Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JOÃO BRASÃO | ||
Descritores: | APOIO JUDICIÁRIO NOMEAÇÃO DE PATRONO NOTIFICAÇÃO FORMA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 09/11/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PRINCIPAL PROCEDENTE / SUBORDINADO IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | Sumário elaborado pelo Relator: –No âmbito do procedimento de concessão de apoio judiciário, a notificação ao requerente da nomeação de patrono, a ser feita por carta, deve sê-lo por carta registada, sob pena de não produzir efeitos. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: I.O relatório AA, BB, CC e DD iniciaram o presente procedimento especial de despejo contra Fortes & Barral, Lda.. Foi proferida sentença, na qual se decidiu: A intempestividade da oposição implica a não pronúncia do Tribunal sobre as questões ali suscitadas, impondo-se o desentranhamento dos autos da referida peça processual, o que se determina. Notifique. A intempestividade da oposição implica a não pronúncia do Tribunal sobre as questões ali suscitadas, impondo-se o desentranhamento dos autos da referida peça processual, o que se determina. Notifique. E, ainda: Nestes termos, decide-se: - Autorizar a entrada imediata no imóvel sito na Rua …, para efeitos de investimento dos requerentes, AA, BB, CC e DD, na posse do imóvel. *** Inconformada, a requerida Fortes & Barral, Lda interpôs recurso de apelação para esta Relação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: 1º. A sentença profligada é totalmente omissa acerca dos fundamentos para ter dado como provado o ponto 5. dos factos provados, pelo que é nula nos termos do disposto no art.º 615º, n.º 1, alínea b) do CPC; 2º. Ainda que assim não fosse, como é, a prova que emana dos autos não autoriza o facto que se deu como provado em 5., cuja redação deve ser fixada de acordo com o que foi comunicado pela Ordem dos Advogados, passando a ter uma redação como: “A nomeação foi notificada à requerida por ofício da OA datado de 18.03.2024, remetido por via postal simples em data não apurada.” 3º. O direito de acesso à justiça é um direito com dignidade constitucional mas é também muito mais do que isso; é fundamental e imprescindível para que, sequer, se possa falar em “Estado de Direito” 4º. Ao cidadão sem capacidade económica devem ser reconhecidos os mesmos direitos de acesso à justiça sob pena de se violar não apenas o art.º 20º mas também o art.º 13º da Constituição da República Portuguesa; 5º. Por isso mesmo foi declarada a inconstitucionalidade da norma da alínea a) do n.º 5 do artigo 24.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho – Ac. do Tribunal Constitucional n.º 515/2020, de 13 de Outubro. 6º. Violando a letra e o espírito de tal decisão do Tribunal Constitucional, na sentença profligada decide-se que a recorrente teria que provar a data em que recebeu uma carta que lhe foi enviada em correio simples, sendo que não fazendo tal prova ficam sem efeito os evidentes direitos que o Tribunal Constitucional já reconheceu; 7º. Tal prova é “diabólica”. É evidente que nenhum cidadão consegue provar o dia em que recebeu uma carta que lhe foi enviada em correio simples, pelo que se trata apenas e só de uma argumentação “viciada”, destinada a repristinar a validade de uma norma que já foi declarada inconstitucional. 8º. Na falta de qualquer argumento realmente jurídico o Tribunal «a quo», sem explicar como, porquê ou em nome de que princípio, decide pura e simplesmente fazer uma analogia com o disposto no art.º 248º do CPC. Analogia que, mais do que improcedente, tem de ser qualificada – sempre com o devido respeito – de absurda. 9º. Tão absurda que o próprio Tribunal «a quo» se escusa a explicá-la, dizendo apenas que a faz. Na falta de explicação – boa ou má – temos de concluir que tal analogia mais não é do que uma tentativa de negar o acesso ao direito à Requerida o que só acontece por ser pobre ao ponto de beneficiar de apoio judiciário. 10º. Por todo o exposto, a sentença profligada é flagrantemente injusta e violadora pelo menos do disposto nos art.ºs 13º e 20º da Constituição da República Portuguesa, é nula por falta de fundamentação e viola também o disposto no art.º 248º do CPC e no art.º 24º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, quando interpretada de acordo com o Ac. do Tribunal Constitucional n.