Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5251/23.7T8SNT-A.L1-2
Relator: PAULO FERNANDES DA SILVA
Descritores: NULIDADE DA SENTENÇA
EXCESSO DE PRONÚNCIA
DECISÃO SURPRESA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
ACTA
TÍTULO EXECUTIVO
CERTEZA E SEGURANÇA JURÍDICAS
EXIGIBILIDADE
LIQUIDEZ
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/04/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: (artigo 663.º, n.º 7, do CPCivil):
I. Sob pena nulidade por excesso de pronúncia, o Juiz está limitado ao pedido, causa de pedir e matéria de exceção invocados pelas partes, salvo quanto a questões de que deva conhecer por ofício próprio.
II. Numa outra vertente, o excesso de pronúncia decorre igualmente quando o Tribunal decide em momento processualmente inadequado para tal, decide prematuramente, produzindo uma decisão-surpresa.
III. A sentença deve estar minimamente motivada de facto e de direito, sendo nula aquela em que falte de todo em todo tal motivação ou em que esta seja absolutamente incompreensível, não cumprindo, assim, o dever constitucional e legal de justificação que deve revestir qualquer decisão judicial.
IV. Em conformidade com o disposto no artigo 6.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25.10, na redação do artigo 4.º da Lei n.º 8/2022, de 10.01, a ata da reunião da assembleia de condóminos constitui título executivo na medida em que dela conste a deliberação do montante das contribuições a pagar ao condomínio, com indicação do montante anual a pagar por cada condómino e o termo final de pagamento de tais contribuições.
V. Tal configura-se como uma decorrência da certeza, exigibilidade e liquidez que deve revestir a obrigação exequenda. 
VI. No apontado regime legal, a ata da reunião da assembleia de condóminos que se limita a identificar o condómino alegadamente incumpridor e o montante da respetiva dívida não constitui título executivo.
VII. o Juiz deve abster-se de conhecer de questões cuja apreciação se mostre desnecessária, escusada, inútil, em função de outras anteriormente abordadas e decididas.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I.
RELATÓRIO.
Em 20.03.2023 o Exequente, CONDOMÍNIO DO PRÉDIO SITO NA RUA …, N.º …, AGUALVA-CACÉM, deduziu execução para pagamento de quantia certa, com processo ordinário, contra a Executada, A …, liquidando em €13.505,17 a quantia exequenda, correspondendo a mesma à adição das quantias de €7.352,94, referente à falta de pagamento de quotas de condomínio de dezembro de 2004 a dezembro de 2022, €5.297,34, quanto a juros moratórios,  €25,50 a título de taxa de justiça, €94,10 da provisão de início de processo e €735,29 aos honorários de Advogado.
Com o seu requerimento inicial o Exequente juntou (i) a ata de condomínio n.º … de 18.04.2022, (ii) certidão permanente do Registo Civil relativo ao ….º andar …, fração …, do prédio sito na Rua … n.º …, em Agualva-Cacém, (iii) um aviso de pagamento endereçado por via postal a Herdeiros de B … não reclamado junto dos CTT e (iv) uma conta corrente, intitulada «valores por liquidar por fração» relativa à indicada fração «AT».
Por despacho de 24.04.2023, notificado ao Exequente, o Juízo de Execução de Sintra proferiu decisão do seguinte teor:
«(…)
Pelo exposto, e nos termos do disposto no artigo 734º, 726º, nº 4 do C.P.C, determino a notificação da exequente para, em 10 dias, juntar aos autos a(s) acta(s) da(s) assembleia(s) de condóminos em que se fixou a quota-parte de comparticipação de cada condómino nas despesas comuns, bem como o montante e prazo de pagamento, relativamente aos anos em causa.
(…)
Assim sendo, é manifesta a falta de título executivo no que respeita a (…) despesas [relativas aos honorários de advogado], pelo que nos termos do disposto no artº 726º, nº 2, al. a) do CPC, se indefere liminarmente, relativamente aos montantes de 735,29€, o requerimento executivo inicial».
