Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
17881/21.7T8LSB.L2-4
Relator: ALVES DUARTE
Descritores: JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
CARGO DE DIRECÇÃO
CADUCIDADE DO PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
INVALIDADE DO PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/07/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: I.O conhecimento dos factos pelo superior hierárquico do trabalhador só releva para o dies a quo do prazo da caducidade se o empregador lhe tiver delegado poderes disciplinares para isso.

II.As causas de invalidade do processo disciplinar são apenas as enunciadas no n.º 2 do art.º 382.º do CT.

III.A falta de assinatura das declarações prestadas por testemunha em processo disciplinar é susceptível de pôr em causa a fidelidade da transcrição dessas declarações, mas não as invalida se a sua autenticidade for provada por outros meios.

IV.A melhoria de resultados económicos conseguidos na sequência da contratação de um trabalhador hierarquicamente inferior ao despedido decidida pela empregadora não é causa para o despedir se foi este quem sugeriu a necessidade dessa contratação como modo de melhor controlar os custos com as aquisições de serviços.

V.A divergência entre serviços contratados e facturados pelo trabalhador a clientes da empregadora só releva para o despedir se daí tiver resultado algum prejuízo para esta.

VI.Embora a sanção pecuniária compulsória a que se refere o artigo 829.º-A n.º 4 do Código Civil seja sempre considerada na execução, nada impede que o credor a peça na acção declarativa.


Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

IRelatório.

