Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
8/23.8PEBRR.L1-5
Relator: ANA LÚCIA GORDINHO
Descritores: ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA
MEDIDA CONCRETA DA PENA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/07/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: Sumário:
I. Tendo o tribunal apreciado criticamente as provas e de acordo com as regras da experiência, não ocorre o vício previsto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo Penal - erro notório na apreciação da aprova.
II. Na determinação da medida da pena, só em caso de desproporcionalidade manifesta na sua fixação ou necessidade de correcção dos critérios de determinação da pena concreta estabelecidos na 1.º Instância, deverá intervir o Tribunal de recurso alterando a pena concreta fixada.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes da 5.º Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório
No processo comum coletivo n.º 8/23.8PEBRR, que corre termos no Juízo Central Criminal de Almada foi decidido, entre o demais:
i. Condenar o arguido AA pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, pp. pelo artigo 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, por referência às tabelas II-A (MDMA) e I-C (canábis) anexas ao mesmo diploma legal, na pena de 5 (cinco) e 6 (seis) meses de prisão;
ii. Condenar o arguido BB pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, pp. pelo artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, por referência à tabela I-C (canábis) anexa ao mesmo diploma legal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão, cuja execução se suspende pelo mesmo período e subordina a regime de prova nos moldes a definir pela DGRSP, bem como eventual tratamento à problemática de consumo de estupefacientes, caso em tal expressamente consinta.
**
Inconformado com esta decisão, veio o arguido AA interpor o presente recurso, apresentado motivações e concluindo do seguinte modo (transcrição):
“I. O Recorrente está condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigoº 21.º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, de 22/01, por referência às tabelas II-A (MDMA) e I-C (canábies) na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.
II. Os pontos 1 e 79 da matéria de facto provada, na perspectiva do recorrente, não correspondem à expressão de toda a prova produzida em audiência de discussão e julgamento, cotejada com a demais prova existente nos autos.
III. O Tribunal a quo alicerçou a motivação da matéria de facto, concretamente quanto aos pontos 1 e 79 da matéria de facto provada, num juízo conclusivo (fls. 30 da decisão): “Já no que respeita à venda de MDMA por AA (factos provados 1.º e 79.º), a sua prova extrai-se da circunstância de deterem tal substância nas quantidades em que a detinham (...) muito superior à necessária ao seu consumo individual.”
IV. Sem precisar as circunstâncias de tempo, modo e lugar (onde, quando, como, quantidades, preço), em que terão ocorrido os actos de venda.
V. A conclusão do Tribunal a quo referida na conclusão III. não se encontra suportada por mais nenhum elemento de prova.
VI. A prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, cotejada com demais elementos probatórios nos autos impôem, quanto aos factos 1.º e 79.º da matéria provada, decisão diferente da alcançada pelo Tribunal a quo.
VII. No relatório final de inquérito, a fls. 841 e segs., não é feita referência da apreensão de MDMA a consumidores que foram seguidos e interceptados após o contacto com os indivíduos que se encontravam junto ao ....
VIII. Todas as testemunhas do Ministério Público, consumidoras de estupefaciente, declararam serem consumidoras de “haxixe” e que foi essa a substância que adquiriram no local.
IX. No dia da detenção do Recorrente – ........2023, as substâncias apreendidas na sua posse e nas imediações do “...” era canábis – vd. pontos 68.º a 71.º dos factos provados, o que reforça a conclusão que, efectivamente, naquele local se vendia apenas canábis.
X. Nas declarações confessionais do Recorrente, atendidas e tidas por relevantes pelo tribunal recorrido, confessando, inclusive, factos para além da acusação, este declarou que que guardava para terceiro o MDMA e grande parte da canábis que lhe foi apreendida em casa, e em troca de tal favor, recebia uma placa de haxixe, que destinava ao seu consumo pessoal, e à venda.
XI. Por não resultar do acórdão recorrido, as concretas circunstâncias de tempo, lugar e modo em que o Recorrente praticou actos de venda de MDMA, cotejado com provas referidas nas conclusões VI a X impõe-se que os facto considerados provado sob os n.ºs 1.º e 79.º sejam considerados não provados.
XII. O tribunal “a quo” ao imputar ao arguido a prática de um crime de tráfico de estupefacientes p.p. pelo artigo 21.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, qualificou erradamente o comportamento delituoso do arguido.
XIII. Tal comportamento integra a previsão do artigo 25.º, corpo e alínea a) do referido diploma legal.
XIV. De facto, não pode constituir critério determinante da gravidade da ilicitude a quantidade e qualidade da substância detida, antes devem ser ponderadas todas as circunstâncias da acção, desde os meios usados à motivação, passando pelo destino do produto da eventual venda e ao comportamento do arguido.
XV. In casu, o Reorrente praticou os factos sem organização ou rede, assumindo os riscos, em local frequentado por consumidores, que declararam ser consumidores habituais há anos, sem indução de novos consumos, durante um período de tempo restricto (duas vendas entre as quintas feiras e o sábado, nos meses de ... e ... de 2023), destinava o produto da venda à sua estrita sobrevivência em face da situação económica precária em que se encontrava, não visando lucro para despesas supérfluas ou sumptuárias, sendo diminuto o lucro.
XVI. A ilicitude mediana/diminuída dos factos apurados situa-se na fronteira entre o tipo incriminador padrão do artigo 21.º e o tipo privilegiado de tráfico de menor gravidade do artigo 25.º, ambos do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, e ainda no limite aceitável de enquadramento no tipo legal previsto artigoº 25.º.
XVII. Ainda que se entenda estar perante um crime de tráfico de estupefacientes p.p. pelo artigo 21.º do Dec. Lei n.º 15/93, a pena concreta deve ser fixada em medida inferior a cinco anos de prisão.
XVIII. Tal pena deve ser suspensa na sua execução, nos termos do artigo 50.º do código penal, face à primaridade do arguido, à confissão relevante, ao arrependimento autêntico e credível.
IX. A suspensão poderá ser condicionada a um regime de prova, nos termos dos artigos 53.º e 54.º do código penal.
Termos em que se requer a vossas excelências que o presente recurso mereça provimento alterando-se, em consequência, a douta decisão recorrida, condenando-se o Recorrente em pena de prisão inferior a cinco anos, com a respectiva execução suspensa, mesmo que sujeito a regime de prova, por ainda assegurar as necessidades de prevenção que estão na base da punição.
Assim se fazendo a costumada Justiça!”.
*
Também recorreu BB, apresentado motivações e concluindo do seguinte modo (transcrição):
“1. Salvo o devido respeito, que é muito, o Tribunal a quo violou o princípio da proporcionalidade, pois aplicou ao arguido, ora recorrente, uma pena de prisão, apesar de se encontrar suspensa sob condição, quando deveria ter optado por uma pena não privativa da liberdade.
2. O Tribunal a quo deveria ter considerado, atento o disposto no art.o 40o do Código Penal, as circunstâncias favoráveis ao arguido, as quais decorrem da análise da douta sentença recorrida e que reduzem significativamente o grau de culpabilidade daquele.
3. Na determinação da medida da pena, deveria o Tribunal a quo ter atendido não só à culpa do agente, minimizada pelos factores acima descritos, como também ao facto de o legislador manifestar clara preferência pelas reacções criminais não detentivas.
4. No caso presente, será suficiente a opção pela pena não privativa da liberdade para a realização adequada da finalidade da punição.
5. O arguido não tem antecedentes criminais.
6. Não podendo, por isso, ser-lhe imputada uma mentalidade criminosa por natureza.
O Tribunal a quo, ao condenar o recorrente na referida de prisão, mesmo suspendendo a execução da mesma fez uma errada aplicação do art.o 71o do Código Penal,
7. Isto porque não graduou correctamente o grau de culpabilidade do recorrente e naõ atendeu que o mesmo é consumidor.
8. No que concerne às exigências de prevenção e reprovação, atendidas no douto acórdão recorrido, estas
9. ultrapassam a medida da culpa do recorrente, a qual deve constituir o limite último na determinação da pena a aplicar em concreto.
10. A douta sentença a quo, deveria ter atendido ao fim preventivo das penas, traduzindo-se na necessidade de reintegração social do recorrente, o qual, apenas cometeu um ilícito penal de menor gravidade, por se encontrar manifestamente impossibilitado, em termos económicos, para cumprir com a prestação de alimentos a que estava obrigado, e olhado ao facto deste ter sido julgado pela primeira vez pela prática de um crime.
11. Julgamos adequada a aplicação ao recorrente de uma pena de multa, pois a simples censura do facto realizará de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
12. Refira-se que o disposto no artigo 40.2 do DL 15/93 terá sempre a sua aplicação desde que o estupefaciente destinado ao consumo seja de quantidade superior à prevista no artigo 2.2 da Lei 30/2000.
Termos em que, deverá o presente recurso obter provimento e ser aplicada ao recorrente uma pena uma pena de multa, pois a simples censura do facto realizará de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
V.aS EXAS. FARÃO ASSIM JUSTIÇA”!
*
Os recursos foram admitidos, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
**
O Ministério Publico respondeu aos recursos, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
**
A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta junto deste tribunal emitiu parecer, nos seguintes termos (transcrição parcial):
“2. 1. Recurso do arguido AA.
Vistas as conclusões do recurso interposto pelo recorrente, este sustenta, em síntese, que: não foi produzida prova dos factos dados como provados em 1 e 79 do acórdão recorrido, os quais impunha expressamente nos termos do art.º412,º n.º 3 e 4, do CPP (pelo que deverão ser dados como não provados); o arguido deveria ter sido condenado pela prática de um crime de tráfico do art.º25.º e ser condenado em pena inferior a 5 anos, e suspensa na execução.
