Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | TERESA SANDIÃES | ||
Descritores: | ACÇÃO DE PREFERÊNCIA ACÇÃO DE DESPEJO PREJUDICIALIDADE SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/10/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | O nexo de prejudicialidade entre ações existe se a decisão duma causa pode afetar a decisão de outra. Se a ação de preferência vier a ser julgada procedente, com a substituição do ali A. (aqui R.) na posição da ali 2ª R. (A. nos presentes autos), como adquirente do prédio na venda efetuada, fica comprometida a ação de despejo, determinando a sua inutilidade, por deixar a aqui A. de ser a proprietária do imóvel, confundindo-se na pessoa do aqui R. as qualidades de senhorio e arrendatário, operando a extinção do contrato de arrendamento. A procedência da ação de preferência produz efeitos ex tunc, operando a substituição do adquirente à data da compra e venda. Por sua vez, a cessação do contrato de arrendamento decorrente da procedência da ação de despejo, por oposição à renovação, opera à data em que a respetiva comunicação se tornou eficaz, in casu, em data posterior à compra e venda do imóvel. (sumário elaborado ao abrigo do disposto no art.º 663º, nº 7, do CPC) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa ZIP …, S.A requereu procedimento especial de despejo contra LS, com fundamento na cessação por oposição à renovação pelo senhorio do contrato de arrendamento celebrado sobre a fração autónoma, com entrada pelo n.º 33 da Rua …, do prédio urbano em regime de propriedade total, sito em …, descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o n.º 000, inscrito na respetiva matriz sob o artigo 000, pedindo a emissão de título para desocupação do locado. O R. deduziu oposição alegando, em síntese, que não foi notificado das comunicações remetidas pela autora, contendo a oposição à renovação do contrato; não reconhece a autora como sua senhoria, porquanto não lhe foi concedido prazo para exercício do direito de preferência na aquisição do imóvel. Mais deduziu pedido reconvencional, peticionando a condenação da autora no pagamento da quantia de € 70.000, a título de benfeitorias úteis e impossíveis de serem retiradas. Mais reclama que em virtude deste direito de crédito tem direito de retenção do locado até efetivo pagamento das benfeitorias realizadas. Aduziu que o locado corresponde à sua morada de família e identificou, nos termos do artigo 15.º-F, n.º 3 do NRAU, como pessoas que vivem consigo em economia comum os seus progenitores. Pediu a suspensão da instância, ao abrigo do disposto no art.º 272º, nº 1 do CPC, por ser sua intenção instaurar ação de preferência. Concluiu pela improcedência do pedido, pela condenação da autora no pedido reconvencional e peticionou o diferimento da entrega do imóvel. A A. apresentou réplica, pugnando pela não admissão da reconvenção, sustentando que o presente procedimento especial não é meio próprio para deduzir o pedido reconvencional nos termos configurados pelo réu, devendo este, como tal, ser liminarmente indeferido. Sustentou, ainda, que as alegadas benfeitorias não têm nenhuma relação com o contrato de arrendamento, uma vez que quaisquer obras que o réu tenha efetuado, foram realizadas num momento em que não existia qualquer relação arrendatícia, porquanto foram realizadas em momento anterior à celebração do contrato. Adicionalmente, pugnou pelo indeferimento da requerida suspensão da instância, não só porque considera que o direito do réu caducou mas também por considerar que não existe fundamento para que os autos sejam suspensos porquanto não foi intentada ação para o exercício de direito de preferência. Concluiu pela improcedência da oposição e do pedido reconvencional. Por despacho de 24 de maio de 2024, foi admitida a reconvenção, tendo sido, nessa sequência, proferido despacho de adequação formal, determinando-se o prosseguimento dos autos sob a forma de processo comum. Foi, ainda, indeferida a requerida suspensão da instância. Realizada audiência prévia, foi proferido despacho saneador, delimitado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova. Nesta diligência o Tribunal comunicou às partes que, face às várias soluções plausíveis de Direito, poderia ponderar da regularidade e eficácia da notificação da oposição à renovação e os efeitos decorrentes da circunstância de as invocadas benfeitorias poderem ter sido efetuadas em data anterior à aquisição do imóvel por parte da autora, devendo as partes exercer o contraditório no início da audiência de julgamento. O R. apresentou requerimento pugnando pela suspensão da instância, com fundamento em causa prejudicial, uma vez que instaurou ação de preferência, que corre termos sob o nº 000, para que lhe seja reconhecido o direito de haver para si o imóvel objeto dos presentes autos, que foi vendido à A., com vista a ser substituída a adquirente (aqui A.) pelo aqui R. no referido negócio, anulando-se a transmissão operada para aquela. O R. juntou cópia da petição inicial da referida ação, que intentou contra SA - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL, e ZIP …, S.A., tendo deduzido os seguintes pedidos: “I. Deve a presente ação ser julgada procedente por provada e, ipso facto, ser reconhecido ao Autor o direito de haver para si o imóvel supra identificado, objeto do direito legal de preferência, que foi vendido à Segunda Ré, substituindo-se a adquirente pelo Autor no referido negócio, anulando a transmissão operada para aquela; II. Deve a Segunda Ré ser condenada a devolver ao Autor todas as rendas entretanto pagas desde a alienação do imóvel mencionado e identificado supra em 8º e todas aqueles que se forem pagando durante a pendência dos presentes autos.” Realizou-se audiência de julgamento com observância do formalismo legal. Nesta diligência foi exercido o contraditório relativamente ao pedido de suspensão da instância, pugnando a A. pelo seu indeferimento. As partes pronunciaram-se, ainda, sobre a regularidade e eficácia da notificação da oposição à renovação e os efeitos decorrentes da circunstância de as invocadas benfeitorias poderem ter sido efetuadas em data anterior à aquisição do imóvel por parte da autora. Foi proferido o seguinte despacho: “Por requerimento de 12.12.2024, o requerido LS veio informar os autos de que em 11.12.2024 intentou ação de preferência para que lhe seja reconhecido o direito de haver para si o imóvel objeto dos presentes autos, que foi vendido à aqui Requerente pela SA - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL, com vista a ser substituído a adquirente (aqui Requerente) pelo aqui Requerido no referido negócio, anulando-se a transmissão operada para aquela. Mais refere que tal acção corre, sob o processo n.º 000, os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Sintra – Juízo Local Cível de … - Juiz 3. Conclui que a acção mencionada, só por si, constitui legítimo pedido de suspensão imediata da presente instância por prejudicialidade, o que se requer nos termos do n.