AA intentou a presente acção declarativa, com processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, contra Blueotter Circular, S.A., tendo apresentado o formulário a que aludem os artigos 98.º-C e 98.º-D do Código de Processo do Trabalho e com ele juntou a decisão de lhe aplicar a sanção disciplinar de despedimento, com justa causa, sem qualquer indemnização ou compensação.
Teve lugar a audiência de partes, na qual não se quiseram conciliar, pelo que ré apresentou articulado motivador do despedimento e o autor contestou e deduziu reconvenção na qual formulou os seguintes pedidos:
a)-Ser declarada a ilicitude do despedimento do Autor, com as legais consequências;
b)-Ser a Ré condenada a pagar uma indemnização pela violação do dever de ocupação efectiva do Autor, em valor a arbitrar pelo Douto Tribunal;
c)-Ser a Ré condenada a pagar danos não patrimoniais em valor a arbitrar pelo Douto Tribunal.
d)-Ser reconhecido que o veículo e o telemóvel atribuídos ao Autor fazem parte integrante da retribuição mensal do Autor e seu respectivo valor, que caso assim se entenda seja liquidado em sede de execução de sentença;
e)-Ser reconhecido que o valor ilíquido da retribuição mensal do Autor é € 4.736,04 (quatro mil setecentos e seis euros e quatro cêntimos);
f)-Ser a Ré condenada a pagar ao Autor as retribuições que este deixou de auferir, desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial que vier a ser proferida;
g)-Ser a Ré condenada a pagar ao Autor indemnização em substituição de reintegração, nos termos do disposto no art.º 391.º do Código do Trabalho, € 92.352,78 (noventa e dois mil euros e trezentos e cinquenta e dois euros e setenta e oito cêntimos);
h)-Ser a Ré condenada a pagar € 3.278,80 (três mil duzentos e setenta e oito euros e oitenta cêntimos), título de compensação pela ausência de formação profissional;
i)-Ser a Ré condenada a pagar juros de mora vencidos e vincendos sobre todas as quantias peticionadas, vencidas, vincendas e também sobre todas as que resultarem eventualmente, da aplicação do art.º 74.º do Código de Processo do Trabalho, desde a citação até efetivo, total e integral pagamento;
j)-Ser a Ré condenada no pagamento, nos termos do disposto no art.º 829.º-A do Código Civil de uma sanção pecuniária compulsória em valor a arbitrar pelo Douto Tribunal, por cada dia de incumprimento, ainda que meramente parcial, data da Sentença que vier a ser proferida até efetivo e integral cumprimento desta;
Realizada a primeira sessão da audiência de julgamento o autor requereu a reorganização do seu requerimento probatório, juntar documentos e aditar testemunhas, o que foi indeferido, tendo o autor recorrido autonomamente para esta Relação de Lisboa; e entretanto os autos seguiram seus termos, tendo sido realizada a terceira e última sessão da audiência de julgamento e no dia 17-01-2022 foi e, por fim, no dia 15-02-2022 a prolação da sentença, na qual a Mm.ª Juiz julgou a acção parcialmente procedente, declarou lícito o despedimento condenando a ré a pagar ao autor a quantia de € 3.402 a título de formação profissional não ministrada nos últimos três anos.
Dessa sentença recorreu o autor; mas entretanto na apelação autónoma que subira a esta Relação de Lisboa foi proferido acórdão decidindo o seguinte:
"Termos em que se acorda julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência:
i.-confirmar o despacho em que a Mm.ª Juiz a quo indeferiu o requerimento do apelante autor para junção do documento com que se propunha provar a data em que o superior hierárquico na apelada com competência disciplinar teve conhecimento dos factos em dissídio; e
ii.-revogar o despacho da Mm.ª Juiz a quo que não admitiu a prova documental e testemunhal arrolada pelo apelante autor relativamente à impugnação do documento pela apelada ré no art.º 28.º da resposta à reconvenção, admitindo-se agora a mesma e determinando-se o consequente prosseguimento dos autos".
Notificado o acórdão proferido na apelação autónoma às partes, o autor recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça mas a revista foi rejeitada e o respectivo despacho transitou em julgado.
De seguida foi prolatado acórdão na apelação da sentença atrás referida, a qual, tendo em conta a procedência parcial da apelação autónoma, decidiu "anular o processado a partir da terceira e última sessão da audiência de julgamento, devendo esta ser reaberta e produzida a prova admitida na apelação autónoma atrás referida, seguindo-se depois os demais termos do processo".
Tendo voltado os autos à 1.ª Instância, foi então reaberta e concluída a audiência de julgamento e proferida sentença na qual a Mm.ª Juiz a quo julgou a "acção parcialmente procedente, declara lícito o despedimento condenando a R. a pagar ao A. a quantia de € 3.402 a título de formação profissional não ministrada nos últimos três anos".
Inconformado, apelou de novo o autor pedindo que a sentença proferida seja revogada e substituída por outra que declare a ilicitude do despedimento, condenando a apelada, culminando a alegação com as seguintes conclusões:
"1.-Sentença enferma de nulidade e erro de julgamento, quer de facto, quer de direito.
2.-A Sentença recorrida é nula por violação do princípio do contraditório.
3.-O Tribunal a quo decide que o despedimento do apelante Autor é lícito, com base em factos novos sobre os quais foi omitido o cumprimento do princípio do contraditório,
4.-A decisão fundamenta-se na matéria de factos constante do ponto 71 dos factos provados, ou seja, 'A direcção do A. não pesquisava preços e adjudicava as manutenções às empresas mencionadas que praticavam preços superiores aos de mercado.'
5.-Sucede que tal factualidade não foi alegada pelas partes, não consta da nota de culpa, nem da decisão de despedimento, nem do articulado motivador apresentado pela apelada Ré,
6.-Não resultou da prova produzida, ao contrário do sufragado pelo Tribunal a quo.
7.-O Tribunal a quo não cumpriu o princípio do contraditório.
8.-Não foram cumpridos os requisitos do uso do poder-dever estatuído no art.º 72.º do C.P.T.
9.-Os factos que sustenta a decisão que considerou o despedimento lícito não foram alegados, não foram discutidos e não foram contraditados, não sendo relevantes para a decisão de causa e não atenuam a responsabilidade do apelante Autor.
10.-O mesmo acontece quanto aos factos dados como provados nos pontos 50, 56, 57 e 59, da matéria de facto dada como provada na Sentença recorrida, que também não constam da nota de culpa e não atenuam a responsabilidade do apelante Autor.
11.-Deste modo, o Tribunal a quo não podia decidir que existe justa causa para o despedimento do apelante,
12.-O Tribunal a quo ampliou a matéria de facto em violação manifesta do art.º 72.º n.º 1 do C.P.T. e art.º 3.º do C.P.C..
13.- Impondo-se, assim, a declarar a nulidade da Sentença.
14.- A Sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia quanto à questão da violação do direito de defesa por não realização de diligências instrutórias requeridas na resposta à nota de culpa e que não foram realizadas.
15.- O Autor, na sua resposta à nota de culpa, para além de ter requerido a audição de sete testemunhas, requereu que fosse a Administração convocada a juntar toda a documentação que comprove a existência litígio, arbitragem, acção judicial ou de uma forma geral litígio a que se alude no artigo 12.º desta peça sobre o processo aquisitivo ou não existindo que preste essa declaração formal nos autos nos termos que a instrução considere relevantes; e que fosse junto aos autos relatório final integral da auditoria a que se alude nos autos.'
16.-Diligências probatórias são manifestamente pertinentes, uma vez que no que à primeira diligência requerida, é do conhecimento do Autor e demais trabalhadores da empresa, que existe um litígio arbitral entre a Ré e a EGEO, S.A., referente aos custos da empresa, nomeadamente, de manutenção, e condições de aquisição da empresa.
17.-Sendo que, relativamente ao relatório final e integral da Auditoria, uma vez que aludiam os autos a tal auditoria, impunha-se conhecer da mesma, para exercício do cabal direito defesa.
18.-Diligências probatórias que apesar de requeridas pelo Autor, não foram realizadas e o A. não foi notificado dessa decisão
19.-Deve, assim, também nesta parte ser declarada a nulidade da Sentença recorrida, por omissão de pronúncia do Tribunal a quo, nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do art.º 615.º do C.P.C.
20.-Parte da Decisão recorrida, quanto à matéria de facto, não reflecte a totalidade da prova produzida nestes autos, quer a prova testemunhal produzida em sede de 315 audiência de julgamento, quer a prova documental existente nos autos.
21.-Tendo nessa parte, o Tribunal a quo dado como provados factos que não resultam da prova produzida; não deu como provados outros que ficaram provados e que são relevantes para a boa decisão da presente causa e de todas as questões jurídicas submetidas à sua apreciação.
22.-Com efeito, o Tribunal a quo na parte referente ao ponto 10 dos factos provados, não deveria ter dados como provados a disposição legal, uma vez que as disposições legais não são factos.
23.-A matéria supracitada e constante do ponto 10 dos factos provados da Sentença recorrida não constitui um facto, mas uma conclusão.
24.-Ao contrário da fundamentação constante da motivação da Sentença recorrida, quanto a este ponto da matéria de facto, tal matéria não resulta de nenhum acordo alcançado em audiência de julgamento.
25.-As partes em sede de audiência apenas acordaram quanto à data em que foi entregue a carta que determinou a suspensão preventiva do Autor, conforme resulta da gravação áudio de tal diligência, realizada no dia 29.10.2021.
26.-Deste modo, erra o Tribunal a quo ao dar como provado que a suspensão preventiva do A. foi determinada nos termos do art.º 354.º n.º 1 do CT., uma vez que quanto aos requisitos fixados naquela disposição legal, quanto à carta de comunicação de suspensão preventiva não existe qualquer acordo das partes e nenhuma prova foi feita.
27.-Acresce que, a prova produzida nos autos aponta em sentido oposto ao decidido pelo Tribunal a quo, quanto a este ponto da matéria de facto, que a carta de suspensão preventiva não foi redigida nos termos do n.º 2 do art.º 354° do C.T., pelo que
28.-Deve, nesta parte ser alterada a decisão de facto, eliminando-se do ponto 10 dos factos provados que a comunicação foi feita 'nos termos do disposto no artigo 354° n.º 2 do C.T.'
29.-Impugna-se a matéria de facto dada como provada no ponto 33 (primeira parte): No 316 dia 02/01/2020 o autor reuniu com a ré onde foi por esta dito da necessidade de redução de custos na área de manutenção', porquanto
30.-Não existe prova de tal factualidade e ao contrário do sufragado na motivação da decisão sobre este ponto da matéria de facto, não foi alcançado qualquer acordo em audiência de julgamento.
31.-Ao invés, resulta da própria motivação desta decisão da matéria de facto, quanto a outros pontos, que não existe qualquer prova nos autos de que no dia 02 de Janeiro de 2020 a Ré disse ao Autor da necessidade de redução de custos na área de manutenção, nem foi abordada a necessidade de se abrir a manutenção a outros fornecedores, como erradamente dá como provado no ponto 33.
32.-Pois, resulta expresso da ata da audiência de julgamento realizada no dia 22.11.2021.
33.-A matéria constante do ponto 19 dos factos assentes referidos na Despacho de dia 22.11.2021, correspondem na integra à matéria vertida no ponto 33 dos factos provados da Sentença recorrida, pelo que não existindo acordo quanto a esta matéria, errando o Tribunal a quo ao dar como provado tal facto por acordo das partes.
34.-O Tribunal a quo não podia dar como provada tal factualidade, nem mesmo com base no alegado nos dos artigos 136.º ao 141.º da contestação e 62.º do articulado motivador, uma vez que
35.-O Autor em sede de audiência de julgamento realizada no dia 29.10.2021 negou tal facto, conforme gravação que se transcreve.
36.-Erra o Tribunal a quo que ao sufragar que a matéria de facto dada como provada nos pontos 39 resulta de acordo em audiência de julgamento.
37.-Não houve acordo das partes sobre tal factualidade, conforme resulta da gravação da primeira sessão de julgamento, realizada nestes autos no dia 29.10.2021.
38.-A matéria de facto em apreço neste ponto da matéria de facto nunca poderá ser dada como provada por acordo, porque não existiu.
39.-Ao contrário do que faz crer a sentença recorrida, o Autor limitou-se a dar uma opinião, sobre a coincidência de valores, contudo, sem qualquer conhecimento directo dos factos, pelo que, tal matéria não pode ser dada como provada,
40.-Não existe nos autos nenhuma prova sobre tal factualidade, resultando o contrário das declarações do Autor, prestadas na audiência de julgamento realizada no dia 17.01.2022, que se transcreve supra.
41.-Deve, assim, ser alterada a decisão quanto à matéria de facto dada como provada no ponto 39, dando-se como não provada.
42.-A matéria de facto dada como provada nos pontos 48 e 49, esta matéria de facto foi erradamente julgada, uma vez que não reflecte a prova produzida.
43.-Tal factualidade não resulta dos depoimentos das testemunhas BB e CC, nem de qualquer outro elemento probatório.
44.-Nenhuma das identificadas testemunhas depôs sobre qualquer política de contenção de custos no início da nova administração da Ré, muito menos sobre qualquer reunião realizada em Janeiro de 2020, conforme se transcreveu supra.
45.-O Tribunal a quo erra na análise da prova e confunde os factos, desvirtuando e descontextualizando os depoimentos das testemunhas.
46.-Prova produzida nos autos, os depoimentos das testemunhas citadas na motivação, contraria a matéria de facto dada como provada nos pontos 48 e 49 e demonstra precisamente o contrário.
47.-A matéria de factos constante do ponto 50 dos factos provados, 'O A., enquanto chefe do departamento da manutenção, não pedia orçamentos prévio a outros fornecedores, situação que já antes sucedia antes de assumir a direcção desse departamento, na medida em que entendia que não havia fornecedores alternativos aos que seguiam, no mercado, não foi alegado pelas partes, não consta da nota de culpa, nem da decisão de despedimento, nem do articulado motivador apresentado nestes autos pela Ré.
48.-Pelo que, não é admissível ao tribunal a quo em ampliar os factos, em manifesta violação do disposto na arte. 357.º, n.º 4 e 382.º, n.º 1 e 2, al. d) do CT e art.º 3.º do C.P.C.
49.-Erra assim o Tribunal a quo ao dar como provados factos novos, em total violação do direito de defesa do A. e do disposto no art.º artigo 98.º-J n.º 1 do C.P.T,
50.-A matéria de facto constante do ponto 50 dos factos provados constitui um facto novo, que não visa atenuar a responsabilidade do trabalhador e sobre o qual o não foi permitido o exercício do direito de defesa,
51.-Sendo a prova documental existente nos autos, concretamente, as comunicações electrónicas/emails, enviadas e recebidas pelo Recorrente, ainda enquanto Director do departamento de Gestão de Activos/Manutenção, a folhas 201 a 207, 321 a 324, 353, 373, 375, 376, 377 e 378, aponta precisamente em sentido contrário ao decidido pelo Tribunal a quo.
52.-Tal como resulta o contrário do depoimento transcrito de DD prestado na sessão de julgamento de dia 22.11.2021, transcrito supra.
53.-Sendo certo, que a testemunha DD nada sabe relativamente ao procedimento do departamento de manutenção enquanto o Autor foi director do Departamento, nem conhecia a actuação do Autor, conforme resulta do seu depoimento prestado nestes autos
54.-E resulta provado da Certidão de Sentença, transitada em julgado em 12.12.2023, sem interposição de recurso, proferida nos autos de Processo n.º 55103/20.5YIPRT, que correram termos no Juiz 3, do Juízo Central Cível de Loures, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, em que foi Autor a empresa ECT Repair, Lda. e Ré Blueotter Circular, S.A, prova documental junta aos autos, antes da última sessão de julgamento realizada no dia 5 de Junho de 2023, que erradamente não foi valorada, violando A Sentença recorrida disposto no art.º 421° do C.P.C.
55.-Acresce que, resulta das declarações prestadas pelo A., na sessão de julgamento realizada no dia 17.01.2022, precisamente o contrário, conforme se transcreve.
56.-Deste modo, a prova existente nos autos impõe decisão contrária quanto à matéria dada como provada no ponto 50, que se impõe alterar.
57.-Impugna-se a decisão sobre a matéria de facto constante nos pontos 51, 52, 53, 54 e 55 da sentença recorrida,
58.-Pois erra o Tribunal a quo quando considera que tal factualidade resulta dos auditorias físico atestado por EE, ou auditoria financeiro, atestado por FF, uma vez que
59.-A alegada auditoria não está concluída, conforme matéria assente nos pontos 21 e 23 dos factos dados como provados, por acordo das partes.
60.-Não pode o Tribunal a quo dar como provados factos com base num suposto elemento probatório que não existia à data do despedimento, não existia à data dos articulados processuais, não existia à data da realização do julgamento e que continua, na presente data, a não existir.
61.-Não existe qualquer resultado de qualquer auditoria.
62.-Acresce que tal matéria de facto não consta do referido relatório preliminar, nem permite sustentar a decisão ora impugnada e que erradamente foi dada como provada.
63.-A EE não tem qualificações, habilitação, nem experiência profissional, nem a própria empresa da mesma, para atestar se um equipamento foi ou não reparado em determinada data, para fazer qualquer auditoria física ao estado dos equipamentos, conforme se verifica pelo curriculum junto aos autos e as declarações prestadas pela mesma em julgamento.
64.-E resulta provado pela sentença, transitada em julgado, proferida nos autos de Processo n.º 55103/20.5YIPRT, que correram termos no Juiz 3, do Juízo Central Cível de Loures, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, em que foi Autor a empresa ECT Repair, Lda. e Ré Blueotter Circular, S.A, que:' Em suma, por estas ordens de razão, quer o depoimento de EE Weiler quer o Relatório de auditoria, mostram-se incapazes de abalar ou sequer de suscitar dúvida fundamentada quanto à consistência dos elementos probatórios a que supra nos reportámos [testemunhais e documentais] e em que sustentamos a decisão sobre a matéria de facto.'
65.-Acresce que, nos presentes autos, não existe qualquer prova sobre tal matéria de facto.
66.-A testemunha EE não prestou depoimento sobre a matéria de facto constante dos pontos 51 a 55 dos factos provados, conforme se pode confirmar pela audição do seu depoimento gravado prestado na audiência de julgamento de dia 22.11.2021.
67.-Não existe qualquer auditoria financeira.
68.-Tal factualidade não resulta provada do depoimento da testemunha FF, gravado e prestado na sessão de julgamento realizada no dia 22.11.2021, conforme depoimento que se transcreve.
69.-Deste modo, o Tribunal a quo não podia ter dado como provada a factualidade constante dos pontos 51 a 55, uma vez que não existe prova de tais factos, devendo, assim, ser dados como não provados.
70.-Impõe-se alterar a decisão da matéria de facto dada como provada nos pontos 56 e 57 'Em várias situações, concretamente não determinadas, não existia registo do envio dos equipamentos para reparação, nem comprovativos da realização das mesmas;' Em várias situações, concretamente não determinadas, constatou-se que durante a direcção do A., os serviços de manutenção tinham facturas de determinados equipamentos com preços inflacionados e muito superiores aos preços de mercado, com equipamentos que não foram reparados, com tempos de reparação que não correspondem aos reais, com reparações efectuadas que não foram feitas nessa exacta medida não pode constar da matéria de facto provada,
71.-Pois, conforme o Tribunal a quo dá como provado no ponto 58 da matéria de facto que: ' As situações referidas em 56 e 57 nunca foram concretizadas, nem dado conhecimento das mesmas ao A., tão pouco pode o mesmo defender-se em concreto de cada uma apenas se apontando de modo genérico que as mesmas sucederam.'
72.-Perante a matéria/conclusão, vertida no ponto 58 dos factos dados como provados, verifica-se que a matéria constante dos pontos 56 e 57 não podia ter sido dada como prova.
73.-A matéria constante do ponto 56 e 57, não constitui factos concretizados, são meras
conclusões, que nunca foram concretizadas em factos. 321
74.-O A. nunca foi notificado, nem conseguiu perceber que factos concretos lhe estavam a ser imputados, nunca tendo sido possível ao mesmo exercer o seu direito de defesa, nem mesmo em sede de processo judicial.
75.-Acresce que, a prova documental existente nos autos, aponta em sentido totalmente contrário, na justa medida em que resulta provado nos pontos 1, 10,18, 22, 30, 31, 32, 33, 34, 34, 35 e 36 da sentença judicial cível, transitada em julgado do de Processo n.º 55103/20.5YIPRT, que correu termos no Juiz 3, do Juízo Central Cível de Loures, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte.
76.-Mais resulta o contrário da motivação da decisão de facto da referida sentença cível, transitada em julgado e das oito guias de remessa e oito guias de transporte, juntas aos presentes autos.
77.- Pelo que, atenta a violação do princípio do contraditório este ponto/matéria deve ser eliminada da matéria de facto da sentença recorrida.
78.-O mesmo acontece na matéria de facto dada como provada no ponto 59 da sentença recorrida.
79.-A matéria de facto constante no ponto 59, não se encontra concretizada, em modo de tempo e lugar e não foi alegado pela Ré, não constando da nota de culpa e não foi concedido o direito de defesa do A..
80.-O Tribunal a quo erra ao dar esta matéria como provada no ponto 59, que não podia conhecer, e constitui uma nulidade processual insuprível, que expressamente se invoca, para todos os efeitos legais, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do C.P.C.
81.-Acresce que, não existe qualquer prova nos autos sobre essa matéria, não resultando tal matéria provada do depoimento supra transcrito, da testemunha DD, como erradamente entendeu o Tribunal a quo, conforme depoimento transcrito supra.
82.-Não é admissível ao Tribunal a quo alterar e ampliar os factos alegados pelas partes, em manifesta violação do disposto no art.º 357.º, n.º 4 e 382.º, n, ° 1 e 2, al. d) do CT.
83.-Há violação do direito de defesa do Autor e do disposto no art.º artigo 98.º-J n.º 1 do C.P.T, que consagra que no articulado do empregador 'O empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador'
84.-A matéria constante do ponto 59 é nova e encontra-se em contradição com o decido por despacho proferido pelo Tribunal a quo de 29.10.2021 e com a própria motivação da Sentença recorrida conforme excerto que se cita na motivação.
85.-Existe erro na decisão dos factos quanto aos factos dados como provados nos pontos 62, 63, 64 da Sentença recorrida,
86.-Tal factualidade não resulta provada pelo depoimento da DD, nem do depoimento de FF, nem de qualquer outro elemento probatório existente nos autos, conforme transcrições de depoimentos supra citadas.
87.-Impõe-se, assim, a modificação da decisão quanto a estes pontos da matéria de facto, que devem ser julgados como não provados, tanto mais a prova produzida é contrária a esta decisão.
88. Resultando o contrário da certidão da sentença transitada em julgado, proferida nos autos de Processo n.º 55103/20.5YIPRT, que correram termos no Juiz 3, do Juízo Central Cível de Loures, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte.
89.-Quanto à matéria constante do ponto 71 dos factos provados da sentença recorrida erra mais uma vez o Tribunal a quo ao dar como provada, uma vez que
90.-A factualidade constante do ponto 71 dos factos provados não foi alegada pelas partes, não consta da nota de culpa, nem da decisão de despedimento, nem do articulado motivador apresentado pela apelada Ré.
91.-A decisão quanto a este ponto da matéria de facto viola o art.º 72.º do C.PT. e o n.º 4 do art.º 357.º do C.T..
92.-Ao contrário do sufragado na Sentença recorrida, tal matéria não resulta do depoimento da testemunha EE, nem do depoimento de DD, nem da testemunha FF, conforme depoimento transcrito supra.
93.-Acresce que a matéria de facto dada como provada no ponto 71 está em contradição com a matéria dada como provada no ponto 67 da própria Sentença recorrida. 323
94.-E, resulta o contrário da matéria de facto dada como provada nos pontos 1 a 26, 30, 36 da sentença transitada em julgado proferida nos autos de Processo n.º 55103/20.5YIPRT, que correram termos no Juiz 3, do Juízo Central Cível de Loures, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte.
95.-Impondo-se alterar a decisão quanto ao ponto 71 dos factos provados da Sentença recorrida, dando-se como não provados.
96.-Relativamente aos factos não provados, constantes na sentença recorrida, verifica-se que, também, existe erro do Tribunal a quo.
97.-O Tribunal a quo erra ao dar como não provada a matéria constante do ponto 11 dos factos não provados da Sentença recorrida, uma vez que esta matéria resulta provada pelo depoimento da testemunha DD e KK, que se transcrevem supra.
98.-E resulta provado pela por prova documental, concretamente, pelo organigrama da R., dado como assente por acordo das partes, no ponto 29 dos factos provados a informação da sociedade OR... e Associados, junto aos autos pela Ré no dia 04.11.2021, o descritivo de funções constante da página 57, 58 e 59 do processo disciplinar a folhas dos presentes autos, pelo que se impõe, também, modificar a decisão quanto a este ponto da matéria de facto.
99.-Quanto à matéria de facto constante dos pontos 19 a 28 dos factos dados como não provados da Sentença recorrida, erra o Tribunal a quo na sua apreciação e decisão,
100.-Ao contrário do sufragado pelo Tribunal a quo, foi produzida prova quanto a estes factos, conforme se verifica pelo depoimento transcrito da testemunha GG e a ata da reunião de revisão pela gestão, data de 26 de Novembro de 2019, concretamente a folhas 111, 112, 113 e 114, do processo disciplinar, a folhas dos presentes autos.
101.-Pelo que a prova supracitada impõe a alteração na resposta à factualidade ora impugnada, devendo em consequência ser dado como provados os pontos 19 a 28 da matéria de facto não provada.
102.-O Tribunal a quo não se pronunciou quanto a factos alegados pelo Autor e que 324 são relevantes para decidir todas as questões que constituem a causa de pedir e fundamentam os pedido formulados nos presentes autos, nomeadamente, a caducidade do exercício direito disciplinar, dos vícios do processo disciplinar, da violação do direito de defesa, a ilicitude do despedimento do Autor e o reconhecimento do veiculo e telemóvel e valor da retribuição.
103.-Impunha-se ao Tribunal a quo ter dado como provada a matéria de facto alegada nos art.º 5.º e 9.º da contestação, que são relevantes para a apreciação da caducidade do exercício do direito disciplinar.
104.-Ao contrário do sufragado pelo Tribunal a quo, o A. cumpriu o ónus probatório que lhe competia sobre esta factualidade.
105.-O A. logrou provar que o seu empregador e superior hierárquico com poder disciplinar teve conhecimento dos factos em 08 de Maio de 2020, máximo 14 de Maio de 2020, conforme prova testemunhal, declarações de parte e prova documental constante dos autos.
106.-Com efeito, resulta do depoimento gravado da testemunha KK, prestado na sessão de julgamento de dia 22.11.2021, que se transcreve.
107.-Igualmente, resulta provada a referida factualidade pela confissão do representante legal da Ré, seu administrador HH, conforme declarações de parte, prestadas em sessão de julgamento de dia 20.12.2021 e 17.01.2022, que se transcreve.
108.-Mais resulta provado pelo depoimento da testemunha FF, na sessão de julgamento de dia 17.01.2022, que se transcreve.
109.-Resultando, igualmente, demonstrado pelas declarações de parte do Autor, prestadas na mesma sessão de julgamento de dia 17.01.2022, que se transcreve.
110.-Pelo que, devem ser dados como provados os factos constantes nos art.º 5.º e 9.º da Contestação.
111.-Os Factos Alegados nos art.º 82.º, 83.º, 84.º e no ponto 7 do art.º 169.º todos da contestação, são relevantes para apreciação da justa causa de despedimento do A., pelo que se impunha ao Tribunal a quo ter dado como provado.
112.-O conteúdo funcional de cada um dos trabalhadores que integravam o departamento de Gestão de Activos/Manutenção, e não apenas o conteúdo funcional do A., encontra-se provada pelos depoimentos das testemunhas DD e KK, transcritos supra e pelo documento a folhas 57 a 59 do processo disciplinar, a folhas dos autos.
113.-Pelo que devem estes factos ser dados como provados, por serem relevantes para apreciação da causa, uma vez não cabiam no conteúdo funcional do Autor os factos que genericamente foram imputados ao A., para sem justa causa procederem ao seu despedimento.
114.-Deve, assim, ser dado como provado, o conteúdo funcional de cada um dos trabalhadores que integravam o departamento de Gestão de Activos, que também é designado por Manutenção, por ser relevante para aferir da justa causa do despedimento do Autor.
115.-Os factos alegados nos art.º 91.º e 330.º, art.º 336.º e 343.º da Contestação/Reconvenção impõe-se dar como provados atenta a prova produzida nos autos e por serem relevantes para a apreciação da questão do valor da retribuição do Autor, considerando que telemóvel e veículo automóvel fazem parte integrante da mesma.
116.-Factualidade que resultou provada pela prova documental e testemunhal produzida nos autos, citada na motivação supra, pelo que se impunha que estes factos tivessem sido seleccionados e dados como provados.
117.-Pois, a realidade dos factos vai para além da matéria dada como provada no ponto 70 dos factos provados que.
118.-O veículo automóvel e o telemóvel foram atribuídos ao A. para uso pessoal e profissional, como condição da sua admissão e faz parte da sua retribuição base, certa, mensal e fixa.
119.-Condições remuneratória que o A. sempre usufruiu e beneficiou desde o primeiro dia em que foi admitido ao trabalho da Ré e até ao dia em que recebeu a decisão de despedimento, inclusive, durante todo o período em que esteve suspenso preventivamente.
120.-Facto este que resulta provado pela carta enviada pela R. ao A., datada de 2 de Julho de 2008, com o assunto condições de admissão, e que foi junta aos autos sob o documento 1 da contestação apresentada pelo A.
121.-Documento este que foi integralmente confirmado pela testemunha II ouvido na sessão de julgamento realizada no dia 05 de Junho de 2023, conforme depoimento que se transcreve supra.
122.-Pelo que atenta a prova supra citada, a que acresce o email/comunicação electrónica remetida pela Ré ao A., em 4.07.2008, com o assunto carta-conformo, com as mesmas condições de admissão no A., na Ré, a folhas dos autos, junto aos autos por requerimento apresentado em 27.10.2021.
123.-E, o termo de entrega, datado de 6.07.2021, que comprova que à data do seu despedimento o Autor auferia do veículo automóvel com a matrícula ...-ZJ-..., só foi entregue após o seu despedimento.
124.-Dúvidas não podem existir que ficou provada a totalidade da matéria constante do art.º 91.º e 330.º, art.º 336.º e 343.º da contestação/reconvenção,
125.-Pelo que a decisão sobre a matéria de facto deve ser alterada, dando-se esta matéria como provada.
126.-Os factos alegados nos pontos 12, 13 e 14 do art.º 169.º, da Contestação são igualmente relevantes para a decisão da causa e impunha-se terem sido dados como provados pela Sentença recorrida.
127.-Pois, resultam provados pelo depoimento da testemunha GG, prestado na sessão de julgamento de dia 22.11.2021, transcrito supra.
128.-O Facto alegado no art.º 172.º da Contestação resulta provado pelas declarações de parte prestada pelo A, na sessão de julgamento gravada e realizada em 17.01.2022, que se transcreve.
129.-Considera-se, assim, que deve ser dada como provada a factualidade em apreço, constante do art.º 172.º da contestação, por ser relevante para apreciação da justa causa do despedimento.
130.-Errou o Tribunal a quo ao não dar como provada a matéria de facto alegada no art.º 264.º da contestação, uma vez que esta factualidade não foi impugnada pela Ré.
131.-A Ré admitiu que em 14 de Maio de 2020, o funcionário DD substituiu o Autor, pelo que
132.-Não tendo a Réu impugnado tal facto e resultando do processo disciplinar que não houve qualquer justificação para o Autor ter deixado de exercer as funções de Director da Gestão de Activos/Manutenção, em 14 de Maio de 2020, antes de ser suspenso preventivamente,
133.-Impunha-se ao Tribunal a quo, ter dado como provada a factualidade constante o referido artigos 264.º da contestação, o que não fez errando na apreciação da prova e na decisão sobre a matéria de facto.
134.-Pois, tal matéria é relevante para a apreciação das questões jurídicas, submetidas à apreciação do tribunal a quo, nomeadamente, caducidade, violação do dever de ocupação efectiva e justa causa de despedimento.
135.-Deve, assim, ser alterada a decisão da matéria de facto, dando-se este facto como provado.
136.-A Sentença recorrida erra na interpretação dos factos e a na interpretação e aplicação do Direito.
137.-Erra o Tribunal a quo ao decidir que não existe caducidade do exercício do poder disciplinar.
138.-Ao contrário do sufragado na Sentença recorrida ficou provado que a R. em 08.05.2020, máximo 14.05.2020, tem conhecimento dos factos que imputou ao A. na nota de culpa e que determinaram o seu despedimento.
139.-Pois, resulta claro da prova produzida e dos factos provados, que os factos imputados na nota de culpa são os mesmo que a Ré teve conhecimento no dia 08.05 2020, quando a Administradora da Ré determinou a realização da dita auditoria e reuniu com à A. e o confrontou com todos os factos enunciados na nota de culpa.
140.-Não existe qualquer alteração aos factos desde o dia 08.05.202 até ao dia do despedimento.
141.-Está provado que em 08.05.2020 a Ré determinou a realização de uma auditoria à direcção de logística e Gestão de Activos/Manutenção, para analisar procedimentos de contratação.
142.-Esta provado que em 14.05.2020 o A. foi retirado das suas funções de director da área de Gestão de activos/Manutenção.
143.-Pelo que, a simples verificação destes dois factos comprova que a R. teve conhecimento dos factos que determinaram o despedimento do A., em 08 de Maio de 2020, máximo em 14 de Maio de 2020.
144.-O mero conhecimento por parte do empregador da suspeita de comportamentos irregulares do trabalhador, determina o evento que marca o início do decurso de prazo da caducidade do exercício do direito disciplinar.
145.-Pelo que é dessa data que se inicia a contagem do prazo de caducidade do direito ao exercido do disciplinar, ou seja, desde 08.05.2020, máximo desde dia 14.05.2020.
146.-Deste modo, é manifesto o erro de direito do Tribunal a quo ao decidir pela improcedência da invocada excepção de caducidade.
147.-Pois, a data do início da contagem do prazo de caducidade é o dia 08.05.2020, máximo dia 14.05.2020.
148.-A R. não desencadeou o procedimento disciplinar nos 60 dias subsequentes ao conhecimento da infracção, pelo caducou o direito de proceder disciplinarmente contra o A.
149.-Pois, o representante legal da R. confessou, quando ouvido em tribunal que teve conhecimento dos factos entre 8 a 10 de Maio de 2020, conforme depoimento transcrito.
150.-Pelo que, dúvidas não devem existir que, o conhecimento efetivo por parte da entidade patronal com poderes disciplinares é pelo menos desde o dia 08 de Maio de 2020.
151.-Deste modo, e tendo em conta que a sentença recorrida deu como provado que foi no dia 27.07.2020 a data em que o A. recebeu a notificação da instauração disciplinar, com vista ao seu despedimento, acompanhada da nota de culpa, (cfr. Ponto 11 dos factos provados),
152.-Impunha-se ao Tribunal a quo ter verificado que nessa data já há muito que havia decorrido o prazo de 60 dias, para a instauração do processo disciplinar.
153.-Ao contrário do sufragado pelo Tribunal a quo, os factos que fundamentaram o despedimento não são resultado de qualquer auditoria, pois essa até hoje não terminou, conforme se provou.
154.-Pelo que, ao decidir como decidiu o Tribunal não tendo reconhecido a caducidade do exercício do poder disciplinar violou o disposto no art.º 329.º n.º 2 do CT.
155.-Deve ser, assim, revogada a decisão recorrida e alterada por outra que julgue procedente a excepção de caducidade, declarando-se a ilicitude do despedimento do Autor.
156.-Acresce que, existe invalidade do procedimento disciplinar, não declarada pelo Tribunal a quo, em manifesto erro de direito.
157.-Pois, conforme resulta provado nos autos, a Decisão de despedimento foi proferida e notificada ao Autor, sem estarem concluídas as diligências instrutórias realizadas no processo disciplinar.
158.-Resulta da matéria de facto dada como provada nos pontos 24, 25 e 26, da sentença recorrida, que à data em que foi redigido o relatório e proferida a decisão final de despedimento (em 22 de Junho de 2021), as diligências instrutórias realizadas nos autos de procedimento disciplinar ainda não se encontravam concluídas.
159.-Não podia a Ré, no dia 22 de Junho de 2021, sem a assinatura do auto de declarações da testemunha JJ, dar por encerradas as diligências probatórias, quando não estavam encerradas
160.-Não podia, sem a conclusão de todos os elementos probatórios, proceder à elaboração de relatório e proferir a decisão final de aplicação de sanção
161.-O encerramento do processo disciplina, sem a Ré ter aguardado pela assinatura do dito auto de declarações, constitui uma violação do disposto no art.º 356.º do CT,
162.-Pois, a anuência para assinatura em momento posterior, não invalidava a necessidade de a testemunha confirmar o seu conteúdo, com a assinatura.
163.-A conclusão do processo disciplinar e a decisão de despedimento ocorreu em momento anterior à assinatura efectiva de um elemento probatório, que o relatório final enuncia como já existindo, conforme se verifica a folhas 43 e 44 do relatório e conclusões da decisão de despedimento, a folhas 614 e 615 do processo disciplinar junto aos autos.
164.-Deste modo, à data em que foi proferida a decisão disciplinar de despedimento, o processo disciplinar não se encontrava concluído, pelo que é inválida a decisão disciplinar, e consequentemente o despedimento do Autor, o que deve ser declarado.
165.-Acresce que o procedimento Disciplinar também é inválido por Falta de Descrição na Nota de Culpa dos Factos imputados ao Autor.
166.-Invalidade que erradamente não foi decretada pelo Tribunal a quo, decisão que se impõe revogar, uma vez que
167.-Os factos constantes da nota de culpa são conclusivos, não tendo sido imputados ao Autor factos concretos.
168.-Toda a matéria constante da nota de culpa e decisão de despedimento sé genérica e conclusiva.
169.-A Ré não refere na nota de culpa, nem na decisão de despedimento, nem no seu articulado motivador as circunstâncias factuais de modo, tempo e lugar em que supostos factos, não alegados, terão sido praticados pelo Autor.
170.-A nota de culpa e do relatório final, viola em absoluto disposto no n.º 1 do art.º 353.º do Código do Trabalho, pelo que se impunha ao Tribunal a quo ter decretado a invalidade do procedimento disciplinar e a ilicitude do despedimento.
171.-Pois, a descrição das condutas supostamente violadoras de deveres do trabalhador, não pode limitar-se a conceitos genéricos e vagos, sem precisar datas concretas, factos concretos, identificar intervenientes e consequências concretas, como indevidamente a Ré fez, na sua nota de culpa e decisão disciplinar.
172.-A alegação é meramente conclusiva, com ausência total de factos devidamente descritos, constante da nota de culpa, impediu e continua a impedir o Autor exercer regularmente o seu direito de defesa.
173.-Omissão de factos que torna não só ininteligível a nota de culpa, como ilícito o despedimento do Autor.
174.-Ao contrário do sufragado na decisão recorrida, a falta de concretização dos factos não se cinge à matéria constante do art.º 89.º do articulado motivador e aos pontos 56 e 57 da matéria de provados na sentença recorrida.
175.-A ausência de concretização dos factos é transversal a toda a nota de culpa e decisão disciplinar, nomeadamente, a constante no ponto 50 a 55 e 59 dos factos provados na sentença recorrida.
176.-Da forma como foi redigida a nota de culpa, verifica-se que todos os factos estão entroncados e têm a mesma matriz, o que não permite ao Tribunal a quo individualizar um ponto do outro, numa tentativa indevida de sanar uma invalidade insanável, do procedimento disciplinar,
177.-Pois, todos então interligados e todos são omissos quanto à narrativa e enquadramento, em termos de tempo, modo e lugar da sua verificação, das actuações concretas de índole disciplinar assacadas ao A., impedindo o A. de organizar a sua defesa e exercer devidamente o seu contraditório.
178.-Erra, assim o Tribunal a quo ao decretar a invalidade do procedimento disciplinar e ao considerar que existe matéria que se logrou provar e que quanto a se pode ponderar a existência de justa causa,
179.-Pois essa matéria que se logrou demonstrar é conclusiva e não assenta em facto concretos, devidamente circunstanciados em modo de tempo e lugar.
180.-Não podia o Tribunal a quo tentar sanar os vícios do procedimento disciplinar, completando alegação de factos, como fez no ponto 50 e 59 e 71 dos factos provados,
181.-Nem podia o Tribunal a quo tirar ilações de não factos alegados e não concretizados, como o fez violando o disposto no artigo 382.º n.º 1 e 2 alínea a) do C.T. e o direito ao contraditório.
182.-No caso em apreço a nota de culpa é indeterminada e obscura e, nessa medida, prejudicou gravemente o direito de defesa do A., sendo inválida, na sua totalidade.
183.-Pelo que, impõe revogar a decisão do Tribunal a quo, também, quanto a esta questão e determina a invalidade do procedimento disciplinar, e consequentemente a ilicitude do despedimento, com as legais consequências.
184.-Acresce que, consequentemente, erra o Tribunal a quo ao considerar que existe justa causa de despedimento, decisão que se impõe revogar, uma vez que
185.-Toda a decisão do Tribunal a quo, sobre a existência de justa causa, é sustentada em conclusões suportada em alegados facto que não constam no processo, não constam na nota de culpa, não constam na decisão de despedimento e não constam no articulado motivador.
186.-Os factos que sustentaram o raciocínio e a decisão do Tribunal a quo quanto à existência de justa causa, também, não constam da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, da sua própria decisão.
187.-O Tribunal a quo imputa ao A. factos novos, não alegados e não provados, conforme ponto por ponto se demonstrou na motivação
188.-Ao decidir como decidiu o tribunal violou o disposto no art.º 357.º, n.º 4 e 382.º, n.º 1 e 2, al. d) do CT e art.º 98.º-J do C.P.T. e do direito ao contraditório.
189.-A sentença nula por conhecer de factos que não podia conhecer, o que constituiu nulidade da sentença, nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do art.º 615.º do C.P.C.
190.-A ampliação de factos novos prejudiciais ao trabalhador e não alegados pelas partes, está vedado nos termos do n.º 4 do art.º 357.º do C.T. e art.º 3.º C.P.C.
191.-Não existe qualquer facto que permita considerar que existe justa causa e que o despedimento do Autor é lícito.
192.-Pois, todos os factos são genéricos, não existindo qualquer facto concreto que tenha sido alegado na nota de culpa e na decisão disciplinar, que permita aferir de qualquer eventual responsabilidade disciplinar do A.
193.-Não existe qualquer facto imputados ao A. na nota de culpa e em que se sustentou a decisão disciplinar não permitem determinar a justa causa de despedimento, que não existe.
194.-Não resultando dos factos alegados na nota de culpa e decisão disciplinar, e provados na sentença recorria, a verificação de qualquer comportamento do A. que seja integrador da violação de qualquer dever laboral, não tendo ficou provado qualquer ato, erro ou omissão que este tenha praticado e que consubstancie a violação de um dever laboral,
195.-Tal como não ficou provada que o mesmo tenha causado qualquer prejuízo, conforme nessa parte o próprio Tribunal a quo reconhece, ainda que tal desvalorize.
196.-O Tribunal a quo erradamente concluiu que o A. violou o dever de lealdade de forma culposa, com base no errado pressuposto que não ficaram provados nos autos e nem sequer constam do processo.
197.-Acresce que, a Sentença recorrida encontra-se em manifesta contradição com a Sentença transitada em julgado, proferida nos autos de processo cível n.º 55103/20.5YIPRT, que correu termos no Juiz 3, do Juízo Central Cível de Loures, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, e, que foi Autor a sociedade ECT Repair, Lda. e Ré a aqui apelada Beluotter Circular, S.A. junta aos autos.
198.-Pelo que se impõe revogar a Sentença recorrida e declarar que inexiste justa causa para o despedimento do Autor.
199.-Pois, resulta da prova produzida que o Autor sempre agiu de forma diligente, protegendo os interesses da Ré e obedecendo às suas instruções.
200.-Ao longo de 12 (doze) anos de trabalho ao serviço da R. sempre cumpriu os seus deveres laborais, nunca tendo sido sancionado disciplinarmente,
201.-Pelo que, atenta a alegada matéria que sustentou o despedimento A e os factos que resultam da prova produzida nestes autos, verifica-se que não se encontram reunidos os requisitos estatuídos no n.º 1 do art.º 351.º do C.T.,
202.-Pelo que deve a Sentença recorrida ser revogada, declarando a inexistência de justa causa e a ilicitude do despedimento do Autor, com as legais consequências, fixadas no art.º 389.º do C.T..
203.-Por outro lado, erra o Tribunal a quo ao considera que não existe violação do dever de ocupação efectiva do Autor.
204.-Não existe fundamento para em 14.05.2020, o Autor ter sido impedido de exercer as suas funções de director de gestão de activos/manutenção, dois meses, antes de ter sido decretar a sua suspensão preventiva e a instauração do processo disciplinar.
205.-Em 14.05.2020, o Autor foi impedido pela Ré de exercer as funções de director do departamento de gestão de activos/manutenção, sem que para o efeito lhe tivesse sido apresentada qualquer justificação e/ou fundamento.
206.-Igualmente, o Autor não foi informado do fundamento da suspensão preventiva decretada por carta recebida em 27.07.2020.
207.-Suspensão preventiva que se prolongou por mais de um ano, sem fundamento.
208.-Pois, o Autor para além de ser director do departamento de gestão de activos/manutenção era, também, director do departamento de logística, funções que poderia ter continuado a desempenhar.
209.-As funções de director do departamento de logística lhe foram retiradas ao Autor sem qualquer fundamento.
210.-Não existe fundamento e justificação para prolongar a suspensão do Autor por mais de 1 (um) ano.
211.-A suspensão do Autor constitui um ato ilícito e abusivo da Ré, que gera a consequente obrigação de indemnizar o Autor, pelo que Tribunal deveria ter julgado verificada a violação do dever de ocupação efectiva do A. e determinado as suas consequências legais, uma vez que
212.-A Ré obstou culposamente à prestação efectiva de trabalho por parte do Autor, não apresentando qualquer justificação, para o efeito, actuando assim ilicitamente e violando as garantias do trabalhador fixadas na alínea b) do n.º 1 do art.º 129.º do C.T.
213.-O Tribunal a quo ao decidir como decidiu violou o disposto na al. b), do n.º 1, e n.º 2, do art.º 129.º do C.T., pelo que a Decisão recorrida deve ser alterada julgando-se procedente o pedido de condenação da Ré por violação do dever de ocupação efectiva, decretando-se as legais consequências.
214.-Erra o Tribunal a quo ao considerar que tendo sido declarado a licitude do despedimento o valor da remuneração do autor não releva, uma vez que
215.-Para além dos pedidos de condenação das indemnizações devidas por despedimento ilícito, o apelante Autor, também, peticionou indemnização por violação do dever de ocupação efectiva e formação profissional não ministrada.
216.-Ao contrário do sufragado na Sentença recorrida, considerar que os veículos automóveis fazem parte da retribuição não é 'um pedido inconsequente'.
217.-Pois, é com base nesse valor tem de ser calculados os créditos peticionados nestes autos, incluindo o valor da formação profissional não ministrada e que foi erradamente calculada pelo Tribunal a quo, na justa medida em que
218.-Na determinação do valor a pagar a esse titulo, o Tribunal a quo apenas considerou o valor € 4.300, a título de vencimento base, sem contabilizar o valor do carro e do telemóvel que fazem parte integrante da retribuição base do apelante Autor, e que deveria ter acrescido ao referido valor.
219.-Pelo que a Sentença recorrida deve ser revogada, reconhecendo-se que o veículo e o telemóvel atribuídos ao Autor fazem parte integrante da retribuição mensal do Autor e o valor ilíquido da retribuição mensal do Autor é € 4.736,04 (quatro mil setecentos e seis euros e quatro cêntimos), determinando-se as devidas consequências legais, atentos os pedidos formulados nos presentes autos.
220.-O Tribunal a quo ao decidir como decidiu, não atendeu aos indícios existentes na prova produzida e aos factos dados provados, errando a decisão, na interpretação dos factos e na interpretação e aplicação do Direito.
221.-Nestes termos, deve o presente recurso de apelação ser considerado procedente, revogando-se a Sentença na parte recorrida, declarando-se a ilicitude do despedimento do Autor, com total procedência da acção".
Contra-alegou a ré, sustentando que deve ser negado provimento ao recurso e mantida a decisão recorrida.
A Mm.ª Juiz a quo admitiu o recurso, pronunciou-se acerca das invocadas nulidades da sentença pretextando que não foram cometidas e determinou a subida a esta Relação, onde foram com vista ao Ministério Público tendo o Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto sido de parecer no sentido de que a sentença deve ser mantida, com a expurgação dos factos novos (não constantes da nota de culpa).
Apenas o apelante respondeu ao parecer do Ministério Público, reafirmando os fundamentos do recurso.
Colhidos os vistos, cumpre agora apreciar o mérito do recurso, sendo o seu objecto delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente e pelas questões que o tribunal conhece ex officio. Assim, importa conhecer:
i.-das nulidades da sentença;
ii.-da impugnação da decisão proferida acerca da matéria de facto;
iii.-da caducidade do exercício do direito disciplinar;
iv.-da nulidade do processo disciplinar por não estarem concluídas as diligências instrutórias quando da prolação da decisão disciplinar;
v.-da invalidade do procedimento disciplinar por falta de descrição na nota de culpa dos factos imputados ao autor;
vi.-da inexistência de justa causa de despedimento e respectivas consequências;
vii.-da indemnização por violação do dever de ocupação efectiva;
viii.-da indemnização por formação profissional não ministrada;
ix.-dos juros de mora;
x.-da sanção pecuniária compulsória.
***
IIFundamentos.

