Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CARLOS CASTELO BRANCO (VICE-PRESIDENTE) | ||
Descritores: | CONFLITO DE COMPETÊNCIA TRÂNSITO EM JULGADO PENDÊNCIA QUESTÃO MESMO TRIBUNAL | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 11/29/2024 | ||
Votação: | DECISÃO INDIVIDUAL | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | CONFLITO DE COMPETÊNCIA | ||
Decisão: | INDEFERIDO | ||
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Sumário: | I. Como resulta dos artigos 99.º, n.º 2, 101.º e 109.º, nºs 1 e 2 do CPC, só existe conflito de competência dirimível nos termos do artigo 109.º e seguintes, quando, sendo a incompetência decretada findos os articulados, o autor requeira a remessa do processo para o tribunal considerado competente (art.º 99º, nº 2) e este, no processo remetido, decline igualmente a competência (art.º 109º, nºs 1 e 2), ou quando, perante a decisão de incompetência, se interponha recurso no qual se decida qual o tribunal competente, mas noutro tribunal esteja pendente a mesma acção (art.º 101º, nº 3 do CPC). II. No caso, tratando-se de dois processos intentados perante dois tribunais distintos, não estamos perante um conflito negativo de competência cuja resolução caiba ao Presidente da Relação. III. A intervenção da presidência do Tribunal da Relação na resolução do conflito negativo de competência pressupõe a existência de uma mesma questão, sendo que, esta, só é a mesma quando suscitada no âmbito do mesmo processo e não em processos diferentes, ainda que, uma das decisões já objeto de trânsito em julgado. Tal é o que resulta do disposto nos artigos 100.º e 109.º, n.º 2, do CPC. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | * I. 1. Por petição inicial apresentada no Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol em 16-05-2024, “A” e “B” instauraram ação declarativa com processo comum, para reconhecimento judicial da situação de união de facto, contra o Estado Português, representado na presente ação pelo Ministério Público, Pedem seja decretado o reconhecimento da situação de união de fato entre os Autores, nos termos e para os fins do n.º 2 do artigo 1.º da Lei 7/2001, de 11 de maio, do n.º 3 do artigo 3.º da Lei nº 37/81, de 3 de outubro e dos n.ºs 2 e 4 do artigo 14.º do Decreto-Lei 237-A/2006, de 14 de dezembro. 2. Citado o réu, foi deduzida contestação – apresentada em juízo em 17-06-2024 – por impugnação. 3. Em 01-10-2024 foi proferido o seguinte despacho: “(…) DA INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA Nos presentes autos vieram os Autores “A” e “B”, residentes na Ribeira Brava, intentar contra o Réu Estado Português, representado pelo Ministério Público, ação declarativa de reconhecimento de união de facto, nos termos e para os efeitos do artigo 3.º, n.º 3, da Lei da Nacionalidade, pugnando pela competência deste Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol. O Ministério Público, em representação do Estado Português veio contestar, apresentando defesa por impugnação. Cumpre apreciar e decidir. Dispõe o artigo 211.º da Constituição da República Portuguesa que os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais, sendo que na primeira instância pode haver tribunais com competência específica e tribunais especializados para o julgamento de matérias determinadas. Materializando tais princípios, o artigo 60.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, estatui que a competência dos tribunais judiciais, no âmbito da jurisdição civil, é regulada conjuntamente pelo estabelecido nas leis de organização judiciária e pelas disposições deste Código. No que respeita ao enquadramento e organização do sistema judiciário a Lei de Organização do Sistema Judiciário (LOSJ) dispõe o artigo 37.º, n.º 1, que, na ordem jurídica interna, a competência reparte-se pelos tribunais judiciais segundo a matéria, o valor, a hierarquia e o território. Quanto à competência em razão da matéria, o regime regra está consagrado no artigo 40.º da LOSJ: “1 - Os tribunais judiciais têm competência para as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional. 2 - A presente lei determina a competência, em razão da matéria, entre os juízos dos tribunais de comarca, estabelecendo as causas que competem aos juízos de competência especializada e aos tribunais de competência territorial alargada.” Os tribunais judiciais de 1.