O objeto deste recurso mostra-se assim circunscrito às seguintes questões:
1ª Impugnação sobre a matéria de facto, nos termos do art.º412.º, n.º3 e n.º4 do CPP – Factos Provados 1 e 79 do acórdão recorrido, que deveriam ter sido dados como não provados;
2.ª Qualificação jurídica dos factos;
2ª Medida e modo de execução da pena.
2.2. Recurso do arguido BB.
Este arguido, vistas as conclusões do ser recurso, vem sustentar que deveria ter sido condenado apenas numa pena de multa.
Questão suscitada: Natureza e medida da pena.
3. Posição do Ministério Público.
3.1. Posição do Ministério Público na 1.ª Instância.
A Digna Magistrada do Ministério Público junto da 1.ª Instância respondeu aos recursos apresentados pelos arguidos/recorrentes sustentando a total improcedência dos mesmos.
3.2. Posição do Ministério Público no TRL.
3.2.1.Da impugnação da matéria de facto nos termos do art.º412.º, n.ºs 3 e 4 do CPP – Questão prévia.
O arguido AA impugna expressamente os factos dados como provados 1 e 79 do acórdão recorrido, os quais considera incorretamente julgados, com base na sua versão dos factos e declarações por si prestadas em julgamento, sem atender ao conjunto da prova e, designadamente, ao facto de lhe terem sido apreendidas elevadas quantidades, quer de cannabis, quer de MDA, que dariam para dezenas de milhares de doses de venda ao consumidor (vejam-se os factos provados 70 e 73), limitando-se a alegações genéricas e subjetivas acerca da sua versão da prova, pelo que não cumpre o requisito de indicação de concretas provas que imponham decisão diversa da recorrida (art.º412.º, n.º3, alínea b), do CPP).
Há que referir que, e como bem se fundamenta no acórdão recorrido, que o tribunal a quo formou a sua convicção na concatenação crítica do conjunto da prova produzida, designadamente a documental, e testemunhal, apreciada de acordo com o seu valor probatório e as regras da experiência, segundo dita o princípio da livre apreciação da prova consagrado no art.º127.º do Código de Processo Penal.
Na verdade, o tribunal a quo esclarece e fundamenta devidamente porque motivo não considerou credíveis as declarações prestadas pelo arguido nas quais o recorrente sustenta o seu recurso, em sentido diametralmente oposto ao da prova produzida, tudo conjugado com as regras da lógica e da experiência comum, assim formando a sua convicção.
A decisão recorrida se encontra devidamente fundamentada, não merecendo censura.
Pelo que o recurso na vertente da impugnação da matéria de facto deverá ser improcedente.
Quanto à qualificação jurídica do crime, entendemos que o recorrente também não tem razão, tendo em conta que a já mencionada elevada quantidade de produtos estupefacientes apreendido obstam a que se possa enquadrar a conduta delituosa no crime do art.º25.º
E, quanto à pena aplicada, este recurso deverá igualmente improceder, uma vez que a pena aplicada se mostra adequada aos factos e à culpa do arguido, até porque se situa pouco acima do mínimo da moldura penal abstratamente aplicável (4 a 12 anos de prisão).
3.2.2. Quanto ao recurso do recorrente BB, não poderá ser atendido, por inadmissibilidade legal, uma vez que o crime pelo qual foi condenado nem sequer admite a aplicação de pena de multa.
*
Pelo exposto, e salvo o devido respeito por diferente opinião, somos do parecer que os recursos interpostos pelos arguidos devem ser ambos julgados totalmente improcedentes, mantendo-se na íntegra o acórdão recorrido.”
**
Notificados do parecer do Ministério Público junto deste Tribunal, os arguidos nada vieram dizer.
**
Colhidos os vistos, o processo foi presente a conferência, por o recurso dever ser aí decidido, de harmonia com o disposto no artigo 419.º, n.º 3, alínea c) do Código de Processo Penal.
**
II. Questões a decidir:
Como é pacificamente entendido tanto na doutrina como na jusrisprudência, o âmbito dos recursos é definido pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, que delimitam as questões que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das que forem de conhecimento oficioso1.
Atentas as conclusões apresentadas, no caso em análise são as seguintes as questões a decidir por ordem de procedência lógica:
Recurso do arguido AA:
• Apreciação da impugnação da matéria de facto;
• Qualificação jurídica dos factos;
• Da pena a aplicar.
Recurso do arguido BB:
• Da pena a aplicar.
**
III. Com vista à apreciação das questões suscitadas, importa ter presente o seguinte teor da sentença proferida:
“II. Fundamentação fáctica
a) Factos provados
Com relevância para a decisão da causa provou-se que:
Da acusação:
1.º BB, CC, e outros, dedicaram-se à venda de canábis, AA, à venda do mesmo estupefaciente e de MDMA, e DD à venda de todos os referidos produtos e de Cocaína, através do contacto directo com os consumidores, nos períodos e termos que seguidamente se descrevem, fazendo deste o seu modo de vida (1.º e 2.º da acusação).
2.º Tais vendas ocorriam no estabelecimento comercial ...”, sito na ... e, nas suas imediações, onde os arguidos passam longos períodos e, são normalmente abordados por consumidores que os procuram para o efeito (3.º da acusação).
3.º No dia ...-...-2023, pelas 15h32, junto ao café ...”, o arguido CC recebeu de um indivíduo que também desenvolvia tal actividade, conhecido como EE, produto estupefaciente que se encontrava escondido nos arbustos (5.º da acusação).
4.º No mesmo dia, pelas 16h34, o arguido DD vendeu uma saqueta de estupefaciente a um indivíduo não identificado (6.º da acusação).
5.º Mais tarde, pelas 17h24, o arguido DD entregou um saco, com várias saquetas com produto estupefaciente ao referido indivíduo conhecido como EE que o escondeu nos arbustos (7.º da acusação).
6.º Nesse mesmo dia, pelas 17h29, o arguido BB, no mesmo local, vendeu um pedaço de canábis, a um individuo desconhecido pela quantia de € 10 (8.º da acusação).
7.º No dia ...-...-2023, pelas 14h44, junto das árvores que ficam em frente ao café ...”, o arguido BB vendeu um pedaço de canábis, a um indivíduo não identificado (9.º da acusação).
8.º Pelas 18h11 desse mesmo dia, no mesmo local, o referido indivíduo conhecido como EE, entregou um pedaço de canábis ao arguido DD, que se encontrava no café ...” (10.º da acusação).
9.º No dia ...-...-2023, pelas 18h20, junto ao café ...”, o arguido BB vendeu um pedaço de canábis, a um indivíduo desconhecido, estupefaciente este que estava escondido na papeleira junto do café ...” (11.º da acusação).
10.º No mesmo dia, pelas 18h29, o arguido BB vendeu a ... um pedaço de canábis, estupefaciente este que estava escondido na papeleira junto do café ...” (12.º da acusação).
11.º Pelas 18h49, no mesmo local, o arguido BB, vendeu um pedaço de canábis a um indivíduo do sexo feminino não identificado, estupefaciente este que estava escondido na papeleira junto do café ...” (13.º da acusação).
12.º Ainda nesse dia, pelas 18h49, na ..., o arguido DD trazia consigo 1,459 gramas de MDMA, com 70.9% de pureza, suficiente para 10 doses, 0,987 gramas de cocaína, com 79,7% de pureza, suficiente para três doses, 3,775 gramas de canábis (resina), com 19% de pureza suficiente para 14 doses, 0,505 gramas de canábis (folhas/sumidades) com 9,7 % de pureza, inferior a 1 dose (14.º da acusação).
13.º No dia ...-...-2023, pelas 17h26, o arguido BB e um suspeito cuja identidade completa não se logrou apurar, encontravam-se junto ao café ...”, com outros indivíduos, tendo a determinada altura chegado um individuo de identidade não concretamente apurada, que entregou uma nota de € 20 ao arguido BB, recebendo em troca uma nota de € 10 e, uma embalagem com produto estupefaciente canábis (18.º da acusação).
14.º Pelas 18h01, desse mesmo dia, o arguido BB vendeu um pedaço de canábis a um indivíduo não identificado, que lhe pagou o estupefaciente com uma nota (19.º da acusação).
15.º No dia ...-...-2023, por volta das 12h30, junto ao café ...”, o arguido DD, foi abordado por um individuo, entrou numa viatura e deslocou-se a outro local, após o que regressou e entregou a um individuo não identificado um saco (20.º da acusação).
16.º Por volta das 14h05, desse dia o arguido BB, escondeu um saco de plástico com produto estupefaciente debaixo de uma pedra no passeio junto ao “...” (21.º da acusação).
17.º Ainda nesse dia, o arguido CC, foi abordado por um individuo não identificado, entrou dentro da viatura onde o mesmo se fazia transportar e entregou-lhe uma embalagem com produto estupefaciente, recebendo em troca uma quantia monetária (22.º da acusação).
18.º No dia ...-...-2023, pelas 19h45, o arguido BB e um suspeito cuja identidade completa não se logrou apurar, encontravam-se junto ao café ...”, conjuntamente com outros indivíduos, quando a determinada altura são abordados por um individuo de identidade não concretamente apurada, que entrega uma nota ao desconhecido e recebe dele uma embalagem de produto estupefaciente canábis” (23.º da acusação).
19.º Por volta das 21h32, chega ao local um casal que faz sinal a um dos indivíduos do grupo cuja identidade não se logrou apurar, que se aproxima, entrega-lhes uma saqueta plástica com produto estupefaciente, recebendo em troca uma quantia monetária (24.º da acusação).
