Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6987/13.6TBOER.L1-1
Relator: MANUEL RIBEIRO MARQUES
Descritores: CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
CLÁUSULAS EXCLUÍDAS
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
INCUMPRIMENTO DO CONTRATO
PERDA DE CHANCE
DANOS
RESSARCIMENTO
EQUIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/14/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: 1.Sendo praticamente ilegíveis as condições gerais que constam do contrato celebrado entre as partes, com recurso a cláusulas padronizadas, e encontrando-se aquelas condições gerais no verso do documento que corporiza o contrato, ou seja, depois da assinatura (não obstante constar no texto do contrato uma nota, com letra reduzida, com o seguinte teor ”Todas as subscrições implicam a aceitação das cláusulas indicadas no verso”) devem as mesmas ser consideradas excluídas do contrato, nos termos do art. 8º als. c) e d), do Dec. Lei n.º 446/85.
2.Tendo a ré instalado uma central de alarmes num imóvel da autora, de que tinha o dever de assistência, competia aquela agir de forma a poder receber os sinais de alarme provenientes do imóvel desta (cliente), verificar os meios técnicos adequados à reposição da normalidade da situação, transmitir à autora os avisos de alarme detectados e, caso necessário, transmitir esses avisos às forças Segurança (plano de acção previsto no programa contratual).
3.Não tendo o alarme funcionado por ocasião de um assalto, como estava previsto/contratado, devido a avaria, estando a ré ciente de que a referida central tinha transmitido sinais de bateria fraca e deixado de conseguir aceder remotamente à mesma, conclui-se que a ré incumpriu, em termos objectivos, a prestação contratual, incumprimento esse que se presume culposo (art. 799º, n.º 1, do C.C.).
4.Apesar de não ser possível afirmar que o funcionamento do alarme evitaria a acção (furto), ficou certo que a conduta omissiva da ré fez perder a autora a chance de, através do accionamento do alarme, evitar um prejuízo, isto é, a concretização do furto ou pelo menos evitar a extensão dos danos.
5.A ressarcibilidade do dano de perda de chance está dependente da formulação de um juízo/julgamento hipotético, sobre as consequências da falta de accionamento do alarme.
6.Essa perda só poderá ser valorada se traduzir uma probabilidade consistente, uma possibilidade real de êxito que se frustrou, caso em que se justifica recorrer à equidade – art. 566º, n.º 3, do C. Civil.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:



I-Relatório:



I. C., Lda, instaurou a presente acção declarativa contra S., Lda, pedindo a condenação desta:
b) Ao pagamento dos danos e prejuízos que resultaram da actuação pouco cuidadosa e negligente da R. cujo montante total se avalia na presente data em 11.277,37€, mas a ser liquidado em definitivo em execução de sentença;
c) Ao reembolso do montante de 575,77€, correspondente ao montante indevidamente pago pela A. à R. de mensalidades desde Fevereiro de 2012 e até Fevereiro de 2013;
d) Ao pagamento do equipamento de segurança que a A. teve necessariamente adquirir quando contactou com a P., LDA igual tipo de serviços de vigilância, no valor de 996,76€; e) A fornecer os relatórios dos registos informáticos na sua posse, ( ... ) e condenada por não o ter feito anteriormente, por montante diário a fixar pelo tribunal e até que o faça.
f) A reconhecer que a A. nada lhe deve seja a que título for, em particular porque não lhe deve a factura n" 54454020, no montante de 244,77€.".

Alegou, em síntese, que é proprietária de uma moradia sita na freguesia de ..., que se encontra desabitada; que em 21 de Fevereiro de 2009 assinou com a ré um contrato denominado “Instalação e Serviços de Manutenção, Ligação à Central de Alarmes e de Serviço de Intervenção Opcional”, o qual visava a instalação na referida moradia de equipamento de vigilância e prestação de serviços de manutenção e de vigilância, através da ligação à central de alarmes da ré; que a moradia foi assaltada em Fevereiro de 2012, tendo sido furtadas duas portadas de alumínio, e o alarme não disparou; que foi o colaborador da autora, VS, quem deu do sucedido conhecimento à ré, tendo então sido informado que o alarme estava desligado há várias semanas e tal se devia ao facto de não ter sido ligado por quem esteve a última vez na moradia; que o técnico da ré que na ocasião se deslocou ao local constatou que o alarme estava desligado por a bateria de emergência se encontrar descarregada, tendo então aquele procedido à sua substituição; que na madrugada de 5 de Dezembro de 2012 a moradia foi novamente assaltada, tendo sido furtadas oito portadas de alumínio que protegiam as janelas e as sacadas do piso térreo e do 1º piso; que mais uma vez a ré não alertou a autora do assalto, tendo uma funcionária desta informado que desde o dia 25 de Novembro o sistema informático da Central de Alarmes da ré acusava uma deficiência no central instalada pela ré na vivenda, por a bateria de emergência se encontrar gasta e com necessidade de ser substituída; que no dia 5/12/2012 um funcionário da ré deslocou-se à moradia e constatou que a central estava queimada tendo então sido instalada uma nova central; que a 13 de Dezembro de 2012, pelas 17h e 53m o colaborador da autora foi contactado telefonicamente pela ré que a informou da activação do sistema de alarme com nova intrusão na propriedade; que aquele fez deslocar ao local pessoas amigas, tendo então 3 indivíduos que aí se encontravam se posto em fuga; que no dia seguinte constataram que tinha sido danificada uma das portas de acesso à moradia e que a central de alarmes tinha sido arrancada da parede, em pedaços, totalmente inoperacional; que verificaram ter sido furtadas mais duas portadas da sacada de alumínio, que a autora tinha retirado e colocado no interior da moradia; que os factos descritos denotam a ineficácia dos serviços de segurança da ré, sendo obrigada a revogar o contrato celebrado com esta; que, por essa razão, a autora tem direito a exigir da ré o montante das mensalidades pagas, no valor de €575,77; que os danos sofridos com o furto das portadas, materiais para proteger os vidros e mão-de-obra importaram a quantia de €11.277,37; que o valor despendido com a aquisição da nova central que teve de adquirir à P., Lda importou a quantia de €996,76, pelo que o valor do qual não prescinde totaliza a quantia de €12.849,90.