O Exequente foi notificado daquele despacho e nada disse ou juntou aos autos de execução.
Entretanto, a Executada foi citada e deduziu embargos de executado.
Alegou, em síntese, que a ata n.º … não reúne os requisitos para ser considerada título executivo, pois não contém a deliberação com a aprovação dos valores vencidos e não pagos, nem tem a descriminação dos concretos montantes das contribuições não pagas e o período a que as mesmas se referem.
Impugnou a dívida exequenda e referiu que encontrarem-se prescritas as prestações de condomínio anteriores a setembro de 2018.
Nestes termos, concluiu pedindo que (i) os embargos sejam julgados procedentes, (ii) a referida ata n.º … não seja declarada como título executivo, (iii) a obrigação exequenda seja declarada extinta ou, caso assim não se entenda, (iv) a quantia exequenda seja declarada prescrita.
Os embargos foram liminarmente admitidos.
Devidamente notificado para tal, o Exequente, enquanto Embargado, não deduziu contestação.
Em face da falta de contestação, o Juízo de Execução de Almada considerou «confessados todos os factos articulados na petição de embargos que não estejam em oposição com os expressamente alegados pelo exequente no requerimento executivo – cfr. arts. 732º, nº 3, e 567º, nº 1, do Cod. Proc. Civil», e notificou as partes «nos termos e para os efeitos do n.º 2 do citado art. 567.º».
Cumprido aquele último normativo, as partes nada disseram e o Juízo de Execução de Almada proferiu sentença na qual julgou procedentes os embargos de executado e declarou extinta a execução.    
Inconformado com aquela decisão, o Exequente/Embargado interpôs dela recurso, apresentando as seguintes conclusões:
«i. Com o presente recurso visa, a Recorrente, visa a nulidade processual a nulidade do saneador-sentença,
ii. Quanto, o tribunal a quo não exarou despacho a dispensar da audiência prévia nem pela sua marcação,
iii. A sentença de que ora se recorre é violadora de dois princípios básicos de processo civil, o princípio do contraditório e o princípio do dispositivo,
iv. Foi cometida uma nulidade, traduzida na prolação de decisão final de mérito sem facultar às partes a produção de todos os meios de defesa, com dispensa de realização da audiência de julgamento e, consequente, produção de prova testemunhal, susceptível de influenciar o exame e a decisão da causa, com manifesta violação do princípio do contraditório.
v. A sentença viola o dever de motivação da matéria de facto,
vi. No presente processo não foi proferido nenhum despacho a convidar as partes para alegarem e para se pronunciarem sobre a possibilidade de ser tomada decisão sem julgamento.
vii. Trata-se de uma nulidade processual traduzida na omissão de uma diligência imposta por lei e que pode influenciar a decisão final.
viii. Esta nulidade assume-se como uma nulidade da própria sentença proferida e, como tal, enquadrável no art.º 615º do CPC.
ix. Implica a anulação do processado a fim da tramitação processual regressar ao momento anterior de forma a possibilitar a efectiva audição das partes em sede de audiência prévia, devendo, no despacho que a designar, serem esclarecidos, em concreto, os fins a que se destina.
x. Bem ainda,
xi. Decidiu o tribunal a quo, que, a falta de contestação tivesse como efeito serem considerado confessados os factos alegados pelo executado/opoente.
xii. Sendo que,
xiii. A recorrente foi notificada para contestar a 4/12/2023 e foi proferido despacho de desentranhamento a 17/1/2024, ainda no decorrer do prazo peremptório artigo 139.º do NCPC nº 5,
xiv. Na falta de impugnação pelo exequente, não se consideram confessados os factos que estejam em oposição com o expressamente alegado no requerimento executivo, obstando-se, por esta via, à produção de um efeito cominatório que se supõe desproporcionado, nos casos em que o exequente, não tendo embora contestado as razões apresentadas pelo embargante, já houvesse, no requerimento executivo, tomado clara e expressa posição sobre a questão controvertida.
