Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1076/22.5PALSB -B.L1-5
Relator: PEDRO JOSÉ ESTEVES DE BRITO
Descritores: REQUERIMENTO DE ABERTURA DE INSTRUÇÃO
REJEIÇÃO
INADMISSIBILIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/07/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: I. O requerimento para abertura de instrução referente a factos e pessoas não visadas no inquérito que o precedeu deve ser rejeitado por inadmissibilidade legal da instrução (cfr. art.º 287.º, n.º 3, do C.P.P.);
II. Deve também ser rejeitado, por inadmissibilidade legal da instrução, o requerimento apresentado pelo arguido relativamente a factos pelos quais o Ministério Público tiver deduzido acusação apenas para obter a suspensão provisória do processo caso não seja colocada em causa a suficiência dos indícios dos factos imputados, não seja alegada qualquer outra razão de direito para evitar submeter a causa a julgamento e não se verifique pelo menos um dos pressupostos previstos na lei de processo para que aquela seja determinada (cfr. art.º 281.º do C.P.P.).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

I. Relatório:
I.1. Da decisão recorrida:
No âmbito dos autos n.º 1076/22.5PALSB, que correm termos no Tribunal Central Instrução Criminal – Juiz 6, em 04-03-2025 foi proferida decisão pela qual foi:
- Rejeitado o requerimento para abertura de instrução apresentado pelo arguido AA relativamente a factos pelos quais o Ministério Público deduziu acusação, por inadmissibilidade legal;
- Não admitida a constituição como assistente de AA, por falta de legitimidade; e
- Rejeitado o requerimento para abertura de instrução apresentado pelo arguido AA, na parte em que pretendia a prolação de despacho de pronúncia, por falta de legitimidade e inadmissibilidade legal.
I.2. Do recurso:
Inconformado com a decisão, o arguido AA dela interpôs recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões:
I. O Despacho de Rejeição da Instrução por inadmissibilidade legal é incorrecto, ilícito, inconstitucional e injusto.
II. O MP e o Tribunal de Instrução, ao tomarem conhecimento de factos que podem consubstanciar crimes de natureza pública, nomeadamente ofensas à integridade física qualificada e agravada e injúrias agravadas, devem investigar estes factos, nos mesmos autos onde são investigados os crimes imputados ao arguido.
III. Isto é mais que uma faculdade, é um dever quer do MP como do Juiz de Instrução, que tomaram conhecimento DIRECTAMENTE de factos que consubstanciam crimes de natureza pública. Devem ordenar a instauração de procedimento criminal em relação a estes factos, oficiosamente.
IV. Ao não fazê-lo, o MP e o TIC violaram os artigos 241.º, 242.º e 243.º do CPP, o que prejudicou gravemente o direito de defesa e contraditório, nomeadamente ao não investigar factos que aconteceram no mesmo local, na mesma data, com os mesmos intervenientes.
V. O MP não pode recusar a apensação de inquéritos, que digam respeito às mesmas pessoas, aos mesmos factos, no mesmo dia e local, em processos que não revistam especial complexidade, sem um motivo ponderoso, que não existe neste caso em concreto.
VI. Neste caso em concreto, não existiam quaisquer fundamentos ou justificação válida para não apreciar e julgar todos os factos no mesmo inquérito.
VII. Assumem natureza urgente todos os factos descritos noutro processo que estejam em relação de conexão de processos (e, por consequência, os respectivos processos), como se verifica neste caso.
VIII. As razões invocadas pelo MP para proceder desta forma não correspondem à verdade e são discricionárias, sem fundamento e injustificadas, o que acarreta a nulidade, por existir um cerceamento grave do direito de defesa e do contraditório.
IX. A Douta Decisão que não determinou a apensação dos dos inquéritos é ilegal e inconstitucional por violar o direito de ampla defesa e do contraditório, as garantias do processo penal, o princípio da proporcionalidade e da busca da verdade material, o que determina a sua nulidade.
X. E, em consequência, a nulidade de todos os actos subsequentes, nomeadamente do Despacho de Acusação, algo que pode, e deve, ser sindicado na Abertura de Instrução.
XI. O Douto Despacho do MP de 3-10-2023 é nulo, por ser inconstitucional e ilegal, por violação expressa dos artigos 24.º e 29.º do CPP e dos artigos 13.º, 18.º, 20.º, 29.º, 32.º da CPR e art.º 340.º, do CPP, nulidade invocada que deve ser reconhecida.
XII. Todos os actos posteriores ao referido Despachos, inclusive a Douta Acusação, são, igualmente, nulos, que fica invocado, para todos os efeitos legais.
XIII. Nulidades que deveriam ser reconhecidas na Abertura de Instrução, que deve zelar pela legalidade do processo.
XIV. A norma e/ou orientação que determina a prioridade e/ou urgência de processos cometidos contra agentes de autoridade e não o faz em relação aos crimes cometidos PELOS agentes de autoridade, nem aos factos que estão em relação directa de conexão, é ilegal e inconstitucional, por violar o direito de igualdade das partes, o princípio da proporcionalidade, o direito de tutela jurisdicional efectiva, o princípio a aplicação da lei criminal, as garantias dos processo criminal, de ampla defesa e do contraditório, efectiva e o princípio da busca da verdade material que orienta o processo penal, previstos nos artigos 13.º, 18.º, 20.º, 29.º, 32.º da CPR e art.º 340.º, do CPP
XV. O Douto Despacho recorrido é inconstitucional e ilegal por violar as normas acima mencionadas, ao não sanear erros, vícios, ilegalidades e deficiências manifestas.
XVI. São inconstitucionais e ilegais os artigos 24.º e 29.º do CPP, quando interpretado no sentido de não permitir a apensação de processos de crimes cometidos contra Agentes da Autoridade de crimes cometidos pelos Agentes de Autoridade, e outros crimes directamente conexos, no mesmo local, data e intervenientes, quando ambos se encontrem na mesma fase processual (inquérito), independentemente do número de diligências que já tinham sido praticadas em cada um deles, por violar os artigos 13.º, 18.º, 20.º, 29.º, 32.º da CPR e art.º 340.º, do CPP
XVII. Esta inconstitucionalidade e ilegalidade acima descrita acarreta a nulidade do processo, invalidando todos os actos posteriores à Decisão ilegal e inconstitucional.
XVIII. Cabe ao Tribunal de Instrução Criminal sanear este vício, tomando todas as providências e ordenando todas as provas necessárias para repor a legalidade dos actos, no competente processo de Abertura de Instrução.
XIX. Portanto, deveriam ter sido julgados todos os factos relatados nos autos, neste processo, independentemente das falhas processuais, de investigação e de diligências (como a ausência de constituição como arguidos) neste processo.
XX. Havendo qualquer deficiência ou irregularidade no RAI o Tribunal de Instrução Criminal, como garante da legalidade, deve convidar o Requerente a aperfeiçoar o mesmo.
XXI. O RAI não poderia ser rejeitado, por não se verificarem quaisquer das circunstâncias em que tal pode acontecer, nomeadamente inexistir falta de pressupostos e inadmissibilidade legal.
XXII. O art.º 108.º, n.º 1, do CPP é ilegal e inconstitucional, quando interpretado no sentido de não permitir que o requerente não tenha interesse e legitimidade num processo cuja conexão foi recusada ilegalmente, por causa que não lhe é imputável.
XXIII. O art.º 287.º, n.os 1 e 3, do CPP é ilegal e inconstitucional, quando interpretados no sentido entender que não é admissível a instrução num caso em que deveria ter havido conexão de processos e não houve por razões alheias à vontade e actuação do requerente.
XXIV. Os artigos 281.º e 287.º, n.os 1 e 3, do CPP são ilegais e inconstitucionais, quando interpretados no sentido de não permitir que o requerente não tenha interesse e legitimidade num processo cuja conexão foi recusada ilegalmente, por causa que não lhe é imputável.
XXV. O Requerimento de Abertura de Instrução não violou o disposto no art.º 283.º, n.º 3 e 287.º, do CPP, uma vez que contém os elementos necessário à acusação.
XXVI. A prova pode, e deve, ser produzida em sede de Instrução.
XXVII. O Douto Despacho viola o disposto no art.º 287.º, n.º 3, por não existir qualquer razão para a sua rejeição, nomeadamente não existir inadmissibilidade legal.
XXVIII. A prova produzida em Instrução supre qualquer deficiência probatória do inquérito, sendo suficiente e adequada para sustentar uma acusação penal.
XXIX. A prova pedida pode e deve ser produzida em sede de Instrução.
XXX. O prosseguimento da acção não conduziria a qualquer nulidade.
XXXI. A fase de instrução deve ser sempre aberta quando seja requerida e quando as provas não sejam manifestamente incompatíveis com a tramitação processual legalmente estabelecida, como ocorre neste caso em concreto.
XXXII. Não se verifica a inadmissibilidade legal da Instrução no caso dos presentes autos.
XXXIII. A autoria e materialidade dos delitos estão identificadas.
XXXIV. As provas requeridas são idóneas para comprovar os factos descritos no RAI e não são, de todo, “actos inúteis e inconsequentes”, muito menos “ilegais”.
XXXV. Todos os factos imputados estão descritos e especificados de forma clara e objectiva na peça processual apresentada.
XXXVI. O Tribunal não poderia ter rejeitado a instrução, por inadmissibilidade legal.
XXXVII. Neste caso em concreto os Denunciados cometeram os crimes que lhes são imputados:
- o Denunciado BB cometeu a ofensas a integridade física qualificadas e agravadas, descrita nos autos;
- os Denunciados Agentes da Autoridade cometeram as ofensas a integridade física agravadas, descritas nos autos;
- a Denunciada CC cometeu as falsas declarações e mesmo que seja considerado que deve ser extraída certidão o processo deve prosseguir quanto aos demais, cujos actos FORAM investigados no processo;
XXXVIII. Os factos supra expostos, relacionados e conjugados, são suficientes para, a após a prova produzida em instrução, conduzirem à condenação do arguido pela prática dos crimes acima mencionados.
XXXIX. Os actos acima mencionados são independentes, autónomos, deliberados e intencionais.
XL. O Tribunal de Instrução Criminal deve corrigir falhas e vícios existentes no Inquérito, no âmbito do processo decorrente do pedido de Abertura de Instrução.
XLI. O Douto Despacho recorrido violou ainda os artigos 24.º e 29.º do CPP, como também art.º 13.º, 18.º, 20.º, 29.º, 32.º da CPR e art.º 340.º, do CPP, ao não sanear o processo e não analisar todos os factos conexos, que deveriam ser tratados num só processo.
XLII. O RAI preenche os pressupostos estabelecidos na lei para o efeito, nomeadamente para a suspensão provisória do processo, nomeadamente verificarem nos autos todos os pressupostos estabelecidos para o efeito e por não ultrapassar o limite abstracto máximo previsto para o efeito e, portanto, o Douto Despacho violou os art.os 277.º e 281.º, do CPP. A Instrução não é um acto inútil e proibido.
XLIII. Em caso de suspensão provisória do processo, estão asseguradas a prevenção geral e especial.
XLIV. Estão preenchidos os pressupostos para ser aberta a Instrução, para que o Tribunal se pronuncie sobre a suspensão provisória do processo.
XLV. O Douto Despacho que rejeitou a Instrução viola os artigos 13.º, 18.º, 20.º, 29.º, 32.º da CPR e art.os 281.º e 287.º, n.os 1 e 3 e 340.º, do CPP
XLVI. O facto de o Recorrente ter-se remetido ao silêncio quando às alegadas imputações efectuadas pelos Agentes não pode ser interpretado no sentido de concordância, ou assunção dos factos, por mesmo.
XLVII. O Douto Despacho, ao considerar que o facto de o Recorrente ter- se remetido ao silêncio sobre as imputações dos Agentes violou o direito ao silêncio do arguido e a presunção de inocência, previstos no art.º 32.º da CRP.
XLVIII. A Abertura de Instrução que foi pedida preenche todos os pressupostos legais, deve ser revogado o Douto Despacho que a julgou inadmissível, sendo substituído por outro, que ordene a abertura e a realização das diligências requeridas.
XLIX. O Recorrente tem, portanto, legitimidade e interesse em constituir- se assistente nos presentes autos, enquanto titular dos direitos legalmente tutelados, devendo ser revogado o Douto Despacho que indeferiu esta constituição, sendo substituído por outro, que defira o pedido e admita o Recorrente nesta posição no processo, em relação aos Denunciados da Queixa cuja junção (e apensação) foi requerida nos autos.
L. A Justiça é cega, mas os Tribunais não!
O referido recurso foi admitido por despacho de 14-05-2025.
I.3. Da resposta:
Ao dito recurso respondeu a Digna Magistrada do Ministério Público junto do tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência, sem formular conclusões.
Foram os autos remetidos a este Tribunal da Relação.
I.4. Do parecer:
Nesta instância, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer através do qual propugnou pela improcedência do recurso, acompanhando a resposta apresentada pelo Ministério Público em 1.ª instância.
I.5. Da tramitação subsequente:
Tendo sido dado cumprimento ao disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (C.P.P.), foi apresentada resposta ao dito parecer, pelo recorrente que, em síntese, renovou todas as considerações já tecidas na sua peça recursiva.
Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos, foram os autos submetidos a conferência.
Nada obsta ao conhecimento do mérito, cumprindo, assim, apreciar e decidir.
II. Fundamentação:
II.1. Dos poderes de cognição do tribunal de recurso:
Está pacificamente aceite na doutrina (cfr., por exemplo, MESQUITA, Paulo Dá, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo V, 2024, Livraria Almedina, pág. 217; POÇAS, Sérgio Gonçalves, in “Processo Penal – Quando o recurso incide sobre a decisão da matéria de facto, Julgar, n.º 10, 2010, pág. 241; SILVA, Germano Marques da, in Curso de Processo Penal, Vol. III, 2.ª edição, 2000, pág. 335) e jurisprudência (cfr., por exemplo, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-02-2024, processo n.º 105/18.1PAACB.S12) que, sem prejuízo do conhecimento oficioso de determinadas questões que obstem ao conhecimento do mérito do recurso (cfr., por exemplo, art.º 410.º, n.º 2, do C.P.P.), são as conclusões que delimitam o seu objeto e âmbito, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19-10-1995, para fixação de jurisprudência, in Diário da República n.º 298, I Série A, de 28-12-1995, págs. 8211 e segs.3).
Na verdade, se o objeto do recurso constitui o assunto colocado à apreciação do tribunal de recurso e se das conclusões obrigatoriamente devem constar, se bem que resumidas, as razões do pedido (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.) e, assim, os fundamentos de facto e de direito do recurso, necessariamente terão de ser as conclusões que identificam as questões que a motivação tenha antes dado corpo, de forma a agilizar o exercício do contraditório e a permitir que o tribunal de recurso identifique, com nitidez, as matérias a tratar.
II.2. Da questão a decidir:
A esta luz, a única questão a conhecer reside em saber se é admissível a constituição do recorrente como assistente e a abertura de instrução, requeridas por aquele (cfr. II.4.).
II.3. Ocorrências processuais com relevo para apreciar a questão objeto do recurso:
Ora, com relevo para o definido objeto do recurso, e resultante dos atos processuais a seguir assinalados, importa atentar no seguinte:
II.3.A. Do despacho do Ministério Público de 04-10-2023 (cfr. ref.ª 395894461 de 04-10-2023 dos autos principais):
No dia 04-10-2023, pelo Ministério Público, foi proferido o seguinte despacho:
“(…)
I. DA NÃO INCORPORAÇÃO DO INQUÉRITO 4281/2.3T9LSB
Consigno que consultei o inquérito n.º 4281/23.3T9LSB que me foi apresentado, o qual, se devolve, pois, ainda que se nos afigure que, entre os dois, exista uma conexão processual, não se afigura que, a apensação dos dois inquéritos, traga benefícios à investigação, porquanto, a investigação nos presentes autos se mostra finda e nos autos que foram apresentados ainda nem sequer se iniciou
Ademais , nos presentes autos está em causa o crime de violência domestica e naqueles um crime de ofensa à integridade física grave, sendo os nossos autos de caracter urgente e de investigação prioritária, pelo que as delongas com a recolha de prova naqueles autos de inquérito n.º 4281/23.3T9LSB não se compadecem com a celeridade que se impões aos processos em que estão em causa a prática do crime de violência domestica.