20.º No dia ...-...-2023, pelas 21h33, junto ao café ...”, um suspeito cuja identidade completa não se logrou apurar foi abordado por um individuo de identidade não apurada, remexe numa pedra que se encontra junto a uma arvore, entregou-lhe produto estupefaciente e recebe dinheiro em troca (25.º da acusação).
21.º Por volta das 23h41, desse dia, na esplanada do café ...”, o referido indivíduo conhecido como EE e outro cuja identidade não se logrou apurar, dirigem-se ao arguido DD e, entregam-lhe ambos um maço de notas. O arguido contou o dinheiro, entrega algumas notas aos suspeitos, guardando o restante no interior da bolsa que trás a tiracolo (26.º da acusação).
22.º No dia ...-...-2023, pelas 21h06, junto do café ...”, o arguido BB, apanhou um saco plástico com estupefaciente que se encontrava escondido, por debaixo de uma pedra, retirou uma parte desse estupefaciente e guardou o restante no mesmo local, de seguida deslocou-se para a porta do café ...” (27.º da acusação).
23.º Pelas 23h17, o arguido BB, dirige-se a uma árvore ali existente de onde retirou um saco que estava escondido debaixo de uma pedra no passeio. De seguida dirigiu- se para o interior do café (28.º da acusação).
24.º No dia ...-...-2023 pelas 11h40, junto ao café ...”, o arguido CC vendeu produto estupefaciente a troco de dinheiro a um indivíduo não identificado (29.º da acusação).
25.º No dia ...-...-2023, pelas 21h52, junto ao café ...”, o arguido BB vendeu produto estupefaciente canábis a dois indivíduos (30.º da acusação).
26.º E, pelas 23h02, desse mesmo dia vendeu a outro indivíduo (31.º da acusação).
27.º No dia ...-...-2023, pelas 14h48, junto do café ...”, o arguido BB, vendeu uma embalagem de produto estupefaciente a um indivíduo não identificado (32.º da acusação).
28.º No mesmo dia e local, pelas 14h54, o arguido BB, vendeu produto estupefaciente que foi buscar junto de um dos pilares do viaduto, a um casal de indivíduos não identificados (33.º da acusação).
29.º Pelas 15h08, junto às árvores que ficam em frente ao café ...”, o arguido BB vendeu produto estupefaciente a FF (34.º da acusação).
30.º No mesmo dia e local, pelas 15h18, o arguido BB vendeu uma embalagem de canábis a um indivíduo não identificado (35.º da acusação).
31.º Pelas 15h25, junto das árvores, o arguido BB vendeu canábis a um indivíduo não identificado, estupefaciente esse que se encontrava escondido junto do pilar do viaduto (36.º da acusação).
32.º Pelas 15h31, desse mesmo dia, junto das árvores, o arguido CC, vendeu produto estupefaciente a um indivíduo não identificado (37.º da acusação).
33.º No mesmo dia, pelas 15h52, junto das árvores, o arguido BB vendeu produto estupefaciente a um indivíduo não identificado (38.º da acusação).
34.º Pelas 16h25, o BB foi recolher o estupefaciente que tinha escondido no chão junto da árvore e no pilar do viaduto e, entrega-o a um indivíduo não identificado que se encontrava integrado no seu grupo, que por sua vez esconde o estupefaciente junto do tronco da árvore (39.º da acusação).
35.º Pelas 16h30, o BB entregou canábis a GG, recebendo em contrapartida pelo menos a quantia de € 5 (aditamento).
36.º No dia ...-...-2023, pelas 11h32, junto ao café ...”, o arguido BB foi abordado por um individuo cuja identidade não se logrou apurar, que lhe entregou algo, recebendo em troca embalagens de produto estupefaciente canábis (40.º da acusação).
37.º Pouco tempo depois, o arguido BB foi abordado pelo condutor do veículo de matrícula ..-..-RH, a quem entregou algumas embalagens plásticas com produto estupefaciente canábis, recebendo dinheiro em troca (41.º da acusação).
38.º Pelas 13.30 horas, BB entregou a HH haxixe, recebendo deste a quantia de € 10,00 (aditamento).
39.º Por volta das 14h23, apareceu o arguido DD com um saco que entregou ao arguido CC. Ato continuo aquele abriu o saco e, retirou algumas saquetas plásticas de produto estupefaciente que entregou a um individuo que ali se encontrava à espera, recebendo dinheiro em troca (42.º da acusação).
40.º No mesmo dia e local, pelas 14h48, o arguido CC vendeu produto estupefaciente a um indivíduo não identificado (43.º da acusação).
41.º No mesmo dia e local, o arguido BB, vendeu produto estupefaciente que tinha escondido junto do pilar do viaduto, a II (44.º da acusação).
42.º No dia ...-...-2023, pelas 11h28, na zona do parque de estacionamento em frente ao café, o arguido AA vendeu dois pedaços de canábis a JJ (45.º da acusação).
43.º Pelas 14h10, no mesmo local, o arguido BB vendeu um pedaço de canábis a FF (46.º da acusação).
44.º No dia ...-...-2023, pelas 13h53, junto ao café ...”, o arguido AA vendeu produto estupefaciente canábis a um indivíduo não identificado (47.º da acusação).
45.º No dia ...-...-2023, pelas 14h56, junto ao café PRISMA, o arguido CC vendeu produto estupefaciente a um indivíduo não identificado que chegou ao local na viatura ..-..-GZ (48.º da acusação).
46.º Pelas 15h40, o arguido CC entregou produto estupefaciente canábis a um indivíduo não identificado que se encontrava junto a este na esplanada do café (49.º da acusação).
47.º No mesmo dia, pelas 16h02, o arguido CC vendeu produto estupefaciente a um indivíduo não identificado na esplanada do café (50.º da acusação).
48.º No dia ...-...-2023, pelas 16h01, junto do café ...”, os arguidos AA e BB, cortaram um pedaço de estupefaciente, “canábis”, e entregaram-no a FF (51.º da acusação).
49.º No dia ...-...-2023, pelas 15h16, AA vendeu produto estupefaciente canábis a um indivíduo não identificado (52.º da acusação).
50.º Pelas 16h28, o arguido BB vendeu um pedaço de canábis a um indivíduo não identificado, em troca de uma nota de valor que não foi possível apurar (53.º da acusação).
51.º Pelas 16h55, o arguido BB vendeu um pedaço de “canábis” a dois indivíduos que se faziam transportar numa viatura de marca ..., ... 308 de cor preta com a matricula AT-..-BN (54.º da acusação).
52.º Pelas 17h05, o arguido BB vendeu um pedaço de “canábis” a um casal (55.º da acusação).
53.º No dia ...-...-2023, pelas 14h17, o arguido BB vendeu canábis a um indivíduo não identificado, pela quantia de € 5 em moedas (56.º da acusação).
54.º Pelas 14h40, o arguido AA vendeu produto estupefaciente canábis a um indivíduo não identificado (57.º da acusação).
55.º Pelas 15h32, o arguido CC entregou um pedaço de canábis ao arguido AA, tendo este último cheirado o produto e entregue novamente a CC (58.º da acusação).
56.º Pelas 15h57, o arguido BB vendeu canábis a um indivíduo não identificado (59.º da acusação).
57.º Pelas 16h03, o arguido CC vendeu canábis a um indivíduo não identificado (60.º da acusação).
58.º Pelas 16h33, o arguido BB vendeu canábis a um indivíduo não identificado (61.º da acusação).
59.º Pelas 17h11 o arguido BB escondeu um saco com estupefaciente atrás de um tubo de escoamento de aguas, junto ao n.º 9 da ..., contiguo ao café ...” (62.º da acusação).
60.º No dia ...-...-2023, pelas 17h52, o arguido BB aproximou-se do n.º 2 C da ..., apanhou um maço de notas do chão e contou o dinheiro (63.º da acusação).
61.º No dia ...-...-2023, pelas 12h07, o arguido AA encontrava-se conjuntamente com outros indivíduos, junto ao café ...”, tendo recebido, por intermédio de um deles, uma nota de € 10 e entregue, pela mesma via, uma saqueta de produto estupefaciente a um comprador (64.º da acusação).
62.º Pouco tempo depois, surge outra pessoa do sexo feminino de quem AA recebeu, também por intermédio de um individuo do grupo, uma nota e a quem entregou-lhe, pela mesma via, produto estupefaciente (65.º da acusação).
63.º Pelas 12h09 desse mesmo dia, surge outro individuo que se dirige ao arguido CC, entregando-lhe uma nota e recebendo em troca uma saqueta plástica com produto estupefaciente (66.º da acusação).
64.º No dia ...-...-2023, pelas 12h05 na esplanada do café ...”, os arguidos CC e AA cederam a KK canábis recebendo desta quantia de € 10 (aditamento).
65.º No mesmo dia, pelas 12h13, junto ao café, o arguido AA vendeu um pedaço de estupefaciente canábis, com o peso de 2,235 gramas, 21.8% de grau de pureza, suficiente para 9 doses, a LL, pelo valor de € 10 (67.º da acusação).
66.º Nesse mesmo dia e local, por volta das 13h47, o arguido CC, vendeu um pedaço de estupefaciente “canábis”, com peso de 2,351 gramas, 27.9% de grau de pureza, suficiente para 13 doses, a MM, pelo valor de € 10 (68.º da acusação).
67.º Pelas 14h37, o arguido BB, vendeu um pedaço de estupefaciente canábis, a NN pelo valor de € 10 (69.º da acusação).