A Ré veio contestar, defendendo-se por excepção e por impugnação e deduziu reconvenção.

Por excepção invocou a ilegitimidade da autora, por o contrato junto por esta ter sido celebrado entre a ré e VS.

Por impugnação alegou, em suma, que a bateria de emergência apenas assegura que o sistema de alarme receba energia até à reposição da corrente eléctrica, a qual nunca foi assegurada pela ré e que o sistema de alarme se encontra desligado desde 26/11/2011, tendo negado vários dos factos articulados na p.i.

Em sede reconvencional peticionou a condenação da autora no pagamento da quantia de €307,46, acrescida dos juros de mora devidos desde 18/12/2013, referente à substituição da central de alarme no dia 14/12/2012 (no montante de €244,77) e da prestação mensal que deveria ter sido paga até ao dia 11/03/2013 (€40,76), acrescidas dos juros de mora vencidos (€17,05 + €4,88).

A autora apresentou articulado de resposta na qual alegou que VS interveio no contrato junto aos autos como seu procurador, e que tal era do conhecimento da ré; que nos encontramos perante um contrato de adesão, tendo a ré preenchido o mesmo como entendeu; que a cláusula 5ª do contrato deve considerar-se excluída do mesmo por passar despercebida, sendo ainda proibida (arts. 8º, als. c) e d) e 21º do DL n.º 446/85, de 25/10); que em Fevereiro de 2013 a ré aceitou a rescisão contratual que a autora lhe enviou em 18 de Fevereiro de 2013.

Conclui pela improcedência da reconvenção.

A ré apresentou o requerimento de fls. 93/95.

No despacho saneador as partes foram consideradas legítimas e foi considerado não escrita a matéria dos arts. 3º a 5º, 29º a 57º e 58º a 64º da réplica e os arts. 7º a 18º do requerimento de fls. 93/94.

De seguida foram enunciados os temas da prova.

Realizado o julgamento, foi proferida a sentença, na qual se decidiu:
“julga-se a acção improcedente, absolve-se a R. dos pedidos a), b), c), d), e e), julga-se improcedente o pedido f), e julga-se parcialmente procedente a reconvenção, e condena-se a A. a pagar à R. a quantia de duzentos e quarenta e quatro euros e setenta e sete cêntimos - acrescida de juros de mora, à taxa supletiva comercial, desde 24-1-13 até integral pagamento.
Custas na proporção dos respectivos decaimentos (CPC 527°)”.

Inconformada com essa decisão, a autora interpôs recurso de apelação, tendo nas respectivas alegações formulado as seguintes conclusões:
(…)

Termina pedindo seja julgada procedente o recurso e revogada a sentença recorrida, com todas as legais consequências.

Nas contra-alegações a ré propugna pela improcedência da apelação.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*
II. As questões a decidir resumem-se, essencialmente, a saber:
- se é caso de alterar a matéria de facto considerada em 1ª instância ou de ordenar a produção de nova prova;
- se a ré violou a sua obrigação de meios para com a autora;
- se em decorrência dessa violação, é caso de condenar a ré no pagamento à autora dos danos decorrentes do furto ocorrido dia 5/12/2012.

*
III.
Factos considerados provados em 1ª instância:
(…)

Factos considerados não provados em 1ª instância:
(…)

**
IV. Do mérito do recurso:

Quanto à impugnação da matéria de facto:
(…)

Em face das alterações operadas na matéria de facto, são os seguintes os factos provados:

1 - Em 21 de Fevereiro de 2009 "VS" e a ora R. assinaram o "Contrato de Instalação/Serviços" junto a fls 26 (cujo teor se dá qui por reproduzido).
2 - A A. adquiriu o equipamento aconselhado pela R., tendo pago 1.705,20€ e passou a pagar mensalmente 40,80€ à R..
3 - A R. garantiu à A., e esta ficou plenamente convencida que, sempre que houvesse intrusão ou tentativa de intrusão na moradia, o alarme existente no local e a Central de Alarmes da R. seriam imediatamente accionados - e que, neste caso, a R. contactaria de imediato com os colaboradores da A. e com as forças policiais (para que estas se deslocarem ao local); e garantiu que, se houvesse falha na corrente eléctrica, esta seria assegurada por uma bateria de emergência (que teria que ser substituída se estivesse descarregada).

3-A - Se a bateria fosse accionada ou o alarme instalado na casa do cliente ficasse desligado da corrente, a Central de Alarmes tomaria conhecimento e accionaria as reparações e/ou substituição necessárias.
3-B-Se o alarme estivesse desligado, mesmo por falta de energia eléctrica ou da bateria de emergência gasta, mesmo assim, "por norma", o sistema teria dado sinal dessa falta de energia, deixando a partir de então de poder aceder ao sistema.

4 - Entre Fevereiro de 2012 e Fevereiro de 2013 a A. pagou à R. a quantia total de 575,77€.
5 - Em Fevereiro de 2012 a moradia foi "assaltada" - tendo sido furtadas portadas de alumínio das janelas.
6 - Na madrugada de 5 de Dezembro de 2012 a moradia foi "assaltada" por desconhecidos tendo sido furtadas portadas de alumínio (que protegiam as janelas e sacadas do piso térreo e do primeiro piso) - tendo sido os vizinhos, e não a R., a avisar a A. do sucedido.
7 - Nesse dia o colaborador da A. (VS) contactou a R ..