Destarte, devolva os autos ao Exmo Colega Titular comunicando-lhe o anterio despacho. (…)”
II.3.B. Do despacho de encerramento do inquérito (cfr. ref.ªs 396464492, 396470195 e 396470196 de 29-11-2024 e 26128023 de 11-12-2024 dos autos principais):
No dia 29-11-2024, o Ministério Público proferiu o seguinte despacho:
I.-Do arquivamento parcial:
O presente inquérito teve início com o auto de notícia por detenção de fls. 2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, dando conta de factos susceptíveis de, em abstracto, integraram a prática de um crime de violência doméstica, p. e p. no art.152º, n.º1, al. b) do Código Penal, perpetuado por AA na pessoa na sua ex-namorada CC.
Em suma, foi trazido ao nosso conhecimento que no dia ........2022, na ... o suspeito dirigiu-se à porta da entrada da habitação de CC e desferiu vários pontapés na ponta ao mesmo tempo que dizia “abre a porta filho da puta, rebento-te todo, chama a polícia abre a porta se és homem filho da puta”.
Por vez, foi incorporado o inquérito 423/24.0... que teve origem na certidão extraída do inquérito 4281/23.3... cujo teor se dá por integralmente reproduzido, dando conta de factos susceptíveis de, em abstracto, integraram a prática de um crime de violência doméstica, p. e p. no artigo 152º, n.º1, al. b) do Código Penal, perpetuado por CC na pessoa de AA.
Em concreto e resumidamente, referiu que no dia ........2024 se dirigiu a porta da habitação de CC, por ter ido no encalço de BB, que momento antes, o tinha agredido, na via pública, com vários socos na face, na cabeça e nariz.
Mais relata que a agressividade e nervosismo naquele dia não tinha nada a ver com a ex-namorada, mas sim por o agressor se ter refugiado na casa daquela.
Referiu ainda que de acordo com a gravação que a vizinha fez dos factos e cujo o CD se encontra junto a fls. 33, demonstra a sua versão dos factos.
Por fim, relatou que a denunciada durante a relação era possessiva e ciumenta, e, por várias vezes o chamou de “ maluco, esquizofrénico, cabrão e filho da puta”, além disso, a denunciada acedeu ao seu telemóvel, e ás suas redes sociais, onde leu as mensagens dele, desta forma a namorada controlava a sua vida e os seus contactos, tendo contactado uma amiga e questionado se essa amiga andava a sair com o seu namorado.
Procedeu-se a inquérito, tendo sido realizadas todas as diligências consideradas necessárias e úteis com vista à descoberta da verdade e ao esclarecimento dos factos, nomeadamente no que respeita à existência do crime denunciado, à determinação do seu(s) agente(s) e à sua responsabilidade (cfr. artigo 262º, n. º1 do Código de Processo Penal), foram determinadas a realização das seguintes diligências:
CC prestou declarações para memória futura, cuja transcrição se encontra a fls. 289 e seguintes, tendo esclarecido que iniciou uma relação de namoro com o arguido em ... de 2019 até ... de 2021, narrou que durante a relação existiu ofensas verbais, físicas e abusos sexuais. Quanto ao dia em que o arguido esteve na porta da sua residência confirmou o auto de notícia. Notificada para vir juntar as mensagens que alegou ter recebido, declarou que as apagou.
Inquirida DD, tia de CC, declarou que em ... de 2021 estava com a CC e assistiu a um telefonema com o arguido, tendo aquela colocado o telefone em voz alta, nessa chamada ouviu o arguido a chamar-lhe de “filha da puta”. Mais descreveu que noutras ocasiões em almoços de família, quando o arguido era contrariado apelidava CC de “filha da puta”.
Foi inquirido EE, amigo de CC, não presenciou os factos, o que relatou foi-lhe dito por CC.
Inquirida FF, a fls. 530, amiga de CC, relatou que CC lhe contou que o amigo BB no dia ........2022 agrediu o arguido com um murro, esclareceu que CC lhe relatou que o arguido nesse dia ficou magoado viu que tinha sangue na face. No mais o que sabe foi o que lhe foi transmitido pela CC.
Instada disse que não tinha conhecimento de o arguido ter forçado CC a ter relações sexuais, mas acha que isso nunca aconteceu. Afirmou que o arguido não aceitou o fim da relação e que pressionava CC, dizendo que se matava se ela acabasse com ele.
Inquirida GG, a fls. 545, declarou que não conhece qualquer um dos intervenientes, descreveu que no final de ano de 2022, quando pernoitava em casa de uma amiga, sita na ..., visualizou através do óculo da porta, que, junto da porta da fracção 3ºA, encontrava-se um individuo do sexo masculino, com sangue na cara a pontapear e a desferir murros na porta daquela fracção, perante isso solicitou a presença da PSP no local e gravou esses factos, gravação essa que entregou às Autoridades.
Inquirido AA a fls. 605, explicou que no dia ........2022, quando se dirigia para a ..., foi abordado pelo BB, amigo e colega do curso de CC, sua ex-namorada, que surgiu por detrás de si, puxou-o e disse-lhe “então és tu o ex-namorado da CC?” de imediato, desferiu-lhe vários socos que o atingiram na face, na cabeça, no nariz e olho, após colocou-se em fuga, tendo o ofendido ido atrás dele até que o mesmo entrou no prédio de CC. O ofendido acreditou que o seu agressor tinha entrado para casa de CC razão pela qual se dirigiu à porta desta, bateu na porta e gritou as expressões que constam no auto de notícia.
Inquirido AA a fls. 616, pai do ofendido, declarou que nunca viu qualquer marca em CC nem aquela se queixou de comportamento do namorado.
Inquirida HH, mãe do ofendido, narrou que, também, nunca viu marcas físicas ou assistiu a qualquer agressão, relatou, ainda, que CC nunca se queixou de ter sofrido ofensas.
Não se constitui CC como arguida, porque não se recolheram indícios suficientes da prática do crime que lhe é imputado.
Ora compulsados agora os autos e bem os elementos probatórios recolhidos, constata-se contudo, que dos mesmos não relevam indícios suficientes que permitem imputar ao arguido e à suspeita a prática por cada um deles do aludido crime de violência doméstica.
Do crime de violência doméstica
Determina o art.º 152º, n.º1 do Código Penal que:
- Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais ou impedir acesso ou fruição aos recursos económicos e patrimoniais próprios ou comuns:
O bem jurídico tutelado pela incriminação do crime de violência doméstica consiste na protecção da pessoa individual e da sua dignidade humana bem como da própria saúde, enquanto bem jurídico complexo que abrange a saúde física, psíquica e mental, pretendendo aqui prevenir-se todas as violações deste bem jurídico que ocorram no seio da família, entendida esta num conceito lato.
Convém frisar que, o preenchimento do tipo legal não se basta com qualquer ofensa à saúde física, psíquica e emocional ou moral da vítima: «O bem jurídico, enquanto materialização directa da tutela da dignidade da pessoa humana, implica que a norma incriminadora apenas preveja as condutas efectivamente maltratantes, ou seja, que coloquem em causa a dignidade da pessoa humana, conduzindo à degradação pelos maus tratos, in Plácido Conde Fernandes, revista do CEJ.
Aqui chegados, importa verificar se, no caso dos autos, existem esses indícios suficientes, ou não, no que respeita à prática do crime de violência doméstica.
Descendo ao caso concreto veja-se que existem duas versões contraditórias e opostas, quanto à mesma factualidade. Na verdade, encontramo-nos perante duas versões, uma de CC sustentada nas declarações de sua tia e amigos e, outra, do AA, suportada, nalguns factos que CC confirmou nas declarações para memória futura e nas declarações dos seus pais.
Por outro lado, o arguido quando interrogado negou os factos e pugnou pela sua versão. Não existe outras testemunhas que tenham presenciados os factos em apreciação.
Os factos constantes no auto de notícia apenas nos mostram que no dia ........2022, o arguido deu pontapés na porta da CC e as expressões que proferiu não foram dirigidas a CC, mas sim a um homem.
Nenhum facto cometido nesse dia foi dirigido a CC, quer as ofensas verbais quer ofensas físicas, a corroborar esta afirmação é a gravação de fls. 33, onde se vê o arguido a pontapear a porta e se ouve as expressões que proferiu e que constam no auto de notícia.
Ao contrário das declarações de CC, que afirmou que nesse dia o arguido a chamou de “ puta e Cabra”, de igual forma, disse que não olhou para o arguido e desconhecia a razão pela qual aquele se dirigiu à sua porta, quando relatou à amiga FF que viu o arguido e que o mesmo estava magoado, pois tinha sido agredido pelo seu amigo BB que se encontrava no local. Factos que omitiu nas declarações que prestou. A ofendida afirmou que estava sozinha em casa, quando das declarações do agente da PSP, ter referido que a ofendida estava acompanhada por um homem, quando abriu a porta da residência. Dúvida que persiste se efectivamente CC estava sozinha ou acompanhada pelo amigo BB.
Quanto aos episódios que CC relatou nas suas declarações, as mesmas não foram corroboradas pelas testemunhas, os amigos apenas sabiam aquilo que lhe foi contado, nunca tendo assistido a nenhuma situação entre os namorados.
Ademais a amiga FF questionada sobre os mesmos disse que nunca teve conhecimento de abusos sexuais, nem nunca assistiu a ofensas, limitou-se a narrar que apenas viu algumas mensagens que lhe forem mostradas. Além disso, descreveu que a CC lhe contou que no dia ........2022, o arguido tinha sido agredido pelo seu amigo BB e apresentava-se muito magoado a sangrar.
Da conjugação da prova testemunhal e supra referida extrai-se a conclusão que a versão que CC apresentou aos autos não é verosímil, existindo discrepâncias entre o que disse e a restante prova.
Desde logo, da audição da gravação dos factos não resulta qualquer insulto dirigido à sua pessoa ao contrário do que relatou.
De igual maneira, a ofendida omitiu quer nas declarações que prestou à PSP quer posteriormente a verdadeira razão pela qual o arguido se deslocou à sua residência, omitiu, ainda, que o amigo BB tinha agredido o arguido e os ferimentos que o mesmo apresentava tinham sido causados pela agressão que tinha sofrido.
Nas declarações que prestou e vertidas no auto de notícia CC relatou que sem que nada o fizesse prever o arguido apareceu-lhe à porta e começou a desferir pontapés na porta e, em simultâneo, injuriou-a e ameaçou-a. Factos que não correspondem à verdade.
Ficou também a dúvida que perante uma relação onde existiam agressões várias nunca as tenha denunciado nem aos amigos, nem os familiares.
Acresce dizer que os factos que a tia narrou não foram mencionados pela ofendida.
Por sua vez, os factos denunciados por AA não se mostram indiciados, na verdade CC assumiu que acedia ás redes sociais e ao telemóvel do namorado, ás escondidas, mas depois confrontava o mesmo com as informações que aí obtinha. De onde se extrai a conclusão que o ofendido sabia dessas atitudes e não se opunha. Aliás, segundo os seus depoimentos era prática recorrente, ambos, acederem aos telemóveis um do outro.
Quanto ás ofensas verbais, além das suas declarações não existe qualquer outro elemento probatório que as tivesse corroborado. Deste modo, e atento o facto de as declarações do ofendido não se encontrarem minimamente sustentadas por qualquer elemento probatório, inexistem, por ora, indícios suficientes quanto ao sucedido, ficando afastada a possibilidade de ser alcançada qualquer condenação criminal
Nesta medida, inexistindo qualquer outro elemento probatório, sem laços familiares com os intervenientes e sem qualquer interesse para a decisão da causa, que permita esclarecer, em definitivo, o que é que efectivamente aconteceu durante o namoro, por apurar ficam os exactos contornos da factualidade trazida ao nosso conhecimento.
Considerando que se mostram realizadas todas as diligências de prova tidas por pertinentes, não se afigura possível remover as dúvidas existentes sobre a realidade dos factos, situação que terá que ser valorada em favor do arguido.
Nesta conformidade, não é previsível que fosse proferida sentença condenatória caso o presente processo seguisse para fase de julgamento e fosse então aí reproduzida a prova recolhida em inquérito. Tal impõe a conclusão da inexistência de indícios suficientes da verificação do crime, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 283.°, do CPP.
Entendemos, assim, que, os factos recolhidos e praticados pelo arguido são censuráveis e penalmente relevantes, em termos de qualificação como um crime de injúria, p. e p. no artigo 181º, n.º1, do Código Penal, mas não são subsumíveis ao tipo de violência doméstica, pelos fundamentos aduzidos.
Pelo exposto, determino, nesta parte, o arquivamento do inquérito, ao abrigo do disposto no artigo 277. °, n.º 2, do CPP, quanto ao crime de violência doméstica praticado reciprocamente por AA e CC.
II.-Do crime de Injúrias
Como supra se anotou, da factualidade apurada ressalta a existência de condutas que poderão, em tese, ser qualificáveis como crime de injúria por referência ao teor do artigo 181.º, do Código Penal.
No que tange este tipo legal, cfr o prevê o art.º188.º, n.º1 do mesmo diploma legal, o respectivo procedimento depende de acusação particular, o que, em face do disposto no art.º 50.º do CPP, determina que o procedimento criminal só pode prosseguir quando se verifique queixa, constituição de assistente e acusação particular.
Destarte, o exercício do direito de queixa tem de ser feito no prazo de 6 meses após o facto, sob pena de extinção de tal direito (artigo 115.º, n.º 1 do CP).
Feitas tais considerações e descendo ao caso em apreço, resulta dos factos apurados, em termos de circunstâncias temporais em que os factos ocorreram, no ... de 2021. Sucede que, compulsados os autos, constata-se que a queixa crime contra o arguido foi apresentada no ... de ... de 2022 (fls. 2 dos autos).
Por conseguinte, a queixa crime foi apresentada pela denunciante para além do prazo legal de 6 meses, sendo, por isso, manifestamente extemporânea.
Dito de outra forma, o prazo, de seis meses, que a lesada dispunha para exercer o direito de queixa pelas ofensas verbais, já se encontrava caducado à data da apresentação da queixa, nos termos do artigo 115º, n.º1, do Código Penal.
Nestes termos, determino, nesta parte, o ARQUIVAMENTO dos autos, por inadmissibilidade legal de o prosseguir por falta de queixa validamente apresentada e, em consequência, julgo extinto o procedimento criminal que se fazia valer contra o arguido, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 277.º n.º 1, do CPP.
Cumpra o disposto no artigo 277.º, n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Penal, notificando os denunciantes e o arguido.
Consigna-se que, nos termos do art. 24º, nº2 da Lei nº 112/2009, o Estatuto de Vítima concedido a CC, cessa com o arquivamento do inquérito.
Declaro cessadas as medidas de coacção aplicadas ao arguido, cfr. artigo 214º, nº1 al. a) do Código de Processo Penal, à excepção do TIR, como infra se requer.
Comunique à PSP para efeitos de cessação de reavaliação do risco.
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III.- Da Acusação
Consigno que o arguido tem Mandatários constituídos a Dra. II e o Dr. JJ, com procuração junta aos autos a fls. 39.
O MINISTÉRIO PÚBLICO, em processo comum, para julgamento com a intervenção do TRIBUNAL SINGULAR, acusa:
AA, filho de AA e de HH, natural da freguesia de ..., concelho da ..., onde nasceu a ........1993, solteiro, residente na ... (TIR de fls. 605)
Porquanto
1.- No dia ... de ... de 2022, pelas 20h15, o arguido dirigiu-se à residência de CC, sita na ..., aí pretendendo entrar para pedir satisfações a BB.
2.- Desagradado com a recusa de CC não abrir a porta, o arguido desferiu inúmeros pontapés na porta de entrada da residência, e em voz alta disse, repetidamente, “ABRE A PORTA FILHO DA PUTA, CHAMA A POLÍCIA, VOU-TE MATAR FILHO DA PUTA, ABRE A PORTA SE ÉS HOMEM FILHO DA PUTA””.
3-. Perante estes factos a moradora do 3º B, GG chamou a PSP, deslocando-se ao local uma patrulha, da qual fazia parte os agentes KK, LL, MM e NN.
4.- À chegada da PSP o arguido, ainda continuava a desferir pontapés bem como socos na porta da residência de CC e dizia “abre a porta filho da puta, rebento-te todo, chama a polícia, vou-te matar filho da puta, abre a porta se és homem filho da puta”.
5.- Os mencionados agentes da PSP, que estavam uniformizados e se identificaram como agentes da PSP, disseram ao arguido que se afastasse da porta e cessasse a sua actuação ao que o arguido tentou desferir pontapés nos agentes, que lograram algemá-lo.