xv. Não podendo determinar a confissão pelo embargado/recorrente dos factos deduzidos em sua defesa pelo embargante, a acção executiva terá de prosseguir a sua legal tramitação.
xvi. A exequente intentou acção executiva sumária com vista a obter a cobrança de 13.505,17€ relativos a quotas de condomínio não pagas desde o ano de 2004, acrescidas de penalização de 4% de juros, €25,50 de taxa de justiça paga, de €94,10 de provisão paga ao agente de execução para início do processo e de honorários de advogado, para tanto alegando que a executada é a proprietária da fracção autónoma designada pela letra “…”, correspondente ao …º Andar …, do prédio, e que não pagou as prestações em causa.
xvii. A Executada em sede de embargos de executada invocou, no essencial, que as quotas reclamadas anteriores a 2018 já se encontram prescritas, e no seu sere que inexiste título executivo,
xviii. É indubitável que a executada deve as quotas de condomínio conforme explanadas no Requerimento executivo, sem que tenha apresentado justificação para a sua dívida, em sede de embargos nada impugnou quanto à dívida, nem aos valores peticionas, cingindo-se à falta de título e à prescrição.
xix. Da ata junto aos autos com o numero …, esta é clara quanto ao que obriga o precito legal, constando da mesma as obrigações art. 1.°, n.º 1 do DL 268/94, de 25 de Outubro, que “a acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte”.
xx. O título existe e enquadra-se no disposto o art. 703.º, al. d) do CPC,
xxi. A ata de condomínio é título executivo nos termos do artigo 703º/1, já que o artigo 6º do DL 268/94 lhe atribui força executiva.
xxii. Assim, deve ser declarada a nulidade da sentença recorrida, determinando-se a consequente remessa do processo ao tribunal a quo, para que aí seja facultada às partes a discussão de facto e de direito do mérito da causa, nos termos e para os efeitos do art.º 591º, nº 1, al. b) do CPC e sejam, subsequentemente, seguidos os trâmites processuais decorrentes, seja com decisão de mérito, seja com o prosseguimento dos autos para apreciação do pedido e das excepções deduzidas, nomeadamente face às várias soluções plausíveis de direito e seu reflexo no conhecimento do mérito da causa.
xxiii. Concluindo, a decisão proferida pelo Douto Tribunal “a quo” violou os preceitos legais e Princípios, supracitados, deve ser integralmente revogada e/ou alterada por outra que ordene o prosseguimento dos autos, até final, com as demais consequências legais.
Termos em que V. Exas concedendo provimento ao recurso e alterando a douta decisão recorrida nos termos pugnados nas presentes alegações, Farão inteira Justiça!»
Notificado do recurso, a Executada/Embargante não contra-alegou.
Colhidos os vistos, cumpre ora apreciar a decidir.
II.
OBJETO DO RECURSO.
Atento o disposto nos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPCivil, as conclusões do recorrente delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo do conhecimento de questões que devam oficiosamente ser apreciadas e decididas por este Tribunal da Relação.
Nestes termos, atentas as conclusões deduzidas pelo Recorrente, não havendo questões de conhecimento oficioso a dilucidar, está em causa apreciar e decidir:
- Da nulidade por excesso de pronúncia,
- Da nulidade por insuficiência de fundamentação;
- Da exequibilidade do título dado à execução,
- Da impugnação de decisão de facto,
- Da prescrição declarada e seus efeitos.
Assim.
III.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A factualidade a considerar na motivação de direito é a que consta do relatório deste acórdão que aqui se dá por integralmente reproduzido, sendo que o Tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos:
«- A embargante nunca foi convocada para as assembleias gerais de condomínio, nem foi notificada das decisões nelas tomadas.