7-A- O sistema informático da Central da R. acusava uma deficiência na central instalada na moradia da autora aquando da ocorrência de 05 de Dezembro de 2012, e que o alarme não foi accionado devido a avaria nesta central já anteriormente a esta data.
7-B-No dia 05 de Dezembro de 2012, pelas 11h e 10m, VS contactou a ré, pelo telefone n.º 707200020, telefone indicado e publicitado por aquela para este tipo de situações, tendo o mesmo perguntado se o alarme havia disparado e se teria havido tentativa de contacto por parte da Ré, tendo o operador desta, TN, informado que não e que estava pendente uma assistência ao cliente, com deslocação ao local.
7-C- Perguntado por aquele desde quando e qual o estado do alarme, o referido operador informou que o alarme tem transmitido sinais de bateria fraca com reposição, mas que naquele momento não conseguia aceder às informações solicitadas.
7-D- Perguntado porque não foi contactado, o operador informou que não encontrava o motivo, pediu desculpa e disse lamentar a situação por não ter sido em tempo útil, tendo transferido para agendamento.
7-E- No dia 05 de Dezembro de 2012, até ao telefonema realizado à 11 horas, nem o alarme disparou, nem a R. contactou a A., nem conseguiu confirmar o estado do alarme, por não lhe conseguir aceder remotamente, por avaria existente neste.
7-F- A R. antes daquele telefonema não tinha registo do alarme ter disparado.
7-G-O fornecimento e montagem de 8 portadas, em substituição das furtadas em 05 de Dezembro de 2012, foi orçamentado, em 29 de Dezembro de 2012, no valor total de € 6.080,00 (+ IVA).

8 - A A. pediu o envio do relatório informático das ocorrências (fls 14), que a R. não enviou.

9 - Nesse dia 5-XII-12 o técnico da R. (FA) deslocou-se ao local, tendo verificado que a central estava "queimada" (totalmente avariada) - tomando-se necessário instalar nova central, o que fez.
10 - A A. adquiriu materiais para proteger os vidros, despendendo 327,37€, e 150€ em mão de obra.

11 - Em 14- XII -12 a A. (VS) deslocou-se ao local e verificou que a porta de acesso (das traseiras) à moradia estava danificada, e a central de alarmes arrancada da parede, e espalhada em pedaços pelo chão (totalmente inoperacional) - tendo verificado que haviam sido furtadas duas portadas de sacada de alumínio (que a A. recolhera, e colocara dentro da moradia).

12 - Nesse dia o técnico da R. (TM) deslocou-se ao local para proceder à substituição da central e reposição do sistema de segurança informando a A. que a nova central teria um custo de 244,77€.

12-A-Nos "assaltos" de Fevereiro de 2012 e de 5/12/2012 foram furtadas, respectivamente, 2 e 8 portadas, tendo no assaltado referido em 11 dos factos provados sido furtadas mais duas portadas (que a autora recolhera e colocara dentro da moradia).
12-B-Foram pedidos pela autora dois orçamentos, em consequência de ter havido furtos por mais que uma vez, orçamentos que no total perfaziam €10.800,00 + IVA.

13 - Em 4 de Janeiro de 2013 a A. enviou à R., que a recebeu em 7-1-­13, a carta junta a fls 18 (cujo teor se dá aqui por reproduzido) - não tendo a R. respondido.

14 - Em 24 de Janeiro de 2013 a R. enviou à A. a factura junta a fls 44v, no valor total de 244,77€ - que a A. não pagou.

15 - Em 30 de Janeiro de 2013 a A. enviou à R. a carta junta a fls 19v (cujo teor se dá aqui por reproduzido) - não tendo a R. respondido.

16 - Em 14-II-13 a A. contratou uma nova empresa - tendo adquirido equipamento novo, e despendido 996,79€ (fls 32-33).

17 - Em 18 de Fevereiro de 2013 a A. enviou à R., que a recebeu em 19- II -13, a carta junta a fls 22 (cujo teor se dá aqui por reproduzido).

18 - Em 1 de Março de 2013 a R. emitiu, em nome da A., a factura junta a fls 70, no valor total de 40,76€ - que a A. não pagou.

Da questão de direito:

Visa a A com a presente acção, como resulta do relatório inicial, que a R./apelante a indemnize dos danos que lhe foram causados pelos furtos cometidos por desconhecidos numa sua moradia em Fevereiro e Dezembro (por duas vezes) de 2012.

Baseia a sua pretensão num contrato atípico de prestação de serviço, sustentando que a R cumpriu defeituosamente a sua prestação e que tal incumprimento defeituoso deu azo aos danos cuja indemnização peticiona.

O contrato escrito em referência consta de fls. 26 dos autos.

Na sentença, considerou-se que não tem cabimento (por implicar a confissão da prática de emissão de facturas falsas) a alegação da ré, vertida na contestação, de que o verdadeiro titular do contrato não é a autora (a quem dirigiu a correspondência), mas sim VS.

Este entendimento não se mostra impugnada quer nas alegações, quer nas contra-alegações.

Efectivamente, embora VS conste no contrato como sendo o utilizador titular, tendo sido ele quem subscreveu o contrato, o certo é que é a sociedade autora quem surge como titular para as facturas, inferindo-se assim que aquele actuou em representação desta.