º 515/2020, de 13 de Outubro. AA e outros apresentaram contra alegações e interpuseram recurso subordinado, apresentando conclusões nos seguintes nos seguintes termos: I – Quanto à intempestividade da oposição 1.ª A douta sentença recorrida encontra-se fundamentada nos documentos juntos aos autos, no que se inclui a tramitação das comunicações efetuadas entre o Tribunal “a quo” e a Ordem dos Advogados, mais concretamente, os pedidos de informação efetuados pelo Tribunal à Ordem dos Advogados e as respostas dadas por esta, com os documentos que as acompanharam, juntos a fls. e que aqui se dão por reproduzidos; 2.ª Não se verificando, como não se verifica, o caso nulidade da sentença recorrida por falta de fundamentação; 3.ª O Tribunal “a quo” deu como assente o ponto 5 da matéria de facto, com base nos pedidos de informação enviados pelo Tribunal à Ordem dos Advogados, no cotejo com as respostas e documentos por esta enviados ao Tribunal; 4.ª O teor concreto da pergunta efetuada pelo Tribunal, com referência expressa ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 515/2020, de 13 de Outubro de 2020, no cotejo com o teor da resposta dada pela Ordem dos Advogados, acompanhada de cópia da carta remetida à recorrente, não consentem outra interpretação; 5.ª Ao declarar “não saber exatamente em que data é que a notificação remetida pela Ordem dos Advogados foi colocada na sua caixa do correio” e “saber apenas que com toda a certeza não a tinha recebido há mais de 15 dias quando apresentou a oposição”, a recorrente justificaria, tão só –por sua confissão expressa (cf. Art.º 574º, n.º 3, do C.P.C.) – a alteração do ponto 5 da matéria de facto passando este a ter como nova redação “5. A nomeação foi notificada à requerida por ofício da OA remetido em 18.3.2024, por via postal simples, não sabendo a requerida exatamente em que data é que tal notificação foi colocada na sua caixa do correio.”, mas não a alteração no sentido pretendido pela recorrente; 6.ª No caso dos autos, o Tribunal a “quo” considerou, para início de contagem do prazo de defesa, não a data de notificação ao patrono nomeado à recorrente da sua designação, mas sim a data da notificação enviada pela Ordem dos Advogados à própria recorrente; 7.ª Nesta conformidade, não tendo havido por parte do Tribunal “a quo” aplicação da norma julgada inconstitucional para início de contagem do prazo interrompido pelo pedido de apoio judiciário requerido pela recorrente (não tendo havido aplicação da alínea a) do n.º 5 do artigo 24.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com o sentido de que o prazo interrompido por aplicação do n.º 4 do mesmo artigo se inicia com a notificação ao patrono nomeado da sua designação), não faz sentido apelar-se à inconstitucionalidade de uma norma não aplicada, sendo o recurso apresentado pela recorrente manifestamente improcedente; 8.ª O recurso à analogia no Código de Processo Civil é permitido como técnica de integração de lacunas, quando a lei não regula uma situação específica, mas existe uma norma que regula uma situação análoga; 9.ª No caso dos autos e na ausência de qualquer norma processual quanto a notificações por via postal simples, o Tribunal “a quo” considerou – e bem, por ser legalmente admissível - ser de aplicar a presunção constante do artigo 248.º do CPC, por analogia, considerando assim a recorrente notificada no dia 21.03.2028, terminando o prazo para dedução de oposição no dia 05.04.2024, ou no dia 10.04.2024, terceiro dia útil após o termo do prazo, por aplicação do disposto no artigo 139º do CPC.; Sem prescindir ou conceder, 10.ª Compulsados os autos, verifica-se que a R. apresentou a sua oposição em 16.04.2024, voltou a intervir nos autos em 10.05.2024 e suscitou a questão de a nomeação de patrono lhe ter sido notificada pela Ordem dos Advogados mediante via postal simples apenas em 19.07.2024, decorridos mais de três meses sobre a data em que a R. praticou, pela primeira vez, um ato no processo; 11.ª Assim, à situação em apreço nos autos aplicam-se as regras previstas nos artigos 186º a 202º do C.P.C.; 12.ª Nesta conformidade, não se verificando o caso de nulidade de que o tribunal possa conhecer oficiosamente (cf. art.º 196º do C.P.C.) ou o caso de nulidade principal (cf. art.