1.-Factos julgados provados:
"1.-A R. BLUEOTTER - CIRCULAR, S.A. (adiante designada como BO CIRCULAR ou R.) é uma sociedade anónima que se dedica ao exercício da actividade de recolha, transporte, armazenagem, triagem, tratamento, valorização, eliminação e reciclagem de resíduos e subprodutos, qualquer que seja a sua forma ou origem, entre outros;
2.-O trabalhador AA (adiante designado como PV ou A.) exerceu, sob a direcção e autoridade da BO CIRCULAR, as funções de Director de Logística e Gestão de Activos/Manutenção;
3.-A antiguidade do A. remonta a 09.09.2008;
4.-Em 02.01.2019 ocorreu a cisão da EGEO, Tecnologia e Ambiente, S.A. (sociedade cindida), tendo dado origem a duas novas empresas, a EGEO Pressão, S.A. e a EGEO Circular, S.A. (sociedades incorporantes);
5.-O A., que era trabalhador da EGEO, Tecnologia e Ambiente, S.A., no âmbito da referida cisão, passou a integrar os quadros da EGEO Circular, S.A.;
6.-Em 19.07.2019 o Grupo BLUEOTTER adquiriu a EGEO Circular, S.A. e a actual Administração tomou posse;
7.-Em 11.09.2019, e na sequência da acima referida aquisição, a EGEO Circular, S.A. alterou a sua denominação social para BLUEOTTER - CIRCULAR, S.A., denominação actual;
8.-O A. auferia, à data da cessação do seu contrato de trabalho, a retribuição base de € 4.300,00 (quatro mil e trezentos euros);
9.-Mais auferia reembolso de Despesas até ao limite mensal de € 400 (quatrocentos euros); Cartão combustível; Via verde; Chip abastecimento gasóleo;
10.-A Administração da R. determinou e comunicou a suspensão preventiva do A., nos termos do disposto no artigo 354.º, n.º 2, do CT, no dia 24.06.2020 (fls. 385 do PD).
11.-Em 23.07.2020, foi o A. notificado da comunicação escrita da instauração de processo disciplinar com intenção de despedimento, acompanhada da respectiva nota de culpa, por email e por carta registada com aviso de recessão pelo mesmo recepcionada em 27.07.2020 (fls. 387 a 409).
12.-Na empresa em questão não existe comissão de trabalhadores, nem tão pouco o A. é representante sindical, pelo que não houve que enviar cópia daquela comunicação e da nota de culpa a qualquer destas entidades.
13.- Por email de 28.07.2020 e por carta registada recepcionada a 29.07.2020, foi a instrutora notificada da junção de procuração ao PD, mais lhe tendo sido solicitada a consulta do PD (fls. 410 a 414 do PD).
14.-A consulta do PD teve lugar no escritório da instrutora, no dia 30.07.2020 (fls. 413 do PD).
15.-A instrutora foi notificada da resposta à nota de culpa apresentada pelo A. por email remetido pela Ilustre Mandatária do mesmo de 06.08.2020, e por carta registada recepcionada em 07.08.2020 (fls. 415 a 457 do PD).
16.-O A., na sua resposta à nota de culpa, juntou 6 documentos, e requereu as seguintes diligências probatórias:
i)-A produção de prova testemunhal, tendo indicado 7 testemunhas para serem inquiridas;
ii)-'Que seja a Administração convocada a juntar toda a documentação que comprove a existência de litígio, arbitragem, acção judicial ou de uma forma geral litígio ou, não existindo, que preste essa declaração formal nos autos nos termos que a instrução considere relevantes';
iii)-'Que seja junto a estes autos relatório final integral da auditoria a que se alude nos autos'.
17.-Em 12.08.2020 a instrutora notificou, por email, a Ilustre Mandatária do A. do despacho que designava dias e horas para inquirição das testemunhas pelo mesmo arroladas. Mais convidou o A, na pessoa da sua Ilustre Mandatária, a indicar os factos da nota de culpa a que pretendia que fosse inquirida cada testemunha, de forma a não exceder o limite da audição de mais de três testemunhas por cada facto descrito na nota de culpa (fls. 458 a 462 do PD).
18.-Por email de 14.08.2020, a Ilustre Mandatária do A. respondeu ao convite formulado, vindo indicar a matéria relativamente a qual cada testemunha deveria ser inquirida (fls. 463 a 464).
19.-A realização das inquirições requeridas pelo A. na sua resposta à nota de culpa tiveram lugar nas seguintes datas:
i)- 18.08.2020: LL (fls. 465 a 468);
ii)- 08.09.2020, 09.10.2020 e 16.10.2020: BB (fls. 476 a 482, 486 a 492 e 495 a 498, respectivamente);
iii)- 27.11.2020: MM (fls. 503 a 504 do PD);
iv)- 17.06.2021: CC (fls. 524 a 529 do PD);
v)- 18.06.2021: NN (fls. 529-A a 529-D do PD);
vi)- 18.06.2021: EE (fls. 530 do PD);
20.-Todas as inquirições foram agendadas previamente com o acordo da Ilustre Mandatária do A..;
21.-A Administração, no dia 8 de Maio, determinou a realização de uma auditoria, à Direcção de Logística e Gestão de Activos/Manutenção, tendo-se recrutado, na primeira fase, para analisar o cumprimento dos procedimentos de contratação, a OR... & Associados, SROC, Lda.;
22.-Na sequência da resposta à nota de culpa do trabalhador, a ré não determinou a realização de duas diligências probatórias requeridas: a documentação relativa ao litígio e o relatório final da auditoria;
23.-A auditoria supra mencionada ainda não se encontra concluída na presente data (29/10/2021);
24.-A testemunha JJ foi ouvida em sede de processo disciplinar no dia 18/06/2021, na presença dos Ilustres Mandatários do autor e da ré, via inquirição por meios informáticos, não tendo assinado o auto da inquirição no momento por urgência da testemunha em se ausentar/viajar, tendo os Mandatários do autor e da ré acordado que as declarações estavam prestadas e seriam assinadas em momento posterior;
25.-As ditas declarações foram assinadas pela testemunha e remetidas à ré no dia 23/06/2021;
26.-A decisão final de despedimento, acompanhada do relatório e conclusões da instrutora, e da procuração a conferir-lhe poderes para tal, foram remetidos pela instrutora ao A. em 22.06.2021, por email e por carta registada com aviso de recessão;
27.-O trabalhador PV propôs um investimento de cerca de 1,8 milhões de euros em renovação de rolantes e estáticos. A Administração adjudicou cerca de 1,5 milhões de euros de investimento para 2020 a iniciar já em 2019;
28.-O trabalhador PV, enquanto Director de Logística e Gestão de Activos, tinha como principais responsabilidades e tarefas a executar, entre outras funções as de:
Seleccionar transportadores subcontratados;
Coordenar as equipas de recolha e transporte de resíduos;
Gerir a frota afecta à logística;
Elaborar e analisar os indicadores de actividade;
Analisar mensalmente, através de indicadores da área, a operação logística da BO CIRCULAR;
Conhecer os objectivos estipulados para a Direcção de Logística;
Cumprir os objectivos estipulados para a Direcção de Logística;
Fazer cumprir os objectivos estipulados para a Direcção ao longo da estrutura hierárquica;
Gerir os seus fornecedores e subcontratados, aplicando os requisitos do processo de Gestão de Compras definido;
Entender a Política de Qualidade, Ambiente Saúde e Segurança, conhecer os objectivos e Metas da Organização;
Conhecer os aspectos/impactes e perigos/riscos associados às suas actividades;
Conhecer os procedimentos de resposta a emergências relativos às suas actividades;
Cumprir as regras aplicáveis do Sistema Integrado de Gestão Qualidade, Ambiente e Segurança, nomeadamente segregação de resíduos, condução económica, boas práticas no consumo energético, papel e água, uso de EPI e máquinas, respeito da sinalização existente;
Identificar ocorrências e registá-las na intranet;
Promover, por via de sugestões, a melhoria do Sistema Integrado de Gestão;
29.-A ré tinha o organigrama vigente à data de fls. 339 verso dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
30.-O novo colaborador, NN, foi admitido no final de 2019, e foram-lhe atribuídas entre outras funções, as de controlar os custos com pneus e gasóleo da BO CIRCULAR, o que deu origem a reduções de custos de aproximadamente € 20.000 no primeiro semestre de 2020;
31.-O trabalhador PV propôs um investimento de cerca de 1,8 milhões de euros em renovação de rolantes e estáticos. A Administração adjudicou cerca de 1,5 milhões de euros de investimento para 2020 a iniciar já em 2019;
32.-A renovação da frota foi avançando no final de 2019;
33.-No dia 02/01/2020 o autor reuniu com a ré onde foi por esta dito da necessidade de redução de custos na área de manutenção, tendo sido abordada a necessidade de se abrir a manutenção a outros fornecedores e o autor aceite consultar mais prestadores de serviços, e ainda abordada a possibilidade de internalizar alguns serviços da manutenção;
34.-Nessa reunião informal, realizada no dia 02 de Janeiro de 2020, o Autor transmitiu à administração da Ré, quando se falou sobre prestadores de serviços de manutenção de estáticos, que existia um contrato com a ECT, que tinha terminado em meados de 2018;
35.-Os custos da manutenção da ré em 2019 foram os que constam do quadro de controlo de gestão constante do artigo 148° da contestação, e os de Janeiro a Março de 2020 os que constam do quadro do artigo 149.º da contestação;
36.-Durante o período da pandemia, a Ré iniciou os serviços em clientes, que haviam sido aprovados, como investimentos no FAR, entre eles: Docapesca, Ambirevo e Maltibérica;
37.-Todos os Directores, sem excepção, foram alertados, nesta reunião, em Março, para um dever especial de vigilância e de controlo, e de actuarem de forma ainda mais diligente, uma vez que não se perspectivava qual o impacto que a pandemia iria ter na actividade da BO CIRCULAR, sendo expectável uma redução acentuada da actividade, uma diminuição das receitas e, consequentemente, ser posta em causa a capacidade de respeitar os compromissos existentes;
38.-No dia 18/06/2021 a auditoria supramencionada elaborou um relatório de Gestão com o teor de fls. 126 a 141 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
39.-Foram facturados pela Jopaviming à ré em Abril de 2020, 15 (quinze) reparações de equipamento todas no valor de € 2.700,00 (dois mil e setecentos euros) que o autor admite não terem todas custado tal valor, na medida em que o volume dos contentores era distinto
40.-No dia 14 de Maio de 2020 o Eng.º DD assumiu a coordenação da área da manutenção, deixando o trabalhador PV de ter qualquer responsabilidade nessa área;
41.-A Administração da ré enviou em 30/04/2020 e 19/02/2020 ao autor, na sequência do envio deste de imagens de contentores pintados, a mensagem de WhatsApp que consta de fls. 159 dos autos;
42.-A Ré deixou de prestar serviços às empresas do universo Egeo, tendo retirado todos os equipamentos que se encontravam nos clientes;
43.-Em 2020 o número de grandes reparações diminuiu conforme consta do artigo 221° da contestação;
44.-O autor nunca teve qualquer sanção no seu registo disciplinar;
45.-A 14/05/2020 a ré retirou ao autor a coordenação da área de gestão de Activos;
46.-Era, também, a Ré quem sempre suportava todas as despesas de seguros e de manutenção dos veículos automóveis atribuídos, nomeadamente revisões, inspecções e pneus;
47.-O Autor não teve qualquer formação nos últimos anos, pelo menos nos últimos três anos;
48.-Quando se iniciou a nova administração da R. foi adoptada uma politica de contenção de custos;
49.-Esta administração reuniu com vários directores, tendo-o feito em Janeiro de 2020, depois no inicio da pandemia e afirmou a necessidade de planos de contenção, com particular atenção aos custos e à necessidade de autorização para grandes reparações, o que foi reforçado em nova reunião em Março de 2020 onde foi dito para parar com os investimentos e projectos;
50.-O A., enquanto chefe do departamento da manutenção, não pedia orçamentos prévios a outros fornecedores, situação que já antes sucedia antes de assumir a direcção desse departamento, na medida em que entendia que não havia fornecedores alternativos aos que seguiam, no mercado;
51.-Até Maio de 2020, 90% das adjudicações de estáticos/caixas da R., foram efectuadas a duas empresas com sócios relacionados (ECT e RESUP);
52.-uma dessas empresas não tem quaisquer colaboradores ao seu serviço (RESUP) e usa as instalações e funcionários da outra (ECT);
53.-os serviços prestados à BO CIRCULAR representam mais de 80% das receitas do conjunto destas empresas;
54.-os serviços de manutenção no Norte e no Algarve são todos realizados pela RESUP, mas as instalações onde os mesmos têm lugar e os trabalhadores que os efectuam são da ECT;
55.-Toda a equipa de manutenção admitiu que quando adjudica trabalhos à RESUP, os pedidos são efectuados aos colaboradores da ECT, não conseguindo identificar nenhum trabalhador da RESUP;
56.-Em várias situações, concretamente não determinadas, não existia registo do envio dos equipamentos para reparação, nem comprovativos da realização das mesmas;
57.-Em várias situações, concretamente não determinadas, constatou-se que durante a direcção do A., os serviços de manutenção tinham facturas de determinados equipamentos com preços inflacionados e muito superiores aos preços de mercado, com equipamentos que não foram reparados, com tempos de reparação que não correspondem aos reais, com reparações efectuadas que não foram feitas nessa exacta medida;
58.-As situações referidas em 56 e 57 nunca foram concretizadas, nem dado conhecimento das mesmas ao A., tão pouco pode o mesmo defender-se em concreto de cada uma, apenas se apontando de modo genérico que as mesmas sucederam;
59.-Sob a direcção do A. foi emitida em 16/4/2020 de 2020 uma factura da Jopaviming que continha a reparação de 16 equipamentos todos com o mesmo valor, de € 2.700, no total de € 40.000, a qual não corresponde a tal, pois não foram reparados 16 contentores com o mesmo valor;
60.-DD assumiu a 14 de Maio de 2020 a direcção da manutenção, substituindo o A. e a partir desse dia, foram dadas ordens e instruções pela Administração ao Eng.º DD para elaborar um caderno de encargos para colocar a concurso, e até lá consultar, para todas as reparações que surjam, todos os operadores disponíveis no mercado para reparações diárias e grandes reparações e para iniciar a analise a cenários de melhoria de redução de custos á área de manutenção, o que foi feito;
61.-Foi ainda determinada a não aceitação/aprovação de qualquer factura sem nota de encomenda prévia, devidamente precedida de consulta a pelo menos 3 fornecedores, e avaliação prévia de orçamentos para todos os serviços e aquisições de manutenção, mesmo as de baixo valor, o que foi feito e encontrados fornecedores para todo o pais;
62.-Logo no mês de Maio de 2020 os custos da manutenção baixaram de uma média de 280 a 300 mensais para 180 mensais;
63.-Nos meses subsequentes os custos da manutenção reduziram para cerca de metade;
64.-Os custos das reparações baixaram em virtude da consulta ao mercado;
65.-Não foram para reparação contentores que não tivessem essa real necessidade;
66.-A R. pediu a realização de uma auditoria em setembro de 2020 em virtude das elevadas despesas da manutenção, e não tendo as auditorias ainda sido concluídas;
67.-O A. tinha realizado um caderno de encargos o qual nunca foi aplicado por a R. não ter entendido que o mesmo era ajustado às necessidades da empresa;
68.-A R. deixou de prestar serviços às empresas do grupo EGEO pelo que retirou os contentores desse cliente e alocou-os a outros clientes;
69.-O despedimento causou tristeza no A., tornando-se este mais calado, isolando-se, ficando deprimido e tendo perdido peso;
70.-O A. tinha um telemóvel e um veículo automóvel, fornecido pela R., que levava consigo nas suas férias;
71.-A direcção do A. não pesquisava preços e adjudicava as manutenções às empresas mencionadas que praticavam preços superiores aos de mercado;
72.-Antes da contratação do A., a R. enviou a sua proposta de admissão que consta de fls. 469 dos autos, a qual era depois de aceite enviada para os recursos humanos da R. e convertida em contrato de trabalho escrito com essas condições".
2.Factos julgados não provados:
"1.-A BO Circular apresentou tesouraria negativa em 2019, tendo um especial impacto neste indicador os custos da manutenção corrente e das grandes reparações (gestão de activos);
2.-O A. afirmou perante a administração antes de Maio de 2020 que tinha a manutenção bem gerida e que não havia oportunidades de melhoria imediata;
3.-Foram dadas indicações específicas ao A. na reunião com a administração em Março de 2020 para não assumirem novas adjudicações na área da manutenção;
4.-No mês de Abril, em plena pandemia COVID 19, e de menor actividade da BO CIRCULAR, os custos de manutenção subiram para cerca de € 390.000 mensais;
5.-As regras internas da R, determinavam a consulta a pelo menos três fornecedores para se encontrar a solução mais vantajosa;
6.-O facto provado em 59 resultou de estarem com pouca actividade e haver contentores parados no parque;
7.-O valor com reparações diárias representava cerca de 40% do valor total com reparações;
8.-A direcção do A. importou um prejuízo de cerca de 2 milhões de euros à R.;
9.-O A. propôs à R. que deviam ser consultados cinco prestadores de serviços o que não veio a ser acolhido por aquela;
10.-Até 8 de Maio de 2020 nenhuma instrução foi dada ao A. para parar trabalhos em curso ou suspender reparações;
11.-O registo de envio e chegada de equipamentos e os comprovativos das reparações era responsabilidade de OO, o qual nunca questionou o A..;
12.-Existia um orçamento previamente aprovado pela Administração da Ré, para a área da manutenção/Gestão de Activos, que era mensalmente acompanhado, através de relatórios produzidos pelo departamento financeiro;
13.-Relativamente aos alegados aumentos dos custos de manutenção verificados em Abril de 2020, é importante referir o maior aumento verificou-se nos Centros de Triagem (CTR's), onde o custo foi superior ao dobro da média do ano de 2019;
14.-Sendo que um dos fornecedores com maior aumento foi precisamente a Ghoffle que era um fornecedor que estava referenciado para consulta no Caderno de Encargos para a manutenção de estáticos.
15.-Sendo que tal aumento se deveu a uma intervenção urgente, que foi necessária efectuar na prensa do CTR da Trofa.
16.-Importante notar que, também, ocorreram intervenções nos fornecedores MDN, nos CTR's, e Lourimáquinas, com intervenção para substituição de moto diesel, numa giratória que se encontrava em reparação há vários meses.
17.-As áreas mais directamente ligadas à quebra de actividade associado à pandemia, que são as áreas de transporte e logística, registaram redução de custos de manutenção de 34% no caso dos Resíduos Industriais Banais (RIB) e 11% no caso dos SPUS's;
18.-Todas as reparações efectuadas foram previamente aprovadas pela Administração da Ré, encontrando-se o respetivo investimento previsto na FAR;
19.-Em 2016, quando o Autor assumiu Direcção da Gestão de Activos/manutenção, a situação do departamento de manutenção era muito grave, fruto do contexto da crise económica vivenciado em 2011-2015, que provocou uma redução da actividade da sua actividade, Tendo a empresa deixado de reparar grande parte dos seus equipamentos estáticos (contentores, monoblocos e postos fixos).
20.-Nos anos 2016 e 2017, com a retoma da actividade e aumento dos serviços, a área da manutenção registou um elevado número de queixas e reclamações dos clientes e comerciais, relativas aos equipamentos estáticos que lhes eram vendidos;
21.-A maioria das queixas e reclamações estavam relacionada com o mau estado dos contentores e avarias recorrentes nos monoblocos e postos fixos, às quais se somavam as queixas dos planeadores que,
22.-Muitas vezes, não tinham contentores, vazios e em bom estado de conservação, disponíveis para trabalhar.
24.-O cenário acima descrito motivou à data diversas reuniões internas, das quais resultou um plano de intensificação das acções e recuperação dos equipamentos estáticos,
25.-Tendo o mesmo sido incluído no Sistema de Gestão da Qualidade, o qual foi aprovado pela Administração e consta da lista de acções do Sistema de Gestão da Qualidade.
26.-Plano de intensificação das acções e recuperação dos equipamentos estáticos, que se manteve em curso.
27.-Nunca existiu nenhuma indicação para que o plano de intensificação de reparação de contentores fosse abandonado,
28.-Pelo que, o mesmo plano manteve-se em 2020, acrescido da necessidade de mudar a imagem de EGEO para BO CIRCULAR em todos os contentores;
29.-Existem contentores em que a imagem foi já alterada para BO, apesar de necessitarem de reparações várias, e este procedimento não era o que estava a ser seguido, já que sempre que a imagem era alterada, o contentor era reparado;
30.-A paragem do cliente APL levou a que o número de reparações tivesse diminuído".
3.A motivação da decisão.
"Os factos assentes de 1 a 47 dos factos provados resultaram do acordo alcançado em audiência de julgamento e expresso na acta.
O depoimento de DD, que trabalhava com o A. (este era o seu chefe) no departamento, e que veio a assumir o departamento depois da saída deste, esclareceu como tudo funcionava no departamento cuja chefia pertencia ao A. e foi particularmente elucidativo, sendo sempre objectivo e isento.
Explicou que não faziam pedidos de cotações por escrito, mas sim algumas por telefone, e que as duas empresas que tinham a maioria das adjudicações já o tinham, mesmo antes do A. ser o chefe do departamento e que derivava de limitações de mercado que depois se vieram a confirmar inexistir.
Esclareceu ainda o que constatou quando assumiu o departamento: o preço das reparações estava inflacionado, não havia guias de transporte dos contentores para indicar que iam para reparação. Exemplificou com seis facturas de reparações de equipamentos que não tinham sido efectuadas, e ainda as (15/16) facturas de reparações em que cada um tinha o mesmo valor, o que não era possível. E o próprio A. nas suas declarações de parte admitiu que não era possível tal suceder e que não tinha explicação para tal (facto provado em 59), mas quanto às demais, individualmente não concretizadas, o mesmo não sabendo quais eram nunca das mesmas se pode defender, nem apurar o que se passou quanto a tal. Porém, o motivo pelo qual o facto provado em 59 sucedeu não se logrou provar.
Mais explicou as medidas que implementou após assumir a direcção, as consultas ao mercado que fizeram e a consequente diminuição dos custos da manutenção, para quase metade (facto provado em 62 a 64). Explicou ainda DD desconhecer se as grandes reparações diminuíram, mas indubitavelmente o valor unitário das reparações baixou.
Estes factos não foram infirmados por nenhuma testemunha, nem mesmo pelas declarações de parte do A.. E quanto ao relato pormenorizado de EE, que fez uma auditoria física aos contentores e pode analisar os mesmo, o seu depoimento foi revelador e esclarecedor. A testemunha aponta números exactos de contentores, percentagens dos que apesar de terem uma factura alocada não sofreram qualquer reparação, e percentagens dos que sofreram reparação mas sem coincidência com o facturado, e ainda percentagens de contentores que sofreram reparações por valores superiores aos de mercado e apenas uma percentagem de 3% dos contentores que não apresentava qualquer problema. O seu depoimento confirma em parte o de DD, mas vai além deste e refere-se ao que surge alegado na motivação de despedimento como adulteração de documentos, pagamento de serviços inflacionados e de serviços não realizados. Não foram concretizados cada um deles, e podiam ter sido já que os documentos da 'reportagem fotográfica' dessa auditoria assim o permitia. E as declarações de parte do A. afirmam isso mesmo: nunca lhe foram apontadas as situações concretas em que tal sucedeu pelo que nunca se pode defender das mesmas. O que foi igualmente dado por provado nesses termos vagos apurados.
EE, FF e DD explicaram que não havia, em algumas situações, documentos de suporte do envio dos equipamentos para reparações, o que se deu por provado em 56, sendo que nenhuma testemunha infirmou tal depoimento.
Se alguma dúvida existia da necessidade de contenção de custos BB, director comercial da R., deu conta das reuniões da administração com o A., e com outras pessoas, sendo uma reunião generalizada no inicio da pandemia, onde foi frisada a necessidade de contenção dos custos e a necessidade de ser colocado à consideração da nova administração os gastos extraordinários. CC, também esteve na reunião de Março de 2020 onde a necessidade de redução de custos foi a tónica e tem presente ter sido afirmado, de forma clara que os projectos tinham que parar e os grandes projectos e investimentos tinham de cessar. Não tem presente se foi dito de modo inequívoco que as grandes reparações tinham de cessar, e BB ficou com a ideia de ter sido transmitido que tinham de ser autorizadas como resultado de um plano de contenção pelo que se deu tal por não provado, assim como não provado em 10 que nada tivesse sido transmitido ao A. senão em 8 de Maio de 2020.
Tal não contraria o depoimento de KK que afirma que a 8 de Maio foi dito para pararem com a manutenção, e que a 11 de Maio entregaram à administração uma lista com todas as reparações de contentores que tinham efectuado. Na verdade, nas reuniões onde esta matéria foi abordada com a administração esta testemunha não esteve, mas apenas no final da situação. Admite a testemunha que fizeram reparações que para a administração não eram economicamente viáveis, e a partir dessa data passaram a pedir três orçamentos por cada compra. Assim se provando os pontos 48 e 49 dos factos provados.
Nenhuma prova foi feita quanto ao facto não provado em 1 e 4, e elementos contabilísticos que poderiam ter demonstrado tal facto não foram juntos aos autos, nem confirmado por depoimentos nesse sentido.
Nenhuma prova foi feita, de igual modo, quanto ao facto não provado em 2 e 7 pois quanto a tal ninguém depôs.
O resultado das auditorias física atestado por EE, ou auditoria financeira, atestado por FF deixaram claro que existia um exclusivo de adjudicações a duas empresas, o que se deu por provado em 51 a 55 dos factos provados.
A ausência de orçamentos escritos prévios não contraria as normas escritas da empresa pois a fls. 424v e do depoimento de DD, resulta que as empresas que tinham o 'monopólio' das adjudicações eram fornecedores aprovados, assim se dando tal por não provado.
À alegação confusa patente no art. 88 do articulado motivador, substituiu o tribunal face aos depoimentos ouvidos, a sua versão do sucedido, sendo que não havia duvida que se tratava de 16 contentores, e não de 15, e cumprindo espelhar a verdade isso se deu por assente.
O impacto da redução dos custos da manutenção foi atestado por DD, nos moldes já afirmados, mas ainda por FF, que atesta com números tal diminuição antes de após a direcção do A., embora não consiga quantificar o prejuízo que tal importa para a R., assim se dando tal por não provado.
EE explicou a data de quando lhe foi pedida a auditoria, e a mesma se deu por provada, assim como as datas das reuniões, não se apurando nada de concreto que permitisse concluir de forma conclusiva que a 8 de Maio já soubesse e tivesse conhecimento dos factos em apreço;
Que o A. tinha feito um caderno de encargos não houve dúvidas, pois o próprio legal representante da R. o admitiu, mas afirma que este era inútil, desadequado, e não ajustado às necessidades da empresa e por isso nunca foi implementado. E isso se deu por provado em 67 dos factos provados. Porém não se prova que o A. alguma vez tenha sugerido 5 prestadores de serviços pois nenhuma prova foi feita quanto a tal.
Nenhuma prova foi feita quanto à matéria dos factos não provados em 11 a 28.
Quanto aos contentores egeo as testemunhas referem-se a cerca de 90 (PP), mas DD afirma que perderam mas alocaram os contentores a outros clientes, pelo que nada de concreto se provou quanto a estes mas sobretudo não se provou que tendo deixado de ter os contentores tenha deixado de ter necessidade de os reparar em virtude de não estarem funcionais, pois alocou-os a outros clientes, o que foi confirmado por BB. E isso se provou em 68 dos factos provados.
Não se provou que o logótipo fosse pintado de propósito, antes pelo contrário, era pintado aquando da reparação, assim se dando tal por não provado em 29 dos factos não provados.
Por seu turno, e quanto ao ciente APL BB afirma que aproveitaram a paragem de fizeram mais reparações para quando arrancassem os contentores estarem prontos, assim se dando tal por não provado em 30.
QQ, amiga do A. há 20 anos, afirma que o viu mais calado, triste, abatido, deprimido com o sucedido, afastando-se e até tendo emagrecido. O que se deu por assente em 69 dos factos assentes.
Quanto ao uso do telemóvel e veículo automóvel apenas KK sabia que nas férias o A. os levava mas não sabia nada mais sobre tal. E apenas isso foi dado por provado em 70.
À demais matéria ou não se respondeu, por ser repetitiva, ou não ter interesse jurídico, ou por esta prejudicada face ao que se provou (por ex. nos danos não patrimoniais, componentes remuneratórias discriminadas), apenas de dando por assente o que se provou.
Por fim, do resultado da auditoria realizada, do depoimento de EE, DD e FF ficou claro o que repetiram amiúde, que o A., enquanto director, adjudicou às ditas empresas a preços muito superiores aos de mercado, e que não efectuou pesquisa de preços. Estes factos resultaram inequívocos de toda a prova produzida, foi contraditada pelo A., não foi algo de surpresa e do qual o mesmo não se pudesse defender, e entendeu-se relevante aditar tal matéria nos termos do art.º 71.º do CT, o que se fez nos artigos 71 dos factos provados.
O facto provado em 72 resultou do cumprimento do acórdão proferido em sede de recurso que determinou a inquirição da testemunha II como forma de se aferir da impugnação do documento feita pela R., e o facto de o mesmo não se encontrar na sua posse. Segundo a testemunha que contratou o A. esse documento por si elaborado era a proposta que foi enviada ao A. antes da contratação mas que todos os contratos depois reflectiam essa proposta e eram convertidos em contrato escrito".
4.O direito
4.1- As nulidades da sentença.
4.1.1-O apelante invocou a nulidade da sentença por violação do princípio do contraditório, com isso querendo significar que se fundamentou em factos não constantes na nota de culpa.
É certo que em face do estabelecido pelo art.º 357.º, n.º 2 do Código do Trabalho a jurisprudência tende a considerar que na decisão final do processo disciplinar o empregador apenas pode relevar os factos que previamente alegou na nota de culpa e comunicou ao trabalhador, isto tendo em vista permitir-lhe substanciar o exercício do seu direito de defesa, mas não produz inevitavelmente a sua invalidade (total). Assim decidiu, inter alia, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 09-10-2019, no processo n.º 2123/17.8T8LRA.C1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt: "A desconformidade factual entre a nota de culpa e a decisão final que conclui pelo despedimento não conduz, de modo necessário, à declaração de invalidade de todo o procedimento disciplinar, cumprindo averiguar, na economia de ambas as peças processuais, em que factos assenta tal desconformidade e em que medida eles se reflectem no direito de defesa do trabalhador. Detectada uma desconformidade factual entre a nota de culpa e a decisão de despedimento com a identificação de factos novos de natureza não atenuativa da responsabilidade do trabalhador, a consequência a retirar é a da impossibilidade de considerar esses factos na formulação do juízo da justa causa de despedimento. Ou seja, a invalidade do procedimento disciplinar como decorrência da apontada desconformidade factual entre a nota de culpa e a decisão de despedimento, não acarreta que não se pondere se a restante factualidade imputada à trabalhadora justifica ou não o despedimento da mesma".
Por outro lado, seguramente que o mesmo efeito decorre para o caso do despedimento vir a ser judicialmente sindicado, agora por força do estatuído no art.º 387.º, n.º 3 do Código do Trabalho.
Todavia, como também é geralmente referido na jurisprudência, as nulidades da sentença são apenas as típica e taxativamente previstas na lei (o art.º 615.º do Código de Processo Civil); Neste sentido vd. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 17-10-1995, no processo n.º 038719, de 06-05-2010, no processo n.º 4670/2000.S1, 09-02-2021, no processo n.º 7228/16.8GMR.G1.S1, de 09-03-2022, no processo n.º 4345/12.9TCLRS-A.L1.S1, da Relação de Lisboa, de 23-10-2018, no processo n.º 1121/13.5TVLSB.L1-1, de 26-06-2023, no processo n.º 12223/16.6T8PRT.P2, da Relação de Coimbra, de 20-01-2015, no processo n.º 2996/12.0TBFIG.C1 e da Relação de Guimarães, de 04-10-2018, no processo n.º 1716/17.8T8VNF.G1 e de 23-04-2020, no processo n.º 109506/18.8YIPRT.G1, todos publicados em http://www.dgsi.pt. e aí não se prevê que a situação em apreço seja uma dessas causas, Neste sentido, vd. o acórdão da Relação de Coimbra, de 20-11-2014, no processo n.º 265/13.8TTVIS.C1, publicado em http://www.dgsi.pt. embora, como está bem de ver, isso não signifique que não possa e deva ser objecto de apreciação na apelação, seja em sede de impugnação da decisão da matéria de facto, seja da matéria de direito.