Na sentença a pretensão da autora foi desatendida mediante a seguinte fundamentação:

Demonstrada a celebração de um contrato de prestação de serviços entre A. e R. (…) e não se encontrando prevista cláusula semelhante à 7 (resolução por incumprimento da cliente), são aplicáveis, à declaração de "revogação" provada no ponto 17, as regras do contrato de mandato (CC 1156°) - nomeadamente, as previstas no artigo 11700 do Código Civil: "1- O mandato é livremente revogável por qualquer das partes, não obstante convenção em contrário ou renúncia ao direito de revogação. 2 - Se, porém, o mandato tiver sido conferido também no interesse do mandante ou de terceiro, não pode ser revogado pelo mandante sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa.".
Não tendo sido demonstrada a ocorrência de "justa causa" (que, neste caso, seria o incumprimento da R.), valem as regras do artigo 1171°: "A designação de outra pessoa, por parte do mandante, para a prática dos mesmos actos implica revogação do mandato, mas só produz este efeito depois de ser conhecida pelo mandatário.".
A "revogação" é, assim, válida - embora não se compreenda por que motivo o técnico da R. se deslocou à moradia em causa em Maio de 2013, data em que já teria sido celebrado o contrato provado no ponto 16, com outra empresa de segurança -, e constitui a A. na obrigação de indemnizar prevista no artigo 1172° do Código Civil (sem prejuízo da obrigação de pagamento da "retribuição" acordada, nos termos do artigo 1 1 67°/c)).
A A., não imputando à R. a prática de qualquer facto típico ilícito (e sendo certo que não alegou factos de onde pudesse resultar a existência de um nexo causal entre uma qualquer "omissão" da R. e o "prejuízo" resultante da prática dos furtos), pretende que a R. seja condenada a pagar-lhe as despesas ocasionadas com tais furtos (as portadas de alumínio, e as reparações) - o que significa que tal "responsabilidade" terá que ser de carácter contratual.
Não havendo regras específicas previstas para o contrato de mandato (prevendo-se apenas a obrigação de o mandante indemnizar o mandatário do prejuízo sofrido com a execução do mandato), valem as regras gerais, designadamente a do artigo 798° do Código Civil: "O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação toma-se responsável que causa ao credor."; não tendo sido demonstrado qualquer facto que permita afirmar que a R. não cumpriu as suas obrigações, não deve responder pelos prejuízos sofridos pela A. com os furtos (tanto mais que não foi demonstrado o "nexo causal", conforme supra referido) - devendo ser absolvida dos pedidos a) e b).
Quanto às mensalidades pagas pela A. entre Fevereiro de 2012 e Fevereiro de 2013 (ponto 4 da matéria de facto provada), não há qualquer motivo para que a R. seja condenada na sua restituição - motivo por que deve ser absolvida do pedido c).
A aquisição do equipamento a outra empresa (ponto 16 da matéria de facto) foi acto deliberado da A., e não pode ser imputado a qualquer comportamento da R. - na precisa medida em que não ficou demonstrado o incumprimento contratual desta; assim, não há motivo para que a R. deva suportar tal despesa, devendo ser absolvida do pedido d).
O pedido formulado na alínea e) não encontra fundamento contratual - não tendo a R. tal obrigação, contratual ou legal - motivo por que deve ser absolvida deste pedido.
Relativamente a pedido f), verifica-se que a factura em causa (ponto 14 da matéria de facto) se refere à "central" substituída em 14-XII-12 por TM (porque a anterior tinha sido destruída, conforme consignado na fundamentação supra) - não havendo dúvida que a A. deve suportar tal substituição (uma vez que a destruição da central anterior não se deveu a avaria, ou outra causa imputável à R.); deve, assim, a R. ser absolvida do pedido f) (…)”.

Na apelação, a autora, para além de ter impugnado, com êxito, a matéria de facto considerada em 1ª instância, contrapõe que:

- Ficou provada a celebração dum contrato de prestação de serviços, nos termos do qual a R. garantiu à A. que sempre que houvesse intrusão, ou tentativa de intrusão, o alarme existente no local e a Central de Alarmes da R. seriam imediatamente accionados e, neste caso, a R. contactaria de imediato os colaboradores da A. e as forças policiais e garantiu que, mesmo que houvesse falha na corrente eléctrica, esta seria assegurada por uma bateria de emergência.

- Ficou também provado que a moradia da A., onde estava instalada a central de alarme foi assaltada por várias vezes, tendo sido furtadas portadas de alumínio e, pelo menos no "assalto" ocorrido em 05 de Dezembro de 2012, foi admitido como provado que foram os vizinhos e não a R. a avisar a A. do sucedido e foi o colaborador da A. (VS) a contactar a R. e não o contrário, como deveria ter sucedido nos termos contratados.

- Ora, o contrato celebrado entre a A. e a R. visava um fim específico e muito concreto, tal como foi considerado provado (n.º 3 dos factos provados) - sempre que houvesse intrusão ou tentativa de intrusão na moradia, o alarme nela existente e a Central de Alarmes da R. seriam instantaneamente accionados e que, neste caso, a R. contactaria de imediato com os colaboradores da A. e com as forças policiais (para se deslocarem ao local); e, mesmo em caso de falha de corrente eléctrica, esta seria assegurada por uma bateria de emergência (que teria que ser substituída se estivesse descarregada).

- É, assim, por demais evidente que qualquer conduta menos diligente da R., qualquer acto, ou omissão de acto, desconforme com aquele fim, fará com que a R. estivesse a faltar culposa mente - na boa interpretação do art.º 798.º - ao cumprimento da obrigação que voluntariamente assumiu (e de resto através dum contrato de adesão da sua autoria), tornando-a responsável pelo prejuízo que causar à contraparte.