ª instância são, em regra, os tribunais de comarca - cf. artigo 79.º da LOSJ - e desdobram em juízos, a criar por decreto-lei, que podem ser de competência especializada, de competência genérica e de proximidade – cf. artigo 81.º, n.º 1, da LOSJ. Entre os juízos de competência especializada encontram-se os de família e menores – cf. artigo 81.º, n.º 3, al. g), da LOSJ, aos quais compete julgar as causas em referência nos artigos 122.º a 124.º, da LOSJ, entre as quais, as ações relativas ao estado civil das pessoas e família. O caso dos autos constitui uma ação de reconhecimento de uma situação de união de facto, para efeitos de atribuição da nacionalidade portuguesa, nos termos previstos no artigo 3.º da Lei da Nacionalidade. Traduzindo-se a união de facto na “situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos.” (cf. artigo 1.º, n.º 2, da Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, que adota medidas de proteção das uniões de facto). Trata-se de um instituto com proteção constitucional (cf. artigo 36.º, n.º 1, da CRP), equiparada em muitos casos ao vínculo conjugal e socialmente aceite como entidade familiar. Determina o artigo 122.º, n.º 1, al. g), da LOSJ que compete aos juízos de família e menores, além do mais, “preparar e julgar: (…) g) Outras acções relativas ao estado civil das pessoas e família”. Donde se conclui que a ação de reconhecimento de uma situação de união de facto é da competência dos Juízos de Família e Menores. Neste sentido - e não olvidando a existência de jurisprudência em sentido contrário -, existe ampla jurisprudência, entre a qual destacamos o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa 06-12-2022, Rel. Edgar Taborda Lopes, proc. 1163/22.0T8FNC.L1-7, in www.dgsi.pt, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13-11-2023, Rel. Joaquim Moura, proc. 8894/22.2T8VNG.P1, in www.dgsi.pt e o acórdão do Tribunal da Relação e Lisboa 08-04-2024, Rel. Arlindo Crua, proc. 20621/23.2T8LSB.L1-2, in www.dgsi.pt - posição perfilhada por este tribunal. Também não olvidamos a menção expressa no artigo 3.º, n.º 3, da Lei da Nacionalidade, a qual atribui competência para julgar estas ações ao “tribunal cível”. Entendemos, porém, que tal menção deve ser entendida como “tribunal judicial”, por oposição aos tribunais administrativos. A este propósito veja-se, entre outros, o decidido no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13-11-2023, Rel. Joaquim Moura, proc. 8894/22.2T8VNG.P1, in www.dgsi.pt: “I - Com a menção ao “tribunal cível”, feita no artigo 3.º, n.º 3, da Lei da Nacionalidade como sendo o tribunal competente para a acção visando o reconhecimento da situação de união de facto, apenas se quis deixar expresso, para não haver dúvidas, de que só o contencioso da nacionalidade passava para a jurisdição administrativa e que aquelas acções continuavam a ser propostas nos tribunais comuns; II - Por isso deve entender-se que, com a referência a “tribunal cível”, o legislador quis referir-se a “tribunal judicial” e não propriamente estabelecer uma excepção à atribuição de competência que decorria da aplicação das regras gerais de distribuição de competência em razão da matéria pelos diversos tribunais judiciais; II - Nesse pressuposto, é de entender que a norma do artigo 3.º, n.º 3, da Lei da Nacionalidade, tal como se argumentou no Ac. TRL de 06.12.2022, não se perfila como uma norma excepcional, antes se conforma com a lei geral, pelo que, nos termos do artigo 122.º, n.º 1, al. g) da LOSJ, são os Juízos de Família e Menores os competentes em razão da matéria para preparar e julgar as acções em que se pretende o reconhecimento da situação de união de facto, pressuposto da aquisição de nacionalidade portuguesa.” Com efeito, no acórdão acima citado do Tribunal da Relação de Lisboa 06-12-2022, Rel. Edgar Taborda Lopes, proc. 1163/22.0T8FNC.L1-7, in www.dgsi.pt, encontra-se devidamente explicitado que: “O artigo 3.º, n.º 3, da Lei da Nacionalidade-LN (conjugado com o artigo 14.º, n.ºs. 2 e 4, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa) não pode ser interpretado como constituindo uma norma especial que derroga lei geral (o artigo 122.º, n.º1, alínea g)) uma vez que: a - o objectivo da norma foi apenas o de obstar a que estas acções ficassem sob a égide da competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais (como decorreria do artigo 26.