Daí que e em conclusão se diga que este fundamento não constitui causa para nulidade da sentença; que todavia poderá (rectius, deverá) ser apreciado no lugar próprio, independentemente da circunstância de nele ter ou não sido invocado uma vez que a errada qualificação jurídica proposta pelas partes aos factos não vincula o Tribunal
Note-se que o apelante qualifica ainda o relevo dado na sentença ao facto provado 59 como nulidade processual prevista no art.º 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil, mas como está bem de ver nessa norma apenas se prevê uma nulidade da sentença e não do processo (estas têm assento nos art.os 186.º e seguintes do Código de Processo Civil), pelo que tudo não passará de um lapso discursivo do apelante que não demanda mais considerações.
4.1.2-O apelante invocou ainda a nulidade da sentença por omissão de pronúncia relativamente à violação do direito de defesa por não realização de diligências instrutórias requeridas na resposta à nota de culpa, a saber, (i) junção ao processo disciplinar de comprovação de litígio sobre o processo aquisitivo (judicial ou não) ou informação da sua inexistência e (ii) relatório final integral da auditoria a que nela se aludia.
No que concerne à primeira omissão, o apelante invocara na nota de culpa e na contestação ao articulado motivador do despedimento que a apelada juntasse ao processo disciplinar toda a documentação que comprovasse a existência de qualquer litígio, judicial ou não, relativamente à matéria que invocara no art.º 12.º da sua resposta à nota de culpa da nota; a isso a apelada respondeu que existia uma arbitragem sobre matérias que reputou confidenciais, por um lado, e que não estavam relacionadas com os factos em causa, juntou declaração nesse sentido a folhas 522 do processo disciplinar e considerou realizada a diligência probatória requerida.
Por sua vez, da sentença consta o seguinte:
" Questões a decidir:
a)-Das irregularidades e caducidade invocada pelo A. como sendo fundamento de nulidade do processo disciplinar
(…)
Mais invoca o A. que as diligências probatórias ainda não estavam concluídas aquando da prolação da decisão.
O art.º 356.º do CT estatui que:
O empregador, por si ou através de instrutor que tenha nomeado, deve realizar as diligências probatórias requeridas na resposta à nota de culpa, a menos que as considere patentemente dilatórias ou impertinentes, devendo neste caso alegá-lo fundamentadamente por escrito.
Vejamos.
De harmonia com o disposto no artigo 382.º, n.º 2, do Código de Trabalho o procedimento disciplinar é inválido, se:
a)-Faltar a nota de culpa, ou se esta não for escrita ou não contiver a descrição circunstanciada dos factos imputados ao trabalhador;
b)-Faltar a comunicação da intenção do despedimento junto à nota de culpa;
c)-Não tiver sido respeitado o direito do trabalhador a consultar o processo ou a responder à nota de culpa ou, ainda, o prazo para resposta à nota de culpa;
d)-A comunicação do trabalhador da decisão de despedimento e dos seus fundamentos não for deita por escrito, ou não esteja elaborada nos termos do n.º 4 do artigo 357.° ou do n.º 2 do artigo 358.º.
Resulta assente que foi feita nota de culpa, por escrito, com direito do trabalhador a responder à mesma e a comunicação de despedimento foi feita por escrito. Se estava ou não o depoimento escrito de uma testemunha é algo que não é relevante, pois na verdade a entidade empregadora não é obrigada a efectuar todas as diligências probatórias requeridas. Mas mais se diga. Raia a má fé a invocação do A. quanto a qualquer irregularidade neste tocante. Pois o que se provou foi que a testemunha prestou o seu depoimento mas não o pode assinar de imediato por estar a ir de férias mas fê-lo posteriormente (embora as declarações tivessem sido emitidas antes da decisão se proferida).
Não existe pois qualquer irregularidade, nem a entidade empregadora seria obrigada a ouvir todas as testemunhas arroladas".
A Mm.ª Juiz a quo sustentou a inexistência desta nulidade nos seguintes termos:
"Por fim refere omissão de dever de pronúncia quanto, cremos, ao facto de o tribunal não se ter pronunciado sobre diligências que requereu na resposta à nota de culpa.
Porém, salvo o devido respeito, cremos que o tribunal está vinculado a responder a questões colocadas no processo judicial e não no processo disciplinar. E estas foram respondidas. Se as diligencias que o A. pretendia ver efectuadas eram essenciais deveria ter requerido as mesmas no processo judicial na sua contestação. O que não fez. Nessa medida nada foi omitido sendo uma surpresa tal alegação de omissão que nunca antes foi levantada.
Por tais motivos creio que inexista qualquer nulidade, mas V. Exas melhor decidirão".
Olhando à sentença constata-se que embora tenha apreciado irregularidades do processo disciplinar nada disse especificamente quanto à questão em apreço da requerida comprovação no processo disciplinar da existência de litígio sobre o processo aquisitivo na apelada (judicial ou não) ou, sequer, da prestação de informação por esta acerca da sua inexistência. Por conseguinte, salvo o devido respeito crê-se que nessa medida a sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia, pois que se é apodíctica a afirmação da Mm.ª Juiz a quo segundo a qual "o tribunal está vinculado a responder a questões colocadas no processo judicial e não no processo disciplinar" (desde logo porque bem pode acontecer que tendo o trabalhador invocado em sua defesa determinado facto no processo disciplinar o não faça na acção judicial por naquele ter visto demonstrada a sua irrealidade), já o mesmo se não pode dizer quanto a isso não ter sido trazido à acção, como se comprova pelo segmento da contestação do apelante "c) Da Violação do direito de defesa" composto pelos art.os 27.º a 30.º.
Conclui-se, pois, que a sentença omitiu pronúncia acerca dessa questão, ainda que apenas em parte já que a apelada declarou no processo disciplinar que efectivamente corria um processo de arbitragem sobre a temática em causa (declaração a fls. 522 e 523 do mesmo).
Apreciemos então se essa omissão tem como efeito produzir a nulidade da sentença (art.º 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil).
Preliminarmente dir-se-á que a apelada justificou no processo disciplinar a razão de assim proceder: é que, argumentou, (i) incidindo a arbitragem sobre matérias confidenciais, em nada estão relacionadas com os factos imputados ao trabalhador em sede de nota de culpa e (ii) por outro lado, os termos em que a Declaração foi exarada pela Administração da BO Circular cumpriram os requisitos necessários para se poder ter por cumprida a diligência.
Indo ao caso concreto, dir-se-á que há um ponto de compreensão para a atitude da apelada não querer juntar os documentos (na prática, seria o processo arbitral): é que tratando-se de uma arbitragem, naturalmente que nesse processo impera o dever de sigilo, mesmo para as partes (art.º 30.º, n.º 5 da Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro).
Acresce que tratando-se de documentos da própria apelada ou que lhe foram dirigidos por terceiro, tinha a mesma deles conhecimento, pelo que a sua não junção em nada comprometeria o direito de defesa do apelante; como decidiu em caso similar o acórdão da Relação do Porto, de 30-11-2015, no processo n. º 829/15.5T8MTS-A.P1, publicado em http://www.dgsi.pt, "os registos biográfico e disciplinar da trabalhadora cuja junção foi por esta requerida na resposta à nota de culpa reportam-se a factos que já são do conhecimento do empregador, pelo que a omissão da realização de tal 'diligência' não seria susceptível de determinar a invalidade do procedimento disciplinar".
Finalmente, o apelante alegou no art.º 12.º da resposta à nota de culpa que "Desde a transmissão da EGEO CIRCULAR, S.A., para o grupo BLUEOTTER, que é do conhecimento dos trabalhadores que há um diferendo entre essas sociedades, em virtude dos termos e condições do negócio celebrado, relacionados com custos, trabalhadores e clientela transmitida e não transmitida" e no art.º 16.º que "Os problemas que existem presentemente na vida das empresas, como aqueles que recentemente tem vindo a público, veja-se https://www.publico.pt/2020/07/30/economia/noticia/adc-acusa-seis-empresas-gestao-residuos-acordo-nao-concorrericia-1926498, nada têm nada tem haver com os actos do Arguido e será, outrossim, fácil de perceber que serão uma pequena amostra do que se refere em 12.º supra e que o povo usa dizer "zangam-se as comadres descobrem-se as verdades", pelo que sempre seria completamente irrazoável pretender demonstrar com a junção ao processo disciplinar de todo um processo arbitral que os factos nele alegados nada têm que ver com este. E mais: mesmo que tenham, e é mais que provável que em parte isso se verifique, não se percebe em que medida o assim anunciado âmbito do processo arbitral provaria a inocência do apelante no processo disciplinar; e assim é desde logo porque o próprio apelante disso não esclareceu, não só na resposta à nota de culpa como também na presente acção, sendo certo que, como enunciou a sentença recorrida, o empregador não é obrigado a realizar as diligências de prova requeridas pelo trabalhador que fundamentadamente tenha por impertinentes ‒ como ocorreu no processo disciplinar.
Por outro lado, o apelante invocou a nulidade da sentença por omissão de pronúncia relativamente à violação do direito de defesa por não realização de diligências instrutórias requeridas na resposta à nota de culpa relativamente à junção do relatório final integral da auditoria a que nela se aludia e sobre isso vale aqui, mutatis, mutandis, o que atrás se disse, apenas com um pormenor diferenciador: é que se é verdade que a questão foi suscitada na resposta à nota de culpa e na contestação ao articulado motivador, também é verdade que por diversas vezes a apelada foi informando no processo disciplinar que a auditoria ainda não estava concluída (folhas 508, 509, etc.); e se não estava concluída, claro está que a apelada também a não podia juntar ao processo disciplinar!
Em resumo, embora tendo omitindo pronúncia sobre essa questão, a sentença não é nula pois que outra coisa não poderia a Mm.ª Juiz a quo ter dito que não fosse isto mesmo.
4.2A impugnação da matéria de facto.
4.2.1-Pretende o apelante que se expurgue do facto provado 10 a disposição legal dele constante por não ser um facto.
Do julgado provado em 10, que corresponde ipis verbis ao art.º 10.º do articulado motivador do despedimento, consta o seguinte:
"10. A Administração da R. determinou e comunicou a suspensão preventiva do A., nos termos do disposto no artigo 354.º, n.º 2, do CT, no dia 24.06.2020 (fls. 385 do PD)".
É apodíctico dizer que as disposições legais não são factos (vale aqui a terceira regra da lógica aristotélica comummente designada por tertium non datur) e por isso não podem ser objecto de prova (art.º 410.º do Código de Processo Civil).
Todavia, independentemente daquilo que efectivamente as partes acordaram no início da 1.ª sessão da audiência de julgamento, Importa dizer que não tendo sido arguida nenhuma desconformidade nem a falsidade da acta, esta vale pelo seu próprio conteúdo é irrelevante o que sobre isso alega e conclui o apelante (art.º 155.º, n.os 5 a 9 e 451.º, n.º 2 do Código de Processo Civil). a verdade é que da acta consta que as partes acordaram acerca dessa questão, Diz a acta, na parte relevante: "De seguida, foi dado como assente por acordo das partes, a seguinte matéria de facto: (…) 5. Artigo 10.º do Articulado de Motivação do Despedimento". pelo que tal não poderia deixar de ser julgado provado pelo Tribunal a quo. Art.º 607.º, n.º 5, in fine do Código de Processo Civil. E para além disso do processo disciplinar resulta que em 24-06-2020 a apelada entregou ao apelante o documento de folhas 385 do qual consta "Exm.º Senhor, Atenta a gravidade dos factos que chegaram ao nosso conhecimento, durante o inquérito à área de manutenção, com confirmados e declarados actos de ausência de gestão e gestão contrária aos interesses da empresa, determinou a Administração da Blueotter Circular, S,A. a suspensão preventiva, nos termos do disposto no artigo 354.º, n.º 2, do Código do Trabalho, dada as funções que desempenha, e a natureza dos indícios de facto que lhe são imputáveis"; e o apelante declarou e assinou esse documento nessa data e nele manuscrevendo ainda "tomei conhecimento".
Assim sendo, não há dúvida de que a apelada determinou e comunicou a suspensão preventiva do apelante naquela data e nos termos daquele dispositivo legal e isso, naturalmente, é um facto (e provado nos termos referidos na decisão recorrida, sendo certo que em todo o caso sempre estaria ex vi dos art.os 374.º, n.º 1 e 376.º, n.os 1 e 2 do Código Civil); coisa diferente é saber se aquela comunicação correspondeu ao conteúdo daquele dispositivo legal, o que já é uma questão de direito, é certo, mas que não foi objecto desse julgamento (repare-se bem: o que está provado é que a apelada determinou e comunicou a suspensão nos termos do normativo em causa e não que o conteúdo desse normativo foi observado; tal como se alguém afirmar que no art.º 1.º da Constituição consta que Portugal é uma república é um facto e verdadeiro; se disser que essa norma refere que é uma monarquia também é um facto, mas falso).
Nesta parte não pode, pois, conceder-se a apelação do autor.
4.2.2-O apelante impugnou também a decisão que julgou como provado o segmento inicial do facto 33, que pretende se julgue não provado, o qual refere o seguinte:
"33.- No dia 02/01/2020 o autor reuniu com a ré onde foi por esta dito da necessidade de redução de custos na área de manutenção…".
O facto foi julgado provado, por acordo das partes, conforme consta da motivação da decisão da matéria de facto A qual refere: "Os factos assentes de 1 a 47 dos factos provados resultaram do acordo alcançado em audiência de julgamento e expresso na acta". e da acta da sessão da audiência de julgamento que decorreu no dia 29-10-2021, pelas 09:00 horas, na qual a Mm.ª Juiz a quo referiu:
"(…)
De seguida, foi dado como assente por acordo das partes, a seguinte matéria de facto:
(…)
19.- No dia 02/01/2020 o autor reuniu com a ré onde foi por esta dito da necessidade de redução de custos na área de manutenção, tendo sido abordada a necessidade de se abrir a manutenção a outros fornecedores e o autor aceite consultar mais prestadores de serviços, e ainda abordada a possibilidade de internacionalizar alguns serviços da manutenção;
(…)".
Todavia, após reclamação da apelada a Mm.ª Juiz a quo proferiu o seguinte despacho na sessão da audiência de julgamento seguinte, realizada no dia 22-11-2021, pelas 09:00 horas:
(…)
No mais rectifique-se a acta em conformidade e quanto ao ponto 19 dos factos assentes tem razão o autor e o facto não foi dado por assente por acordo, mas sim pelo Tribunal, devendo ficar a constar em acta que o Tribunal entendeu dá-lo por assente em virtude dos artigos 136.º ao 141.º da contestação e 62.º do articulado motivador".
Em suporte da sua pretensão o apelante alegou e concluiu que negou o facto na sessão da audiência de julgamento ocorrida no dia 29-10-2021 conforme gravação que disse transcrever (embora se deva dizer que a transcrição não é de qualquer prova produzida na audiência de julgamento, mas de diálogo entre a Mm.ª Juiz a quo e a Ilustre Mandatária do apelante).
Deste modo, porque controversa a questão importa apreciá-la e decidi-la, sendo certo que a apelada alegou no articulado motivador do despedimento que:
"62.º
Dia 2 de Janeiro de 2020, na primeira reunião do ano 2020, a Administradora RR fez uma reunião/almoço de trabalho com o trabalhador PV, onde discutiu oportunidades de melhoria de redução de custos, na área de Logística e Manutenção, tendo-se seleccionado como prioridades a redução de custos na área de manutenção, especificamente a abertura da manutenção a outros fornecedores, e a implementação de um plano de internalização dos níveis mais simples da manutenção (nível I e nível II)".
Por seu turno, o apelante alegou na respectiva contestação:
"65.º
Impugna, por ser falsa, a matéria, alegada nos artigos 38.º a 59.º, 61.º a 148.º do articulado de motivação do despedimento".
Porém, alegou igualmente nesse articulado:
"136.º
Quanto à matéria constante dos artigos 61.º a 70.º da motivação do despedimento, diga-se que apenas no dia 02 de Janeiro de 2020, foi realizada a primeira reunião em que foram abordados cenários para reduzir custos de manutenção"
Temos assim, portanto, que o apelante não impugnou propriamente antes confirmou (confessou) o segmento impugnado do facto julgado provado, pois que se antes disse genericamente que negava a sua veracidade, adiante especificada e motivadamente afirmou a sua realidade pelo que não poderia deixar de ser julgado provado atendendo ao estatuído nos art.os 573.º, n.º 1 e 574.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo Civil; e por isso não interessa ao caso analisar o que sobre essa temática declarou na dita sessão da audiência de julgamento. É que estando o facto já provado sobre ele não poderia sequer incidir qualquer produção de prova, pois que dela não carecia (cfr. art.º 410.º do Código de Processo Civil).
Mas ainda que assim não fosse, o que se admite por necessidade de raciocínio, a verdade é que o autor não especificou qualquer prova que impusesse decisão diferente da recorrida, pelo que sempre a impugnação teria que naufragar em consonância com o estatuído pelo art.º 640.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil.
Por fim e em reforço final da apreciação desta questão sempre seria de relevar que não obstante tudo o que atrás se referiu ainda assim o apelante confirmou a realidade das coisas nas suas declarações de parte, como se vê das passagens especificadas pela apelada dos 56:10 ms aos 57:30 ms; Assim: J: "Porque é que o Senhor não faz consultas ao mercado? (….) Eng.º AA, eu preciso de perceber isto… com a minha inteligência mediana, preciso de perceber porque é que o senhor não faz com um bom pai de família faz na sua casa. O senhor tem um departamento que tem os maiores custos que há; aquilo está a disparar, tem que reduzir; ninguém sabe como é que vai ser a economia naquele momento, ninguém sabe; e o que o senhor diz é 'ah, eu não consigo encontrar uma empresa tem que ser uma para o país inteiro!'; Explique-me lá como é que isto faz sentido?"; A: "Oiça uma coisa, a questão do caderno de encargos, ele surge antes do COVID. Eu quando entreguei o caderno de encargos à administração, quando dei conhecimento do caderno de encargos, nós não estávamos em COVID, isso aconteceu em Janeiro, no início do ano. Isso não se passou na altura do COVID"; J: "O que é que o senhor faz para reduzir custos, na sequência dessas reuniões em que lhe dizem: 'É preciso reduzir custos'. O que é que o senhor faz?"; A: "O meu primeiro foco na manutenção é reduzir custos de manutenção fazendo uma manutenção melhor, garantindo que os equipamentos avariam menos vezes, que as reparações são mais eficazes, que o equipamento passado uma semana ou duas semanas de ser reparado não está novamente com os mesmos problemas de avaria. O meu foco… o meu enfoque na manutenção sempre foi muito nesse sentido". e ainda noutro contexto da impugnação mas de qualquer modo relevável nos termos do art.º 640.º, n.º 2, alínea b) do Código de Processo Civil, também resulta das passagens dos 49:37 ms aos 49:49 ms. Passagens que, com data venia à apelada, se transcreve: J: "Mas quando vem a nova administração, começa a reunir com o senhor e a dizer: 'Olhe, precisamos de controlar custos', porque é que o senhor não disse: 'Mas eu até tenho aqui um caderno de encargos'?"; A: "Mas eu disse. Disse e forneci esse caderno de encargos". É certo que as declarações de parte não valem como confissão e por isso não têm força probatória plena, mas ainda assim podem e devem ser livremente apreciadas (art.º 466.º, n.º 3 do Código de Processo Civil); e porque vão em sentido desfavorável ao declarante e não existindo qualquer outra prova a apontar em sentido diverso que por qualquer forma abalasse a sua força probatória, sempre empurraria a solução no sentido propugnado pela decisão impugnada.
4.2.3-O apelante impugna também a decisão que julgou provado o facto 39, pretendendo que se julgue como não provado, o qual reza assim:
"39.- Foram facturados pela Jopaviming à ré em Abril de 2020, 15 (quinze) reparações de equipamento todas no valor de € 2.700,00 (dois mil e setecentos euros) que o autor admite não terem todas custado tal valor, na medida em que o volume dos contentores era distinto".
Para tal negou ter acordado sobre isso na audiência de julgamento e especificou passagens das declarações de parte que prestou no dia 17-01-2022.
A decisão do facto seguiu o padrão atrás assinalado, conforme consta da motivação A qual refere: "Os factos assentes de 1 a 47 dos factos provados resultaram do acordo alcançado em audiência de julgamento e expresso na acta". e da acta da sessão da audiência de julgamento que decorreu no dia 29-10-2021, pelas 09:00 horas, na qual a Mm.ª Juiz a quo referiu:
"(…)
De seguida, foi dado como assente por acordo das partes, a seguinte matéria de facto:
(…)
25.- Foram facturados pela Jopaviming à ré em Abril de 2020, 15 (quinze) reparações de equipamento todas no valor de € 2.700,00 (dois mil e setecentos euros) que o autor admite não terem todas custado tal valor, na medida em que o volume dos contentores era distinto;
(…)".
Porém, nesta parte o apelante não arguiu qualquer desconformidade no teor da acta nem arguiu a sua falsidade, pelo que a mesma tem força probatória plena relativamente aos factos nela atestados (art.os 155.º, n.os 5 a 9 e 451.º, n.º 2 do Código de Processo Civil e 371.º do Código Civil) e em conclusão daí decorre que o facto não poderia depois deixar de ser considerado como provado na sentença (art.º 607.º, n.º 5, in fine do Código de Processo Civil).
De todo o modo, a verdade é que sempre assim seria tendo em conta a passagem do depoimento das declarações de parte que o apelante prestou no dia 17-01-2022 constante entre os 30:50 ms e os 31:00 ms e que o mesmo especificou na apelação. Veja-se: quando sobre isso questionado pela Mm.ª Juiz a quo (ou seja, não lhe ter causado estranheza o valor das 15 reparações ser sempre o mesmo) o apelante disse "causou, causou, causou estranheza vamos lá ver, causou estranheza, eu sei que os contentores não podem ter custado todos o mesmo valor. Aliás, eu já disse isto nos autos, isso está aí escrito"; o que vai em linha com o que acerca disso também foi dito pela testemunha DD.
Em suma, também nesta parte se não concede a apelação do autor.
4.2.4-O apelante impugna também a decisão que julgou provados os factos 48 e 49, pretendendo que seja julgados como não provado. Deles consta o seguinte:
"48.- Quando se iniciou a nova administração da R. foi adoptada uma politica de contenção de custos;
49.- Esta administração reuniu com vários directores, tendo-o feito em Janeiro de 2020, depois no inicio da pandemia e afirmou a necessidade de planos de contenção, com particular atenção aos custos e à necessidade de autorização para grandes reparações, o que foi reforçado em nova reunião em Março de 2020 onde foi dito para parar com os investimentos e projectos".
Para tal especificou passagens dos depoimentos prestados pelas testemunhas CC (entre os 05:17 ms e os 10:20 ms) e BB (entre os 04:27 ms e os 18:50 ms) na audiência de julgamento, que também transcreveu.
A Mm.ª Juiz a quo também motivou a decisão proferida acerca desses factos nos depoimentos das referidas testemunhas.
Importa preliminarmente dizer que a parte dos factos impugnados respeitante ao próprio apelante teria sempre que ser julgada provada tendo em conta o acordo das partes nos articulados e as próprias declarações de parte do apelante prestadas na audiência de julgamento, tal como atrás se referiu no item 4.2.2 (a propósito da apreciação da impugnação da decisão referente ao facto provado 33). A questão coloca-se, portanto, apenas quanto a saber se a administração também reuniu e quando com outros directores além do apelante com a apontada finalidade de contenção e de redução de custos.
Ora, ouvidas as passagens especificadas pelo apelante ficou claro que relativamente a este aspecto ambas as testemunhas afirmaram saberem, por conhecimento directo, que isso ocorreu (também participaram em algumas dessas reuniões), mas no início da pandemia, tendo inclusivamente a testemunha BB afirmado que tal correspondeu ao início do mês de Março de 2020; o que em todo o caso por se tratar de facto notório não carecia de ser alegado e provado (art.º 412.º, n.º 1 do Código de Processo Civil). Mas ao contrário do pretendido pelo apelante resulta claro dos depoimentos das ditas testemunhas que nas reuniões a apelada pretendia que os custos fossem reduzidos e também que os grandes projectos parassem ou fossem analisados (assim, quanto à testemunha CC, desde logo a passagem aos 05:21 ms: "Não me recordo o que é que foi dito concretamente ao Sr. AA, foram calls, em que estavam vários directores, portanto, mas houve um conceito generalizado de, temos de olhar a custos, tudo o que são grandes projectos vão ter que parar ou ser analisados primeiro, ou têm que ser falados, tudo o que são grandes custos, e, e tem que se olhar a custos no dia-a-dia…"; e quanto à testemunha BB, a passagem aos 06:19 ms: "Aquilo que me foi dito, aquilo que me foi dito à minha frente era, atenção aos custos para todos os responsáveis das áreas"; a dos 06:37 ms: "Foi abordado, atenção às reparações, atenção às reparações e vamos fazer aquelas que sejam estritamente necessárias, na altura, isso foi transmitido"; reafirmada aos 07:43 ms: J: "Certo, mas em todo vamos lá ver, foi atenção aos custos e atenção às grandes reparações, é isso?"; T: Sim, exactamente").
Todavia, importa dizer que as testemunhas não negaram que outras reuniões pudessem antes ter ocorrido com o apelante (a testemunha BB até o admitiu na passagem dos 06:14 ms. O que em todo o caso, mesmo que tivessem negado a ocorrência dessas outras reuniões ‒ e, portanto, a de Janeiro de 2010 ‒ isso seria irrelevante tendo em conta dois aspectos: (i) por um lado o que atrás se disse quanto a esse ponto já estar provado, por outro (ii) isso ter sido afirmado pelo próprio apelante em declarações de parte); e a motivação da decisão também não pretendeu que aquelas testemunhas afirmaram que o segmento probando do facto impugnado não ocorreu ‒ pelo contrário, até referiu expressamente que as coisas se passaram conforme o depoimento das ditas testemunhas (que assim é resulta evidente da motivação da decisão. Assim: "Se alguma dúvida existia da necessidade de contenção de custos BB, director comercial da R., deu conta das reuniões da administração com o A., e com outras pessoas, sendo uma reunião generalizada no inicio da pandemia…"; (…) "CC, também esteve na reunião de Março de 2020 onde a necessidade de redução de custos foi a tónica…").
Deste modo, a impugnação não procede quanto ao facto provado 48 e procede parcialmente quanto ao 49, ficando este com a seguinte redacção:
"49.- Esta administração reuniu com o apelante em Janeiro de 2020 e afirmou a necessidade de planos de contenção, com particular atenção aos custos e à necessidade de autorização para grandes reparações, o que foi reforçado em nova reunião, em Março de 2020, na qual também estiveram presentes outros directores e onde foi dito para parar com os investimentos e projectos".
4.2.5-O apelante impugna ainda a decisão que julgou provado o facto 50, que pretende seja julgado como não provado e consta do seguinte:
"50.- O A., enquanto chefe do departamento da manutenção, não pedia orçamentos prévios a outros fornecedores, situação que já antes sucedia antes de assumir a direcção desse departamento, na medida em que entendia que não havia fornecedores alternativos aos que seguiam, no mercado".
Para tal sustentar especificou diversos documentos e passagens do depoimento da testemunha DD e das suas declarações de parte prestados na audiência de julgamento.
Já a motivação da decisão do Tribunal a quo não resulta completamente perceptível uma vez que sobre a questão, como lembra a apelada, refere apenas dois parágrafos, os quais, no entanto, pese embora remeterem para o depoimento da testemunha DD e para folhas 424 e verso dos autos se aproximam de uma petição de princípio. Os quais referem: "A ausência de orçamentos escritos prévios não contraria as normas escritas da empresa pois a fls. 424v e do depoimento de DD, resulta que as empresas que tinham o 'monopólio' das adjudicações eram fornecedores aprovados, assim se dando tal por não provado" e "À alegação confusa patente no art. 88 do articulado motivador, substituiu o tribunal face aos depoimentos ouvidos, a sua versão do sucedido, sendo que não havia duvida que se tratava de 16 contentores, e não de 15, e cumprindo espelhar a verdade isso se deu por assente". Isto quando estava em causa saber porque se julgou provado que o apelante não pediu orçamentos prévios e foi naquele art.º 88.º do articulado motivador do despedimento que se referia esta questão.
Em todo o caso, importa considerar que nas passagens especificadas do depoimento da testemunha DD esta disse que assumiu a área da manutenção em Maio de 2020 em substituição do apelante e que o KK lhe disse que antes pediam as cotações das reparações (o que equivaleria a orçamentos) por telefone; mas face a insistência da Mm.ª Juiz a quo em saber se "aquando da direcção do Eng.º AA, também tinha esse mesmo procedimento", respondeu "Não sei. Não estava nesse departamento, não consigo…", pelo que daqui se retira que em nada podia este meio de prova contribuir para a decisão impugnada; já nas especificadas passagens das suas declarações de parte o apelante disse que pedia orçamentos, o que naturalmente a infirma.
As folhas 424 e verso dos autos referidas na motivação da decisão não importam propriamente para o facto em crise uma vez que ali apenas se descrevem regras sobre consultas a fornecedores externos (pelo que, naturalmente, nada diz acerca de se, quem e quando efectuou consultas desse tipo e a quem; regras são uma coisa, o seu cumprimento é outra).
Já o mesmo se não pode dizer de alguns dos documentos especificados pelo apelante (os de folhas 201 a 207, 321 a 324, 353, 373 e 375 a 378), Os documentos datam dos meses de Dezembro de 2019 e de 27-02-2020 a 13-05-2020, ou seja, posteriores à data do pedido da realização da auditoria (Setembro de 2020 – facto provado 66) e da sua determinação pela apelada (08-05-2021, a qual começou no dia 27 seguinte, como dela consta - cfr. factos provados 21 e 23), mas dentro da janela temporal de exercício das funções do apelante (14-05-202, cfr. factos provados 40 e 45); já a sentença proferida no processo n.º 55103/20.5YIPRT, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte ‒ Juízo Central Cível de Loures - Juiz 3 e transitada em julgado no dia 12-12-2022, cuja certidão o apelante juntou, é irrelevante pois que se é certo que evidencia que entre a (antecessora da) apelada e a ECT Repair, Ld.ª foi celebrado um contrato para manutenção e reparação de equipamentos estáticos, a verdade é que dela se não extrai se o apelante (enquanto trabalhador da apelada) pediu outros orçamentos prévios; sendo que a questão aqui é saber se o apelante pediu orçamentos a terceiros (para escolha do mais conveniente à apelada) e não se pediu orçamentos à autora daquele processo na execução do contrato vigente entre a mesma e a aqui apelada. os quais indubitavelmente consubstanciam o contrário do decidido (note-se que não foram impugnados pela apelada para os efeitos e consequências decorrentes dos art.os 374.º, n.º 1 e 376.º, n.os 1 e 2 do Código Civil), pelo que impõem decisão contrária à impugnada e por isso se julga agora o facto como não provado.
4.2.6-O apelante impugna a decisão que julgou provados os factos 51 a 55, os quais pretende sejam julgados como não provados. Consta desses factos:
"51.- Até Maio de 2020, 90% das adjudicações de estáticos/caixas da R., foram efectuadas a duas empresas com sócios relacionados (ECT e RESUP);
52.- uma dessas empresas não tem quaisquer colaboradores ao seu serviço (RESUP) e usa as instalações e funcionários da outra (ECT);
53.- os serviços prestados à BO CIRCULAR representam mais de 80% das receitas do conjunto destas empresas;
54.- os serviços de manutenção no Norte e no Algarve são todos realizados pela RESUP, mas as instalações onde os mesmos têm lugar e os trabalhadores que os efectuam são da ECT;
55.- Toda a equipa de manutenção admitiu que quando adjudica trabalhos à RESUP, os pedidos são efectuados aos colaboradores da ECT, não conseguindo identificar nenhum trabalhador da RESUP".
Para sustentar a sua pretensão o apelante especificou um documento (a certidão da sentença atrás referida) e passagens dos depoimentos prestados pelas testemunhas EE e FF na audiência de julgamento.
