Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
303/2005-8
Relator: MOREIRA CAMILO
Descritores: MÚTUO
CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
CAPITALIZAÇÃO DE JUROS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/03/2005
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Sumário: I. As cláusulas contratuais gerais insertas num contrato após a assinatura das partes contratantes, são nulas, nos termos do art. 8º al. d) do Dec.-Lei nº 446/85 de 25/10.
II. Capitalizados os juros remuneratórios num contrato de mútuo, com capital, juros e outras despesas a reembolsar em prestações, o vencimento antecipado de algumas prestações por falta de pagamento de uma delas, ao abrigo do disposto no art. 781º do Cód. Civil, não prejudica o recebimento daqueles juros contratuais.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

O Banco A propôs, na 3ª Vara Cível de Lisboa,  contra B e C a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, peticionando a condenação dos RR. no pagamento da quantia de €. 15.661,36, acrescida de €. 2.142,23, a título de juros vencidos até 28/11/03 e de €. 85,69 correspondentes ao imposto de selo sobre esses juros e ainda dos juros que posteriormente se vencerem sobre a primeira das referidas quantias, à taxa anual de 21,52%, mais o respectivo imposto de selo, à taxa de 4%.
Alega, para o efeito, em síntese, ter emprestado ao R. B, a quantia de 2.590.000$00, com juros à taxa de 17,52%, tendo ficado acordado que a importância seria reembolsada, juntamente com os juros e o prémio do seguro de vida, em 72 prestações, mensais e sucessivas, no valor unitário de 60.381$00, vencendo-se a primeira em 10-8-01.
O R. não pagou a prestação vencida em 10/4/03, o que acarretou o imediato vencimento das restantes.
Por ter incorrido em mora, o R. é devedor de uma indemnização a título de cláusula penal, correspondente à taxa contratual de juros de 17,52% acrescida de quatro pontos percentuais.
O empréstimo contraído reverteu em proveito comum do casal formado pelos RR., já que a viatura, a cuja aquisição se destinava a quantia mutuada, iria integrar o património comum conjugal.
Consequentemente, a R. C é responsável pelas obrigações emergentes do contrato em causa, solidariamente com o co-R.
Os RR. foram pessoal e regularmente citados, não tendo apresentado contestação. 
Julgados os factos alegados provados, foi proferida sentença que julgou o pedido parcialmente procedente.
Desta decisão apelou a autora, tendo nas suas alegações formulado as conclusões seguintes:
- As condições gerais acordadas no contrato de mútuo dos autos, que se encontravam já integralmente impressas quando o R. B nele apôs a sua assinatura, não constituem qualquer formulário onde se possa inserir ou preencher o que quer que seja, e não foram inseridas depois da assinatura de qualquer das partes, pelo que não existe qualquer violação do disposto na al. d) do art. 8º do Dec.-Lei nº 446/85 e 25/10;
- Acresce que, nos autos não só nunca se pôs sequer a questão de o contrato dos autos ser ou não – e não o é , designadamente para efeitos do disposto na al. d) do art. 8º do Decreto-Lei nº 446/85 de 25/10 – um formulário como o previsto na dita alínea d) do art. 8º como – e é isso que interessa – também nunca se pôs a questão de o R. B mutuário não ter dado - como deu – o seu consentimento aquilo que acordado foi no contrato de mútuo dos autos;
- Aliás, nenhuma excepção foi deduzida pelo R. B que nem sequer contestou apesar de ter sido pessoal e regularmente citado, pelo que não tinha nem podia pois o Sr. Juiz conhecer da “questão” da pretensa violação da citada al. d) do art. 8º. Assim, O Sr. Juiz a quo violou o disposto no art. 3º do Cód. de Proc. Civil, designadamente no que concerne à proibição das chamadas “ decisões-surpresas”. É, assim, para além do mais, NULA a sentença dos autos já que o Sr. Juiz  a quo, atento ter violado o disposto no art. 3º do CPC;
- Está provado nos presentes autos que o A. na acção, é uma sociedade financeira de aquisições a crédito, constituindo, aliás, actualmente um banco;
- Não existe qualquer taxa de juro especificadamente fixada pelo Banco de Portugal para a actividade de financiamento de aquisições a crédito, isto é, para a actividade exercida pelo A.;
- A taxa de juro – 17,52% - estabelecida por escrito para o financiamento de aquisição a crédito ao R. B do veículo automóvel referido nos autos é inteiramente válida;
- É admissível a capitalização de juros por parte das instituições de crédito ou parabancárias, como a recorrente, pelo que a A. pode capitalizar juros. Pode – como o fez – pedir juros moratórios sobre o valor total das prestações em débito, apesar de em tal total estarem já incluídos os juros remuneratórios;
- Ao decidir como decidiu na sentença recorrida o Sr. Juiz a quo para além de ter violado o disposto no art. 3º do CPC, violou, interpretou e aplicou erradamente os arts. 560º e 781º do Cód. Civil, como também, o artigo 405º do mesmo diploma legal, pois não atendeu sequer à vontade expressa das partes.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Corridos os vistos legais, urge apreciar e decidir.
Como é sabido – arts. 684º nº 3 e 690º, nº 1 do Cód. de Proc. Civil,  a que pertencerão todas as disposições a citar sem indicação de origem -, o âmbito dos recursos é delimitado pelo teor das conclusões dos recorrentes.
Das pouco concisas conclusões da aqui apelante se vê que a mesma, para conhecer neste recurso, levanta as seguintes questões:
a) A sentença apelada é nula por violação do disposto no art. 3º nº 3 ?
b) As condições gerais do contrato de mútuo aqui ajuízado, apostas após a assinatura das partes são válidas, em face do disposto no art. 8º al. d) do Dec.-lei nº 446/85 de 25/10 ?
c) A taxa de juros remuneratórios e a capitalização destes acordados é legal ?