- A Ata nº … de 18/04/2022, da Embargada, dada à execução não contém a deliberação com a aprovação dos valores vencidos e não pagos.
- Não existem na ata nº …, os montantes das contribuições discriminadas e o período a que se referem, incluindo a sua quota-parte;
- Não existe, na ata nº …, o respectivo prazo de pagamento nem do seu vencimento.
- A Ata dada à execução nº … de 18/04/2022 pela embargada, limita-se no seu ponto 2(dois):
 “(…)
A. A mencionar que se encontravam em dívida ao dia de 31 de Dezembro de 2021, as quotas das frações de habitação… incluindo o …º B no valor global de 13.964,24€;
B. A Assembleia foi informada sobre o estado dos processos que estão a decorrer em tribunal;
Processo da fração do …º A;
…º B - …/…;
Ficaram a dever quotas ao condomínio, as fracções;
Ex-Proprietário … - C …-Proc nº …/…
Ex-proprietário … - Executado Sr. D … / E … Proc 2.597,52€, …/…
Ex-Proprietário do …, Executado Sr. F … no valor de 755,30€
A assembleia deliberou dar entrada de novos processos executivos, para recuperação dos valores em dívida das frações; de “… a …”, referente às lojas do Centro Comercial …, que é administrado pelo Centro Comercial …, sito na Rua … nº …, Cave e R-Chão, tendo em conta, que devem ao condomínio do prédio o valor de 1.071,60€, referente ao Fundo Comum de Reserva, e 50% do valor da renda da loja que pertence ao condomínio e ao Centro Comercial ….
 Os Proprietários Sr. G …, e Sra. H …, do …, fração “…” devem quotas ao condomínio de resto de Março de 2019 até Dezembro de 2021, com a quota mensal de 30,98€. Foram várias vezes interpelados por cartas registadas com AR e e-mail e não procederam ao pagamento da dívida.
A proprietária Sra. I …, do …, correspondente à fracção “…”
C. Valores em débito - Período 01-01-2021 a 31-12-2021, onde num quadro descrimina as várias frações, Entidade (proprietário), Saldo inicial, previsto, recebido, saldo.
C.1 - Assim, e extrapolando, só no que respeita à fração em causa menciona: Fração Entidade Saldo inicial Previsto Recebido Saldo: [1]


FraçãoEntidadeSaldo inicialPrevistoRecebidoSaldo
AT-….º-Herdeiros de B … 6.479,48321,36294,586.506,26


- Apenas na carta junta aos autos, carta não recebida e devolvida, vem a descrição dos montantes em débito, ou seja, a conta corrente, fazendo referência em 31-12-2008 a quotas de 2004/2005/2006/2007/2008, bem como a quotas de 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018, 2019, 2020, 2021 e 2022. Perfazendo um total de 7.352,94€.
- A execução foi instaurada a 20.03.2023 e a citação da executada ocorreu a 19.09.2023».
(Negrito da autoria dos aqui subscritores).
IV.
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
1. DA NULIDADE POR EXCESSO DE PRONÚNCIA.
(Conclusões i a iv, vi a ix, xii, xiii, xxii e xxiii das alegações de recurso).
Neste domínio a Embargada/Recorrente alega, em síntese, que o Tribunal recorrido proferiu prematuramente saneador-sentença, dispensando sem mais a audiência prévia e a produção de todos os meios de defesa, assim violando os princípios do contraditório e do dispositivo.
Apreciemos.
O artigo 615.º n.º 1, alínea d), do CPCivil dispõe que «[é] nula a sentença quando o juiz (…) conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».
Ou seja, o Juiz está limitado ao pedido, causa de pedir e matéria de exceção invocados pelas partes, salvo quanto a questões de que deva conhecer por ofício próprio.
O excesso de pronúncia afere-se, pois, pelo pedido, causa de pedir e exceção deduzidos na ação ou em incidente.