68.º Nesse dia, pelas 16h, o arguido BB trazia consigo (70.º da acusação):
- 1 (uma) bolsa de tiracolo;
- € 135 (cento e trinta e cinco euros) em notas;
- € 5 (cinco euros) em moedas;
- 1,474 gramas de canábis (resina), com 33,0% de pureza, suficiente para 9 doses,
acondicionado no interior da sua bolsa;
- 18,297 gramas, de canábis (resina), com 33,7% de pureza, suficiente para 123
doses, escondidos na papeleira, junto ao café ...”.
69.º Nas mesmas circunstâncias de tempo e de lugar, o arguido CC trazia consigo (71.º da acusação):
- 8,560 gramas de canábis (resina), com 28.1% de pureza, suficiente para 48 doses, no interior de uma bolsa cor-de-rosa, que atirou para o chão;
- 1,056 gramas de canábis (resina), com 19.8% de pureza, suficiente para 4 doses, no interior do bolso das calças;
- 6,509 gramas de canábis (resina), com 26.2% de pureza, suficiente para 34 doses, no interior de um maço de tabaco, que atirou para o chão no momento da abordagem;
- 14,385 gramas de canábis (resina), com 26.3% de pureza, suficiente para 75 doses, que escondeu junto das árvores, em frente ao café ...”;
- 1 (uma) nota de 10 Euros no bolso das calças;
- 1 (um) ... ... 6025D_EEA.
70.º Por sua vez, o arguido AA tinha consigo (72.º da acusação):
- 1 (um) Telemóvel de marca ... ... 11;
- 31,20 (trinta e um euros e vinte cêntimos) em numerário;
- 1 (um)cartão de débito com o n.º ...; honraste
- 4,696 gramas de canábis (resina), com 33,4% de pureza, suficiente para 31 doses.
- 3,536 gramas de canábis (resina), com 19,8 de pureza, suficiente para 14 doses, escondidos num vaso de flores junto do café ...”.
71.º Mais foi encontrado junto aos arguidos, um maço de tabaco de marca ... contendo no seu interior 16.262 gramas de canábis (resina), com 26,3% de pureza, suficiente para 85 doses (73.º da acusação).
72.º No mesmo dia, pelas 16h10, o arguido DD, guardava na sua residência sita na ..., o seguinte (74.º da acusação):
- três sacos de plástico com fecho, contendo no seu interior 2.982 gramas de cocaína (cloridrato), com 37% de pureza, suficiente para 5 doses.
- um saco de plástico com fecho, contendo 0,154 gramas de cocaína (cloridrato), com 57,2 % de pureza, inferior a 1 dose.
- uma cigarreira;
- € 30 em dinheiro;
- um pedaço, com o peso de 2,063 gramas de canábis (resina), com 40,8 de pureza, suficiente para 16 doses,
- uma balança de cozinha;
- quatro sacos de plástico com fecho, contendo 6,313 gramas canábis (folhas/sumidades), com 11.1% de pureza, suficiente para 14 doses;
- uma faca de cozinha;
- um telemóvel de marca ..., com o IMEI ....
73.º No dia ...-...-2023, pelas 16h, o arguido AA, guardava na sua residência, sita na ..., o seguinte (75.º da acusação):
- uma bolsa de marca “...” que continha estupefaciente, balança e canivetes seguidamente descritos.
- 249,012 e 77,899 gramas de canábis (resina), com, respectivamente, 32,9% e 33,6% de pureza, suficiente para 1638 e 523 doses,
- duas embalagens com 14,359 gramas de MDMA, com 60,7% de pureza, suficientes para 87 doses;
- uma balança digital;
- dois canivetes;
- vários pedaços de canábis (resina), com o peso total de 989,000 gramas com 33,8% de pureza, suficientes para 6685 doses.
- € 800,00 em dinheiro;
- uma máquina embalar a vácuo;
- um rolo película aderente;
- um frasco de plástico com 10,034 gramas de MDMA, com 61.1% de pureza, suficiente para 61 doses;
- vários pedaços de canábis (resina), com o peso de 34,704 e 16,405 gramas com, respectivamente, 20,5 % e 27,9 % de pureza, suficientes para 142 e 91 doses.
- um pedaço de canábis (resina) com 15,945 gramas, 20,6% de pureza, suficiente para 65 doses,
- € 60 em dinheiro;
- um rolo de plástico próprio para embalar em máquina de vácuo;
- uma mala de viagem que se encontrava debaixo da cama, que acondicionava
produto estupefaciente seguidamente descrito;
- uma mochila que se encontrava no interior da mala de viagem de baixo da cama,
onde se encontrava acondicionado estupefaciente;
- uma embalagem plástica com resíduos de produto estupefaciente;
- um frasco plástico de vitaminas utilizado para acondicionar estupefaciente;
- vários pedaços canábis (resina) com 880,000 e 496,000 gramas, com, respectivamente, 20.1% e 33,5 % de pureza, suficiente para 3537 e 3323 doses,
- vários pedaços de canábis (resina) com 1.957,900 gramas, 34,2% de pureza, suficiente para 13.392 doses.
- várias embalagens de MDMA, com o peso de 843,000 gramas, 61.1 % de pureza, suficiente para 5150 doses;
- várias embalagens de MDMA, com o peso de 449,000 e 89,930 gramas, com, respectivamente, 61.1 % e 61.6 % de pureza, suficiente para 2765 e 549 doses;
- uma embalagem de MDMA, com o peso de 2,346 gramas, 22,7% de pureza suficiente para 5 doses;
- um pedaço de canábis (resina), com o peso de 0,708 gramas, 34,0% de pureza, suficiente para 4 doses;
- seis cartões de débito pré-pagos de várias entidades bancárias.
74.º Por sua vez, por volta das 16h30, o arguido BB, guardava no interior da sua residência, sita na ... o seguinte (76.º da acusação):
- uma bolsa azul de pequenas dimensões, com uma embalagem de MDMA, com o peso de 0,687 gramas, 59,6 % de pureza, suficiente para 4 doses;
- duas placas de canábis (resina), com o peso de 197,919 gramas, 33.1 % de pureza, suficiente para 1310 doses;
- um pedaço de canábis (resina), com o peso de 30,709 gramas, 33.9 % de pureza, suficiente para 208 doses;
- uma caixa de óculos com € 700 em dinheiro;
- três facas de cozinha com vestígios de produto estupefaciente;
- um rolo de película aderente;
- um bastão de basebol;
- dois tabuleiros em INOX, com vestígios de produto estupefaciente.
75.º No mesmo dia, cerca das 16h20, o arguido CC, guardava na sua residência, sita na ..., o seguinte (77.º da acusação):
- uma faca de cozinha, com resíduos de estupefaciente;
- € 40 em dinheiro;
- dois sacos de plástico com fecho;
- uma mala.
76.º Entre ... e ... de 2023, entre as quintas-feiras e sábados, AA realizava pelo menos duas vendas de canábis (resina) diárias, recebendo por cada uma a quantia de € 10,00 (aditamento).
77.º Entre ... e ... de 2023, DD vendia 5 gramas de cocaína, cerca de duas vezes por mês, pela quantia de € 60,00/grama (aditamento).
78.º O produto estupefaciente encontrado na posse dos arguidos destinava-se a ser vendido a terceiros, sendo que, os demais produtos e objectos encontrados serviam para pesar, manusear e, acondicionar (78.º da acusação).
79.º Todos os arguidos agiram sempre de forma concertada, em colaboração mútua com vista à venda de canábis a terceiros, cientes na natureza do produto que detinham e que vendiam, tendo AA e DD transaccionado igualmente MDMA e cocaína, cientes da sua natureza (79.º da acusação).
80.º Os arguidos sabiam conheciam as características estupefacientes dos produtos que detinham e as quantidades que possuíam, bem sabendo que, a respectiva detenção, cedência e venda os fazia incorrer na prática de crime (80.º da acusação).
81.º Os arguidos agiram sempre de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei e, ainda assim, prosseguiram os seus intentos, actuando pela forma supra descrita (81.º da acusação).
Das condições pessoais e socioeconómicas do arguido e antecedentes criminais:
Do arguido AA
82.º À data dos factos, o arguido integrava um agregado familiar composto pela mãe, um irmão de 37 anos de idade e duas irmãs de 33 e 31 anos de idade, cuja dinâmica familiar era funcional embora o arguido não partilhasse com os mesmos as refeições ou projectos pessoais.
83.º No Estabelecimento Prisional, o arguido tem visitas da mãe e das irmãs que mantêm disponibilidade para o apoiar independentemente do desfecho do presente processo judicial.
84.º A família é originária da .... O primeiro elemento a imigrar para Portugal foi o irmão mais velho do arguido. A mãe veio posteriormente para o apoiar, quando o mesmo estava com problemas de saúde. O arguido imigrou para Portugal mais tarde, quando tinha 17 anos de idade.
85.º O agregado familiar reside em casa adquirida pelo irmão do arguido, com recurso a um empréstimo bancário. É este irmão que paga a amortização do empréstimo ao banco. A mãe paga as despesas relativas à alimentação, fornecimento de água, electricidade e gás.
86.º A habitação é um apartamento de tipologia T3, onde o arguido tem um quarto exclusivamente para si, pelo qual era responsável por arrumar e limpar, pelo que os restantes membros do agregado familiar não o frequentavam.
87.º O arguido fez a maior parte dos seus estudos na ..., mas, já em Portugal, completou o 12.º ano de escolaridade, aos 19 anos de idade.