º 1, do artigo 272º do Código de Processo Civil. Ouvida, a requerente pugnou pela improcedência do requerido, alegando, em suma, que é terceira em relação à obrigação de concessão da preferência e que a acção em causa é alheia à situação dos autos. Cumpre apreciar. Nos termos do artigo 272.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado. Para Alberto dos Reis (in «Comentário ao Código Processo Civil», vol. III, pág. 206), “Uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela pode prejudicar a decisão desta, isto é, quando a procedência da primeira tira a razão de ser à existência da segunda”. Como refere Lebre de Freitas (in «Código de Processo Civil Anotado», vol. I, pág. 173) questão prejudicial para efeitos do disposto nos artigos 97.º e 279.º do Código de Processo Civil, “É aquela cuja resolução constitui pressuposto necessário da decisão de mérito da segunda”. Assim, e em suma enquanto causa de suspensão da instância, a relação de dependência entre uma acção e outra já proposta assenta no facto de nesta se discutir em via principal uma questão essencial para a decisão da primeira, de tal modo que a decisão dessa acção – depende – é atacada ou afectada pelo julgamento emitido na outra – prejudicial, pois que nesta se aprecia uma questão cuja resolução pode influir, modificar a situação que tem de ser considerada para a resolução do outro litigio. Só quando seja indispensável ao conhecimento do objecto da acção a decisão prévia de outra é que esta constituirá, em relação à primeira causa prejudicial. Não existindo essa indispensabilidade, não deve ser suspensa a instância. Assim, para haver prejudicialidade não basta que o resultado possível de uma acção seja susceptível de conduzir à impossibilidade ou inutilidade de outra causa, mas torna-se necessário que exista uma precedência lógica entre o fim de uma acção e o da outra. Ora nos presentes autos o que está em causa é a relação obrigacional fundada no contrato de arrendamento, sendo que na acção de preferência intentada, o que está em causa é a transmissão da propriedade do bem. Neste contexto, se bem que o objecto quer da acção especial de despejo, quer da acção de preferência intentada, seja o mesmo imóvel, não é possível configurar a existência de prejudicialidade entre as suas acções que justifique a ponderação da suspensão da presente instância. Como de forma clara e que, portanto, nos permitimos transcrever, se sustentou no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11.01.2024, proferido no processo n.º 1273/23.6YLPRT.P1, Rel. Des. Aristides Rodrigues de Almeida, disponível em www.dgsi.pt “(…) a acção de preferência não tem por objecto, a título principal ou incidental, saber quem é o proprietário do imóvel (arrendado); o que se discute nessa acção são os pressupostos do direito de preferência do terceiro num determinado negócio jurídico. A decisão que será proferida nessa acção ou mantem o adquirente da coisa na titularidade do direito adquirido (em caso de improcedência da acção) ou opera a sua substituição pelo terceiro que se apresentou a exercer o direito de preferência e que viu esse direito ser-lhe reconhecido (em caso de procedência da acção). Nessa medida a acção de preferência é compatível com a acção/procedimento especial de despejo e não a prejudica em nada. O que sucede é que se a acção de preferência proceder e for decretado que o preferente passe a ocupar a posição do adquirente da propriedade do bem arrendado, o contrato de arrendamento se extinguirá nessa ocasião. Mas isso não sucederá por razões que resultem da acção de preferência ou por efeito da sua decisão, sucederá por aplicação do instituto da confusão (entre a posição de senhorio e de arrendatário) com base em circunstâncias que se prendem com algo diverso, isto é, com o facto exterior à acção de preferência de o preferente reunir, em simultâneo, qualidades que determinem a aplicação daquele instituto (dar-se a circunstância de o preferente ser o arrendatário). A acção de preferência tem natureza constitutiva. A modificação que, caso seja procedente, ela opera na esfera jurídica depende e produz-se por efeito da sentença e no momento em que a sentença transita em julgado. Até lá, enquanto isso não ocorrer, não há modificação da esfera jurídica do autor e do réu e a titularidade do bem continua a caber a quem celebrou com o transmitente o contrato de alienação, no qual o autor da acção pretende exercer o direito potestativo de preferência; portanto, é também ele, por sucessão ex lege, o senhorio no contrato de arrendamento. Por outro lado, a transmissão do bem arrendado não gerou a extinção do contrato de arrendamento, pelo que este continua em vigor e subordinado ao respectivo regime jurídico, designadamente no tocante à exigibilidade dos direitos e obrigações das partes. Em consequência, também a instauração da acção de preferência não pode ter a virtualidade de suspender o contrato de arrendamento enquanto não transitar em julgado a respectiva sentença, deixando os direitos e as obrigações dos respectivos contraentes numa espécie de … estado de hibernação Se assim fosse, então bastaria ao inquilino demandado na acção de despejo instaurar, por exemplo, uma acção de preferência, uma acção de reivindicação, uma acção de declaração de nulidade por simulação da aquisição pelo senhorio do direito de propriedade sobre a coisa arrendada, ou sucessivamente cada uma delas, para obter de imediato e por tempo indeterminado a suspensão das obrigações que resultam da relação de arrendamento. Ora não é esse o objectivo da figura da causa prejudicial e da suspensão da instância que ela determina. Aquela solução levaria a que suspensão acabasse por se traduzir não apenas numa suspensão da instância, ou seja, numa paralisação da tramitação de uma acção até que outra seja decidida e essa decisão (sendo procedente) exclua directamente um dos pressupostos do direito reclamado na acção suspensa conduzindo à respectiva improcedência imediata, mas essencialmente na suspensão do regime jurídico do contrato que constitui a causa de pedir da acção suspensa. (…)” Em face do exposto, por não se verificarem os respectivos pressupostos, indefiro a requerida suspensão da instância. Custas do incidente pelo requerido, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie. Notifique.” Após o encerramento da audiência de julgamento foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: “De acordo com os fundamentos supra referidos e de harmonia com o disposto nos preceitos legais citados: I. Julgo o procedimento especial de despejo procedente por provado e, em consequência: i. Julgo cessado, desde 31 de Outubro de 2023, o contrato de arrendamento celebrado entre as partes, que tem por objeto o prédio urbano sito na Rua …., descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número 000 da referida freguesia e inscrito na matriz sob o artigo 000 da união de freguesias de …., por oposição à renovação válida e eficaz por iniciativa da autora/ senhoria; ii. Decreto o despejo do local arrendado, condenando o réu, LS, a proceder à entrega do referido imóvel à autora, ZIP …, S.A., livre de pessoas e bens pessoais, no prazo de 30 dias, nos termos do art.