º da LN que, por via da legislação aplicável, atribui o contencioso da nacionalidade aos Tribunais Administrativos e Fiscais); b - no momento da publicação da LN inexistia norma semelhante à da alínea g) do artigo 122.º da LOSJ e a acção sempre seria da competência dos Tribunais Cíveis, não se tendo pretendido efetuar uma atribuição diferente daquela que na altura resultava da aplicação das regras gerais da LOFTJ; c - podendo o legislador atribuir competência material para o tipo de processos que entender e nos instrumentos legislativos que tiver por convenientes, é linear que a Lei da Nacionalidade não constitui a sede legal natural, normal ou mesmo óbvia, para delimitar a competência material dos juízos dos tribunais judiciais para uma determinada acção, sendo esse o motivo pelo qual no n.º 3 do artigo 3.º, a Lei aceitou, se conformou e se adequou ao que a LOFTJ regulava, não constituindo a escolha dos Tribunais Cíveis uma opção autónoma, mas apenas um sancionar da realidade normativa existente; d - se o legislador não criou nenhuma norma especial que contrariasse o que decorria da lei geral não faz sentido que, com a vigência da alínea g) do artigo 122.º da LOSJ, se passe a considerar ex post o n.º 3 do artigo 3.º da LN, como norma especial, quer por não haver dúvidas de que está em causa matéria de Direito da Família, quer por não haver razões materiais e substantivas que apontem para isso; e - tal interpretação constituiria forçar o legislador a, décadas depois, dizer o que não quis dizer no momento da elaboração da norma, e contrariar a sua opção inicial de respeitar a opção da LOFTJ (hoje LOSJ) e sem qualquer razão de fundo que o justificasse; f - tal interpretação tornaria a norma inconstitucional, porque teria o resultado de discriminar entre as várias formas de constituir família, contra o disposto na primeira parte do n.º 1 do artigo 36.º da CRP.” Donde, considera-se que este Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol não será o competente para tramitar o presente processo face às competências atribuídas ao Juízo de Família e Menores no artigo 122.º, n.º 1, alínea g), da LOSJ - o que configura uma exceção dilatória, de conhecimento oficioso, e determina a absolvição da instância (cf. artigos 577.º, al. a), 578.º e 278.º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Civil). Em face do exposto, julga-se este tribunal absolutamente incompetente, em razão da matéria, por ser competente o Juízo de Família e Menores, determinando-se a absolvição do Réu da instância. Custas a cargo dos Autores, que se fixam no mínimo legal. Valor da ação: € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) - cf. artigos 296.º, 299.º, n.º 1, 303.º, n.º 1 e 306.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil. Registe e notifique (…)”. 4. A decisão referida em 3. foi objeto de notificação expedida em 02-10-2024. 5. Em 04-10-2024 foi apresentado em juízo requerimento, subscrito pela mandatária dos requerentes, onde consta escrito, nomeadamente, o seguinte: “(…) após ser notificada da sentença de V. Exa. (ref.ª (…)58 de 01/10/2024) donde se retira que “...considera-se que este Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol não será o competente para tramitar o presente processo face às competências atribuídas ao Juízo de Família e Menores no artigo 122.º, n.º 1, alínea g), da LOSJ - o que configura uma exceção dilatória, de conhecimento oficioso, e determina a absolvição da instância (cf. artigos 577.º, al. a), 578.º e 278.º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Civil). Em face do exposto, julga-se este tribunal absolutamente incompetente, em razão da matéria, por ser competente o Juízo de Família e Menores, determinando-se a absolvição do Réu da instância.” Acontece que, a 15/02/2023 a ora signatária, havia dado entrada no Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, Juízo de Família e Menores do Funchal, Juiz 2, ao qual foi atribuído o n.º de processo (…)/23.8T8FNC, e no qual foi proferida sentença donde se retira que “...a competência dos juízos cíveis mantêm-se no caso presente. Sobre este assunto vd. Acórdão do STJ de 17.06.2021, Rel. Juiz Conselheiro João Cura Mariano e Acórdão do STJ de 29.04.2022 e 07.07.2022. Desta forma, é este juízo de família e menores incompetente para preparar e julgar o objecto da presente acção. Pelo exposto, declaro o presente juízo de família e menores incompetente para preparar e julgar a presente ação, por ser competente para a mesma os juízos cíveis desta Comarca do Funchal.”, conforme sentença que se junta como doc. n.