Os factos a considerar provados são os constantes da douta sentença apelada, pois não foi impugnada a decisão daqueles e não se vislumbra necessidade de alterar aqueles oficiosamente. Por isso, nos termos do art. 713º nº 6 se dão aqueles factos por reproduzidos.
Vejamos agora cada uma das questões acima referidos como objecto deste recurso.
 
a) Esta primeira questão versa uma nulidade da douta sentença consistente em a mesma ter decidido sem ouvir previamente a apelante sobre o teor da decisão.
Ora não pode proceder a pretensão da apelante por várias razões.
As nulidades processuais são quaisquer desvios do formalismo processual seguido em relação ao formalismo processual prescrito na lei, a que esta faça corresponder - embora não de modo expresso - uma invalidação mais ou menos extensas de actos processuais.
Do regime destas que consta dos artigos 193º e seguintes, resultam vários princípios, entre os quais, o de que a nulidade é, em regra meramente relativa, ou seja, depende de ser arguida em prazo fixo, e o princípio de que essa irregularidade é sanável, salvo disposição em contrário.
Fora das nulidades principais previstas nos artigos 193º a 200º, que não estão em causa nos autos, as nulidades não são do conhecimento oficioso - artº 202º -e só são invocadas pelo interessado na observância da prescrição omitida.
Além disso, nos termos do artº 205º, nº 1, a parte interessada tem de argui-la no momento em que a mesma for cometida, se a ela estiver presente e não o estando, pode argui-la no prazo de cinco dias - artº 153º na redacção do C.P.C., então em vigor -, contado o mesmo prazo, do dia, após aquela, em que interveio em algum termo dele ou foi notificada para qualquer termo do mesmo, mas neste último caso, só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.            
Por outro lado, as nulidades da sentença estão  taxativamentre previstas no art. 668º nº 1 em que não consta o circunstancialismo dos autos.
De qualquer modo, a acusada nulidade traduz-se na falta de audição da apelante antes da sentença ser proferida e, por isso, não é a sentença nula, mas a nulidade consistiu na falta de audição prévia denunciada, ou seja, a nulidade é anterior à prolação da sentença.
A apelante teve de tomar conhecimento da prática da mesma nulidade-omissão aquando da notificação da mesma sentença, pelo que  teria de a arguir no prazo de dez dias a contar daquela notificação, o que não fez, sanando-se a mesma por falta de arguição tempestiva.
Além disso, mesmo que estivesse a nulidade arguida em tempo, a mesma improcederia.
Com efeito, o art. 3º nº 3 prescreve que não é lícito ao juiz decidir questões de direito ou de facto, mesmo do conhecimento oficioso, sem que as partes tenham a possibilidade de sobre elas se pronunciarem, salvo o caso de manifesta desnecessidade.
Ora a douta sentença limitou-se a interpretar e aplicar, em termos discutíveis em face da divergência jurisprudencial existente sobre a matéria,  como mais abaixo melhor veremos, a lei aos factos alegados pela apelante-autora.
Esta teve oportunidade de se pronunciar sobre a matéria na petição inicial, nos termos do art. 467º nº 1 al. d).
Também tinha tido oportunidade de o fazer na fase prevista no nº 2 do art. 484º se esta não tivesse sido omitida apesar de o contrário constar da sentença, mas esta omissão também foi sanada por falta de arguição da autora atempada.
Assim, não se verifica qualquer causa de nulidade da sentença e nem qualquer outra nulidade processual de que cumpra legalmente conhecer, pelo que é improcedente esta pretensão da apelante.

