Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ADEODATO BROTAS | ||
Descritores: | RESPONSABILIDADE PRÉ-CONTRATUAL ILICITUDE BOA-FÉ CULPA DANO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 12/19/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | 1- Para que se possa falar em responsabilidade civil pré-contratual, não basta que a não conclusão do contrato tenha frustrado expectativas legítimas que a contraparte tenha criado. 2- É igualmente necessário e essencial que essa não conclusão seja ilícita, por se traduzir em injustificada violação das regras da boa fé; e, ainda, é necessário que seja culposa, por o contraente não ter agido, quando podia, conforme às regras de boa fé e aos deveres de lealdade, informação e proteção; e, finalmente, que cause um dano à contraparte. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam neste colectivo da 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: I- RELATÓRIO 1- MI SGPS, SA, instaurou acção declarativa, com processo comum, contra OIIA e, I – Sociedade Gestora de Organismos de Investimentos Colectivo, SA, pedindo: - A condenação das rés a pagarem indemnização de 500.000€, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação. Alegou, em síntese, que no exercício da sua actividade, manteve contactos com a 2ª Ré, na sua qualidade de representante do Fundo 1º Réu e na prossecução dos objectivos para os quais foi criada, no âmbito do processo destinado à venda de 99,96% das acções representativas do capital social da sociedade “C Park, S.A.”, em Vila Nova de Gaia, que integravam o património daquele. Esses contactos desenvolveram-se até à fase em que a Autora, após análise dos termos em que seria possível concretizar o negócio, apresentou uma proposta de compra por um preço indicativo, no decurso da qual se disponibilizou, também, para assinar um acordo de confidencialidade que permitisse o acesso a toda a documentação e demais informação neste dossier, o que veio a acontecer. Após aturada análise ao dossier e visita ao espaço, a Autora veio a apresentar uma proposta concreta de compra pelo valor de € 12.000.000,00, correspondente ao preço de venda pedido pela Ré I, tendo em resposta recebido indicação de que deveria rever tal preço em alta; apresentada nova proposta, a Autora contemplou duas alternativas, tendo recebido da Ré resposta escrita, em 06.01.2017, contendo a “decisão final” da vendedora, conforme doc. 12 com a petição inicial; nesse mesmo dia, a Autora enviou à Ré carta a aceitar o preço da venda e as condições de pagamento, tendo recebido nova resposta reconfirmando formalmente os termos da venda. Esta troca de correspondência corporizou um acordo pré-contratual que vinculava as partes à celebração do negócio projectado, tanto mais que, pouco tempo mais tarde, a Autora veio a assegurar o financiamento para liquidação de parte do preço, pelo que, desde essa data, tinha ao seu dispor os fundos necessários para o pagamento do valor total; porém, em 23.02.2017, a Ré enviou à Autora carta na qual informou que tinha sido proposta contra si uma providência cautelar de suspensão provisória dessa venda, tendo-lhe transmitido a posição e estratégia de defesa por si adoptada, tendo manifestado, também, que se mantinha em condições de prosseguir com o negócio projectado, sem quaisquer alterações. Mas em 18.05.2017 e para surpresa da Autora, a mesma Ré veio a remeter-lhe nova carta, informando que considerava desaconselhável prosseguir com o negócio, face ao risco associado à mencionada providência cautelar, tendo assumido uma postura de contradição com aquela anteriormente manifestada. Sendo certo que, nesse procedimento cautelar, a Ré foi absolvida, a acção principal seguiu os seus termos e as partes vieram a celebrar transacção; tendo a Autora reiterado o seu interesse na prossecução do negócio, a Ré remeteu-se ao silêncio, tendo respondido já em 2018, informando ser sua intenção retomar o processo de venda, mas em moldes diversos, os quais, veio a Autora a apurar, passariam por um entendimento com as sociedades envolvidas no procedimento cautelar – a quem, aliás, as acções da C Park vieram a ser alienadas, pelo preço de € 15.576.000,00. As Rés são solidariamente responsáveis, perante a Autora, e o processo de venda foi ilicitamente interrompido, tendo esta direito ao ressarcimento dos prejuízos em que incorreu. 2- Citadas, as Rés contestaram conjuntamente. Invocaram excepção de prescrição do direito da Autora, por ter já decorrido o prazo de três anos a que alude o artigo 498º, n.º 1 do Código Civil (aplicável por força do artigo 227º, n.º 2 do mesmo Código), e, também a ilegitimidade passiva da 2ª Ré, enquanto mera representante do 1º Réu. Impugnaram grande parte da matéria factual constante da petição inicial e alegaram, em síntese, que, até à suspensão do processo negocial, o clausulado do contrato nunca chegou a ser discutido, razão pela qual não há lugar à responsabilidade pré-contratual peticionada pela Autora que, até àquele momento, havia apresentado apenas uma proposta não vinculativa. Aquando do posterior retomar do processo de venda do C Park, a Autora só não nele participou porque não quis, não podendo essa circunstância ser imputável a nenhuma das Rés. Para além disso, a Autora alega determinado prejuízo sem sustentação fáctica ou legal, pelo que, independentemente da prova que pudesse fazer sobre o seu direito, não lhe são devidos os valores que peticiona. Terminam pedindo a procedência das excepções, com a correspondente absolvição do pedido ou da instância e, ainda, a condenação da Autora como litigante de má-fé, por ter feito do processo um uso manifestamente abusivo e ter deduzido pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar. 3- A respondeu às excepções e ao pedido de sua condenação como litigante de má fé, pugnando pelas respectivas improcedências. 4- Realizada audiência prévia, foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade da ré I e, relegado para final o conhecimento da excepção de prescrição. Foi indicado o objecto do litígio e os temas de prova. Houve pronúncia sobre os meios de prova. 5- Teve lugar a realização da audiência final, em quatro sessões, constando a acta da 1ª sessão assentada de factos reconhecidos pelo legal representante da autora. 6- Com data de 22/03/2024 foi proferida sentença, com o seguinte teor decisório: “VII- DISPOSITIVO Por tudo o exposto, julga-se a acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, decide-se condenar os Réus a pagar à Autora a quantia de € 59.363,34 (cinquenta e nove mil, trezentos e sessenta e três euros e trinta e quatro euros), acrescida de juros de mora devidos, à taxa legal comercial, desde a citação até integral pagamento. Custas por Autora e Réus na proporção do respectivo decaimento.” *** 7- Inconformada, a autora interpôs recurso dessa sentença, formulando as seguintes CONCLUSÕES: A) A recorrente intentou a presente acção pedindo a condenação das RR. no pagamento de uma indemnização no valor de € 500.000,00 (quinhentos mil euros), com fundamento no facto de as RR. terem operado a rutura ilícita de negociações e, ademais, na circunstância de não terem observado o dever de contratar; B) Considerou correctamente o tribunal, em linha com a jurisprudência maioritária, se não unânime, que apenas é indemnizável o interesse contratual positivo (ou de cumprimento) quando exista “o chamado “dever jurídico de conclusão” do negócio: quando as negociações tiverem atingido um desenvolvimento tal que justifique a confiança na celebração do negócio, como é o caso de se ter atingido um acordo sobre todas as questões e apenas faltar a concretização/celebração do acordo através da forma legal”; C) Andou mal o tribunal quando, ao analisar o caso dos autos e apesar de, ainda com acerto, afirmar que “não se vislumbra que outros aspectos (essenciais) do contrato faltaria negociar”, concluiu que (ainda) não havia o dever jurídico de conclusão do negócio; D) A, parcial, improcedência do pedido louva-se no facto de nenhuma das partes ter apresentado “minuta de contrato para a outra assinar, nem existiu qualquer outra contraproposta”; E) O facto de nenhuma das partes ter apresentado qualquer contraproposta resulta do facto de a negociação estar encerrada e a circunstância de não ter si não constitui argumento decisivo nem relevante para eliminar ou mesmo atenuar o dever jurídico de conclusão do negócio; F) Assumindo a difícil tarefa de definir a “linha vermelha” a partir da qual já existe um autêntico dever jurídico de conclusão do negócio (a partir do qual já existirá um interesse positivo a proteger)” considerou o tribunal a quo que “a cristalização das condições do contrato não avançou para a sua corporização concreta”, acrescentando que “a jurisprudência tem identificado aquele ponto crucial quando o processo negocial atingisse a fase em que apenas faltasse a corporização do contrato projectado através da forma legal”; G) Ao contrário do que se refere na sentença, as condições do contrato encontravam-se totalmente cristalizadas, estando acordado o objecto da transacção, o preço, a forma de pagamento e as garantias a prestar pela compradora; H) Como se refere no acórdão do STJ de 16.12.2010, invocado na sentença, quando “pelo encontro da proposta e da aceitação, já tenha sido obtido acordo, com a chegada a bom termo da fase decisória da negociação e faltando apenas a formalização do contrato (…) é de entender que existe um verdadeiro dever de conclusão cuja violação implica a indemnização do interesse do cumprimento, isto é, considerando-se como indemnizável o ganho que derivaria da celebração (formalização) do contrato e que não se obteve.”; I) Constitui uma clara incongruência afirmar-se que “não se vislumbra que outros aspectos (essenciais) do contrato faltaria negociar” e, ao mesmo tempo, que “a cristalização das condições do contrato não avançou para a sua corporização concreta – por exemplo, numa minuta, seja de contrato-promessa, seja de outro instrumento contratual”, sendo certo que caso tivesse avançado para a sua “corporização concreta” seriamos remetido para um quadro de responsabilidade contratual; J) Donde, considerando já existia um acordo global entre as partes, faltando apenas a formalização do negócio, os RR. violaram o dever jurídico de conclusão do contrato, sendo, por isso, devida indemnização correspondente ao dano positivo ou de cumprimento; K) Encontrando-se assentes os elementos essenciais do negócio, não sendo exigida para a perfeição do contrato qualquer específica formalidade, não tendo sido feita prova da existência de qualquer circunstância que, do ponto de vista negocial, evidenciasse qualquer tipo de divergência entre as partes e não tendo igualmente sido feita prova de que tenham sido adoptados comportamentos adequados a evitar ou a prevenir frustração da conclusão negocial, não se mostra ilidida a presunção de culpa prevista no art.º 799.º, n.º 1 do Código Civil; L) Para além de se encontrarem adstritos ao cumprimento dos deveres de informação, lealdade, esclarecimento e honestidade, estavam igualmente os RR. vinculados à observância do dever de conclusão do negócio em razão de ter sido criada a expectativa e a confiança razoável na conclusão do contrato; M) Em face dos factos provados dúvidas não restam de que a fase preliminar há muito se encontrava concluída razão pela qual a culpa na formação do contrato situa-se no patamar da violação do dever de conclusão desse mesmo contrato; N) Uma vez demonstrado que, por força da justificada e legítima confiança que a recorrente depositou na concretização do negócio, a recorrente perdeu uma oportunidade de negócio a indemnização deve abranger o interesse positivo; O) Devendo o conteúdo dessa indemnização compreender os lucros cessantes, nos termos dos artigos 564.º, 566.º e 798.º do Código Civil; P) Para além das normas referidas na anterior conclusão, a sentença recorrida violou, ainda, o disposto nos artigos 227.º e 799.º do Código Civil. Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente e a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra tudo nos termos acima preconizados. *** 8- As rés, igualmente inconformadas, interpuseram recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES: A) O Tribunal a quo deu como provados vários factos que, no entender da Recorrente, foram incorretamente julgados, designadamente os factos constantes dos números 24, 38, 40 e 41 da matéria de facto dada como provada; B) No que concerne o número 24, entendem as Recorrentes que não ficou provado a aprovação de um financiamento no montante de €12.000.000,00 para a concretização da aquisição acordada. C) Antes de mais, porquanto a prova no qual se alicerçou a decisão sobre este número, trata-se de um simples email, sem a indicação das condições gerais (v.g. taxa de juros aplicável, spread, etc.) e/ou particulares (garantias, prazo de reembolso, etc.), remetido pelo gestor da conta bancária da Autora junto da Caixa Económica Montepio Geral, com quem a Recorrida trabalhava há largos anos, posterior à proposta de aquisição que esta enviou à Ré a 9 de janeiro de 2017. D) Um financiamento deste género e montante tem de cumprir com diversos formalismos, designadamente a obtenção da Administração do Banco, produção da documentação relevante, o que não foi minimamente provado ou sequer alegado pela Recorrida e o financiamento apenas se encontraria válido até 10 de fevereiro de 2017 e sujeito a manifestação de interesse pela A, o que não se provou. E) Atente-se ao depoimento da testemunha da Recorrida RO, gestor da conta bancária da Recorrida: “Advogado da RR 00:32:07 (…) Como é que é normalmente comunicada a aprovação de um financiamento? Testemunha 00:32:17 Pode ser comunicada via e-mail ou por carta. Advogado dos RR 00:32:20 E este e-mail, digo eu, parece-me assim de alguma informalidade. Isto é normal, dizer-se ‘olhe, temos o prazer de informar que há uma aprovação de um financiamento de 12.000.000 de euros para a aquisição da C Park e esta proposta mantém-se válida até ao dia 12, ou seja, nem 30 dias… até ao dia 10.02. Isto é normal? É assim que acontece? O banco tem alguma formalidade para formalizar e comunicar estas aprovações? Testemunha 00:32:55 Não, não tem nenhuma carta formal que indique que tenha de se fazer dessa forma. Advogado dos RR 00:33:06 E não tem de se enviar documentos nenhuns? Nenhumas minutas de contratos de financiamentos ou as condições? Testemunha 00:33:07 Isso só é feito depois do aceite de condições. O que tem de aceitar posteriormente a isso, há sempre condições particulares… Advogado dos RR 00:33:16 Mas o cliente já sabia as condições de financiamento ou não? Testemunha 00:33:24 Já sabia as condições de financiamento. Advogado dos RR 00:33:26 E é normal este prazo inferior a um mês? Testemunha 00:33:33 Isso terá a ver com a forma de pressionar o cliente. Porque nós nunca sabemos se o cliente coloca as operações nos outros bancos. E é também uma forma de pressionar o cliente a dar uma resposta o mais rápido possível. Advogado dos RR 00:33:50 Certo. Eu já percebi, mas é normal? Testemunha 00:33:51 Isso é mais uma questão comercial. Sim, é normal. Pode ser 30 ou 60 dias, que normalmente é o prazo que nós damos… Advogado dos RR 00:33:57 Certo, mas isto não chegam a 20 dias. E depois desta comunicação, o senhor recebeu mais alguma comunicação da MI? O que sabe sobre isto? Testemunha 00:34:18 Não, depois do que me lembro foi do engenheiro José C nos ter ligado e ter dito que o negócio infelizmente não iria ficar feito. Advogado dos RR 00:34:30 Mas disse-vos isto antes deste prazo de 10.02.2017 ou depois desse prazo? Ou seja, o financiamento seria válido até 10.02.2017. Quando é que ele vos comunicou isso: se foi antes ou depois? Testemunha 00:34:52 Eu não tenho a certeza, mas seguramente que foi antes, porque senão não lhes valia a pena falar depois, porque as condições já teriam caducado, não é? Advogado dos RR 00:35:09 Se fosse previsto o Montepio emitir… Os senhores sabiam que o preço final eram os €13.000.000 ou não? Testemunha 00:35:26 Como disse há pouco ao seu colega, daquilo que me recordo, o que o engenheiro… e estamos a falar daquilo que da comunicação verbal do cliente nos foi transmitido… que o valor da aquisição era €13.000.000, que pretendia €12.000.000 e os capitais próprios seriam €1.000.000. era isto que o cliente nos transmitia, mas não vi um ofício, não vi nenhuma comunicação sobre o valor. Advogado dos RR 00:35:54 Pronto, mas para o Banco poder emitir duas garantias de €500.000 euros, de €250.000 cada, isto teria de estar nesta proposta, se fizesse parte da operação de financiamento. Sim ou não? Testemunha 00:36:13 Sim, por isso é que eu há pouco disse que me recordo que não tinham sido aprovadas as garantias, mas tinham sido faladas em posteriormente [impercetível] dessas garantias. Porque penso que o que era mais urgente eram esses €12.000.000. Advogado dos RR 00:36:31 Mas essas garantias não tinham de ser apresentadas? Testemunha 00:36:38 Não me recordo. Advogado dos RR 00:36:43 Chegou a receber algum pedido de renovação deste financiamento? Testemunha 00:36:57 Não. Advogado dos RR 00:37:05 Ou seja, isto estaria válido até ao dia 10 de fevereiro. O senhor já nos disse que seguramente recebeu o contacto antes de caducar esta proposta. Certo? E depois desta data nunca chegou a haver um pedido de renovação de financiamento. Certo? Testemunha 00:37:34 Certo.” F) Pelo exposto, este facto não deveria ter sido dado como provado. Contudo, se se entender que deveria sê-lo, deveria constar deste item o prazo de validade da alegada proposta do banco, com a indicação que o mesmo não se renovaria, nem que este nunca chegou a receber qualquer pedido de renovação de financiamento por parte da Recorrida. G) Assim, a manter-se como provado, deveria ser com a seguinte redação: “Na sequência das negociações entretanto mantidas pela Autora com a Caixa Económica Montepio Geral, esta comunicou-lhe, em 16.01.2017, a aprovação de um financiamento no montante de €12.000.000,00 para a concretização da aquisição acordada, cuja validade terminava em 10.02.2017. Nesta data o financiamento caducou, não se tendo renovado nem a Recorrida apresentou qualquer pedido de renovação.”. H) Quanto ao número 38 da matéria de facto dada como provada é referido que: “Com vista à celebração do negócio descrito nos autos, a Autora despendeu as seguintes quantias: i. € 6.000 com honorários de Advogados; ii. € 380,00 com custos de constituição e manutenção da VFQ, SGPS, Lda.; iii. €52.983,34 de custos com recursos humanos alocados ao desenvolvimento do processo de aquisição da C Park” I) No que concerne o ponto i. do número 38 dos factos dados como provados, “€ 6.000 com honorários de Advogados”, este não pode deixar de ser dado como não provado. J) Este facto foi alegado pela Recorrida no artigo 132 da sua petição inicial, tendo juntado para a respetiva prova os documentos 31 a 33. Estes documentos são cópias das faturas (e não recibos, pelo que não provam o respetivo pagamento) emitidas pela sociedade de Advogados PSA, SP, RL, as quais mencionam expressamente que se referem à avença mensal que têm com a Recorrida. K) A testemunha GC, filho do presidente do Conselho de Administração da Recorrida, confirmou a existência do aludido contrato de avença: “Advogado dos RR 00:20:21 Sabe se tem uma avença mensal com algum escritório de advogados? Testemunha 00:20:24 Sim temos.” L) Também a testemunha da Recorrida DM, responsável financeiro da Recorrida referiu o seguinte: “Advogado dos RR [00:34:01] (…) Há pouco, falámos de uma avença que os Srs. têm, que a MI tem uma avença com um escritório de advogados. Essa avença é mensal? Testemunha [00:34:14] Sim. Advogado dos RR [00:34:15] É sempre o mesmo valor? Testemunha [00:34:18] Tem sido, sim. Advogado dos RR [00:34:19] Qual é esse valor? Qual é o montante? Testemunha [00:34:21] Eu penso que é à volta dos 2.000€. Advogado dos RR [00:34:24] E à data também era 2.000€? Testemunha [00:34:26] Sim, sim. Advogado dos RR [00:34:27] E isso oscila com mais ou menos trabalho ou há acertos ao final de um tempo? Testemunha [00:34:33] Não, não, não tem havido acertos. Advogado dos RR [00:34:36] Ou seja, independentemente do que o escritório de advogados… Qual é o escritório de advogados? Testemunha [00:34:40] É PSA… É o Dr. FN. Advogado dos RR [00:34:45] Pronto. É aqui o escritório do nosso ilustre colega, do meu ilustre colega. E, nessa data, qual foi o montante que vocês gastaram? Gastaram algum montante a mais do que o normal ou foi incluído naquele montante mensal que estava pago? Testemunha [00:35:08] Não, não tenho ideia de se ter pago a mais. Advogado dos RR [00:35:11] Ou seja, era já a avença mensal. Testemunha [00:35:14] Sim, a avença mensal. Agora, o trabalho é que era diferente… Advogado dos RR [00:35:18] Claro, mas o valor foi o mesmo no final. Testemunha [00:35:26] Sim, tenho ideia disso.” M) Pelo que, caso efetivamente tivessem sido prestados serviços fora do âmbito da aludida avença mensal, a sociedade de Advogados deveria ter emitido a respetiva fatura e respetivo recibo, discriminando os serviços prestados – o que não fez. N) Aliás, de acordo com o disposto na alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do Código do IVA, as faturas devem conter a “b) A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável (…);”. O) Além de que, se efetivamente foram prestados serviços no âmbito do processo de tentativa de aquisição do C Park, os mesmos não implicaram um aumento de custos para a Recorrida – que, através do presente processo, pretende, entre o mais, receber um valor correspondente a um custo fixo que já suportava, independentemente do trabalho realizado. P) Assim, não só não ficou provado que este suposto valor de €6.000,00 foi efetivamente pago pela A, como também não se provou que o mesmo seja referente a serviços jurídicos relativos ao assunto em questão nos presentes autos. Q) Pelo exposto, ponto i. do número 38 deve ser retirado dos factos dados como provados. R) No que respeita ao ponto ii. do número 38 relativo aos custos (€ 380,00) de constituição e manutenção da VFQ, SGPS, Lda., também não poderá deixar de ser dado como não provado. S) Antes de mais, o tipo de sociedade escolhido e o respetivo objeto social, a saber: “Gestão de participações sociais noutras sociedades como forma indireta do exercício de atividades económicas”, são esclarecedores que a mesma não se destinaria exclusivamente à aludida aquisição da participação social em causa nos presentes autos. T) Acresce que, considerando que passados mais de 4 anos desde que a aludida SGPS foi constituída, esta ainda se encontra ativa e a ser utilizada pela Recorrida, é também por si só demonstrativo e evidente que a mesma não se destinou exclusivamente à aquisição da participação social da C Park e continua a ser utilizada noutros negócios da Recorrida. U) A demonstra-lo, atente-se ao depoimento de DM, responsável financeiro da Recorrida, que confirmou tal facto: “Advogado dos RR [00:45:37] Olhe, porque é que vocês, já disse que constituíram a sociedade VFQ de propósito para este negócio. Quando viram que este negócio não ia ser feito, porque é que não liquidaram a sociedade? Testemunha [00:45:49] É assim, nós, qualquer processo, projetos, nós criamos uma empresa para fazer esse tipo de projeto, de investimento. Esta estava destinada a isso, portanto, futuramente, se não fosse para esse processo, seria para outro, foi agora em 2021. Comprámos uns edifícios… Advogado dos RR [00:46:14] Ou seja, deixaram em banho-maria, porque sabiam que, mais cedo ou mais tarde, iam utilizar. É isso? Testemunha [00:46:17] Sim, provável.” V) Pelo exposto, ponto ii. do número 38 deve ser retirado dos factos dados como provados. W) No que concerne o ponto iii. do número 38 relativo aos custos (€52.983,34) com recursos humanos alocados ao desenvolvimento do processo de aquisição da C Park, este ponto não poderá igualmente deixar de ser considerado não provado. X) Para provar tais factos juntou a declaração empresarial simplificada (IES) e um quadro (Doc. 37 junto com a PI), elaborado pela Recorrida, sem qualquer referência aos elementos de despesa, não identificando quais os supostos funcionários da Recorrida que alegadamente estiveram alocados ao processo negocial, quais as suas funções e respetivos salários, nem concretamente como tal valor foi calculado. Y) Tal quadro, no que concerne os colaboradores da Recorrida afetos e ao período de tempo despendido pelos mesmos no processo de aquisição da C Park, não é consistente com os factos dados como provados na presente ação, designadamente nos números 12 a 15 dos factos dados como provados. Z) O número 12 dos factos dados como provados tem a seguinte redação: “Em 04.11.2016, Autora e R. I celebraram um acordo de confidencialidade, nos termos do qual a A. manifestou o seu interesse na aquisição, directamente por si, ou através de sociedade por si participada, da totalidade da mencionada participação social detida pelo R. OIIA e, consequentemente, o interesse em receber do mesmo, através da R. I - SG, elementos de informação e documentação sobre a C Park, seus activos e passivos, a fim de a A. aferir oportunidade desta transacção – doc. 6 junto com a p.i..”. AA) No entanto, ficou provado que apenas após a celebração de um acordo de confidencialidade é que os Recorrentes disponibilizaram a documentação necessária para que a Recorrida pudesse aferir da oportunidade desta transação. BB) Do número 14 dos factos dados como provados pode-se retirar que até 18.11.2016, os RR não haviam disponibilizado quaisquer documentos ou informação à Recorrida para que esta pudesse iniciar a análise dos elementos contabilísticos, financeiros, urbanísticos e construtivos necessários à aferição da oportunidade desta transação. CC) Aliás, tal está confirmado no item 15 dos factos dados como provados, pelo que daqui decorre que os quadros técnicos da Recorrida apenas iniciaram a análise dos elementos contabilísticos, financeiros, urbanísticos e construtivos após 18.11.2016. DD) Nesse sentido, veja-se o depoimento da testemunha da Recorrida, Arq. FB: “Advogado dos RR [00:28:52] Pronto. É que disse inicialmente que começou a trabalhar neste projeto no início de 2016, depois disse em meados… afinal, não terá começado em novembro? Testemunha [00:29:05] Em novembro comecei mais direcionada só a este projeto, antes já tinha tido conhecimento de que havia uma intenção de compra/aquisição de… Advogado dos RR [00:29:15] Mas antes tinha iniciado a análise desses documentos? Testemunha [00:29:19] Não. EE) Quanto à data em que terminaram esta análise, e conforme resulta do depoimento da testemunha, DM, responsável financeiro da Recorrida, este afirmou que terminou a análise da informação (não tendo, no entanto, elaborado qualquer relatório escrito) entre o dia 15 e 20 de dezembro de 2016: “Advogado dos RR [00:29:16] E, depois, quando é que terminou o relatório? Testemunha [00:29:19] Para aí em dezembro, lembro-me de ter terminado, terminei mais ou menos o relatório, nessa altura, Dr. Não me lembro se foi a 15, 20…” FF) Pelo que resulta cristalino que o período de análise da informação e documentação disponibilizada não terá sido superior a um mês, iniciando-se após 18.11.2016 e terminando antes de 20.12.2016, no que concerne a parte financeira e legal. GG) Ademais, nem sequer foi produzido um relatório escrito da suposta due diligence efetuada, pelo que o tempo despendido nunca poderá ter sido o constante da tabela supra copiada, como decorre do depoimento da testemunha, DM, responsável financeiro da Recorrida: “Advogado dos RR [00:30:13] Mas, então, produziu ou não um relatório? Testemunha [00:30:16] Um relatório físico, com páginas? Advogado dos RR [00:30:17] Sim. Testemunha [00:30:18] Não me lembro de ter produzido isso assim…” “Testemunha [00:31:31] Todos nós analisamos os processos. Eu peço-lhe ajuda a elas e fomos analisando [impercetível] isso aí nós internamente fomos trabalhando no dia a dia. Não é uma entidade externa que ali estamos. Advogado dos RR [00:31:49] Mas tem que, na mesma, elaborar um sumário, diria eu, da informação recolhida para se poder ponderar até onde se vai. Testemunha [00:31:57] Sabe onde é que eu recolho a minha informação quando preciso? Eu tenho umas sebentas, uns cadernos pretos A4, que vou tirando as minhas notas aí quando preciso. Advogado dos RR [00:32:10] E as suas colegas fazem o mesmo? Testemunha [00:32:11] As minhas colegas vão fazendo, também tomam os apontamentos delas. Advogado dos RR [00:32:15] E, depois, como é que se reúne tudo? Testemunha [00:32:17] Então, reunimos… Advogado dos RR [00:32:20] Como é que o Sr. passa a informação à administração? Testemunha [00:32:23] Passo-a na reunião. Advogado dos RR [00:32:24] Ou seja, rasga a folha e entrega-lhes? Cada um dos colegas… Explique-nos só para nós tentarmos perceber. Juiz [00:32:30] Oh Sr. Dr., já percebemos que não há um relatório organizado, sistematizado, como de uma entidade externa [impercetível] entrega, é uma coisa mais informal. Testemunha [00:32:41] Sim, sim. O administrador está ali todos os dias comigo na sala ao lado, ele tem a porta aberta, eu tenho a minha… Juiz [00:32:50] O que é certo é que não há relatório [impercetível]. Advogado dos RR [00:32:57] É que era isso que eu queria… Juiz [00:33:01] Essa parte já percebemos.” HH) No que concerne a percentagem de afetação dos colaboradores da Recorrida no processo de aquisição da C Park, este quadro encontra-se suportado apenas no depoimento inconsistente da testemunha, DM, responsável financeiro da Recorrida, que foi quem elaborou o mesmo e que não conseguiu sequer explicar cabalmente como decidiu as percentagens das pessoas afetas a este processo. II) Trata-se de uma simples tabela que contém números lançados de uma forma arbitrária, sem qualquer suporte ou referência aos elementos de despesa, não identificando quais os supostos funcionários da Recorrida que alegadamente estiveram alocados ao processo negocial, quais as suas funções e respetivos salários, nem concretamente como tal valor foi calculado. JJ) Nesse sentido vai o depoimento da testemunha, DM, responsável financeiro da Recorrida, no qual o Tribunal a quo suportou a sua decisão: “Advogado dos RR [00:36:53] Mas como é que definia a percentagens então? Testemunha [00:36:56] É assim, nós definíamos as percentagens foi conforme os trabalhos que achamos que fomos disponibilizando para este processo… Advogado dos RR [00:37:04] Mas qual era o critério? Testemunha [00:37:06] Era fazendo, pronto… Quando tínhamos mais algum trabalho… Advogado dos RR [00:37:10] Certo. Mas como é que o Sr. sabia que a colega X estava a 100%, a colega Y estava a 90%, a outra a 80%, a outra 60%? Testemunha [00:37:19] É assim, nós estamos internamente ali, nós sabemos mais ou menos. Agora é assim, não lhe posso dizer se foi 35 ou 36 ou 40%. Advogado dos RR [00:37:27] Medem mais ou menos a olho… Testemunha [00:37:29] Não, não foi a olho, foi uma coisa razoável.” KK) Ora, para a Recorrida conseguir provar os alegados danos que diz ter tido com a alocação do seu pessoal ao projeto de compra da C Park, teria desde logo que alegar e provar quanto ganhava cada um dos funcionários e quais os funcionários alocados ao projeto – o que não logrou. LL) Consequentemente, também não se conseguiu aferir o tempo que cada um dos funcionários havia despendido neste projeto. MM) Não é admissível o recurso a uma média grosseira e global de vencimentos, como se o eventual tempo perdido pelo diretor financeiro fosse igual ao eventual tempo perdido pela secretária ou pelo arquiteto alocado ao projeto. NN) Apenas após aferidos e provados estes valores é que se poderia verificar a efetiva relação entre esta perda de rentabilidade e eventualmente aferir a existência de nexo de causalidade. OO) Ora, nada disto foi efetuado pela Recorrida, pelo que não podem ser considerados provados tais supostos prejuízos com base numa mera tabela e no testemunho inconsistente do responsável financeiro da Recorrida. PP) Se assim fosse, estavam resolvidas todas as dificuldades de prova (de Autores) em processos desta natureza, porquanto bastaria pedir a um trabalhador, ainda que responsável financeiro, que elaborasse uma tabela baseada em suposições infundamentadas. QQ) Ademais, se a análise financeira e legal (ponto 40 dos factos dados como provados) deste processo já havia terminado entre 15 a 20 de dezembro de 2016, restaria apenas a análise do projeto pela Arq. FB, que, segundo a mesma, cessou a respetiva análise em maio de 2017 (tendo ainda cessado o seu vínculo laboral com a Recorrida em junho desse ano). RR) Resulta uma evidente falta de prova dos factos alegados, pelo que deverá o ponto iii do número 38 dos factos dados como provados, ser considerado como não provado. SS) Quanto ao número 40 da matéria de facto dada como provada, conforme decorre do supra exposto relativamente à impugnação da matéria de facto contida no ponto i. do número 38, a Recorrida não contratou propositadamente uma equipa de advogados para a auxiliar no processo de due diligence. TT) Na realidade, a ter havido intervenção de Advogados neste processo, a mesma foi realizada pelos Advogados da sociedade PESA, com quem a Autora tinha um contrato de avença mensal de preço fixo. UU) Assistência jurídica essa que, inclusive, não gerou qualquer despesa adicional, conforme decorre do depoimento da testemunha, DM, responsável financeiro da Recorrida, que, conforme já supra exposto. VV) Termos em que deverá o número 40 dos factos dados como provados, ser considerado como não provado e, em sua substituição, ser dar como provado que: “A Autora socorreu-se da sociedade de advogados PESA, com quem tinha um contrato de avença mensal com o montante fixo de €2.000,00, para a auxiliar na parte jurídica no processo de due diligence à sociedade C Park.” WW) Quanto ao número 41 da matéria de facto dada como provada, o Tribunal a quo deu-o como provado com base no supra aludido quadro supra e nos depoimentos das testemunhas DM e FB. XX) Pelos depoimentos referidos, acima transcritos, verifica-se uma total ausência de prova que possa sustentar a decisão quanto a este item 41, pelo que deve ser retirado dos factos dados como provados. YY) Pretende a Recorrida, a condenação dos Recorrentes, no pagamento de uma indemnização no montante de €500.000,00, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento. ZZ) Este pedido, segundo a Recorrida, assenta na responsabilidade pré-contratual das Recorrentes. AAA) Em síntese, a sua pretensão é fundamentada na seguinte factualidade: a. As Recorrentes e a Recorrida chegaram a um acordo pré-contratual de aquisição de 99,96% das ações representativas do capital social da sociedade “C Park, S.A.” que integravam o património OIIA; b. O processo de venda foi ilicitamente interrompido pelas Recorrentes; BBB) Pelo que a Recorrida tem direito ao ressarcimento dos prejuízos em que incorreu. CCC) O Tribunal a quo entendeu que, tendo a Recorrente e a Recorrida discutido e negociado os termos essenciais do contrato, poderia a Recorrida, razoavelmente, esperar a efetiva celebração do contrato. DDD) Assim, com base na factualidade provada relativa a aspetos essenciais do contrato que as partes tinham acordado, juntamente com o facto da Recorrente ter interrompido as negociações, o Tribunal a quo, entendeu, sem mais, estarem reunidos os requisitos da responsabilidade pré-contratual. EEE) A Recorrente não se pode conformar com esta decisão, porquanto O Tribunal a quo deveria ter levado em conta que não havia ainda sido negociada e produzida a documentação contratual em termos aceitáveis para as partes, designadamente a minuta do contrato definitivo de transmissão das ações, ou sequer a minuta de um contrato promessa. FFF) Este tipo de negociação e de contratos tem uma complexidade que não se resume ao objeto do negócio, ao preço e à forma de pagamento. GGG) Além destes elementos, outros há, de grande importância e que normalmente tornam as negociações difíceis, designadamente, garantias, limitações de responsabilidade, indemnizações, clausulas penais, prazos de reclamações, etc. HHH) O Tribunal a quo deveria ter analisado, face aos factos provados, se a interrupção das negociações aconteceu de forma abrupta e sem qualquer justificação, mas no entanto limitou-se, pura e simplesmente, a referir (pág. 31 da sentença em crise) que: “Ficaram, assim, demonstrados todos os requisitos supra mencionados para a formação da responsabilidade pré-contratual: pois que a troca de correspondência entre as partes corporizou um acordo de vontades, necessário e suficiente à celebração de um contrato, criadora e indutora de confiança, de uma das partes na outra, no sentido em que o contrato seria celebrado; a Autora investiu a sua confiança no projecto contratual e agiu de acordo com essa confiança; o contrato não aconteceu e a confiança da Autora saiu frustrada por facto imputável à Ré, a mesma que nisso a havia induzido. Está assim, portanto, identificado o direito da Autora a indemnização por responsabilidade pré-contratual.” III) Não efetuou ainda uma análise critica dos factos provados de forma a aferir se as Recorrentes terão agido de má-fé, quando, em boa verdade, os factos dados como provados demonstram que a interrupção das negociações não aconteceu de forma abrupta nem injustificada. JJJ) A Recorrente tinha uma justificação sólida para a interrupção das negociações. KKK) A interrupção de negociações para a formação de um contrato é, a priori, lícita, e a rutura das negociações não implica necessariamente a violação das regras da boa-fé. LLL) A Recorrente alegou e provou factos que demonstram a sua boa fé nas negociações, pelo que não incorreu em responsabilidade pré-contratual. MMM) Como é consabido, com a realização de uma due diligence, os compradores tomam conhecimento, de uma forma mais cabal, da realidade económica e financeira da sociedade alvo, designadamente, dos contratos mais relevantes em vigor, dos créditos e das dívidas por regularizar, etc. NNN) Assim, normalmente, com base nesta informação podem os compradores concluir que a sociedade alvo, perante todos os compromissos e responsabilidades subjacentes, poderá ter contingências, a quais serão suscetíveis de causar prejuízos ou diminuir consideravelmente o valor da venda. OOO) E, consequentemente, propõem cláusulas que prevejam uma forma de remeter os prejuízos ou eventuais contingências para os vendedores, designadamente, através de garantias que possibilitem o respetivo ressarcimento e, por outro lado, os vendedores impõem cláusulas de limitação de responsabilidade, seja no tempo, nos valores ou no tipo de responsabilidades. PPP) As negociações relativas a estas questões essenciais não foram efetuadas, uma vez que as Recorrentes e a Recorrida apenas acordaram o preço e forma de pagamento, faltando negociar e acordar todas as restantes condições do contrato promessa e do contrato definitivo. QQQ) Por outro lado, e não menos relevante, como decorre dos factos dados como provados sob os números 26, 27, 29 e 31 no decurso das negociações, foi pela sociedade BPJC – Gestão e Consultoria, S.A., interposta uma providência cautelar contra a Recorrente, com indicação da Recorrida como contrainteressada, na qual pedia fosse decretada a suspensão provisória da venda à Recorrida da participação na C Park (e, consequentemente, a não celebração do contrato de compra e venda de ações). RRR) Entendeu a Requerente da providência cautelar (BPJC – Gestão e Consultoria, S.A.), que as unidades de participação do OIIA que pertenciam indiretamente ao Estado Português e que, por via disso, este estaria obrigado a permitir a sua participação no processo de alienação das participações sociais na C Park a todos os que mostrassem interesse no mesmo (cfr. doc. n.º 25 junto com a petição inicial). SSS) Aliás, a Requerente da providência cautelar desde logo alegou prejuízos na ordem dos 500.000,00 € e informou que iria peticionar à Recorrente se não lhe fosse permitido participar nas negociações da aquisição da participação na C Park. TTT) Conforme decorre dos factos dados como provados sob os itens 26, 27, 29 e 31, a Recorrente informou a Recorrida, em 23/02/2017, da instauração da providência cautelar (apesar desta ser, como se referiu, contrainteressada) e nesta data, a Recorrida tomou conhecimento de um obstáculo nas negociações. UUU) Sendo a Recorrida contrainteressada nesta providência cautelar, conforme já referido, tinha a mesma, total conhecimento dos fundamentos e pedidos formulados na mesma (número 26 dos factos provados). VVV) Em 11 de maio de 2017 houve uma reunião entre os representantes da Recorrente e da Recorrida onde foi comunicado a esta última a interrupção das negociações, por motivos de prudência, pois seria desaconselhável assumir riscos inerente à venda da participação social face às ações em curso intentadas pela sociedade BPJC – Gestão e Consultoria, S.A. (número 27 dos factos provados). WWW) Esta comunicação foi formalizada por escrito através de carta remetida em 18.05.2017 (número 27 dos factos provados). XXX) Como referido, neste caso concreto, pode-se afirmar com toda a segurança que as partes não chegaram a concluir qualquer contrato, nem sequer preliminar, que vinculasse a Recorrida a celebrar o contrato de compra e venda das suas participações sociais. YYY) Porquanto não chegou a ser celebrado ou sequer discutido o contrato promessa de compra e venda, faltando acordar todas as restantes condições do contrato, supra referidas. ZZZ) Face à sobredita providência cautelar intentada pela sociedade BPJC – Gestão e Consultoria, S.A. e à intenção desta em recorrer ao tribunal a pedir uma indemnização se a venda da participação social fosse efetuada à Recorrida sem que a mesma tivesse oportunidade de também ela se candidatar à aquisição, é legitima a posição da Recorrente em interromper as negociações. AAAA) Sobre a responsabilidade civil pré-contratual, dispõe o artigo 227.º do Código Civil que “Quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte.”. BBBB) De acordo com a jurisprudência e a doutrina sobre a responsabilidade civil pré- contratual, os deveres impostos pelo princípio da boa fé no período da formação dos contratos são o dever de proteção, o dever de informação e o dever de lealdade. CCCC) Um dos casos em que aplica este instituto da responsabilidade civil pré-contratual é a rutura unilateral e injustificada das negociações, que se verifica quando uma das partes rompe, de forma unilateral e arbitrária, as negociações em curso, depois de ter suscitado, na contraparte, fundadas expectativas de que estas chegariam a bom termo. DDDD) Em tais casos, o abandono injustificado consubstancia uma violação dos deveres de informação e de lealdade, que impõem uma atuação honesta e consequente. EEEE) Os contraentes são, em regra, livres para conformar a sua atuação no comércio jurídico da forma que melhor sirva os seus interesses e ninguém é obrigado a contratar pela simples razão de ter encetado negociações com outrem. FFFF) O processo negocial é, por natureza, precário, sendo nomeadamente aceitável (e muito frequente) que as partes fixem um prazo limite para a sua conclusão, sem necessidade de justificar a fixação desse prazo (desde que o mesmo se afigure razoável). GGGG) Por outro lado, a parte que rompe as negociações não está sequer obrigada a justificar por que motivo o faz. Aquilo que a lei, em todo o caso, penaliza é o abandono em termos contrários às regras de correção e honestidade que provoque danos injustificados à contraparte. HHHH) Dos factos provados resulta, de forma inequívoca, não ser censurável a conduta da Recorrente do ponto de vista ético-jurídico, nem que tenham sido provocados danos injustificados à Recorrida, a quem as Recorrentes tiveram o cuidado e a lealdade de manter informada das suas ações e dos obstáculos às negociações. IIII) Além do mais, resulta dos factos provados, que após retomar as negociações da venda da participação social, convidou a Recorrida a participar no processo de venda, tendo esta escolhido não participar, apesar da insistência das Recorrentes. JJJJ) As Recorrentes não interromperam, pura e simplesmente e sem qualquer justificação, as negociações, mas sim para zelar pelos seus interesses e pelos da Recorrente (que se veria envolvida em processos judiciais de desfecho imprevisível), face às ações judiciais interpostas e à decisão da BPJC – Gestão e Consultoria, S.A. em recorrer aos tribunais para pedir uma indemnização à Recorrente se fosse excluída do processo de venda da participação social. KKKK) As Recorrentes sempre agiram de boa-fé, com um comportamento honesto e consciencioso, que não as poderá fazer incorrer a Recorrente em responsabilidade pré- contratual. TERMOS EM QUE SE REQUER A V. EX.AS SE DIGNEM DAR PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO A DECISÃO RECORRIDA NA PARTE QUE LHE FOI DESFAVORÁVEL, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE JULGUE TOTALMENTE A IMPROCEDENTE PRESENTE AÇÃO. *** 9- As rés contra-alegaram no recurso interposto pela autora, sem apresentar Conclusões, pugnando pela improcedência do recurso. *** 10- A autora contra-alegou no recurso interposto pelas rés, formulando as seguintes CONCLUSÕES: A) A decisão relativa à matéria de facto encontra-se devidamente fundamentada; B) O ponto 24. da matéria de facto – “Na sequência das negociações entretanto mantidas pela Autora com a Caixa Económica Montepio Geral, esta comunicou-lhe, em 16.01.2017, a aprovação de um financiamento no montante de € 12.000.000,00 para a concretização da aquisição acordada.” – foi confirmado pela testemunha RO e pelo legal representante da A. em sede de depoimento de parte; C) Referiu a testemunha RO que “O que a MI SGPS pretendia era um financiamento para apoio para aquisição da sociedade e foi isso que foi aprovado no valor de doze milhões de euros.”, tendo José C, administrador da recorrida, referido que “Foi aprovado nesta mesma altura. Uma semana depois ou da aceitação da proposta, coincidiu quase, nós começámos a tratar antes deste processo de negociações, tivemos a aprovação do Banco quase em simultâneo com a aceitação da proposta.”; D) O ponto 38. da matéria de facto - “38) Com vista à celebração do negócio descrito nos autos, a Autora despendeu as seguintes quantias: i. € 6.000 com honorários de Advogados; ii. € 380,00 com custos de constituição e manutenção da VFQ, SGPS, Lda.; iii.€ 52.983,34 de custos com recursos humanos alocados ao desenvolvimento do processo de aquisição da C Park.” – resulta da prova documental, nos exactos termos que consta da fundamentação da sentença, e dos depoimentos das testemunhas FB e DM; E) Em rigor, a discordância das recorrentes quanto ao ponto i., assenta no pressuposto de que a recorrida não contratou advogados para, propositadamente, a assessorarem no projecto C Park, tendo utilizado os serviços do escritório de advogados com o qual tinha uma avença o que, de acordo com a tese das recorrentes, constitui fundamento de exclusão de qualquer responsabilidade das recorrentes; F) Demonstrado que a recorrida suportou este valor com advogados – embora erradamente as recorrentes aleguem que não foi feita prova do pagamento das facturas emitidas pelos advogados – saber se as recorrentes são ou não responsáveis por tal pagamento constitui matéria de direito sem qualquer impacto na matéria de facto provada; G) Quanto ao ponto ii., a testemunha DM e o legal representante da recorrida confirmaram que a sociedade VFQ, SGPS, Lda. foi constituída exclusivamente para este negócio e que a sociedade esteve inactiva até 2021; H) Relativamente ao ponto iii., a testemunha FB e, principalmente, DM, director financeiro da recorrida, confirmaram a percentagem de afetação dos colaboradores da recorrida ao processo de aquisição da C Park, ficando demonstrado (i) quanto ganhava cada um dos funcionários, (ii) quais os funcionários alocados ao projeto e (iii) o tempo que cada um dos funcionários despendeu neste projeto; I) A testemunha DM, responsável pela elaboração do documento 37 junto com a petição inicial e pelo quadro com valores remuneratórios junto em 09.06.2021, esclareceu o critério subjacente à informação constante de tais documentos razão pela qual tal meio de prova foi atendido pelo tribunal; J) A motivação das recorrentes no que concerne à impugnação do facto 40 - “A Autora contratou uma equipa de advogados que, durante cerca de três meses, auxiliaram no processo de due diligence.;” – remete para o que foi alegado a propósito do ponto 38., pelo que a discordância das recorrentes encontra-se confinada ao facto de os advogados não terem sido contratados propositadamente para esse fim, o que prejudica qualquer ulterior pronúncia sobre o tema; K) Também no que tange ao facto 41 - “A Autora também alocou meios internos ao acompanhamento permanente das negociações, à preparação de documentos, à análise de questões que fossem sendo suscitadas, com vista ao sucesso da negociação.” – as recorrentes remetem para o que alegaram quanto ao facto 38., sendo certo que não se verifica qualquer similitude entre a factualidade constante dos pontos 38. e 41.; L) É evidente que o acompanhamento permanente das negociações, a preparação de documentos e a análise das questões que foram sendo suscitadas ao longo do processo negocial sempre exigiria que a recorrida afectasse meios internos que desempenhassem tais tarefas; M) Devem manter-se inalterados os factos provados sob os números 24, 38., 40. e 41.; N) Ao contrário do que alegam as recorrentes o tribunal analisou os factos provados e, de forma clara, se a interrupção das negociações aconteceu de forma abrupta e sem qualquer justificação; O) As recorrentes não lograram provar qualquer facto que permita concluir que, ao interromperem as negociações, não incorreram em responsabilidade pré-contratual; P) Dos factos dados como provados resulta à evidência que inexistiu justificação sólida para a interrupção das negociações; Q) A justificação dada pelas recorrentes para interromperem as negociações decorre do facto de, depois de terem chegado a acordo com a recorrida quanto ao objecto do negócio, ao preço e condições de pagamento e às garantias a prestar, um terceiro ter intentado uma providência cautelar com vista a impedir a formalização do negócio, a qual foi indeferida pelo tribunal; R) No momento em que tomaram conhecimento da providência cautelar, as recorrentes informaram a recorrida de que “estaremos em condições de prosseguir com o projectado negócio de compra e venda da participação social em curso, sem quaisquer alterações ao planeado.” S) Na contestação alegaram as recorrentes que foi a providência cautelar que fez suspender o respetivo processo negocial até ao término da ação principal do aludido processo cautelar e emissão de sentença favorável pelo que, findo tal processo, deveria o negócio entre recorrentes e recorrida ter sido formalizado; T) A motivação das recorrentes para converterem a inicial suspensão num subsequente encerramento do processo negocial não foi demonstrada, sendo totalmente inconsequente a tentativa de demonstrar que a negociação das cláusulas de limitação da responsabilidade constituiria a parte mais sensível das negociações porque, segundo as recorrentes, costuma ser assim; U) Para além de constituir violação do disposto no artigo 639.º do CPC, o facto de as recorrentes não terem indicado quais as normas jurídicas que consideram ter sido violadas evidencia a falta de fundamento do presente recurso; V) A sentença não enferma, nesta parte, de qualquer vício razão pela qual a decisão recorrida não é merecedora de qualquer censura. Nestes termos e nos mais de direito, que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser negado provimento ao recurso, sendo, consequentemente, nesta parte confirmada a douta decisão recorrida. *** II- FUNDAMENTAÇÃO. - Objecto do Recurso. 1- É sabido que o objecto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (art.º 635º nº 2 do CPC) pelas conclusões (artºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 640º do CPC) pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e, ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida. Assim, em face das conclusões apresentadas pelas recorrente, são as seguintes as questões que importa analisar e decidir: A)- Recurso da autora: i)- Revogação da sentença com a consequente condenação das rés no pedido. *** B)- Recurso das rés: i)- A Impugnação da Matéria de Facto; ii)- A revogação da sentença, com a consequente improcedência da acção. *** 2- Fundamentação de Facto. A 1ª instância decidiu a seguintes Matéria de Facto: - FACTOS PROVADOS 1) A Autora é uma sociedade comercial anónima que tem por objecto a gestão de participações sociais noutras sociedades como forma indirecta do exercício de actividades económicas. 2) O Réu Fundo I é um organismo de investimento imobiliário sob forma contratual que tem como fim o investimento colectivo de capitais obtidos junto de investidores e cujo funcionamento se encontra sujeito ao princípio da repartição de riscos e à prossecução do exclusivo interesse dos seus participantes. 3) Concretamente, o Réu realiza investimentos num conjunto diversificado de activos imobiliários, incluindo imóveis, unidades de participação em organismos de investimento imobiliário e participações sociais em sociedades imobiliárias, predominantemente na área do comércio e serviços, tendo iniciado a sua actividade em 22 de Março de 2000. 4) Até 28.09.2018, o Réu Fundo I foi titular das acções representativas de 99,96% do capital social da sociedade comercial “C Park, S.A.” (anteriormente designada “Empresa E-C, S.A.”). 5) A Ré I é uma sociedade comercial anónima que desenvolve a actividade de gestão e administração, de forma especializada, em representação dos participantes, de organismos de investimento imobiliário (OII) abertos e fechados, sendo que o Réu Fundo I é um dos OII por si geridos. 6) Assim, enquanto entidade gestora do Réu Fundo I e sua legal representante, compete à Ré I a gestão do património deste OII, incluindo a selecção, aquisição, arrendamento e alienação dos activos imobiliários, bem como o exercício dos direitos directa ou indirectamente relacionados com os activos do Réu Fundo I, adquirir unidades de participação noutros OII, participações sociais em sociedades imobiliárias, títulos de dívida pública de curto prazo e fazer outras aplicações financeiras legalmente permitidas e, em geral, praticar todos os atos necessários à sua correcta administração. 7) Em Junho de 2016, a A. foi contactada pelo Dr. LMF, que lhe referiu estar mandatado pela R. I para procurar compradores para 99,96% das acções representativas do capital social da sociedade comercial anónima C PARK, S.A., com sede na Rua …, n.º 3… freguesia de Vila Nova de Gaia (Santa Marinha), concelho de Vila Nova de Gaia, com o capital social de € 750.000,00 (setecentos e cinquenta mil euros), com o número único de matrícula e de identificação de pessoa colectiva 500.096.350 (doravante “C Park”) que integravam o património do R. I, tendo o mesmo remetido ao Presidente do Conselho de Administração da A. o e-mail cuja cópia corresponde ao doc. 1 junto com a p.i., acompanhado das cópias de dois relatórios de avaliações ao imóvel propriedade da C Park realizadas 5 anos antes (em 2011): Docs. 2 e 3 juntos com a p.i.. 8) Com a recepção daquela documentação, os quadros técnicos da A. procederam a uma apurada análise da mesma, tendo a A. informado LMF que, por aqueles valores, não estava interessada no negócio que este apresentava. 9) Em Outubro de 2016, a A. foi novamente contactada por LMF que informou que a Ré I, na qualidade de gestora do R. Fundo, estava disposta a alienar a participação social na C Park por preço inferior ao resultante dos valores das mencionadas avaliações. 10) Em face desta nova informação, a A. declarou-se interessada em negociar a aquisição daquela participação social e, no âmbito dessas negociações, apresentou, por e-mail de 11.10.2016, dirigido ao mediador designado pelos RR. (o Dr. LMF), uma proposta de compra da mesma pelo preço indicativo de € 10.000.000,00, tendo-se também disponibilizado para assinar um acordo de confidencialidade que lhe permitisse o acesso à documentação e informação referente à C Park – cf. doc. 4 junto com a p.i. 11) Em resposta àquele e-mail, a R. I, em representação do R. Fundo I e através do mencionado mediador, considerou que o valor da proposta apresentada era muito baixo e contrapropôs vender a referida participação social pelo preço de € 12.000.000,00, sujeito a novas avaliações que iriam decorrer em Novembro de 2016, e disponibilizou-se para celebrar um acordo de confidencialidade prévio ao envio de informação com base na qual a A. poderia rever as condições da oferta indicativa apresentada – cf. doc. 5 junto com a p.i. 12) Em 04.11.2016, Autora e R. I celebraram um acordo de confidencialidade, nos termos do qual a A. manifestou o seu interesse na aquisição, directamente por si, ou através de sociedade por si participada, da totalidade da mencionada participação social detida pelo R. Fundo I e, consequentemente, o interesse em receber do mesmo, através da R. I, elementos de informação e documentação sobre a C Park, seus activos e passivos, a fim de a A. aferir oportunidade desta transacção – doc. 6 junto com a p.i.. 13) Pelo mesmo instrumento contratual, a R. I, enquanto entidade gestora do R. Fundo I, manifestou igualmente o interesse nesta transacção e a disposição para facultar à A. os elementos de informação e documentação sobre a C Park, necessários à análise e ponderação da transacção. 14) Imediatamente após a celebração do acordo de confidencialidade, a A. remeteu à R. I, por correio electrónico dirigido ao mediador Dr. LMF, uma lista com pedidos de informação e documentação relativa à C Park – cf. doc. 7 junto com a p.i. – tendo aquele remetido à Autora, em 18.11.2016, parte da informação e documentação disponibilizada pela Ré I, em representação da Ré I – doc. 8. 15) Logo após a recepção da informação e documentação disponibilizada, os quadros técnicos da Autora iniciaram a análise dos elementos contabilísticos, financeiros, urbanísticos e construtivos recebidos, tendo a Autora solicitado aos seus advogados que iniciassem a aferição da situação jurídica da C Park e dos respectivos activos, direitos e responsabilidades, os quais, em 13.12.2016, entregaram as suas conclusões sumárias e preliminares sobre os imóveis propriedade da C Park, os contratos de arrendamento em vigor e os principais aspectos societários da mesma – cf. doc. 9 com a p.i.. 16) Após a realização de uma detalhada visita ao imóvel propriedade da C Park, a 13.12.2016, a A. apresentou proposta de compra ao R. Fundo I das acções detidas pelo mesmo e correspondentes a 99,96% das acções representativas do capital social da referida sociedade, C Park, pelo valor de € 12.000.000,00, nos termos que constam da carta cuja cópia corresponde ao doc. 10 com a p.i.. 17) Poucos dias após o envio desta segunda proposta, foi transmitido à A. pelo mediador LMF que a R. I entendia que o novo preço de compra proposto ainda era baixo, pelo que era conveniente a A. rever, em alta, a contrapartida a pagar pela aquisição das acções da C Park detidas pelo R. Fundo I. 18) Assim, a Autora, em 04.01.2017, apresentou ao R. Fundo I nova proposta, cf. carta cuja cópia corresponde ao doc. 11 com a p.i., contemplando duas alternativas, a saber: a alternativa A, mediante a qual se propunha a aquisição de 99,96% das acções representativas do capital social da sociedade C Park pelo preço de € 12.750.000,00, pago integralmente na data de celebração do contrato de compra e venda; a alternativa B, nos termos da qual se propunha a aquisição da participação social pelo preço global de € 13.000.000,00 – € 12.000.000,00 dos quais pagos na data da celebração do contrato de compra e venda e € 1.000.000,00 pago em 6 prestações anuais, iguais e sucessivas. 19) Esta proposta estava sujeita às seguintes condições: «conclusão satisfatória do processo de Due Diligence em curso»; «negociação e produção de documentação contratual em termos aceitáveis para as artes»; «obtenção de financiamento bancário por parte da proponente em condições adequadas»; «mantendo-se apenas válida até 27 de Janeiro de 2017, caducando, de forma imediata e automática, naquela data». 20) Em 06.01.2017, na sequência de negociações mantidas com vista à alienação da participação social, foi remetido à Autora, pela Ré I através do mediador LMF, um email com o seguinte teor, conforme doc. 12 junto com a p.i.: «(…) A decisão final da I é a seguinte: - Preço da venda = 13.000.000 euros; - Pagamento de 12.500.000 euros na escritura de compra e venda das acções; - 2 Pagamentos de 250.000 euros cada, o primeiro um ano após a data da escritura e um segundo passados dois anos após a data da escritura. Para estes dois pagamentos, necessitamos de uma garantia bancária para cada um dos dois pagamentos de 250.000 euros na data da escritura. A escritura será realizada o mais rápido possível, após conclusão do processo de due diligence. (…)». 21) Naquele mesmo dia, a A. enviou carta à R. I a aceitar o preço de venda e as condições de pagamento – cf. doc. 13. 22) Em 09.01.2017, a A. enviou nova carta à R. I, com o seguinte teor, além do mais que ora se dá por reproduzido, cf. doc. 43 junto com a p.i.: «Assunto: C Park, S.A. – Proposta de Aquisição. (…) Reportamo-nos à nossa proposta de 13 de Dezembro de 2016, tal como parcialmente modificada em 3 de Janeiro último e no seguimento da vossa mensagem (…), consignamos a nossa aceitação do preço de venda de € 13.000.000,00 (…) para as acções representativas de 99,96% (…), e das respectivas condições de pagamento. Assim, concorda-se com o prazo proposto por V.Exas. para o pagamento das duas últimas tranches do preço global (…) que será pago em três tranches: a primeira, no montante de € 12.500.000,00 (…) com a celebração e produção de feitos do contrato de compra e venda das mencionadas acções, a segunda e terceira prestações, no valor de € 250.000,00 (…) cada uma, serão liquidadas, respectivamente, no primeiro e segundo aniversário da celebração e produção de efeitos do referido contrato (…). A MI (…) aceita ainda entregar duas garantias bancárias, no valor máximo de € 250.000,00 (…) cada uma, destinadas a assegurar ao pontual e integral pagamento das segunda e terceira prestações do preço. Como contributo para a célere formalização da compra e venda ora acordada, manifestamos a nossa inteira disponibilidade para iniciar a análise dos documentos e elementos já solicitados e referentes à C Park, S.A., seus activos e passivos imediatamente após a respectiva recepção (…)». 23) Em 13.01.2017, a Autora recebeu carta da Ré I, com o seguinte teor, além do mais que ora se dá por reproduzido, cf. doc. 14 junto com a p.i.: «Assunto – Condições de alienação de 99,96% das acções (…). A I (…), na qualidade de gestora e legal representante do Fundo de Investimento Imobiliário Imonegócios, detentor de 99,96% das acções (…), vem pela presente e no seguimento das negociações mantidas (…), comunicar formalmente os termos aprovados para a venda. Assim, em reunião de Conselho de Administração da entidade gestora, foram definidas as seguintes condições para a alienação: - Preço de venda: € 13.000.000,00 (…); - Forma de pagamento: a) € 12.500.000,00 (…), na data de assinatura do Contrato de Compra e Venda de Acções, a realizar imediatamente após a conclusão do processo de due diligence, a finalizar até 60 (…) dias a contar da presente data; b) € 250.000,00 (…), um ano após a data de assinatura do Contrato de Compra e Venda de Acções; c) € 250.000,00 (…), dois anos após a data de assinatura do Contrato (...). – Garantias associadas à operação: Na data de realização da Escritura Pública (…) deverão ser entregues à Sociedade Gestora, como garantia de bom pagamento do valor remanescente, no montante de € 500.000,00 (…) duas Garantias Bancárias, no valor de € 250.000,00 (…) cada uma, e que serão accionadas, ao final de 12 (…) e de 24 (…) meses, respectivamente, caso o pagamento não seja voluntariamente efectuado pela M I. Os restantes termos serão oportunamente definidos por acordo das Partes, aquando da discussão do clausulado do Contrato de Compra e Venda de Acções. (…)» 24) Na sequência das negociações entretanto mantidas pela Autora com a Caixa Económica Montepio Geral, esta comunicou-lhe, em 16.01.2017, a aprovação de um financiamento no montante de € 12.000.000,00 para a concretização da aquisição acordada. 25) Em 23.01.2017, a Autora constituiu, conjuntamente com uma sociedade sua participada, uma “SGPS” com a firma VFQ, SGPS, Lda., destinada exclusivamente à aquisição da participação social na C Park – cf. docs. 16 e 17 juntos com a p.i. 26) Em 23.02.2017, a Ré I enviou à Autora a carta, cuja cópia consta como doc. 18, com o seguinte teor, além do mais que ora se dá por reproduzido: «Assunto: Venda das acções representativas do capital social da sociedade C Park, SA Processo n.º 124/17.5BEAVR do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (1ª UO) Exmos. Senhores, Reportamo-nos à providência cautelar intentada contra a I (…) na qualidade de gestora do Fundo (…), titular da participação social representativa do capital social da C Park, S.A., cujo processo de venda se encontra a decorrer. Tomámos conhecimento de terem sido V.Exas. já citadas, enquanto contra-interessados (…). Ao abrigo dos princípios gerais da transparência e boa-fé que tutelam os negócios jurídicos (…), serve a presente para V/transmitir a nossa posição e estratégia relativamente à referida pretensão. (…) Na opinião da Abreu Advogados, é bastante provável que o TAF seja sensível aos nossos argumentos (sem que tal, naturalmente, constitua qualquer garantia de sucesso), pelo que, estaremos em condições de prosseguir com o projectado negócio de compra e venda da participação social em curso, sem quaisquer alterações ao planeado. Comprometemo-nos a manter V.Exas. informados de todos os desenvolvimentos deste processo e, caso os vossos mandatários desejem mais informações sobre o mesmo, teremos todo o gosto em coloca-los em contacto com os responsáveis deste processo do lado da A… Advogados. (…)» 27) Em 18.05.2017, a Ré I enviou à Autora a carta, cuja cópia consta como doc. 19, com o seguinte teor, além do mais que ora se dá por reproduzido: «Assunto: Processo de negociação da transmissão das acções representativas do capital sociedade C Park, S.A. Exmos Senhores, Na sequência da nossa reunião do passado dia 11 de Maio serve a presente carta para vos comunicar a decisão da I (…), na qualidade de legal representante do Fundo (…) relativamente à transmissão das acções (…). 3 – Entretanto, enquanto decorria o processo negocial referido no ponto anterior, (…) a I, na qualidade de legal representante (…) foi citada para um Procedimento Cautelar intentado pela BPJC – Gestão e Consultoria, S.A. (…) e Group MR, SGPS, S.A. (…) contra o Fundo (representado pela I), com indicação da MI como contra-interessada (…) e visava, entre outros, o decretamento da suspensão provisória da venda à MI da participação na C Park (e, consequentemente, a não outorga do contrato de compra e venda de acções). 4 – Assim que notificada do requerimento inicial da Providência Cautelar, a I (…) enviou uma comunicação à MI informando-a da suspensão do processo de venda da participação social da C Park até que fosse proferida decisão pelo TAF colocando-se, no entanto, à disposição da MI para prestar as informações que fossem necessárias, pessoalmente ou através dos seus mandatários. 5 – Posteriormente, a I tomou conhecimento de que, em 13 de Abril de 2017, a BPCJ e Group MR apresentaram uma Acção Administrativa contra o Fundo (…) [sendo] provável que constitua o processo principal (…). 7 – Acontece que, nessa sentença [proferida no procedimento cautelar] o TAF limitou-se a declarar a sua incompetência para analisar a questão suscitada pelos Autores, não tomando posição sobre a questão principal referente à validade da venda da participação social da C Park à MI. (…) 9 – Por outro lado, a BPCJ e a Group MR manifestaram (…) a sua intenção de recorrer da decisão do TAF (…) bem como de avançar judicialmente contra o Fundo e, possivelmente, contra a MI (…) colocando, mais uma vez, em causa o processo de venda (…). 10 – Ora, desconhecendo-se, nesta fase, as intenções da BPCJ e da Group MR relativamente ao processo de venda (…) e sua possível impugnação, e sendo compreensível desejo do Fundo que esse processo se consume em termos definitivos e inatacáveis, afigura-se desaconselhável, por elementares motivos de prudência, assumir os riscos inerentes à referida venda da participação social na C Park. 11 – No entanto, se e quando o Fundo voltar a ponderar a venda da referida participação social, a MI será contactada para, se assim o entender, participar nesse processo. (…)» 28) A Autora respondeu por carta datada de 13.07.2017, cf. doc. 20 cujo teor se dá por reproduzido, no qual, além do mais: manifestou a manutenção do seu interesse na aquisição da participação social, conferindo ao Réu I uma última possibilidade de formalização da compra e venda, para a qual mantinha o respectivo financiamento; e solicitou a entrega de documentos em falta, de modo a permitir a conclusão do processo de due diligence em curso, no prazo de 15 dias, sob pena de recurso aos meios judiciais para ressarcimento de danos e prejuízos. 29) A esta carta respondeu a Ré I também por carta, datada de 24.07.2017, na qual refere, em súmula e para o que aqui releva, cf. doc. 21 junto com a p.i.: ter sido notificada da apresentação de recurso e respectivas alegações por parte das requerentes do procedimento cautelar contra si intentado, tendo já procedido à entrega das contra-alegações; ainda não ter sido citada no âmbito da acção principal intentada pelas requerentes do procedimento cautelar, mas ter já conhecimento da existência de tal acção. 30) Por carta datada de 20.12.2017, dirigida à Ré I – cf. doc. 22 com a p.i. – a Autora reiterou o interesse na aquisição da participação social da C Park e declarou dispor-se a aumentar o preço de aquisição para € 13.350.000,00, tendo também informado que incorreu em custos acrescidos como consequência de o processo de formalização da venda ter sido abrupta e unilateralmente suspenso. 31) A Ré I respondeu por carta datada de 19.01.2018, com o seguinte teor, além do mais que ora se dá por reproduzido, cf. doc. 23 com a p.i.: «(…) cumpre informar que, conforme referido a outros interessados (…), é nosso desígnio retomar o respectivo processo de venda estando o caderno de encargos a ser elaborado por uma entidade independente contratada pela I (…). As informações sobre o processo de venda ficarão oportunamente disponíveis no nosso site, podendo V. Exas, ou quaisquer outros interessados, consultá-lo a qualquer momento. No entanto, refira-se desde já a este propósito que, um dos requisitos exigidos para a participação no referido processo de venda, será, evidentemente, a não existência de quaisquer litígios contra o Fundo I e/ou contra a I.» 32) A 26.01.2018, a Autora respondeu referindo, em síntese, que: face às comunicações precedentes, concluía que a Ré I havia recusado o aumento do preço proposto em 20.12.2017; face ao(s) litígios existentes entre as sociedades BPJC – Gestão e Consultoria, S.A. e Group MR, SGPS, S.A. e a R. I, havia que concluir que a participação destas no processo de venda da participação social da C Park, S.A. não seria permitida; face à exigência da inexistência de litígios para a participação no processo de venda da participação social da C Park, S.A., e à manutenção do seu interesse naquela aquisição, iria suspender o accionamento das competentes vias judiciais até à conclusão daquele mesmo processo de venda– cf. doc. 24 com a p.i. 33) Em 06.02.2018, a Autora foi notificada da sentença proferida pelo TAF de Aveiro indeferindo novamente a providência cautelar de suspensão provisória do acto de venda à Autora da participação social da C Park – cf. doc. 25 com a p.i. 34) A Autora foi contactada, em finais de Maio de 2018, por um director da KPMG Advisory – Consultores de Gestão, S.A. (KPMG), informando que esta empresa estava mandatada pela Ré I para retomar o processo de venda da participação social da C Park e que, para aceder à informação actualizada daquela sociedade seria necessário celebrar novo acordo de confidencialidade. 35) Tendo recebido a minuta do novo acordo de confidencialidade, agora redigido em língua inglesa, a A. constatou que o clausulado do mesmo continha uma declaração por parte da mesma garantindo a inexistência de qualquer litígio actual ou potencial contra os RR., o que significava que a Ré só permitia o acesso da Autora à informação actualizada da C Park caso a mesma renunciasse ao seu direito de accionar aqueles pelos prejuízos do anterior processo negocial. 36) A Autora propôs a eliminação, do clausulado de acordo de confidencialidade, da declaração de inexistência de qualquer litígio potencial (contingente litigation) contra os RR., o que, nessa ocasião, foi recusado, conforme email de 05.06.2018 (doc. 27 com a p.i.). 37) Em 28.09.2018, a participação social detida na C Park pelo R. Fundo I foi vendida pelo preço de € 15.576.000,00 à sociedade I, Lda., detida em partes iguais pelas referidas BPJC – Gestão e Consultoria S.A. e Group MR, SGPS, S.A.. 38) Com vista à celebração do negócio descrito nos autos, a Autora despendeu as seguintes quantias: i) – passou a ponto 38-A em consequência da impugnação da matéria de facto; ii. € 380,00 com custos de constituição e manutenção da VFQ, SGPS, Lda.; iii. a autora alocou/empenhou pessoal interno no estudo e desenvolvimento do processo de aquisição da C Park com dispêndio de tempo e valores não concretamente apurados. * (alterado em consequência da impugnação da matéria de facto). Ponto 38-A) - A autora pagou à sociedade de advogados PESA: i)- No mês de Janeiro de 2017 avença de 2.000€ mais IVA; ii)- No mês de Novembro de 2016 a avença de 2.000€ mais IVA; iii)- No mês de Dezembro de 2016 a avença de 2.000€ mais IVA. 39) A determinação do valor a apresentar como proposta de aquisição da participação social da C Park implicou estudo e análise detalhados da vasta documentação disponibilizada pelos RR., por profissionais qualificados, tendo em conta a quantidade de imóveis que se incluíam no negócio, e a complexidade das relações jurídicas que já se encontravam estabelecidas, nomeadamente ao nível de contratos de arrendamento e de cedência de espaço, de negociações com potenciais adquirentes e da verificação da rentabilidade que desses negócios pudesse advir para a A.. 40) (eliminado em consequência da impugnação da matéria de facto). 41) A Autora também alocou meios internos ao acompanhamento permanente das negociações, à preparação de documentos, à análise de questões que fossem sendo suscitadas, com vista ao sucesso da negociação. 42) No ano de 2016, a Autora gastou, com recursos humanos, um valor de cerca de € 289.000,00 – cf. IES doc. 39 com a p.i. 43) À data dos factos, a C Park S.A., era a proprietária de 20 imóveis, sendo que 6 deles constituem o parque empresarial denominado ‘C Park’, situado em Vila Nova de Gaia, no Porto, o qual ocupa a área onde anteriormente estava instalada a Electro Cerâmica, o qual está dividido em escritórios, espaços industriais, armazéns, espaços de retail e unidades residenciais, englobando ainda um terreno, cedido, em parte, a uma estação de serviço e, noutra, arrendado a uma empresa de transportes. 44) Este empreendimento é explorado comercialmente através de arrendamentos, cedências de espaços e de um direito de superfície (relativo à estação de serviço), tudo conforme informação preparada pela Ré I e disponibilizada à Autora. 45) Em Novembro de 2016, o valor mensal das rendas recebidas pela C Park ascendia a € 111.265,00, sendo que, no ano de 2017, o valor dos proveitos auferidos pela C Park ascendeu a € 1.921.825,00, como resulta do respectivo relatório financeiro. 46) No exercício de 2017, a C Park obteve um resultado líquido de € 547.329,00 e, em 2016, de € 865.163,00. 47) Em 2018, aquando da aprovação de contas do exercício de 2017, a C Park distribuiu dividendos ao Réu Fundo I no montante de € 6.000.000,00, conforme acta da assembleia geral de 21.09.2018 e deliberação do seu accionista único – docs. 29, pág. 67, e 42, pág. 7, juntos com a p.i., e 16 junto com a contestação. 48) Na reunião de 11 de Maio de 2017, referida na carta datada de 18.05.2017, a Ré I transmitiu à Autora o contexto à data dos acontecimentos relacionados com a acção judicial proposta pelas sociedades BPJC e MR Group, bem como os argumentos que aí estariam a ser esgrimidos e seu reflexo no processo negocial pendente entre as partes. 49) No início de 2017, o mercado imobiliário em Portugal estava em curva ascendente. 50) O Dr. LMF é um ex-administrador da Ré I e propôs-se intermediar a venda da C Park a potenciais interessados. 51) O ponto 9. do acordo de confidencialidade celebrado entre a Autora e a Ré consignou que o mesmo não vinculava as partes a celebrar qualquer contrato ou acordo futuro. 52) A sociedade VFQ, SGPS, S.A. tem como objecto social a «Gestão de participações sociais noutras sociedades como forma indirecta do exercício de actividades económicas» e actualmente ainda se encontra activa. 53) A proposta que a Autora apresentou em 20.12.2017 (doc. 22 com a p.i. e facto provado 30) era válida até 31.01.2018 e estava sujeita às seguintes condições: (i) «realização e conclusão satisfatória de um processo de due diligence à C Park e aos seus activos e passivos»; (ii) «negociação e produção de documentação contratual em termos aceitáveis para as partes»; e (iii) «obtenção dos financiamentos necessários por parte da MI (…)». 54) Dessa mesma proposta, constava, ainda, o seguinte: «Caso o contrato de compra e venda da referida participação social não se encontre concluído no prazo de seis meses a contar da presente data, o mencionado valor de € 350.000,00 considerar-se-á imediatamente vencido (…). De igual modo, consideraremos aquela quantia vencida na data em que seja conhecida a adjudicação da participação social da C Park, S.A. a outra ou outras entidades, devendo V.Exas. proceder ao respectivo pagamento no prazo de 15 dias a contar do envio da nossa notificação (…)». 55) A KPMG, contratada pela Ré I para a prestação de serviços de avaliação e assessoria financeira na venda das participações sociais do Fundo na C Park, contactou cerca de quarenta potenciais interessados na aquisição dessas participações sociais. 56) A KPMG contactou a Autora em Maio de 2018, a cujo administrador transmitiu que estava mandatada para iniciar novo processo de venda das participações sociais e, na sequência desse contacto, enviou a esta por email, em 23.05.2018, o “teaser” (prospecto de apresentação da sociedade e do empreendimento) e o acordo de confidencialidade (“NDA”) – cf. doc. 5 junto com a contestação. 57) Em 28.05.2018, a Autora respondeu ao email com comentários ao NDA, em particular na sua cláusula 12, pretendendo retirar a expressão “não existência de litígios contingentes”. 58) A KPMG respondeu em 01.06.2018, recusando a substituição da expressão “pending or contingent litigation” por “pending legal proceedings”. 59) A Autora replicou no mesmo dia e pela mesma via, declarando o seguinte, cf. doc. 8 junto com a contestação: «Perante a recusa da alteração contratual por nós proposta e por forma a permitir a solicitada resposta ao vosso email desta tarde, agradeço que nos informem o que entende a I por ‘pending or contingente litigation’». 60) Em 05.06.2018, a KPMG contactou telefonicamente a Autora respondendo à questão por esta colocada e nesse mesmo dia formalizou por email a sua resposta, informando que a proposta de alteração da cláusula (12), mais precisamente a substituição da expressão “pending or contingent litigation” por “pending legal proceedings” não havia sido aceite pela I e a solicitar confirmação sobre se poderiam emitir o NDA em versão final. 61) Os demais interessados na aquisição das participações sociais na C Park já haviam concordado com a redacção do NDA, incluindo a aludida cláusula 12. 62) Em 06.06.2018, a Autora respondeu à KPMG nos seguintes termos, conforme consta de doc. 9 junto com a contestação: «(…) Em face à ausência de resposta ao pedido de esclarecimentos formulado no nosso email da passada sexta-feira (1 de Junho) e perante a intransigente e injustificada recusa da I relativamente à simples alteração proposta ao texto do Acordo de Confidencialidade, posição essa, aliás, em clara contradição com o afirmado pela vossa cliente em carta de 19/01/2018, consideramos que a MI, SGPS, S.A., está a ser injusta e ilegitimamente impedida de participar no presente processo de venda das acções representativas do capital social da C Park, S.A.. Perante esta conduta (…), somos forçados a accionar as competentes vias judiciais para tutela dos nossos direitos, designadamente para ressarcimento integral dos prejuízos sofridos em resultado da recusa da vossa cliente em formalizar a venda da mencionada participação social em Janeiro de 2017 (…)». 63) Poucos dias após esta comunicação, a I aceitou o pedido de alteração da redacção da cláusula 12 do NDA, nos termos pretendidos pela Autora. 64) Os Réus, por intermédio da KPMG, tentaram por diversas vezes contactar a Autora por telefone para lhe transmitir essa aceitação, por telefone, sem sucesso. 65) Em 14.06.2018, a KPMG enviou à Autora o email cuja cópia consta como doc. 10 com a contestação, com o seguinte teor, além do mais que ora se dá por reproduzido: «(…) Tentei ligar estes últimos dias, mas sem sucesso. A nossa Cliente (…), reconsiderou o V/pedido de alteração do acordo de confidencialidade. Pelo exposto, segue em anexo a respectiva minuta, já com a alteração solicitada introduzida, para que façam o favor de nos remeter a mesma devidamente assinada. (…)» 66) Nos dias seguintes, a KPMG tentou novamente o contacto telefónico com a Autora, sempre na pessoa do seu administrador José Q, sem sucesso. 67) Em 19.06.2018, a KPMG enviou à Autora o email cuja cópia consta como doc. 11 com a contestação, com o seguinte teor, além do mais que ora se dá por reproduzido: «(…) Na sequência do último email, tentei entrar em contacto consigo nos últimos dias, mas sem sucesso. Gostaríamos de saber se já teve oportunidade de analisar o referido email. Permanecemos à V/ inteira disposição para qualquer esclarecimento que entendam necessário e na expectativa da recepção do acordo de confidencialidade devidamente assinado (…).» 68) Em 21.06.2019, a Autora respondeu à KPMG, nos seguintes termos, conforme doc. 12 com a contestação: «Caro VM, Em resposta aos emails de 14 e 19 de Junho, os quais, aliás, mereceram a minha melhor atenção, comunico que a postura que vem sendo assumida pela I não oferece garantias que a MI (…) será tratada neste processo de venda (…) de forma imparcial, justa e em igualdade com os demais eventuais interessados. Por conseguinte, não tenciona esta sociedade alterar a posição transmitida no email de 6 de Junho (…).» 69) A KPMG voltou a tentar contactar novamente a Autora, sem resposta, e enviou nova comunicação escrita em 21.06.2019, solicitando a devolução do contacto – cf. doc. 13 junto com a contestação. 70) No processo n.º 124/17.5BEAVR, pendente no TCA Norte, as partes (BPJC, S.A. e MR Group, S.A., como Requerentes, e I, S.A., por si e enquanto sociedade gestora do Fundo I, como Requeridos), requereram, em 26.06.2018, a homologação da desistência de todos os pedidos aí formulados, por inutilidade superveniente dos mesmos devido à retoma das diligências com vista à venda da participação social na C Park, e a transacção quanto a custas – cf. doc. 14 com a contestação. 71) Em 20.07.2018, a KPMG apresentou aos Réus um documento de comparação das melhores ofertas apresentadas, uma pelas sociedades BPJC, S.A e Group MR., S.A. e outra pela MSeven – cf. doc. 15 junto com a contestação. *** FACTOS NÃO PROVADOS a) Que a Ré I negociou e acordou com as sociedades BPJC e Group MR o termo da acção principal por estas instaurada na condição de estas virem a adquirir a C Park (art.º 63º da p.i.); b) Que, atendendo ao clima de curva ascendente do mercado imobiliário, o Réu Fundo resolveu efectuar uma consulta ao mercado para aferir de uma possível venda das acções representativas do capital social da C Park (artigo 83º da contestação); c) Que, na reunião de 11.05.2017, a Ré I transmitiu à Autora a sua intenção de não prosseguir com o processo negocial (parte do artigo 150º da contestação); d) Que a Autora esteja, ou estivesse à data dos factos, em condição económico-financeira frágil (artigos 269º e seguintes da contestação). *** 3- As Questões Enunciadas. Por uma questão de precedência lógica, inicia-se a apreciação dos recursos, pela impugnação da matéria de facto efectuada pelas rés. 3.1- Impugnação da Matéria de Facto. As rés, no recurso que interpõem, impugnam a decisão do tribunal a quo quanto aos pontos 24, 38, 40 e 41 dos factos provados. Vejamos cada uma dessas impugnações. Ponto 24. Defendem as rés que não ficou provado que o Montepio tenha aprovado o financiamento de 12.000.000,00€ à autora. Argumentam, em sínteses, que o simples email junto pela autora não é documento suficiente para demonstrar a aprovação de financiamento desse montante, que tem de cumprir certos formalismos, como a autorização pela administração do banco e a produção de documentação relevante; e que do depoimento da testemunha RO não resulta demonstrada inequivocamente a aprovação do financiamento. Caso se entenda que a aprovação do financiamento foi aprovada, deve acrescentar-se o prazo de validade da proposta de aprovação do financiamento. Passando o facto a ter a seguinte redacção: “Na sequência das negociações entretanto mantidas pela Autora com a Caixa Económica Montepio Geral, esta comunicou-lhe, em 16.01.2017, a aprovação de um financiamento no montante de €12.000.000,00 para a concretização da aquisição acordada, cuja validade terminava em 10.02.2017. Nesta data o financiamento caducou, não se tendo renovado nem a Recorrida apresentou qualquer pedido de renovação.” Será assim? Antes de mais, recorde-se a redacção dada pela 1ª instância ao ponto 24: “24) Na sequência das negociações entretanto mantidas pela Autora com a Caixa Económica Montepio Geral, esta comunicou-lhe, em 16.01.2017, a aprovação de um financiamento no montante de € 12.000.000,00 para a concretização da aquisição acordada.” E vejamos a fundamentação do tribunal a quo sobre este ponto de facto: “Quanto ao ponto 24, valeu a mensagem de correio electrónico cuja cópia constitui o doc. 15 junto com a p.i. (datado de 16.01.2017), cujo teor foi confirmado pela testemunha RO, bancário do Montepio Geral que, à data, tratou do processo de financiamento solicitado pela Autora, de cuja confirmação aquela mensagem é demonstrativa. Valeu, também, o depoimento da testemunha DM, responsável financeiro da Autora que, no âmbito deste mesmo processo, manteve contactos com o referido RO junto do Montepio Geral, confirmando que o financiamento foi aprovado nos termos que constam do já citado email.” Pois bem, desde já se adianta que somos a concordar com a decisão da 1ª instância. Na verdade, pelo email de 16/01/2017 (doc. 15 da p.i.), enviado por RO, do Montepio, para o administrador da autora, é comunicada a aprovação do financiamento de 12.000.000€ para aquisição da empresa C Parque SA. A testemunha RO, no seu depoimento confirmou, inequivocamente, a aprovação do financiamento nesse valor. O que nos parece é que as rés confundem aprovação do financiamento com concretização do financiamento: apenas nessa concretização se exige outra documentação, com discriminação de valores, amortizações, prazos, garantias e demais condições. Na simples informação de que foi aprovado o financiamento, não se exigem esses formalismos. Quanto à pretendida alteração, subsidiária, da redacção do ponto 24, com a menção à data do termo da proposta de financiamento e referência à “respectiva” caducidade, é factualidade que não poderá ser aditada pela simples razão de não ter sido alegada por qualquer das partes: não foi alegada pela autora – como decorre, a contrario, dos pontos 31, 32 e 33 da p.i – nem invocado pelas rés: apenas faz referência ao email no ponto 112º da contestação e é referido no ponto 113º “Sendo que o mesmo encontrar-se-ia supostamente válido apenas até 10 de fevereiro de 2017 e sujeito a manifestação de interesse pela A.”. E, não se tratando de matéria de excepção, não pode ter lugar a aplicação do art.º 5º nº 2 do CPC. A esta vista, resta concluir que não existe fundamento para alterar o ponto 24º dos factos provados. - Quanto ao ponto 38. Segundo as rés, o ponto 38 dos factos provados deve ser considerado não provado porque, entendem, não foi demonstrado o pagamento de 6.000€ de honorários com advogados com trabalho despendido no estudo e análise do processo de aquisição da C Park porque se tratava de uma avença mensal e, como tal, sempre seria paga; a VFQ, SGPS, SA, constituída para a aquisição da C Park, veio a ser utilizada para um outro activo; e, não foi feita prova segura dos recursos humanos efectivamente utilizados, tempo despendido e custo pessoa/tempo na análise/estudo da operação de aquisição da C Park. Para o efeito, invoca, em síntese, quanto ao valor de 6.000€ de honorários com advogados, que a sociedade de advogados que assessorou o estudo do projecto de aquisição da C Park já tinha contrato de avença com a autora conforme resulta das próprias facturas juntas e mencionaram as testemunha GC e DM. No que toca ao valor de 380€ gastos com a constituição da sociedade VFG, SGPS, SA deve ser dado como não provado porque essa SGPS veio a ser utilizada num outro activo adquirido, conforme disse a testemunha DM. Igualmente, no que respeita ao valor de 52.983,34€ alegadamente despendido com recursos humanos utilizados na análise, estudo e desenvolvimento do projecto de aquisição da C Park, porque o documento junto não indica os funcionários que estiveram a desenvolver trabalho no projecto, as funções desempenhadas e respectivos salários e, além disso, o quadro que compõe o documento 37 da p.i e no qual se baseou o tribunal, não é compatível com os factos provados em 12 a 15 porque apenas a partir de 18/11/2016 é que os documentos relativos à C Park foram disponibilizados à autora. A testemunha FB reconheceu que antes de meados de Novembro de 2016 não tinha iniciado o estudo do projecto de aquisição da C Park. A testemunha DM disse ter terminado o relatório de avaliação da C Park a entre 15 a 20 de Dezembro de 2016. Além disso, a testemunha não conseguiu explicar como calculou as percentagens das pessoas afectas a processo; dizem tratar-se de tabela com números lançados arbitrariamente. Além disso, ficou provado que a análise jurídica e financeira ficou concluída entre 15 a 20/12/2016. Vejamos. Recorde-se a redacção do ponto 38: “38) Com vista à celebração do negócio descrito nos autos, a Autora despendeu as seguintes quantias: i. € 6.000 com honorários de Advogados; ii. € 380,00 com custos de constituição e manutenção da VFQ, SGPS, Lda.; iii. € 52.983,34 de custos com recursos humanos alocados ao desenvolvimento do processo de aquisição da C Park.” Para fundamentar a sua decisão quanto a este (e outros) pontos de facto, a 1ª instância escreveu: “No que concerne à prova sobre os pontos 38 a 42, o Tribunal fundou a sua convicção nos documentos apresentados pela Autora com a p.i., correspondentes aos n.ºs 32-33 (para a al. a) do facto 38), 44-46 (para al. b) do mesmo facto) e 37 (al.c)) e, ainda, 39 (para o ponto 42), devidamente complementados pela prova testemunhal produzida, nomeadamente prestada pelos colaboradores da Autora FB (que declarou ter estado plenamente envolvida no projecto cerca de seis meses e demonstrou conhecimento concreto sobre o empreendimento C Park), DM, já referido (enquanto responsável financeiro da Autora, que acompanhou de perto o projecto, mais concretamente a due diligence), de cuja autoria é, designadamente, o documento 37; este documento, pese embora o facto de constituir um mero apontamento, serviu para sistematizar os valores invocados pela Autora, no que respeita os recursos humanos por si alocados a este projecto, tendo a testemunha sido credível e rigorosa na explicitação dos valores ali inseridos (conforme alegado no artigo 134º da p.i.), também por referência ao quadro com valores remuneratórios junto posteriormente em ref. 29500722 (09.06.2021) e aos extractos de declaração de remunerações junto da Segurança Social (docs. 99 a 110 juntos em ref. 30609638, de 22.10.2021) – razão pela qual, portanto, se atendeu a este meio de prova. Aliás, o teor deste documento está, também, em consonância com os documentos 38 e 39, cujo teor também foi esclarecido por esta mesma testemunha, dado tratar-se de informação financeira/contabilística cuja sistematização é de sua responsabilidade. Enfim, a prova sobre estes elementos suportou, também, os valores alegados pela Autora e dados como provados no próprio ponto 38, por traduzirem a demonstração do apuramento dos valores aí consignados.” Vejamos se pode ser assim. Começando pelo valor de 6.000€ correspondente a honorários de advogados. Diz-se na redacção do ponto 38 que “Com vista à celebração do negócio previsto nos autos, a Autora despendeu as seguintes quantias: i)- 6.000€ com honorários de advogados;” A questão que se coloca é a de saber se esse valor pago pela autora a advogados teve como causa o trabalho jurídico destes com vista à aquisição da C Park. Ora bem, decorre dos depoimentos das testemunhas GC e DM, que a autora tinha um contrato de avença com o escritório dos Mandatários da autora, pela qual pagava um valor mensal de 2.000€ (mais IVA); que esse valor era fixo e não dependia de maior ou menor trabalho despendido com questões da sociedade autora. Trata-se, por isso, de uma despesa permanente, enquanto durar a avença, e não uma despesa feita com aquela finalidade específica. Não é um custo finalizado ou específico, que não seria feito se não existisse o projecto de aquisição da C Park. Estudassem ou não o processo de aquisição da C Park, o escritório dos mandatários da autora receberia sempre o mesmo valor mensal da avença e a autora pagaria, na mesma, esse valor. Portanto, o que apenas pode ser considerado provado é que a autora pagou à sociedade de advogados, o que é referido nas facturas juntas como documentos 31, 32 e 33: no mês de Janeiro de 2017 avença de 2.000€ mais IVA; no mês de Novembro de 2016 a avença de 2.000€ mais IVA; no mês de Dezembro de 2016, a avença de 2 000€ mais IVA. Assim, o ponto 38 dos factos provados terá de ser alterado em conformidade, passando a constar: - Ponto 38-A: A autora pagou à sociedade de advogados PESA: i)- No mês de Janeiro de 2017 a avença de 2.000€ mais IVA; ii)- No mês de Novembro de 2016 a avença de 2.000€ mais IVA; iii)- No mês de Dezembro de 2016, a avença de 2.000€ mais IVA. Consequentemente, elimina-se trecho correspondente à alínea i) do ponto 38 dos factos provados. Quanto ao valor de 380€ com custos de constituição da sociedade gestora participações sociais VFQ, SGPS, Lda. Ficou demonstrado que essa sociedade gestora de participações sociais foi constituída, em 23/01/2017, como decorre, desde logo, da respectiva matrícula junta aos autos como documento 17 da petição inicial. Mais se provou o custo respectivo, como decorre dos documentos juntos 44, 45 e 46 da petição inicial. Igualmente, provou-se que essa sociedade gestora de participações sociais foi constituída com vista à aquisição da C Park, conforme foi mencionado pela testemunha DM e referido pelo legal representante da autora. Se posteriormente essa sociedade gestora de participações sociais, passados cerca de quatro anos, “foi aproveitada” para a aquisição de outro activo, é facto que aqui não releva. O que se demonstrou foi que a constituição dessa SGPS teve em vista o negócio de aquisição da C Park. A esta vista, mantem-se o ponto 38 ii) dos factos provados. Quanto 52.983,34 de custos com recursos humanos alocados ao desenvolvimento do processo de aquisição da C Park, dado como provado no ponto 38 iii). Defendem as rés que não foi feita prova dos montantes/valores despendidos pela autora, com pessoal interno alocado ao estudo e desenvolvimento do processo de aquisição da C Park. Invocam que as datas mencionadas na tabela junta como documento 37 da p.i. não correspondem e estão em contradição com as datas consideradas nos pontos 12 a 15 dos factos provados porque, somente em 18/11/2016, após assinatura do acordo de confidencialidade em 04/11/2026, é que a ré disponibilizou à autora os elementos contabilísticos, financeiros, urbanísticos e construtivos necessários ao estudo do processo de aquisição da C Park. E só foi a partir dessa data que os quadros técnicos da autora iniciaram a análise desses elementos da C Park (ponto 15). Que a testemunha FB confirmou que somente em Novembro de 2016 ficou direcionada para o projecto da C Park. E do depoimento da testemunha DM decorre que o relatório da aquisição da C Park ficou terminado em 15 ou 20 de Dezembro de 2016. Além disso, a testemunha DM, que elaborou a tabela junta como documento 37 da p.i., não concretizou como chegou às percentagens de alocação dos colaboradores internos da autora ao estudo da aquisição da C Park. Vejamos. Voltemos a recordar a fundamentação da 1ª instância quanto a, entre outros, o ponto 38 dos factos provados: “No que concerne à prova sobre os pontos 38 a 42, o Tribunal fundou a sua convicção nos documentos apresentados pela Autora com a p.i., correspondentes aos n.ºs 32-33 (para a al. a) do facto 38), 44-46 (para al. b) do mesmo facto) e 37 (al. c)) e, ainda, 39 (para o ponto 42), devidamente complementados pela prova testemunhal produzida, nomeadamente prestada pelos colaboradores da Autora FB (que declarou ter estado plenamente envolvida no projecto cerca de seis meses e demonstrou conhecimento concreto sobre o empreendimento C Park), DM, já referido (enquanto responsável financeiro da Autora, que acompanhou de perto o projecto, mais concretamente a due diligence), de cuja autoria é, designadamente, o documento 37; este documento, pese embora o facto de constituir um mero apontamento, serviu para sistematizar os valores invocados pela Autora, no que respeita os recursos humanos por si alocados a este projecto, tendo a testemunha sido credível e rigorosa na explicitação dos valores ali inseridos (conforme alegado no artigo 134º da p.i.), também por referência ao quadro com valores remuneratórios junto posteriormente em ref. 29500722 (09.06.2021) e aos extractos de declaração de remunerações junto da Segurança Social (docs. 99 a 110 juntos em ref. 30609638, de 22.10.2021) – razão pela qual, portanto, se atendeu a este meio de prova. Aliás, o teor deste documento está, também, em consonância com os documentos 38 e 39, cujo teor também foi esclarecido por esta mesma testemunha, dado tratar-se de informação financeira/contabilística cuja sistematização é de sua responsabilidade. Enfim, a prova sobre estes elementos suportou, também, os valores alegados pela Autora e dados como provados no próprio ponto 38, por traduzirem a demonstração do apuramento dos valores aí consignados.” Pois bem, analisada a prova, afigura-se-nos que as rés têm parcialmente razão. Com efeito, a tabela que constitui o documento 37 da p.i., e que serviu de suporte à alegação do ponto 134º desta peça processual, refere-se a períodos temporais e a percentagens de tempo com o empenho do pessoal interno no estudo da proposta de aquisição da C Park. A questão que se coloca é a de saber se, por um lado, os períodos temporais – 15/06/2026 a 11/10/2026; 11/10/2026 a 04/11/2026; 04/11/2027 a 13/01/2027; e, 13/01/2017 a 13/05/2017 – e as percentagens de empenho do pessoal se podem considerar provados. Isto porque, quando à despesa de gastos com o pessoal, admite-se que ronde os 289 000€/ano, conforme decorre dos documentos 38 (demonstração de resultados) e 39 (IES) e, de resto, foi dado como provado no ponto 42. Ora, salvo o devido respeito entende-se que não podem considerar-se como provados nem aqueles períodos temporais, nem as percentagens de empenho/dedicação do pessoal interno ao estudo do processo de aquisição da C Park. Na verdade, quanto aos períodos temporais, importa ter em consideração que no ponto 7 dos factos provados ficou demonstrado que em 15/06/2016, LMF, mandatado pela ré, indagou a autora sobre estar interessada na aquisição da C Park e, enviou cópias dos relatórios de avaliação do acervo imobiliário da C Park, que constituem os documentos 2-1 (com 66 folhas) 2-2 (com 102 folhas) e 3 (com 82 folhas). Provou-se, no ponto 8, que com a recepção dessa documentação os quadros técnicos da autora procederam à respectiva análise técnica, com a consequente resposta de falta de interesse pela autora. Porém, desconhece-se o tempo, rectius, período de tempo que perdurou o estudo dessa documentação até à resposta da autora. Só posteriormente, somente em Outubro de 2016, (11/10/2016), é que a autora voltou a receber proposta da ré para a aquisição da C Park e, a autora propôs o valor de 10.000.000€ (ponto 10). A ré respondeu com a contraproposta de 12.000.000€ (ponto 11). Posteriormente, após a assinatura de acordo de confidencialidade (04/11/2016), a ré remeteu à autora, a 18/11/2016, os elementos contabilísticos, financeiros, urbanísticos e construtivos da C Park (ponto 14) e, logo após a recepção desses elementos, os quadros técnicos da autora e os advogados iniciaram a análise desses elementos e visita detalhada aos imóveis, que culminou com as conclusões sumárias em 13/12/2016 (ponto 15) e proposta de aquisição por 12.000.000€ (doc. 10 da p.i.). Por a ré entender que a proposta de 12.000.000€ era baixa, retorquiu com pedido de apresentação de proposta em alta (ponto 17), o que a autora fez em 04/01/2017, propondo duas alternativas de preço/pagamento (ponto 18) e levou à contraproposta da ré de 13.000.000€ em 06/01/2017 (ponto 20) e a nova contraproposta da autora em 09/01/2017 (ponto 22); e a nova contraproposta da ré, a 13/01/2017, a aceitar a venda conforme consta do ponto 23. Em 23/02/2017, a ré informou a autora da pendência do procedimento cautelar de suspensão da venda (ponto 26). Pois bem, desta factualidade não decorre que tenham sido, necessária e integralmente preenchidos com estudos relativos à aquisição da C Park os períodos temporais mencionados no documento 37. De resto, a testemunha FB referiu que trabalhou no desenvolvimento do projecto de arquitectura até à sua saída da autora. Por outro lado, no que concerne à alegada percentagem de empenho do pessoal interno da autora no estudo do processo de aquisição da C Park, o único meio de prova produzido acerca do respectivo cálculo foi o depoimento testemunhal DM – que elaborou o documento 37 da p.i e fez constar na quarta coluna essas percentagens de empenho - que, concretamente, questionado sobre qual o critério de imputação das percentagens de empenho do pessoal interno da autora no estudo do processo da C Park, não conseguiu responder, referindo que foi um cálculo razoável. A esta luz, não podem considerar-se como provado o dispêndio de 52.983€ com pessoal interno alocado ao projecto. Apenas se pode concluir que a autora alocou ou empenhou pessoal interno no estudo e desenvolvimento do processo de aquisição da C Park com dispêndio de tempo e valores não concretamente apurados. Altera-se, em conformidade, o ponto 38 iii) dos factos provados. - O ponto 40 dos factos provados. Entendem as rés que o ponto 40 deve ser dado como não provado. Invocam, para o efeito, os argumentos que haviam utilizado sobre o ponto 38 i): que a autora não contratou uma equipa de advogados que durante três meses a auxiliaram na realização da due diligence porque já tinha um contrato de avença com essa sociedade de advogados. Pois bem, afigura-se-nos que as rés têm razão neste aspecto. Mesmo que os advogados da sociedade PESA tenham auxiliado/assessorado a autora no processo de due diligence - facto que não se põe em causa - a verdade é que, conforme se viu a propósito do ponto 38 i), a autora tinha um contrato de avença com essa sociedade de advogados e, por isso, não pode dizer-se que a autora contratou essa sociedade de advogados, durante três meses, com vista a auxiliarem-na no processo de due diligence. Apenas se pode considerar provado o que passou a constar do ponto 38-A: “A autora pagou à sociedade de advogados PESA: i)- No mês de Janeiro de 2017 a avença de 2.000€ mais IVA; ii)- No mês de Novembro de 2016 a avença de 2.000€ mais IVA; iii)- No mês de Dezembro de 2016, a avença de 2.000€ mais IVA.” Assim, elimina-se dos factos provados o ponto 40. - Ponto 41 dos factos provados. Entendem as rés que se verifica uma total ausência de prova quanto à factualidade do ponto 41. Pois bem, recordemos o ponto 41 dos factos provados: “41) A Autora também alocou meios internos ao acompanhamento permanente das negociações, à preparação de documentos, à análise de questões que fossem sendo suscitadas, com vista ao sucesso da negociação.” Ora bem, como se referiu acima a propósito da fundamentação, pela 1ª instância, do ponto 38 dos factos provados, teve em conta, quanto a este ponto, os depoimentos de DM e de FB. Analisados estes depoimentos decorre que a FB mencionou cada um dos colaboradores da autora que participaram no estudo do processo de aquisição da C Park. Concretamente, mencionou, além dela própria, o DM, director financeiro da autora, GG, contabilista, GC, arquitecto, JG, arquitecta, RS, financeira, SG, financeira e, SPC, gestora de eventos. E o mesmo foi dito pela testemunha DM. Pois bem, à luz destes depoimentos, somos a entender que não há fundamento para alterar a decisão da 1ª instância quanto ao ponto 41 dos factos provados. Em face do que se expôs conclui-se que procede parcialmente a impugnação da matéria de facto feita pelas rés. *** 3.2- A revogação da sentença com a absolvição das rés do pedido. Defendem as rés que não podia a 1ª instância ter considerado e decidido que houve uma ruptura ilícita das negociações por banda das rés porque, em rigor não estavam sequer negociadas as condições e documentação contratual final ou sequer as cláusulas do contrato promessa de aquisição das acções do capital social da C Park. Além disso, a interrupção das negociações não ocorreu de forma abrupta e injustificada, mas motivada pela interposição de procedimento cautelar, por terceira, para suspensão do processo de venda. A 1ª instância entendeu estarmos perante uma situação de responsabilidade pré-contratual na vertente de recusa ilegítima de conclusão do contrato, argumentando: “…haverá lugar a responsabilidade pré-contratual por rotura das negociações se a frustração das expectativas legítimas de uma das partes na celebração do negócio for imputável à contraparte e desde que esta última tenha criado uma situação de confiança na celebração efectiva do negócio” (…) “No caso, a factualidade demonstrada indica que as partes discutiram e negociaram os termos essenciais do contrato, em termos tais que, razoavelmente, a Autora poderia esperar a sua efectiva celebração. De facto, demonstrou-se que as partes acordaram, designadamente, (i) no objecto da transacção, (ii) no preço e (iii) na forma de pagamento” (…) “Ficaram, assim, demonstrados todos os requisitos supra mencionados para a formação da responsabilidade pré-contratual: pois que a troca de correspondência entre as partes corporizou um acordo de vontades, necessário e suficiente à celebração de um contrato, criadora e indutora de confiança, de uma das partes na outra, no sentido em que o contrato seria celebrado; a Autora investiu a sua confiança no projecto contratual e agiu de acordo com essa confiança; o contrato não aconteceu e a confiança da Autora saiu frustrada por facto imputável à Ré, a mesma que nisso a havia induzido. Está assim, portanto, identificado o direito da Autora a indemnização por responsabilidade pré-contratual.” Será assim? Estabelece o art.º 227º nº 1 do CC, com epígrafe “Culpa na formação dos contratos”, que: “1. Quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte.” A doutrina e a jurisprudência vêm reconhecendo que o preceito trata da chamada “responsabilidade pré-contratual” porque, por regra, tem origem em comportamentos, por acção ou por omissão, ocorridos antes da conclusão de um “contrato perfeito”. Em termos simples, pode dizer-se que essa responsabilidade pré-contratual emerge da circunstância de, ao entrarem em negociações as partes saírem do círculo de deveres puramente negativo dos contactos extracontratuais, entrando na vinculação positiva da esfera contratual e, por isso, têm o dever de empregar, na própria contratação, a diligência necessária a evitar ocorrência de danos na contraparte. O simples facto de se entrar em negociações é susceptível de criar uma situação de confiança na outra parte, confiança essa que é imediatamente tutelada pelo direito mesmo antes da conclusão do contrato. Do dever de actuar segundo a boa fé, derivam três tipos de deveres pré-negociais: i)- Deveres de Protecção que determinam que as partes, na fase negocial, devem evitar qualquer actuação susceptível de causar danos à outra parte, sejam eles pessoais ou patrimoniais; ii)- Deveres de Informação, em especial quanto às circunstâncias que possam ser relevantes para a formação do consenso da outra parte; iii)- Deveres de Lealdade, por forma a evitar comportamentos que se traduzam numa deslealdade para com a outra parte, aqui se incluindo a própria ruptura das negociações quando a outra parte tenha adquirido, justificadamente, a confiança de que ela iriam conduzir à celebração do contrato. (Cf. Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. I, 7ª edição, pág. 360). De acordo com Galvão Telles (Direito das Obrigações, 7ª edição, pág. 71), no “iter contractus” há que distinguir, normalmente, duas fases: i) - face negociatória, constituída pelos actos tendentes à celebração do contrato, desde os primeiros contactos estabelecidos entre as partes até à conclusão do acordo…; ii) - Fase decisória, constituída pela conclusão do acordo resultante de duas declarações vinculativas…” (…) “Em ambas as fases e portanto em todo o percurso do caminho contratual, devem as duas partes proceder segundo as regras da boa fé de tal modo que se alguma delas assim não agir responderá pelos danos que culposamente causar à outra parte.” E continua aquele Professor que podem gerar-se fundamentalmente, três situações, sendo uma delas “…as negociações interrompem-se e, portanto, o contrato não chega a concluir-se.” Posteriormente, a págs. 76 e seg., esclarece que a responsabilidade pela ruptura das negociações ocorre na fase negociatória. “As partes não estão obrigadas a concluir o contrato. Seria absurdo que sobre elas impendesse tal obrigação.” (…) “Claro que também aqui há que proceder segundo as regras da boa fé e a parte que romper as negociações ou provocar essa ruptura com violação de tais regras incorre em responsabilidade aquiliana por exercício abusivo do seu direito (…) A ruptura é livre, mas não pode ser arbitrária, deixando de ser legítima quando configure um abuso de direito, pelas circunstâncias em que foi operada ou pelo modo como o foi.” A este propósito de as partes não estarem, por regra, obrigadas a concluir os contratos, Menezes Leitão salienta “Apenas quando na outra parte tenha sido criada uma confiança justificada de que o contrato iria ser concluído e ocorre uma ruptura das negociações sem motivo legítimo é que se pode considerar ter ocorrido uma violação das regras da boa fé, único caso em que a responsabilidade pré-contratual se aplica.” (Direito das Obrigações…, cit., pág. 361). Destes ensinamentos, podemos adiantar que não basta uma não conclusão do contrato que tinha gerado expectativas legítimas à contraparte: é necessário que essa recusa seja injustificada e violadora das regras da boa fé. Por outro lado, o próprio art.º 227º nº 1, exige a violação culposa dos deveres de boa fé: de lealdade ou de informação ou de protecção. Explicitando. A previsão do art.º 227º nº 1 analisa-se em três elementos: 1º- Que haja uma acção ou uma omissão de um dos contraentes; 2º- Que a acção ou omissão cause uma violação dos deveres pré-contratuais; 3º- Que a violação dos deveres pré-contratuais causa um dano. (Cf. Numo Pinto Oliveira, Princípios de Direito dos Contratos, pág. 208 e seg.). E continua este autor “O segundo requisito é o da ilicitude e o terceiro, o da culpa. A ilicitude é um juízo de censura dirigido à acção (ou à omissão) por ser contra o direito; a culpa é um juízo de censura dirigido à pessoa de quem age (ou à pessoa de quem omite), por ter agido contra o direito quando podia e devia ter agido conforme ao direito.” E mais adiante explicita “O dever de continuação das negociações para a conclusão de um contrato (…) e o dever de conclusão do contrato não devem constituir um afloramento, concretizações ou explicitações de um (alegado) dever geral de corresponder às expectativas alheias; consequentemente, não pode retirar-se da (justificada) recusa de um dever geral de corresponder às expectativas alheias a (injustificada) recusa de um dever específico de continuação das negociações para a conclusão de um contrato, ou de um dever específico de conclusão do contrato projectado.” (Princípios…cit., pág. 211). * (sublinhados nossos). Portanto, podemos concluir que para que se possa falar em responsabilidade civil pré-contratual, além de não bastar uma recusa de conclusão do contrato que tinha gerado expectativas legítimas à contraparte, é necessário que essa recusa seja ilícita por se traduzir em injustificada violação das regras da boa fé e, ainda é necessário que seja culposa, por o contraente não ter agido, quando podia, conforme às regras de boa fé e aos deveres de lealdade, informação e protecção. Dito isto, vejamos o caso dos autos. A 1ª instância bastou-se com a inferência de o estado das negociações – com identificação do objecto, o estabelecimento do preço e o modo de pagamento - ter criado uma situação “…de confiança, de uma das partes na outra, no sentido em que o contrato seria celebrado; a Autora investiu a sua confiança no projecto contratual e agiu de acordo com essa confiança; o contrato não aconteceu e a confiança da Autora saiu frustrada por facto imputável à Ré.” Salvo o devido respeito, não nos parece que assim seja. Não basta que a confiança, rectius, expectativa da parte seja frustrada, como acima se observou: é igualmente necessário que essa não conclusão seja ilícita, por se traduzir em injustificada violação das regras da boa fé; e, ainda, é necessário que seja culposa, por o contraente não ter agido, quando podia, conforme às regras de boa fé e aos deveres de lealdade, informação e proteção; e, finalmente, que causa um dano à contraparte. No caso em apreço, apesar da identificação do objecto mediato do contrato (acções representativas do capital social da C Park), o preço acordado (13.000.000€) e modo de pagamento (12.500.000€ com celebração do contrato, 250.000€ um ano após e, 250.000€ dois anos depois), a verdade é que as partes tinham ainda um percurso negocial importante a percorrer, visto que em 13/01/2017 (ponto 23) previam um prazo de 60 dias para a due diligence onde, por natureza, são apuradas e estabelecidas cláusulas relevantes relativas, por exemplo, a responsabilidades da vendedora perante terceiros, contingências para com terceiros, garantias de ressarcimento, cláusulas de delimitação de responsabilidades e tempo de assunção dessa responsabilidade. Ora, ainda na pendência do prazo para realização da due diligence (que terminaria a 13/03/2017), em que seria acertadas as condições e clausulado final, verificou-se um facto relevante para a negociação: instauração do procedimento cautelar, por terceira, com vista à suspensão do processo de negociação em curso entre autora e rés e para o qual, de resto, a autora foi citada como parte contra-interessada. As rés informaram, de imediato, em 23/02/2017, (reitera-se, na pendência do prazo para a due diligence) a autora da pendência dessa providência cautelar e invocaram expressamente que essa informação era feita “…ao abrigo dos princípios gerais de transparência e boa fé que tutelam os negócios jurídicos.” Note-se que desde 23/02/2017, a autora nada disse ou reagiu quanto a essa informação das rés. Posteriormente, a 18/05/2017, as rés voltaram a informar a autora (ponto 27) que na sequência de uma reunião entre autora e rés, em 11/05/2017, comunicaram que em virtude da pendência do procedimento cautelar, suspendiam o processo de venda das acções da C Park (ponto 27-4) e comunicaram que “…afigura-se desaconselhável , por elementares motivos de prudência, assumir riscos referentes à venda das participações sociais da C Park…” (ponto 27-10); e, mais informaram, que se voltassem a ponderar a venda da C Park, contactariam a autora (ponto 27-11). A autora respondeu, a 13/07/2017, manifestando interesse na aquisição da C Park e solicitou os restantes elementos em falta para realização da due diligence (ponto 28). Por carta de 20/12/2017 a autora reiterou interesse na aquisição da C Park e propôs aumento do preço para 13.350.000€ (ponto 30). As rés informaram a autora terem intenção de retomar o processo de venda da C Park estando o caderno de encargos a ser elaborado por uma terceira, a KPMJ (ponto 31). Posteriormente, em Maio de 2018, a KPMG informou a autora de que estava mandatada para proceder à venda da C Park e seria necessário formalizar novo acordo de confidencialidade (ponto 34). Após resposta da autora quanto ao conteúdo do acordo de confidencialidade, a KPMG tentou, por diversas vezes e formas, contactar a autora (pontos 55, 56, 58, 60, 63, 64, 66, 67 e 69). A C Park acabou por ser vendida, a terceiros, em 28/09/2018, por 15.576.000€. Ora, desta factualidade pode retirar-se que existiu um motivo justificado para a suspensão do processo de venda em fase de negociação com a autora: a pendência da providência cautelar de suspensão dessa venda, intentada por terceiro. As rés, prontamente informaram a autora desse constrangimento à venda, cumprido os deveres de lealdade e de informação. As rés justificaram a suspensão do processo de negociação como cautela de protecção dos interesses de ambas. Ou seja, as rés observaram os deveres de lealdade, informação e protecção para com a autora. Tanto assim foi que a própria autora não reagiu a essa comunicação de suspensão do processo de venda. E quando, finalmente, findaram o procedimento cautelar e a acção respectiva, as rés decidiram retomar a intenção de venda da C Park e informaram a autora que, de resto, foi convidada a participar no processo de aquisição das acções da C Park o que se expôs somos a concluir que não se verificam os requisitos acima enunciados que permitam imputar à ré responsabilidade pré-contratual pela não conclusão do contrato. O mesmo é dizer que o recurso das rés procede e, por conseguinte, devem ser absolvidas dos pedidos. *** 3.3- O Recurso da Aurora. Como se enunciou supra a autora interpôs recurso da sentença visando a condenação das rés na totalidade do pedido. Ora, como acabámos de verificar, não existe responsabilidade pré-contratual das rés e, por conseguinte, inexiste dever de indemnizarem a autora. Sem necessidade de outros considerandos, conclui-se pela improcedência do recurso da autora. *** III- DECISÃO. Em face do exposto, acordam neste colectivo da 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: - Julgar totalmente improcedente o recurso da autora e totalmente procedente o recurso das rés e, em consequência revogam a sentença da 1ª instância e absolvem as rés da totalidade do pedido. Custas, em ambas as instâncias, pela autora. Lisboa, 19/12/2024 Adeodato Brotas António Santos Gabriela de Fátima Marques |