º 1 Pelo exposto, requer a ora signatária, nos termos e para os efeitos do artigo 111.º do Código de Processo Civil a resolução do presente conflito. Junta: 1 (um documento).”. 6. Anexo ao requerimento referido em 5. consta cópia da decisão proferida, em 13-09-2023, pelo Juízo de Família e Menores do Funchal – Juiz 2, no processo n.º (…)/23.8T8FNC, concluindo-se na mesma em se declarar “o presente juízo de família e menores incompetente para preparar e julgar a presente acção, por ser competente para a mesma os juízos cíveis desta Comarca do Funchal”. 7. Em 21-10-2024, o Ministério Público promoveu que: “Atento o conflito negativo de competência do Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol, nos presentes autos e do Juízo de Família e Menores do Funchal, no âmbito do processo n.º (…)/23.8T8FNC, promove-se que seja suscitada a sua resolução pelo presidente do tribunal competente para a decisão, nos termos dos artigos 109.º, n.º 2, 110.º, n.º 2 e 4 e 111.º do Código de Processo Civil”. 8. Em 25-10-2024, o Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol proferiu despacho de onde se lê, nomeadamente, o seguinte: “(…) Mantendo este tribunal o entendimento sufragado no despacho de 01-10-2024, ref.ª (…)58, por considerar que a ação de reconhecimento de uma situação de união de facto é da competência dos Juízos de Família e Menores, nos termos do artigo 122.º, n.º 1, al. g), da LOSJ, e dos argumentos aduzidos no aludido despacho. Verifica-se um conflito negativo de competência, nos termos do disposto nos artigos 109.º e ss, do Código de Processo Civil, porquanto quer este tribunal, quer o Juiz 2, do Juízo de Família e Menores do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira se declararam incompetentes para conhecer da mesma questão. De acordo com o preceituado no artigo 109.º, n.º 1, do Código de Processo Civil “Há conflito de jurisdição quando duas ou mais autoridades, pertencentes a diversas atividades do Estado, ou dois ou mais tribunais, integrados em ordens jurisdicionais diferentes, se arrogam ou declinam o poder de conhecer da mesma questão: o conflito diz-se positivo no primeiro caso e negativo no segundo.” Refutando os dois Tribunais da 1.ª instância a sua competência para o julgamento nestes autos, deve ser suscitado, o conflito negativo de competência perante o Venerando Juiz Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, nos termos do disposto nos artigos 109.º a 113.º, do Código de Processo Civil. Correndo o processo de resolução de conflitos com caráter urgente, nos próprios autos (cf. artigo 111.º, n.º 3, do Código de Processo Civil). Em face do exposto, cumpre suscitar o conflito negativo de competência, requerendo-se ao Venerando Juiz Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa (secção cível), o Tribunal Superior, que dirima o aludido conflito negativo entre tribunais da 1.ª instância. Após trânsito em julgado do despacho que julgou este Tribunal incompetente, subam os autos o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa. Notifique”. 9. Em 27-11-2024, o Ministério Público apresentou pronúncia, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 112.º, n.º 2, do CPC, concluindo que, “não estamos perante um conflito negativo de competência, mas sim perante decisões contraditórias e que por força da aplicação disposto no artigo 625.º do Código de Processo Civil deverá prevalecer a proferida a de 13.09.2023, no processo n.º (…)/23.8T8FNC, pelo Juiz 2, do Juízo de Família e Menores do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, que declarou a competência dos juízos cíveis da Comarca do Funchal, para o conhecimento da ação declarativa de reconhecimento de união de facto”. * II. Nos termos do disposto no artigo 109.º, n.º 2, do CPC, há conflito, positivo ou negativo, de competência quando dois ou mais tribunais da mesma ordem jurisdicional se consideram competentes ou incompetentes para conhecer da mesma questão. Pressuposto necessário para que haja lugar a conflito de competência é que ambas as decisões proferidas pelos tribunais em conflito tenham transitado em julgado, pois, conforme estatui o n.º 3 do artigo 109.º do CPC, “não há conflito enquanto forem suscetíveis de recurso as decisões proferidas sobre a competência”. A decisão considera-se transita em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação (cfr. artigo 628.