b) Nesta segunda questão, a apelante pretende que as condições gerais apostas no contrato de mútuo em causa após a assinatura das partes são válidas.
A douta sentença entendeu que estando as referidas cláusulas apostas após a assinaturas das partes eram nulas por força do disposto no art. 8º al. d) do Dec.-Lei nº 446/85 de 25/10.
Vejamos.
Esta douta opinião tem sido seguida em outras decisões jurisprudenciais, nomeadamente, desta Relação, por ilustres colegas.
Também têm sido proferidas decisões neste tribunal de recurso em sentido contrário, havendo que optar por uma das referidas opiniões.
O contrato ajuízado dado como provado consta de fls. 9 e 10 e dele se pode ver que se trata de um contrato escrito intitulado como de mútuo celebrado pela apelante como mutuante e pelo réu B como mutuário.
Trata-se de contrato de adesão dado que consta de impresso previamente elaborado pela autora que o aderente se limita a aceitar ou não sem possibilidade de conformar as cláusulas à sua vontade, para além da óbvia possibilidade de aceitar ou rejeitar. 
Naquele contrato, após a identificação das partes, estipula o mesmo que “ é celebrado o contrato de mútuo constante das Condições Específicas e gerais seguintes:”
Seguem-se as condições específicas em que se inclui o bem a financiar e identificação do fornecedor do mesmo bem, as condições de financiamento – total do capital mutuado, a comissão de gestão, o número e o montante de cada uma das prestações de reembolso e as respectivas datas, as taxas de TAEG e de juros.
Ainda consta a seguir sob a epígrafe “Protecção “o valor do seguro de vida prevista na cláusula 15ª, sem se identificar se das condições específicas ou gerais, mas dada a inexistência de cláusula específica 15º e havendo nas condições gerais a cláusula 15ª que trata da “Protecção” se terá de referir a esta.
Também aqui consta uma declaração de estar em boa saúde e de ter tomado conhecimento das condições de cobertura, garantias e exclusões associadas àquele seguro constante de documento autónomo, sem que se tenha tido o cuidado de expressamente indicar a qual dos dois subscritores do contrato se refere a declaração, mas que facilmente se vê ter-se de atribuir ao mutuário, pois a mutuante não é passível de boa saúde física, pois se tratar de sociedade anónima.
Em seguida consta a data e a assinatura do mutuário, e uma assinatura pouco perceptível abaixo do nome dactilografado da autora e com o carimbo daquela sobre a mesma assinatura.
Na folha a seguir constam as condições gerais do mesmo contrato, sem que da mesma folha conste qualquer assinatura ou identificação concreta do contrato ou das suas partes.
 Devemos dizer, antes demais, que a elaboração deste tipo de contrato, em face das regras legais aplicáveis, é, pelo menos, pouco cuidada, até por provir de uma sociedade anónima que deve utilizar a mesma fórmula diariamente na sua actividade, o que lhe permitia e impunha maior cuidado e recurso a técnicos mais qualificados para elaborar aquela de  molde a evitar questões como a dos autos.
O art. 8º al. d) do referido Dec.-Lei nº 446/85 de 25/10 prescreve que em matéria de cláusulas contratuais gerais, são excluídas as que sejam inseridas em formulários, depois da assinatura de algum dos contraentes.
Na opinião dos Professores Mário Júlio Almeida Costa e António Menezes Cordeiro, nas “Cláusulas Contratuais Gerais “, pág. 27, tal dispositivo tem em vista afastar as cláusulas que o circunstancialismo exterior da celebração contratual aponte para a inexistência de mútuo consenso das partes sobre o conteúdo das cláusulas.
  Pensamos assim que as referidas cláusulas contratuais gerais são nulas por constarem do impresso contratual após a assinatura das partes.
Foi este o entendimento da douta sentença e foi o entendimento dos acórdãos desta Relação de que foi relatora a ilustre Desembargadora Rosa Maria Ribeiro Coelho, de 21.01.2003 e de 13.05.2003, publicados, respectivamente, na Col. Jurisp. 2003, tomos I , pág. 70 e III, pág. 75.