88.º Quando foi detido, AA estava inactivo profissionalmente há cerca de quatro meses, tendo regressado de ... com o objectivo de tirar a carta de condução e de tirar um curso de “...”.
89.º Começou a trabalhar aos 19 anos de idade, numa das empresas do ..., mas como não lhe foi renovado o contrato de trabalho, emigrou para ... e para o ..., onde veio a realizar trabalhos temporários de ….
90.º Quando se encontrava a trabalhar em ... auferia cerca de € 2.000,00 pelo que, quando regressou ficou a viver das poupanças, que também serviram para pagar a carta de condução. Com o decorrer do tempo, ficou sem dinheiro e numa situação financeira precária.
91.º O arguido centrava as suas rotinas diárias em torno de actividades para tirar a carta de condução, frequência de aulas e estudo do código, convívio com amigos nas proximidades do café ...”, e prática de ….
92.º O arguido conhecia e convivia com os co-arguidos, mas não os considera seus amigos. Os amigos são, alguns, originários da ... e outros, do tempo em que frequentava a escola.
Quando está no estrangeiro a trabalhar, convive com colegas de trabalho.
93.º Era consumidor de canábis, por vezes em quantidades elevadas, mas também conseguia ficar abstinente nos dias em que tinha aulas de condução. Já experimentou MDMA e ingeria bebidas alcoólicas socialmente.
94.º O presente processo judicial e, sobretudo a detenção do arguido, tiveram um forte impacto junto dos familiares, particularmente da mãe e das irmãs, que ficaram surpreendidas e muito desgostosas.
95.º O arguido tem mantido um comportamento adequado ao contexto prisional. Está desocupado, por razões inerentes ao Estabelecimento Prisional. Não tem infracções registadas e recebe visitas da mãe e das irmãs.
96.º Do certificado de registo criminal relativo ao arguido, emitido a 18-03-2025, não consta qualquer condenação.
Do arguido DD
97.º O agregado familiar do arguido é composto pelo próprio, companheira e três filhos menores, sendo a dinâmica familiar caracterizada pelos seus membros como positiva e com vinculação afectiva entre os seus elementos. O arguido mantém contactos regulares com os irmãos consanguíneos, tendo descrito a relação com estes como próxima.
98.º À data dos factos, o agregado do arguido era constituído apenas pela companheira e pelas duas filhas do casal, tendo o filho mais novo nascido entretanto.
99.º Desde o seu nascimento até 2005, DD viveu entre o ... e a ..., alternando agregados familiares diferentes (mãe e avós maternos e tios paternos), vivenciando situações de violência física e psicológica.
100.º Veio para Portugal em 2005 com o irmão OO, integrando o agregado familiar do progenitor, tendo-se adaptado positivamente e, entretanto, obtido a cidadania portuguesa.
101.º Iniciou relacionamento afectivo com a actual companheira em 2018.
102.º DD reside com a companheira e os três filhos do casal, na zona do ..., num apartamento, de tipologia T3, tendo a habitação adequadas condições de conforto. A zona habitacional é calma, não existindo problemas de relacionamento com a comunidade.
103.º A habitação é propriedade do pai do arguido, o qual assegura mensalmente o pagamento da correspondente prestação bancária. DD refere que, quando trabalha e tem rendimentos, comparticipa ou ressarce o pai nessa despesa.
104.º O arguido, que concluiu o 8.º ano, afirma ter tido um percurso escolar pouco investido, facto que associa a conflitos com o progenitor relativamente à conciliação do percurso escolar com a actividade desportiva.
105.º À data dos factos o arguido encontrava-se desempregado, auxiliando a proprietária do café ...” pelo que auferia quantias variáveis. Desde ... de 2024, trabalha como ... pela empresa ..., Lda., estando colocado na empresa ...
106.º Desde ... de 2024, DD encontra-se de baixa médica por acidente de trabalho, sendo o seu actual rendimento mensal assegurado pela companhia de seguros, em cerca de € 500,00 mensais.
107.º A amortização do empréstimo bancário relativo à habitação, no valor mensal de € 410,00, é garantida pelo progenitor.
108.º DD caracteriza a situação económica do seu agregado como deficitária pela dificuldade em assegurar a totalidade das despesas fixas mensais, atendendo ao facto de ser o único elemento activo da sua família e ter um rendimento salarial baixo. Por sua vez, a companheira do arguido refere que a sua própria família a ajuda financeiramente sempre que necessita.
109.º O seu quotidiano assenta no desempenho da actividade laboral e no convívio familiar, tendo-se afastado dos pares com quem habitualmente acompanhava, por considerar que alguns desses amigos mantêm comportamentos desviantes, associado ao tráfico de substâncias ilícitas.
110.º Desde ... de 2023, não mais voltou a conviver ou contactar com estes amigos.
111.º Em termos de tempos livres, aos fins-de-semana realiza treino futebolístico de crianças nos “...” e no “...”.
112.º Mantinha, à data dos factos, consumos de haxixe, comportamento que abandonou por opção própria e sem apoio especializado.
113.º O arguido identifica como repercussões da sua actual situação jurídico-penal, em termos pessoais e familiares, o facto de ter ficado sem actividade laboral e sem o único recurso de subsistência económica do seu agregado familiar, bem como tensões na relação com o seu pai.
114.º Do certificado de registo criminal relativo ao arguido, emitido a 18-03-2025, consta condenação, por crime de consumo de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 40.º, n.º 1, e n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/1993, de 22 de Janeiro (deve-se certamente a lapso a menção ao crime de tráfico atenta a norma referida), na pena de 59 dias de mula, declarada extinta pelo cumprimento.
Do arguido BB:
115.º Desde ... de 2024 que BB encontra-se a viver no ... com familiares maternos. Trata-se de uma situação de recurso, ditada pela necessidade de afastar-se da zona de ..., por força do seu envolvimento no presente processo. Ainda que não existisse relação anterior do arguido com este agregado, a sua integração está a correr bem, uma vez que cumpre as regras familiares e existe disponibilidade do casal para continuarem a apoiá-lo. Por parte do arguido é expresso agrado pelo apoio que lhe é prestado e pela boa relação que estabelece com os primos, num ambiente familiar tranquilo e organizado.
116.º Simultaneamente, BB mantém namoro com PP, ..., residente na ..., que passa muito tempo com o arguido, sendo considerada pelos familiares uma boa influência para este, por ser calma e ponderada.
117.º De um relacionamento anterior, sem coabitação, o arguido tem uma descendente com dois anos de idade, a viver com os avós maternos, em ..., relativamente à qual procura manter-se ligado, participando na sua manutenção.
118.º O arguido veio para Portugal em 2019, para viver e estudar em .... A situação alterou-se com a pandemia passando o arguido a viver com familiares em ... e depois no .... Em ambas as situações sentiu dificuldades de adaptação, ressentindo-se do facto de não existir relação anterior com os mesmos e encontrar uma organização familiar diferente do que estava habituado. Em razão de tal, em 2023, já no ... arrendou um quarto numa casa que partilhava com outros jovens.
119.º Os pais de BB separaram-se quando este estava no inicio da adolescência, ficando o arguido a viver com o progenitor, na ..., enquanto a mãe constituiu nova família e passou a viver no ... e actualmente na .... O pai, profissionalmente ligado às minas, e a madrasta, enfermeira, foram as suas referências afectivas até 2019, altura em que veio para Portugal e não voltou a estar com eles. A relação com a mãe, comerciante de roupa e comida, tornou-se praticamente inexistente uma vez que desde os 13 anos nunca mais a viu, sendo esporádicos os contactos que mantêm através das redes sociais. Também com o pai não tem contactos presenciais desde que veio para Portugal.
120.º O arguido vive em casa dos tios, numa situação que considera adequada às suas necessidades, partilhando o quarto com dois dos primos. Provisoriamente, para estar mais próximo do local onde trabalha, em conjunto com o primo QQ, arrendou uma casa-contentor situada nas imediações do ..., na .... De outra forma não conseguiria deslocar-se da casa dos tios até ao trabalho, por se tratar de uma zona com características rurais e sem transportes públicos nocturnos.
121.º Tem como grau de escolaridade o 12º ano, … e, no ano lectivo ...1...-20, BB frequentou o 1º ano do Curso Técnico Superior de Especialização Profissional em Construção Civil, ministrado pelo .... A interrupção das aulas impostas pela pandemia COVID-19 e dificuldades do pai em continuar a financiar a formação ditaram o abandono definitivo, ainda que BB mantenha uma atitude de investimento na obtenção de certificação para trabalhar. Insere-se neste âmbito a formação como … que o próprio procurou e pagou, após ter verificado tratar-se de um requisito importante para arranjar trabalho em armazéns e grandes superfícies comerciais.
122.º BB possui contrato de trabalho a termo certo, com a categoria profissional de …, exercendo funções no... localizado no ..., na .... O arguido tem vontade em continuar a trabalhar no local, sentindo-se confortável com o que está a fazer. Caso tal não aconteça, refere possuir outra hipótese de trabalho num armazém de mercadorias, situado na mesma zona.
123.º Atribui valor ao trabalho e mantém uma atitude empenhada e activa de procura do mesmo.
Terá sido em Portugal que trabalhou pela primeira vez e por força da interrupção da formação que estava a fazer. De 2020 até à actualidade esteve ligado a empresas de trabalho temporário, através das quais arranjou trabalho na …, fundamentalmente na zona de …. Já no ..., entre ... e ... de 2024, trabalhou numa …, como empregado de …. O facto de ter estado mais de um ano com o título de residência em Portugal caducado, dificultou a obtenção de trabalho com vínculo duradouro.
