Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA JOSÉ SIMÕES | ||
Descritores: | MANDADO DE DESPEJO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 02/06/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | AGRAVO | ||
Decisão: | CONCEDIDO PROVIMENTO | ||
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Sumário: | I – Resulta do artº 59º nº 1 do RAU que mediante requerimento, o senhorio pode solicitar ao Tribunal, na sequência da sentença que decretou o despejo, a sua imediata execução, dada a falta de entrega do locado pelo arrendatário. II – Inexistindo qualquer disposição legal que imponha que tal requerimento a solicitar a passagem de mandado de despejo deva ser efectuado em acção autónoma, mediante um modelo aprovado por decreto-lei, acompanhado de documento comprovativo do pagamento de taxa de justiça inicial de acordo com regras emergentes da reforma da acção executiva, deve tal requerimento constituir uma sequência lógico-jurídica decorrente do incumprimento daquilo que foi decretado por sentença, transitada em julgado e, como tal constituirá um mero incidente da acção declarativa. (MJS) | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes deste Tribunal da Relação de Lisboa I – RELATÓRIO A A. Fundação… intentou acção de despejo com processo sumário contra A e T, pedindo a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre as partes, com o consequente despejo do locado, bem como a condenação solidária das RR a pagar as rendas vencidas e vincendas até restituição do imóvel. Prosseguiram os autos, tendo sido proferida sentença, na qual se julgou a acção procedente, por provada e, em consequência: a) Foi decretada a resolução do contrato de arrendamento para habitação respeitante ao r/chão esqº do prédio urbano sito na Rua Luís de Freitas Branco, em Lisboa, celebrado entre a A. e as RR e condenada a 1ª Ré a despejar imediatamente o locado e a entregá-lo à A. livre e devoluto de pessoas e bens. b) Foram condenadas as RR solidariamente a pagar à A. as rendas vencidas desde 1 de Novembro de 2003 e vincendas até à entrega efectiva do locado à A. no montante de € 481,62 as vencidas em 1 de Novembro e 1 de Dezembro de 2003 e no montante de € 499,44 as restantes. Tendo transitado em julgado esta sentença e porque, segundo alega a A., em requerimento dirigido ao Tribunal em 02/12/2005 (cfr. fls. 39) a 1ª Ré continua sem abrir mão do local objecto do pedido, solicitou ao Tribunal, ao abrigo do disposto no nº 1 do artº 59º do RAU fosse ordenada a passagem de mandado para efectivação do despejo. Sobre tal requerimento recaiu o despacho de fls. 42/43 dos autos, no qual o Mmº Juiz a quo entendeu que a execução de despejo deve correr por traslado nos Juízos de Execução, em conformidade com as regras emergentes da reforma da acção executiva, nos termos dos artºs 90º nº 3 b) e 810º ex vi do artº 466º nº 3 do CPC e 23º nº 2 do CCJ, razão pela qual indeferiu a passagem do requerido mandado de despejo. Inconformada com tal decisão, da mesma interpôs a A. Fundação… recurso de agravo, tendo no final das suas alegações, formulado a seguinte conclusão: Não tendo sido revogados os artºs 59º e 60º do DL nº 321-B/90 de 15/10 com a entrada em vigor do novo regime da acção executiva, o legislador pretendeu manter o regime especial da execução da sentença de despejo, a qual constitui mero incidente da acção declarativa a correr nos próprios autos. Não foram produzidas contra-alegações. Foram colhidos os vistos legais. II – QUESTÕES A RESOLVER Como se sabe, o âmbito objectivo do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (artºs 684º nº 3 e 690º nº 1 do CPC), importando, assim, decidir as questões nelas colocadas – e, bem assim, as que forem de conhecimento oficioso –, exceptuadas aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – artº 660º nº 2 também do CPC. Assim, em face das conclusões apresentadas, é a seguinte a questão a resolver por este Tribunal. - A execução do despejo constitui ou não mero incidente da acção declarativa em que o mesmo foi decretado. III – FUNDAMENTOS DE FACTO O despacho recorrido é do seguinte teor: “Requereu a A. Fundação… a passagem de mandado para execução do despejo, em simples requerimento atravessado na presente acção. Tem sido questão controvertida na nossa doutrina e jurisprudência saber se a execução do despejo, prevista nos art.ºs 59º a 61º do RAU, constitui um incidente da acção declarativa respectiva ou uma acção executiva propriamente dita, ou seja, se deve ser requerida nos próprios autos da acção de despejo ou, pelo contrário, deve ser instaurada por apenso à acção declarativa, como qualquer outra execução, cfr. sobre esta matéria, Prof. José Lebre de Freitas, A Acção Executiva, 4ª Edição, Coimbra Editora, págs. 404 e segs.; Conselheiro Jorge Alberto Aragão Seia Arrendamento Urbano, 6ª Edição, Almedina, págs. 335 e 336 e Dr. Joel Timóteo Ramos Pereira, Prontuário de Formulários e Trâmites, Processo Executivo, Volume IV, Quid Iuris, 2ª Edição, págs. 1131 e segs. e demais doutrina e jurisprudência citadas nestas obras. Considerando que a fase executiva da acção de despejo abrange duas vertentes, a execução do despejo propriamente dito, isto é a desocupação do imóvel, e o pagamento coercivo das rendas em dívida ou indemnização, não se justifica que esta última siga a forma de processo comum de execução e a primeira possa constituir um enxerto da acção declarativa. Por esta razão, e ainda porque a acção de despejo, com a entrada em vigor do RAU, deixou de constituir, no seu todo, um processo especial, entende-se que a execução do despejo é feita através de uma execução para entrega de coisa certa, observando-se a tramitação especial dos art.ºs 59º a 61º do RAU, cfr., neste sentido, Conselheiro Jorge Alberto Aragão Seia, ob. cit. Em conformidade com este entendimento, a execução de despejo deve correr no traslado e, na comarca de Lisboa, nos Juízos de Execução, em conformidade com as regras emergentes da reforma da acção executiva, ou seja, designadamente em modelo aprovado por decreto-lei, o qual deve mostrar-se acompanhado do respectivo documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial, cfr. art.º 90º, n.º 3, b) e 810º ex vi do art.º 466º, n.º 3 do Código de Processo Civil e 23º, n.º 2 do Código das Custas Judiciais. Pelo exposto, e não tendo a A. instaurado a execução de despejo nos termos das supra citadas normas legais, indefiro a passagem do requerido mandado de despejo. Custas do incidente pela A., com taxa de justiça que se fixa em 1 UC, cfr. art.º 16º do Código das Custas Judiciais. Notifique”. IV – FUNDAMENTOS DE DIREITO Vejamos, então, se a execução do despejo constitui ou não mero incidente da acção declarativa em que o mesmo foi decretado. Como já vimos, foi proferida sentença em 21/10/2005, já transitada em julgado, a qual declarou resolvido o contrato de arrendamento para habitação do prédio aí identificado e condenou a 1ª Ré a despejar imediatamente o locado e a entregá-lo livre e devoluto de pessoas e bens à A. A A., porém, dado que a 1ª Ré não abre mão do locado, veio em requerimento na própria acção de despejo com processo sumário, requerer ao Tribunal a emissão de mandado para efectivação de despejo, por entender que a execução de despejo se faz através de incidente na acção. O Tribunal de 1ª instância entendeu, no entanto, que a execução do despejo deve ser feita através de uma execução para entrega de coisa certa, a correr por traslado, nos Juízos de Execução de Lisboa, em conformidade com as regras emergentes da reforma da acção executiva, em modelo aprovado por decreto-lei, o qual deve mostrar-se acompanhado do respectivo documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial. De que lado estará a razão? De acordo com o nº 1 do artº 59º do RAU “O senhorio pode requerer um mandado para a execução do despejo, quando o arrendatário não entregue o prédio na data fixada na sentença” (sublinhado nosso). Resulta, assim, desta disposição legal que mediante requerimento, o senhorio pode solicitar ao Tribunal, na sequência da sentença que decretou o despejo, a sua imediata execução, dada a falta de entrega do locado pelo arrendatário. E, inexistindo qualquer disposição legal que imponha que tal requerimento a solicitar a passagem de mandado de despejo deva ser efectuado em acção autónoma, mediante um modelo aprovado por decreto-lei, acompanhado de documento comprovativo do pagamento de taxa de justiça inicial de acordo com regras emergentes da reforma da acção executiva, entendemos que tal requerimento constituirá uma sequência lógico-jurídica decorrente do incumprimento daquilo que foi decretado por sentença, transitada em julgado e, como tal constituirá um mero incidente da acção declarativa. Na verdade, cremos não decorrer nem da letra nem do espírito do legislador do Regime do Arrendamento Urbano, que o requerimento a solicitar o mandado de despejo deva obedecer ao regime previsto para as execuções de entrega de coisa certa, fundadas em sentença, nos termos previstos no artº 810º do CPC. Aliás, se o artº 56º nº 1 do RAU faz alusão à acção de despejo, na sua fase declarativa, isto quer dizer que tal acção comporta também uma fase executiva, constituindo, assim, a nosso ver, aquele requerimento a solicitar a passagem de mandado de despejo, ou seja, a efectivação da desocupação do locado, já decretada, o “pontapé” de partida para a fase executiva da acção de despejo. A intenção do legislador foi, sem dúvida, a de conferir maior simplificação a um processado que se pretende célere, a fim de servir os interesses que se pretende acautelar como sejam a desocupação imediata do locado e a sua correspondente restituição ao senhorio. E, tanto assim é, que as recentes alterações do regime da acção executiva, não revogaram os artºs 59º e 60º do RAU que regulam o mandado de despejo, não têm a mínima correspondência com a tramitação prevista para a execução para entrega de coisa certa. Na verdade, a execução do mandado de despejo constitui, uma verdadeira execução especial para entrega de coisa certa, não se lhe aplicando as regras dos artºs 928º a 932º do CPC, já que na primeira das disposições citadas, se prevê, desde logo, a citação do executado para fazer a entrega da coisa ou opor-se à execução, enquanto que no artº 59º do RAU porque não é notificado o despacho que ordena a passagem de mandado, apenas se prevê a emissão imediata de mandado de despejo para execução do despejo, a solicitação do senhorio, por o arrendatário não entregar o locado, conforme decidido em sentença transitada em julgado. Assim sendo, a execução de despejo não carece de ser deduzida segundo um qualquer modelo aprovado por decreto-lei como requerimento executivo. As regras dos artºs 59º e 60º do RAU não podem, de todo, ser aplicadas por analogia às regras contidas nos artºs 928º e segs. do CPC, por serem normas de carácter especial e excepcional. O requerimento executivo de despejo, deve assim, ser formalizado mediante um simples requerimento deduzido nos próprios autos de acção declarativa de despejo, constituindo um mero incidente desta. V – DECISÃO Nestes termos, acorda-se em conceder provimento ao recurso, revogando-se o despacho recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que dê o normal seguimento ao requerimento de execução de despejo. Sem custas. Lisboa, 06/02/2007 (Maria José Simões) (Azadinho Loureiro) (Ferreira Pascoal) |