º do CPC). Assim, o conflito de competência apenas se materializa “quando ambas as decisões se revelarem definitivas” (assim, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, 2018, p. 137) e, por outro lado, quando as mesmas se refiram à mesma questão. * III. Na situação em apreço verifica-se que, o Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol, por decisão de 01-10-2024, excecionou a incompetência material para conhecer do presente litígio, por considerar competente o Juízo de Família e Menores, determinando a absolvição do réu da instância. Tal decisão foi notificada, mas não transitou em julgado, pois, 3 dias depois de proferida foi apresentado o “pedido” de resolução de “conflito de competência”. Também se desconhece se a decisão do processo n.º (…)/23.8T8FNC transitou, ou não, em julgado, sendo certo que a mesma, como é evidente, não foi proferida nos presentes autos, não se dirigindo à mesma questão. Por outra parte, o decidido no processo n.º (…)/23 não atribuiu competência ao Juízo de Competência Genérica da Ponta do Sol, pelo que, não se mostra negação recíproca de competência, entre o Juízo de Família e Menores do Funchal e o aludido Juízo de Competência Genérica. Conforme resulta do prescrito no artigo 100.º do CPC: “A decisão sobre incompetência absoluta do tribunal, embora transite em julgado, não tem valor algum fora do processo em que foi proferida, salvo o disposto no artigo seguinte”. Esta foi também a posição assumida, na decisão proferida em 15-01-2014, nos autos de conflito negativo de competência proferidos no âmbito do Proc. 5/11.6TTPTG.E1, da Relação de Évora (rel. ANTÓNIO M. RIBEIRO CARDOSO), nos quais se refere: “Ora, tendo sido instaurados dois processos distintos em dois tribunais diferentes, a decisão declinando a competência proferida por cada tribunal em cada um dos processos, apenas tem validade dentro do próprio processo, ou seja, nada obsta a que os AA. voltem a instaurar nova acção, seja no tribunal de competência genérica, seja no tribunal do trabalho, uma vez que as respectivas decisões, ainda que tenham transitado, não constituem caso julgado fora do processo em que foram proferidas. E só assim não seria se a questão do tribunal competente tivesse sido decidida “em via de recurso”” [art.º 101º do CPC]. Como resulta dos artigos 99.º, n.º 2, 101.º e 109.º, nºs 1 e 2 do CPC, só existe conflito de competência dirimível nos termos do artigo 109.º e seguintes, quando, sendo a incompetência decretada findos os articulados, o autor requeira a remessa do processo para o tribunal considerado competente (art.º 99º, nº 2) e este, no processo remetido, decline igualmente a competência (art.º 109º, nºs 1 e 2), ou quando, perante a decisão de incompetência, se interponha recurso no qual se decida qual o tribunal competente, mas noutro tribunal esteja pendente a mesma acção (art.101º, nº 3 do CPC). No caso, tratando-se de dois processos intentados perante dois tribunais distintos, não estamos perante um conflito negativo de competência cuja resolução caiba ao Presidente da Relação. A intervenção da presidência do Tribunal da Relação na resolução do conflito negativo de competência pressupõe a existência de uma mesma questão, sendo que, esta, só é a mesma quando suscitada no âmbito do mesmo processo e não em processos diferentes, ainda que, uma das decisões já objeto de trânsito em julgado. Tal é o que resulta do disposto nos artigos 100.º e 109.º, n.º 2, do CPC. O artigo 109.º, n.º 2, do CPC estatui que: “Há conflito, positivo ou negativo, de competência quando dois ou mais tribunais da mesma ordem jurisdicional se consideram competentes ou incompetentes para conhecer da mesma questão”. Não se verificam, pois, os pressupostos para a decisão de conflito de competência, existindo causa de indeferimento do pedido – cfr. artigo 113.º, n.º 1, do CPC. * IV. De acordo com o exposto, por não estarmos perante uma situação de conflito suscetível de ser conhecido por esta Presidência, indefiro o pedido formulado no requerimento de 04-10-2024. Custas a cargo dos autores. Notifique-se (art.º 113.º, n.º 3, do CPC). Baixem os autos. Lisboa, 29-11-2024, Carlos Castelo Branco. (Vice-Presidente, com poderes delegados – cfr. Despacho 2577/2024, de 16-02-2024, D.R., 2.ª Série, n.º 51/2024, de 12 de março). |