º 15.º-I, n.º 11, do NRAU; iii. Consigno que a presente decisão vale como autorização de entrada imediata no domicílio, nos termos do art.º 15.º-I, n.º 11, do NRAU; II. Julgo improcedente por não provado o pedido reconvencional formulado pelo reconvinte e, em consequência, absolvo a autora/ reconvinda do mesmo; III. Julgo improcedente por não provado o pedido de diferimento de desocupação do locado; IV. Condeno o réu no pagamento das custas do processo atento o integral decaimento na acção e em sede reconvencional – artigo 527.º, do Código de Processo Civil - sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que beneficie. Valor da acção: o fixado no despacho saneador Registe comunique e notifique nos termos do art.º 15.º-I, do NRAU e art.º 16.º, da Portaria n.º 49/2024, de 15 de Fevereiro.” O R. interpôs recurso da decisão proferida em audiência de julgamento que indeferiu a suspensão da instância e da sentença, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: “• DO RECURSO DO DESPACHO QUE RECAIU SOBRE O REQUERIMENTO COM A REFERÊNCIA CITIUS N.º 20557211. 1. Vem o presente recurso interposto do despacho que recaiu sobre o requerimento com a referência Citius n.º 26934436, que foi proferido na acta de diligência de julgamento com a referência 154814678, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, …., aliás mui douto, notificado ao Réu, aqui ora Recorrente, no qual, salvaguardado o devido respeito, se faz incorreta decisão quanto à não procedência da suspensão da instância por prejudicialidade, o que culminou, com o prosseguimento da mesma e com a procedência do pedido intentado pela Autora; 2. O aqui ora Recorrente pugna, assim, pela não manutenção do aludido despacho ora posto em crise, aliás douto, porquanto o mesmo enferma de erro de apreciação/julgamento; 3. Salvado o devido respeito, não andou, bem o tribunal “a quo”, devendo, por isso, o presente recurso, interposto do douto despacho (aqui em ora crise) proceder, fazendo-se, desta forma, jus e dignificando a tão almejada Justiça; 4. Refere o tribunal “a quo”, no despacho ora em crise, que indefere a requerida suspensão da instância por não se verificarem os respetivos pressupostos, tendo consubstanciado a sua decisão, aliás douta, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 11.01.2024, proferido no processo n.º 1273/23.6YLPRT.P1; 5. O Tribunal “a quo” andou mal ao fazer-se socorrer de um entre tantos outros e doutos Acórdãos que decidem de forma totalmente contrária, e de forma mais justa, com o apurado nos presentes autos; 6. Veja-se, a título de exemplo o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 08.10.2015, proferido no processo n.º 1311/14.3YLPRT.E1, perfeitamente compatível com os fundamentos invocados nos presentes autos; 7. Na presente ação, mas mal, foi decretado o despejo sem estar ainda decidida a ação de preferência que sob o processo n.º 0000, corre os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, …; 8. Na ação de preferência que vai, muito provavelmente, o Recorrente passar a ser titular do direito de propriedade do agora locado, confundindo-se na sua esfera a condição de senhorio e inquilino, com a natural cessação do contrato de arrendamento; 9. Isso redundará na inutilidade da decisão de despejo – o que confere a esta uma natureza condicional, consistindo esta na efetividade da decisão de despejo que só terá lugar se ocorrer a improcedência da ação de preferência. O que, é manifestamente pouco provável; 10. A não suspensão dos presentes autos irá comprometer seria e abruptamente a normal vida do Recorrente com a consequente entrega do locado à Recorrida, o que significará um prejuízo de tal forma elevado que dificilmente poderá vir a ser reparada no futuro. 11. Sem a suspensão da instância, o Recorrente vai ter de desenvolver esforços descomunais e desumanos, para depois lhe vir a ser novamente entregue o agora locado com a procedência da ação de preferência e, porventura, depois de desenvolver diligências processuais para obter a restituição do que entregou; 12.O que, com o devido respeito, não faz o mínimo de sentido! • DO RECURSO DA SENTENÇA 13.Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, aliás mui douta, notificada ao Réu, aqui Recorrente, na qual, salvaguardando o mais elevado e devido respeito, se faz incorreta decisão quanto ao apuramento da matéria de facto dada como assente, por terem sido cometidos lapsos na apreciação da prova, mormente a produzida em sede de audiência de discussão e julgamento da causa, bem como incorreta interpretação e aplicação do direito; 14.O aqui ora Recorrente pugna, assim, pela não manutenção da sentença ora posta em crise, aliás douta, designadamente na parte que ora se recorre, porquanto a mesma enferma de erro de julgamento de facto e de direito, o que conduziu a que o tribunal “a quo” tivesse julgado totalmente improcedente as pretensões formuladas na Oposição (corrigida) apresentada pelo Réu/Recorrente; 15.Salvado o devido respeito, que é muito elevado, não andou, assim, bem o tribunal “a quo”; 16.Deve, por isso, o presente recurso, interposto da douta sentença do tribunal “a quo”, proceder, fazendo-se, desta forma, jus e dignificando a tão almejada Justiça. • DO ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO 17.A decisão ora em crise, concretamente apresenta-se errar o decisório, ora em recurso, onde se faz, em parte, incorreta decisão quanto ao apuramento da matéria de facto dada como assente (provada), porquanto cometeu alguns erros na apreciação da prova produzida em sede de audiência de julgamento; 18. O Tribunal “a quo” apontou quatro factos que deu como não provados, dos quais três o aqui Recorrente não concorda; 19. Quanto ao facto b) dado como não provado [As obras efectuadas no imóvel dos autos a que se referem 19. e 20. dos factos provados, importaram o valor de 70.000 € (setenta mil euros)] o tribunal “a quo” deveria de ter chegado a este valor embora não qualificando inteiramente como montante das obras realizadas, mas sim como encargos gastos com o locado, onde se incluem obras efetivamente realizadas e montante entregue a título de ocupação inicial do imóvel, que consistia numa situação corriqueira na altura; 20. Os 40.000€ (quarenta mil euros) acrescidos de valor muito superior a 20.000,00€ (vinte mil euros) que o pai do Recorrente gastou na realização das obras no locado, perfaz, senão os 70.000,00€ (setenta mil euros), valor muito