124.º Aufere € 1.000, despendendo € 260 em arrendamento, € 75 em pensão de alimentos paga à filha, e € 100 em alimentação (entregue aos tios)
125.º BB conta com o apoio logístico e alimentar dos tios com os quais tem vivido no .... Sempre que trabalha comparticipa na medida das suas possibilidades para a economia familiar. Globalmente, a situação familiar apresenta contornos de sustentabilidade e suficiência.
126.º BB apresenta-se um jovem que em 2019 veio sozinho estudar para Portugal, para ..., um meio social e culturalmente muito diferente daquele em que se desenvolveu, uma vez que sempre tinha vivido na .... Quando se viu forçado a ir viver com familiares, na ..., continuou a sentir dificuldades em sentir- se integrado. Tais dificuldades fizeram-se notar também nas relações sociais em geral, em razão do que se considera uma pessoa sem relações de amizade significativas, para além dos contactos que estabelece nos sítios onde está em determinado momento.
127.º Possuidor de competências pessoais e sociais, BB acaba por não sentir muitas dificuldades em estabelecer contactos em novos locais, ainda que se percepcione uma atitude defensiva relativamente a vinculações sociais mais duradouras.
128.º BB é consumidor estupefacientes, especialmente haxixe, situação que considera controlada e sem impacto no seu quotidiano, uma vez que consegue cumprir compromissos.
129.º À data dos factos, o consumo de substâncias ilícitas estava agravado, facilitado pelas pessoas que ia conhecendo e acompanhava. Na altura terá sido identificado como consumidor e sujeito intervenções em ambulatório.
130.º A presente sujeição de BB a julgamento parece representar para o arguido uma oportunidade de reflexão e maior auto-regulação, identificando-se na sua estrutura de pensamento vontade em ajustar-se à norma e distanciar-se dos contextos em que poderá voltar a envolver-se em situações potencialmente delinquenciais.
131.º Como impacto imediato, e por força da medida de coacção imposta no presente processo, BB afastou-se do ... e encontrou no ..., onde se tem mantido, experiências de vida que parece valorizar. De igual forma, continua a contar com o apoio e disponibilidade por parte dos familiares que o receberam para se manter junto deles, desde que não se envolva em situações problemáticas e trabalhe, o que o arguido parece aceitar.
132.º BB expressa preocupação com o processo, predispondo-se a colaborar com o que for decidido, revelando-se capaz de reflectir criticamente sobre o seu comportamento.
A presente sujeição a julgamento parece também estar a ser aproveitada para reflectir sobre os aspectos que podem influenciar as decisões que toma. Insere-se neste âmbito a censura exercida pela namorada relativamente ao consumo, ainda que diminuto, de estupefacientes que parece ser mantido e a identificação de vulnerabilidades relativamente ao recurso a sites de jogo online, onde por vezes o arguido perde dinheiro. Ambas as situações originam discussões pontuais entre o casal e contribuem para que equacione sujeitar-se a acompanhamento na área das dependências.
133.º Do seu certificado de registo criminal, emitido a 18-03-2025, não constam quaisquer condenações.
Do arguido CC:
134.º CC vive sozinho, desde 2023, ainda que mantenha uma relação de namoro. Neste momento, esta ligação apresenta-se para o arguido como a única referência com relevância afectiva que mantém em Portugal, apresentando a namorada como a pessoa com a qual organiza o seu quotidiano, ambos circulando entre o ... e o ....
135.º Como familiar de referência, CC identifica apenas a mãe, residente na ..., com a qual fala frequentemente através das redes sociais, à qual dirige expressões de afecto e preocupação em ajudar.
136.º À data dos factos, vivia sozinho no ..., afastado dos poucos familiares que teria em Portugal e das outras pessoas conhecidas com as quais começara por coabitar.
137.º CC encontra-se a viver em Portugal desde 2017, data em que tendo apenas 16 anos de idade, veio sozinho em procura de uma vida melhor. Começou por viver na zona de ..., em casa de uma amiga da mãe. Seguiram-se quatro meses a viver na ..., junto de um irmão, e o regresso a Portugal, sem grande enquadramento em razão do que passa a circular por casa de amigos da família e, já em 2022, de uma irmã.
138.º CC é o mais novo de quatro filhos de sua mãe, com os quais foi criado. Nunca viveu com o pai, revelando-se o mesmo ausente da sua manutenção e orientação, referindo que este tem outras famílias constituídas e vive na ....
139.º Desde há cerca de quatro meses que CC vive num quarto arrendado, parte de uma construção em madeira, que divide com mais duas pessoas, situada num camping ilegal, situado nas imediações da cidade de .... Trata-se de uma solução de recurso que pretende manter pelo tempo estritamente necessário, dadas as condições físicas em que vive e o ambiente pouco seguro do mesmo.
140.º À data dos factos, vivia em espaços devolutos, situados na cidade do ..., após ter deixado de conseguir pagar o quarto que arrendara na mesma cidade
141.º Tem habilitações literárias equivalentes ao 9 º ano (escolaridade obtida no ...)
142.º CC encontra-se a trabalhar, por intermédio de uma empresa de trabalho temporário, numa …, que tem …, com um vínculo de trabalho precário e de curta duração, tratando-se de uma situação em que se tem mantido no último ano. Neste momento, a previsão é que se mantenha com trabalho até Abril.
143.º Nesta mesma empresa, à qual se mantém vinculado desde ... de 2024, CC tem tido outros contratos de trabalho, de curta duração, na … ou na …, sendo a sua expectativa que na próxima época balnear possa ter um contrato de trabalho mais duradouro. Para tanto invoca a proximidade e a confiança que sente existir por parte dos responsáveis da empresa de trabalho temporário, considerando-se apoiado pelos mesmos.
144.º Desde que em 2017 veio para Portugal, CC tem procurado trabalhar em áreas diversas, referindo experiências na … e na …. A ausência de autorização de residência é apresentada como a grande dificuldade para se manter nas empresas onde já trabalhou, apresentando um discurso que atribui valor ao trabalho, não só para assegurar a sua manutenção como para conseguir enviar dinheiro para a mãe, que permanece no ....
145.º Aufere € 60/diários líquidos, tendo como despesas de habitação € 350, sendo a sua situação económica condicionada pela incerteza dos seus rendimentos e pelo facto de não ter retaguarda material. Pese embora precária, a situação actual é encarada pelo arguido como mais favorável, tendo por base a expectativa de conseguir manter uma fonte regular de rendimentos e assegurar o pagamento de um espaço para morar.
146.º À data dos factos, CC encontrava-se sem trabalho, incapaz de suportar os custos básicos com alojamento e alimentação. Tal situação voltou a repetir-se já no ..., onde ainda viveu em condições mais precárias que as actuais.
147.º CC expressa atribuir valor à permanência em Portugal, ainda que se mantenha numa situação irregular, sendo a sua intenção regularizar a situação. O regresso ao ... é afastado referindo que as condições de vida, lá mantidas pela progenitora, são muito más, sendo importante o pouco dinheiro que lhe envia.
148.º Em Portugal, CC possui poucas relações ou referências, organizando o seu quotidiano em função da namorada e dos contactos de ocasião, ainda que mencione ter alguns amigos.
149.º Relativamente ao futuro expressa confiança em consolidar os laços que, entretanto, desenvolveu no ..., onde se sente mais confiante em termos de trabalho.
150.º É consumidor de estupefacientes desde há três anos, o que atribui às dificuldades que tem passado em Portugal, considerando que neste momento fá-lo apenas ocasionalmente, não identificando a necessidade de se sujeitar a avaliação médica.
151.º A presente sujeição a julgamento parece estar a ser gerida pelo arguido como um confronto com as consequências de continuar a viver com base em expedientes e em contextos sociais que reconhece de risco, tais como aqueles em que funcionava à data da instauração do presente processo. Como consequência mais imediata receia o impacto no seu processo de regularização de permanência em Portugal.
152.º À distância CC consegue identificar as situações que contribuíram para a sua associação ao presente processo, tais como o consumo de estupefacientes e a ausência de dinheiro para assegurar a sua manutenção.
153.º Do seu certificado de registo criminal, emitido a 18-03-2025, não constam quaisquer condenações.
Mais se provou que:
154.º AA admitiu objectivamente os factos proados a seu respeito, denotando arrependimento.
b) Factos não provados
Com relevância para a decisão da causa não se provou que:
a. Desde ... de 2023 os arguidos dedicaram-se à venda de produtos estupefacientes e os BB e CC (1.º da acusação).
b. DD fazia-o através da utilização de intermediários, sendo coadjuvado por BB, CC, AA que depois lhe entregavam o produto da venda de estupefaciente (2.º da acusação).
c. No dia ...-...-2023, entre as 16h45 e as 17h, os arguidos guardavam junto à entrada do ..., na zona da esplanada uma balança digital e 9,855gr de “canábis” (4.º da acusação).
d. O estupefaciente descrito em 12.º tinha o peso, respectivamente, de 2,57gr, 1,65gr, 4,18gr e 0,84gr (14.º da acusação).
e. No dia ...-...-2023, pelas 15h47, junto do café ...”, o arguido BB vendeu uma saqueta com canábis a um indivíduo não identificado, pelo valor de € 10. O estupefaciente encontrava-se escondido no interior de uma espuma (15.º da acusação).
f. No mesmo dia, pelas 17h34, o arguido BB retirou daquele local (espuma) uma saqueta com canábis, que vendeu a um indivíduo não identificado (16.º da acusação).
g. Pelas 17h45, desse mesmo dia, o arguido BB, vendeu €10 de canábis que retirou da bolsa que trazia consigo, a um indivíduo não identificado (17.º da acusação).