A decisão proferida na sentença acerca desses factos foi motivada referindo que "o resultado das auditorias física atestado por EE, ou auditoria financeira, atestado por FF deixaram claro que existia um exclusivo de adjudicações a duas empresas, o que se deu por provado em 51 a 55 dos factos provados".
A tese da apelante é que estando provado que a auditoria não estava concluída (como decorre dos factos provados 21 e 23) e uma vez que as testemunhas disseram que poderia vir a ter um resultado final diverso quando estivesse e tendo ainda em conta o documento especificado na apelação conjugados com a circunstância de não terem sido produzidos outros meios de prova, tudo isso impunha decisão diversa da proferida.
Ora bem, é verdade que a auditoria não estava ainda concluída aquando do processo disciplinar (factos provados 21 e 23), como de resto resulta dos seus termos e das especificadas passagens dos referidos depoimentos testemunhais; e da parte concluída apenas foram considerados dados parciais (amostras, por assim dizer, dado que os auditores não tiveram acesso a todos os elementos necessários, tanto físicos ‒ contentores ‒ como contabilísticos).
Por outro lado, nada dali resulta acerca da composição societária da ECT e da RESUP, nem tampouco da composição dos seus efectivos de trabalhadores, instalações e portfólio de negócios, o que de resto é de meridiana compreensão uma vez que a única empresa da auditoria alvo foi a própria apelada.
Assim sendo as coisas, naturalmente que a prova em questão impunha que não tivessem sido julgados provados os factos impugnados, razão pela qual se concede a apelação e julga os mesmos não provados.
4.2.7-O apelante impugnou igualmente a decisão que julgou provados os factos 56 e 57, pretendendo que sejam eliminados. Desses factos consta o seguinte:
"56.-Em várias situações, concretamente não determinadas, não existia registo do envio dos equipamentos para reparação, nem comprovativos da realização das mesmas;
57.-Em várias situações, concretamente não determinadas, constatou-se que durante a direcção do A., os serviços de manutenção tinham facturas de determinados equipamentos com preços inflacionados e muito superiores aos preços de mercado, com equipamentos que não foram reparados, com tempos de reparação que não correspondem aos reais, com reparações efectuadas que não foram feitas nessa exacta medida".
Sustenta o apelante que se não trata de matéria de facto mas de conclusões, como de resto também expressamente refere o item julgado provado 58, o qual, de resto, padece da mesma maleita; por outro lado, o apelante especifica prova documental que aponta em sentido contrário.
A decisão relevou os depoimentos prestados pelas testemunhas EE, FF e DD.
É pacífico o entendimento de que tanto as conclusões como as afirmações vagas e genéricas não devem ser julgadas como se factos concretos fossem, o que assentando nas três regras da lógica aristotélica é naturalmente acolhido, inter alia, pelos art.os 5.º, 410.º, 411.º e 607.º, n.º 4 do Código de Processo Civil e assertivamente lembrado tanto pela doutrina Alberto dos Reis, Código de Processo Civil, Anotado, 1987, Coimbra Editora, volume III, páginas 206, 207 e 209 e Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 1984, Coimbra Editora, páginas 391 e 392. como pela jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, Neste sentido seguiram os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 12-03-2014, no processo n.º 590/12.5TTLRA.C1.S1 e de 24-03-2015, no processo n.º 10795/09.0T2SNT.L1.S1 e da Relação de Coimbra, de 24-04-2012, no processo n.º 219/10.6T2VGS.C1, da Relação de Évora, de 28-06-2018, no processo n.º 170/16.6T8MMN.E1, da Relação do Porto, de 10-02-2020, no processo n.º 566/16.3T8ETR.P1, de 09-03-2020, no processo n.º 3789/15.9T8VFR.P1 e de 23-11-2020, no processo n.º 6107/18.0T8MTS.P1, da Relação de Guimarães, de 27-04-2017, no processo n.º 636/14.2T8VVD-F.G1, de 06-12-2018, no processo n.º 20/17.6T8TMC.G1 e de 30-04-2020, no processo n.º 1441/16.7T8BRG.G1 e da Relação de Lisboa, de 09-07-2014, no processo n.º 606/13.8TCFUN.L1-1, de 12-11-2019, no processo n.º 5657/14.2 Y1PRT.L3-1, de 09-07-2014, no processo n.º 606/13.8TCFUN.L1-1 e da Relação de Évora, 28-06-2018, no processo n.º 170/16.6T8MMN.E1, publicados em http://www.dgsi.pt. que em linha com isso conclui que, oficiosamente até, Acórdãos da Relação do Porto de 18-11-2019, no processo n.º 3875/18.3T8MTS.P1, de 24-01-2018, no processo n.º 30243/15.6T8PRT.P1 e de 23-06-2021, no processo n.º 2837/19.8T8MTS.P1, publicados em http://www.dgsi.pt. "deve tal pronúncia ter-se por não escrita" Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-12-2011, no processo n.º 342/09.0TTMTS.P1.S1; no mesmo sentido, o acórdão de 14-01-2015, no processo n.º 488/11.4TTVFR.P1.S1, ambos publicados em http://www.dgsi.pt. pois que só os factos proprio sensu relevam para o enquadramento jurídico das questões em litígio.
É o caso da matéria acima referida, que de resto enuncia à partida a indeterminabilidade, generalidade ou vacuidade de tudo o que depois refere ter ocorrido; o que igualmente ocorre com o consequente ponto da matéria julgada provada em 58: "58. As situações referidas em 56 e 57 nunca foram concretizadas, nem dado conhecimento das mesmas ao A., tão pouco pode o mesmo defender-se em concreto de cada uma, apenas se apontando de modo genérico que as mesmas sucederam". Daí que também este ponto da decisão será oficiosamente eliminado.
4.2.8-O apelante impugna igualmente a decisão que julgou provado o facto 59, o qual diz o seguinte:
"59.- Sob a direcção do A. foi emitida em 16/4/2020 de 2020 uma factura da Jopaviming que continha a reparação de 16 equipamentos todos com o mesmo valor, de € 2.700, no total de € 40.000, a qual não corresponde a tal, pois não foram reparados 16 contentores com o mesmo valor".
Para o efeito sustenta que isso não resulta do depoimento da testemunha DD, que em parte especificou e transcreveu na motivação, e contradiz o despacho do dia 29-10-2021 e parte da sentença.
A decisão encontrou motivação no depoimento da testemunha DD e nas declarações de parte do apelante.
Esta questão tem praticamente os mesmos contornos da que foi apreciada no item 4.2.3 (relativamente a facto que na acta da sessão da audiência de julgamento do dia 29-10-2021 consta "foi dado como assente por acordo das partes"), excepto quanto ao número de contentores e ao produto da operação aritmética referidos (aqui erradamente descritos), razão por que se elimina este facto (porquanto o que efectivamente está provado por acordo é o que consta do facto provado 39, que se mantém, e com isto apenas se elimina o que afinal está errado descrito).
4.2.9-O apelante também impugnou a decisão que julgou provados os factos 62 a 64, os quais referem o seguinte:
"62.- Logo no mês de Maio de 2020 os custos da manutenção baixaram de uma média de 280 a 300 mensais para 180 mensais;
63.-Nos meses subsequentes os custos da manutenção reduziram para cerca de metade;
64.- Os custos das reparações baixaram em virtude da consulta ao mercado".
Para tanto especificou e transcreveu na motivação passagens dos depoimentos das testemunhas DD e FF, além de um documento (a sentença proferida no processo n.º 55103/20.5YIPRT, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte ‒ Juízo Central Cível de Loures - Juiz 3 atrás já referida).
Por seu lado a sentença motivou a decisão recorrida no depoimento da testemunha DD, o qual "explicou as medidas que implementou após assumir a direcção, as consultas ao mercado que fizeram e a consequente diminuição dos custos da manutenção, para quase metade (facto provado em 62 a 64). Explicou ainda DD desconhecer se as grandes reparações diminuíram, mas indubitavelmente o valor unitário das reparações baixou", factos que "não foram infirmados por nenhuma testemunha, nem mesmo pelas declarações de parte do autor".
Ouvidas as passagens do depoimento da testemunha DD especificadas pelo apelante dir-se-ia que impunham decisão diversa da recorrida uma vez que a testemunha nada sabia acerca da matéria a que depusera, situação que à partida seria assaz estranha tendo em conta que é o responsável da logística da apelada desde há cerca de dois anos (ou seja, 2019 considerando a data em que depôs; mas antes já lá trabalhava no controle de gestão da parte da logística), sendo subordinado do apelante.
Todavia, trata-se de pura ilusão, como de resto a especificação mais generosa de passagens do seu depoimento feita pela apelada o demonstram ad nauseam usque. Assim, e apenas porque o apelante conhece bem as sincopadas passagens que ele próprio especificou do depoimento da testemunha deixa-se aqui, com data venia à apelada, alguns exemplos de que afinal a testemunha sabia mais do que a apelação fazia crer:
"35:26 Juiz: Estava-me a falar em 200 contentores, fixámo-nos em Maio de 2020, em Maio de 2020 tem alguma ideia de quantos contentores é que tinham? Não. Tem alguma ideia de quanto é que eram os custos de manutenção nessa altura, em que o senhor chegou á área de manutenção?
35:43 DD: Sim.
35:43 Juiz: Os custos de manutenção eram de quanto?
35:46 DD: Eram mais ou menos entre os € 280.000,00 e os € 300.000,00.
35:52 Mandatária: Mensais?
35:52 DD: Sim, mensais.
35:55 Juiz: E depois passou a ser de quanto? Não é actualmente, porque, entretanto, o custo do ferro diminui, houve aí diferenças, mas passado aí uns seis meses, vá, que estivesse isto implementado.
36:07 DD: Passámos ali para uma média de € 180.000,00 por mês.
36:09 Juiz: E o número de manutenções, o número de grandes reparações, manteve-se, só o custo é que diminuiu?
36:16 DD: Sim".
Já relativamente às passagens do depoimento da testemunha FF especificadas pelo apelante ninguém poderia dizer com propriedade sobre o que versavam, são praticamente passagens de diálogo entrecortadas e sobrepostas sem qualquer sentido, a não ser se considerado o que vem de atrás e que de resto mereceu a seguinte síntese da Mm.ª Juiz a quo:
"36:25: Advogada: Mas era a prática da casa até quando? Então faço a pergunta assim.
36:28: Juiz: Certo, mas isso, certo já percebi.
36:29: FF: Sim, sim não, aliás…
36:30 Juiz: Olhe, mas isto ficou claríssimo, o seu depoimento deixou isto claríssimo, veio uma nova administração e disse alto chega, tudo o que andaram a fazer chega. Pronto.
36:37.2 FF: Exactamente".
E mais adiante:
"36:38 Juiz: Mas tudo o que andaram a fazer, andaram a fazer Blueotter. Que muda de nome, que muda de donos, que muda disto e daquilo, mas era Blueotter, a entidade empregadora!
36:46 Advogada: Por acaso era…
37:09 Advogada: E quando a administração diz chega … pararam ou não pararam?
37:14 FF: Agora sim pararam, tanto…
37:16 Advogada: Muito bem.
37:17: FF: …as grandes reparações deixam de existir, praticamente, não é, passamos de um…
37:19 Advogada: Quando é que a administração disse chega?
37:22 FF: A administração disse chega, tanto quanto eu tomei conhecimento foi agora que é implementado este controlo rigoroso".
Daí que se conclui que as passagens dos depoimentos das testemunhas DD e FF especificadas pelo apelante não impunham decisão diferente da recorrida, como teria que ser para permitir agora a sua inversão, conforme resulta do art.º 640.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil; pelo contrário, o que delas resulta é que impunham a decisão propugnada na decisão recorrida. E que também não impunha a alteração da decisão se conclui em face do documento que para esse efeito o apelante juntou, desde logo porque tratando-se de uma sentença proferida numa acção em que a apelada e sociedade terceira discutiram questões entre ambas e na qual a testemunha DD também depôs, a verdade é que daí resulta que o extensão do objecto do seu depoimento se confinou a isso mesmo, ou seja, às relações entre as partes nesse processo e não, como aqui, às estabelecidas entre a apelada e a generalidade dos seus fornecedores.
4.2.10-O apelante impugnou a decisão que julgou provado o facto 71, ou seja:
"71.- A direcção do A. não pesquisava preços e adjudicava as manutenções às empresas mencionadas que praticavam preços superiores aos de mercado".
Especificou e transcreveu na motivação passagens dos depoimentos das testemunhas EE e DD, Na conclusão 92 referiu também a testemunha FF mas nada especificou na motivação a esse respeito, pelo que não foi considerado atendendo ao estatuído no n.º 1 do art.º 639.º do Código de Processo Civil (sendo as conclusões resumo da alegação, não tem que se atender ao que consta daquelas mas não desta, como generalizadamente considera a jurisprudência, de que são exemplo os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-05-2010, no processo n.º 1227/04.1TBVIS.C1.S1, da Relação do Porto, de 21-01-2009, no processo n.º 0842545, da Relação de Lisboa, de 06-11-2012, no processo n.º 2255/10.3TVLSB.L1-1 e da Relação de Coimbra, de 08-06-2018, no processo n.º 1840/16.4T8FIG-A.C1, publicados em http://www.dgsi.pt). além de um documento (a sentença proferida no processo n.º 55103/20.5YIPRT, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte ‒ Juízo Central Cível de Loures - Juiz 3 atrás já referida); e pretexta que contraria o facto provado 67.
A motivação da decisão firmou-se nos depoimentos das testemunhas DD e KK.
As passagens especificadas do depoimento da testemunha EE em nada relevam para importunar a decisão impugnada. Assim:
"35:47 Juiz: Neste período de tempo … vamos lá ver, de Janeiro de 2019 a Maio... oiça para percebermos é muito simples, este período de tempo em que andou a fazer a auditoria destas facturas, dessas facturas a estes contentores, constatou que 4% deles tinham o custo 20 a 30% superior ao de mercado. E a pergunta que se colocava era, como é que sabia o valor de mercado? E a Senhora respondeu sei o valor de mercado porque vi outros orçamentos. Mas neste período não havia outros orçamentos. Portanto, os orçamentos que foi ver, foi os orçamentos a partir de Maio que o Sr. DD arranjou certo?
36:24 EE: Correcto".
Ou seja, o que daqui resulta é que a testemunha afirmou não ter consultado orçamentos no período relevante, mas posterior, até porque desse período não viu orçamentos; embora, como resulta do facto provado 4.2.5, pelo menos os ali referidos existiam.
Quanto às passagens do depoimento da testemunha DD vale o que atrás se disse no item 4.2.5, isto é, a testemunha não tinha conhecimento directo do facto (e o seu contrário resulta provado dos documentos, não impugnados, ali referidos).
Pelo que se impõe julgar o facto como não provado (de resto, em linha com o decidido a propósito do facto provado 50).
4.2.11-O apelante discorda da decisão que julgou não provado o facto 11, no qual consta o seguinte:
"11.-O registo de envio e chegada de equipamentos e os comprovativos das reparações era responsabilidade de OO, o qual nunca questionou o A."
Especificou passagens do depoimento das testemunhas DD e KK e documentos, além de que contraria o facto provado 29 (organigrama e relatório elaborado pela Oliveira Reis & Associados, SROC, Ld.ª relacionado com a validação de procedimentos de controlo interno e transacções de compras da área de manutenção da Blueotter Circular, S.A., para o período de análise compreendendo os anos de 2017 a 2020).
A decisão considerou que nenhuma prova foi feita quanto a este facto.
Ouvidas as passagens dos depoimentos testemunhais especificados pelo apelante e vistos os documentos em causa resulta demonstrado que impunham a decisão sugerida pelo apelante pois que todas essas provas convergem nesse sentido (sendo certo que o organigrama vigente na apelada foi ele mesmo julgado provado no facto 29), razão por que assim se decidirá eliminando o facto impugnado do rol dos não provados e julgando o mesmo provado, ficando assim. Todavia, na leitura deste facto tem que ser tido em cota que, conforme de resto os documentos espelham (e resulta do facto provado 28), o apelante era o Director de Logística e Gestão de Activos (onde aquele OO estava inserido).
"55-A. O registo de envio e chegada de equipamentos e os comprovativos das reparações era responsabilidade de OO, o qual nunca questionou o A."
4.2.12-Também discorda o apelante da decisão que julgou não provados os factos 19 a 28, a saber:
"19.- Em 2016, quando o Autor assumiu Direcção da Gestão de Activos/manutenção, a situação do departamento de manutenção era muito grave, fruto do contexto da crise económica vivenciado em 2011-2015, que provocou uma redução da actividade da sua actividade, tendo a empresa deixado de reparar grande parte dos seus equipamentos estáticos (contentores, monoblocos e postos fixos).
20.-Nos anos 2016 e 2017, com a retoma da actividade e aumento dos serviços, a área da manutenção registou um elevado número de queixas e reclamações dos clientes e comerciais, relativas aos equipamentos estáticos que lhes eram vendidos;
21.-A maioria das queixas e reclamações estavam relacionada com o mau estado dos contentores e avarias recorrentes nos monoblocos e postos fixos, às quais se somavam as queixas dos planeadores que,
22.-Muitas vezes, não tinham contentores, vazios e em bom estado de conservação, disponíveis para trabalhar.
24.-O cenário acima descrito motivou à data diversas reuniões internas, das quais resultou um plano de intensificação das acções e recuperação dos equipamentos estáticos,
25.-Tendo o mesmo sido incluído no Sistema de Gestão da Qualidade, o qual foi aprovado pela Administração e consta da lista de acções do Sistema de Gestão da Qualidade.
26.-Plano de intensificação das acções e recuperação dos equipamentos estáticos, que se manteve em curso.
27.-Nunca existiu nenhuma indicação para que o plano de intensificação de reparação de contentores fosse abandonado,
28.-Pelo que, o mesmo plano manteve-se em 2020, acrescido da necessidade de mudar a imagem de EGEO para BO CIRCULAR em todos os contentores".
Especificou passagens do depoimento prestado pela testemunha GG e um documento (acta de reunião da revisão da gestão).
A decisão considerou que nenhuma prova foi feita quanto a este facto.
Note-se que o apelante impugna oito factos para tal especificando provas para o conjunto assim formado e sem as individualizar relativamente a cada um dos factos cuja decisão pretendeu impugnar.
Ora, acerca disso já decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20-12-2017, no processo n.º 299/13.2TTVRL.C1.S2 - 4.ª Secção, publicado em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/social_boletim-anual-de-sumarios-2017.pdf. no que se desenha como um fio condutor de afirmação na sua jurisprudência Como se infere dos acórdãos do mesmo Supremo Tribunal de Justiça, de 05-09-2018 - 4.ª Secção, no processo n.º 15787/15.8T8PRT.P1.S2, de 19-12-2018, no processo n.º 271/14.5TTMTS.P1.S1 - 4.ª Secção e de 20-02-2019, no processo n.º 1338/15.8T8.PNF.P1.S1 - 4.ª Secção, publicado em http://www.dgsi.pt. e, mais recentemente, também na das Relações: Assim vimos decidindo desde o acórdão prolatado a 05-12-2018, no processo n.º 595/18.2T8PDL.L1 e também assim decidiram os acórdãos da Relação de Évora, de 14-03-2019, no processo n.º 305/16.9T8EVR.E1 e da Relação de Guimarães, de 21-03-2019, no processo n.º 61/17.3T8VRL.G1, publicados em http://www.dgsi.pt.
"I.- A alínea b), do n.º 1, do art.º 640.º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique '[o]s concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida', impõe que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respectivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos.
II.- Não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, divide a matéria de facto impugnada em três 'blocos distintos de factos' e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna".
Assim sendo, nesta parte não se poderia conhecer da apelação (note-se que uma coisa é pretender a apreciar conjunta de dois ou três factos interligados, o que é racionalmente compreensível, outra bem diferente um número tão elevado de factos).
Em todo o caso, a verdade é que de pouco servia ter o apelante cumprido os cânones legais.
Com efeito, muito do que consta dos itens julgados não provados, e que o apelante pretende impugnar, não são factos mas conclusões ou afirmações vagas ou genéricas e nunca concretizadas (assim, no 19: "a situação do departamento de manutenção era muito grave", "provocou uma redução da actividade" e "deixado de reparar grande parte dos seus equipamentos"; no 20: "retoma da actividade e aumento dos serviços" e "elevado número de queixas e reclamações dos clientes"; no 21: "Muitas vezes"; no 24: "resultou um plano de intensificação das acções e recuperação dos equipamentos estáticos"), pelo que nessa medida não podiam deixar de ser desconsideradas (em rigor nem sequer deveriam ter sido julgadas como não provadas, isto porque, como se viu, apenas os factos devem ser objecto de decisão como provados ou não provados).
Do remanescente aproveitável nada resulta demonstrado pelas especificadas passagens do depoimento da testemunha GG, desde logo porque apenas ali se refere a existência de reclamações de um cliente (o Porto de Lisboa), sem se perceber sequer qual o seu número, absoluto (quantas foram) e relativo (ou seja, no cômputo geral das reclamações); nem do documento acima referido, porquanto embora se perceba que esse documento tenha sido elaborado em 26-11-2019, a verdade é que os quadros das páginas especificadas não se referem sequer aos anos de 2016 e 2017 e, por outro lado, o seu conteúdo é totalmente alinhado com o depoimento daquela testemunha (só refere conceitos vagos e genéricos e nunca concretizados).
4.2.12-Por outro lado, o apelante pretende que deveria ter sido julgado provado o que alegara nos art.os 5.º e 9.º da contestação, ou seja:
"5.º
Ao contrário do alegado pela Ré, pelo menos desde o dia 8 de Maio de 2020, data em que a Administração da Ré determinou a realização de uma auditoria ao Departamento de Logística e Gestão de Activos/Manutenção, que os superiores hierárquicos do Autor têm conhecimentos da matéria em apreço nestes autos,
(…)
9.º
Dúvidas não podem existir que, o conhecimento por parte da Ré dos alegados factos nos autos disciplinares, ocorreu pelo menos em 14 de Maio de 2020". A matéria alegada nos artigos intercalares é totalmente irrelevante para a saber se a estes deveriam ter sido julgados provados.
Para tal especificou passagens das suas declarações de parte, dos depoimentos das testemunhas KK, HH, FF e um documento, tudo isto, alega e conclui o apelante, relevante para a apreciação da caducidade do exercício do direito disciplinar.
É sabido que o Tribunal da Relação só pode conhecer em recurso da decisão proferida acerca dos factos relevantes para a boa decisão da causa alegados pelas partes nos articulados podem ser conhecidos, a não ser que apesar de não terem sido alegados o Tribunal recorrido tenha proferido decisão acerca deles, seja julgando-os como provados ou não provados (art.º 72.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo do Trabalho; neste sentido, vd. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-04-2018, no processo n.º 205/12.1TTGRD.C3.S1, da Relação de Lisboa, 16-03-2016, no processo 37/13.0TBHRT.L1-4, da Relação do Porto, de 07-10-2019, no processo n.º 3633/17.2T8VFR.P1, da Relação de Évora, de 26-04-2018, no processo n.º 491/17.0T8EVR.E1, da Relação de Coimbra, de 28-04-2017, no processo n.º 2282/16.7T8LRA.C1 e da Relação de Guimarães, de 05-03-2020, no processo n.º 1984/18.8T8BCL.G1, todos publicados em http://www.dgsi.pt). Isto para além dos fatos notórios e dos que o Tribunal conhece de ofício (art.º 412.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo Civil).
Todavia, naturalmente que em qualquer caso não pode o Tribunal da Relação conhecer da decisão proferida acerca de factos irrelevantes para a boa decisão da causa ou da sua omissão, tenham ou não sido alegados pelas partes, sob pena de a não ser assim praticar um acto proibido por lei (art.º 130.º do Código de Processo Civil; neste sentido, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 09-02-2021, no processo n.º 26069/18.3T8PRT.P1.S1, da Relação de Lisboa, de 24-09-2020, no processo n.º 35708/19.8YIPRT.L1-2, da Relação do Porto, de 05-11-2018, no processo n.º 3737/13.0TBSTS.P1, de 16-02-2017, no processo n.º 52/12.0TBMBR.C1e da Relação de Guimarães, de 15-12-2016, no processo n.º 86/14.0T8AMR.G1,publicados em http://www.dgsi.pt).
Ora, é sabido que para determinar o dies a quo do prazo da caducidade do procedimento disciplinar do empregador releva apenas o conhecimento do facto por parte do próprio empregador ou do superior hierárquico a quem tenha delegado poderes disciplinares para assim proceder; e uma vez que se trata de facto extintivo do direito do empregador, os ónus da alegação e prova dessa delegação de competência para o superior hierárquico corre por conta do trabalhador (cfr. os art.os 329.º, n.º 2 do Código do Trabalho e 342.º, n.º 2 do Código Civil; neste sentido segue regularmente a jurisprudência, como ocorreu no caso dos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-09-2016, no processo n.º 14633/14.4T2SNT.L1.S1, da Relação de Lisboa, de 27-05-2015, no processo n.º 2950/12.2TTLSB.L1-5, da Relação do Porto, de 25-06-2018, no processo n.º 2049/17.5T8AVR.P1, da Relação de Coimbra, de 10-07-2019, no processo n.º 2950/12.2TTLSB.L1-5, da Relação de Guimarães, de 12-11-2020, no processo n.º 135/20.3YRGMR, da Relação de Évora, de 16-12-2021, n processo n.º 395/21.2T8STB-P.E1, publicados em http://www.dgsi.pt).
Sendo assim, é apodíctico dizer-se que não releva para a boa decisão da causa saber se "…pelo menos desde o dia 8 de Maio de 2020… os superiores hierárquicos do Autor têm conhecimentos da matéria em apreço nestes autos", pois que tal só relevaria se o apelante também tivesse alegado que a apelada havia delegado poderes disciplinares nos superiores hierárquicos para procederem disciplinarmente contra ele, o que não fez (note-se que na conclusão 105 o apelante não pretende ter alegado que o superior hierárquico tinha poderes disciplinares, mas, outrossim, que "logrou provar que o seu empregador e superior hierárquico com poder disciplinar teve conhecimento dos factos em 08 de Maio de 2020", o que é diferente. Veja-se: naquele caso, trata-se do ónus da alegação, que o apelante não observou e obsta a que se conheça da realidade desse facto; esta realidade dos factos, por sua vez, contende com o ónus da prova e supõe aquele cumprido).
Daí que nesta parte se não possa apreciar a impugnação da decisão da matéria de facto; e se assim não fosse, improcederia.
4.2.13-O apelante pede que se julgue provado o que alegou nos art.os 82.º a 84.º e 169.º-7 da contestação, a saber:
"82.º
A área de Gestão de Activos era constituída pelo Coordenador de Gestão de Activos e pelo Responsável de Equipamentos Estáticos, os quais tinham autonomia técnica e funcional, conforme descritivo de funções a folhas 56 e 58 dos autos disciplinares juntos aos autos e depoimento da testemunha BB a folhas 476 a 478 do Processo Disciplinar
83.º
Das instruções da entidade patronal, resulta que o Coordenador de Gestão de Activos tinha a responsabilidade e as seguintes tarefas a executar:
· Liderar a equipa de manutenção
· Garantir a adequação dos meios da equipa face às necessidades da empresa
· Garantir a adequação dos meios aos objectivos e fins fixados na Manutenção;
· Gestão da Manutenção de equipamentos com particular atenção para os custos, a gestão do orçamento da manutenção
· Seguimento e Controlo dos Indicadores (custos, tempos, qualidade de serviço, segurança, ambiente)
· Responsável pela orçamentação anual da Manutenção
· Assegurar o controlo dos meios técnicos, humanos e financeiros para fazer cumprir os planos de trabalho
· Comunicar os eventos e as informações relevantes da actividade de forma eficiente e atempadamente.
· Definir planos de trabalho com instruções de manutenção correctiva e preventiva.
· Gestão de Inventário (peças e consumíveis)
· Assegurar o controlo do consumo de energia e equipamentos, implementando acções de melhoria na eficácia do consumo.
· Gestão de Frota com apoio nos meios internos equipa, garantir o cumprimento da legislação vigente aplicada aos equipamentos da empresa (inspecções, alvarás, ADR, ATEX, seguros).
· Controlar informação sobre sinistralidade em bens.
· Contactos com seguradores (participações e indemnizações)
· Reporting de sinistralidade
· Assegurar e controlar o reporting das actividades de investimentos na área de equipamento.
· No âmbito da manutenção e verificação periódica dos mesmos, controlo da gestão dos Equipamentos de Medição e Monitorização (EMM).
· Preparar os Cadernos de Encargos e requisitos técnicos em todos os processos de compras de equipamentos
· Gerir os seus fornecedores e subcontratados aplicando os requisitos do processo de Gestão de Compras definido
· Entender a Política de Qualidade, Ambiente, Saúde e Segurança, conhecer os Objectivos e Metas da organização.
· Conhecer os aspectos/impactes e perigos/riscos associados às suas actividades.
· Cumprir as regras aplicáveis do Sistema Integrado de Gestão Qualidade, Ambiente e Segurança, nomeadamente, segregação de resíduos, condução económica, boas práticas no consumo energético, papel e de água, uso de EPI e máquinas, respeito da sinalização existente.
· Divulgar os seus colaboradores, subcontratados e trabalhadores temporários sob sua responsabilidade as regras do Sistema Integrado de Gestão de Qualidade, Ambiente e Segurança.
· Identificar ocorrências e registá-las na Intranet.
· Promover, por via de sugestões, a melhoria do Sistema Integrado de Gestão.
· Participar no processo de consulta aos trabalhadores, comparecer às acções de formação para as quais é convocado, bem como às consultas de medicina do trabalho.
Vide folhas 55 e 56 dos autos disciplinares juntos aos presentes.
84.º
Ao Responsável de Equipamentos Estáticos da Ré competia executar as tarefas de:
· Acompanhar a manutenção dos equipamentos do grupo no âmbito de intervenções preventivas
· Coordenar a execução das acções previstas nos planos de manutenção
· Coordenar as paragens dos equipamentos para a execução dos trabalhos
· Programação, supervisão e elaboração de mapas de controlo para análise e facturação relativo às manutenções executadas pelas empresas subcontratadas de manutenção e outras que estejam no universo de prestadoras de serviços de manutenção e assistência técnica.
· Estudos de mercado, solicitação, estudo e comparação de orçamentos, negociação com fabricantes e fornecedores na aquisição e aluguer de equipamentos estáticos, contentores, componentes mecânicos e hidráulicos, eléctricos e consumíveis
· Aquisição e programação de instalações de equipamentos a efectuar em clientes novos ou alterações nos já existentes
· Gestão do sistema informático da manutenção – registos de novos equipamentos, alterações, elaboração de planos de manutenção, registo de ordens de trabalho das oficinas de mecânica serralharia e pintura, conferência e actualização de tabelas em sistema
· Controlo e acompanhamento dos contratos de manutenção – comunicações de dados ao prestador de serviço e Direcção Administrativa e Financeira
· Requisição de serviços e aquisição de peças em apoio da serralharia, hidráulica e mecânica
· Preparação das requisições para a Direcção Administrativa e Financeira
· Aquisição e acompanhamento das entregas de contentores
(metálicos/plásticos), gestão de contentores disponíveis (fins de serviço), controlo de contentores em parque e colocação nos clientes
· Envio de requisições para a Direcção financeira (registo, cópias e arquivo) e fecho do mês de acordo com as regras da Direcção Administrativa e Financeira.
· Conferência de facturas/Análise de custos
· Gerir os seus fornecedores e subcontratados aplicando os requisitos do processo de gestão de compras definido.
· Entender a Política de Qualidade, Ambiente, Saúde e Segurança, conhecer objectivos e Metas da Organização.
· Conhecer os aspectos /impactes e perigos/riscos associados às suas actividades.
· Conhecer os procedimentos de resposta e emergência relativos às suas actividades
· Cumprir as regras aplicáveis ao Sistema Integrado de Gestão de Qualidade, Ambiente e Segurança, nomeadamente segregação de resíduos, condução económica, boas práticas no consumo energético, papel e de água, uso de EPI e máquinas, respeito da sinalização existente.
· Identificar ocorrências e registá-las na Intranet.
· Promover, por via de sugestões, a melhoria do Sistema Integrado de Gestão.
· Participar no processo de consulta aos trabalhadores, comparecer às acções de formação para as quais é convocado, bem como às consultas de medicina do trabalho.
Vide folhas 59 do processo disciplinar junto aos autos.
(…)
169.º
Quanto à matéria alegada no artigo 88.º da motivação do despedimento, (conclusões que a Ré ora alega ter obtido em 18 de Junho de 2021, mas que na Nota de Culpa eram conclusões de 22 de Julho de 202), e sem prescindir da alegação supra quanto à invalidade da nota de culpa por falta de alegação de factos devidamente circunstanciados, cumpre referir que:
(…)
7-As encomendas e a conferência das facturas também não fazem parte das funções do Arguido,
(…)".

