permita inferir que o gerente da autora sabia da invocada incapacidade do Sr. JAA ou da doença da companheira (esposa?) deste.
No que toca ao ponto XIII, não foi feita prova da ausência de qualquer negociação quanto às cláusulas do contrato de mediação imobiliária.
Finalmente, quanto ao ponto X, não obstante o gerente das rés, nas suas declarações de parte, ter mencionado que a sua mãe (esposa/companheira) do seu pai, JAA, no ano de 2016 estava muito doente e debilitada, com um cancro de que veio a falecer, a verdade é que esse facto poderia funcionar como facto instrumental do facto mencionado em XI (a invocada incapacidade de discernimento do JAA) e, como vimos foi feita prova do contrário.
Em face do que se expôs, conclui-se não existir fundamento para dar como provados os pontos III, V, VII, IX, X, XI, XII e XIII dos factos não provados.

Em suma, permanece inalterada a factualidade decidida pela 1ª instância.
***

3.2- A Pretendida revogação da sentença.

As rés pretendem seja revogada a sentença em termos de serem absolvidas do pedido de condenação no pagamento de 177 120€ a título de remuneração da autora no âmbito do contrato de mediação imobiliária.
Baseiam a sua pretensão revogatória da decisão da 1ª instância, dizendo que: (i) Não de pode considerar válido o contrato de mediação imobiliária; (ii) que o autor não cumpriu a obrigação de mediação; (iii) que o negócio não se concretizou por causa imputável ao autor.
Além disso, invocam a invalidade/anulabilidade do contrato de mediação imobiliária por incapacidade acidental dos representantes das rés.
Defendem, ainda, a exclusão de certas cláusulas do contrato de mediação imobiliária por violação do dever de informação e esclarecimento por parte da autora.
No desenvolvimento dos seus fundamentos, argumentam que existiam ónus sobre o prédio, concretamente um contrato de arrendamento e um ónus de inalienabilidade a favor da Câmara Municipal e não foram indicados no contrato de mediação imobiliária; defendem que não chegaram a ser acertados os termos do negócio entre os representantes das rés e os interessados no negócio; e que o negócio não de concretizou por causa imputável à autora, mediadora imobiliária, que não demonstrou ter obtido acordo dos proprietários quanto ao clausulado, designadamente quanto aos ónus e encargos existentes.
Pois bem, essencialmente, as rés/apelantes fundam a pretendida revogação da sentença nas alterações que propunham para a matéria de facto.
Ora, como vimos, nenhum dos factos impugnados mereceu alteração; isto é, manteve-se, integralmente, a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto provada e não provada.
Significa isto que a pretensão de revogação da sentença se baseia num pressuposto que não se verifica: as pretendidas alterações à matéria de facto que, como vimos, foi totalmente improcedente.
Tanto bastaria para se concluir pela improcedência do recurso. Na verdade, não sendo atendidas as alterações à matéria de factos e baseando-se a pretensão de revogação da sentença (apenas) nessas alterações de facto, fica sem fundamento o recurso. Digamos que ocorre uma situação de inviabilidade do recurso: os pressupostos de facto em que se baseia não se verificam.

Não obstante, de modo sumário, vejamos se a sentença deve ser revogada.

Assim, quanto à obrigação de pagamento da remuneração acordada.
O artº 19º da Lei 15/2013, de 08/02, relativa ao Regime Jurídico da Actividade de Mediação Imobiliária (RJAMI) estabelece no seu nº 1 que A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação…”.
Por sua vez, o nº 2 determina queÉ igualmente devida … a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente…”.
Destas duas normas decorre que, como regra, na mediação imobiliária simples, portanto sem exclusividade, a remuneração é devida com a perfeição e conclusão do contrato tido em vista.
Como excepção, é estabelecido que no contrato de mediação celebrado com carácter de exclusividade, a remuneração é devida mesmo que o contrato visado não se concretize por causa imputável ao cliente.

Estas normas já eram estabelecidas nos regimes anteriores.
Assim, no DL 77/99, de 16/03, estava definido 1- A remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação”. “2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior: a) Os casos em que o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação celebrado em regime de exclusividade, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, tendo esta direito a remuneração;”.
De igual modo, o artº 18º do DL 211/2004, de 20/08, dizia: 1 - A remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação. 2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior: a) Os casos em que o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação celebrado, em regime de exclusividade, com o proprietário do bem imóvel, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, tendo esta direito a remuneração.
Quer dizer, no caso de contrato de mediação imobiliária celebrado com exclusividade, a remuneração da mediadora não depende da celebração do contrato tido em vista, dependendo somente do cumprimento da obrigação assumida: encontrar interessado, genuinamente interessado e pronto a celebrar o negócio nos moldes em que foi concebido no âmbito do contrato de mediação. (Cf. Higina Castelo, O Contrato de Mediação, Teses, Almedina, pág. 431 e segs.).

Provando a mediadora que efectuou com sucesso a sua prestação –encontrar interessado genuinamente pronto a celebrar o negócio –o cliente apenas poderá eximir-se ao pagamento da remuneração acordada mediante prova de que o contrato não se concretizou por causa que não lhe é imputável (porque, por exemplo, recebeu, entretanto e inesperadamente uma ordem de expropriação, ou porque o terceiro não obteve o crédito necessário à realização do negócio ou desistiu por qualquer outra razão) - Higina Castelo, O Contrato de Mediação, cit., pág. 431)
Quer dizer, a prova do sucesso de o mediador ter conseguido a obtenção de um interessado que satisfaça o interesse do credor, estabelecido no contrato e nos moldes em que foi concebido, compete à empresa mediadora.
Para que o cliente poder ficar eximido de ter de suportar a remuneração acordada terá de provar que o contrato não se concretizou em virtude de uma causa que não lhe é imputável.
Ora, no caso dos autos, a autora provou que conseguiu obter um interessado na compra dos imóveis, pelo preço que estava estipulado para a venda e, comunicou-o às rés; e as rés aceitaram essa proposta. É o que decorre dos pontos 37, 38 e 39: “37. No dia 21 de abril de 2016, a T – Arquitectos, Lda., apresentou a proposta de aquisição dos imóveis nos termos constantes de fls. 44; 38. (…) Proposta essa que o legal representante da Autora transmitiu ao gerente das Rés, JAA, no dia seguinte;39. Tal proposta foi aceite pelo gerente das Rés nos termos que constam de fls. 44v.

Por sua vez, as rés não lograram provar que o contrato não se concretizou por virtude de uma causa que não lhes seja imputável.
A esta luz e de acordo com o artº 19º nº 2 da Lei 15/2013, de 08/02, a autora ficou com o direito à remuneração acordada.

É certo que as rés, dias depois, recusaram-se a assinar o contrato promessa de compra e venda dos imóveis.
Pode colocar-se a questão de saber qual a relevância desta recusa de venda, pelas rés, após o cumprimento, pela autora, da prestaçãoa que se havia obrigado pelo contrato de mediaçãocom exclusividade.

Salvo o devido respeito por outra opinião, entendemos que essa recusa posterior de vender é irrelevante para efeitos de exonerar as rés a pagarem a remuneração a que, como vimos, a autora passou a ter direito: por haver exclusividade, cumprida a prestação pela mediadora, mantém-se intacto o direito da autora à remuneração, na mediada em que o negócio visado não se concretizou por causa imputável à ré (Neste sentido, ver ainda Fernando Baptista de Oliveira, Manual de Mediação Imobiliária, Almedina, 2019, pág. 182).

Na verdade, como é sabido, por regra, o contrato extingue-se com o seu cumprimento. Trata-se mesmo da causa natural de extinção dos vínculos contratuais: a realização da prestação a que o devedor se encontrava vinculado (artº 762º nº 1 do CC). Dito de outro modo: a realização da prestação estabelecida no programa contratual previamente delineado aquando da celebração do contrato tem por efeito a cessação do contrato por via do cumprimento e a consequente obrigação da contraparte cumprir a obrigação a que se vinculou.

Tanto basta para se concluir que não há fundamento para revogar a sentença sob recurso.

Finalmente, duas notas: uma sobre a pretensão de invalidade do contrato de mediação imobiliária, por alegada incapacidade acidental do gerente das rés; outra, sobre a pretendida exclusão de certas cláusulas contratuais por alegada falta de comunicação e esclarecimento.
Ora bem, qualquer destes dois fundamentos invocados pelas rés/apelantes para a pretendida revogação da sentença, não procedem. E não procedem por uma razão muito simples: as rés não provaram a factualidade relativa à invocada incapacidade acidental nem à falta de comunicação das cláusulas, provando a autora, de resto, que as comunicou.
Dito de outro modo.

A incapacidade acidentalenquanto factor de invalidade do negócio, está prevista no artº 257º do CC onde se determina que é anulável a declaração negocial feita por quem se encontrava acidentalmente – portanto de modo não definitivo – incapacitado de entender o sentido da declaração ou desprovido do livre exercício da sua vontade. Conquanto, desde que essa incapacidade seja notória ou do conhecimento do declaratário. E, é notória, quando podia ter sido constatada por pessoa de diligência normal.
No caso dos autos, as rés não demonstraram a factualidade que lhes permitiria ver preenchido os requisitos da incapacidade acidental, como decorre da circunstância da não prova dos pontos III a X, XI e XII dos factos não provados.

O mesmo se diga relativamente à pretendida exclusão de certas cláusulas do contrato de mediação imobiliária: as rés não demonstraram a factualidade do ponto XIII dos factos não provados, sendo que a autora provou ter explicado ao gerente das rés o conteúdo das cláusulas do contrato previamente á respectiva assinatura (ponto 46).

Tratava-se, pois, de um problema de ónus de prova.
Como é sabido, a questão do ónus da prova ergue-se como o grande eixo de todo o direito probatório material: se não se demonstrarem os factos que alicerçam a dedução de uma pretensão, esta não pode ser atendida nem concedida.
As normas jurídicas só funcionam quando se verifiquem as respectivas previsões normativas: o juiz não pode aplicá-las quando não constate, no domínio dos factos, a ocorrência dos pertinentes acontecimentos.

A regra básica, sobre direito probatório material, está estabelecida no artº 342º nºs 1 e 2 do CC: a quem invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito em causa e, a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado, pertencem àquele contra quem a invocação é feita.

Em suma e sem necessidade de outros considerandos: o recurso improcede.

***

III–DECISÃO.

Em face do exposto, acordam neste colectivo da 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, julgar o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida.

Custas no recurso, pelas rés, na vertente de custas de parte (as taxas de justiça mostram-se satisfeitas e não há lugar a encargos nesta instância).



Lisboa, 03/03/2022



(Adeodato Brotas)
(Vera Antunes)
(Aguiar Pereira)