h. O saco descrito em 15.º continha “liamba” (20.º da acusação).
i. Nas circunstâncias descritas em 22.º, BB foi abordado por indivíduos não identificados (27.º da acusação).
j. Os indivíduos referidos em 25.º e 26.º eram RR, SS e TT (30.º e 31.º da acusação).
k. O indivíduo referido em 44.º era UU (47.º da acusação).
l. Os indivíduos referidos em 51.º eram VV e WW (54.º da acusação).
m. AA recebeu directamente a nota e entregou directamente o estupefaciente nas circunstâncias descritas em 61.º e 62.º (64.º e 65.º da acusação).
n. O estupefaciente vendido a XX e MM tinha, respectivamente, o peso de 2,72 gramas e 2,42 gramas (67.º e 68.º da acusação).
o. O estupefaciente descrito em 68.º tinha o peso, respectivamente, de 1,52 grs e 19,28 grs.
p. O estupefaciente descrito em 69.º tinha o peso, respectivamente, de 8,84, 1,08, 6,67 e 16,60 gramas.
q. O estupefaciente descrito em 70.º tinha o peso, respectivamente, de 5,48 gramas e 4,27 gramas.
r. O estupefaciente descrito em 71.º tinha o peso de 15,51 gramas.
s. O estupefaciente descrito em 72.º pesava, respectivamente, 3,81, 0,49, 2,12, e 7,71 gramas.
t. O estupefaciente descrito em 73.º pesava, respectivamente, 336,29, 15,51, 1061,91, 12,16, 58,17, 18,88, 1455,09, 2108,53, 865,31, 549,75, 2,62, 0,98 gramas.
Não existem outros factos não provados ou a provar com relevo para a decisão, revestindo o demais alegado e não consignado na factualidade provada ou não provada natureza jurídico- conclusiva, devendo-se a redacção adoptada à necessidade de expurgar a matéria de facto de elementos juridicamente irrelevantes.
c) Motivação
Prova atendida:
- Declarativa – declarações de AA, prestadas em audiência de julgamento, e de DD, prestadas em primeiro interrogatório judicial de arguido detido, e reproduzidas em audiência nos termos dos artigos 141.º, n.º 4, alínea b), 355.º, n.º 2, e 357.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal.
- Testemunhal – depoimentos de YY, ZZ, AAA, BBB, CCC, XX, NN, DDD, EEE, KK, HH, FFF, GGG, HHH, III, NN, JJJ, KKK, LLL, MMM, NNN, OOO, PPP, QQQ, RRR, QQ, SSS e TTT.
- Pericial – relatório de exame pericial n.º 202302066 – BTX, de folhas 36, 119; relatório de exame pericial n.º 202310351 – BTX, de folhas 689-696, e relatório de exame pericial n.º 202307186-BTX de folhas 1499.
- Documental – auto de notícia, folhas 4-5; autos de exame directo a produto estupefaciente e folhas 6, 205-208, 230, 232, 234, 236, 238, 240, 242, 244, 246, 248, 250, 252, 254, 256, 285, 324, 330; autos de apreensão de folhas 7, 217-218, 268-269, 270, 271-272, 292-293, 322-323, 329, 338; reportagens fotográficas de folhas 8-11; aditamentos de folhas 38-39, 161, 163-164, 173, relatórios intercalares de folhas 40-42, 70, 87, 115-116, 142, 153-155, 517, 522, 526; relatórios de vigilância de folhas 43-55, 66-69, 84-86, 94-114, 127-141, 152, 165-166, 335- 337; autos de busca e apreensão de fls. 192-194, 221-225, 279-281, 296-297; fotogramas de fls. 209-216, 231, 233, 235, 237, 239, 241, 243, 245, 247, 249, 251, 253, 255, 257-267, 286- 289, 311-317, 325, 331, 339-345, 449, 450, 451, 452; relatórios policiais de folhas 290-291; auto de notícia por detenção de folhas 359-368; auto de notícia por detenção de folhas 4-5 do NUIPC195/23.5PFBRR, auto de apreensão de folhas 6 do NUIPC 195/23.5PFBRR, autos de exame directo de folhas 12-15 do NUIPC 195/23.5PFBRR); fotogramas de folhas 16-18 (NUIPC 195/23.5PFBRR); apenso de vigilâncias, relatórios sociais de folhas 1191-1194 (DD), de folhas 1191-1194 (BB), de folhas 1355-1358 (CC), de folhas 1115-1117 (AA), folhas 971, 1323-1324, certificados de registo criminal de folhas 1483 (AA), 1484-1485 (DD), 1486 (BB), 1487 (CC).
Exame crítico:
Na formação da sua convicção o Tribunal atendeu aos meios de prova disponíveis, acima referidos, alicerçando-se nos dados objectivos fornecidos pelos documentos dos autos, procedendo a uma análise das declarações e depoimentos prestados, e apreciando globalmente a prova produzida de acordo com as regras da experiência comum e lógica do homem médio, suposto pelo ordenamento jurídico, procedendo à sua análise crítica (cf. artigo 127.º do Código de Processo Penal).
No âmbito das suas declarações, o arguido AA admitiu, desde logo, a detenção do estupefaciente, bens e quantias monetárias que lhe foram apreendidos a ...-...-2023, quer na sua residência, quer no café. Referiu que guardava tal produto a pedido de terceiro, tendo-o feito por duas ou três vezes, sendo a primeira no final de ... de 2023. O estupefaciente apreendido tinha-lhe sido entregue em .... Tal pessoa, cujo nome não quis referir, ia a sua casa buscar o estupefaciente quando precisava, e, para o efeito, dava-lhe um toque através da aplicação Sigma. Em troca de tal favor, recebia uma placa de haxixe. Tal placa destinava-se ao seu consumo pessoal, e à venda, o que sucedeu, designadamente, nos dias ...-...-2023 e ...-...-2023, nos termos descritos na acusação. Realizava a venda sozinho e por sua própria conta. Sobre as vendas por si realizadas, o arguido esclareceu que todos os dias frequentava o café ..., mas vendia estupefaciente – apenas haxixe – naquele local entre a quinta-feira e sábado, realizando duas ou três vendas em cada dia. O local é conotado com a venda de produtos de tal natureza, razão pela qual era abordado por consumidores a quem cedia estupefaciente mediante o pagamento de € 10,00 por uma quantia entre 1-2 gramas. O dinheiro que recebia das vendas ficava no seu bolso para gastos correntes. Os demais arguidos também frequentavam o café. Confrontando com o teor do relatório da vigilância realizada a ...-...-2023 (Relatório de vigilância n.º 30, de folhas 63-65 do apenso respectivo), concretamente às 12.05 horas, declarou que o arguido CC apenas participou em tal actividade nesse dia. Referiu que guardava o estupefaciente em vários locais, designadamente na floreira e no vaso junto da porta do café, usando sempre a mochila que foi apreendida no seu quarto. Confirmou que, aquando da detenção, o canábis encontrado no vaso de flores do café era seu, e o dinheiro que tinha consigo, cerca de € 30,00 era das suas economias. Pretendia continuar a vender estupefacientes até obter a carta de condução. Fumava cerca de três cigarros de haxixe, não sabendo especificar a quantidade, e consumia metanfetaminas quando dia a festas, o que sucedia cerca de uma ou duas vezes por mês. O telemóvel que lhe foi apreendido, havia-lhe sido oferecido pela namorada, em ... de 2022.
Quanto ao estupefaciente que guardava, declarou que o referido indivíduo avisava que ia deslocar-se a sua casa, mandava mensagem quando chegava a avisar, e o próprio descia com as coisas dele. Às vezes entregava-lhe haxixe, outras metanfetaminas, o que ele pedisse. Quanto à quantia monetária que lhe foi apreendida, a mesma era fruto do seu trabalho. Trabalhou em ..., onde recebia ajudas de custo semanais, e encontrava-se em Portugal à cerca de três/quatro meses para frequentar um curso de soldadura e tirar a carta de condução. Questionado, o arguido referiu que a máquina de vácuo, w rolo de película aderente pertenciam ao dito indivíduo, que este, depois de receber de si o estupefaciente, dizia que ia a casa embalar o estupefaciente e depois trazia os utensílios de volta. A preparação não era realizada em sua casa porque vivia com a família. Confrontando com a circunstância de o estupefaciente se encontrar disperso pelo quarto, afirmou que o haxixe que estava na secretária era para entregar, o MDMA e ecstasy eram para seu consumo pessoal, e que estavam dispersos porque não queria que as irmãs descobrissem, embora apenas a mãe entrasse no quarto para o limpar.
O arguido DD prestou declarações em sede de primeiro interrogatório judicial, que vieram a ser reproduzidas em audiência. No seu âmbito, declarou trabalhar no café ..., desde ... de 2023, desempenhado funções ao balcão e na cozinha, entre as 19.00 e as 02.00 horas, auferindo o salário mínimo. Às vezes, quando a proprietária não pode também abre o café pelas 09.00 horas. Tal sucedeu quando ficou desempregado do seu trabalho na .... Para compor os rendimentos familiares, uma vez que a sua companheira é doméstica, desde esse mesmo mês até à sua detenção, em ... de 2023, vendia cocaína cerca de duas vezes por mês, na zona do ..., abastecendo-se, para o efeito, também duas vezes por mês, no ..., quando se deslocava a Lisboa para visitar familiares ao domingo. Abastecia-se de cerca de 5 gramas de cada vez, por um preço de € 40,00/grama, e revendia esse estupefaciente a € 60,00/grama. A última vez que se tinha abastecido foi no domingo anterior à detenção (ou seja ...-...-2023).