Para tal especificou os documentos referidos naqueles artigos da contestação e as passagens dos depoimentos prestados pelas testemunhas DD e KK especificadas a propósito da impugnação do facto julgado não provado 11.

Preliminarmente dir-se-á que as funções atribuídas a outros trabalhadores que não o apelante não relevam para saber se este deixou de cumprir as que lhe estavam cometidas pela apelada e que a final considerou justa causa para o despedir (a saber: não controlar os custos, pedindo orçamentos prévios a adjudicações aos fornecedores) e essas são as que constam do facto provado 28, pelo que já se vê a irrelevância dos factos para a decisão da causa. É verdade que o mesmo critério seria aplicável à impugnação do facto julgado não provado 11, mas importa ter presente que a situação que levou à sua apreciação é diversa desta pois que o mesmo foi objecto de decisão.

Em todo o caso sempre diremos que dos documentos resulta que o seu conteúdo é o que foi reproduzido nos referidos factos da contestação, embora e ao contrário do suposto pelo apelante não refiram que o Responsável de Equipamentos Estáticos "detinha total autonomia funcional, por determinação da Ré". Pelo contrário, o que dali se infere é que esse "Responsável" reportava ao "Director de Logística e Gestão de Activos", sendo certo que era o apelante quem exercia tal cargo, conforme resulta do facto provado 28 (de resto, foi o apelante quem assinou a aprovação do documento em apreço, como se vê a folhas 56); o que não foi infirmado pelas especificadas passagens daqueles depoimentos testemunhais.

Assim sendo, nesta parte não se concede a apelação do autor.

4.2.14-Pretende também o apelante que deveria ter sido julgado provado o que alegou nos art.os 91.º e 330.º (no que se refere ao automóvel e ao telemóvel) e 336.º e 343.º da contestação, a saber:
"91.º
À data do despedimento, o Autor auferia:
· remuneração ilíquida o valor de € 4.300 (quatro mil e trezentos euros);
· Telemóvel, para uso profissional e particular;
· Viatura, carinha Volkswagen, com a matrícula ...-ZJ-..., para uso profissional e particular,
· Prémio de Desempenho;
· Subsídio de Refeição;
· Reembolso de Despesas;
· Cartão combustível;
· Via verde;
· Chip abastecimento gasóleo
(…)
330.º
Conforme termos e condições de admissão e celebração do contrato de trabalho do Autor, pela prestação do seu trabalho, o Autor tinha direito a auferir o seguinte:
· remuneração mensal ilíquida, à data do despedimento no valor de € 4.300 (quatro mil e trezentos euros);
· Subsídio de alimentação
· Prémio Anual de Desempenho
· Telemóvel, para uso profissional e particular, pelo qual a Ré paga uma média mensal de € 50 (cinquenta euros)
· Reembolso de despesas
· Automóvel, modelo carrinha, actualmente carrinha Volkswagen Golf, com a matrícula ...-ZJ-..., para uso profissional e particular,
(…)
336.º
Pois, o veículo automóvel e o telemóvel sempre foram atribuídos ao Autor para uso total, 365 dias do ano e constituem condição da sua admissão.
(…)
343.º
A utilização de viatura e telemóvel para uso pessoal nos moldes descritos, ocorre desde a sua admissão em 09 de setembro de 2008 até à data do seu despedimento".
Especificou três documentos e passagens do depoimento da testemunha II prestado na audiência de julgamento, que também transcreveu.
Os documentos, todos atribuídos pelo apelante à apelada, são uma carta de conforto que esta deu ao apelante aquando da negociação do contrato de trabalho, um termo de entrega deste àquela (devolução) de diversas coisas (entre as quais um veículo automóvel de matrícula ...-ZJ-... e um cartão de combustível) e dois e-mails referentes ao primeiro (onde TT, Assistente de Direcção Comercial/Operacional da apelada refere "Junto envio cópia da carta assinada e carimbada. O original irá ser enviado para a sua morada em correio azul" e, além do mais, o apelante respondeu "Concordo com as condições apresentadas na carta, gostaria apenas de reforçar que a viatura deverá ser 'tipo break'").
A apelada alegou na contra-alegação do recurso que impugnou na resposta à contestação o alegado pelo apelante relativamente ao uso particular do veículo e também a carta junta como documento n.º 2 junto com a reconvenção e efectivamente fê-lo no art.º 28.º da dita resposta (nada disse quanto aos e-mails).
A testemunha II, cuja razão de ciência consistia em ter sido administrador executivo da apelada (então Egeu Tecnologia e Ambiente) até Abril de 2022 (saiu sem qualquer litígio), confirmou a veracidade da carta de conforto em questão, que, de resto, redigiu pessoalmente.
Assim sendo, concatenando os documentos (a carta de conforto e os e-mails juntos com a contestação) com o depoimento da testemunha, que tinha razão para saber acerca do facto e do documento em apreço, fica claro que esses meios de prova impunham a decisão pretendida pelo apelante (que aliás vai em linha com o facto provado 72, o qual não poderia ser julgado provado e estes não, sem a apresentação de nenhuma razão explicativa).
Daí que se julga agora provado que:
"8-A. À data do despedimento, o autor auferia ainda:
· Telemóvel, para uso profissional e particular;
· Viatura, carinha Volkswagen, com a matrícula ...-ZJ-..., para uso profissional e particular".
4.2.15-Pede o apelante que se julgue provado a matéria que alegou nos pontos 12, 13 e 14 do art.º 169.º da contestação, ou seja:
"169.º
Quanto à matéria alegada no artigo 88.º da motivação do despedimento, (conclusões que a Ré ora alega ter obtido em 18 de Junho de 2021, mas que na Nota de Culpa eram conclusões de 22 de Julho de 202), e sem prescindir da alegação supra quanto à invalidade da nota de culpa por falta de alegação de factos devidamente circunstanciados, cumpre referir que:
(…)
12- Ou seja, antes da pandemia, sendo que as guias de transporte da Ré para a Jopaviming, datas do período entre 4 e 6 de Março, assim o demonstram.
13- A APL é um cliente que se caracteriza por padrões de elevada exigência ao nível do estado de conservação dos contentores e do cumprimento de horários
14- E, nos meses de Abril a Junho tem um pico elevado de serviços relacionados com a chegada de paquetes ao Porto de Lisboa,
(…)".
Para prova do alegado especificou passagens do depoimento prestado pela testemunha GG na audiência de julgamento.
Tratando-se de matéria totalmente conclusiva não tinha que ser julgada pelo Tribunal recorrido e por isso não se concede este ponto da impugnação.
4.2.16-Pede o apelante que se julgue provado a matéria que alegou no art.º 172.º da contestação:
"172.º
Existia um orçamento previamente aprovado pela Administração da Ré, para a área da manutenção/Gestão de Activos, que era mensalmente acompanhado, através de relatórios produzidos pelo departamento financeiro".
Especificou passagens das declarações de parte que prestou na audiência de julgamento; todavia, desacompanhadas que estão de qualquer outra prova, indiciária sequer, não provam a tese do apelante, sendo certo que apontando aquelas para provas constituídas poderiam estas ter sido produzidas sem qualquer dificuldade.
4.2.17- Pede o apelante que se julgue provado a matéria que alegou no art.º 172.º da contestação:
"264.º
Em 14 de Maio de 2020, o Autor foi suspenso das funções de Director de Gestão de Activos, conforme confessado pela Ré no art.º 102.º da motivação do despedimento, sem que para o efeito tenha sido apresentada qualquer justificação e/ou fundamento para o efeito".
Sustenta a sua pretensão dizendo que a factualidade supra enunciada não foi impugnada pela apelada.
Por sua vez, a apelada respondeu ao alegado pelo apelado dizendo, inter alia, o seguinte:
"7.º
Não corresponde, pois, à verdade que o A. tenha sido suspenso das funções de Director de Gestão de Activos, nem a R. confessou tal facto, pelo que se impugna os factos alegados pelo A. neste sentido, nos artigos 264.º, 265.º e 274.º".
Deste modo, não pode de modo algum concluir-se, como o apelante, que a apelada não impugnou o facto em questão, razão por que nesta parte também se não concede a apelação.
4.3-A caducidade do exercício do direito disciplinar.
O apelante pretende que o direito da apelada proceder disciplinarmente contra ele caducou uma vez que teve conhecimento dos factos em 08-05-2020 ou no máximo em 14-05-2020.
Por sua vez e em resumo, a esse respeito a sentença considerou essencialmente o seguinte:
"A 14/05/2020 a ré retirou ao autor a coordenação da área de gestão de Activos, pelo que a suspensão a que o A. se refere é uma suspensão de funções prática, efectiva, de coordenação mas não uma suspensão jurídica de funções. O A. foi afastado da direcção de uma área num momento mas suspenso preventivamente apenas em 24/6/2020. Pelo que desde esse data até à notificação da decisão não decorreram 60 dias.
Por outro lado, em Maio o que se passou foi que a R. tinha suspeitas de má gestão da parte do A., posto que as despesas não diminuíam, mas não tinha a noção da dimensão do sucedido, pois esta só surge com a auditoria. No entanto, caberia ao A. demonstrar que o superior hierárquico com poder disciplinar teve conhecimento efetivo dos factos em determinada data, e isso não o fez. Prova-se que existiram reuniões, que foram dadas listas dos gastos de manutenção efectuados ainda em Maio, mas a análise das mesmas, e os factos que conduzem ao despedimento são resultado da auditoria, e essa data em concreto não se apura.
Assim a data que se tem é a da suspensão preventiva do A. que ocorreu em 24/6/2020, sendo que a comunicação da nota de culpa ocorreu em 23/7/2020, cfr. fls. 212 e 199.
A data para a contagem da caducidade do exercício do poder disciplinar afere-se pela data em que o superior hierárquico tomou conhecimento dos factos. E essa foi seguramente em data anterior à da suspensão mas em concreto quando não se apura. Nas reuniões de Maio, ou mesmo quando o A. é afastado da coordenação seguramente a R. não tinha exacta noção da dimensão de tudo, pois se o tivesse teria suspenso de imediato o A.. Não se apurado a data do conhecimento efetivo não se pode afirmar que decorreram mais de 60 dias pelo que improcede a excepção de caducidade".
Concorda-se com a sentença recorrida: não estando determinado nos termos pretendidos pelo apelante, o dies a quo do prazo da caducidade nunca poderia ter-se por verificado, porquanto (i) como já se referiu no item 4.2.12, esse é o conhecimento dos factos pelo empregador ou superior hierárquico com poderes disciplinares por ele delegados sobre o trabalhador; (ii) os ónus da alegação e da prova correm pelo trabalhador; (iii) e na parte em o apelante alegou não logrou provar (mas apenas, como referido a sentença recorrida, que "havia suspeitas de má gestão da parte do A., posto que as despesas não diminuíam, mas não tinha a noção da dimensão do sucedido", quando o n.º 2 do art.º 329.º do Código do Trabalho exige "conhecimento da infracção").
Improcede, pois, a excepção peremptória da caducidade invocada pelo apelante.
4.4-A nulidade do processo disciplinar.
4.4.1-O apelante alegou a nulidade do processo disciplinar por não estarem concluídas as diligências instrutórias quando da prolação da decisão disciplinar; isto porque na tese do apelante a testemunha JJ, que por si fora arrolada, foi ouvida no processo disciplinar e ainda não assinara o respectivo auto quando foi proferida a decisão final.
Sobre isso disse a sentença recorrida:
"De harmonia com o disposto no artigo 382.º, n.º 2, do Código de Trabalho o procedimento disciplinar é inválido, se:
a)-Faltar a nota de culpa, ou se esta não for escrita ou não contiver a descrição circunstanciada dos factos imputados ao trabalhador;
b)-Faltar a comunicação da intenção do despedimento junto à nota de culpa;
c)-Não tiver sido respeitado o direito do trabalhador a consultar o processo ou a responder à nota de culpa ou, ainda, o prazo para resposta à nota de culpa;
d)-A comunicação do trabalhador da decisão de despedimento e dos seus fundamentos não for deita por escrito, ou não esteja elaborada nos termos do n.º 4 do artigo 357.º ou do n.º 2 do artigo 358.º.
Resulta assente que foi feita nota de culpa, por escrito, com direito do trabalhador a responder à mesma e a comunicação de despedimento foi feita por escrito. Se estava ou não o depoimento escrito de uma testemunha é algo que não é relevante, pois na verdade a entidade empregadora não é obrigada a efectuar todas as diligências probatórias requeridas. Mas mais se diga. Raia a má fé a invocação do A. quanto a qualquer irregularidade neste tocante. Pois o que se provou foi que a testemunha prestou o seu depoimento mas não o pode assinar de imediato por estar a ir de férias mas fê-lo posteriormente (embora as declarações tivessem sido emitidas antes da decisão se proferida).
Não existe pois qualquer irregularidade, nem a entidade empregadora seria obrigada a ouvir todas as testemunhas arroladas".
Mais uma vez se concorda com a sentença recorrida. O que importa não é se a testemunha tinha ou não assinado o auto das suas declarações à data em que foi proferida a decisão, mas se as tinha ou não prestado e no limite se assim foram reproduzidas no auto. Veja-se o que sobre isso disse o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 17- 02-1999, no processo n.º 226/97 - 4.ª Secção, publicado em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/social1999.pdf e inteiramente relevante no contexto da norma em apreciação:
"I-A falta de assinatura das declarações prestadas pelas testemunhas em processo disciplinar é susceptível de pôr em causa a fidelidade da transcrição dessas declarações e a autenticidade destas, mas não exclui, sem mais a possibilidade de as declarações terem sido efectivamente prestadas.
II-A indicação, no auto de inquirição de testemunhas, em processo disciplinar, de uma data diferente daquela em que realmente a testemunha foi nele ouvida e a assinatura do auto em data muito posterior à da prestação das declarações, e mesmo a falta de assinatura desse auto, não afastam a possibilidade de se demonstrar que a testemunha foi efectivamente ouvida naquela data (diferente da que consta do auto) e que as declarações não assinadas, foram na realidade prestadas e são autenticas". No mesmo sentido, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17-02-1999, no processo n.º 348/98 - 4.ª Secção, publicado em https://www.pgdlisboa.pt/jurel/stj_mostra_doc.php?nid=3375&codarea=3.
Por outro lado, como decidiu já o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 21-03-2012, no processo n.º 161/09.3TTVLG.P1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt, "o procedimento só é inválido se verificada alguma das omissões elencadas no n.º 2 do art. 382.º do Código do Trabalho"; Em linha, diga-se, com a sua tradição jurisprudencial, como se vê dos acórdãos de 28-10-1998, no processo n.º 98S115, publicado em http://www.dgsi.pt e de 27-05-2004, no processo n.º 2550/03 - 4.ª Secção, publicado em https://www.pgdlisboa.pt/jurel/stj_mostra_doc.php?nid=17184&codarea=3. ora, está bem de ver que a falta de assinatura de um auto de declarações pela testemunha não preenche nenhum dos casos ali elencados e por isso a sua falta à data da decisão não se importou a nulidade do processo disciplinar.
Por fim, ainda se dirá que é no mínimo duvidoso que o empregador tenha necessariamente que reduzir a escrito os depoimentos das testemunhas, desde que demonstre tê-las efectivamente inquirido se indicadas pelo trabalhador, pois que desse modo não afecta o direito de defesa; tanto mais que tais meios de prova servem apenas para enformar a decisão acerca do despedimento e nenhum relevo judicial autónomo se lhes reconhece, como refere Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 4.ª edição, Princípia, 2017, página 221. Sendo certo, note-se bem, que isso não é objecto do recurso pois que o apelante não põe em causa ter ocorrido a inquirição da testemunha no processo disciplinar nem tampouco o conteúdo do seu depoimento (mal seria, pois esteve representado na inquirição).
Em conclusão se dirá que o facto em questão não constitui nulidade do processo disciplinar.
4.4.2-Por outro lado, o apelante pretende que o processo disciplinar é inválido por falta de descrição na nota de culpa e na decisão final dos factos que lhe imputa, isto porque as imputações que efectivamente lhe faz são genéricas e conclusivas.
Ora, para se decidir pela validação da licitude do despedimento do apelante o Tribunal a quo relevou o seguinte:
"Vejamos pois o que se logrou provar e se estão reunidos os requisitos para que seja considerado (i)lícito o despedimento.
Os factos dados por assentes são graves e revelam comodismo, falta de iniciativa e incompetência. Estamos a lidar com um director de um departamento que tem os custos mais elevados de uma empresa. Custos elevados, numa altura em que a nova direcção pede para diminuir custos e não o faz. Numa altura em que surge a situação de pandemia e pede para novamente diminuir custos e o A. o que faz?! Nada.
O que se apura que era a atitude deste director? Adjudicava a duas empresas todas as reparações da R. e a um preço muito superior ao de mercado (e a prova é que quando o seu substituto passou a fazer pesquisa de mercado os custos reduziram para quase metade), não pedia orçamentos prévios a adjudicações, não pesquisava preços mais baixos e nenhum esforço fez para reduzir custos.
E só isto cremos que chega para despedir o A..
Não se apura quanto é que a atitude do A. importa de prejuízo para a R., mas a verdade é que uma empresa não pode ter como director um funcionário que tem o espírito dos antigos funcionários públicos, que seja acomodado, inactivo, com falta de iniciativa e com indolência. Chama-se incompetência a tal atitude. Se nas nossas casas particulares, para se adjudicar um trabalho de construção civil, a colocação de um estore, de vidros duplos, de colocação de chão, ou qualquer trabalho pedimos vários orçamentos, solicitamos formas de obter o melhor preço possível, como se explica que o A., director de uma área de uma sociedade anónima que tem elevados custos não o faça?!
Poder-se-á dizer que nunca o fez, e que a anterior administração da R. nunca viu nisso um problema. Mas tal não deixa de ser incompetência. E esta torna-se visível e grave quando a nova administração lhe dirige indicações específicas de contenção de custos que não são alcançados. E podiam sê-lo, pois logo quando o A. foi substituído os custos reduzem para cerca de metade.
É sabido que a nossa legislação laboral não torna fácil despedir ninguém, e os despedimentos por incompetência são de absoluta dificuldade de vingar. No entanto cremos que qualquer pessoa colocada na posição da R. sabe que não pode ter ao seu serviço um trabalhador, director de uma área que a onera financeiramente, e que nada faz. É inexigível à R., a qualquer empresa, ou qualquer pessoa singular que seja empregadora, que tenha a seu cargo um trabalhador que é incompetente, que nada faz do que é suposto, e que se escude nas situações dizendo que isso cabe aos seus subordinados, ou que nem explicação tem para elas.
É o caso da factura com 15/16 reparações todas do mesmo valor. Em sede de julgamento a explicação do A. foi não ter explicação para tal. Mas o facto é que a mesma foi emitida sob a sua alçada e numa altura de contenção económica, de dificuldade generalizada pela paragem resultante do covid 19, o que faz o A.?! Compactua, efectua, ou nem vê situações de fraude que importam um gasto de € 40.000 para a empresa. Sob a sua alçada foram desdobradas reparações falsas (porque todos, incluindo o A. admitem não ser possível todas terem o mesmo valor) por um valor único elevado.
Não temos qualquer dúvida que a confiança que um empregador deposita num trabalhador que tem esta atitude, fazendo ele o desdobramento falso das reparações, ou compactuando com ele, ou não tendo dado conta do mesmo, a verdade é que a confiança é totalmente abalada. E se já era inexigível que uma empresa tivesse a seu cargo um trabalhador incompetente num cargo de direcção, ter um incompetente que tem atitudes de fraude é impensável.
Ficou de modo irremediável violada a confiança que a R. deposita no A., e nenhuma entidade empregadora pode confiar num trabalhador que tenha tido estas atitudes.
O comportamento de violação do dever de lealdade do A. foi culposo, objectivo e deixa a entidade patronal numa situação em que qualquer pessoa colocada no seu lugar dificilmente quereria, ou poderia, manter um trabalhador nesses termos. No futuro seria difícil para a R. confiar que o seu trabalhador não voltasse a ter condutas iguais às que teve, e geraria uma total desconfiança, constante, no que esta faria, o que conduz à situação de constatarmos a impossibilidade prática de subsistência da relação laboral. Nenhuma pessoa colocada na situação da entidade patronal consegue continuar com uma pessoa como o A. ao seu serviço. E não consegue nem é exigível. Nenhuma sanção existe pois que fosse adequada para a situação que não o despedimento.
E isto basta para que o despedimento seja considerado lícito por existência de justa causa.
O poder disciplinar permite que o empregador aplique aos seus trabalhadores várias sanções que vão desde a repreensão até ao despedimento sem indemnização ou compensação - artigo 328.° do Código de Trabalho - que devem ser aplicadas atentos os princípios de proporcionalidade e adequação entre o comportamento do trabalhador e suas consequências e a sanção a aplicar. Mas nenhuma outra sanção havia como mais adequada ao comportamento da A. que não o despedimento.
Razão pela qual declaro lícito o despedimento improcedendo a acção intentada".
A sentença recorrida considerou então como factos relevantes para fundamentar o despedimento do apelante a circunstância deste liderar o departamento com os custos mais elevados da empresa e apesar da nova direcção lhe pedir para diminuir custos não o fez, mesmo depois de surgir a pandemia, antes adjudicava a duas empresas todas as reparações a um preço muito superior ao de mercado (e a prova é que quando o seu substituto passou a fazer pesquisa de mercado os custos reduziram para quase metade), não pedia orçamentos prévios às adjudicações, não pesquisava preços mais baixos e nenhum esforço fez para reduzir custos.
Vejamos então se estamos perante conclusões vagas e genéricas e não factos, sendo certo que apenas se atenderá à matéria deste trecho da sentença uma vez que só nele se louvou para concluir pelo despedimento do apelado.
A propósito da diferenciação destes conceitos, escreveu Alberto dos Reis, no Código de Processo Civil, Anotado, 1987, Coimbra Editora, volume III, páginas 206 e 207:
"É fácil enunciar critérios gerais de orientação. Assim pode dizer-se:
a)- É questão de facto tudo o que tende a apurar quaisquer ocorrências da vida real, quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças operadas no mundo exterior.
b)- É questão de direito tudo o que respeita à interpretação e aplicação da lei.
(…)
Reduzindo o problema à sua maior simplicidade, a fórmula é esta:
a)- É questão de facto determinar o que aconteceu;
b)- É questão de direito determinar o que quer a lei, ou seja, a lei substantiva, ou seja a lei de processo".
Reflecte-se aqui, pois, a dicotomia enunciada por Kelsen entre o ser (o que aconteceu) e o dever-ser (o que quer a lei).
Tendo isto presente, não pode seguramente dizer-se que as imputações feitas ao apelante são genéricas ou conclusivas, pois que "não pedir orçamentos prévios às adjudicações" ou "não pesquisa[r] preços mais baixos" são manifestamente ocorrências da vida da empresa (da relação desta com terceiros por via da relação laboral com o apelante), ainda que omissivas, uma vez que se situam no domínio do ser ou, nas citadas palavras de Alberto dos Reis, do que aconteceu, e não do dever ser ou do "que quer a lei".
Também é facto dizer-se que o apelante "antes adjudicava a duas empresas todas as reparações", pois que se reporta a um comportamento que se lhe imputa ter protagonizado.
Diferente é dizer-se que o fez "a um preço muito superior ao de mercado", pois que sem mais é conclusivo (valora duas realidades, o serviço adjudicado e o mercado). Todavia, sendo uma conclusão sobre factos, a decisão depois materializou-os ao dizer que "quando o seu substituto passou a fazer pesquisa de mercado os custos reduziram para quase metade" (o que vale por dizer que os adjudicava pelo dobro e, portanto, que o valor de mercado era de metade daquele por que era adjudicado). E não pode o apelante pretender que não podia saber a que reparações se referia a apelada, pois que naturalmente eram as que protagonizou relativamente às duas empresas em causa (como de resto resulta do ponto 60 da nota de culpa e, consequentemente da decisão final, pois que para ela remeteu).
Questão diferente é saber se isto constava na nota de culpa e depois na decisão final, como teria que ser para poder ser relevado no contexto do despedimento do apelante (art.os 353.º, n.º 1 e 357.º, n.º 4 do Código do Trabalho).
No que concerne ao primeiro ponto, lendo a nota de culpa (vale dizer, também a decisão final) vê-se bem que toda esta problemática foi ali desenrolada, maxime (mas não só) nos pontos 28 a 34, 38 a 40, 53, 60 e 70 a 79 (os factos julgados provados 50 e 56 a 59 e 71 ou foram julgados não provados ou eliminados, pelo que não relevam para este ponto da apelação).
Assim e em conclusão fica evidente que a questão da falta de descrição na nota de culpa de factos imputados ao apelante não se verificava (não se pode dizer que a circunstanciação temporal merecesse particular recomendação, mas ainda assim elenca dados mínimos como se vê dos factos provados 30 e 33 a 39, 48, 49 etc.); saber se os mesmos se provaram e nesse caso poderiam suportar a decisão é outra questão.
4.5-A ilicitude do despedimento e suas consequências.
4.5.1-Cumpre agora apreciar se os factos provados constituíam ou não justa causa para a apelada despedir o apelado (a questão da sentença se fundamentar em factos não alegados na nota de culpa e na decisão final perdeu-se no caminho uma vez que, recorda-se, os factos relevantes, julgados provados 50 e 56 a 59 e 71, ou foram julgados não provados ou eliminados).
Renovando o já atrás referido, o despedimento do apelante assentou na acusação de que "adjudicava a duas empresas todas as reparações da R. e a um preço muito superior ao de mercado (e a prova é que quando o seu substituto passou a fazer pesquisa de mercado os custos reduziram para quase metade), não pedia orçamentos prévios a adjudicações, não pesquisava preços mais baixos e nenhum esforço fez para reduzir custos". Contudo, vimos que tal não tinha completa aderência à realidade pois que, conforme o apelante demonstrou (vd. item 4.2.5 e nota de rodapé12), o mesmo pediu orçamentos prévios a adjudicações feitas pela empresa.
É certo que das competências do apelante fazia parte "gerir a frota afecta à logística" Facto provado 28. e que "o novo colaborador, NN, foi admitido no final de 2019, e foram-lhe atribuídas entre outras funções, as de controlar os custos com pneus e gasóleo da BO CIRCULAR, o que deu origem a reduções de custos de aproximadamente € 20.000 no primeiro semestre de 2020", Facto provado 30. mas essa questão não se prende directamente com a atrás referida (reparações de contentores, etc.).
Ficou até por saber porque baixaram os custos com pneus e gasóleo, uma vez que apenas foi julgado provado que tal ocorreu com a atribuição da função de os controlar ao NN, mas a verdade é que a decisão de despedimento elencou a razão porque tal ocorreu mas foi ignorada na sentença. Assim, consta da decisão final que:
"21.- O trabalhador PV referiu que não tinha membros suficientes para controlar os custos com gasóleo e pneus, e que estas despesas eram áreas que não estaria a verificar o suficiente, tendo solicitado o recrutamento de um novo trabalhador. A Administração autorizou, ainda em Setembro, esta contratação e esse trabalhador foi recrutado durante o mês de Outubro.
22.- Em Outubro de 2019 houve uma reunião entre o trabalhador PV e a Administração, onde o trabalhador PV explicou a situação envelhecida em que a frota se encontrava e a necessidade de investimento e renovação.
23.- O trabalhador PV propôs um investimento de cerca de 1,8 milhões de euros em renovação de rolantes e estáticos. A Administração adjudicou cerca de 1,5 milhões de euros de investimento para 2020 a iniciar já em 2019.
24.- O novo colaborador, NN, foi admitido no final de 2019, e foram-lhe atribuídas funções para controlar os custos com pneus e gasóleo da BO CIRCULAR, o que deu origem a reduções de custos de aproximadamente € 20.000 no primeiro semestre de 2020". Note-se que os factos 23 e 24 da decisão de despedimento foram julgados provados em 30 e 32.
Ou seja, o apelante considerou que não estava a controlar os custos com gasóleo e pneus por não ter trabalhadores suficientes para isso e que a frota estava envelhecida, propondo à apelante o recrutamento de um novo trabalhador e um investimento de cerca de 1,8 milhões de euros em renovação de rolantes e estáticos, e ao que tudo indica o seu diagnóstico mereceu a concordância da apelada uma vez que no final de 2019 admitiu um novo colaborador e adjudicou cerca de 1,5 milhões de euros de investimento para 2020 a iniciar já em 2019. Ou seja, se a contratação do novo trabalhador certamente contribuiu para a redução de custos, é justo dizer que o mérito dessa medida também deve ser imputado ao próprio apelante, pois que foi dele o diagnóstico da sua necessidade e o consequente efeito da medida! Valendo o mesmo para o investimento em novo material circulante, como está bem de ver. E a circunstância da sentença não ter especificadamente dado estes factos por provados não desmerece a conclusão a que se chegou uma vez que o refere genericamente nos factos provados 11 (relativamente à nota de culpa) e 26 (para a decisão final). E não fora isso sempre teria que se determinar a ampliação da matéria de facto, nos termos do art.º 662.º do Código de Processo Civil, uma vez que tais factos, sendo relevantes para a apreciação do litígio, foram expressamente alegados nos art.os 50.º a 58.º do articulado motivador do despedimento (estranhamente impugnados na amálgama do art.º 65.º da contestação).
Em conclusão, por um lado a imputação de que o apelante efectuava adjudicações sem prévias consultas de mercado não se provou e, por outro, a responsabilidade pelos sobrecustos com pneus e gasóleo das viaturas também não lhe pode ser assacada.
Diferentes são as coisas relativamente à operacionalização das consultas de mercado das reparações, isto porque se provou que no dia 14-05-2020 a apelada determinou que passassem a ser pedidos tês orçamentos por cada encomenda (factos provados 60 e 61), o que levou à redução inicial dos custos de cerca de € 100.000,00 nesse mês e nos subsequentes de metade (factos provados 62 a 64).
Ora, sendo inegável o salto qualitativo da medida de gestão em apreço, deve dizer-se que a mesma não pode ser creditada ao substituto do apelante, mas à própria apelada, pois que foi a sua administração quem tal decidiu, como se viu atrás.
Do mesmo modo, também não pode ser imputado ao apelante o modus operandi anterior, uma vez que lhe competia apenas "Fazer cumprir os objectivos estipulados para a Direcção ao longo da estrutura hierárquica" e "Gerir os seus fornecedores e subcontratados, aplicando os requisitos do processo de Gestão de Compras definido" (facto provado 28).
Assim sendo, não estando provada a determinação da apelada para que até Maio de 2020 o apelante pedisse três orçamentos por cada adjudicação, naturalmente que se não pode dizer que deixou de "aplica[r] os requisitos do processo de Gestão de Compras definido" (sendo relevante notar que os ónus da alegação e prova corriam por conta da apelada, ex vi do n.º 2 do art.º 342.º do Código Civil). E se porventura a apelada o não determinou antes de 2020, como tudo indica pois que sequer tal alegou (mas e apenas a partir de então), o mais que se pode dizer é sibi imputet si quod sæpius cogitare poterat et evitare non fecit!
Por outro lado, também se não pode dizer, como a sentença recorrida, que "numa altura em que a nova direcção pede para diminuir custos e não o faz", pois que se é verdade que a apelada fez tal pedido em 02-01-2020 (factos provados 33 e 49), só em 14-05-2020 determinou que a adjudicação de reparações e a aprovação das facturas passassem a ser precedidas de consulta a três fornecedores (facto provados 60 e 61) e isso coincidiu com a cessação das responsabilidades do apelante nessas áreas (factos provados 40 e 45).
Por fim, com relevo apurou-se que "39.- Foram facturados pela Jopaviming à ré em Abril de 2020, 15 (quinze) reparações de equipamento todas no valor de € 2.700,00 (dois mil e setecentos euros) que o autor admite não terem todas custado tal valor, na medida em que o volume dos contentores era distinto".
Note-se que o apelante sustentou que o facto provado 59 não fora alegado na nota de culpa e na decisão final e que, apesar de ter sido eliminado, certo é que no essencial é idêntico ao provado 39 acima descrito (recorda-se que a diferença decorria do erro do produto da operação aritmética referida no primeiro), pelo que de uma forma ou outra a questão mantém relevância; mas a verdade é que lhe não assiste razão pois o facto constava expressis verbis (com conteúdo ampliado, mas que não foi julgado provado) dos pontos 53 da nota de culpa e 55, alíneas l) e m) da decisão final.
Apesar da divergência com a realidade manifestada no facto, a verdade é que não se pode dizer que tenha a relevância disciplinar para o apelante que a apelada lhe pretendeu dar. É certo que se provou haver uma divergência entre o que foi facturado e os contentores que efectivamente foram reparados, pois que apesar de não terem o mesmo volume o valor unitário da reparação foi o mesmo; todavia, daí não resulta demonstrado qualquer prejuízo para a apelada uma vez que se não provou qual deveria ter sido o valor da reparação de cada um e, consequentemente, da totalidade dos contentores cuja reparação foi facturada à apelada.
E assim sendo as coisas, uma vez que em decorrência do estatuído pelo art.º 342.º, n.º 1 do Código Civil o ónus da prova de todos os factos disciplinarmente relevantes corria por conta da apelada, Neste sentido, vd. o acórdão Supremo Tribunal de Justiça, de 29-09-2021, no processo n.º 5999/19.0T8FNC.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt. que o não logrou observar, ter-se-á que concluir que o despedimento do apelante foi ilícito por ter sido perpetrado sem justa causa.
4.5.2-Assente que não havia justa causa para a apelada despedir o apelado, vejamos agora as consequências daí decorrentes.
O art.º 389.º do Código do Trabalho estatui o seguinte:
"1- Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado:
a)-A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais;
b)-Na reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, salvo nos casos previstos nos artigos 391.º e 392.º
(…)".
Por sua vez, diz o art.º 390.º:
"1- Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento.
2- Às retribuições referidas no número anterior deduzem-se:
a)-As importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento;
b)-A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento;
c)-O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º 1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social".
Por fim, refere o art.º 391.º do Código do Trabalho Serão deste diploma as normas doravante citadas sem outra referência. refere o seguinte:
"1- Em substituição da reintegração, o trabalhador pode optar por uma indemnização, até ao termo da discussão em audiência final de julgamento, cabendo ao tribunal determinar o seu montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.º
2- Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial.
3- A indemnização prevista no n.º 1 não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades".
A primeira consequência lógica decorrente do despedimento ilícito é o direito do trabalhador ser reintegrado na empresa, podendo no entanto optar por uma indemnização até ao termo da discussão em audiência final de julgamento, o que o apelante fez e por isso importa fixar o seu montante; que, como vimos, se situa entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade (art.º 391.º, n.º 1); o que pressupõe resolvida a questão, também suscitada pelo apelante, do valor da retribuição mensal visto que esta (acrescida, eventualmente, das diuturnidades) é um dos pressupostos daquela (art.º 391.º, n.º 1).
A este propósito tem sido enfatizado pela jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que "na fixação do valor referência da indemnização de antiguidade relevam, por um lado, o valor da retribuição e, por outro lado, o grau de ilicitude: quanto menor for a retribuição, mais elevada deve ser a indemnização; e mais elevada deve ser a indemnização quanto maior for a ilicitude". Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24-02-2011, no processo n.º 2867/04.4TTLSB.S1, publicado em http://www.dgsi.pt; no mesmo sentido, o acórdão de 19-02-2013, no processo n.º 2018/08.6TTLSB.L1.S1, publicado em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-tematica/indemnizacaodeantiguidade_social.pdf e de 12-01-2017, no processo n.º 1368/15.0T8LSB.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt.
Quer isto dizer, portanto, seguindo ainda a lição do Supremo Tribunal de Justiça, agora no acórdão de 19-02-2013, no processo n.º 2018/08.6TTLSB.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt, que "a indemnização substitutiva da reintegração assume feição mista (reparadora e sancionatória), devendo ser calculada em função dos parâmetros indicados no n.º 1 do citado art. 439.º (valor da retribuição vs. grau da ilicitude), sendo o primeiro (retribuição) factor de variação inversa (quanto menor for, maior deve ser o valor/ano, dentro da latitude legalmente prevista) e o segundo (ilicitude), de variação directa". No mesmo sentido, seguiu ainda o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 26-05-2015, no processo n.º 373/10.7TTPRT.P1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt.
E é aqui que entra a necessidade de se apurar o valor da retribuição base (o apelante não auferia diuturnidades) do apelante, questão que, como se disse, também foi por ele suscitada e que por isso importa desde já determinar.
O apelante pretendia que se declarasse que o valor ilíquido da sua retribuição mensal era de € 4.736,04, mas apenas se provou que "8.- O A. auferia, à data da cessação do seu contrato de trabalho, a retribuição base de 4.300,00€ (quatro mil e trezentos euros)", pelo que é nessa medida que se atenderá à apelação.
Ora, o valor da retribuição base do apelante corresponde a pouco mais de seis vezes e meias a retribuição mínima mensal garantida no ano de 2021 (€ 665,00, fixado pelo Decreto-Lei n.º 109-A/2020, de 31 de Dezembro), que foi o ano do despedimento do apelante (facto provado 26), pelo que para os padrões do país se terá que considerar como médio-elevado (mas ainda assim se deverá ter em conta que o rendimento anual daquele é líquido de impostos, mas o rendimento anual do apelante não, antes sujeito a uma taxa média de 37,613% decorrente do art.º 68.º do Código do IRS, que baixa aquela rácio para quatro); pelo que o valor ano deve ser valorado numa proporção inversa, nos termos referidos.
No que concerne ao grau de ilicitude, dir-se-á que é médio, atendendo ao contexto em que os factos foram praticados pela apelante (pretendia baixar custos numa situação de stresse económico derivada de factor incontornável, mas a sua antiguidade na empresa, superior a 13 anos, merecida sem dúvida outro grau de cuidado).
Assim sendo, a indemnização deve ser achada com base em 20 dias de retribuição por cada ano completo ou fracção de antiguidade, pelo que se considerada aquela antiguidade do apelante na empresa deve a apelada ser condenada a pagar-lhe uma indemnização em substituição da reintegração no valor de € 45.866,66 ([€ 4.300,00 : 30] x 20 x 16).
Mas, como se viu atrás, o art.º 389.º, n.º 1, alínea a) estabelece ainda que no caso do despedimento ser ilícito o trabalhador tem também direito a ser indemnizado pelo empregador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais.
Quanto a isto o apelante pediu que a apelada fosse condenada a pagar danos não patrimoniais em valor a arbitrar pelo Tribunal.
A este propósito, estabelece o art.º 389.º que "1- Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado: a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais".
Por sua vez, o art.º 496.º do Código Civil refere no n.º 1 que "na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito" e no n.º 4 que "o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º".
A este propósito provou-se que "69. O despedimento causou tristeza no A., tornando-se este mais calado, isolando-se, ficando deprimido e tendo perdido peso".
Trata-se de consequências do despedimento que sem dúvida alguma merecem a tutela do direito. É certo que a jurisprudência amiúde tende a descartar situações de tristeza causadas pelo despedimento, admitindo que constituam dano, mas não de gravidade suficiente para merecerem reparação por serem reacção normal de quem passa por situações similares; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13-07-2011, no processo n.º 105/08.0TTSNT.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt. todavia, já o mesmo se não pode dizer de estados psíquicos como a depressão, pois que por um lado não são consequência característica de todo e qualquer despedimento e, por outro, são substancialmente mais graves e por isso merecedores de tutela jurídica (neste sentido, vd. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 27-02-2008, no processo n.º 07S2901, da Relação de Lisboa, de 08-11-2000, no processo n.º 0036584 e da Relação de Évora, de 15-05-2007, no processo n.º 603/07-2, publicados em http://www.dgsi.pt). Mais ainda assim é se para além de consequências puramente psíquicas como a tristeza, o isolamento e a depressão teve repercussões de índole física, como foi a perda de peso. Pelo que sopesando tudo isso não pode deixar de se considerar as consequências do despedimento do apelante como suficientemente graves para serem tidas como danos merecedores de reparação pecuniária.
Já o valor da sua compensação deve ser determinado segundo critérios de equidade, relevando "o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem" (art.os 496.º, n.º 4 e 494 do Código Civil).
Com interesse provou-se apenas que o apelante era Director de Logística e Gestão de Activos e, portanto, um trabalhador qualificado (facto provado 28), com antiguidade reportada ao dia 09-08-2008 (facto provado 4) e sem qualquer mácula disciplinar (facto provado 44), que os factos ocorreram num período em que grassava uma pandemia sanitária global com consequente diminuição da actividade económica em Portugal e no Mundo (factos notórios, que não precisam de alegação e prova ex vi do art.º 412.º do Código de Processo Civil, mas em todo o caso bem espelhados no facto provado 33, 37, 43 e 49), pelo que se justifica fixar equitativamente a compensação devida ao apelante a este título em € 6.000,00.
Por outro lado, vimos atrás que o art.º 390.º, n.º 1, alínea a) concede ainda ao trabalhador o direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento.
Repare-se que a lei apenas se refere agora a "retribuições" e não, como no caso atrás enunciado, em "retribuições base", pelo que importa abrir novo parêntesis para determinar qual era o valor da retribuição do apelante, questão que este também trouxe à colação nos autos.
Com efeito, o apelante pediu que fosse reconhecido que o veículo e o telemóvel que lhe foram atribuídos faziam parte integrante da sua retribuição mensal e que o seu valor fosse liquidado em sede de execução de sentença.
Ora, o art.º 258.º estabelece no n.º 1 que "considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho", no n.º 2 que "a retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie" e no n.º 3 que "presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador".
Por seu turno, o art.º 259.º refere no n.º 1 que "a prestação retributiva não pecuniária deve destinar-se à satisfação de necessidades pessoais do trabalhador ou da sua família e não lhe pode ser atribuído valor superior ao corrente na região" e no n.º 2 que "o valor das prestações retributivas não pecuniárias não pode exceder o da parte em dinheiro, salvo o disposto em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho".
Finalmente, o art.º 261.º estatui no n.º 1 que "a retribuição pode ser certa, variável ou mista, sendo esta constituída por uma parte certa e outra variável", no n.º 2 que "é certa a retribuição calculada em função de tempo de trabalho" e no n.º 3 que "para determinar o valor da retribuição variável, quando não seja aplicável o respectivo critério, considera-se a média dos montantes das prestações correspondentes aos últimos 12 meses, ou ao tempo de execução de contrato que tenha durado menos tempo".
Com interesse provou-se que "8.- O A. auferia, à data da cessação do seu contrato de trabalho, a retribuição base de € 4.300,00 (quatro mil e trezentos euros)", que "9.- Mais auferia reembolso de Despesas até ao limite mensal de € 400 (quatrocentos euros); • Cartão combustível; • Via verde; • Chip abastecimento gasóleo" e que ""8-A. À data do despedimento, o autor auferia ainda: • Telemóvel, para uso profissional e particular; • Viatura, carinha Volkswagen, com a matrícula ...-ZJ-..., para uso profissional e particular".
Assim sendo, presumindo-se legalmente a natureza retributiva dessas atribuições e não tendo a apelada ilidido tal presunção, como lhe competia ex vi dos art.º 342.º, n.os 1 e 2 e 350.º, n.º 1 e 2 do Código Civil, ter-se-á que considerar que as mesmas integravam a retribuição na medida em que a sua utilização era não apenas profissional como também particular (quanto ao uso particular do telemóvel, vd. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 12-09-2007, no processo n.º 1513/07 - 4.ª Secção, publicado em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2021/08/retribuicao-e-componentes-remuneratorias-2005-a-julho-de-2021-seccao-social.pdf e de 24-09-2008, no processo n.º 08S1031, publicado em http://www.dgsi.pt; e do veículo automóvel, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 13-02-2019, no processo n.º 7847/17.7T8LSB.L1.S1, da Relação do Porto, de 08-06-2022, no processo n.º 2887/20.1T8PRT.P1 e da Relação de Lisboa, 29-05-2019, no processo n.º 603/17.4T8LSB.L1-4 e de 29-03-2023, no processo n.º 24780/21.0T8LSB.L1-4, publicados em http://www.dgsi.pt).
Todavia, importa considerar que "o valor da retribuição em espécie correspondente à utilização permanente de veículo automóvel tem valor equivalente ao benefício económico obtido pelo trabalhador, por via do uso pessoal da viatura (no qual não se inclui o uso profissional)" (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25-06-2015, no processo n.º 1256/13.4TTLSB.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt; na mesma linha, vd. os acórdãos da Relação de Lisboa, de 11-10-2017, no processo n.º 5210/12.5TTLSB.L1, publicado em https://www.pgdlisboa.pt/jurel/jur_mostra_doc.php?codarea=59&nid=5308 e de 29-05-2019, no processo n.º 603/17.4T8LSB.L1-4, publicado em http://www.dgsi.pt), pelo que só essa medida se concede a apelação do autor.
A isto não obsta a circunstância de se desconhecer o valor patrimonial da atribuição correspondente à utilização particular do telemóvel e do veículo automóvel, pois que tal pode e deve ser apurada em liquidação em consonância com o estatuído pelo art.º 609.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (neste sentido, vd. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25-06-2015, no processo n.º 1256/13.4TTLSB.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt).
Aqui chegados, e uma vez que ao valor conhecido da retribuição base de € 4.300,00 mensais acrescerá os valores destas prestações a liquidar, restará condenar a apelada a pagar ao apelante o valor global que se vencer até ao trânsito em julgado da sentença e deste acórdão em conformidade com o que então se apurar.
Deve no entanto determinar-se o desconto nas retribuições de todas as prestações do subsídio de desemprego que porventura tenham sido atribuído ao trabalhador naquele período uma vez que "constitui matéria de conhecimento oficioso, já que se trata de uma prestação do Estado, substitutiva da retribuição, que, uma vez recuperada, tem que ser devolvida à Segurança Social, não redundando, por isso, num qualquer beneficio para o empregador". Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12-09-2012, no processo n.º 154/06.2TTMTS-C.P1.S1; e no mesmo sentido o acórdão da Relação do Porto, de 20-12-2011, no processo n.º 406/10.7TTVCT.P1, ambos publicados em http://www.dgsi.pt.
4.5.3-Vejamos agora o pedido do apelante de condenação da apelada a pagar-lhe uma indemnização por violação do seu direito de ocupação efectiva.
O n.º 1 do art.º 129.º estabelece que "é proibido ao empregador: (…) b) Obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho".
Como está bem de ver, "a obrigação de cumprimento do dever de ocupação efectiva do trabalhador pressupõe que se mantenha em vigor o contrato de trabalho pois que, cessado este [ainda que, por hipótese, por despedimento ilícito], cessa o poder directivo do empregador" (acórdão da Relação do Porto, de 13-05-2019, no processo n.º 7902/15.8T8PRT.P1); por outro lado, tal "pressupõe que exista por parte do empregador comportamentos injustificadamente obstativos da prestação efectiva de trabalho, pelo que só ocorre a violação desse direito se se verificar uma injustificada desocupação do trabalhador determinada pela empregadora" (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, 31-05-2016, no processo n.º 3715/13.0TTLSB.L1.S1, como aquele publicado em http://www.dgsi.pt).
O direito de ocupação efectiva decorre do princípio geral da boa-fé na execução do contrato de trabalho e a sua violação ocorre quando o empregador age de má-fé, sendo amiúde relacionado com uma atitude discriminatória, quando não de assédio do trabalhador (Pedro Romano Martinez e outros, Código do Trabalho Anotado, 13.ª edição, Almedina, Coimbra, 2020, página 340); em paralelo, "o nosso ordenamento jurídico jus-laboral consagra um dever de ocupação efectiva a cargo do empregador, o qual constitui um verdadeiro dever de prestação do empregador e traduz-se na exigência de ser dada ao trabalhador a oportunidade de exercer efectivamente e sem quaisquer dificuldades ou obstáculos a actividade contratada" (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12-01-2006, no processo n.º 35/05 - 4.ª Secção, publicado em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/social2006.pdf).
Todavia, como em geral ocorre com a responsabilidade civil fundada noutras causas, a par da ilicitude da conduta é necessário que a mesma tenha sido culposa e causadora de danos que se produzam em virtude de um nexo de causalidade com a conduta ilícita (neste sentido, vd. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30-03-2006, no processo n.º 06S013, publicado em http://www.dgsi.pt).
Tratando-se de factos constitutivos do direito que o apelante pretende ver declarado, correm por sua conta os ónus da alegação e da prova de todos os seus pressupostos, com excepção da culpa porque essa é legalmente presumida (art.os 342.º, n.º 1, 350.º, n.º 1 e 799.º, n.º 1 do Código Civil; cabendo o empregador alegar e provar a sua justificação, nos termos do n.º 2 do citado art.º 342.º, como de resto recordou o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de 13-07-2011, no processo n.º 105/08.0TTSNT.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt); pelo que "a ausência de um dos requisitos da responsabilidade contratual […] igualmente impede a condenação da entidade empregadora por danos não patrimoniais" (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07-10-2004, no processo n.º 04S1003, publicado em http://www.dgsi.pt).
Neste aspecto, o apelante alegou em reconvenção e provou que "40.- No dia 14 de Maio de 2020 o Eng.º DD assumiu a coordenação da área da manutenção, deixando o trabalhador PV de ter qualquer responsabilidade nessa área" e que "45. A 14/05/2020 a ré retirou ao autor a coordenação da área de gestão de Activos"; também alegou (264.º da reconvenção), mas não provou, que "Em 14 de Maio de 2020, o Autor foi suspenso das funções de Director de Gestão de Activos, conforme confessado pela Ré no art.º 102.º da motivação do despedimento, sem que para o efeito tenha sido apresentada qualquer justificação e/ou fundamento para o efeito".
Tendo em conta as funções atribuídas ao apelante (facto provado 28), é apodíctico dizer que não alegou nem consequentemente provou que a apelada o tenha privado em absoluto do exercício das funções que lhe estavam atribuídas (desocupação), embora se deva reconhecer que tal ocorreu relativamente a parte significativamente relevante pois que se traduziu num esvaziamento muito substancial das funções que lhe estavam acometidas.
Assim, ainda que se pudesse dizer que a apelada violou o direito do apelante à ocupação efectiva, a verdade é que não pode proceder a sua pretensão em ver condenada a pagar-lhe a compensação peticionada porquanto se não provou que isso tenha causado quaisquer danos ao apelante; provou-se, é certo, que "69. O despedimento causou tristeza no A., tornando-se este mais calado, isolando-se, ficando deprimido e tendo perdido peso", mas isso, como está bem de ver, foi consequência do despedimento e não propriamente da desocupação parcial funcional do apelante, pelo que se eventualmente poderá relevar enquanto dano moral nesse domínio, seguramente que não nestoutro.
Pelo que se conclui que nesta parte não procede a apelação ao autor.
4.5.4-Cabe ainda apreciar o pedido formulado pelo apelante de condenação da apelada a pagar-lhe a quantia de € 3.278,80 a título de compensação pela ausência de formação profissional durante os últimos três anos nos termos do art.º 131.º, n.º 2 (40 horas x 3 anos).
Estabelece essa norma que "o trabalhador tem direito, em cada ano, a um número mínimo de trinta e cinco horas de formação contínua ou, sendo contratado a termo por período igual ou superior a três meses, um número mínimo de horas proporcional à duração do contrato nesse ano".
Por seu lado, provou-se que "47.- O Autor não teve qualquer formação nos últimos anos, pelo menos nos últimos três anos".
A sentença condenou a apelada a pagar ao apelante a quantia de € 3.402,00 a título de formação profissional não ministrada nos últimos três anos com base no pedido formulado pelo apelante (art.os 351.º a 354.º da reconvenção), para o que levou em conta a retribuição de € 4.300,00 mensais que julgou provada.
O apelante sustenta que uma vez provados os factos que alegou nos art.os 91.º, 330.º, 336.º e 334.º da reconvenção relativamente à inclusão na sua retribuição do valor da atribuição para uso particular do veículo automóvel e do telemóvel isso deverá ser tido em conta na definição da indemnização por formação profissional não ministrada.
Todavia, o valor que a sentença a esse título concedeu ao apelante (€ 3.402,00) supera já o do pedido de condenação da apelada por ele formulado na acção (€ 3.278,80), pelo que apesar de lhe assistir razão no que concerne aos pressupostos da questão suscitada não pode conceder-se a apelação (art.º 609.º, n.º 1 do Código de Processo Civil).
4.5.4-O apelante pediu ainda que a apelada fosse condenada a pagar-lhe juros de mora sobre as referidas quantias, desde a citação até efetivo, total e integral pagamento.
Tendo em conta o pedido, as decisões enunciadas e o disposto nos art.os 559.º, n.º 1, 804.º, n.os 1 e 805.º, n.º 2, alínea b) e 806.º, n.os 1 e 2 do Código Civil e Portaria n.º 291/03, de 8 de Abril, sobre cada uma das prestações de capital vencidas são devidos, pela apelada, juros de mora à taxa de 4% ao ano, desde a citação até efectivo pagamento.
4.5.5-Por fim, o apelante pediu que a apelada fosse condenada a pagar, nos termos do disposto no art.º 829.º-A do Código Civil, uma sanção pecuniária compulsória em valor a arbitrar pelo Douto Tribunal, por cada dia de incumprimento, ainda que meramente parcial, data da sentença que vier a ser proferida até efetivo e integral cumprimento desta.
A supra citada norma estatui o seguinte:
"1- Nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.
2- A sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior será fixada segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar.
3- O montante da sanção pecuniária compulsória destina-se, em partes iguais, ao credor e ao Estado.
4- Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indemnização a que houver lugar".
Como se lê no n.º 1 do citado normativo, a sanção pecuniária compulsória está prevista para compelir ao cumprimento o devedor de obrigações de facto infungíveis, ou seja, aquelas que apenas podem ser cumpridas pelo próprio devedor (as fungíveis podem ser cumpridas por terceiro quando daí não decorra qualquer prejuízo para o credor, conforme decorre dos art.os 767.º, n.os 1 e 2 e 768.º, n.º 1 do Código Civil).
Ora, embora a prestação assumida pelo trabalhador seja (pelo menos) quasi sempre infungível, Menezes Cordeiro, in Direito do Trabalho II - Direito Individual, 2019, Almedina, Coimbra, páginas 150 e seguinte, João Leal Amado, Contrato de Trabalho, 2014, 4.ª edição, Coimbra Editora, página 76. não existem razões de princípio para o mesmo ocorrer com a prestação do empregador, pois que ao cabo e ao resto a retribuição é em regra pecuniária (art.os 258.º, n.º 2 e 259.º, n.º 2) e o dinheiro é por definição um instrumento geral de troca. Daí que Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, 2017, 8.ª edição, Almedina, página 311 refira até que "a obrigação de pagar mensalmente o salário pode ter sido assumida por terceiro".
De resto, sobre esta questão já decidiu a Relação de Lisboa, em acórdão de 28-06-2017, no processo n.º 7078/14.2T8SNT.L1-4, publicado em http://www.dgsi.pt:
"Como a sua própria designação indica, a sanção pecuniária compulsória constitui uma medida coercitiva, de natureza pecuniária, traduzindo-se numa condenação acessória da condenação principal. Visa compelir o devedor a cumprir, sob a ameaça do pagamento duma determinada quantia por cada período de atraso no cumprimento da prestação ou por cada infracção. É uma medida marcadamente preventiva. A ameaça só se converte em 'sanção', se o devedor resolver não cumprir, suportando a desvantagem monetária daí decorrente, desvantagem, todavia, que não o liberta da obrigação principal.
Do n.º 1 do citado artigo 829.º-A resulta clara a natureza subsidiária da medida adoptada. O legislador não consagrou a sanção pecuniária compulsória como mecanismo coercitivo de aplicação geral, reservando a sua aplicação para os casos em que a execução específica não tem lugar (prestações de facere e de non facere), em virtude do cumprimento exigir a intervenção insubstituível do devedor.
No caso vertente, como resulta do exposto, a recorrida não será condenada a proceder à reintegração da recorrente em consequência da ilicitude do despedimento, mas, apenas, a pagar-lhe as retribuições intercalares nos termos já definidos, pelo que não se verificam os pressupostos previstos no artigo 829.º-A, n.º 1 para a pretendida condenação da recorrida numa sanção pecuniária compulsória de € 150,00 diários.
Improcede neste aspecto a pretensão da recorrente".
E subsequentemente acrescentou o citado aresto, na nota de rodapé 15: "A lógica do carácter subsidiário da sanção pecuniária compulsória é quebrada no n.º 4 do citado preceito, que aqui não está em causa na medida em que a sua aplicação não depende da intervenção judicial e funciona automaticamente a partir do trânsito em julgado da sentença de condenação quando esta seja em quantia líquida ou do trânsito em julgado da decisão que julgar a liquidação, quando tal não ocorra (vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Janeiro de 2003, Processo n.º 02B4173, e de 2016.03.03, Processo n.º 4946/05.1TTLSB.L2.S1, ambos in www.dgsi.pt)".
É certo que debruçando-se a Relação do Porto sobre um caso paralelo em que também considerou que "o credor não necessita de pedir, na acção declarativa, a condenação do devedor na sanção pecuniária a que se refere o artigo 829.º-A n.º 4 do Código Civil. Basta que reclame no requerimento inicial da acção executiva", O carácter automático da sanção pecuniária compulsória estabelecida no n.º 4 do art.º 829.º-A do Código Civil é generalizadamente reconhecido na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, de que são exemplo os acórdãos de 12-09-2019, no processo n.º 8052/11.1TBVNG-B.P1.S1 e de 31-03-2022, no processo n.º 9423/19.0T8SNT-A.L1.S1, publicados em http://www.dgsi.pt. em acórdão, de 17-11-1998, no processo n.º 9820317, publicado em http://www.dgsi.pt concluiu afinal que "o facto de a sanção decorrer da própria lei não veda ao credor a possibilidade de pedir, na acção declarativa, a condenação do devedor na referida sanção"; No mesmo sentido, vd. o acórdão da Relação do Porto, de 16-06-1997, no processo n.º 9820317, parecendo ser de acolher este entendimento, todavia apenas se determinará a sua aplicação imediata à condenação da parte líquida, sem prejuízo da sua consideração em eventual incidente da liquidação.
***

III-Decisão.
Termos em que se acorda:
a)- quanto à impugnação da decisão da matéria de facto, conceder parcialmente a apelação e, em consequência:
i.- alterar a redacção do facto provado 49, ficando assim:
"Esta administração reuniu com o apelante em Janeiro de 2020 e afirmou a necessidade de planos de contenção, com particular atenção aos custos e à necessidade de autorização para grandes reparações, o que foi reforçado em nova reunião, em Março de 2020, na qual também estiveram presentes outros directores e onde foi dito para parar com os investimentos e projectos";
ii.- julgar não provados os factos julgados provado 50 a 55;
ii.- eliminar os factos julgados provados 56 a 59;
iv.- julgar não provado o facto julgado provado 71;
v.- julgar provado o facto julgado não provado 11, ficando assim:
"55-A. O registo de envio e chegada de equipamentos e os comprovativos das reparações era responsabilidade de OO, o qual nunca questionou o A.";
vi.- julgar provado o seguinte facto:
"8-A. À data do despedimento, o autor auferia ainda:
· Telemóvel, para uso profissional e particular;
· Viatura, carinha Volkswagen, com a matrícula ...-ZJ-..., para uso profissional e particular";
b)- no que concerne às questões jurídicas:
i.- declarar a ilicitude do despedimento do apelante;
ii.- condenar a apelada a pagar-lhe uma indemnização em substituição da reintegração no valor de € 45.866,66 (quarenta e cinco mil oitocentos e sessenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos);
iii.- condenar a apelada a pagar-lhe a quantia de € 6.000,00 (seis mil euros) a título de danos não patrimoniais decorrentes do despedimento;
iv.- reconhecer que o valor ilíquido da retribuição mensal do apelante era no valor de € 4.300,00 (quatro mil e trezentos euros);
v.- reconhecer que o uso particular do veículo e do telemóvel atribuídos ao apelante faziam parte integrante da sua retribuição mensal, sendo os seus valores apurados em liquidação de sentença no que será tido em conta que também eram utilizados no serviço profissional;
vi.- condenar a apelada a pagar-lhe o valor global de todas as retribuições que se vencerem até ao trânsito em julgado da sentença, descontadas as prestações do subsídio de desemprego que porventura entretanto tenham sido atribuídas ao apelante;
vii.- condenar a apelada a pagar-lhe juros de mora sobre cada uma das prestações, à taxa de 4% ao ano, desde a citação até efectivo pagamento;
viii.- são devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, sobre a quantia de € 6.000,00 (seis mil euros) concedida ao apelante a título de danos não patrimoniais, sem prejuízo do que quanto ao mais vier a ser objecto de eventual liquidação;
c)- no mais, confirmar a sentença recorrida.

Custas por ambas as partes na proporção do decaimento (art.º 527.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo Civil e 6.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela I-B a ele anexa).
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Lisboa, 07-02-2024.


(Alves Duarte)
(Leopoldo Soares)
(Alda Martins)