Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
0064296
Nº Convencional: JTRL00014596
Relator: SILVA PAIXÃO
Descritores: EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
AMPLIAÇÃO DO PEDIDO
INDEMNIZAÇÃO
LEI APLICÁVEL
Nº do Documento: RL199403100064296
Data do Acordão: 03/10/1994
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: CJ ANOXIX 1994 TII PAG85
Tribunal Recurso: T J ALMADA 1J
Processo no Tribunal Recurso: 9712/911
Data: 07/30/1993
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: FERNANDO ALVES CORREIA IN AS GRANDES LINHAS DA RECENTE REFORMA DO DIREITO URBANÍSTICO PORTUGUÊS PAG70.
Área Temática: DIR PROC CIV - PROC ESP.
Legislação Nacional: CEXP76 ART20 N4 ART27 ART28 N1 ART30 N1 N2 ART36 N1 ART82 N1 ART83 N2.
CEXP91 ART23 ART63.
CPC67 ART273 N2.
Jurisprudência Nacional: AC STJ DE PROC83259 DE 1993/03/17.
AC STJ DE 1980/11/20 IN BMJ N301 PAG309.
AC RL DE 1989/02/23 IN CJ ANOXIV T1 PAG138.
AC TC DE 1988/06/08 IN DR 1988/06/29 E IN BMJ N378 PAG168.
AC TC DE 1990/03/07 IN DR 1990/03/30.
Sumário: I - A expropriação rege-se pela lei vigente à data da publicação no Diário da República da declaração de utilidade pública.
II - No cálculo de justa indemnização como critério deve ser escolhido o do valor "venal", do "justo preço", do "valor normal do mercado" do bem a expropriar.
III - Face à avaliação de uma parcela como terreno apto a comportar novas edificações, a implantação destas e a execução das correspondentes infra-estruturas, implica a prévia demolição das construções e o derrube de árvores existentes pelo que não é lógico nem razoável a sua valorização enquanto benfeitorias, para efeitos do cálculo de indemnização a arbitrar.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
1. Por despacho publicado no DR, II série, n. 40, de 18/2/88, foi declarada a utilidade pública e a urgência da expropriação da parcela de terreno com a área de 1662 m2, destinada à criação do parque urbano de Almada, a desanexar do prédio denominado Quinta do (Q), inscrito na matriz rústica da freguesia da Cova da Piedade sob o art. 39, secção D, e na matriz urbana de freguesia do Laranjeiro sob o art. 42 e descrito na 2 Conservatória do Registo Predial de Almada sob o n. 13154 a folhas 49 do livro B 37.
Promovido o processo expropriativo pela Câmara Municipal de Almada, como expropriante, sendo expropriados (M) e marido (D), (J), (H) e mulher (E), (V) e marido (R), (N), (S), (I), (O), (P), (K), (A), (C), (U), (Z), (Y) e (L), foi realizada a vistoria "ad perpetuam rei memoriam" e nomeados os árbitros que, por unanimidade, atribuiram à parcela o valor de 1627700 escudos.
2. Da decisão arbitral recorreram os treze primeiros identificados expropriados, pugnando pela elevação do montante indemnizatório para o quantitativo de 78489000 escudos, "como valor real mínimo, sem prejuízo de posterior ampliação do pedido".
3. Efectuada a avaliação, não houve uniformidade nos laudos dos peritos, nem nos critérios adoptados.
Os peritos do Tribunal e dos expropriados, considerando a capacidade edificativa do terreno, deram-lhe o valor de 10470600 escudos, desprezando a valorização das árvores e das construções nele implantadas, estimada em 73000 escudos e 577500 escudos, respectivamente.
O perito da expropriante, atendendo exclusivamente à sua aptidão agrícola, indicou o valor de 1490068 escudos, onde incluiu árvores e construções.