- E, note-se bem, competia neste caso ao devedor, ou seja, à R., provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procedia de culpa sua, tal como estipula o art.º 799.º, n.º 1 do Código Civil.

- Seria, assim, expectável e normal que a S., Lda mantivesse o sistema a funcionar permanentemente e, se interrupção houvesse, teria a obrigação de detectar imediatamente a interrupção e disso deveria avisar a A., para que a reposição do sistema fosse praticamente imediata, ou pelo menos ocorresse em tempo útil, não dando hipótese que, entretanto, pudesse ocorrer qualquer intrusão ou tentativa, sem que tal fosse imediatamente detectado pelo sistema de segurança.

- Ora, a R. não fez qualquer prova de que agiu com a diligência normal dum bom pai de família, para manter o sistema de alarme a funcionar permanentemente, com obrigação de detectar imediatamente qualquer interrupção, e disso avisar a A,. para que a reposição do sistema fosse praticamente imediata, ou pelo menos ocorresse em tempo útil, não dando hipótese que, entretanto, pudesse ocorrer qualquer intrusão ou tentativa, sem que tal fosse imediatamente detectado pelo sistema de segurança.

- Por tudo isto, o Senhor Juiz "a quo" não poderia deixar de condenar a R., ao menos no pagamento do valor dos danos sofridos com o furto das portadas ocorrido no dia 05 de Dezembro de 2012 e das despesas suportadas com a protecção das janelas.

- Pois, pelo menos, na intrusão e furto ocorridos no dia 05 de Dezembro de 2012, a central instalada na moradia da A. estava avariada, e a R. não teve a diligência necessária ao caso de a reparar ou substituir, em tempo útil, pelo que nem o sistema funcionou, nem avisou a A., ou as forças policias.

- Como consequência disto, o valor de reposição das portadas furtadas nesse dia ascendia em 29 de Dezembro de 2012 a € 6.080,00 (S/IVA), mas cujo valor só se determinará em concreto em execução de sentença, tanto são os prejuízos em que a A. incorreu.

- Além dos custos que teve de suportar no valor de € 327,37 de materiais e € 150,00 em mão de obra para poder proteger os vidros que entretanto ficaram sem portadas.

Vejamos.

Pela mera análise visual do contrato de fls. 26, em especial face a circunstância da maior parte dos seus dizeres se encontrarem impressos, com espaços deixados em branco para preenchimento manual, e perante a expressão “Condições Gerais do Contrato de Prestação de Serviços de Instalação e Manutenção pela S., Lda”, que antecede o detalhe do clausulado, estamos claramente perante conteúdo contratual resultante de cláusulas pré-elaboradas pela R/apelada que foram inseridas no contrato singular.

É, pois, aplicável ao caso o regime das chamadas cláusulas contratuais gerais (DL 446/85, de 25 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo DL 220/95, de 31 de Outubro, que o republicou, pelo DL 249/99, de 7 de Julho).

Ora, nos termos do art. 5º as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitam a subscrevê-las ou a aceitá-las, competindo o ónus da prova da comunicação ao contraente que submeta a outrem essas cláusulas.
E nos termos do art. 6º a contraente que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar a outra parte dos aspectos nela compreendidos.

Tudo sob pena de se considerarem tais cláusulas excluídas do contrato – art. 8º als. a) e b).

Porém, a autora não alegou a falta de comunicação e de informação na p.i., tendo-o apenas feito na “réplica” (arts.  29º a 64º).

Acontece que esses artigos foram considerados não escritos pelo despacho de fls. 94.

Deste modo, a autora não cumpriu de forma processualmente adequada o ónus de alegação da falta de comunicação, pelo que sobre a ré não recaía o ónus de prova da comunicação.

Todavia, é patente que as condições gerais que constam do contrato (fls. 26 v) são praticamente ilegíveis, por a letra ser de dimensão muito reduzida e com um espaço entre as linhas também muito reduzido.

Mesmo com recurso a uma lupa é impossível, ou pelo menos muito difícil e cansativo, para uma pessoa de visão média, conseguir ler algumas das palavras.

Ademais, as condições gerais encontram-se no verso do documento que corporiza o contrato, ou seja, depois da assinatura do representante da autora (apesar de no texto do contrato constar uma nota, com letra reduzida, com o seguinte teor ”Todas as subscrições implicam a aceitação das cláusulas indicadas no verso”).

Por estas razões, e nos termos do art. 8º als. c) e d), do Dec. Lei n.º 446/85,consideram-se excluídas do contrato as referidas “Condições Gerais”.

Por outra via:

Na apelação, como vimos, a autora impugnou a matéria de facto, com êxito, propugnando que a ré seja condenada a pagar o valor dos danos sofridos com o furto das portadas ocorrido no dia 05 de Dezembro de 2012, a liquidar posteriormente, e das despesas suportadas com a protecção das janelas.

Assim, em causa na apelação está somente o incidente atinente ao furto por desconhecidos das 8 portadas e das despesas suportadas com a protecção das janelas.

Como decorre do provado, entre a autora e a ré foi celebrado um contrato de instalação e prestação de serviços de assistência, passando aquela a pagar por este último serviço a quantia mensal de 40,80€.

Apurou-se ainda que a R. garantiu à A., e esta ficou plenamente convencida que, sempre que houvesse intrusão ou tentativa de intrusão na moradia, o alarme existente no local e a Central de Alarmes da R. seriam imediatamente accionados - e que, neste caso, a R. contactaria de imediato com os colaboradores da A. e com as forças policiais (para que estas se deslocarem ao local); e garantiu que, se houvesse falha na corrente eléctrica, esta seria assegurada por uma bateria de emergência (que teria que ser substituída se estivesse descarregada).