6.- Nesse momento, o arguido dirigiu-se aos agentes KK e NN e disse-lhes “FILHOS DA PUTA EU NÃO TENHO MEDO DE VOCÊS, PANELEIROS”
7.- Advertido de que incorria num crime de injúria, o arguido disse aos identificados agentes da PSP “ÉS UM FILHO DA PUTA, TENS CARA DE PANELEIRO”.
8.- No percurso do local da detenção até à esquadra, o arguido acompanhado pelos agentes LL e MM, manteve a mesma atitude proferido para estes agentes “FILHOS DA PUTA VÃO SE FODER, PANELEIROS, ESTÃO FODIDOS” e, a dado momento, cuspiu na direcção do agente MM, tendo atingido o banco do viatura.
9.- O arguido quis e dirigiu as mencionadas expressões aos agentes da PSP, ciente de que os mesmos eram agentes de autoridade no exercício das funções e que ao dirigir-se-lhes nos termos indicados agia de forma adequada a atingi-los na sua honra e bom nome pessoal e profissional, o que queria e logrou.
10. O arguido agiu em tudo, livre, deliberada e conscientemente, ciente de que a sua conduta era proibida e punida por lei
Pelo exposto, incorreu o arguido, na prática, em autoria material e na forma consumada, em concurso efectivo, de:
- 4 (quatro) crimes de injúria, agravado, previsto e punível pelo disposto nos artigos 181.º, n.º 1, e 184.º, por referência ao disposto no artigo 132.º, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal.
Prova:
Testemunhal:
i. NN, agente da PSP, id. a fls. 499;
ii. KK, agente da PSP, id. a fls. 502;
iii. MM, agente da PSP, id. a fls. 505;
iv. LL, agente da PSP, id. a fls. 509;
v. GG, id. a fls. 545.
vi. Por declarações para memória futura prestadas por CC, gravadas em CD.
Documental:
i. Auto de notícia por detenção a fls. 2-3;
ii. CRC do arguido a fls. 8.,
iii. CD de fls. 33.
Medidas de coacção:
Não se verificando, por ora, a ocorrência de qualquer alteração dos pressupostos de facto e de direito que determinaram a pretérita aplicação de TIR, promovo que o arguido continue a aguardar os ulteriores termos do processo sujeito às obrigações decorrentes daquela medida de coacção (cfr. artigo 196.º do C. P. Penal).
Notificações:
Notifique o arguido, nos termos do disposto no artigo 287.º, n.º 1, alínea a), do CPP; notificação a efectuar por via postal simples (cfr. artigo 113.º, n.º 1, alínea c), do CPP), atenta a morada do TIR.
Notifique o Ilustre Mandatário do arguido, - do despacho de acusação que antecede, conforme previsto no artigo 277.º, n.º 3, ex vi artigo 283.º, n.º 5, ambos do CPP.
Notifique os agentes da PSP- do despacho de acusação, conforme previsto no artigo 277.º, n.º 3 e n.º 4, aplicável ex vi artigo 283.º, n.º 5, ambos do CPP e sobre a possibilidade de apresentarem, querendo, pedido de indemnização civil, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 77.º, n.º 2, do CPP.
O referido despacho foi notificado a AA, mediante via postal simples, por meio do envio de carta que se mostra depositada em 02-12-2024, e à sua ilustre mandatária, mediante via postal registada, por meio de carta enviada em 29-11-2024.
II.3.C. Do requerimento para constituição como assistente (cfr. ref.ª 26127051 de 10-12-2024 dos autos principais):
No dia 10-12-2024, AA veio requerer a sua constituição como assistente alegando que era “(…) ofendido e denunciante nos autos deste inquérito, uma vez que foi incorporado o Inq. n.º 423/24.0..., que teve a sua origem na certidão extraída do inquérito 4281/23.3T9LSB, inquéritos que figuram no Douto Despacho do MP, por ter interesse, legitimidade, estar em tempo e estar representado por Advogado (…)”.
II.3.D. Do requerimento para abertura de instrução (cfr. ref.ª 26133519 de 23-12-2024 dos autos principais):
No dia 23-12-2024, AA apresentou o seguinte requerimento:
AA, tendo apresentado o pedido de constituição como assistente nos autos do inquérito à margem referenciado e aí melhor identificado, notificado que foi do Douto Despacho de Arquivamento e de Acusação de parte da matéria dos autos, vem, nos termos e para os efeitos do disposto no art.° 287°, n.° 1, al. a) do CPP requerer a
ABERTURA DE INSTRUÇÃO
nos termos e com os seguintes fundamentos:
1. DAS RAZÕES DE FACTO E DE DIREITO DA DISCORDÂNCIA DO DOUTO DESPACHO DO M P
i. Histórico
1) No dia ...-...-2022 AA foi detido, por alegadamente estar a cometer um crime de violência doméstica, por alegadamente estar a ofender e ameaçar a ex-namorada, na sua residência, sita na ....
2) Este facto ocorreu após ambos terem terminado o namoro, há praticamente um ano e não terem tido qualquer contacto físico após o fim da relação.
3) Após a detenção AA foi submetido ao primeiro interrogatório judicial, no qual foi-lhe aplicada uma medida de coacção altamente invasiva, considerando a aparente gravidade dos factos, descritos no Douto Despacho contendo a matéria indiciária elaborada pelo Ministério Público para o primeiro interrogatório judicial do arguido detido de ...-...-2022 e conforme as declarações de CC.
4) No primeiro interrogatório judicial o Denunciante explicou que não estava a gritar com a Denunciada, que estava a gritar com o amigo dela, BB, ora Denunciado, que instantes antes tinha dado três socos na cara a ele, na ..., quando este se deslocava para a ....
5) A agressividade e o nervosismo do Denunciante AA naquele episódio não tinham nada a ver com a denunciada CC, como resulta do vídeo e do que a PSP detectou no local, mas sim da raiva de ter sido agredido, à socapa, sem qualquer razão, pelo amigo desta denunciada, BB.
6) Porém, nada disto foi abordado no processo, naquela altura há dois anos atrás.
7) E, em virtude dos contornos atribuídos ao processo pela denunciada CC foi ainda considerado que existia "Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova"; e "Perigo de continuação da atividade criminosa e perturbação grave da ordem e a tranquilidade pública", nos termos dos art.°s 191° a 195.°, 196.°, 200.°, n.° 1 al. a) e d) 204.° als. a) b) e c), todos do Código de Processo Penal, e ainda nos termos dos art.°s 31.°, n.° 1, al. c) e d) e 35.°, n.° 1 e 36.°, n.° 7, da Lei n.° 112/2009 de 16 de Setembro.
8) O Ministério Público proferiu neste Inquérito o Douto Despacho de Arquivamento e de Acusação, 29-11-2024, que foi notificado somente ao arguido AA, e não aos seus Mandatários, aos 02-12-2024 (cfr. tracking de entrega da correspondência), que é objecto do presente pedido de Abertura de Instrução.
ii. Do Andamento processual
9) AA apresentou Queixa-Crime no dia ...-...-2023, na qualidade de Denunciante, nos seguintes termos:
a. Contra BB, por agressão agravada, da qual resultou um traumatismo craniano, no dia ...-...-2022;
b. Contra os Agentes da ...que estavam ao serviço no dia ...-...-2023 a partir das 18 horas (nomeadamente OO, PP e outros a identificar) e os que fizeram o transporte desde a ...até à a Esquadra de Olaias, assim como alguns que estavam no local naquela altura, por agressão qualificada;
c. Contra CC, por violência doméstica, durante a relação;
10) Esta queixa apresentada deu lugar à abertura do Inq. 4281/23.3T9LSB, que correu termos na 6a Secção do DIAP de ....
11) Dada a evidente conexão, foi pedido nos presentes autos a apensação do Inq. 4281/23.3T9LSB, que corria termos na 6a Secção do DIAP de Lisboa.
12) Aos 3-10-2023 (sublinhado e negrito nosso), a Digníssima Sra. Procuradora-Adjunta proferiu o seguinte Despacho:
"Consigno que consultei os autos no CITIUS e respectivo processo físico de fls. (...) do Inq. n.° 4281/23.3T9LSB que nos foi apresentado.
I. Da não incorporação do Inq. n.º 4281/23.3T9LSB
Consigno que consultei o Inq. n.º 4281/23.3T9LSB, que me foi apresentado, o qual se devolve, pois, ainda que se nos afigure que, entre os dois, exista uma conexão processual não se afigura que, a apensação dos dois inquéritos, traga benefícios à investigação, porquanto a investigação nos presentes autos se mostra finda e nos autos que foram apresentados ainda nem sequer se iniciou.
Ademais, nos presentes autos está em causa o crime de violência doméstica e naquele um crime de ofensa à integridade física grave, sendo os nossos autos de carácter urgente e de investigação prioritária, pelo que as delongas com a recolha de prova naqueles autos de Inq. n.º 4281/23.3T9LSB não se compadecem com a celeridade que se impõe aos processos em que estão em causa a prática do crime de violência doméstica.
Destarte, devolvo os autos ao Ex.mo Colega Titular, comunicando-lhe o anterior Despacho.
(...)”
13) Este Douto Despacho nunca foi notificado ao Denunciante AA, nem aos advogados constituídos nos autos.
14) Aos 12-6-2024 (sublinhado e negrito nosso), a Digníssima Sra. Procuradora-Adjunta proferiu o seguinte Despacho:
"Consigno que consultei os autos do Inq. n.º 423/24.0... que nos foi apresentado.
I. Da conexão processual
Compulsados os presentes autos, e consultado o Inq. n.º 423/24.0..., constatamos que ambos os processos se encontram sob investigação e, além do mais, os factos em causa da mesma natureza e com os mesmos intervenientes, tratando-se de uma situação de queixa contra queixa.
Ora, afigura-se-nos que a investigação a encetar, nos presentes autos e nos autos de Inq. com o NUIPC n.º 423/24.0..., deverá ser conjunta, porque existe entre eles uma situação de conexão processual objectiva, ao abrigo do disposto no art.° 24.°, n.º 1, al. e), do CPP, em prol da boa administração da justiça e fazendo apelo aos princípios da economia processual e do melhor aproveitamento dos actos processuais.
Assim sendo, determino a incorporação do NUIPC n.º 423/24.0..., neste inquérito, por ser este o determinante da conexão nos termos e ao abrigo do disposto nos art." 28. °, als. a) e c), e 29. °, n.º 2, ambos do CPP.
Face ao exposto, dê baixa do NUIPC n.º 423/24.0..., dê conhecimento à Ex.ma Colega Titular e incorpore-o fisicamente nos nossos autos.
Comunique ao queixoso naqueles autos da presente incorporação.
Uma vez cumprido o supra determinado, abra conclusão com vista à uma apreciação global dos actos em causa e determinação de diligencias de investigação a encetar."
15) Este douto despacho nunca foi notificado ao Denunciante AA, nem aos advogados constituídos nos autos.
16) Aos 29-11-2024 foi proferido o Douto Despacho de Arquivamento e de Acusação, cujo conteúdo aqui se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais.
17) No Douto Despacho consta o seguinte:
"Do arquivamento parcial
(…)
Por sua vez foi incorporado o Inq. 423/24.0... que teve origem na certidão extraída do Inq_ n.° 4281/23.3T9LSB cujo teor se dá por integralmente reproduzido, dando conta de factos susceptíveis de, em abstracto, integrarem a prática de um crime de violência doméstica, p. e p. no art.° 152, n.º 1, al. b), do CP, perpetuado por CC na pessoa de AA.
(…)
(sublinhado e negrito nosso)
18) A denunciada CC prestou "declarações informais" junto à PSP no dia ...-...-2022.
19) Igualmente, prestou declarações para memória futura no dia ...-...-2023.
20) O também arguido neste Inquérito AA prestou primeiro interrogatório judicial no dia ...-...-2022.
21) Prestou declarações como ofendido nos Serviços do Ministério Público, nos autos do Inquérito n.º 4281/23.3T9LSB.
22) Igualmente, como ofendido, prestou declarações na Divisão de Investigação Criminal no presente Inquérito, na PSP.
23) Os agentes da PSP que agrediram o Denunciante AA foram identificados nestes autos e nos autos do outro Inquérito.
24) Foram produzidas provas da matéria de ambos Inquéritos nestes autos.
25) Posteriormente, pediu a sua constituição como assistente nos autos deste Inquérito, como fez no Inq. n.º 4281/23.3T9LSB.
iii. Motivos da discordância e meios de prova que não foram considerados no Inquérito
26) Está a haver uma clara DENEGAÇÃO DA JUSTIÇA, pois o Inq. n.°4281/23.3T9LSB não foi incorporado aos autos (Despacho do MP de 3-10-2023 -pag,463). apesar de estar directamente relacionados com os factos descritos no dia ...-...-2022.
27) E o Denunciante AA não teve como pronunciar-se ou reagir a este Despacho, pois nunca foi notificado do mesmo, nem pessoalmente, nem através de seus mandatários.
28) O Ministério Público alega que estão em causa num processo, matéria urgente de investigação prioritária (alegada violência doméstica), mas ARQUIVA ESTA PARTE DO INQUÉRITO E ACUSA POR OUTRA (alegados crimes de injúrias qualificadas).
29) Ora, os factos imputados no Douto Despacho de Acusação estão directamente relacionados com os factos que figuram na queixa, que deu origem ao Inq. n.º 4281/23.3T9LSB.
30) Ora, como o devido respeito não trata-se de uma queixa de uma queixa, como muito juridicamente é referido, se trata de uma outra descrição dos factos, no mesmo dia e hora, com os mesmos intervenientes, assim como de factos que não foram referidos pela outra parte, que são relevantes para o bom julgamento desta causa.
31) Existe uma clara confusão, nomeadamente sabre o conteúdo da investigação de cada inquérito, que prejudicou de forma objetiva e grave o andamento do processo e o direito de defesa e do contraditório de AA.
32) Foram parcialmente produzidas neste Inquérito provas referentes aos factos descritos no Inq. n.º 4281/23.3T9LSB, como, por exemplo, o depoimento do assistente AA, a inquirição de parte das testemunhas arroladas na queixa, mas não foram produzidas todas as provas necessárias e pedidas, nem com a extensão e profundidade devidas.
33) Não foram interrogados os Denunciados, nem foram requisitadas as informações e documentos pedidos.
34) Da mesma forma, este processo sempre foi conduzido como um processo de violência doméstica. AA nunca foi chamado para pronunciar-se sobre as injúrias alegadamente proferidas contra os polícias.
35) Esta é uma DECISÃO SURPRESA, pois AA nunca foi chamado a pronunciar-se sobre isto.
36) O que consubstancia uma violação grave do direito de defesa e do contraditório, como do acesso aos tribunais e ao direito.
37) Por outro lado. os depoimentos dos polícias curiosamente só aparecem depois da apresentação da queixa-crime apresentada contra BB, CC e os polícias identificados nestes autos.
38) Igualmente, o Douto Despacho de Arquivamento e de Acusação NÃO CONTEMPLA TODOS OS FACTOS E CRIMES PREVISTOS NA QUEIXA CUJO INQUÉRITO TERIA QUE SER INCORPORADO.
39) O Denunciante prestou declaração sobre todos os factos dos dois Inquéritos, deste e do Inq. n.º 4281/23.3T9LSB, quando deslocou-se para prestar depoimento, por terem sido apensados os processos, conforme referiu o Agente que efectuou a diligência na Divisão de Investigação Criminai da PSP.
40) Este Agente referiu ainda que iria inserir a qualidade de assistente ou ofendida porque o sistema não aceitava duas qualidades no mesmo processo,
41) Mas assegurou que os dois inquéritos, este e o Inq. n.° 4281/23.3T9LSB, tinham sido apensados, afirmações realizadas na frente do Mandatário que subscreve a presente Instrução.
42) Também não contempla crimes públicos, verificados durante o curso deste Inquérito, nomeadamente o de falsidade de testemunho da denunciada CC, apesar de reconhecer tal facto jurídico no Douto Despacho.
43) Do mesmo modo, não contempla os crimes de ofensas à integridade física agravadas, praticadas pelo Denunciado BB, contra o Denunciante AA, largamente atestadas nos autos.
44) Do mesmo modo, não contempla os crimes de ofensas à integridade física e injúrias qualificadas, praticadas pelos Agentes KK, MM, LL e OO.
45) Do mesmo modo, a separação dos processos prejudica gravemente a defesa do aqui arguido AA, na medida que descontextualiza os factos, deturpa a actuação do mesmo e atribui uma gravidade e censurabilidade que não existe, pelo menos na medida que aparenta no Douto Despacho de Acusação.