º 198º do C.P.C.), a regra geral sobre o prazo de arguição de eventual nulidade de ato processual ou da respetiva irregularidade, é a regra geral que dispõe que “(...) o prazo para arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo (...)”, o mesmo se verificando no caso de mera irregularidade processual, em conformidade com o disposto no art.º 199.º, nºs 1 e 2, do C.P.C.; 13.ª Mas a recorrente nada disse; 14.ª Em face do que, mesmo sem recurso à analogia, a questão de a recorrente ter sido notificada pela Ordem dos Advogados por via postal simples, por não ter sido suscitada nos autos no prazo estabelecido no art.º 199.º, n.º 1, do C.P.C., deve julgar-se sanada, e a oposição apresentada pela recorrente, num caso como no outro, deduzida intempestivamente. II – Da improcedência do recurso 15.ª Os recorridos AA e mulher BB, CC e DD, eram à data da oposição à renovação do contrato de arrendamento sub judice, bem como à data da apresentação do requerimento de despejo, respetivamente, os únicos e legítimos usufrutuários e titulares da nua propriedade do imóvel locado – cf. CPU – caderneta predial urbana e certidão predial “on line” juntas a fls., que aqui se dão por reproduzidas; 16.ª Dúvidas não subsistem, por conseguinte, quanto à legitimidade ativa dos Autores/Recorridos, comprovada documentalmente; 17.ª Os recorridos (senhorios) comunicaram à recorrente (arrendatária) a sua oposição à renovação do contrato de arrendamento pelo meio próprio e com a antecedência devida, a saber, notificação judicial avulsa cumprida em 18.05.2018, ou seja, com antecedência superior a 1 ano em relação ao termo do prazo do contrato de arrendamento em apreço (31.05.2019), mostrando-se assegurada a sua legitimidade, bem como a adequação e a oportunidade do meio empregue, nos termos previstos no Art.º 9º e 10º, n.º 3, do NRAU e a antecedência prevista no Art.º 1.097.º, al. a), do Código Civil; 18.ª A recorrente não impugnou este facto, nem, na sua oposição, indicou ou requereu meios de prova; 19.ª Ao que acresce, notificadas as partes quanto à possibilidade de imediato conhecimento de mérito – mesmo no caso de admissão da oposição (cf. douto despacho de 17-07-2024) – com dispensa de realização de audiência final, nenhuma se opôs; 20.ª Pelo que os autos contêm todos os elementos necessários à decisão de mérito; 21.ª Tornado desnecessária, para não dizer inútil, a eventual baixa dos autos ao Tribunal de 1ª Instância; 22.ª Nesta conformidade, mesmo no caso da procedência do recurso interposto pela recorrida, deve ainda assim a oposição ser julgada improcedente, muito embora com fundamento diverso da douta sentença recorrida, proferindo-se douto acórdão que condene a recorrente a proceder à entrega do locado, valendo tal decisão como autorização de entrada imediata no imóvel locado, nos termos consignados no Art.º 15.º-I, n.º 11, do NRAU e as legais consequências. Improcede, pois, Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores, em qualquer caso, o recurso apresentado pela recorrente, devendo ser proferido Douto Acórdão que, indeferindo o recurso, confirme a douta sentença recorrida, com as legais consequências. III – Do recurso subordinado 1.ª Os recorridos concordam com a douta sentença recorrida; 2.ª Todavia, prevenindo o caso de procedência do recurso interposto pela recorrente Fortes & Barral, Lda., os recorridos não se conformam com o douto despacho proferido em 17.07.2024 (Ref.ª 437306370) pelo Tribunal de 1.ª Instância, quanto à parte em que, verificada a junção aos autos pelo M. Ilustre mandatário da recorrente de procuração sem ratificação do processado, na interpretação que fez da dita ocorrência processual, concedeu uma segunda oportunidade de validação do processado, ordenando a respetiva notificação para, em cinco dias, juntar aos autos procuração forense com ratificação de todo o processado, sob pena de, não o fazendo, ficar sem efeito tudo o que tiver sido praticado, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 48.º do Código do Processo Civil; 3.ª Cabe, assim, do mesmo, recurso subordinado ao abrigo do disposto, conjugadamente, nos Artºs 644.º, n.º 3 e 633.º, n.º 1 do CPC; 4.ª Em 08.05.2024, o Tribunal a quo proferiu despacho (Ref.ª 435323992) determinando o seguinte: “Do compulsar dos autos verifica-se que a procuração junta não foi subscrita pela Requerida, sociedade comercial. Assim, e antes de mais, ao abrigo do disposto no art.º 48.º n.