4. Apresentadas alegações pela expropriante e pelos recorrentes, que, entretanto, deduziram a ampliação do pedido "para a quantia de 10470600 escudos, indexado a 1,12% desde Setembro 91 e com o acréscimo das benfeitoras ali existentes", foi proferida sentença a admitir a requerida ampliação, a negar a qualidade de interessado a (A) (que pedira a indemnização de 2000000 escudos, por "residir" na parcela) e a fixar o montante indemnizatório a pagar pela expropriante aos expropriados em 10470600 escudos, "acrescido da quantia que se vier a liquidar com base nos indíces de variação de preços no consumidor entre 17/9/91 e a data em que os expropriados puderem receber a indemnização referida".
5. Inconformados, dela apelaram os expropriados (que haviam recorrido do acórdão arbitral) e a expropriante.
A) Esta, defendendo a "anulação" da sentença e a "repetição da avaliação" ou a revogação da sentença com fixação da indemnização em 1627700 escudos, culminou a sua alegação com estas sintetizadas conclusões:
I - A sentença enferma da nulidade da alínea b) do n. 1 do art. 668 do CPC, "por não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificaram a solução nela adoptada".
II - E enferma, ainda, da nulidade da alínea c) do mesmo preceito, porquanto, ao fixar a indemnização "com apelo aos critérios aprovados pelo DL n. 438/81", fez "errada interpretação da lei, geradora da oposição da decisão com os seus fundamentos".
III - A admissão de ampliação do pedido fora e após a entrega da petição de recurso não era viável.
IV - A fixação de indemnização em montante superior ao indicado pelos expropriados no requerimento de recurso e quinze vezes superior ao valor atribuído pelos árbitros nomeados pelo Presidente da Relação, viola o disposto no n. 2 do art. 83 do DL n. 845/76.
V - O prédio a expropriar integra-se, ainda que parcialmente, na Reserva Agrícola Nacional e na Reserva Ecológica Nacional, pelo que, devendo os solos "exclusivamente ser afectos à agricultura", não era lícito "considerar uma capacidade construtiva num ficcionado aproveitamento para esse fim".
VI - O valor da indemnização fixado na sentença "é muito superior ao preço do mercado", devendo a justa indemnização fixar-se aproximadamente em cerca de 1627700 escudos, "atendendo-se às reais características das parcelas e aos preços do mercado".
B) Por sua vez, os expropriados, advogando a alteração da decisão recorrida, concluiram a sua alegação deste modo:
I - A indemnização deveria ter sido fixada pelo menos em 11121100 escudos, isto é, em 10470600 escudos (sendo 10470600 escudos relativos ao valor do terreno e 650000 escudos, respeitante às benfeitorias - árvores e construções), sem prejuízo da actualização legal.
II - A indemnização devida ao deficiente (A) é autónoma, não devendo ser inferior a 2000000 escudos.
III - A inconstitucionalidade do art. 83 n. 2 do DL n. 845/76 é flagrante, pelo seu carácter limitativo do valor real, corrente, do bem expropriado.
IV - A Câmara Municipal de Almada não pode instaurar expropriações sem depositar as respectivas quantias e impedir assim o benefício consagrado no art. 51 n. 3 do DL n. 438/91, de 9 de Novembro.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
6. Como se sabe, o recurso visa modificar a decisão recorrida e não criar decisão sobre matéria nova, determinando-se o seu âmbito em face das conclusões da alegação do recorrente, abrangendo, por isso, tão só as questões aí colocadas (art. 684 n. 3 e 690 n. 1 do CPC).
Daqui resulta que a matéria da conclusão IV de 5B) não tem que ser apreciada, pois envolve questão nova, não suscitada pelos expropriados nem decidida na sentença.
7. Vejamos, agora, o problema da nulidade da sentença.
As causas da nulidade da sentença, taxativamente enumeradas no n. 1 do art. 668 do CPC, não incluem no seu elenco - é bom dizê-lo - o "chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário" (A. Varela, "Manual de Processo Civil", 2 ed., pág. 686).