aproximado, ou talvez os tenha ultrapassado (de acordo com as passagens supra reproduzidas); 21. Quanto ao facto c) dado como não provado [O réu suportou o custo das obras realizadas;] o tribunal “a quo” não soube, com o devido respeito, tirar a ilação devida; 22. Apesar de terem sido os pais do Réu a custearem todos os encargos com o imóvel em causa, após o momento em que foi outorgado o contrato de arrendamento, tais valores foram transmitidos (como que doados) pelos pais do Réu a este, por este ter passado a ser o legítimo possuidor do imóvel em causa com todos os direitos e obrigações a isso correspondentes; 23. Tendo existido assim, a transmissão para o Réu de todos os créditos que inicialmente pertenciam aos pais daquele, o que se efetivou com a outorga do contrato de arrendamento; 24. Quanto ao facto d) dado como não provado [Foram efectuados, no imóvel dos autos, trabalhos de polimento manual das zonas enchidas, com utilização de lixa apropriada; colocação de caldeira e candeeiro na cozinha, de cimento no chão do espaço exterior e colocação de vedação em chapa em cima dos muros] o tribunal “a quo” deveria de ter dado como provado não a totalidade do facto em causa, mas que efetivamente foi colocado caldeira e candeeiro na cozinha, de cimento no chão do espaço exterior e colocação de vedação em chapa em cima dos muros (de acordo com as passagens supra reproduzidas); 25. Assim, o tribunal “a quo” deveria de ter dado como provado que foi colocado no imóvel locado uma caldeira, um candeeiro na cozinha, bem como de cimento no chão do espaço exterior e colocação vedação em chapa em cima dos muros da moradia (locado); 26. Quanto ao facto e) dado como não provado [O imóvel foi cedido ao réu por um anterior ocupante, a quem pagou um valor elevado pelo início da ocupação do imóvel, crendo que estava a negociar com o seu legítimo proprietário] o tribunal “a quo” deveria de ter chegado ao facto de a cedência não se ter efetivado na pessoa do Réu, mas sim nas pessoas dos seus pais, como, aliás, e amplamente referido em várias passagens da douta sentença; 27. Em face de toda a prova produzida nos autos, o tribunal “a quo” devia ter dado também como provados os seguintes factos: 22. Os encargos efetivados com o imóvel dos autos a que se referem 19. e 20. dos factos provados, importaram no valor de 70.000 € (setenta mil euros); 23. Ao Réu foi transmitido o direito de crédito que era dos seus pais, no valor de 70.000,00€; 24. Foram efetuados, no imóvel dos autos, trabalhos de colocação de caldeira e candeeiro na cozinha, de cimento no chão do espaço exterior e colocação de vedação em chapa em cima dos muros; 25. O imóvel foi cedido aos pais do réu por um anterior ocupante, a quem pagou um valor elevado pelo início da ocupação do imóvel, crendo que estava a negociar com o seu legítimo proprietário. • DO ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO I - DO DIREITO DO RÉU AO RESSARCIMENTO DAS BENFEITORIAS 28. O direito a exigir uma indemnização por benfeitorias realizadas no imóvel (locado) cai sempre na pessoa do seu atual senhorio, pois é no momento em que o contrato de locação cessa, que surge o direito ao locatário de poder exigir o exercício desse direito e não antes; 29. De acordo com o previsto no artigo 1273.º do Código Civil o possuidor de boa-fé ou de má-fé tem direito a ser indemnizado pelas benfeitorias necessárias e a levantar as úteis, que o possam ser sem detrimento da coisa (n.º 1), ou a ser compensado pelo titular pelo respetivo valor calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa (n.º 2); 30. Tendo em conta que o direito primário do possuidor nas benfeitorias úteis é de as levantar e que o direito secundário de indemnização em valor terá o mesmo de alegar e provar que o levantamento das benfeitorias realizadas na coisa causa a esta um dano significativo, como se poderia, então, exigir-se do primitivo Senhorio qualquer tipo de indemnização por benfeitorias (úteis) realizadas se, no momento em que o locado é transmitido a novo proprietário, que passa a ter a qualidade de novo Senhorio, essas próprias benfeitorias (úteis), que eventualmente pudessem vir a ser levantadas aquando da cessação do contrato, ainda fazem falta no locado?! E porque assim ainda não existe a possibilidade de se apurar um valor a indemnizar. 31. Pelo que necessariamente se terá de concluir que o responsável pela indemnização por benfeitorias necessárias ou benfeitorias úteis (que não possam ser levantadas sem detrimento da coisa) é sempre o atual senhorio, neste caso a Autora/Recorrida; 32. De acordo com o previsto no artigo 479.º do Código Civil, a obrigação de restituição compreende “o que tenha sido obtido à custa do empobrecido” ou o valor correspondente, não podendo exceder a medida do locupletamento. Pelo que, efetivamente o valor pedido a título de reconvenção traduz apenas o valor que os pais do Réu despenderam com o locado, valor que foi transmitido ao aqui Recorrente. 33. Apesar de terem sido os pais do Réu a custearem todos os encargos com o imóvel em causa (locado), acontece que, com a outorga do contrato de arrendamento, tais valores foram transmitidos, mesmo que implicitamente, pelos pais do Réu a este que aceitou ao assumir o arrendamento. Pois, este (Réu/Recorrente) passou a ser o legítimo possuidor do imóvel em causa com todos os direitos e obrigações a isso correspondentes, tendo assim existido a transmissão para o Réu de todos os créditos que inicialmente pertenciam aos seus pais; 34. Destarte, e com o devido respeito, não poderia o tribunal “a quo” ter decidido como decidiu, afastando o Réu do direito de ser indemnizado pelas benfeitorias realizadas no locado e do valor entregue pela ocupação do imóvel; II - DO DIREITO DE RETENSÃO DO LOCADO 35. Concluiu e decidiu também o tribunal “a quo” que não assiste ao Réu, aqui Recorrente, o direito de retenção do locado, improcedendo, assim, esta sua pretensão; mas mal, com o devido respeito; 36. Ao Réu foi transmitido o direito de crédito sobre o imóvel (locado) que era detido pelos seus pais; 37. Assim sendo, e tendo-se em conta o artigo 754.º, do Código Civil, encontram-se reunidos todos os requisitos para que ao Réu/Recorrente fosse reconhecido o direito de retenção sobre o locado até que ao mesmo fosse atribuído a indemnização a que tem direito pelas benfeitorias realizadas no locado (reconstrução total do locado) e do valor entregue pela ocupação do imóvel; 38.Andou também assim mal o tribunal “a quo”! III - Termos em que, I - Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o despacho em crise e, em consequência, que os presentes autos baixem à primeira instância para que proceda à anulação do despacho em causa, o qual deve ser substituído por outro que determine a suspensão da instância no presente processo, ao abrigo da primeira parte do nº 1 do artigo 272º do Código de Processo Civil, e até ao julgamento definitivo da ação de preferência supra identificada. II – Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença em crise, proferida pelo tribunal “a quo”, aliás douta, e considerar-se ter o Recorrente direito a ser indemnizado pelas benfeitorias realizadas no locado (reconstrução total do imóvel) e do valor entregue inicialmente pela ocupação do mesmo, bem como do direito de retenção sobre o locado até que ao Réu seja atribuído a indemnização a que tem direito pelas benfeitorias realizadas no locado (reconstrução total do locado) e do valor entregue pela ocupação do imóvel;” A A. não apresentou contra-alegações. A decisão recorrida considerou como provada a seguinte matéria de facto: 1. Pela AP n.