Não se desconhece, como dissemos já, que há outras opiniões, nomeadamente nesta Relação sobre a interpretação do citado art. 8º al. d), de que a apelante juntou uma decisão e de que conhecemos outras.
Porém, seguimos a 1ª interpretação que foi seguida pela douta sentença e que obteve recentemente a  consagração do STJ em acórdão de 13.01.2005, de que foi Relator, o Conselheiro Ferreira Girão, proferido na revista nº 3874/04-2 em que é também recorrente a aqui apelante.
Seguindo de perto o citado acórdão diremos que o regime das cláusulas gerais regulado no Dec.-Lei nº 446/85 mencionado se destina a acautelar os interesses do contraente que não teve qualquer intervenção na elaboração do contrato – o aderente -, por forma a evitar que ele subscreva acordos negociais de forma leviana, sem uma leitura ponderada e conscienciosa do teor, normalmente impessoal e estandardizado, desta espécie de contratos, impondo, por isso, o legislador a observância de determinadas cautelas  na celebração deste tipo de contratos, sob a cominação de nulidade, como é o caso dos autos em que as assinaturas dos contraentes não constem no final de todo o clausulado, mas apenas na primeira página, onde só constam as condições específicas do contrato.
O texto da referida al. d) do art. 8º é claro no sentido de se aplicar ao caso dos autos.
Mesmo constando da página do contrato assinada a referência às cláusulas gerais que, no entanto, só surgem após as assinaturas, se mantém o risco de não terem sido atentadas essas cláusulas por aderente menos cuidado ou atento, pois há a convicção popular do que se não assinou, ou seja, do que não consta até à assinatura, não foi incluído no contrato.
Não se trata aqui de aferir sobre se as cláusulas gerais constavam já do impresso aquando da assinatura do contrato, mas de obviar à suspeita de que tais cláusulas não foram lidas ou que sobre elas não tenha havido acordo, tal como refere Meneses Cordeiro, in Tratado de Direito Civil Português – parte geral, Tomo I, 2ª ed., pág. 436.      
Citando o ac. de 21-01-2003 desta Relação referido, as diversas alíneas do mencionado art. 8º visam acautelar o risco de uma aceitação meramente aparente de condições que facilmente podem passar despercebidas e no caso em apreço tal risco é patente, pois o local de inserção daquelas cláusulas não garante que sobre elas tenha incidido a atenção do contraente a quem são dirigidas, prevendo-se e admitindo o legislador que aquele apenas atente devidamente e tome consciência do conteúdo do contrato até ao ponto onde apõe a sua assinatura.
E remata aquele acórdão que a bem da lisura  e transparência de processos, nestes casos devem ser adoptados formulários concebidos de modo a que depois de assinados, não surjam cláusulas contratuais.
Improcede, assim, este fundamento do recurso, pelo que bem andou a douta sentença em declarar nulas as cláusulas constantes do contrato após a assinatura das partes.