A sentença é nula não só "quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão" (alínea b) desse artigo), como também "quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão" (alínea c) do mesmo normativo).
Aquela primeira nulidade, porém, só ocorre se existe falta absoluta de motivação. Se a motivação é apenas deficiente, medíocre ou errada, a sentença fica sujeita ao risco de revogação ou alteração em via de recurso; mas nula é que nunca será (cfr. A. Reis, "Anotado", vol. V, pág. 140, e J. Bastos, "notas", vol. III, pág. 246).
A nulidade da alínea c), por seu turno, traduz-se num vício de estrutura lógica da sentença, por contradição entre as suas permissas, de facto e de direito, e a conclusão. É o que sucede quando "os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto".
Esta nulidade só se verifica, portanto, quando há uma contradição real entre os fundamentos e a decisão:
"a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente"
(A. Reis, Anotado, V, pág. 141, e A. Varela, op. cit, pág. 690).
No caso vertente, é incontroverso que a sentença impugnada não padece de nenhum desses vícios, geradores de nulidade. Basta lê-la, para se constatar que ela se encontra suficientemente fundamentada, quer sob o ponto de vista fáctico quer sob o ponto de vista jurídico, e que, além disso, a decisão está em consonância com a respectiva fundamentação.
Soçobram, por conseguinte, as conclusões I e II de 5 A).
8. E o que dizer da ampliação do pedido formulada pelos expropriados a folhas 465/468?
Será ela inadmissível como sustenta a expropriante? Respondemos negativamente.
O n. 2 do art. 273 do CPC dispõe que o autor pode ampliar o pedido até ao encerramento da discussão em primeira instância, "se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo".
Em processo de expropriação, atenta a sua especial tramitação, o encerramento da discussão ocorre com a apresentação pelas partes das alegações que antecedem a sentença.
Representando a ampliação do pedido um desenvolvimento do quantitativo inicialmente indicado pelos expropriados no requerimento de interposição do recurso do acórdão arbitral, poderia ela ter sido deduzida até ou nas alegações (art. 82 n. 1 do DL n. 845/76 e art. 63 n. 1 do DL n. 438/91) a apresentar imediatamente antes de ser proferida a sentença (neste sentido, Ac. do STJ de 17/3/93, Proc. n. 83259; paralelamente, ver A. Varela, op. cit., pág. 357).
Assim, bem admitida foi a ampliação do pedido formulada pelos expropriados subsequentemente ao laudo dos peritos, em requerimento autónomo (folhas 465/468) apresentado antes das suas apontadas alegações (folhas 470/46).
Razão por que naufraga a conclusão III de 5 A).
9. Expurgados os recursos das antecedentes questões prévias, eis os factos considerados assentes, com relevância para a fixação do montante indemnizatório: a) A parcela de terreno expropriada, com destino à criação do parque urbano de Almada, localiza-se na freguesia da Cova da Piedade. b) Tem a área de 1662 metros quadrados e apresenta uma configuração aproximadamente triangular e uma suave inclinação para poente. c) Encontra-se dividida em duas sub-parcelas, uma de pinhal e mata e outra de cultura arvense. d) Existem na parcela 12 pinheiros médios, 1 sobreiro, 1 pereira de tamanho pequeno e 1 castanheiro de tamanho grande. e) E existem construções: edíficio destinado a habitação com 27,5 m2, um ensoleiramento em betão de 54,5 m2, arrecadação com 5 m2, muro de espera com 10,1 m, muretes de vedação com 20,9 m2 e depósito de água de 500 m3. f) A parcela confronta a nascente com um arruamento urbano numa extenção de 30 metros, dotado de redes domiciliárias de distribuição de água, colectores de águas pluviais e residuais, energia eléctrica, iluminação pública e telefone. g) E confina com uma zona urbanizada com arruamentos e restantes infra-estruturas básicas com edifícios de
6 e 7 pisos, construidos ou em construção.