46) Com o devido respeito, não tem qualquer sentido não apreciar os factos que estão descritos na queixa-crime apresentada pelo Denunciante AA neste processo, por o crime de violência doméstica ter natureza urgente e investigação prioritária, ALEGANDO INCLUSIVE QUE ESTE INQUÉRITO ESTAVA FINDO (cfr. Douto Despacho do MP), quando todos os factos relacionados com a alegada violência doméstica reciproca foram arquivados, por não terem qualquer densidade para consubstanciarem o tipo penal previsto e punido na lei, como também por EM OUTUBRO DE 2024 ainda estarem sendo ouvidas testemunhas neste processo, que, portanto, não estava findo, como muito juridicamente foi sustentado pelo MP aos 3-10-2023, ou seja, UM ANO ANTES.
47) Como se depreende com clareza, diferentemente do que foi sustentado no Douto Despacho de 03-10-2023 do MP, inexistem crimes de violência doméstica com relevância penal, que justificasse a não apensação dos processos.
48) Igualmente, o Inquérito não estava findo, pelo que era, e é, pertinente que os factos sejam julgados em conjunto, por existirem fortes factores de conexão entre os processos, que desaconselham, de todo, a sua separação.
49) Diferentemente do que é dito, existe vantagem na junção dos processos, que dizem respeito essencialmente aos mesmos factos.
50) Não se compreende esta actuação, que é claramente tendenciosa e prejudicial do direito de ampla defesa e do contraditório do Denunciante AA.
51) Como se depreende com alguma clareza dos autos, os factos dizem respeito ao mesmo episódio, do dia ...-...-2022 e descrevem uma outra versão dos factos descritos nos autos, estando em conexão processual necessária.
52) Neste processo foram realizadas diligências probatórias sobre os factos que figuram na Queixa-Crime apresentada pelo Denunciante AA (inq, n.° 4281/23.3T9LSB), não podendo este ser prejudicado por falhas na condução dos inquéritos referidos, que não deu causa.
53) Estão claramente identificados os agentes dos crimes, a existência dos delitos, nomeadamente das agressões (do Denunciado BB e dos agentes acima mencionados), das ameaças e ofensas qualificadas (dos agentes acima referidos) e da falsidade de depoimento (da denunciada CC).
54) Igualmente, estão documentados nos autos indícios da autoria e da materialidade dos delitos, suficientes para uma condenação criminal, inexistindo qualquer razão para não ser deduzida a Acusação dos mesmos.
55) O Douto Despacho do Ministério Público reconhece que "FF, a fls. 530, amiga da CC, relatou que CC lhe contou que o amigo BB no dia ...-...-2022 agrediu o arguido com um murro, esclareceu que CC lhe relatou que o arguido neste dia ficou magoado viu que tinha sangue na face".
56) Vem referido nos autos e no Douto Despacho do Ministério Público que foi referida a agressão do denunciado BB, com murros na face (3a folha), sendo, portanto, matéria dos autos.
57) No Douto Despacho do Ministério Público também é reconhecido que "ao contrário das declarações de CC, que afirmou que neste dia o arguido a chamou de puta e cabra, de igual forma, disse que não olhou para o arguido e desconhecia a razão pela qual aquele se dirigiu a sua porta, quando relatou à amiga FF que viu o arguido e que o mesmo estava magoado, pois tinha sido agredido pelo seu amigo BB que se encontrava no local: Factos de omitiu na declaração que prestou".
58) Com o devido respeito, a denunciada CC não omitiu, mas sim MENTIU, sob juramento, prestado perante a Meritíssima Juiz de Instrução Criminal, nas declarações para memória futura que prestou, o que consubstancia o crime de falsidade de depoimento.
59) Consta também do Douto Despacho do Ministério Público que a denunciada CC "afirmou que estava sozinha em casa, quando das declarações do Agente da PSP, ter referido que a ofendida estava acompanhada por um homem, quando abriu a porta da residência".
60) Com o devido respeito, mais uma vez, a denunciada CC não omitiu, mas sim MENTIU. sob juramento. prestado perante a Meritíssima Juiz de Instrução Criminal, nas declarações para memória futura que prestou.
61) Consta ainda do Douto Despacho do Ministério Público que a denunciada CC "lhe contou que no dia ...-...-2022, o arguido tinha sido agredido pelo seu amigo BB e apresentava-se muito magoado a sangrar".
62) Com o devido respeito, mais uma vez, a denunciada CC não omitiu, mas sim MENTIU, sob juramento, prestado perante a Meritíssima Juiz de Instrução Criminal, nas declarações para memória futura que prestou.
63) Curiosamente, no primeiro interrogatório judicial de arguido detido foi apresentada uma versão áudio, do evento ocorrido no dia ...-...-2022. Já a versão consultada na Secretaria do Ministério Público existia um vídeo, brevíssimo, sem som (CONSULTADO NO DIA 19-12-2022, PELA I. MANDATÁRIA), O QUE NÃO DEIXA DE CRIAR GRANDE ESTRANHEZA NA DEFESA.
64) Nomeadamente quando foi negada a entrega de gravações, por alegada privacidade da então ofendida ,CC, sendo que posteriormente verificou-se que NEM SEQUER FOI GRAVADA POR ESTA. NÃO PONDENDO, NEM EM ABSTRACTO, ESTAREM EM CAUSA PRIVACIDADE OU DADO PESSOAIS SENSÍVEIS DA REFERIDA OFENDIDA, ORA DENUNCIADA CC.
65) Consta ainda do Douto Despacho do Ministério Público que a denunciada CC "omitiu quer nas declarações que prestou à PSP quer posteriormente a verdadeira razão pela qual o arguido se deslocou à sua residência, omitiu, ainda, que o amigo BB tinha agredido o arguido e os ferimentos que o mesmo apresentava tinham sido causados pela agressão que tinha sofrido.".
66) Prossegue dizendo que, "nas declarações que prestou, vertidas no auto de notícia CC relatou que sem nada que o fizesse prever o arguido apareceu-lhe à porta e começou a desferir pontapés na porta e, em simultâneo, injuriou-a a ameaçou-a, factos que não correspondem à verdade ".
67) Com o devido respeito, outra vez, a denunciada CC não omitiu, mas sim MENTIU, o que é reconhecido pelo Ministério Público ao dizer "factos que não correspondem à verdade".
68) Então não há consequências para isto? Imagine-se se não houvesse a gravação e o depoimento da FF, o ora denunciado poderia ser condenado severamente por um crime que nunca cometeu!!!
69) Ora, é evidente que houve um abuso da queixa de um crime grave, de violência doméstica, que merece toda a tutela do Judiciário e da sociedade, com a intenção clara de prejudicar gravemente a vida do ora denunciante AA.
70) Que em virtude disto foi violentamente agredido pelo denunciado BB e pelos polícias abaixo referidos, com lesões graves, que poderiam em abstracto até ter conduzido ao óbito!
71) Foi do mesmo modo violentamente agredido pelos polícias que estão identificados nos autos.
72) E as lesões documentadas nas urgências do hospital atestam que existem muito mais lesões do que as existentes na face, nomeadamente na perna e na mão, parte delas lesões defensivas, das agressões dos policiais que estão identificados nos autos.
73) E seria mais um caso de queda nas escadas, do local da detenção e na Esquadra.
74) E isto não pode ficar sem consequências!
75) Independentemente de todas as questões que já foram levantadas nesta Instrução, nomeadamente da não pronúncia no Douto Despacho sobre factos que estão directa e inseparavelmente ligadas ao presente Inquérito, ainda assim nos autos existem factos que inquestionavelmente não foram abordados.
76) Decorre do Inquérito, que o Denunciante AA foi ouvido nestes autos sobre todos os factos descritos neste processo, exceptuadas as alegadas injúrias qualificadas (das quais vem agora acusado), e na queixa por si apresentada, que deram lugar ao Inq. n.º 4281/23.3T9LSB.
77) Relativamente a este Inquérito e ao Inq. n.º 4281/23.3T9LSB, está documentado nestes autos o seguinte:
a) Que o Denunciante AA foi violentamente agredido pelo Denunciado BB, agressão da qual resultou um traumatismo craniano e com hemorragia intracraniana, e depois fugiu para o apartamento da denunciada CC; estes factos estão provados por:
a. 1° interrogatório judicial do arguido detido, bem como depoimento prestado sobre a queixa apresentada, no qual refere estes factos, nomeadamente que foi violentamente agredido pelo referido Denunciado e que quando estava detido à porta do prédio da denunciada CC viu esta sair do apartamento com o Denunciado BB;
b. As declarações prestadas por FF, amiga da denunciada CC, que reportou que esta contou-lhe sobre a agressão com socos do Denunciado BB ao Denunciante AA, em depoimento que prestou perante a Digníssima Sra. Procuradora-Adjunta, nos Serviços do Ministério Público;
c. As declarações do Polícia NN, matrícula 158609, que atestou no seu depoimento que, quando chegou ao local, a ofendida CC tinha um homem consigo dentro do apartamento;
d. Os exames e relatórios médicos realizados nas Urgências do …, aos ...-...-2022, com respectivo internamento nos serviços de urgência;
e. Da presença do INEM no local, para prestar primeiros socorros ao Denunciante AA;
f. As declarações prestadas por GG que atestou que o Denunciante AA, antes de ser detido, já tinha marcas de agressões e sangue na face, além de estar alterado, em depoimento que prestou perante a PSP;
g. A própria denunciada CC refere na sua inquirição para memória futura que as ofensas proferidas pelo Denunciante AA, aquando estava à porta de seu apartamento, foram endereçadas para o amigo dela, o Denunciado BB;
b) Que a denunciada CC mentiu nos autos, inclusive sob juramento perante ao Meritíssimo Sr.(a) Juiz de Direito, na participação que realizou, nas declarações que prestou à Polícia sobre as mesmas, bem como nas declarações para a memória futura, com a intenção de prejudicar o Denunciante AA:
a. A denunciada prestou declarações para memória futura, perante a Meritíssima Sra. Juiz de Direito, no CC e, para o efeito, prestou juramento, com a advertência de que deveria dizer a verdade, só a verdade e toda a verdade, sob legal cominação; estas declarações para memória futura foram transcritas nos autos;
b. A denunciada disse inicialmente e depois no seu depoimento nas declarações para memória futura que estava óptima;
c. Mas omitiu que já tinha sido sujeita a tratamento psiquiátrico por depressão, no final do secundário, bem como que estava sujeita a tratamento psiquiátrico desde ... de 2022, quase um ano após o fim da relação, sem contacto com o alegado agressor;
d. A denunciada alega ter chamado a polícia, mas o vídeo gravado na altura dos factos, pela vizinha da mesma (que segundo a Digníssima Sra. Procuradora e a Meritíssima Sra. Juiz foi quem contactou com a PSP), facto desmentido pela própria denunciada na sua inquirição para memória futura;
e. A denunciada queixou-se de emails, telefonemas, mensagens nas redes sociais e uma autêntica perseguição, sem concretizar qualquer facto que fosse, mas assume que bloqueou o Denunciante AA em todas as plataformas e aparelhos, sendo impossível tomar conhecimento sequer do envio de mensagens de alguém que está bloqueado, como é de conhecimento público e notório ("3. O Arguido não se conformou com o termo da relação e continuou a tentar contactar a vítima, contra a vontade desta, através das redes sociais levando-a a bloqueá-lo, pelo que aquele passou a enviar-lhe, regularmente, emails."); estes factos (inexistência de contactos, pessoais, por mensagens SMS, emails ou nas redes sociais) também foram confirmados na inquirição para memória futura; a denunciada reconhece que tinha bloqueado o Denunciante nas redes sociais, deixando de receber mensagens e tentativas de contacto do mesmo, mas omite nesta declaração inicial que procedeu de igual forma em relação ao telemóvel e ao email; na inquirição para memória futura a denunciada, inquirida sobre a matéria, confessa que bloqueou o Denunciante AA nas redes sociais, mas também bloqueou o telemóvel e o email do mesmo, DEIXANDO DE RECEBER qualquer tipo de mensagem ou tentativa de contacto, quando assim o entendeu; explicou ainda que os emails e mensagens que foram alegadamente enviados antes de o bloquear não tinha qualquer conteúdo ofensivo, ameaçatório ou sequer agressivo, eram convites para sair, pedidos para conversar, votos em ocasiões de festas, etc., diferentemente do que referiu inicialmente;
f. A denunciada refere inicialmente que era perseguida e assediada mas depois confirmou nas declarações para memória futura que nunca mais viu pessoalmente o Denunciante AA, ou seja, que ele nunca mais passou no seu apartamento, nem fez qualquer perseguição;
g. A denunciada alegou inicialmente (inquirição informal), para figurar Douto Despacho com a matéria indiciária do MP de ...-...-2022 que "no dia ... de ... de 2022, pelas 20h15, AA dirigiu-se à residência de CC sita na ..., aí pretendendo entrar para conversar com a vítima, o que não lhe foi facultado.";
h. Porém, resulta da inquirição para memória futura, que a denunciada confessa que não houve este contacto, pretendendo entrar para conversar -e que lhe teria sido negado-, ao contrário, refere que o Denunciante AA estava a gritar e bater na porta, com agressividade, que trancou a porta, foi para o quarto e ligou para a polícia, apesar de ouvir que as frases estavam a ser proferidas no masculino, como está assente nos autos;
i. A denunciada alegou pânico e desconhecer o motivo do Denunciante AA estar exaltado a bater em sua porta, quando tinha conhecimento que o Denunciado BB o agrediu previamente, como confidenciou a amiga (que referiu tal facto no seu depoimento, prestado perante a Digníssima Magistrada do MP), na altura dos factos;
j. Alegou ainda que estava sozinha no apartamento, quando foi referido que estava acompanhada por um homem, pela própria polícia que esteve no local;
k. Na inquirição para memória futura a denunciada confessa que estava no quarto, ouviu gritos e baterem na porta com força, olhou pelo monóculo da porta, viu que era o Denunciante AA, correu para o quarto, trancou-se e chamou a polícia. Só saiu na varanda para gritar por ajuda quando o carro da PSP chegou. Disse ainda que estava nervosa que nem conseguiu ver a cara cheia de sangue do Recorrente, apesar da sua vizinha que também olhou pelo monóculo, numa distância muito maior, disse ter visto com clareza que o Denunciante AA tinha sangue na face); mas para a amiga confidenciou confessou que viu a cara cheia de sangue a agressão perpetrada pelo denunciado BB;
c) Que os agentes da PSP Denunciados agrediram, ameaçaram e ofenderam o Denunciante AA, no exercício de suas funções:
a. O Denunciante AA identificou nos autos dos dois inquéritos os agentes da PSP que o agrediram e ofenderam durante a noite de ...-...-2022 e a madrugada do dia ...-...-2022, descrevendo ainda as agressões levadas a cabo por cada um deles;
b. Os exames e relatórios médicos realizados Urgências do …, aos ...-...-2022, com respectivo internamento nos serviços de urgência, atestam lesões no nariz, nas pernas e nas mãos, que são compatíveis com as agressões imputadas aos agentes;
c. Da presença do INEM no local, para prestar primeiros socorros ao Denunciante AA;
78) O não julgamento, no mesmo processo, de factos ocorridos no mesmo episódio, pelos mesmos intervenientes, assim como as outras violações dos direitos mais elementares do Denunciante AA consubstanciam uma violação grave do direito de ampla defesa, do contraditório, do direito de igualdade entre as partes e do de acesso ao direito e aos Tribunais.
iv. Dos factos que deveriam constar na Acusação, conforme está documentado nestes autos
79) Resulta indiciado nestes autos os factos abaixo descritos.
80) No dia ...-...-2022, pelas 18h00-20h00 o Denunciante AA estava a frequentar a Aula de ... em ..., na ...
81) Por volta, das 20h00 até 21h30 decidiu tomar uma refeição no restaurante (...), sita no ..., próxima da faculdade, enquanto assistia na T.V ao jogo de futebol do mundial 2022, ....
82) Por volta das 21h30, o Denunciante caminhava em direcção à ..., para regressar a casa e descansar, quando foi abordado pelo Denunciado BB, amigo da Denunciada CC.
83) O Denunciado, BB abordou o Denunciante na ..., veio por trás, puxou-o e perguntou-lhe: "então, és tu o ex-namorado da CC?"
84) O Denunciante disse que sim e o Denunciado BB começou a disferiu-lhe vários socos na face, pelo menos 3, e a agredi-lo com muita violência.
85) Os socos foram na cabeça, nariz e olho, com extrema força e violência, com a intenção de causar sérios danos físicos, como efectivamente foram causados, ainda para mais sendo um estudante de medicina, com conhecimentos específicos de anatomia.