º 1 do Código de Processo Civil, notifique a Requerida e o I. advogado para juntarem aos autos a procuração forense em falta e (eventualmente) providenciarem pela ratificação do processado (da responsabilidade daquela), sob cominação do disposto no art.º 48.º n.º 2 do Código de Processo Civil. Prazo: 5 dias”; 5.ª Este despacho, proferido em 08.05.2024, transitou em julgado em data anterior à data do douto despacho recorrido (17.07.2024), em concreto, transitou em julgado no dia 03.06.2024; 6.ª Na sequência do mesmo, veio, em 10.05.2024, o Ilustre mandatário da recorrida juntar aos autos procuração forense subscrita por EE, na qualidade de sócio gerente da Requerida, conferindo ao mandatário subscritor somente “todos os poderes forenses gerais, em direito permitidos”, não constando da mesma qualquer menção ao processado anterior praticado pelo mandatário; 7.ª Nem pela respetiva data – sem prejuízo de a data de emissão do documento ser, só por si, insuficiente para ratificar o processado – se poderia ter extraído outra conclusão, uma vez que a oposição ao pedido de despejo foi apresentada pelo mandatário da recorrida em 16.04.2024 e esta procuração foi emitida em 10.05.2024, data em que foi junta aos autos, ou seja, foi emitida quase um mês depois da data em que o ato processual, sem poderes de representação, foi praticado pelo mandatário que o subscreveu; 8.ª A procuração forense junta aos autos em 10.05.2024 pelo M. Ilustre mandatário da recorrida, uma vez que se limita a conceder ao mesmo “poderes forenses gerais”, não é apta a ratificar o processado; 9.ª Ainda que se entenda que a junção da procuração, com o requerimento de 10.05.2024, sana a falta do mandato, tal procuração, simples, por não conter poderes especiais para a respetiva ratificação, não valida o processado anteriormente desenvolvido, verificando-se pois que a recorrida não cumpriu o determinado no douto despacho de 08.05.2024 (Ref.ª 435323992), no prazo de 5 dias nele fixado, devendo ter sido logo aplicada a cominação prevista no Art.º 48.º, n.º 2, do C.P.C.; 10.ª Uma vez transitado em julgado o douto despacho vindo de referir, não podia a Mta. Juiz “a quo”, ter deixado de aplicar à recorrida a cominação nele fixada, proferindo posteriormente novo despacho concedendo à recorrida uma segunda oportunidade de validação do processado, num novo prazo, para o mesmo efeito e novamente sob a mesma cominação, por nesta altura já estar esgotado o poder jurisdicional do Tribunal; 11.ª Consequentemente, o douto despacho recorrido é nulo, por violação do disposto, conjugadamente, do disposto nos Artºs 613.º, n.º 1 e 615.º, n.º 1, al. e), do C.P.C., devendo ser revogado e substituído por douto acórdão que julgue sem efeito tudo quanto foi praticado pelo Ilustre mandatário da Requerida, in casu, a oposição ao requerimento de despejo apresentada em 16.04.2024, tal como cominado pelo art.º 48.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, com as legais consequências. 12.ª Disposições legais violadas: os citados Artºs 613.º, n.º 1 e 615.º, n.º 1, al. e), do C.P.C. * Os recursos foram admitidos como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. * Objecto e delimitação do recurso. São as seguintes as questões a resolver por este Tribunal: – Nulidade da sentença por falta de fundamentação; – Impugnação da matéria de facto dada como provada; – Da inconstitucionalidade da norma da alínea a) do n.º 5 do artigo 24.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho; – Da ilegalidade da analogia com o disposto no art.º 248º do CPC. - Do recurso subordinado: falta/insuficência do mandato Da eventual nulidade de sentença. Segundo a Recorrente, a sentença padece da nulidade prevista no art.º 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC, por falta de fundamentação, pois não há qualquer palavra explicativa na sentença proferida para se ter dado como provado o ponto 5 da matéria de facto provada, que é o facto fundamental para a decisão que acabou por ser tomada. De acordo com a citada alínea b) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justifiquem a decisão. A nulidade da sentença por falta de fundamentação (art.º 615.º, n.º 1, al. b) do CPC) pressupõe a absoluta ausência de fundamentação, não se bastando com uma fundamentação insuficiente ou desadequada (de referir que uma tal posição doutrinal constitui jurisprudência largamente acolhida pelos tribunais superiores, exemplificando-se tal constatação com os Acórdãos do STJ de 09-10-2019, proferido no processo 2123/17.8LRA.C1.S1; de 15-05-2019, proferido no processo n.