Provou-se também que se a bateria fosse accionada ou o alarme instalado na casa do cliente ficasse desligado da corrente, a Central de Alarmes tomaria conhecimento e accionaria as reparações e/ou substituição necessárias.

Aconteceu que na madrugada de 5 de Dezembro de 2012 a moradia foi "assaltada" por desconhecidos tendo sido furtadas 8 portadas de alumínio (que protegiam as janelas e sacadas do piso térreo e do primeiro piso), tendo sido os vizinhos, e não a R., a avisar a A. do sucedido.

Na ocasião o sistema informático da Central da R. acusava uma deficiência na central instalada na moradia da autora, não tendo o alarme sido accionado devido a avaria nesta central já anteriormente a esta data, não conseguindo, por isso, a ré aceder remotamente à mesma.

Nesse dia, pelas 11h e 10m o colaborador da A. (VS) contactou a R, tendo o mesmo perguntado se o alarme havia disparado e se teria havido tentativa de contacto por parte da Ré, tendo o operador desta, TN, informado que não e que estava pendente uma assistência ao cliente, com deslocação ao local.

Perguntado por aquele desde quando e qual o estado do alarme, aquele operador informou que o alarme tem transmitido sinais de bateria fraca com reposição, mas que naquele momento não conseguia aceder às informações solicitadas.

A A. pediu o envio do relatório informático das ocorrências (fls 14), que a R. não enviou.

Nesse dia 5-XII-12 o técnico da R. (FA) deslocou-se ao local, tendo verificado que a central estava "queimada" (totalmente avariada) - tomando-se necessário instalar nova central, o que fez.

Desta factualidade decorre que naquela ocasião a ré não cumpriu o seu dever de assistência, pois que, estando ciente de que a central instalada na moradia da autora tinha transmitido sinais de bateria fraca e que tinha deixado de conseguir aceder remotamente à mesma, o que inculcava, claramente, a ideia de que a central estava avariada, nada fez, só procedendo à substituição da central após o furto das portadas.

Ora, competia à ré agir de forma a poder receber os sinais de alarme provenientes do imóvel do cliente, verificar os meios técnicos adequados à reposição da normalidade da situação, transmitir à autora os avisos de alarme detectados e, caso necessário, transmitir esses avisos às forças Segurança (plano de acção previsto no programa contratual) – vide documento de fls. 29 (frente).

Assim, na ocasião da ocorrência daquele furto, a ré não cumpriu a prestação devida, pois que se apurou que ocorreu um assalto sem que o sistema de alarme (sensores magnéticos colocados nas portadas) tivessem detectado esse evento e sem que, em consequência, o referido “plano de acção” tivesse funcionado.

Incumpriu, pois, em termos objectivos, a prestação contratual.

É certo que a ré não se vinculou a uma obrigação de resultado, isto é, a evitar os assaltos, mas sim a uma obrigação de meios.

Porém, enquanto serviço de prevenção e dissuasão de furtos, pressupõe e exige, naturalmente, que o equipamento de alarme montado funcione, que cumpra a sua função.

Deste modo, tendo-se registado o furto de 8 portadas e não tendo então o alarme funcionado, como estava previsto/contratado, verificou-se e existiu um incumprimento contratual, o qual se presume culposo (art. 799º, n.º 1, do C.C.), sendo que a ré não ilidiu essa presunção.

Efectivamente, não se provou ser insuficiente, para efeitos de reparação, o tempo decorrido entre o momento em que se registou a avaria no sistema de alarme instalado no imóvel da autora e o momento da ocorrência do furto.

Também não se provou ser atribuível a esta ou a um terceiro aquela avaria.

Conclui-se, por isso, no sentido de se presumir imputável à ré a falta de reparação do sistema de alarme em tempo útil.

Da questão do nexo de causalidade:
 
No caso em análise não se demonstrou que se o alarme funcionasse tal evitaria a concretização do furto das portadas (repare-se que no assalto de 13/12/2012, apesar do alarme ter disparado, foram furtadas duas portadas – vide doc. de fls. 242/243).

A questão está assim em saber se se pode afirmar que o comportamento da ré foi conditio sine quo non dos danos sofridos, na medida em que, retirado que fosse o facto ilícito e culposo da ora ré, se não sabe se o alarme tivesse disparado o furto seria concretizado ou os assaltantes se colocariam em fuga.

É que o sistema/equipamento de segurança pode funcionar devidamente – dar o devido sinal na central de alarmes e desencadear o plano da acção previsto – e ainda assim ocorrer um assalto.

O problema é pois daquilo que na doutrina e em alguma jurisprudência tem sido abordada como uma perda de chance.

A perda de chance é uma nova figura jurídica (surgida em França, em meados dos anos 60 do século XX – “perte de chance”) que, entre nós, tem merecido pouca atenção da doutrina e da jurisprudência, e mais aplicada no domínio da responsabilidade médica (cf. Dr.ª Rute Pedro, “A Responsabilidade Civil do Médico”, 179 e ss) e, mais recentemente, no da contratação pública (cfr. Rui Cardona Ferreira, Indemnização do Interesse Contratual Positivo e Perda de Chance, Em Especial, na Contratação Pública).

Trata-se de situações em que um comportamento potencialmente gerador de responsabilidade provoca o malogro de uma possibilidade (chance) de obter, no futuro, uma vantagem ou de evitar uma desvantagem, colocando-se a questão da possibilidade de ressarcimento dessa perda de possibilidade.

Como é bom de ver, uma hipótese de perda de oportunidade apenas pode colocar-se verdadeiramente quando não se alcança a prova de que um determinado facto foi causa física de um determinado dano final.