86) As agressões foram realizadas com conhecimentos de anatomia e com o objectivo de causar as maiores lesões possíveis, com dolo específico e directo, pois o Denunciado BB sabia que iria causar lesões sérias ao denunciante AA, queria o fazer e efectivamente o fez.
87) Depois de agredir o Denunciante, o Denunciado BB pôs-se em fuga, a correr, e fugiu em direcção à casa da Denunciada CC
…, com algum ligeiro avanço, pois o Denunciante não compreendeu o que se passou e ficou "abananado", uma vez que foi apanhado de surpresa, não teve tempo de se defender e de responder.
88) Ao cair em si, o Denunciante ficou zangado e começou a correr atrás do agressor, que estava a correr em direcção do prédio da Denunciada, sito na ....
89) O Denunciado BB entrou no prédio e no apartamento da Denunciada, CC, após ter agredido o Denunciante.
90) O Denunciante AA sabe que o Denunciado BB é amigo da denunciada CC, mas nunca teve qualquer questão com o mesmo, desconhecendo os motivos.
91) O Denunciante AA sofreu várias agressões, levou vários socos na face e na cabeça, disferidos pelo Denunciado BB, que causaram um traumatismo craniano, com hemorragia intracraniana, diagnosticado no hospital, para onde se deslocou logo após a libertação.
92) Quando AA estava à porta do apartamento de CC estava com lesões visíveis, com hematomas e o sangue na face, que foram constatados pela vizinha que filmou o episódio, pelos agentes da PSP que efectuaram a detenção e pelos que estavam no local, assim como pela equipa do INEM que se deslocou ao local, para socorrer exclusivamente aquele que até ao momento era o alegado agressor, AA.
93) Dois policiais efectuaram a detenção, o Agente KK e outro policial de olhos claros, que o Denunciante AA não conseguiu ver o nome.
94) Durante a detenção o Agente KK utilizou de força excessiva, projectou o Denunciante AA para o chão e para a escada e depois disto, com este no chão, deu-lhe um pontapé na face, ao lado do nariz, bem como no tronco e pernas, ainda dentro do prédio.
95) Foi usada uma brutalidade desproporcional e desnecessária.
96) Uma vez detido, o ora Denunciante AA foi conduzido, algemado, para a porta de entrada do prédio.
97) Posteriormente, já fora do prédio, o Denunciante AA foi colocado junto aos caixotes de lixo.
98) Nesta altura, o ora Denunciante AA viu a denunciada CC a sair do prédio acompanhada do Denunciado BB, conforme a mesma confessa no depoimento prestado a ...-...¬2023.
99) O Denunciante AA tinha o nariz a sangrar, tinha sangue na boca, estava em muito mau estado, em decorrência da agressão do Denunciado BB.
100) As agressões sofridas na cabeça do Denunciante AA foram desferidas pelo agressor, o Denunciado BB, com a intenção de causar graves danos físicos ao Denunciante, como efectivamente causaram.
101) Após a detenção, foi chamado o INEM, para prestar os primeiros socorros ao Denunciante AA, que foi visto no local e teve o primeiro tratamento no local.
102) Depois o Denunciante AA foi conduzido à ....
103) Nesta deslocação, o Denunciante AA sentou-se ao lado do Agente MM, que disse-lhe com a intenção de ofender, como efectivamente ofendeu, "a tua namorada está com oullo" (o que demonstra que viram outro homem no apartamento), "és um corno", "bates em mulheres", "és um merdas", bem como disse-lhe ainda, com a intenção de ameaçar, "gajos como tu deveriam morrer" e "vais ver quando chegares à esquadra", "quando chegares à esquadra levas no focinho" e "estás fodido". Este agente ainda ficava "mandando beijinhos", para provocar o Denunciante AA.
104) O Denunciante AA sentiu-se intimidade e teve receio pela sua vida e integridade física em função destas ameaças.
105) Chegando na ..., as ameaças e agressões intensificaram-se.
106) O Denunciado AA foi colocado sentado na Esquadra.
107) O Agente MM começou a passar pelo Denunciado AA dizendo "tu estás aqui e a tua namorada está em casa a foder com o outro", "és um merdas", "gajos como tu merecem é um tiro nos cornos", "vamos partir-te todo, seu cabrão, seu filho da puta", bem como a dar pontapés nas pernas e chapadas na cara. Em certo momento, começou a ficar mais agressivo ainda e tirou a placa de identificação com o nome.
108) A Agente LL começou a passar pelo Denunciado AA dizendo "bates em mulheres", "paneleiro", "não vales nada" e "devias morrer".
109) A Agente LL passou próximo do Denunciante AA e desferiu dois socos na cara do mesmo, na parte lateral do rosto.
110) O Agente OO levantou da secretária foi a correr até ao Denunciante AA e deu-lhe um pontapé na cara, tendo o nariz começado a sangrar imenso, sangue que se espalhou no chão da Esquadra.
111) Em virtude deste pontapé o Denunciante AA bateu com a cabeça na parede da Esquadra, tendo formado imediatamente um galo.
112) Este pontapé agravou a lesão já feita pelo Denunciado BB e partiu-lhe também o nariz, que sangrou muito, sujou todo o chão da Esquadra e que passou a doer agudamente neste momento.
113) O Denunciante AA foi agredido também por outros agentes que estavam na Esquadra, mas que não conseguiu identificar, por estar aterrorizado e em pânico.
114) As agressões feitas pelos polícias acima identificados criaram novas lesões, nas pernas e nas mãos, e agravaram as já existentes, na face e na cabeça.
115) Os polícias bateram no Denunciante AA, que protegia-se com as mãos e ficou com marcas de defesa, tinha hematomas e arranhões por todo o corpo.
116) No dia ...-...-2022 compareceu no ... a denunciada CC acompanhada dos agentes 12ª esquadra com a matrícula ... (LL) e ... (MM) e disse o seguinte: "que no presente dia .../.../22 por volta das 20H15 estava sozinha na sua residência tendo o suspeito aparecido e começado a insistir para entrar no interior da mesma. Tendo o mesmo de algum modo conseguido entrar no interior do prédio, tem tentado à posterior arrombar a porta, da residência da vítima com vários pontapés.".
117) Ora, mas como é possível afirmar que estava a insistir para entrar se depois falou que nem atendeu a chamada da campainha e que nem sabia quem era?
118) Disse que "ao ficar assustada com a situação contactou esta polícia a fim de, pedir auxílio" e "viu o mesmo os seguintes insultos e ameaças: puta vou te matar cabra do caralho, não vais sair daqui viva".
119) Ora, mas depois quando confrontada com o vídeo, que demonstra que eram afirmações feitas no masculino, a depoente não responde, desconversa.
120) A denunciada CC prestou declarações para memória futura no dia ...-...-2023, perante a Meritíssima Sra. Juiz de Instrução de ....
121) Foi efectuado o juramento e a advertência de que a depoente deveria dizer a verdade, toda a verdade e só a verdade, sob pena de incorrer no crime de falsidade de testemunho, punido por lei.
122) Nesta diligência, entre outras coisas, a denunciada sob juramento fez aas seguintes afirmações:
a. Indagada sobre se estava sozinha no apartamento a depoente disse que "sim" e que "eu estava em casa sozinha" (págs. 25 e 26 da transcrição das declarações);
b. "Ouvi o elevador a subir até ao meu piso, ouvi alguém a sair do elevador, e ouvi alguém a bater à minha porta, e a tocar à campainha da minha porta. A partir daí comecei a ficar assustada. Ouvia a tocar, a tocar com muita insistência. mesmo a tocar constantemente, eu pensei "meu Deus, aposto que ele", ele a gritar "abre a porta, abre a porta, caralho, sua cabra, abre a porta" (pág. 26 da transcrição das declarações);
c. "Por isso fui lá ver aquilo da porta, onde se vê, sim. Fui lá ver, vi que era ele. Tinha a porta trancada. Assim que vi que era ele, fui a correr para o meu quarto, tranquei a porta do meu quarto, comecei a tremer. Ele começou a gritar para eu abrir a porta. Eu estava em pânico, liguei ao BB, que é um grande amigo meu, e que vive a 5 minutos de mim." (pág. 26 da transcrição das declarações);
d. "o BB é meu amigo, ele tem mais força que eu". por isso se for preciso, para ele me dar apoio, para eu não estar sozinha liguei ao BB. O BB diz "OK CC vou já para aí", porque eu disse está aqui o meu ex-namorado." (pág. 26 da transcrição das declarações);
e. "para lhe abrir a porta, a ameaçar-me e chamar-me de puta, chamar-me cabra, a dizer que me ia matar, a dizer abre a porta, e a bater";
f. Indagada pela Meritíssima Sra. Juiz "há um vídeo, não sei se sabe, ele a bater à sua porta. Nesse vídeo é possível ouvi-lo a dirigir-se como se estivesse um homem dentro de casa. Percebeu que tipo de expressões ele dizia também?"'a depoente respondeu já outra coisa "Eu estava em pânico. Eu só sei que..." e desconversa, não responde;
g. "O que eu sei é que o BB chegou ao meu prédio na mesma altura que a polícia. Porque eu sei que chegou uma agente da polícia mulher.". Como seria possível o Denunciado BB dar socos ao Denunciante AA já com a polícia no local?
h. "esse tempo todo estive na minha casa sozinha";
123) A denunciada CC confidenciou à sua amiga FF que BB agrediu o Denunciante AA com socos, naquela data, bem como "a amiga disse-lhe que ele apresentava sangue".
124) FF refere. Refere também o seguinte: "mais tarde, quando as duas se encontraram pessoalmente, a CC sorria e negava agressões de que tinha contado pelo telefone nessa altura, confrontou-a com os factos que lhe relatou e aquela, de forma estranha e pouco convincente, lhe disse que lhe tinha mentido e que estava tudo bem e que aquele nunca a tinha agredido ", "instada disse que CC lhe referiu que o amigo dela lhe tinha, pelo menos, desferido um murro”.
125) Disse ainda que "mas a ideia que tem é que o AA foi agredido pelo BB no hiato entre aquele ter ido à porta da CC e de estar na rua até à chegada da polícia ao local".
126) E FF reportou esta agressão com socos do Denunciado BB ao Denunciante AA, em depoimento que prestou perante a Digníssima Sra. Procuradora-Adjunta, nos Serviços do Ministério Público.
127) Avizinha do apartamento, GG, que chamou a polícia e gravou as imagens do monóculo da porta, afirmou que o Denunciante AA "visivelmente alterado, com sangue na face, a pontapear e a desferir murros na porta daquela fracção".
128) O Polícia NN, matrícula 158609, atestou no seu depoimento que quando chegou ao local a ofendida CC tinha um homem consigo dentro do apartamento.
129) Inclusive, este Agente referiu que não se recorda se foi a denunciada CC ou os seus colegas a referir que este homem era o actual companheiro da denunciada.
130) No dia ...-...-2022, após ser libertado, o Denunciante AA dirigiu-se às Urgências do …(2° atendimento médico de urgência, relacionado com os factos), onde foram diagnosticadas um traumatismo craniano, com hemorragia intracraniana e com o nariz partido, além de outras lesões, onde ficou internado para observação no Serviço de Urgência, por 24 horas.
131) Assim, todos os Denunciados tiveram a intenção de cometer os crimes mencionado nesta Instrução, tendo agido de forma activa e dolosa para a concretização dos respectivos intuitos.
132) Os Denunciados agiram de forma livre, voluntária, consciente e deliberada, sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
133) As afirmações proferidas são altamente atentatórias da honra, dignidade, do Denunciante AA, que sentiu-se ofendido.
134) As outras afirmações são susceptíveis de incutir medo e receio fundado, dada as circunstâncias, local e qualidade dos agentes, como efectivamente causou muito medo, pois o Denunciante AA temeu efectivamente pela sua vida e integridade física.
135) Foram efectivamente concretizadas partes das ameaças realizadas.
136) As lesões deixaram sequelas graves de desalinhamento do nariz, que causa dor e sofrimento ao Denunciante AA.
137) Estas sequelas poderão se agravar provocando perturbação da respiração, apneia obstrutiva do sonho, alteração da voz e da fonação (comunicação verbal), limitação de actividade desportiva e física por incapacidade de ventilação em alto débito.
138) Estão presentes todos os elementos constitutivos dos tipos penais, nos factos narrados.
II. DA SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO
139) Como é possível se verificar com alguma clareza deste Requerimento de Abertura de Instrução, como sempre foi dito os factos não ocorreram como inicialmente foram delineados nos autos.
140) Concretamente, AA não apareceu simplesmente à porta de CC e forçou a entrada.
141) Ao contrário, o episódio ocorrido à porta do apartamento da CC foi decorrente e no seguimento do Denunciante AA ter sofrido uma brutal agressão por parte do amigo de CC, BB, da qual resultou um traumatismo craniano, com hemorragia intracraniana.
142) Como resulta do depoimento da vizinha, GG, o Denunciante AA estava agredido e com sangue na face, enquanto pontapeava a porta de CC, a pedir que o homem que estava lá saísse do apartamento.
143) De igual modo, a presença do INEM no local, que assistiu o Denunciante AA (até então suposto agressor, o único com lesões neste episódio), demonstra que o mesmo foi agredido com violência suficiente para ter uma intervenção médica no local.
144) Ora, o também arguido AA foi injusta e violentamente assistido, estava zangado, magoado e sentindo-se injustiçado, quando a polícia chegou ao local.
145) Os agentes policiais que chegaram no local viram que AA estava magoado e sangrando, mas mesmo assim fizeram uma detenção com utilização de força excessiva, ao invés de procurarem serenar os ânimos e compreender o que estava a se passar.
146) E também o ofenderam e agrediram de forma grave, nos termos acima mencionados, local para onde se remete e cujo conteúdo aqui se dá por inteiramente reproduzido, para todos os efeitos legais.
147) Que, como já foi dito, não foi nada daquilo que foi alegado por CC, na declaração inicial deste processo.
148) Ora, como devido respeito os factos têm outros contornos, muito diferentes dos que foram inicialmente reportados, que conduziram a uma gravidade e risco que não existiam, nem existem, em absoluto.
149) A presente Instrução poderia ter sido pedida inclusive somente ao que a suspensão do processo diz respeito, conforme ensina a melhor jurisprudência:
Ac. TRC de 28-03-2012: O requerimento para abertura de instrução em que o único pedido seja a suspensão provisória do processo não pode ser rejeitado, visto que não viola a regra sobre a finalidade da instrução, porque a comprovação judicial a que se reporta o n.° 1 do art° 286° CPP, não se restringe ao domínio do facto naturalístico, antes compreende também a dimensão normativa do mesmo e por conseguinte, a sua susceptibilidade de levar (ou não) a causa a julgamento.
150) AA declara desde já que não se opõe à suspensão dos processos em relação aos crimes nos quais é a vítima, nos termos do disposto no art.° 281.°, n.° 1, al. a) do CPP, caso também seja realizada a suspensão do seu processo, em relação aos crimes que lhe são imputados (4 crimes de injúria agravada), desde que não haja também outro pedido de abertura de instrução.
151) Da mesma forma, poderá desistir das queixas, caso o mesmo ocorra em relação a si. copia respectiva extinção de todos os processos e desde que não haja também outro pedido de abertura de instrução.
152) Estão reunidas as condições estabelecidas no art.° 281.° do CPP, pelo que requer a suspensão provisória do processo, em relação aos quatro crimes de injúria agravada que lhe são imputados.
Caso assim não o seja, não se prescinde da Instrução.