10. Segundo a doutrina e jurisprudência dominantes, a expropriação deve reger-se, nomeadamente no que respeita às regras jurídicas sobre a indemnização, dada a sua natureza substantiva, pela lei vigente
à data da publicação no DR da declaração de utilidade pública, por ser esse o facto constitutivo da relação expropriativa (cfr., entre outros, o Ac. do STJ de 20/11/80, Bol. 301, pág. 309, o Ac. desta Relação de 23/2/89, C. Jurisprudência XIX, 1, pág. 138, e Ac. da Relação do Porto de 23/11/93, Rec. 518 - 4; ver, ainda, Fernando Alves Correia, "As grandes linhas da recente reforma do Direito Urbanístico Português", pág. 70).
Ora, tendo sido publicada a declaração de utilidade pública em 18/2/88, a lei aplicável é, na situação vertente, o anterior Código das Expropriações (DL n. 845/76, de 11 de Dezembro).
11. A expropriação por utilidade pública só pode ser efectuada mediante o pagamento de justa indemnização, a fixar com base no valor real dos bens expropriados.
A justa indemnização visa ressarcir o "prejuízo que para o expropriado advém da expropriação", medido "pelo valor real e corrente dos bens expropriados" (art. 62 n. 2 da Constituição da República e arts. 27 e 28 n. 1 do DL n. 845/76).
E, declarada a inconstitucionalidade com força obrigatória geral tanto do n. 1 como do n. 2 do art. 30 deste DL (Acs. do T. Constitucional n. 131/88, de 8/6/88, in DR de 29/6/88 e Bol. 378, pág. 168, e n. 52/90, de 7/3/90, in DR de 30/3/90 e Bol. 395, pág. 91, respectivamente), o valor real do prédio é sempre determinado sem observância das limitações que aí eram impostas.
A expropriação deve ter, portanto, como contrapartida uma justa indemnização que, para o ser, terá de corresponder ao valor real e corrente do bem expropriado; se assim não for, a expropriação traduzir-se-á num verdadeiro confisco, violador dos princípios constitucionais.
O dano patrimonial suportado pelo expropriado é compensado de uma forma integral e justa, "se a indemnização corresponder ao valor comum do bem expropriado, ou, por outras palavras, ao respectivo valor do mercado ou ainda ao seu valor de compra e venda".
Postergando-se factores de ordem puramente especulativa, o que é essencial na determinação da justa indemnização
é que se tomem em consideração todos os elementos valorativos do prédio, que, numa análise objectiva da situação e segundo a opinião generalizada do mercado, nunca possam nem devam ser desprezados.
E dentre esses elementos conta-se, com particular relevo, a capacidade edificativa do terreno, as suas potencialidades edificatórias, especialmente quando ele, atenta a sua localização e envolvimentos, demonstra manifesta vocação urbanística. Essas potencialidades são, as mais das vezes, decisivas na determinação do valor do prédio.
Ora o critério do valor "venal", do "justo preço", do "valor normal do mercado" é aquele que deve ser acolhido no cálculo da justa indemnização (cfr. Fernando Alves Correia, "As garantias do particular na expropriação por utilidade pública", pág. 129).
12. Expostos estes princípios jurídicos e valorando a matéria fáctica enunciada em 9, diremos que é incompreensivel a posição assumida pelo perito da expropriante, ao afastar a aptidão edificativa do terreno e ao atender apenas à sua aptidão agrícola, dando-lhe o valor de 1490068 escudos (fls. 391). Valor que, frise-se, nem a própria expropriante aceita, como emerge das suas alegações (folhas 562 e 537), em que sustenta que a indemnização deve ser fixada em 1627700 escudos, de acordo com a decisão arbitral...
Em águas diferentes navegaram, no entanto, os peritos do tribunal e dos expropriados (que apresentaram conjuntamente o seu laudo), considerando a totalidade da parcela integrada em "aglomerado urbano" (art. 62 n. 1 do DL n. 794/76, de 5 de Novembro) e calculando o seu valor em função das suas "potencialidades de utilização urbana".