É essa a situação que ocorre nos autos, pois que não se provaram factos que permitam formular um juízo de causalidade naturalístico. Trata-se de um caso em que existe uma efectiva impossibilidade de prova por parte da autora em satisfazer o ónus de demonstrar, e com toda a probabilidade, de que o furto não teria sido concretizado, não fora o comportamento da ré.

Ora, apesar de não ser possível afirmar que o funcionamento do alarme evitaria a acção (furto), ficou certo que a conduta omissiva da ré fez perder a autora a chance de, através do accionamento do alarme, evitar um prejuízo, isto é, a concretização do furto ou pelo menos evitar a extensão dos danos.

O dano de perda de chance reporta-se ao valor da oportunidade perdida.

A doutrina da perda de chance propugna, em tese geral, a concessão de uma indemnização quando fique demonstrado, não o nexo causal entre o facto e o dano final, mas simplesmente que as probabilidades de obtenção de uma vantagem, ou de evitamento de um prejuízo, foram reais, sérias, consideráveis. Sustenta-se que, para efeitos de verificação do nexo de causalidade, se deve colocar o acento tónico não no resultado final, mas nas possibilidades de ele ser atingido (é necessário que o acto ilícito e culposo seja a causa jurídica da perda da chance).

Trata-se de uma técnica a que se recorre, pois, para ultrapassar as dificuldades de prova do nexo causal, pretendendo-se com a mesma evitar-se a solução drástica, e em muitos casos injusta, a que conduz o modelo tradicional do tudo ou nada – cfr. Dra Patrícia Helena Leal Cordeiro da Costa, in Dissertação de Mestrado, Dano de Perda de Chance e a sua Perspectiva no Direito Português, pag. 4 a qual pode ser consultada no Google.

A chance surge assim como uma entidade autónoma, como um dano emergente, sendo o seu quantum inferior ao dano final, a determinar de acordo com a equidade e em função do grau de seriedade (probabilidade de êxito) da chance perdida.

Através da noção da perda de chance faz-se “avançar” a incerteza do encadeamento causal de acontecimentos para o da valoração dos danos, transformando-se o problema da prova da causalidade numa questão de avaliação do dano – vide Rute Teixeira, ob. cit. pags. 221, 225, 229, 230 e 408.

Várias críticas têm sido feitas a este enquadramento da figura da perda de chance, desde logo o seu artificialismo.

Com efeito, tratando-se de um dano autónomo, é difícil explicar que para a sua indemnizabilidade se exija um determinado grau de gravidade, pois que, no direito português, em princípio, todos os danos patrimoniais são indemnizáveis – arts. 562º, 564º e 566º, n.º 2, do CC.

Daí que Rui Cardona Ferreira rejeite esta configuração tradicional da figura da perda de chance, sustentando que, em face do direito português, não se pode caracterizar a perda de chance como um dano patrimonial autónomo e que haverá que trilhar outro caminho, mediante a revisão da teoria da causalidade normalmente adoptada, configurando a perda de chance como uma modalidade ou um critério da causalidade entre o facto lesivo e o dano final ocorrido – ob. cit. pags. 285 e 347.

Para tanto, sustenta que a tal não obsta a circunstância de ser generalizado o entendimento de que no art. 563º do CC se consagra a teoria da causalidade adequada, na medida em que a ciência do Direito não é imóvel, nem estanque, sendo necessário traçar o esboço de uma possível reconfiguração dogmática da perda de chance, passando por um entendimento mais subtil ou mais diversificado da causalidade jurídica, tanto mais que a teoria da causalidade adequada não fundamenta normativamente o grau de previsibilidade ou de probabilidade exigível – pags. 287, 288, 307 e 338.

Assim, o autor recorre aos contributos provenientes da doutrina penalista, em especial dos ensinamentos do penalista alemão Claus Roxin, admitindo, em certos casos, o recurso à teoria da conexão do risco, de acordo com a qual, o resultado danoso deve ser imputado ao agente quando a respectiva conduta tenha criado ou aumentado um risco não permitido ou, nos casos de omissão, não tenha eliminado ou diminuído esse risco, nos termos que seriam exigíveis.

Propugna ainda que, embora esta teoria tenha por efeito, em larga medida, a restrição ou exclusão da imputação do resultado nos casos em que seria considerado como decorrente da conduta do agente, segundo a teoria da equivalência das condições, “o que sucede é que este efeito negativo da teoria em causa procede de um critério novo, que não é delimitador, mas fundador, ou seja, a conexão do risco não se apresenta apenas com uma dimensão rectora ou coadjuvante de outro critério de imputação, mas antes com uma dimensão verdadeiramente etiológica. Por outras palavras, a exclusão da imputação nos casos em que não se verifique um risco não permitido tem, como contrapartida ou face oposta da mesma moeda, a afirmação da imputação aí onde o risco possa ser detectado e o resultado venha a consistir na respectiva materialização” – pags. 320 e 321.

Refere também que a teoria da conexão do risco conduz, na generalidade dos casos, às mesmas soluções que, sob a invocação da tradicional teoria da causalidade adequada, são perfilhadas na nossa doutrina civilista e que, em determinados grupos de casos, sujeitar a indemnização à exigência da elevada fasquia da conditio sine qua non pode significar a criação de verdadeiras zonas francas ou de isenção de responsabilidade, quando o circunstancialismo objectivo, factual ou normativo, caracterizador das situações em causa, se traduza na impossibilidade de satisfazer tal exigência – pags. 333 e 335.

Propõe, por isso, que se relativize o estatuído no art. 563º do CC de molde a que a teoria da causalidade aí consagrada não obste a que, em determinado número de casos, nomeadamente no domínio da perda de chance, se recorra à teoria da conexão do risco e ao alargamento do especto de imputação, prescindindo do crivo da conditio sine qua non – pags. 341 e 342.