º 72 de 2006/05/03, mostra-se registada a aquisição por compra, como bem próprio, a favor de EM, à data do registo, casada sob o regime de comunhão de bens adquiridos do prédio urbano sito na Rua do …; 2. Pela AP. n.º 4050 de 2012/11/27, mostra-se registada a aquisição do prédio a que se reporta 1., por compra em Processo de Insolvência, a favor de Banco …, sendo sujeito passivo EM; 3. Pela AP. 2448 de 2013/11/26, mostra-se registada a aquisição do prédio a que se reporta 1., por compra, a favor de SA - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL; 4. Pela AP. 4520 de 2022/02/09, mostra-se registada a aquisição do prédio a que se reporta 1., por compra, a favor da autora ZIP …, S.A.; 5. Datado de 01 de Novembro de 2020, a SA - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL, como primeiro outorgante, e o LS, como segundo outorgante, celebraram, respectivamente nas qualidades de Senhorio e de Arrendatário, um contrato denominado de “Contrato de Arrendamento para Habitação Permanente, com Prazo Certo”, no âmbito do qual convencionaram, designadamente, as seguintes cláusulas: “(…) 1. Objecto Pelo presente contrato, o Primeiro Outorgante dá de arrendamento ao Segundo Outorgante a fração autónoma, com entrada pelo n.º … da Rua do …, para o qual foi emitida em 19 de Maio de 2010 o Alvará de Licença de utilização n.º 000 pela Câmara Municipal de …. 2. Vigência e Renovação 2.1. O arrendamento é celebrado por prazo certo, ao abrigo do disposto nos artigos 1095.º e seguintes do Código Civil com a redação que lhe foi dada pela Lei n.º 6/2006 de 27 de fevereiro (NRAU) e terá a duração de 3 (três) anos, com início em 1 de Novembro de 2020 e termo em 31 de Outubro de 2023 e renovar-se-á por iguais e sucessivos prazos de 1 (um) ano, salvo se for denunciado, por qualquer das partes nos termos da cláusula 3. 2.2. O locado destina-se exclusivamente a habitação permanente do Arrendatário, sem prejuízo da al. a) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 1093.º do Código Civil. (…) 3. Oposição à renovação e denúncia 3.1. O Senhorio poderá opor-se à renovação automática do contrato mediante comunicação, remetida ao Arrendatário por carta registada com aviso de receção, com a antecedência mínima de 120 dias do termo do prazo de duração inicial do contrato, ou de qualquer uma das suas eventuais renovações. (…) 3.4. Quando o Senhorio proceda à denúncia do presente contrato nos termos previstos no número 3.1. ou o contrato cesse por qualquer outra causa e o Arrendatário não restitua o locado até ao termo do prazo contratual em vigor ou até à data em que o deveria fazer, o Arrendatário constitui-se na obrigação de indemnizar o Senhorio no valor diário correspondente a 1/10 (um décimo) do valor mensal da renda por cada dia de atraso na restituição do locado e ainda na obrigação de suportar as despesas judiciais e extrajudiciais que o Senhorio venha a ter, incluindo custas judiciais e honorários de Advogado ou de solicitador de Execução. 4. Renda 4.1. A renda inicial é de 300€ (trezentos euros). (…) 5. Obras e conservação ordinária 5.1. O Arrendatário reconhece que, salvo o disposto no ponto II do Anexo 2, o locado e suas dependências, se encontram em perfeito estado de conservação e em condições de funcionalidade para o fim a que se destinam, conforme verificado na vistoria presencial por si efetuada, com os equipamentos e eletrodomésticos indicados na listagem que constitui o Anexo 2, devendo, com a cessação do presente contrato, entregar o locado e os equipamentos e eletrodomésticos arrendados no estado em que os recebeu, limpos e em bom estado de conservação, obrigando-se o Arrendatário a reparar todas as deteriorações, incluindo as deteriorações lícitas realizadas para assegurar o seu conforto ou comodidade e com exceção das que resultem de um uso normal e prudente, indemnizando o Senhorio de todos os danos que porventura haja causado e que não tenham sido reparados. (…) 5.3. Constitui obrigação e encargo do Arrendatário a realização das obras de conservação ordinária do locado e dos equipamentos e electrodomésticos nele incluídos e melhor discriminados no Ponto 1. Do Anexo 2, requeridas pelas leis vigentes ou pelo fim do contrato, incluindo, nomeadamente, as reparações, limpezas, substituições de materiais e manutenção das instalações de água, luz, gás, esgotos e comunicações e a perfeita manutenção das paredes, tectos, pavimentos, portas, fechaduras, vidros e encanamentos, não podendo o Arrendatário realizar quaisquer outras obras no locado sem prévia autorização, por escrito, do Senhorio. (…) 5.5. O Arrendatário não terá direito a levantar as obras ou benfeitorias realizadas no locado, ainda que autorizadas pelo Senhorio, renunciando a vir a exigir qualquer indemnização, mesmo que com fundamento nas regras do enriquecimento sem causa, ou a alegar ou exercer o direito de retenção ou de remoção por quaisquer benfeitorias ou obras, incluindo as licitamente feitas, salvo as que puderem ser levantadas sem dano para o locado. (…) 8. Comunicações e Foro 8.1. Para os efeitos previstos na al. c) do n.º 7 do artigo 9.º do Novo Regime de Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, as partes convencionam como domicílio do Arrendatário, o imóvel objeto do presente contrato de arrendamento. (…) Anexo 2 I. Listagem de equipamentos e eletrodomésticos instalados no locado à data da celebração do presente contrato (…) O Senhorio apenas garante o bom funcionamento do esquentador, fogão/placa e exaustor durante os primeiros três meses de vigência do presente contrato. Todos os demais equipamentos e electrodomésticos instalados no locado na presente data, conforme listagem acima (v.g. ar condicionado, frigorífico, máquinas de lavar louça e roupa, etc.), e sem prejuízo das obrigações de boa conservação e manutenção dos mesmos pelo Inquilino, não são considerados essenciais ao presente contrato, pelo que o Senhorio fica totalmente dispensado de garantir o seu bom funcionamento ou a sua substituição em caso de avaria durante todo o período de vigência do presente contrato, não dando, essas eventuais avarias, lugar a qualquer revisão das condições acordadas para o presente contrato de arrendamento. II. Obras e equipamentos a cargo do Arrendatário O Arrendatário assume, a suas custas, a obrigação de realização das obras e/ou da instalação dos equipamentos a seguir discriminados: · Nada a assinalar. (…)” 6. A autora efetuou o pagamento do imposto de selo relativo ao contrato a que se reporta 5., a 05 de dezembro de 2023; 7. Datada de 15 de Dezembro de 2021, a autora, ZIP …, S.A. e a SA - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL, remeteram ao réu, LS, que a recebeu, uma carta com o seguinte teor: “(…) Assunto: Contrato de Arrendamento - Transmissão da posição da Senhoria (Referência: ID70143) Exmo(s), Senhor(es), Dirigimo-nos a V, Exa(s)., na V. qualidade de arrendatário(s) do prédio urbano sito na Rua do …. (adiante designado por "Locado"). Para os efeitos legais e contratuais aplicáveis, vimos, pela presente, informar que o Locado foi, nesta data, alienado pelo SA - Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional, FILAH à sociedade denominada ZIP … S.A. com sede na Avenida …, Lisboa, matriculada na Conservatória do Registo Comercial sob o número único de matrícula e de pessoa coletiva … (adiante designada por "Compradora"). Em consequência, a Compradora passou a ser, a partir da presente data, a legitima proprietária do Locado e, nos termos do artigo 1057.° do Código Civil, assumiu a posição de senhoria, bem como todos os direitos e obrigações, como senhoria, resultantes do contrato de arrendamento celebrado com V. Exa.(s) relativo ao Locado (adiante designado por "Contrato de Arrendamento"). Assim, informamos V. Exa(s), de que todas os pagamentos a efetuar ao abrigo do Contrato de Arrendamento em causa, que se vençam a partir da presente data, deverão realizar-se da seguinte forma: . Transferência Bancária para o IBAN …; ou ii. Depósito na conta bancária aberta junto do Banco …, com o número …, indicando a referência que consta do assunto da presente comunicação. Para efeito de quaisquer comunicações que se mostrem necessárias ao abrigo do Contrato de Arrendamento em causa, solicitamos que as mesmas passem a ser enviadas para a seguinte entidade e contactos: … Quaisquer esclarecimentos adicionais poderão ser obtidos através do contacto … Pelo SA - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL, [assinatura] Pela ZIP…, S.A. [assinatura]” 8. À referida missiva, o réu respondeu por carta que remeteu à autora, datada de 04 de abril de 2022, com o seguinte teor: “(…) Assunto: Contrato de Arrendamento - Transmissão da posição da Senhoria (Referência: ID70143) Dirijo-me a V. Exas. na qualidade de Mandatária do meu Cliente, LS, legitimo arrendatário do imóvel sito na Rua do …, apresentando, antes de mais, os meus mais cordiais e respeitosos cumprimentos! Mandata-me o meu Cliente para solicitar, com muita urgência, no máximo até ao próximo dia oito do corrente mês e ano, informação detalhada sobre a que título V. Exas. se intitulam de novos Senhorios, requerendo, como complemente, cópia do título bastante, designadamente da escritura de compra e venda. Na eventualidade de se gorar a informação no prazo supra indicado, o meu Cliente não irá reconhecer V. Exas. como proprietários do locado, continuando a pagar a renda a SA - Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional (FIAH). Na expectativa de rápidas notícias de V. Exas., reitero cumprimentos iniciais! (…)” 9. A autora, representada pela sociedade H, remeteu uma carta registada com aviso de receção, dirigida ao réu, para a morada ..., datada de 14 de julho de 2022, com o seguinte teor: “(…) Assunto: Oposição à renovação do contrato de Arredamento Exmo(a) Senhor (a), Vimos, pela presente, na qualidade de Procuradora e Representante da Proprietária – ZIP. …, S.A., sociedade comercial com o NIPC 0000 - e nos termos e para os efeitos do Artigo 1097º do Código Civil, comunicar-lhe a oposição renovação, por iniciativa da Senhoria, do Contrato de Arrendamento com prazo certo celebrado em 01-11-2020, relativo ao imóvel a que corresponde ao prédio urbano sito em Bairro do …, respeitando a antecedência de 120 (cento e vinte) dias prevista contratualmente. Assim, o referido contrato cessará os seus efeitos em 31-10-2023, devendo V. Exa desocupar o locado nessa data. Desde já se designa o período horário entre as 10h e as 17h, do dia 02-11-2023, para receção do imóvel pela Senhoria, imóvel que deverá ser entregue livre de pessoas e bens, com todos os seus elementos e em condições de conservação que se coadunem com um uso prudente e cuidado do mesmo, conforme expressamente previsto no Contrato, sendo naquele ato lavrado o devido Termo de Entrega e Vistoria do Locado, a ser assinado por ambas as Partes. Na eventualidade de não ser possível a V. Exa. a entrega do Locado na data mencionada anteriormente, solicita-se contacto para o email ....@....com, desde já se alertando que não se concederá entrega do locado passados mais que 3 dias úteis da data designada. Adicionalmente, informamos que todas as comunicações a realizar à Senhoria deverão ser efetuadas para: Sem mais de momento, e com os nossos melhores cumprimentos; (…)” 10. Tendo sido efetuada, pelos CTT, uma tentativa de entrega da carta a que se refere o número anterior, no dia 18 de julho de 2022, e uma vez que a entrega não foi concretizada, a referida carta ficou disponível para ser levantada na Loja CTT …, até ao dia 27 de julho de 2022. 11. O réu não procedeu ao levantamento da referida carta, que foi devolvida ao remetente com a indicação “Objecto não reclamado”; 12. Nessa sequência, a autora, representada pela sociedade H, remeteu uma carta registada com aviso de receção, dirigida ao réu, para a morada …, datada de 07 de setembro de 2022, com o seguinte teor: “(…)Vimos, pela presente, na qualidade de Procuradora e Representante da Proprietária – ZIP…, S.A., sociedade comercial com o NIPC 000 - e nos termos e para os efeitos do Artigo 1097º do Código Civil, em cumprimento do estabelecido nos Artigos 98 e 10° do NRAU, comunicar-lhe a oposição à renovação, por iniciativa da Senhoria, do Contrato de Arrendamento com prazo certo celebrado em 01/11/2020, relativo ao imóvel a que corresponde a fração autónoma designada "0", sito na Bairro do …, respeitando a antecedência de 120 (cento e vinte) dias, prevista contratualmente. Assim, o referido contrato cessará os seus efeitos em 31/10/2023. Desde já se designa o período horário entre as 10h e as 17h, do dia 02/11/2023, para receção do imóvel pela Senhoria, imóvel que deverá ser entregue livre de pessoas e bens, com todos os seus elementos e em condições de conservação que se coadunem com um uso prudente e cuidado do mesmo, conforme expressamente previsto no Contrato, sendo naquele ato lavrado o devido Termo de Entrega e Vistoria do Locado, a ser assinado por ambas as Partes. Na eventualidade de não ser possível a V. Exa. a entrega do Locado na data mencionada anteriormente, solicita-se contacto para o email …, desde já se alertando que não se concederá entrega do locado passados mais que 3 dias úteis da data designada. Adicionalmente, informamos que todas as comunicações a realizar à Senhoria deverão ser efetuadas para: … Sem mais de momento, e com os nossos melhores cumprimentos, (…)” 13. Foi efetuada pelos CTT, uma tentativa de entrega da carta a que se refere o número anterior no dia 14 de setembro de 2022, no entanto, uma vez que a entrega não foi concretizada, a referida carta ficou disponível para ser levantada na Loja CTT …, até o dia 21- 09-2022; 14. O réu não procedeu ao levantamento da referida carta, que foi devolvida ao remetente com a indicação “Objecto não reclamado”; 15. O réu não desocupou o imóvel no dia 31 de outubro de 2023; 16. O réu reside no imóvel a que se reportam. 