Acertadamente, diga-se.
Com efeito, se relembrarmos que o terreno confina com uma zona em que se encontram implantados edifícios de 6 e 7 pisos e que a parcela confronta a nascente com um arruamento urbano numa extenção de
30 metros, dotado de redes domiciliárias de distribuição de água, colectores de águas pluviais e residuais, energia eléctrica, iluminação pública e telefone, nenhumas dúvidas podem legitimamente subsistir sobre a sua aptidão para construção de prédios de semelhante envergadura.
Por outro lado, sendo de aceitar, por se mostrar perfeitamente ajustados, tanto a área de construção possível (1163,4 m2), como o custo provável dessa construção (69804000 escudos), considera-se correcto o valor encontrado por esses quatro peritos para a parcela expropriada, ou seja, 10470600 escudos.
13. Para afastar a "capacidade construtiva" da parcela, alega a expropriante que ela se integra, parcialmente, na Reserva Agrícola Nacional e na Reserva Ecológica Nacional.
Trata-se, contudo, de afirmação gratuita, que não aparece comprovada nos autos. Pelo contrário, ela é desmentida pela circunstância de a parcela, de acordo com a declaração expropriativa, se destinar à criação do parque urbano de Almada, e pelas respostas dadas pelo próprio perito da expropriante aos quesitos que esta formulara (folha 395).
De todo o modo, cabia à expropriante a prova de inclusão da parcela na RAN e na REN, nos termos do n. 1 do art. 342 do Código Civil. Coisa que não fez, apesar de, pela sua posição, ser a parte que melhor apetrechada se encontrava para exibir as indispensáveis provas.
Refira-se, ainda, que, à data da declaração de utilidade pública, ainda não vigoravam nem o DL n. 196/89, de 14 de Junho (que estabeleceu o novo regime de RAN), nem o DL n. 93/90, de 19 de Março (que reviu o regime jurídico da REN), pelo que nunca poderiam ser chamados à colação, como pretende a expropriante.
A parcela em causa, aliás, atenta a sua localização e o seu envolvimento definido em 9, sempre seria excluída da RAN, como decorre dos arts. 7 e 8 do DL n. 196/89 (e já decorria do art. 3 do DL n. 451/82, de 16 de Novembro, entretanto revogado por aquele).
Além disso, não pode esquecer-se que a proibição da construção de edifícios em terrenos abrangidos pela RAN não é absoluta, uma vez que, verificados determinados requisitos, pode ser autorizada, aí, a edificação (art. 9).
14. Já dissemos que o valor real e corrente da parcela expropriada adiantado no laudo dos peritos do tribunal e dos expropriados correspondia à justa indemnização.
Porém, cabe perguntar:
Ao fixar a indemnização em 10470600 escudos, terá a sentença violado o disposto no n. 2 do art. 83 do DL n. 847/76 (e sem curarmos da sua eventual inconstitucionalidade), como pensa a expropriante? Obviamente que não.
De facto, essa norma deve ser interpretada extensivamente, pelo que a condenação abrange o pedido, seja o primitivo seja o ampliado (cfr. o art. 661 do CPC). Logo, tendo os expropriados ampliado, oportunamente, o pedido - ampliação admissível, como se viu -, torna-se evidente que, fixando-se o montante indemnizatório em 10470600 escudos, nunca teria sido ultrapassado o limite "máximo" por eles indicado.
Tal como se respeitou a segunda parte do mesmo normativo. É que, tendo os peritos do tribunal dado o maior laudo - 10470600 escudos -, se adicionássemos a essa parcela metade do seu valor, encontrariamos o total de 15705900 escudos (10470600 escudos + 1/2 x 10470600 escudos = 15705900 escudos).
Daí que seja imperceptível, no mínimo, a crítica que, nesta parte, se faz à sentença!