A ser assim, o dano decorrente da perda de chance seria um verdadeiro lucro cessante.

Os entendimentos que se deixam expressos, embora fundados em diferente base jurídica, tendem para a possibilidade do dano de perda de chance ser ressarcível.

Como refere Rui Cardona Ferreira, é intuitivo que a recusa liminar da existência de um dano indemnizável constitui uma fonte de injustiça e deixa insatisfeita qualquer das finalidades reconhecidamente desempenhadas pela responsabilidade civil (ob.cit. pag. 285).

Num caso como o dos autos, seria, a nosso ver, intolerável e repugna a consciência jurídica que se negasse liminarmente à autora o direito a ser indemnizada só porque não provou o nexo de causalidade entre o dano (final) sofrido e a falta de funcionamento do sistema de alarme.

Haverá, assim, que formular um juízo/julgamento hipotético, sobre as consequências da falta de funcionamento do alarme, o que passa pela aferição do grau de risco/probabilidade de verificação do resultado danoso.

No caso dos autos, desconhece-se o tempo que os assaltantes demoraram para se apoderarem das 8 portadas. Não é, porém, temerário afirmar que essa operação demorou por certo vários minutos (note-se que algumas das portadas eram inclusivamente do 1º piso).

Ora, se o alarme tivesse funcionado, existia uma significativa possibilidade dos assaltantes se colocarem imediatamente em fuga para não serem “apanhados” ou pelo menos uma fortíssima possibilidade de retirarem um número significativamente menor de portadas, face ao receio do aparecimento de alguém ou da autoridade policial, o que aponta claramente para uma redução das consequências danosas do evento.

Deste modo, a conduta da ré foi causa adequada da perda da oportunidade por parte da autora de evitar a concretização do assalto ou pelo menos parte significativa dos danos provocados.
Em casos como este, na fixação do quantum indemnizatório, haverá que recorrer à equidade – art. 566º, n.º 3, do C. Civil – vide Rute Teixeira Pedro, ob. cit. pag. 373.

Ora, nesta sede, a factualidade apurada permite desde já liquidar esse montante.

Assim, valorando toda a factualidade provada (apurou-se que o fornecimento e montagem de 8 portadas, em substituição das furtadas em 05 de Dezembro de 2012, foi orçamentado, em 29 de Dezembro de 2012, no valor total de € 6.080,00, acrescida de IVA, e que a A. adquiriu materiais para proteger os vidros, despendendo 327,37€, e 150€ em mão de obra), entende-se razoável e equilibrado fixar na quantia de €5.000,00, o valor da oportunidade perdida pela autora com a falta de funcionamento do alarme no incidente ocorrido dia 5/12/2012 (quanto aos demais incidentes não se apurou qualquer conduta ilícita da ré).

Procede, assim, em parte a apelação.
 
Sumário:

1. Sendo praticamente ilegíveis as condições gerais que constam do contrato celebrado entre as partes, com recurso a cláusulas padronizadas, e encontrando-se aquelas condições gerais no verso do documento que corporiza o contrato, ou seja, depois da assinatura (não obstante constar no texto do contrato uma nota, com letra reduzida, com o seguinte teor ”Todas as subscrições implicam a aceitação das cláusulas indicadas no verso”) devem as mesmas ser consideradas excluídas do contrato, nos termos do art. 8º als. c) e d), do Dec. Lei n.º 446/85.

2. Tendo a ré instalado uma central de alarmes num imóvel da autora, de que tinha o dever de assistência, competia aquela agir de forma a poder receber os sinais de alarme provenientes do imóvel desta (cliente), verificar os meios técnicos adequados à reposição da normalidade da situação, transmitir à autora os avisos de alarme detectados e, caso necessário, transmitir esses avisos às forças Segurança (plano de acção previsto no programa contratual).

3. Não tendo o alarme funcionado por ocasião de um assalto, como estava previsto/contratado, devido a avaria, estando a ré ciente de que a referida central tinha transmitido sinais de bateria fraca e deixado de conseguir aceder remotamente à mesma, conclui-se que a ré incumpriu, em termos objectivos, a prestação contratual, incumprimento esse que se presume culposo (art. 799º, n.º 1, do C.C.).

4. Apesar de não ser possível afirmar que o funcionamento do alarme evitaria a acção (furto), ficou certo que a conduta omissiva da ré fez perder a autora a chance de, através do accionamento do alarme, evitar um prejuízo, isto é, a concretização do furto ou pelo menos evitar a extensão dos danos.

5. A ressarcibilidade do dano de perda de chance está dependente da formulação de um juízo/julgamento hipotético, sobre as consequências da falta de accionamento do alarme.

6. Essa perda só poderá ser valorada se traduzir uma probabilidade consistente, uma possibilidade real de êxito que se frustrou, caso em que se justifica recorrer à equidade – art. 566º, n.º 3, do C. Civil.

***

VI. Decisão:

Pelo acima exposto, decide-se:

1. Julgar a apelação parcialmente procedente, condenando-se a ré a pagar à autora a quantia de €5.000,00 (cinco mil euros) como compensação pelos danos sofridos decorrentes do furto das 8 portadas ocorrido dia 5/12/2012, mantendo-se no demais o decidido na sentença;
2. Custas devidas nesta Relação pela apelante e apelado, na proporção de 1/3 e 2/3, respectivamente;
3. Notifique.


Lisboa, 14 de Julho de 2015

(Manuel Ribeiro Marques - Relator)
(Pedro Brighton - 1º Adjunto)
(Teresa Sousa Henriques – 2ª Adjunta)
Decisão Texto Integral: