Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | AFONSO HENRIQUE | ||
Descritores: | ARRENDAMENTO COMERCIAL TRESPASSE ERRO SOBRE A BASE DO NEGÓCIO ALTERAÇÃO ANORMAL DAS CIRCUNSTÂNCIAS | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 07/01/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | N | ||
Texto Parcial: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I - Tanto há erro sobre a base do negócio quando a falsa representação incide sobre circunstâncias passadas ou presentes, como quando ela recai sobre circunstâncias futuras, desde que, num caso e noutro, a decisão de contratar se tenha fundado em tais circunstâncias. II – E isso não acontece quando pois, a A. durante o período negocial teve pleno conhecimento da actividades exercidas pelo Colégio em causa. III - Também não se pode considerar alteração anormal das circunstâncias, o facto do número de crianças terem diminuído ou as exigências feitas pela fiscalização para que a A. pudesse exercer no locado outras valências. (Sumário do Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | - Quid juris? Segundo Inocêncio Galvão Teles, “constituem base do negócio as circunstâncias determinantes da decisão do declarante que, pela sua importância, justificam, segundo os princípios da boa fé, a invalidade do negócio em caso de erro do declarante, independentemente de o declaratário conhecer ou dever conhecer a essencialidade, para o declarante, dessas circunstâncias e, por maioria de razão, sem necessidade de os dois se mostrarem de acordo sobre a existência daquela essencialidade” - in, Manual dos Contratos em Geral, 4º ed., pag.341. Tanto há erro sobre a base do negócio quando a falsa representação incide sobre circunstâncias passadas ou presentes, como quando ela recai sobre circunstâncias futuras, desde que, num caso e noutro, a decisão de contratar se tenha fundado em tais circunstâncias. O erro como vício dos negócios jurídicos tutela a desconsideração de uma vontade que não seja perfeita por culpa que não seja imputável ao declarante. Isto em nome da confiança que deve imperar entre pessoas que negoceiam livremente e de boa fé. O erro-obstáculo acontece sempre que, por um lado, existe uma perfeita formação da vontade contratual do declarante e, por um lado, uma divergência entre o querido e o declarado, divergência essa não desejada pelo declarante. O erro-vício consiste no desconhecimento ou na falsa representação da realidade que determinou ou podia ter determinado a celebração do negócio e essa realidade pode consistir numa circunstância de facto ou de direito – cfr. a nível jurisprudencial, por todos, o Acórdão do STJ, de 1-10-2009, exarado no pº296/05.1TBVGS.C1.S1 e publicitado in, www.dgsi.pt. Como ensina Castro Mendes, a ideia central no erro sobre a base do negócio é “a de um erro bilateral sobre condições patentemente fundamentais do negócio jurídico” – in, Direito Civil, Vol. II, pag.217. O conceito de base do negócio foi introduzido pelo alemão Oertman (Leipzig, 1921) e desenvolvido pelo seu compatriota Lehman e consiste na representação duma das partes, reconhecida e não contestada pela outra, sobre a existência de circunstâncias tidas como fundamentais para a formação da vontade. Nesta esteira seguiu Manuel de Andrade que também admitiu a boa fé como causa de resolução e que está reflectido na nossa lei – sobre a origem deste conceito, vide, Mota Pinto, in, Teoria geral do Direito Civil, 3ª ed., actualizada, Coimbra Editora, 1996, pags.505 a 518 e Vaz Serra, BMJ 68, pag.315. Tal conceito jurídico foi introduzido na doutrina portuguesa por Manuel de Andrade que lhe “acrescentou” o requisito boa fé (falta dela) como causa de resolução do negócio – in, Teoria Geral das Obrigações, pags.243 e ss. Como escreveu Mota Pinto, o que distingue o erro-vício do erro na declaração ou erro-obstáculo é que: “O primeiro é um vício da vontade e o segundo uma divergência entre a vontade e a declaração; o erro-vício é um erro na formação da vontade enquanto que o erro-obstáculo é um erro na formulação da vontade (por ex. o prédio acordado tem 10 unidade e o comprador pressupunha que tinha 15 e esta era condição decisiva para o declarante realizar o negócio)”. Por fim dispõe o artº437º nº1 do CC que: “Se as circunstâncias em que as partes fundaram a sua a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos do próprios contrato”. Confrontando os factos apurados e não apurados com a doutrina e os normativos citados não podemos deixar de subscrever a fundamentação jurídica explanada pelo Tribunal a quo. Isto porque, como assinálamos quando nos pronunciámos sobre a não atendida impugnação da matéria de facto, a A. durante o período negocial teve pleno conhecimento da actividades exercidas pelo Colégio em causa. As negociações duraram cerca dum mês e foi fornecido ao representante da A. todos os elementos necessários, inclusivé, o alvará vigente para poder formar a sua vontade no sentido de aderir, ou não, ao negócio (coligação dos seguintes contratos: trepasse e arrendamento). Não houve pois, ocultação de quaisquer dados que pudessem viciar a vontade da A. em realizar o aludido negócio, cujo objecto não era alheio à A., uma vez que exercia actividade similar no Estoril e em Almada. Da factualidade provada e não provada retira-se, como enfatiza a sentença recorrida, que o negócio não correu bem por outros motivos, nomeadamnete, de ordem económica e pessoal. Por exemplo, não é aceitável, que tenha sido uma discussão entre uma trabalhadora do “Colégio” em causa e a R. que impediu que esta permanecesse até que o problema do alvará se resolvesse, sendo ainda certo ter sido a A. a tomar a iniciativa de fechar o estabelecimento em discussão. Finalmente, também não se pode considerar alteração anormal das circunstâncias, o facto do número de crianças terem diminuído ou as exigências feitas pela fiscalização para que a A. pudesse exercer no locado outras valências. Sindicada a sentença objecto de recurso, deve improceder a apelação in totum. DECISÃO - Assim e pelos fundamentos expostos, os Juízes desta Relação acoradm em julgar improcedente o recurso e mantêm o decidido pelo Tribunal recorrido. Custas pela apelante. Lisboa, 1 de Julho de 2014 Afonso Henrique Ferreira Rui Torres Vouga Maria do Rosário Barbosa | ||
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Decisão Texto Integral: |