Como referem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2.º, edição de 2019, página 737, «[n]ão podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de excepções não deduzidas na exclusiva disponibilidade das partes (art. 608-2), é nula a sentença em que o faça».
Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02.05.2024, processo n.º 1099/21.1T8AMD.L1.S1, «[t]al nulidade da sentença prende-se, essencialmente, com os comandos normativos extraídos dos arts. 608.º, n.º 2, e (…) 609.º, n.º 1, ambos do CPC, dos quais decorre que “o juiz (…) não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras” e que “a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir”.
Numa outra vertente, o excesso de pronúncia ocorre quando o Tribunal decide em momento processualmente inadequado para tal, decide prematuramente, produzindo uma decisão-surpresa.
Na situação vertente é manifesto que a decisão recorrida não padece de nulidade por excesso de pronúncia em qualquer das apontadas vertentes.
Com efeito, os embargos de executado não foram contestados no prazo de 20 dias legalmente concedido para o efeito, conforme artigo 732.º, n.º 2, do CPCivil, o Tribunal recorrido considerou «confessados todos os factos articulados na petição de embargos que não estejam em oposição com os expressamente alegados pelo Exequente no requerimento executivo», conforme artigos 732.º, n.º 3, e 567.º, n.º 1, do CPCivil, e notificou as partes para alegarem por escrito, conforme artigos 732.º, n.º 2, e 567.º, n.º 2, do CPCivil, sem que as mesmas o tenham feito.
Nestes termos e ao abrigo da parte final daquela última norma legal, na regular tramitação dos autos, seguir-se-ia a prolação de sentença, conforme sucedeu, pelo que a sentença recorrida não constituiu uma decisão-surpresa, sendo que na situação vertente a decisão final não dependia da anterior realização de audiência prévia e muito menos de audiência final.
Ao Embargado, ora Recorrente, foi conferido o exercício do contraditório em dois momentos processuais: para contestar os embargos de executado e para alegar por escrito quanto ao desfecho da causa na sequência do despacho que considerou confessados os factos articulados nos embargos nos termos indicados.
O não exercício do contraditório em nenhuma daquelas circunstâncias decorre exclusivamente de escolha do Embargado, não podendo este assacar a outrem os efeitos das suas opções e muito menos concluir pela inobservância do contraditório.
Diversamente do alegado pelo Recorrente, a decisão recorrida não violou, pois, o disposto nos artigos 6.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, 20.º da Constituição da República Portuguesa e 3.º do CPCivil.
Por outro lado, a decisão recorrida ateve-se ao objeto do processo, não se vislumbrando, por isso, qualquer inobservância do princípio do dispositivo.
Com efeito, na petição de embargos, a Embargante, aqui Recorrida, colocou em causa a exequibilidade do título dado à execução e invocou a prescrição parcial da dívida exequenda, aspetos que foram abordados na sentença recorrido, circunscrevendo-se esta a tais temas, pelo que a decisão recorrida conteve-se no objeto da causa, observando, assim, o princípio do dispositivo, designadamente o preceituado no artigo 609.º, n.º 1, 2.ª parte, do CPCivil: «[a] sentença não pode condenar em (…) objeto diverso do que se pedir».
Improcede, pois, nesta sede o recurso.
2. DA NULIDADE POR INSUFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO.
(Conclusões i e v das alegações de recurso).
 O Recorrente entende que «a sentença viola o dever de motivação da decisão de facto».
Apreciemos.
Nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPCivil, «[é] nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão».
A sentença deve estar minimamente motivada de facto e de direito, sendo nula aquela em que falte de todo em todo tal motivação ou em que esta seja absolutamente incompreensível, não cumprindo, assim, o dever constitucional e legal de justificação que deve revestir qualquer decisão judicial.
A fundamentação escassa ou deficiente ou incorreta não constituem causas de nulidade da decisão, conforme a apontada disposição legal. 
Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, volume I, edição de 2020, página 763, no que ora está em causa a sentença é nula quando ocorre «(…) a absoluta falta de fundamentação e não a fundamentação alegadamente insuficiente e ainda menos o putativo desacerto da decisão (…)».
No mesmo sentido, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13.10.2020, processo n.º 3015/06.1TBVNG.P1.S1, refere que «[q]uanto ao dever de fundamentar as decisões que se impõe ao juiz por imperativo constitucional e legal, mostra-se pacificamente aceite na doutrina e jurisprudência que só a falta absoluta de fundamentação (fáctica ou jurídica) conduz à nulidade da decisão, não integrando tal vício, uma fundamentação deficiente que apenas pode merecer cabimento em sede de erro de julgamento».
In casu.
A decisão recorrida fundamentou a decisão de facto nos seguintes termos:
«A convicção sobre a matéria de facto provada, supra discriminada, baseou-se na confissão do exequente e na documentação junta aos autos», sendo que no que a esta respeita, conforme factualidade dada como provada, o Tribunal recorrido considerou «a ata nº …» e «a carta junta aos autos». 
Nestes termos, embora de modo algo frugal, a decisão de facto em causa surge minimamente fundamentada.
Pode entender-se que seria desejável que a fundamentação surgisse de forma especificada, com referência a cada dos factos dados como provados.
Pode até discordar-se da fundamentação.
Não pode é dizer-se que ela inexiste, sendo que face à falta de contestação dos embargos e aos poucos documentos constantes dos autos tornam absolutamente compreensível a decisão de facto constante da sentença recorrida.
Nestes termos, não pode assacar-se à decisão recorrida o vício da falta de fundamentação ora em causa, termos em que improcede, pois, também nesta parte o recurso.
3. DA EXEQUIBILIDADE DO TÍTULO DADO À EXECUÇÃO.
(Conclusões xvi a xxiii das alegações de recurso).
Nos termos do artigo 10.º, n.º 5, do CPCivil, «[t]oda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva».
Conforme artigo 703.º n.º 1, alínea d), do mesmo Código, «[à] execução (…) podem servir de base [o]s documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva».
Segundo o disposto no artigo 6.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25.10, na redação do artigo 4.º da Lei n.º 8/2022, de 10.01, «[a] ata da reunião da assembleia de condomínio que tiver deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio menciona o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações», sendo que tal ata «constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte».
Ou seja, por força do apontado regime legal, em razão, pois, de disposição especial, a ata da reunião da assembleia de condóminos constitui título executivo na medida em que dela conste a deliberação do montante das contribuições a pagar ao condomínio, com indicação do montante anual a pagar por cada condómino e o termo final de pagamento de tais contribuições.  
Tal configura-se como uma decorrência da certeza, exigibilidade e liquidez que deve revestir a obrigação exequenda, conforme artigo 713.º do CPCivil. 
A obrigação é certa quando o seu objeto está substancialmente determinado, delimitado no seu conteúdo.
A obrigação é exigível caso possa ser imposta ao devedor pelo respetivo credor, o que sucede se a obrigação não estiver sujeita a termo, condição ou outra limitação.
A obrigação é líquida quando o objeto da sua prestação está quantitativamente definido, ou seja, está determinado quanto à sua quantidade ou montante.
Como refere Marco Carvalho Gonçalves, Lições de Processo Civil Executivo, edição de 2023, páginas 156, «[v]ale isto por dizer, a contrario, que não constitui título executivo a ata da reunião da assembleia de condóminos que se limite a identificar o condómino alegadamente incumpridor, bem como o respetivo montante em dívida (…), já que essa ata, para além de não observar os requisitos previsto no art. 6º, nº 1, do DL nº 268/94, de 25 de outubro, também não permite determinar a certeza, a exigibilidade e a liquidez da obrigação exequenda. (…)».
No caso sub judice.
O título dado à execução é a intitulada ata n.º … da Assembleia de Condóminos, datada de 18.04.2022.