º 835/15.0T8LRA.C3.S1; e de 02-06-2016, proferido no processo n.º 781/11.6TBMTJ.L1,S1; todos eles enunciados, por seu turno, no Acórdão do mais alto Tribunal de 03-03-2021, proferido no processo 3157/.8T8VFX.L1.S1 (Acórdão(s) disponível(eis) na internet, no sítio com o endereço www.dgsi.pt). Segundo a sentença recorrida e para fundamentar o facto 5 (dado como assente): A Ordem dos Advogados informou que notificou a requerida da nomeação do patrono em 18.03.2024, por via postal simples. Ainda que se entendesse que a fundamentação é escassa, tal não significa ausência de fundamentação, determinadora de nulidade para efeitos do disposto no art. (art.º 615.º, n.º 1, al. b) do CPC), pelo que se indefere a arguida nulidade da sentença. *** 2. Dos factos Receberam-se da 1ª instância os seguintes factos provados e não provados: Com interesse para apreciação da questão suscitada, consideraram-se assentes os seguintes factos: 1. A requerida foi citada através de carta depositada no receptáculo postal em 29.02.2024. 2. A requerida apresentou requerimento de protecção jurídica na modalidade de nomeação de patrono no dia 14.03.2024. 3. O pedido de apoio judiciário foi deferido em 18.03.2024, tendo sido nomeado patrono o Dr. FF. 4. A nomeação foi comunicada ao patrono nomeado em 18.03.2024. 5. A nomeação foi notificada à requerida por ofício da OA remetido em 18.03.2024, por via postal simples. 6. A requerida apresentou oposição no dia 16.04.2024. * Não se provou que: 1. A requerida apenas recebeu a notificação da OA 15 dias antes da data em que apresentou a oposição. Da impugnação da matéria de facto dada com provada Questiona a recorrente ter-se dado como assente: A nomeação foi notificada à requerida por ofício da OA remetido em 18.03.2024, por via postal simples (Ponto 5). Segundo a recorrente: o único elemento de prova a que o Tribunal «a quo» poderia ter lançado mão para ter dado tal facto como provado é a informação que a Ordem dos advogados fez juntar ao processo e que é :“A nomeação (…), foi comunicada por Ofício datado de 18.03.2024 remetido por via postal simples” – cfr. E-mail da Ordem dos Advogados, ref.ª 41694928, de 22.01.2025. Ora, como é meridianamente evidente, há um “mundo” de diferença entre dizer-se que o ofício foi remetido em 18.03.2024 – versão dos factos provados – e dizer-se que o ofício é datado de 18.03.2024. É ocioso afirmar-se que do facto de o ofício ter aposta uma determinada data não se extrai que tenha efetivamente sido remetido nessa data. Cumpre apreciar e decidir: Neste domínio, a posição da recorrente, merece provimento. Nestes casos, havendo que distinguir entre a data do ofício da AO e a data da sua expedição, a informação da Ordem dos Advogados foi no sentido de que o ofício data de 18.03.2024, mas é omissa quanto à data de expedição do mesmo por via postal simples, com o fito de notificar a requerida. Em face do exposto, e julgando procedente a impugnação da matéria de facto, altera-se a factualidade dada como assente no ponto 5, passando da mesma a constar: - A nomeação foi notificada à requerida por ofício da OA datado de 18.03.2024, remetido por via postal simples em data não apurada. 3. O DIREITO Sobre a intempestividade da oposição, discorreu a sentença recorrida nos seguintes termos: Nos termos do artigo 15º - F, n.º 1, do NRAU, o prazo para oposição é de 15 dias a contar da notificação do requerido, sendo que estado em causa um processo de natureza urgente tal prazo não se suspende durante as férias judicias (artigo 15.º - S, n.º 10, do NRAU). Nos termos do disposto no artigo 24.º, n.ºs 4 e 5, da Lei nº 34/2009, de 29 de julho: “4. Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo. 5. O prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se, conforme os casos: a) A partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação (…)”. Não obstante, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 515/2020, de 13.10.2020, declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma da alínea a) do n.º 5 do artigo 24.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com o sentido de que o prazo interrompido por aplicação do n.º 4 do mesmo artigo se inicia com a notificação ao patrono nomeado da sua designação, quando o requerente do apoio judiciário desconheça essa nomeação, por dela ainda não ter sido notificado.” Entende-se, assim, que deve ser dada oportunidade à requerida para demonstrar ter recebido a comunicação referente à nomeação do patrono em data posterior, contando-se dessa data o prazo para deduzir oposição. No caso, apenas ficou demonstrado que a OA notificou a requerente da nomeação do patrono em 18.03.2024, por via postal simples. Mas não ficou demonstrado que a requerente apenas tenha tido conhecimento dessa nomeação 15 dias antes da apresentação da oposição. Na ausência de qualquer norma quanto às notificações por via postal simples, considera-se ser de aplicar a presunção constante do artigo 248º do CPC, por analogia, considerando-se, assim, a requerida notificada no dia 21.03.2028, terminando o prazo para dedução de oposição no dia 05.04.2024, ou, no dia 10.04.2024, terceiro dia útil após o termo do prazo, por aplicação do artigo 139º do CPC. Assim sendo, considerando que a oposição da requerida foi apresentada a 16.04.2024, é forçoso concluir-se que a mesma foi apresentada fora do prazo legal. Segundo o recorrente: 6º. Violando a letra e o espírito de tal decisão do Tribunal Constitucional, na sentença profligada decide-se que a recorrente teria que provar a data em que recebeu uma carta que lhe foi enviada em correio simples, sendo que não fazendo tal prova ficam sem efeito os evidentes direitos que o Tribunal Constitucional já reconheceu; 7º. Tal prova é “diabólica”. É evidente que nenhum cidadão consegue provar o dia em que recebeu uma carta que lhe foi enviada em correio simples, pelo que se trata apenas e só de uma argumentação “viciada”, destinada a repristinar a validade de uma norma que já foi declarada inconstitucional. Apreciando. De acordo com o juízo de inconstitucionalidade da alínea a)do n.º 5 do artigo 24.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho decorrente do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 515/2020, de 13 de Outubro de 2020, quando interpretada no sentido de que o prazo interrompido por aplicação do n.º 4 do referido artigo se inicia com a notificação ao patrono nomeado da sua designação, quando o requerente do apoio judiciário desconheça essa nomeação, por dela ainda não ter sido notificado, há que entender que só com essa notificação (ou com a do patrono nomeado, conforme a última que ocorrer) é que se reinicia o prazo anteriormente interrompido (cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 02-05-2023, proferido no proc. 1590/20.7T8VFX-A.L1-7, versão integral em www.dgsi.pt). No caso em apreciação, provou-se que foi enviada notificação pela AO da nomeação de patrono, porém, na decorrência da alteração à matéria de facto assente operada nesta decisão, não ficou demonstrado quando tal aconteceu, dada a incerteza sobre a data em que a carta simples para o efeito foi remetida, não é aqui aplicável o racciocínio da sentença recorrida, segundo a qual na ausência de qualquer norma quanto às notificações por via postal simples, considera-se ser de aplicar a presunção constante do artigo 248º do CPC, por analogia, considerando-se a requerida notificada no dia 21.03.2024, terminando o prazo para dedução de oposição no dia 05.04.2024, ou, no dia 10.04.2024, terceiro dia útil após o termo do prazo, por aplicação do artigo 139º do CPC. Igualmente, não se demonstrou a data em que a requerente/recorrente foi notificada da nomeação de patrono, para efeito de reinício do prazo interrompido para dedução de oposição – pois, não se provou que: A requerida apenas recebeu a notificação da OA 15 dias antes da data em que apresentou a oposição. Subsiste um problema: deu-se como assente que a AO notificou a requerente/recorrente através de carta simples, sem que se saiba quando foi expedida tal carta. De todo o modo, tomando por bom que foi expedida e que não foi devolvida a carta, tal circunstância – a de uma carta enviada por correio simples para a morada de determinada pessoa não ser devolvida ao remetente - não prova que o destinatário a recebeu; apenas prova que não foi devolvida, podendo ter sido destruída, extraviada, entregue em morada distinta da do destinatário, entre outras possibilidades. Ora, o envio por correio simples, sem registo, não obedece à forma legalmente prescrita. Neste sentido, escreve-se no Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 02-05-2023, já supra citado: Na verdade, ainda que o RADT não preveja qualquer forma especial para a notificação, o respectivo art.º 37º estabelece como regime subsidiário as disposições do Código do Procedimento Administrativo em tudo o que não esteja especialmente regulado na referida lei. Assim, nos termos do art.º 112.º, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro, a notificação faz-se por carta registada enviada para o domicílio do notificando (ou por contacto pessoal com o notificando, por telefax, telefone, correio electrónico ou notificação electrónica, por edital ou anúncio, quando verificadas as situações descritas nas restantes alíneas do mencionado normativo legal). A ter sido cumprido o legalmente determinado, a consulta do registo permitiria determinar a data da notificação. Não o tendo sido, não é possível apurar a data em que o apelante foi notificado, que, sendo alheio ao incumprimento da lei por parte da entidade encarregada da notificação, não pode ser por tal prejudicado. Com efeito, a se mostrar comprovada nos autos a notificação, por carta registada, dirigida pela Ordem dos Advogados para o endereço do requerente do patrocínio judiciário indicado no requerimento inicial do procedimento administrativo, funcionaria a presunção a que se reporta o art.º 249.º, n.º 1 do CPC, que rege sobre as notificações às partes que não constituam mandatário, presumindo-se que a notificação foi feita no terceiro dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja. Dado que, neste caso, a notificação foi expedida por via postal simples, tal presunção (do art. 249º do CPC) não pode operar, por ter sido omitida a formalidade indicada no preceito acima indicado, logo não poderia a oposição apresentada ter sido considerada intempestiva. Impõe-se, pois, revogar a decisão recorrida, para que em sua substituição seja proferida outra que leve em conta as questões suscitadas pela recorrente na sua oposição. Do recurso subordinado interposto pelos recorridos. Segundo os recorridos: - Todavia, prevenindo o caso de procedência do recurso interposto pela recorrente Fortes & Barral, Lda., os recorridos não se conformam com o douto despacho proferido em 17.07.2024 (Ref.ª 437306370) pelo Tribunal de 1.ª Instância, quanto à parte em que, verificada a junção aos autos pelo M. Ilustre mandatário da recorrente de procuração sem ratificação do processado, na interpretação que fez da dita ocorrência processual, concedeu uma segunda oportunidade de validação do processado, ordenando a respetiva notificação para, em cinco dias, juntar aos autos procuração forense com ratificação de todo o processado, sob pena de, não o fazendo, ficar sem efeito tudo o que tiver sido praticado, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 48.º do Código do Processo Civil; 4.ª Em 08.05.2024, o Tribunal a quo proferiu despacho (Ref.ª 435323992) determinando o seguinte: “Do compulsar dos autos verifica-se que a procuração junta não foi subscrita pela Requerida, sociedade comercial. Assim, e antes de mais, ao abrigo do disposto no art.º 48.º n.º 1 do Código de Processo Civil, notifique a Requerida e o I. advogado para juntarem aos autos a procuração forense em falta e (eventualmente) providenciarem pela ratificação do processado (da responsabilidade daquela), sob cominação do disposto no art.º 48.º n.º 2 do Código de Processo Civil. Prazo: 5 dias”; 5.ª Este despacho, proferido em 08.05.2024, transitou em julgado em data anterior à data do douto despacho recorrido (17.07.2024), em concreto, transitou em julgado no dia 03.06.2024; 6.ª Na sequência do mesmo, veio, em 10.05.2024, o Ilustre mandatário da recorrida juntar aos autos procuração forense subscrita por EE, na qualidade de sócio gerente da Requerida, conferindo ao mandatário subscritor somente “todos os poderes forenses gerais, em direito permitidos”, não constando da mesma qualquer menção ao processado anterior praticado pelo mandatário; 7.ª Nem pela respetiva data – sem prejuízo de a data de emissão do documento ser, só por si, insuficiente para ratificar o processado – se poderia ter extraído outra conclusão, uma vez que a oposição ao pedido de despejo foi apresentada pelo mandatário da recorrida em 16.04.2024 e esta procuração foi emitida em 10.05.2024, data em que foi junta aos autos, ou seja, foi emitida quase um mês depois da data em que o ato processual, sem poderes de representação, foi praticado pelo mandatário que o subscreveu; 8.ª A procuração forense junta aos autos em 10.05.2024 pelo M. Ilustre mandatário da recorrida, uma vez que se limita a conceder ao mesmo “poderes forenses gerais”, não é apta a ratificar o processado; 9.ª Ainda que se entenda que a junção da procuração, com o requerimento de 10.05.2024, sana a falta do mandato, tal procuração, simples, por não conter poderes especiais para a respetiva ratificação, não valida o processado anteriormente desenvolvido, verificando-se pois que a recorrida não cumpriu o determinado no douto despacho de 08.05.2024 (Ref.ª 435323992), no prazo de 5 dias nele fixado, devendo ter sido logo aplicada a cominação prevista no Art.º 48.º, n.º 2, do C.P.C.; 10.ª Uma vez transitado em julgado o douto despacho vindo de referir, não podia a Mta. Juiz “a quo”, ter deixado de aplicar à recorrida a cominação nele fixada, proferindo posteriormente novo despacho concedendo à recorrida uma segunda oportunidade de validação do processado, num novo prazo, para o mesmo efeito e novamente sob a mesma cominação, por nesta altura já estar esgotado o poder jurisdicional do Tribunal; 11.ª Consequentemente, o douto despacho recorrido é nulo, por violação do disposto, conjugadamente, do disposto nos Artºs 613.º, n.º 1 e 615.º, n.º 1, al. e), do C.P.C., devendo ser revogado e substituído por douto acórdão que julgue sem efeito tudo quanto foi praticado pelo Ilustre mandatário da Requerida, in casu, a oposição ao requerimento de despejo apresentada em 16.04.2024, tal como cominado pelo art.º 48.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, com as legais consequências. A factualidade relevante para dirimir esta questão é que já consta das conclusões das contra alegações de recurso da recorrida. Contrariamente ao sustentado pelos recorridos, entendemos que não estava esgotado o poder jurisdicional da Mmª Juiz a quo para proferir o despacho posto em crise, nem que este viole o art. 615º nº 1 al. e) do CPC-segundo este artigo: é nulo o despacho quando o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido. É inquestionável que na sequência do despacho de 08/05/2024, pela ré foi junta uma procuração que se limitava a atribuir ao seu mandatário “poderes forenses gerais”, não sendo a mesma apta a ratificar o processado, desigadamente a oposição anteriormente apresentada, porém não podemos desligar a análise do problema do teor do requerimento que acompanhou a junção da procuração: onde consta «Fortes & Barral, Lda», Requerida nos autos supra identificados, vem juntar aos autos procuração forense, retificando todo o processado. (sublinhado nossso). Embora, imprecisamente expressa no requerimento, é notório que a parte, com a junção da procuração, pretendeu tabém ratificar o processado cumprindo o despacho de 08/05/2024, pelo que aceitamos a posição constante do despacho recorrido, segundo a qual a não incorporação de procuração com a formulação correcta visando a dita ratificação se deveu a um lapso material e, com vista à obtenção de processo equitativo, concedeu-se uma nova oportunidade à requerida para validação do processado. Mais, o despacho posto em crise está inteiramente em linha com o dever de gestão processual do juiz vertido no art. 6º nº 2 do CPC-O juiz providencia oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais suscetíveis de sanação, determinando a realização dos atos necessários à regularização da instância ou, quando a sanação dependa de ato que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a praticá-lo. Improcederá, assim, o recurso subordinando interposto pelos recorridos. * V. A decisão Pelo exposto, os Juízes da 6.ª Secção da Relação de Lisboa acordam: -em julgar procedente a impugnação da decisão sobre a matéria de facto deduzida pela apelante, nos termos supra determinados; -na procedência total da apelação e, consequentemente, decidem revogar a decisão recorrida, para que em sua substituição seja proferida outra que leve em conta as questões suscitadas pela recorrente na sua oposição; - na improcedência total do recurso subordinado. Custas pela recorrida. Registe e notifique. Lisboa, 11 de setembro de 2025 João Brasão Gabriela de Fátima Marques Cláudia Barata |