III. DAS PROVAS DA INSTRUÇÃO
Actos de instrução e meios de prova da audiência
1) AA pretende provar nesta diligência:
a. Que o Denunciado BB agrediu-o com socos violentos na cara, no dia ...-...-2022, causando-lhe um traumatismo craniano, com hemorragia intracraniana, tendo se refugiado no apartamento da denunciada CC depois disto;
b. Que a denunciada CC mentiu nas declarações iniciais que prestou na Polícia e nas declarações para memória futura, após prestar o juramento, com a intenção de prejudicar o Denunciante AA, a quem imputou o crime de violência doméstica, tendo cometido o crime de falsidade de testemunho com as falsas declarações prestadas nestes autos;
c. Que o Denunciado Agente KK agrediu de forma violenta o Denunciante AA, no momento da detenção e na ..., além deter o ameaçado e ofendido no transporte entre o local da ocorrência e a Esquadra, como também na própria Esquadra em causa;
d. Que o Denunciado Agente MM agrediu de forma violenta o Denunciante AA, no momento da detenção e do transporte na ..., além de ter o ameaçado e ofendido no transporte entre o local da ocorrência e a Esquadra, como também na própria Esquadra em causa;
e. Que o Denunciado Agente OO agrediu de forma violenta o Denunciante AA, na ..., tendo agravado o traumatismo craniano, com hemorragia intracraniana já existentes, além de ter quebrado o nariz do referido Denunciante, na ...;
f. Que a denunciada Agente LL agrediu de forma violenta o Denunciante AA, no momento da detenção e do transporte na ..., além de ter o ameaçado e ofendido no transporte entre o local da ocorrência e a Esquadra, como também na própria Esquadra em causa;
2) Para o efeito, entende que é necessário produzir as seguintes provas, para reunir indícios susceptíveis de levar todos os arguidos a julgamento pelos crimes que cometeram:
a. Que seja determinada a extracção de cópia integral do Inq. n.° 4281/23.3T9LSB, nomeadamente das diligências que foram realizadas, para que possam instruir os presentes autos. Pretende-se com esta diligência aproveitar-se provas que já tenham sido produzidas nesse Inquérito, para a boa administração da justiça;
b. Que seja determinada a extracção de cópia integral do Inq. 423/24.0..., nomeadamente das diligências que foram realizadas, para que possam instruir os presentes autos. Pretende-se com esta diligência aproveitar-se provas que já tenham sido produzidas nesse Inquérito, para a boa administração da justiça;
c. Que sejam requisitados o TAC, todos os exames e relatórios médicos e clínicos realizados no episódio de urgência do denunciante AA, nos dias ... e ...-...-2022. Pretende-se com esta diligência provar todas as lesões sofridas pelo Denunciante AA, quer na face e cabeça (primeiras agressões do Denunciado BB), como no nariz e na cabeça (agressões na ... pelo Denunciado OO), como noutras partes do corpo, designadamente nas pernas e nas mãos (Denunciados KK e LL), como também provar a gravidade e extensão destas lesões, como ainda as sequelas das mesmas.
d. Que sejam requisitados o(s) nome(s) do(s) médico(s) neurocirurgião(ões) que emitiram os três pareceres clínicos, das lesões referidas na TAC, no episódio de urgência do denunciante AA, nos dias... e ...-...¬2022. Pretende-se com esta diligência provar todas as lesões sofridas pelo Denunciante AA, quer na face e cabeça (primeiras agressões do Denunciado BB), como no nariz e na cabeça (agressões na ... pelo Denunciado OO), como noutras partes do corpo, designadamente nas pernas e nas mãos (Denunciados KK e LL), como também provara gravidade e extensão destas lesões, como ainda as sequelas das mesmas.
e. Que sejam ouvidos como testemunhas:
i. O(s) neurocirurgião(ões) que for(em) identificado(s) na diligência acima mencionada, que efectuou as três avaliações de periculosidade das lesões sofridas;
ii. O médico neurorradiologista Dr. QQ, que efectou os exames de diagnóstico no episódio em causa, com domicílio profissional no ..., sito na ...;
iii. A médica de cirurgia geral Dra. RR, que efectou o tratamento inicial e requisitou os exames de diagnóstico no episódio em causa, com domicílio profissional no ..., sito na ...;
iv. A médica de cirurgia geral Dra. SS, que efectou o tratamento inicial e requisitou os exames de diagnóstico no episódio em causa, com domicílio profissional no ..., sito na ...;
v. A médica de cirurgia plástica Dra. TT, que efectou o acompanhamento em relação à fractura do nariz, que atestou que o nariz ficou com um desalinhamento, mas que não precisava de cirurgia nas urgências, no episódio em causa, com domicílio profissional no ..., sito na ...;
vi. Pretende-se com estas diligências provar todas as lesões sofridas pelo Denunciante AA, quer na face e cabeça (primeiras agressões do Denunciado BB), como no nariz e na cabeça (agressões na ... pelo Denunciado OO), como noutras partes do corpo, designadamente nas pernas e nas mãos (Denunciados KK e LL), como também provar a gravidade e extensão destas lesões, como ainda as sequelas das mesmas;
f. Que seja realizada a avaliação pericial dos danos decorrentes das lesões, no Instituto de Medicina Legal, nomeadamente das sequelas, do desalinhamento do nariz, assim como de perturbação da respiração, apneia obstrutiva do sonho, alteração da voz e da fonação (comunicação verbal), limitação de actividade desportiva ou física por incapacidade de ventilação em alto débito, decorrentes das lesões sofridas no nariz, no episódio em causa. Pretende-se com estas diligências provar todas as lesões sofridas pelo Denunciante AA no nariz e as sequelas disto decorrentes;
g. Que seja requisitada ao ... informações sobre os funcionários de serviço na ..., entre às 20h do dia ...-...-2022 e às 10h do dia ...-...-2022, assim como de todos os outros agentes que deslocaram-se ao local da ocorrência, no dia ...-...-2022; pretende-se com esta diligência confirmar que os Denunciados da PSP estiveram no local e tiveram intervenção concreta na detenção, no transporte e na custódia na ..., locais onde foram praticados os crimes de que vêm acusados;
h. Determinação do reconhecimento de BB, de CC e de todos os polícias que estiveram no local (Agentes KK, NN, LL, MM, UU e OO) pelo ora Denunciante AA; esta diligência destina-se a comprovar que o Assistente reconhece todos os acusados;
i. Constituição como arguido e interrogatório judicial de CC; pretende-se com esta diligência confirmar que a arguida cometeu os crimes que vêm mencionados nesta Abertura da Instrução, nomeadamente através de confissão;
j. Constituição como arguido e interrogatório judicial de BB; pretende-se com esta diligência confirmar que o arguido cometeu os crimes que vêm mencionados nesta Abertura da Instrução, nomeadamente através de confissão;
k. Constituição como arguido e interrogatório judicial do Polícia OO; pretende-se com esta diligência confirmar que o arguido cometeu os crimes que vêm mencionados nesta Abertura da Instrução, nomeadamente através de confissão das agressões; pretende-se com esta diligência confirmar quais eram as lesões que já existiam no local (realizadas pelo Denunciado BB), confirmadas pelos técnicos do MIEM, para confrontar com as lesões posteriores, sofridas pelo Denunciante, decorrentes das agressões dos polícias que vêm acusados, registadas nos relatórios médicos do Hospital, para onde se deslocou imediatamente após o 1° interrogatório judicial
l. Constituição como arguido e interrogatório judicial da Polícia LL, matrícula 159456; pretende-se com esta diligência confirmar que a arguida cometeu os crimes que vêm mencionados nesta Abertura da Instrução, nomeadamente através de confissão das agressões; pretende-se com esta diligência confirmar quais eram as lesões que já existiam no local (realizadas pelo Denunciado BB), confirmadas pelos técnicos do INEM, para confrontar com as lesões posteriores, sofridas pelo Denunciante, decorrentes das agressões dos polícias que vêm acusados, registadas nos relatórios médicos do Hospital, para onde se deslocou imediatamente após o 1° interrogatório judicial
m. Constituição como arguido e interrogatório judicial do Polícia MM, matrícula 159756; pretende-se com esta diligência confirmar que o arguido cometeu os crimes que vêm mencionados nesta Abertura da Instrução, nomeadamente através de confissão das agressões; pretende-se com esta diligência confirmar quais eram as lesões que já existiam no local (realizadas pelo Denunciado BB), confirmadas pelos técnicos do INEM, para confrontar com as lesões posteriores, sofridas pelo Denunciante, decorrentes das agressões dos polícias que vêm acusados, registadas nos relatórios médicos do Hospital, para onde se deslocou imediatamente após o l° interrogatório judicial;
n. Constituição como arguido e interrogatório judicial do Polícia KK, matrícula 159582; pretende-se com esta diligência confirmar que o arguido cometeu os crimes que vêm mencionados nesta Abertura da Instrução, nomeadamente através de confissão das agressões; pretende-se com esta diligência confirmar quais eram as lesões que já existiam no local (realizadas pelo Denunciado BB), confirmadas pelos técnicos do INEM, para confrontar com as lesões posteriores, sofridas pelo Denunciante, decorrentes das agressões dos polícias que vêm acusados, registadas nos relatórios médicos do Hospital, para onde se deslocou imediatamente após o 1° interrogatório judicial;
o. Inquirição como testemunhas dos Agentes PSP que estiveram no local da ocorrência e/ou na Esquadra, designadamente os acima mencionados (ponto d)):
i. Na porta do prédio onde o Denunciante ficou a aguardar o atendimento do INEM: agente mais novo de olhos claros;
ii. Na Esquadra: agente VV, cabelo castanho-escuro, com rabo-de-cavalo, alta e açoriana ou madeirense; o chefe e o subchefe de serviço, um afro-português (claro, tipo cabo-verdiano) e ou outro caucasiano com estatura normal, robusto;
Esta diligência destina-se a confirmar a presença dos agentes agressores nos locais (da ocorrência e na esquadra), bem como o estado físico e lesões do Denunciante AA após a detenção e após deixar a esquadra de polícia;
p. Requisição de documentos e informações, à Direcção da PSP e ao IGAI cópia de todos os processos de averiguação e disciplinares (nomeadamente a queixa, os depoimentos e o relatório final), que envolvam os polícias ora acusados, nomeadamente nos crimes de ofensas à integridade física, injúria e difamação cometidos contra cidadãos não militarizados; esta diligência destina-se a comprovar o histórico violento dos agentes da PSP acusados na Instrução, inclusive os casos arquivados, por falta de prova ou outro motivo;
q. Requisição de cópia integral do procedimento disciplinar instaurado no IGAI, referente aos factos narrados nestes autos: esta diligência destina-se a provar as eventuais diferenças existentes nestes processos;
r. Requisição de cópia integral do procedimento disciplinar instaurado na ... referente aos factos narrados nestes autos: esta diligência destina-se a provar as eventuais diferenças existentes nestes processos;
s. Requisição da entrega no Tribunal de Instrução Criminal do original de todas as gravações efectuadas pela vizinha GG e a reprodução das mesmas, nomeadamente para verificar a existência partes dos factos que não constam da gravação disponibilizada, bem como a existência de áudio no vídeo, uma vez que como é de conhecimento público o telemóvel grava imagem e som, mas a gravação disponibilizada é parcial e não tem som, como de outras gravações que não tenham sido juntas ao processo; esta diligência destina-se a demonstrar as lesões do Denunciante, que já existiam quando ele estava exaltado à porta de CC, assim como demonstrar a detenção com excesso de força policial que motivou qualquer palavra que tenha sido dita, como também que não foram proferidas as palavras alegadas pelos agentes da PSP;
t. Requisição de todas as gravações das chamadas efectuadas para o 112, com o pedido de intervenção da PSP no episódio de ...-...-2022, na ...; pretende-se com esta diligência identificar quem chamou a PSP no local e o que alegou nesta chamada;
u. Reprodução em audiência das gravações acima mencionadas; pretende-se com esta diligência identificar quem chamou a PSP no local e esclarecer o conteúdo dos factos reportados nesta chamada;
v Requisição de informações sobre todos os integrantes da equipa do INEM - os bombeiros voluntários do ... e ..., na viatura 2107 ABSC 04 com 2 elementos chefiados pelo chefe WW número 11890144, que esteve no local em assistência no episódio do dia ...-...¬2022 (nome, profissão e morada profissional); pretende-se com esta diligência confirmar quais eram as lesões que já existiam no local, confirmadas pelos técnicos do INEM, para confrontar com as lesões posteriores, sofridas pelo Denunciante, decorrentes das agressões dos polícias que vêm acusados;
w. Depoimento do Chefe de Equipa do INEM, acima referido, que esteve no local em assistência no episódio do dia ...-...-2022; pretende-se com esta diligência confirmar quais eram as lesões que já existiam no local, confirmadas pelos técnicos do INEM, para confrontar com as lesões posteriores, sofridas pelo Denunciante, decorrentes das agressões dos polícias que vêm acusados, registadas nos relatórios médicos do Hospital, para onde se deslocou imediatamente após o 1° interrogatório judicial;
x. Depoimento do primeiro membro da Equipa do INEM, que esteve no local em assistência no episódio do dia ...-...-2022; pretende-se com esta diligência confirmar quais eram as lesões que já existiam no local, confirmadas pelos técnicos do INEM, para confrontar com as lesões posteriores, sofridas pelo Denunciante, decorrentes das agressões dos polícias que vêm acusados, registadas nos relatórios médicos do Hospital, para onde se deslocou imediatamente após o 1° interrogatório judicial;
y. Depoimento do segundo membro da Equipa do INEM, que esteve no local em assistência no episódio do dia ...-...-2022; pretende-se com esta diligência confirmar quais eram as lesões que já existiam no local, confirmadas pelos técnicos do INEM, para confrontar com as lesões posteriores, sofridas pelo Denunciante, decorrentes das agressões dos polícias que vêm acusados, registadas nos relatórios médicos do Hospital, para onde se deslocou imediatamente após o 1° interrogatório judicial;
z. Requisição de documentos e relatórios do episódio do dia ...-...-2022, nomeadamente o relatório do expediente e os relatórios médicos e clínicos da pessoa assistida no local; pretende-se com esta diligência confirmar quais eram as lesões que já existiam no local, confirmadas pelos técnicos do INEM, para confrontar com as lesões posteriores, sofridas pelo Denunciante, decorrentes das agressões dos polícias que vêm acusados, registadas nos relatórios médicos do Hospital, para onde se deslocou imediatamente após o 1° interrogatório judicial;
aa. Depoimento da testemunha FF; pretende-se com esta diligência confirmar as declarações que já prestou, que referem que a denunciada CC confidenciou-lhe a agressão do Denunciado BB ao Denunciante AA;
bb. Acareação de quaisquer depoimentos ou declarações que estejam em contradição; esta diligência destina-se a retirar dúvidas que eventualmente surjam durante a Instrução, para que fiquem reunidos indícios de materialidade e autoria suficientes para uma condenação criminal (e o respectivo Despacho de Pronúncia);
cc. Seja determinado o levantamento do sigilo das telecomunicações do Denunciado BB e que sejam requisitadas, para todas as operadoras de telemóvel, o(s) número(s) de telemóvel do Denunciado em causa, para instruir a diligência abaixo descrita; esta diligência tem como objectivo instruir a diligência descrita no ponto seguinte;
dd. Seja determinado o levantamento do sigilo das telecomunicações dos Denunciados BB e CC, para a identificação de todas as chamadas realizadas no dia ...¬...-2022, quer dos telemóveis pessoais de ambos (a identificar e ...), assim como o fornecimento dos metadados do telemóvel de BB que demonstrem a sua localização física entre às 20h e às 23.30h do dia ...-...-2022; esta diligência destina-se a provar quando alegadamente CC ligou para o BB, assim como quando, bem como onde estava fisicamente o Denunciado BB, durante o período do episódio em causa, nomeadamente se estava ou não no apartamento da Denunciada;
Nestes termos e nos demais de direito, requer a V. Exa. se digne a determinar a Abertura de Instrução, a suspensão provisória do processo, em relação aos quatro crimes de injúria agravada que lhe são imputados, a produção das provas acima mencionadas e que se digne a pronunciar pelos factos acima descritos, nos termos supra expostos, nomeadamente:
- o Denunciado BB por ofensas à integridade física grave qualificada, p. e p. nos termos do disposto nos arts. 143.°, n.° 1, cc 144.°, al. d) e 145.°, n.° 1 (especial censurabilidade por ser estudante de medicina), todos do CP;
- a denunciada CC por falsidade de testemunho neste processo, p. e p. nos termos do disposto no art.° 360.°, do CP;
- o Denunciado Agente MM por ofensas à integridade física, ameaça e injúria, todos qualificados pela qualidade de agente da PSP, nos termos do disposto no arts. 143.°, n.° 1, cc e 145.°, n.° 1, art..º 153.º, n.° 1, 155.º, n.° 1, als. a) e d) e arts. 181.°, n.° 1 e 2, c/c 184.°, in fine, todos do CP;
- o Denunciado Agente KK por ofensas à integridade física, ameaça e injúria, todos qualificados pela qualidade de agente da PSP, nos termos do disposto no arts. 143.°, n.° 1, cc e 145.°, n.° 1, art.º 153.°, n.°1, 155.°, n.° 1, als. a) e d) e arts. 181.º, n.°s 1 e 2, c/c 184.°, in fine, todos do CP;
- o Denunciado Agente OO por ofensas à integridade física grave (agravamento do traumatismo craniano e nariz quebrado), qualificada pela qualidade de agente da PSP, nos termos do disposto no a rt.°s 143.0, n.° 1, cc 144.°, al. d) e 145.°, n.° 1, do CP;
- a denunciada por LL por ofensas à integridade física, ameaça e injúria, todos qualificados pela qualidade de Agente da PSP, nos termos do disposto no arts. 143.º, n.° 1, cc e 145.º, n.° 1, arts. 153.º, n.° 1, 155.º, n.° 1, als. a) e d) e arts. 181.°, n.ºs 1 e 2, c/c 184.°, in fine, todos do CP;
Junta: relatório médico do ..., do dia ...e ...-...-2022
Refere que o comprovativo de concessão de protecção jurídica, na modalidade de pagamento de custas e demais encargos com o processo, já foi junto aos autos.