c) Finalmente resta a terceira questão em que a apelante pretende que a taxa de juros remuneratórios acordada e a capitalização daqueles sejam admissíveis.
Aqui parece-nos ter a apelante, em parte, razão.
A douta sentença, se a bem compreendemos, adoptou um entendimento que nos parece  carecer de coerência, pese embora o respeito devido ao seu ilustre autor.
Com efeito, segundo aquela douta decisão, tendo em conta que a cláusula geral de vencimento imediato de todas as prestações – de reembolso do capital mutuado e de juros remuneratórios e outras despesas – por falta de pagamento de quaisquer uma delas, é nula por constar após a assinatura das partes contraentes, admite o mesmo vencimento por força do disposto no art. 781º do Cód. Civil, mesmo sem que tenha havido interpelação do credor para a exigência dessa totalidade.
Não é esta última a nossa opinião, pois entendemos que para aquela aplicação do art. 781º, se exige a interpelação que aqui não foi alegada – conforme decidiu o referido ac. do STJ acima mencionado em caso idêntico -, mas tal questão não é objecto deste recurso, pelo que se tem de aceitar a aplicação imediata do citado art. 781º.
Porém, a sentença em apreço só admitiu o vencimento imediato das prestações no tocante ao capital mutuado e às despesas das mesmas constantes e, ainda, no tocante aos juros remuneratórios apenas referentes ao período de tempo efectivamente decorrido até à falta de pagamento e consequente vencimento imediato das restantes prestações.
No entanto e incoerentemente, segundo nos parece, aceitou esse montante total de juros remuneratórios para imputar o montante das vinte prestações voluntária e tempestivamente pagas.
Por nós entendemos, tal como o ac. desta Relação de 23-09-2004, no rec. nº 4093/04-6 de que foi relator o Desemb. Manuel Gonçalves e junto a fls. 99 pela apelante, que a capitalização dos juros remuneratórios acordada nas condições específicas do contrato é legal, por dizer respeito a período superior a três meses, ao abrigo do disposto no Dec.-Lei nº 344/78 de 17/11 e suas sucessivas alterações pelos Decretos-Leis números 83/86 de 6/5, 204/87.
Deste modo, capitalizados os juros remuneratórios de acordo com a cláusula contratual admitida pela lei, com o vencimento imediato das prestações ainda em dívida, com a falta de pagamento da 21ª prestação, tem a apelante direito ao montante total das prestações em dívida acrescido dos juros moratórios contados da referida data de falta de pagamento.
A taxa de juros moratórios serão os do contrato para os juros remuneratórios, sem o acréscimo dos 4% constante da cláusula geral que já vimos ser nula, tal como foi decidido na 1ª instância.
É certo que na falta de cláusula contratual de fixação dos juros moratórios – por nulidade da respectiva cláusula geral -, seria de aplicar a taxa supletiva da lei que é inferior àquela fixada contratualmente para os juros remuneratórios.
Porém, tendo nessa parte a recorrente defendido a aplicação de taxa superior – ou seja, com o acréscimo de 4% -, não pode aquela apelante, na falta de recurso dos apelados, ser prejudicada em relação ao decidido na 1ª instância, sob pena de violação do princípio processual reformatio in pejus, adoptada pelo nosso código no nº 4 do art. 684º.
Deste modo, tem a apelante o direito ao valor das prestações ainda em dívida, ou seja, 52X€ 301,18 = € 15.661,36. Tem ainda direito aos juros moratórios sobre aquele montante, à taxa anual de juro de 17, 52%, contados desde a data em que os apelados deixaram de cumprir a 21ª prestação, ou seja, em 10-04-2003, e até integral pagamento. Têm ainda os réus de pagar o imposto de selo peticionado.
Por outras palavras diremos que o pedido procederá na totalidade, salvo no tocante à sobretaxa de 4%  que acresceria sobre a taxa de juros de 17,52%.
Procede, assim, em parte, este fundamento do recurso.

Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a presente apelação e por isso, se altera a sentença apelada, nos termos expostos, ou seja, procederá todo o pedido, salvo no tocante à sobretaxa de 4% incidente sobre a taxa de juros de 17,52% incidente sobre o valor das 52 prestações em falta e contados desde 10/04/2003 e até integral pagamento, absolvendo os réus desta parte do pedido.
Custas em ambas as instâncias a cargo de autora e réus, na proporção do decaímento.

Lisboa 3-03-2005

João Moreira Camilo ( Relator )
Jorge Paixão Pires
José Caetano Duarte.