1. a 5. juntamente com os seus pais, MS e PS, desde data não concretamente apurada, mas que se situa entre 2011 e 2012; 17. Em data anterior à ocupação do imóvel pelo réu, o prédio encontra-se desabitado e era utilizado para guardar animais, como por exemplo galinhas e cães; 18. Desde que o réu e os seus pais passaram residir no imóvel, foram realizadas obras no mesmo, as quais foram concluídas em data não concretamente apurada, mas anterior a 1 de novembro de 2020 [data da celebração do contrato de arrendamento a que se reporta 5.]; 19. As referidas obras foram custeadas por MS e PS, pais do réu; 20. Tais obras foram realizadas por MS e por amigos e familiares, e consistiram em: - Execução de trabalhos de eliminação de toda a tinta existente nas paredes e tetos, mormente nas zonas onde a mesma se encontrava lascada e levantada decorrente de infiltrações das águas pluviais; - Execução de trabalhos de picagem das paredes para alargamento das fissuras, rachas, fendas e buracos que existiam em todas as paredes e tetos; - Realização de trabalhos de enchimento das fissuras, rachas, fendas e buracos que existiam nas paredes e tetos, com aplicação de produto específico para o efeito; - Pintura do interior do imóvel. - Reparação do chão do imóvel, tendo sido instalada na cozinha e na casa de banho, chão com mosaicos, na sala de estar foi aplicado chão vinílico e nos quartos foi aplicado chão flutuante. - Colocação, na cozinha, de canalização de água, canalização de gás; canalização de esgotos; instalação de rede elétrica; lava-loiças; janelas; portas. - Restauro da casa de banho através da instalação de canalização de águas, canalização de esgotos, instalação da rede elétrica; instalação de lavatório, torneiras, poliban, sanita. - Colocação, no espaço exterior, de um portão e reparação dos muros existentes; 21. A licença de autorização de utilização do imóvel foi emitida pela Câmara Municipal em 2010/05/19, inscrita por AP 372 de 2011/05/25”. A decisão recorrida considerou como não provada a seguinte matéria de facto: “a) O Contrato de arrendamento celebrado entre a SA - Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional e o réu foi celebrado pelo prazo de duração inicial de 5 (cinco) anos; b) As obras efectuadas no imóvel dos autos a que se referem 19. e 20. dos factos provados, importaram o valor de 70.000 € (setenta mil euros); c) O réu suportou o custo das obras realizadas; d) Foram efectuados, no imóvel dos autos, trabalhos de polimento manual das zonas enchidas, com utilização de lixa apropriada; colocação de caldeira e candeeiro na cozinha, de cimento no chão do espaço exterior e colocação de vedação em chapa em cima dos muros: e) O imóvel foi cedido ao réu por um anterior ocupante, a quem pagou um valor elevado pelo início da ocupação do imóvel, crendo que estava a negociar com o seu legítimo proprietário.” * Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela apelante e das que forem de conhecimento oficioso (arts. 635º e 639º do CPC), tendo sempre presente que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (art.º 5º, nº 3 do CPC). Assim, as questões a decidir são as seguintes: 1. Do deferimento da suspensão da instância por causa prejudicial 2. Da impugnação da decisão de facto 3. Da indemnização a título de benfeitorias 4. Do direito de retenção * 1. Do deferimento da suspensão da instância por causa prejudicial O R. requereu a suspensão da instância por causa prejudicial em relação à ação de preferência que instaurou, com os fundamentos supra expostos. A A. deduziu oposição, pugnando pela inexistência de causa prejudicial. O despacho recorrido indeferiu a suspensão da instância por não se verificar relação de prejudicialidade. Vem defendido no presente recurso que na ação de preferência, muito provavelmente, o apelante vai passar a ser titular do direito de propriedade do agora locado, confundindo-se na sua esfera a condição de senhorio e inquilino, com a natural cessação do contrato de arrendamento; o que redundará na inutilidade da decisão de despejo, conferindo-lhe uma natureza condicional, consistindo esta na efetividade da decisão de despejo que só terá lugar se ocorrer a improcedência da ação de preferência. Prevê o art.º 272.º, n.º 1 do CPC a possibilidade conferida ao Tribunal de ordenar a suspensão da instância “quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado”. Dispõe o nº 2 do citado preceito que “não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens”. Há causa prejudicial sempre que numa ação se discuta e pretenda apurar um facto ou situação que é elemento ou pressuposto do objeto de uma outra ação, quando a procedência de uma ação inutiliza outra. Citando Alberto dos Reis (in Comentário ao Código Processo Civil Vol. 3º, pág. 206; 269) “uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela pode prejudicar a decisão desta, isto é, quando a procedência da primeira tira a razão de ser à existência da segunda (…). Sempre que numa ação se ataca um acto ou facto jurídico que é pressuposto necessário de outra ação, aquela é prejudicial em relação a esta. (…) há uma ação prejudicial que, se for julgada procedente, inutiliza a acção subordinada. (…). Há efectivamente casos em que a questão pendente na causa prejudicial não pode discutir-se na causa subordinada; há outros em que pode discutir-se nesta, mas somente a título incidental. Na primeira hipótese o nexo de prejudicialidade é mais forte, na segunda, mais frouxo; na primeira há uma dependência necessária, na segunda, uma dependência meramente facultativa ou de pura conveniência. Exemplos da primeira modalidade: acção de anulação de casamento e acção de divórcio ou separação (…).” E referindo-se ao acórdão do STJ de 27/05/1938, que considerou prejudicial uma ação de investigação de paternidade ilegítima em relação a uma ação destinada a anular a legitimação do investigante, escreve o citado autor: “deve notar-se, observa o Prof. Andrade, que em rigor poderia dizer-se que a acção de investigação podia ser julgada improcedente sem estar decidia a acção de anulação (…). É certo. Mas coisa semelhante sucede em todos os casos nítidos de causa prejudicial. A acção de divórcio pode ser declarada improcedente sem estar julgada a acção de anulação do casamento. O nexo de prejudicialidade existe, desde que a decisão duma causa pode afectar a decisão de outra. Ora, no caso sujeito, o julgamento da acção de anulação podia afectar e prejudicar o julgamento da acção de investigação, pois que, se a primeira improcedesse, a segunda estava comprometida” (ob. citada, pág. 270). Na base da decisão de suspensão da instância pela existência de causa prejudicial estão razões de utilidade e conveniência processual. Pretende-se evitar que com o decurso de duas ações, em que uma das questões suscitadas pode determinar o não conhecimento da submetida a apreciação na outra, o tribunal esteja a despender esforços processuais e a onerar as partes bem como a poder eventualmente proferir decisões de sentido antagónico. Nos presentes autos a causa de pedir tem por fundamento a cessação por oposição à renovação do contrato de arrendamento celebrado entre a anterior proprietária do imóvel, como senhoria, e o R., como arrendatário, tendo sido formulado o pedido de despejo imediato (desocupação) do imóvel locado. No processo nº 000, instaurado pelo aqui R. contra a anterior proprietária e a ora A., a causa de pedir funda-se na preterição do direito de preferência na aquisição do imóvel e o pedido principal consiste no reconhecimento ao ali Autor do direito de haver para si o imóvel objeto do direito legal de preferência, que foi vendido à segunda Ré (aqui A.), substituindo-se a adquirente pelo Autor no referido negócio. Se a ação nº 000 vier a ser julgada procedente, com a substituição do ali A. (aqui R.) na posição da ali 2ª R. (A. nos presentes autos), como adquirente do prédio na venda efetuada, fica comprometida a presente ação de despejo, determinando a sua inutilidade, por deixar a aqui A. de ser a proprietária do imóvel, confundindo-se na pessoa do aqui R. as qualidades de senhorio e arrendatário, operando a extinção do contrato de arrendamento. A procedência da ação de preferência produz efeitos ex tunc, operando a substituição do adquirente à data da compra e venda. Por sua vez, a cessação do contrato de arrendamento decorrente da procedência da ação de despejo opera à data em que a respetiva comunicação se tornou eficaz, in casu, em data posterior à compra e venda do imóvel. Em suma, a decisão da ação de preferência pode vir a afetar a presente ação de despejo – principal critério para aferir da existência da relação de prejudicialidade. Por tratar de situação semelhante, citamos o acórdão da Relação de Évora de 08/10/2025, proc. nº 1311/14.3YLPRT.E1, a cujos fundamentos aderimos: “Como vimos, o tribunal a quo, negando a prejudicialidade, argumentou que uma decisão favorável aos requeridos na acção de preferência (no sentido de lhes assistir o direito de exercer preferência na aquisição do locado) «retiraria utilidade» à presente lide, mas que isso não significaria «estarmos perante questão prejudicial». Mas não será que essa inutilidade (superveniente da presente lide e decorrente da procedência da acção de preferência) se integra ainda, afinal, no conceito de prejudicialidade? Poderá dizer-se que nada obsta a que, independentemente do que for decidido na acção de preferência, seja proferida decisão na presente acção de despejo. E assim será: pode aqui ser decretado o despejo (como efectivamente foi decidido pelo tribunal a quo, na sentença também recorrida) sem estar decidida a acção de preferência. Mas o que sucederá a essa decisão de despejo se, afinal, vier a ser julgada (definitivamente) procedente a acção de preferência? Daí resultará que, por efeito dessa decisão na acção de preferência, os aqui inquilinos passam a proprietários do locado, confundindo-se na sua esfera a condição de senhorios e inquilinos, com a cessação do contrato de arrendamento. E isso redundará na inutilidade da decisão de despejo – o que confere a esta uma natureza condicional: a efectividade da decisão de despejo só terá lugar se ocorrer a improcedência da acção de preferência. Mas se já é muito duvidosa a possibilidade de prolação de decisões condicionais, mais perturbadoras podem ainda tornar-se as consequências dessa condicionalidade. Se se entender que a decisão de despejo pode ser proferida sem esperar pela decisão da acção de preferência, isso significará que o despejo poderá ser executado antes de resolvida a questão da preferência, com a consequente entrega do locado aos actuais senhorios; mas se entretanto vier a ser decidida a acção de preferência em benefício dos actuais inquilinos, isso significará que a posse do locado é conferida aos novos proprietários …e actuais inquilinos. Ou seja: pode fazer-se os actuais inquilinos entregar um bem que depois se conclui que afinal lhes deve ser entregue – e com a agravante de tal situação, para além de redundar na inutilidade da decisão de despejo, ainda obrigar os actuais inquilinos a terem de desenvolver diligências processuais para obter a restituição do que entregaram… Desta reflexão se terá, pois, de deduzir a existência de uma efectiva relação de interdependência entre as duas acções em presença – o que consubstancia, em nosso entender, o conceito de prejudicialidade supra exposto. (…) Como se demonstrou, igual conexão se verifica entre a acção de preferência e a acção de despejo aqui em confronto, pelo que forçoso é concluir ser aquela acção de preferência causa prejudicial em relação à presente acção de despejo. E, consequentemente, ocorrendo as condições definidoras duma verdadeira e própria prejudicialidade ou dependência entre as duas causas, entende-se estar o presente processo dependente do julgamento da supra identificada acção de preferência, anteriormente proposta, e considera-se justificado suspender a instância na presente acção.” Impõe-se a revogação do despacho de indeferimento o qual deve ser substituído por outro que determine a suspensão da instância até à decisão final transitada em julgado na ação nº 0000, com fundamento na prejudicialidade em relação à ação de despejo, o que implicará a anulação do processado posterior, mormente a sentença, ficando, naturalmente, prejudicada a apreciação do recurso dela interposto (todas as demais questões objeto do recurso). Pelo exposto, julga-se procedente o recurso na parte respeitante ao despacho de indeferimento do pedido de suspensão da instância por prejudicialidade, revogando-o, o qual deverá ser substituído por outro que determine a suspensão da instância no presente processo, ao abrigo da primeira parte do nº 1 do art.º 272º do CPC, e até à decisão final com trânsito em julgado da ação de preferência supra identificada. Custas do recurso a cargo da apelada. Lisboa, 10 de abril de 2025 Teresa Sandiães Amélia Puna Loupo Amélia Ameixoeira |