II.3.E. Da decisão recorrida (cfr. ref.ª 9226906 de 04-03-2025 dos autos principais):
Por fim, é do seguinte teor a decisão recorrida:
Fls. 625 a 637:
I. Veio AA requerer: i) a respectiva constituição como assistente; ii) a abertura de instrução nessa qualidade; iii) a abertura de instrução na qualidade de arguido.
II. O Ministério Público procedeu ao encerramento do inquérito, arquivando-o parcialmente e deduzindo acusação contra o arguido AA (fls. 615 a 620v). No que respeita a tal arquivamento parcial, entendeu o Ministério Público que os factos recolhidos e praticados pelo arguido são censuráveis e penalmente relevantes, em termos de qualificação como um crime de injúria, p. e p. no artigo 181.º, n.º1, do Código Penal, mas não são subsumíveis ao tipo de violência doméstica, pelo que, nesta sequência, procedeu ao arquivamento do inquérito, ao abrigo do disposto no artigo 277.°, n.º 2, do CPP, quanto ao crime de violência doméstica praticado reciprocamente por AA e CC. Por seu turno, quanto ao referido crime de injúria, o Ministério Público arquivou o inquérito ao abrigo do disposto no art. 277.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, invocando inadmissibilidade legal de o prosseguir por falta de queixa validamente apresentada. Por fim, na acusação pública foi imputada ao arguido a prática, em autoria material e na forma consumada, em concurso efectivo, de 4 (quatro) crimes de injúria, agravado, previsto e punível pelo disposto nos artigos 181.º, n.º 1, e 184.º, por referência ao disposto no artigo 132.º, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal.
III. O requerente da abertura de instrução pretende a suspensão provisória do processo, na parte em que contra o mesmo foi deduzida acusação pública.
IV. Por seu turno, o mesmo requerente da abertura de instrução pretende ainda que seja proferido despacho de pronúncia de:
- Denunciado BB por ofensas a integridade física grave qualificada, p. e p. nos termos do disposto nos art.os 143.º, n.° 1, cc 144.º, al. d) e 145.º, n.º 1 (especial censurabilidade por ser estudante de medicina), todos do CP;
- denunciada CC por falsidade de testemunho neste processo, p. e p. nos termos do disposto no art.º 360.°, do CP;
- Denunciado Agente MM por ofensas a integridade física, ameaça e injúria, todos qualificados pela qualidade de agente da PSP, nos termos do disposto no art.os 143.º, n.° 1, cc e 145.º, n.° 1, art.os 153.º,n.º 1, 155.º, n.° 1, als. a) e d) e art.os 181.º, n.os 1 e 2, c/c 184.°, in fine, todos do CP;
- Denunciado Agente KK por ofensas à integridade física, ameaça e injúria, todos qualificados pela qualidade de agente da PSP, nos termos do disposto no art.os 143.º,n.° 1, cc e 145.º, n.º 1, art.os 153.º, n.° 1, 155.º, n.º 1, als. a) e d) e art.os 181.º, n.os 1 e 2, c/c 184.º, in fine, todos do CP;
- Denunciado Agente OO por ofensas à integridade física grave (agravamento do traumatismo craniano e nariz quebrado), qualificada pela qualidade de agente da PSP, nos termos do disposto no art.os 143.º, n.º 1, cc 144.º, al. d) e 145.º, n.º 1, do CP;
- denunciada por LL por ofensas à integridade física, ameaça e injúria, todos qualificados pela qualidade de Agente da PSP, nos termos do disposto no art.os 143.º, n.° 1, cc e 145.º, n.º 1, art.os 153.º, n.º 1, 155.º, n.° 1, als. a) e d) e art.os 181.º, n.os 1 e 2, c/c 184.º, in fine, todos do CP.
V. Contudo, o requerimento de abertura de instrução terá necessariamente de ser rejeitado, por inadmissibilidade legal daquela fase processual.
VI. O arguido AA pretende a suspensão provisória do processo, na parte em que contra o mesmo foi deduzida acusação pública, tendo-lhe sido imputada a prática, em autoria material e na forma consumada, em concurso efectivo, de 4 (quatro) crimes de injúria, agravado, previsto e punível pelo disposto nos artigos 181.º, n.º 1, e 184.º, por referência ao disposto no artigo 132.º, n.º 2, alínea l), todos do Código Penal.
VII. Da conjugação do disposto nos arts. 277.º, n.os 1 e 2, e 281.º, n.º 1, proémio, ambos do Código de Processo Penal, resulta que constitui desde logo requisito para a suspensão provisória do processo a existência de indícios suficientes da prática de crime punível com pena de prisão não superior a cinco anos ou com sanção diferente da prisão, mesmo em caso de concurso de crimes (a este propósito, cf. Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora: ..., 2007, p. 719). Na medida em que o arguido não colocou em causa que na fase de inquérito tenham sido recolhidos indícios suficientes de que praticou a factualidade que lhe foi imputada na acusação pública, resta apreciar o requerimento de abertura de instrução sob o ponto de vista da única pretensão no mesmo formulada na parte em que reage contra tal acusação, ou seja, da aplicação do instituto da suspensão provisória do processo. Em situações como esta, e tal como se refere no acórdão do Tribunal da Relação de ... de 09.03.2021, apesar de não ser de excluir a abertura da instrução apenas para obter a suspensão provisória do processo, realizar-se esta fase, em que obrigatoriamente tem lugar um debate instrutório, quando aquilo que o recorrente pretende é legalmente inadmissível, não deixa de se traduzir num acto inútil, que a lei processual proíbe nos termos do art.º 130.º do CPC aplicável ex vi art.º 4º do C.P.P, sendo inadmissível o requerimento de abertura da instrução (ECLI:PT:TRL:2021:474.19.6PFLRS.A.L1.5.D5). No mesmo sentido, entendeu-se no acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 13.07.2021 que, caso resulte dos autos, não estarem verificados os pressupostos da suspensão provisória do processo, previstos no artigo 281.º, n.º 1, do CPP e o requerimento da abertura da instrução apresentado pelo arguido, com vista à aplicação daquele instituto sem suscitar a discussão da verificação dos respetivos pressupostos, deve ser liminarmente rejeitado, na medida em que, nesse caso, a instrução se traduziria na prática de um ato inútil, dado que estaria afastada, ab initio, a possibilidade de aplicação da suspensão provisória do processo (ECLI:PT:TRE:2021:45.17.1GBFTR.E1.B9).
VIII. De harmonia com o disposto no n.º 1 do citado art. 281.º do Código de Processo Penal, constitui requisito para a suspensão provisória do processo, para além do mais e para o que ora releva, ser de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta responda suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir [al. f)]. Nas exigências de prevenção, incluem-se tanto as vertentes da prevenção especial como as da prevenção geral, entendida aquela com o sentido de tentar que o agente não volte a cometer novos ilícitos criminais e esta com o sentido da denominada prevenção geral positiva ou de integração, ou seja, de garantia para a comunidade da validade e vigência da norma violada. Os crimes imputados ao arguido implicam fortes razões de prevenção geral, o que é revelado, por exemplo, pela circunstância de a Lei n.º 38-A/2023, de 02.08, que estabeleceu um perdão de penas e uma amnistia de infracções por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude, excluir a aplicação das medidas na mesma previstas a condenados por crimes cometidos contra membro das forças policiais e de segurança, das forças armadas e funcionários, no exercício das respetivas funções (art. 7.º, n.º 2), não sendo de prever que a suspensão provisória do processo responda suficientemente às exigências de prevenção, nomeadamente geral, que no caso se fazem sentir. Sabendo-se desde já que no caso dos autos não pode haver lugar – por falta de verificação dos pressupostos legais – à suspensão provisória do processo, a abertura da fase de instrução traduzir-se-ia na prática de um acto inútil.
IX. Pelo exposto, por inadmissibilidade legal, rejeito o requerimento de abertura de instrução, na parte em que o arguido AA pretende a suspensão provisória do processo (art. 287.º, n.º 3, do Código de Processo Penal).
X. Conforme já se deixou expresso, AA requereu a respectiva constituição como assistente e a abertura de instrução nessa qualidade. No entanto, o requerente carece de legitimidade para intervir neste processo na qualidade de assistente.
XI. O requerente AA apresentou denúncia em que imputou a BB e a Agentes da ... a prática da factualidade pela qual pretende agora ver proferido despacho de pronúncia, e que deu origem ao processo 4281/23.3T9LSB (fls. 563 a 577). Na mesma denúncia, o requerente imputou a CC a prática de factos susceptíveis de integrar a prática pela mesma do crime de violência doméstica. Nesta parte, ou seja, no que respeita à factualidade relativa a CC, houve lugar à cessação da conexão processual, tendo sido extraída certidão do referido processo 4281/23.3T9LSB, que deu origem ao processo 423/24.0..., tendo este, por seu turno, vindo a ser incorporado no presente processo 1076/22.5PALSB (fls. 559 a 564). Em suma, este processo 1076/22.5PALSB teve como objecto a definição da responsabilidade criminal do arguido AA pela prática de factos susceptíveis de integrar a prática pelo mesmo dos crimes de violência doméstica e de injúria agravada (factualidade com que foi confrontado no interrogatório judicial a que foi submetido em ........2022 e sobre a qual incidiu o despacho de encerramento do inquérito) e, por força da referida incorporação do processo 423/24.0..., também o apuramento da responsabilidade criminal de CC pela prática de factos susceptíveis de integrar a prática pela mesma do crime de violência doméstica (factualidade sobre a qual recaiu também o despacho de encerramento do inquérito).
XII. No entanto, em momento algum foi objecto de investigação no presente processo 1076/22.5PALSB a prática por CC do crime de falsidade de testemunho neste processo, p. e p. nos termos do disposto no art.º 360.°, do CP, pelo qual AA pretende agora vê-la pronunciada. Por seu turno, conforme se referiu, a factualidade pela qual AA pretende ver pronunciados BB, MM, KK, OO e LL deu origem ao processo 4281/23.3T9LSB e, portanto, manteve autonomia relativamente ao objecto do presente processo 1076/22.5PALSB. Ou seja, para além da factualidade que foi objecto do despacho de arquivamento parcial do inquérito (processo 1076/22.5PALSB e processo incorporado 423/24.0...) e do despacho de acusação pública (processo 1076/22.5PALSB), não subsiste qualquer outro ilícito criminal que tivesse sido investigado durante a fase de inquérito relativamente ao qual o requerente AA pudesse ter legitimidade para se constituir como assistente neste processo 1076/22.5PALSB. Na verdade, de harmonia com o disposto no art. 68.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, podem constituir-se assistentes no processo penal, além das pessoas e entidades a quem leis especiais conferirem esse direito: os ofendidos, considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação, desde que maiores de 16 anos [al. a)]. Conforme referem Jorge de Figueiredo Dias/Nuno Brandão a propósito dos particulares que intervêm no processo penal como assistentes, trata-se, em regra, de particulares que detêm a qualidade de ofendido quanto ao crime objeto da ação penal e são, por isso, portadores de um interesse próprio na realização da justiça nesse processo (cf. Direito processual penal. Os sujeitos processuais, Coimbra: Gestlegal, 2022, p. 169; sublinhado meu).
XIII. Assim, em face do que se deixa exposto, por falta de legitimidade, não admito AA a intervir nestes autos na qualidade de assistente.
XIV. De harmonia com o disposto no art. 287.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, a abertura da instrução pode ser requerida (…) pelo assistente, se o procedimento não depender de acusação particular, relativamente a factos pelos quais o Ministério Público não tiver deduzido acusação [al. b)]. No entanto, na parte em que no requerimento de abertura de instrução em causa é defendida a prolação de despacho de pronúncia, o requerente AA carece de legitimidade para requerer a abertura de tal fase processual, pois o mesmo não assume (nem pode assumir, conforme acima se decidiu) a qualidade de assistente nos presentes autos.
XV. Pelo exposto, rejeito a abertura de instrução requerida por AA, na parte em que este pugna pela prolação de despacho de pronúncia, por inadmissibilidade legal de aquela fase processual poder ter lugar, na medida em que não foi requerida por quem para tanto tenha legitimidade [art. 287.º, n.os 1, al. b), e 3, do Código de Processo Penal].
XVI. Notifique.
XVII. Oportunamente, remeta os autos ao Juízo Local Criminal de ..., para julgamento.
II.4. Da apreciação da questão objeto do recurso (cfr. II.2.):
O recorrente não põe em causa que apresentou denúncia através da qual imputou a BB e aos referidos agentes da Polícia de Segurança Pública a prática no dia ...-...-2024 de diversos crimes, o que deu origem ao inquérito que corre termos sob o n.º 4281/23.3T9LSB, que não foi apensado aos autos de inquérito n.º 1076/22.5PALSB.
O recorrente também não põe em causa que os autos de inquérito n.º 1076/22.5PALSB, face à entretanto ordenada apensação do inquérito que correu termos sob o n.º 423/24.0..., tendo em conta as denúncias/queixas/participações que lhes deram origem, visavam investigar o cometimento por parte do recorrente AA de 1 crime de crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152.º, n.º 1, al. b), do Código Penal (C.P.) na pessoa de CC, e de 4 crimes de injúria agravada, ps. e ps. pelos arts. 132.º, n.º 2, al. l), 181.º, n.º 1, e 184.º, do C.P., nas pessoas de KK, LL, MM e NN, e por parte de CC de 1 crime de crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152.º, n.º 1, al. b), do C.P. na pessoa de AA.
Não tendo sido ordenada a apensação daquele inquérito n.º 4281/23.3T9LSB ao inquérito n.º 1076/22.5PALSB (cfr. II.3.A.), obviamente que o objeto daquele não fazia parte deste (cfr. art.º 241.º a 247.º e 262.º do C.P.P.).
É certo que o recorrente entende que tal apensação deveria ter sido ordenada (cfr. I.2.). Contudo, se o despacho do Ministério Público pelo qual a mesma não foi ordenada é (ou não) fundado, bem como a eventual omissão da sua notificação ao recorrente são questões que não podem ser conhecidas nesta sede.
Em primeiro lugar, em inquérito, pertence ao Ministério Público a competência para ordenar a apensação ou fazer cessar a conexão (cfr. art.º 264.º, n.º 5, do C.P.P.), o que não é passível de recurso (cfr. art.º 399.º do C.P.P.; acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 30-10-2024, processo n.º 573/23.0T9MGR-A.C14).
Acresce que, mesmo que alguma omissão e, assim, algum vício tivesse sido cometido, não estando previsto como uma nulidade, só poderia tratar-se de irregularidade que, não tendo sido oportunamente arguida, sempre se teria que considerar sanada (cfr. arts. 118.º, n.ºs 1 e 2, 119.º, 120.º e 123.º, n.º 1, do C.P.P.).
Na verdade, “qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do ato a que se refere e dos termos subsequentes que possa afetar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio ato ou, se a este não tiverem assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum ato nele praticado” (cfr. art.º 123.º, n.º 1, do C.P.P.).
Ora, tendo em conta que a data em que a notificação do despacho de encerramento do inquérito ao recorrente e à sua ilustre mandatária se mostra efetuada (cfr. II.3.B. e art.º 113.º, n.º 1, als. b) e c), n.º 2, n.º 3 e n.º 10, do C.P.P.), é evidente que em 23-12-2024, quando requereu a abertura de instrução (cfr. II.3.D.), já havia decorrido o referido prazo de três dias. Deste modo, qualquer irregularidade, a existir, já estaria sanada.
É certo que “pode ordenar-se oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, no momento em que da mesma se tomar conhecimento, quando ela puder afetar o valor do ato praticado” (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do C.P.P.). Contudo, tal pressupõe que a irregularidade ainda não esteja sanada, sob risco de, a admitir-se reparação de irregularidades já sanadas, se introduzir grave entorse no sistema qual seja a de, relativamente ao menos solene dos vícios formais se admitir, afinal, um regime de reparação não só mais permissivo do que o das nulidades relativas (cfr. art.º 120.º do C.P.P.), como equiparável, até, ao das nulidades insanáveis (cfr. art.º 119.º do C.P.P.) (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27-01-2022, processo n.º 303/12.1JACBR.P1-B.P1.S15).