Àquela data encontrava-se em vigor o artigo 6.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25.10, na apontada redação da Lei n.º 8/2022, de 10.01, entrada em vigor em 10.04.2022, conforme respetivo artigo 9.º, termos em que dispensa-se aqui de abordar a matéria relativa à natureza interpretativa ou inovadora de tal Lei.
Assim sendo, analisada a referida ata n.º … dada à execução constata-se que da mesma não consta a deliberação do montante das contribuições a pagar ao condomínio e muito menos nela é especificado o montante anual a pagar por cada condómino, nomeadamente pela Executada, ou o termo final de pagamento das contribuições a que a mesma está obrigada.  
A ata limita-se a indicar como valor de débito a quantia de «[€]6.506,26», com referência a 31.12.2021.
É certo que o Exequente, ora Recorrente, juntou com o seu requerimento executivo, uma alegada «conta corrente», documento n.º 4, onde indica diversos montantes alegadamente em dívida pelo Executada, entre 2004 e 09.12.2022.
Contudo, tal documento não constitui ata da reunião da assembleia de condóminos e só esta pode ser título executivo no caso, conforme regime jurídico indicado.
Mais, conforme decorre do relatório deste acórdão, notificado do despacho proferido nos autos de execução em 24.04.2023, para «juntar a(s) acta(s) da(s) assembleia(s) de condóminos em que se fixou a quota-parte de comparticipação de cada condómino nas despesas comuns, bem como o montante e prazo de pagamento, relativamente aos anos em causa», «nos termos do disposto no[s] artigo[s] 734º [e] 726º, n 4, do C.P.C.», o Exequente/Recorrente nada disse, nem juntou aos autos, numa clara opção de não suprir as deficiências apontadas naquele despacho de 24.04.2024. 
Nestes termos, conclui-se pela inexequibilidade do título dado à execução, pelo que carece de fundamento a execução, devendo procederem os embargos de executado e a execução ser declarada extinta, nos termos dos artigos 729.º, alínea a), e 732.º, n.º 4, do CPCivil, importando, assim, manter a decisão recorrida.
*
Segundo o disposto no artigo 608.º, n.º 2, do CPCivil, aplicável ao acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa por força do preceituado no artigo 663.º, n.º 2, do mesmo CPCivil, na parte que aqui releva, «[o] juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)». 
Nos termos da apontada disposição legal, o Juiz deve abster-se de conhecer de questões cuja apreciação se mostre desnecessária, escusada, inútil, em função de outras anteriormente abordadas e decididas, o que bem se compreende por motivos de coerência lógica do discurso judiciário e de eficiência do sistema de justiça.
Ora, na situação em apreço, considerando a procedência dos embargos de executado e a extinção da execução, mostram-se prejudicadas as demais questões suscitadas pelo Recorrente.
Improcede, assim, o recurso.
*
Quanto às custas do recurso.
Segundo o disposto nos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPCivil e 1.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais, o recurso é considerado um «processo autónomo» para efeito de custas processuais, sendo que a decisão que julgue o recurso «condena em custas a parte que a elas houver dado causa», entendendo-se «que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção que o for».
Ora, in casu improcede a pretensão do Recorrente.
Na relação jurídico-processual recursiva o Recorrente configura-se como parte vencida, pois a improcedência do recurso é-lhe desfavorável.
Nestes termos, as custas do recurso devem ser suportadas pelo Recorrente.

V. DECISÃO  
Pelo exposto, julga-se improcedente o presente recurso, mantendo-se, pois, a sentença recorrida que julgou procedentes os embargos de executado e declarou extinta a execução.
Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 4 de julho de 2024
Paulo Fernandes da Silva
José Manuel Correia
João Vaz Gomes

[1] O quadro apresentado não consta da sentença recorrida, fazendo parte, contudo, da referida ata n.º 57, no que respeita à fração autónoma AT, correspondente ao 5.º andar B.