15. O valor da indemnização, como é jurisprudência assente, deve reportar-se à data da avaliação - no caso, a 16/9/91.
Todavia, só se alcançará a justa indemnização pretendida pela lei, se esse valor for actualizado no momento em que puder ser recebido pelos expropriados.
Só assim se evitará num injustificado benefício para a expropriante e um correspondente prejuízo para os expropriados, que, doutro modo, iriam receber uma importância com um valor real inferior áquele que tinha quando foi fixada.
Não admira, por isso, que o art. 23 do actual Código das Expropriações (DL n. 438/91, de 9 de Novembro) tenha vindo estabelecer que o montante da indemnização será "actualizado à data da decisão final do processo de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação", "publicado pelo Instituto Nacional de Estatística relativamente ao local da situação dos bens ou da sua maior extensão".
É certo que, sendo duvidosa a natureza interpretativa deste preceito, a sua aplicabilidade na hipótese "sub iudice" é de afastar, atento o que se escreveu em 10.
No entanto, face à necessidade de actualização do valor indicado pelos peritos, nada impede - mais, tudo aconselha - que se adopte o critério preconizado naquele art. 23, por se entender que ele se revela equilibrado e justo (neste sentido, ver Ac. da Relação do Porto de 28/10/93, recurso n. 271-3).
O que significa que a sentença não merece reparo, ao fazer acrescer ao montante indemnizatório de 10470600 escudos a quantia que resultar da aplicação, a partir de 17/9/91, dos índices de preços no consumidor.
16. Improcedendo, em consequência, também, as conclusões
IV, V, e VI de 5A) - alegação da expropriante -, debrucemo-nos sobre o recurso dos expropriados.
Recurso que, claro, não pode lograr êxito, perante o já explanado.
Na tese dos expropriados, em primeiro lugar, a indemnização deveria subir para 11121100 escudos, por forma a englobar o valor das árvores (73000 escudos) e das construções implantadas no terreno (577500 escudos).
Não perfilhamos tal entendimento.
Face à avaliação da parcela como terreno apto a comportar novas edificações, a implantação destas e a execução das correspondentes infra - estruturas, implica a prévia demolição das construções existentes e o derrube das árvores.
Logo, não seria lógica nem razoável a sua valorização, enquanto benfeitorias, para efeitos do cálculo da indemnização a arbitrar (cfr., neste pendor, os Acs. da Relação do Porto de 19/10/89, Rec. n. 9646, e de 18/9/90, Rec. n. 10127), pelo que soçobra a conclusão I de 5B).
17. E idêntica sorte cabe à conclusão II da alegação dos expropriados.
Vejamos.
Além do expropriado, são interessados no processo expropriativo "os titulares de qualquer direito real ou ónus sobre o prédio" e os arrendatários.
Para o efeito de os arrendatários serem indemnizados pelo expropriante, "o arrendamento é considerado como encargo autónomo" (arts. 20 n. 4 e 36 n. 1 do DL n. 845/76).
Simplesmente, o (A) não demonstrou ser interessado na expropriação, no sentido que lhe é emprestado por esses normativos.
Só a folhas 420 veio informar que residia numa casa pré-fabricada implantada na parcela. Sem ter invocado, sequer, a titularidade de algum "direito real ou ónus sobre o prédio" ou a qualidade de arrendatário.
Por consequência, não tem direito a qualquer indemnização, como se sentenciou.
18. Finalmente, esclareça-se que não interessa abordar a questão da inconstitucionalidade do n. 2 do art.
83 do DL n. 845/76, colocada na conclusão III de 5B). É que, na fixação da indemnização foram de todo em todo irrelevantes os limites estabelecidos nessa norma; o montante indemnizatório foi encontrado sem necessidade de jogar com tais limites.
19. Pelo exposto, julgam-se improcedentes as duas apelações e confirma-se a sentença recorrida.
Custas pelos expropriados da apelação por eles interposta.
Lisboa, 10 de Março de 1994
José da Silva Paixão,
Carlos Alberto da Cruz Broco.