Por outro lado, apesar de ser possível invocar uma irregularidade em sede de recurso, tal também pressupõe que a mesma ainda não esteja sanada (cfr. CORREIA, João Conde, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo I, Almedina, 2019, pág. 1299).
Ora, uma vez que o arguido, legitimamente e de acordo com a opção por si tomada, não exerceu faculdade que detinha, não se poderá considerar que tenha existido uma violação de qualquer direito seu, nomeadamente de defesa (cfr. art.º 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa – C.R.P.).
Por outro lado, cumpre salientar que a instrução visa a comprovação judicial da decisão do Ministério Público de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento (cfr. art.º 286.º, n.º 1, do C.P.P.).
É incontestável que é legalmente permitido à pessoa com a faculdade de se constituir assistente requerer a sua constituição como tal e a abertura de instrução, relativamente a factos pelos quais o Ministério Público não tiver deduzido acusação, no prazo de 20 dias a contar da notificação do arquivamento (cfr. arts. 68.º, n.ºs 1, 3, al. b), e 287.º, n.º 1, al. b), do C.P.P.).
Deste modo, no caso, o recorrente possuía legitimidade para requerer a sua constituição como assistente e a abertura de instrução no que concerne ao crime que imputou a CC, ou seja, 1 crime de crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152º, n.º 1, al. b), do C.P., objeto do despacho de arquivamento por parte do Ministério Público e alvo de investigação no inquérito que o precedeu.
Contudo, nessa parte, o requerimento para abertura de instrução apresentado (cfr. II.3.D.) não coloca em causa o despacho de arquivamento quanto a tal crime (cfr. II.3.B.), pretendendo o recorrente, através dele, que fosse aberta a instrução relativamente a outros crimes que não fazem sequer parte do objeto do inquérito onde aquele foi proferido.
Ora, se o recorrente entende que, no âmbito do próprio inquérito n.º 1076/22.5PALSB algum crime foi cometido, nomeadamente de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art.º 360.º do C.P., por parte de algum interveniente, pode, querendo, denunciar tais crimes, para que os mesmos sejam investigados no subsequente inquérito a que tal denúncia dará origem (cfr. arts. 241.º, 244.º e 262.º do C.P.P.). Mesmo que se entendesse que havia sido prejudicado por algum depoimento desconforme com a realidade e, assim, possuísse legitimidade para se constituir como assistente (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12-12-2024, processo n.º 57/24.9YGLSB-A.S1-A.S16), teria que assim proceder nos autos onde tal crime fosse investigado. O que não pode é, sem que tenha existido inquérito onde esse crime tenha sido investigado, requerer a sua constituição como assistente e a abertura de instrução, tendo em vista a prolação de um despacho de pronúncia precisamente nos autos onde, no seu entender, aquele foi cometido.
Na verdade, tal consubstanciaria, desde logo, uma nulidade insanável (cfr. art.º 119.º, al. d), do C.P.P.). De facto, sob a direção do Ministério Público (cfr. art.º 263.º, n.º 1, do C.P.P.), o inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação (cfr. art.º 262.º, n.º 1, do C.P.P.), onde é assegurado ao respetivo arguido o direito de intervir, oferecendo provas e requerendo as diligências que se lhe afigurarem necessárias (cfr. art.º 61.º, n.º 1, al. g), do C.P.P.), possuindo assim natureza obrigatória em processo comum, compreendendo-se, pois, que a sua falta consubstancie a referida nulidade insanável.
Cumpre ainda lembrar que os assistentes têm a posição de colaboradores do Ministério Público, a quem cabe exercer a ação penal (cfr. art.º 4.º, n.º 1, al. d), do Estatuto do Ministério Público), e a cuja atividade subordinam a sua intervenção no processo, salvas as exceções da lei (cfr. art.º 69.º, n.º 1, do C.P.P.).
Ora, o recorrente visa constituir-se assistente e pretende a abertura de instrução por factos que não foram objeto do inquérito levado a cabo nos autos, sendo aí que funda a sua pretensão de se constituir como assistente. Assim, é evidente que o mesmo não visa comprovar a decisão do Ministério Público em submeter ou não alguém a julgamento, mas sim a realização de um novo inquérito contra pessoas não visadas naquele que precedeu o requerimento para abertura de instrução. Deste modo, mesmo admitindo, por facilidade de raciocínio, que, de facto, nenhum dos crimes em causa possuía natureza particular (cfr. art.º 50.º do C.P.P.), sempre a instrução seria legalmente inadmissível, (cfr. art.º 287.º, n.º 3, parte final, do C.P.P.; ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, in Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2.ª edição atualizada, Universidade Católica Editora, 2008, pág. 751; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-09-2019, processo n.º 47/17.8YGLSB7; acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 08-09-2015, processo n.º 58/11.7MAOLH-A.E18; acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 30-01-2008, processo n.º 07162989), não possuindo o recorrente legitimidade para, nessa parte, intervir nos autos como assistente (cfr. art.º 68.º do C.P.P.).
Defender o contrário é que consubstanciaria uma flagrante violação das garantias de defesa e dos princípios estruturantes do processo penal (cfr. art.º 32.º, n.º 1 e n.º 5, da C.R.P.).
É também incontroverso que relativamente aos factos pelos quais o Ministério Público tiver deduzido acusação, o arguido pode requerer a abertura de instrução (cfr. art.º 287.º, n.º 1, al. a), do C.P.P.).
O recorrente, na sequência da acusação pública deduzida contra si pelo Ministério Público, não pondo sequer em causa a suficiência dos indícios dos factos imputados, nem alegando qualquer outra razão de direito que evitasse submeter a causa a julgamento, entendeu que estavam reunidos os pressupostos para a suspensão provisória do processo (cfr. II.3.D.), o que continua a defender em recurso (cfr. I.2.).
Afigura-se que não é de excluir a abertura da instrução pelo arguido, relativamente a factos pelos quais o Ministério Público tiver deduzido acusação, apenas para obter a suspensão provisória do processo, assim evitando que aquela seja introduzida em juízo (cfr. arts. 286.º, n.º 1, e 307.º, n.º 2, do C.P.P.; ALBERGARIA, Pedro Soares de, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo III, Almedina, 2021, págs. 1203 e 1204; acórdão do Tribunal da Relação de ..., de 06-06-2023, processo n.º 32/20.2PBPDL-A.L1-510), embora se trate de entendimento que nem sequer é unânime (cfr. ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, in Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2.ª edição atualizada, Universidade Católica Editora, 2008, pág. 751).
Seja como for, um dos pressupostos de que depende a suspensão provisória do processo consiste em ser de prever que o cumprimento das injunções e regras de conduta responda suficientemente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir (cfr. art.º 281.º, n.º 1, al. f), do C.P.P.).
No presente caso, o tribunal recorrido entendeu que o mesmo não se verificava dado que não era de prever que a suspensão provisória do processo respondesse suficientemente às exigências de prevenção, nomeadamente geral, que no caso entendeu que se faziam sentir (cfr. II.3.E.). Não merece qualquer censura tal juízo uma vez que é imposto pelo sentimento de reprovação social contra ataques a elementos de uma força de segurança, cuja natureza de um imprescindível serviço público é incontestável, sob pena de se gerar uma má sensação de impunidade.
É certo que a instrução é formada pelo conjunto dos atos de instrução que o juiz entenda dever levar a cabo e, obrigatoriamente, por um debate instrutório, oral e contraditório (cfr. art.º 289.º, n.º 1, do C.P.P.). Acresce que o legislador integrou a aplicação da suspensão provisória do processo no preceito legal referente à decisão instrutória (cfr. art.º 307.º, n.º 2, do C.P.P.), proferida na sequência do encerramento do debate instrutório (cfr. art.º 307.º, n.º 1, do C.P.P.). Por outro lado, no caso de arquivamento em caso de dispensa de pena, o legislador pronunciou-se claramente pela possibilidade de dispensa do debate instrutório, dado que aquela poderá ocorrer enquanto a instrução decorrer (cfr. art.º 280.º, n.º 2, do C.P.P.).
No entanto, o debate instrutório visa permitir uma discussão perante o juiz, por forma oral e contraditória, sobre se, do decurso do inquérito e da instrução, resultam indícios de facto e elementos de direito suficientes para justificar a submissão do arguido a julgamento (cfr. 298.º do C.P.P.), o que igualmente se reflete no decurso do próprio debate (cfr. art.º 302.º do C.P.P.).
Na verdade, o juiz abre o mesmo com uma exposição sumária sobre os atos de instrução a que tiver procedido e sobre as questões de prova relevantes para a decisão instrutória e que, em sua opinião, apresentem carácter controverso (cfr. art.º 302.º, n.º 1, do C.P.P.). De seguida, concede a palavra ao Ministério Público, ao advogado do assistente e ao defensor para que estes, querendo, requeiram a produção de provas indiciárias suplementares que se proponham apresentar, durante o debate, sobre questões concretas controversas (cfr. art.º 302.º, n.º 2, do C.P.P.), seguindo-se a produção da prova sob a direta orientação do juiz, o qual decide, sem formalidades, quaisquer questões que a propósito se suscitarem, podendo dirigir-se diretamente aos presentes, formulando-lhes as perguntas que entender necessárias à realização das finalidades do debate (cfr. art.º 302.º, n.º 3, do C.P.P.). Acresce que antes de encerrar o debate, o juiz concede de novo a palavra ao Ministério Público, ao advogado do assistente e ao defensor para que estes, querendo, formulem em síntese as suas conclusões sobre a suficiência ou insuficiência dos indícios recolhidos e sobre questões de direito de que dependa o sentido da decisão instrutória (cfr. art.º 302.º, n.º 4, do C.P.P.).
Ora, no presente caso, não está em causa a indiciação dos factos imputados pelo Ministério Público na acusação que deduziu, nem o recorrente alega qualquer outra razão de direito que evitasse, nessa parte, submeter a causa a julgamento, estando apenas em causa a aplicação do instituto da suspensão provisória do processo. Deste modo, não há, nessa parte, lugar a quaisquer atos de instrução, não existem questões de prova controversas, não existe prova suplementar indiciária a considerar e, sobretudo, não há qualquer valoração a efetuar sobre a eventual insuficiência dos indícios recolhidos.
Por isso mesmo, não é de estranhar que já tenha sido perfilhado o entendimento de acordo com o qual um requerimento para abertura de instrução visando apenas a suspensão provisória do processo dispensa a realização do debate instrutório (cfr. acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 08-09-2020, processo n.º 1797/19.0PIPRT.P111).
Seja como for, um dos princípios que preside à tramitação de um processo é o da economia processual, entendida esta como a proibição da prática de atos inúteis, conforme estabelece o art.º 130.º do Código de Processo Civil (C.P.C.), aplicável ao processo penal nos termos do art.º 4.º do C.P.P., por o princípio que lhe serve de substrato com ele se harmonizar em absoluto (cfr. acórdão do Supremo tribunal de Justiça, de 13-01-2011, processo n.º 3/09.0YGLSB.S112).
Ora, no presente caso, não se verificando um pressuposto essencial para que a suspensão provisória do processo fosse determinada, consubstanciaria a prática de atos inúteis e, como tal, proibidos por lei (cfr. arts. 4.º do C.P.P. e 130.º do C.P.C.), efetivar-se a fase de instrução, com a realização de debate instrutório (cfr. art.º 289.º, n.º 1, do C.P.P.), quando aquilo que o recorrente pretende é legalmente inadmissível (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 13-07-2021, processo n.º 45/17.1GBFTR.E113; de acórdão do Tribunal da Relação de ..., de 09-03-2021, processo n.º 474/19.6PFLRS-A.L1-514).
De facto, nas apontadas circunstâncias, caso se exigisse a abertura de instrução e a realização do debate instrutório, sendo evidente que se manteria na decisão instrutória o mesmo entendimento por parte do juiz de instrução, o que ditaria que não fosse determinada a suspensão provisória do processo, sendo proferido despacho de pronúncia, o certo é que nem sequer era possível interpor recurso desta decisão (cfr. art.º 310.º, n.º 1, do C.P.P.).
Por seu turno, se em vez de deduzir acusação o Ministério Público, em inquérito, tivesse determinado a suspensão provisória do processo, mantendo-se a discordância do juiz de instrução à suspensão provisória do processo com o mesmo fundamento, sendo a sua concordância pressuposto essencial para aquela (cfr. art.º 281.º, n.º 1, do C.P.P.), não sendo sequer aquela discordância passível de recurso (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 16/2009, para fixação de jurisprudência, de 18-11-200915), o resultado seria o mesmo, dado que nunca poderia ser efetivada a suspensão provisória do processo.
Desta forma, não só o tribunal recorrido evitou a prática de atos inúteis, proibidos por lei, como permitiu que o recorrente, discordando da sua decisão, a impugnasse junto desta instância, assegurando-lhe todas as garantias de defesa, incluindo o recurso (cfr. art.º 32.º, n.º 1, da C.R.P.).
Cumpre salientar que o objeto da decisão decorrida foi, como não poderia deixar de ser e resulta evidente do seu teor (cfr. II.3.E.), o requerimento apresentado pelo recorrente para ser admitido como assistente e para abertura de instrução. Ora, da decisão recorrida não consta qualquer referência à circunstância de o recorrente, em inquérito, ter ou não prestado declarações sobre os factos com que foi confrontado aquando do seu interrogatório como arguido.
Acresce que uma vez que o recorrente, legitimamente e de acordo com a opção por si tomada, não colocou em causa a suficiência dos indícios dos factos que lhe foram imputados, nem alegou qualquer outra razão de direito que evitasse submeter a causa a julgamento por aqueles factos, apenas requerendo a suspensão provisória do processo, também não se poderá considerar que tenha existido uma violação de qualquer direito seu, nomeadamente de defesa ou da presunção da sua inocência (cfr. art.º 32.º, n.ºs 1 e 2, da C.R.P.).
Assim, mostra-se fundada a rejeição, por inadmissibilidade legal, do requerimento para abertura da instrução apresentado pelo arguido relativamente a factos pelos quais o Ministério Público deduziu acusação apenas para obter a suspensão provisória do processo.
Improcede, pois, o recurso interposto.
II.5. Das custas:
Só há lugar ao pagamento da taxa de justiça quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso (cfr. art.º 513.º, n.º 1, do C.P.P.), sendo o arguido condenado em uma só taxa de justiça, ainda que responda por vários crimes, desde que sejam julgados em um só processo (cfr. art.º 513.º, n.º 2, do C.P.P.), devendo a condenação em taxa de justiça ser sempre individual e o respetivo quantitativo ser fixado pelo juiz, a final, nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais (R.C.P.) (cfr. art.º 513.º, n.º 3, do C.P.P.).
Assim, tendo ocorrido decaimento total, nos termos do art.º 8.º, n.º 9, do R.C.P. e da Tabela III a ele anexa, o recorrente deve ser condenado entre 3 UC e 6 UC a título de taxa de justiça, tendo em vista a complexidade da causa.
Ora, tendo em conta o número e a complexidade das questões em causa, suscitadas sem o rigor técnico que seria desejável, julga-se adequado fixar a taxa de justiça em 4 UC.

III. Decisão:
Julga-se totalmente improcedente o recurso interposto pelo arguido AA, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida.
Condena-se o recorrente no pagamento das custas, fixando-se a taxa de justiça por ele devida em 4 UC.

Lisboa, 07-10-2025
Pedro José Esteves de Brito
Ester Pacheco dos Santos
João Grilo Amaral
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1. https://julgar.pt/wp-content/uploads/2015/10/021-037-Recurso-mat%C3%A9ria-de-facto.pdf
2. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/458ff4110b557ba080258ac5002d2825?OpenDocument
3. https://files.dre.pt/1s/1995/12/298a00/82118213.pdf
4. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/76c9873d529d119f80258bc70057fc93?OpenDocument
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6. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b8bb055475f3904780258bf5003b7193?OpenDocument
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9. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/29719bcc3cc159c5802573e500557a95?OpenDocument
10. https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/76a60f7bd0f6f76e802589ef002e3bde?OpenDocument
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14. https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/c0709b31aa215d29802586a10042a9d7?OpenDocument
15. https://files.diariodarepublica.pt/1s/2009/12/24800/0873708749.pdf