UUU, agente da PSP, em exercício de funções da Esquadra de Investigação Criminal (EIC) do ... e que, em tal qualidade, procedeu a vigilâncias ao estabelecimento de café ..., e imediações, no período entre ... a ... de 2023, bem como na abordagem aos arguidos ocorrida em ...-...-2023, descreveu de modo escorreito as diligências por si empreendidas, bem como a actuação de cada um dos arguidos no período em causa, por si directamente observada, bem como o estupefaciente, quantias monetárias e objectos apreendidos aos mesmos. Concretizou que os arguidos entregavam estupefaciente a terceiros quando se encontravam na esplanada do café ou debaixo das árvores existentes junto do mesmo, sendo que AA, apesar de antes já frequentar o café apenas se envolveu nesta actividade a partir de .... Precisou que inicialmente confundiram AA com o irmão de DD, VVV, bem como com WWW, residente no mesmo prédio, tendo depois vindo a confirmar a sua identidade, como resulta do aditamento de folhas 163, com o qual foi confrontado. Quanto à intervenção concreta de DD, na altura, concluiu que o mesmo teria uma posição de direcção dos demais. Extraiu tal conclusão, porquanto o mesmo foi visto a entregar sacos a EE (pessoa que também cedia estupefacientes no local e depois desapareceu) e a CC; e a receber dinheiro dos outros (embora não pela própria testemunha); também viu CC a entrar no prédio onde DD residia e de lá sair com um saco; além disso, assistiu pelo menos a uma venda directa de DD a um comprador. Relativamente à concreta actuação dos arguidos BB, CC e o referido EE, estes eram os mais assíduos no café, entregando directamente o estupefaciente aos compradores, indo, para o efeito, buscá-lo ao local onde previamente o haviam ocultado. O arguido XXX, no período em que desenvolveu tal actividade, não permanecia tanto tempo no local.
YYY e ZZZ, também agentes da PSP, em exercício de funções na mesma EIC e intervenientes na investigação, também enunciaram as diligências por si empreendidas e descreveram a concreta actuação de cada um dos arguidos por si presenciada, em moldes essencialmente coincidentes com os da anterior testemunha embora enunciando pormenores distintos, o que evidencia a sua credibilidade.
YYY referiu ter concluído que DD tinha uma posição predominante relativamente aos demais arguidos pois: numa fase inicial foi visto a chamar EE que, por seu turno, se deslocou às ervas e daí recolheu um saco que entregou a DD sem nada receber em troca; noutra ocasião, chegou ao café, entregou um saco a CC e este, por seu turno, tirou estupefaciente do seu interior e entregou a um consumidor; também noutra ocasião, CC deslocou-se a casa de DD e saiu de lá com um saco com o qual se deslocou para o café.
Quanto aos demais, o modus operandi consistia em ceder aos compradores estupefaciente, indo para o efeito buscá-lo a debaixo de pedras, junto a arbustos e numa papeleira onde o haviam previamente ocultado. Descreveu ainda a abordarem realizada a MM, e apreensão do estupefaciente que este havia acabado de adquirir no café (cf. auto de apreensão de folhas 322).
ZZZ, por seu turno, também descreveu a actuação de cada um dos arguidos nos termos por si presenciados, referindo ter visto DD a entrar no banco de trás de uma viatura, outro indivíduo também a entrar no banco de trás, e DD entregar-lhe um saco que o outro indivíduo depois oculta numa mochila (cf. Relatório de vigilância n.º 9, de folhas 18-20 do apenso respectivo). Também viu CC, BB, e AA, sendo este último numa altura posterior. BB foi quem viu mais vezes a ceder estupefaciente. Quanto à identificação de AA, esclareceu que, quando se apercebeu de mais um individuo a vender estupefaciente no café, através da matrícula do carro que o mesmo conduzia, chegou ao nome de OO, tendo, porém, vindo a concluir posteriormente, pelas características físicas, que se tratava de AA.
No que respeita à prova testemunhal, MM, consumidor ocasional de haxixe, admitiu que adquiria o estupefaciente no café referido nos autos, cerca de uma vez por mês, e de mês a mês ou a cada dois meses, tendo, inclusivamente, vindo a ser interceptado pela policia numa ocasião em que tinha adquirido haxixe por € 10,00. Referiu que se deslocava ao local com um colega, sendo este quem conhecia os vendedores. O depoimento foi corroborado por AAAA, que acompanhava a testemunha e referiu que, à data, era consumidor de estupefaciente e adquiriu tal produto no referido café durante cerca de seis meses, dia sim, dia não, despendendo no mínimo € 10,00. O produto foi-lhe entregue por várias pessoas diferentes, que, após serem por si abordadas, ausentavam-se, regressando depois com o produto que lhe entregavam. Desconhece onde o iam buscar.
XX, à data consumidor de haxixe, no que despendia € 50,00 mensais, negou adquirir tal substância no café ..., referindo apenas aí se deslocar para tomar café, cerca de uma vez por mês quando ia fazer as compras mensais ao supermercado sito nas imediações. Confrontando com o auto de apreensão de folhas 329, admitiu que detinha tal estupefaciente, afirmando que o havia adquirido em Lisboa. Não pode, porém, merecer credibilidade tal depoimento quando conjugado com a demais prova a que se aludirá a propósito dos factos de ...-...-2023.
BBBB, também consumidor de estupefacientes à data dos factos, referiu ter adquirido haxixe no café ..., cerca de duas a três vezes por semana, despendendo € 10,00 de cada vez, a pessoas diferentes que não consegue reconhecer. O estupefaciente estava muitas vezes guardado junto das árvores, do parque de estacionamento ou debaixo de pedras. Pese embora tenha referido inicialmente que os vendedores ficavam na rua, acabou por referir ter chegado a comprar a alguém que se encontrava na esplanada.
CCCC esclareceu conhecer os arguidos por frequentar o café ..., sendo que DD trabalha naquele estabelecimento. Narrou as circunstâncias em que, certo dia, se deslocou ao local acompanhada de uma amiga (DDDD) e adquiriu uma “língua” de haxixe, que lhe daria para dois dias de consumo a BB mediante o pagamento de € 10,00. Foi o seu namorado quem, a seu pedido, combinou previamente o encontro. DDDD corroborou ter acompanhado a sua amiga CCCC e o teor do depoimento desta.
KK, também consumidora de haxixe à data e frequentadora do café ...”, afirmou conhecer os arguidos DD, por lá trabalhar, BB e AA por o frequentarem. Admitiu ter adquirido estupefaciente no local por cinco ou seis vezes, tendo-se deslocado umas vezes a pé e noutras no seu veículo, de marca Renault, e matrícula ..-ZS-... A testemunha referiu ter sempre adquirido estupefaciente a BB, por indicação do seu namorado, porém, como resulta do relatório de vigilância n.º 30, de folhas 63-65, a mesma adquiriu, pelo menos no dia ...-...-2023, estupefaciente aos arguidos CC e AA, como observado pelo agente UUU, que fez constar a factualidade por si presenciada. Pese embora tenha referido que o ... do seu veículo é Clio, e não ... como consta do relatório, perante a matrícula indicada dúvidas inexistem de que se trata do veículo da testemunha.
HH, consumidor de haxixe, esclareceu que consumia diariamente e adquiria estupefaciente em vários locais, incluindo no café referido nos autos, não logrando concretizar a periodicidade e quantidade, mas despendendo cerca de € 10,00 haxixe que consumiria numa semana.
Enunciou que quando aí adquiria, chegava e perguntava quem tinha haxixe, acabando por adquirir a várias pessoas. Algumas estavam no café, outras fora, uns mantinham o haxixe no bolso, outros saíam e voltavam com o estupefaciente, outros iam buscá-los aos arbustos. Apercebia-se de outras pessoas também a comprar. Deslocava-se ao local conduzindo o veículo de matrícula Honda Civic, matrícula ..-..-LI.
II consumidor de haxixe à data, referiu conhecer já os arguidos por frequentar o café e admitiu ter adquirido haxixe a BB, porque o via a fumar tal substância, não sabendo concretizar quantas vezes. Pagava € 5,00 a € 10,00 no máximo. Por vezes BB tinha a substância no bolso, noutras ausentava-se para a ir buscar. Chegou a comprar perto do viaduto e fazia-se deslocar no seu veículo automóvel, um ..., de matrícula ..-OL-...
EEEE, consumidor de estupefacientes, referiu que frequentava o café em causa, mas, apesar de comprar haxixe uma vez por semana, não o fazia lá, mas sim em lisboa, onde trabalhava.
Conhecia os arguidos de tal local, pois DD aí trabalhava e os demais frequentavam o estabelecimento. Negou ter adquirido estupefaciente aos arguidos e sequer tê-los alguma vez visto fumar haxixe. Confrontado com o teor do relatório de vigilância, n.º 4, de folhas 8-10, reiterou nunca ter comprado haxixe a BB.
Também FF, consumidor de haxixe, pese embora admitido deslocar-se bastantes vezes ao café em causa para consumir estupefaciente, declarou, de modo vago e evasivo, que não o comprava pois conhecia muita gente por lá, não sabendo concretizar quem.
FFFF referiu apenas conhecer os arguidos do café, que frequentava, e nunca lhes ter adquirido estupefaciente, apesar de ser consumidor, nem lhe ter sido oferecido produto de tal natureza. Admitiu que fumava haxixe junto do café, mas afastado porque nem é permitido fumar na esplanada.
GGGG, que conhece todos os arguidos de vista por serem clientes do café ..., que também frequenta, afirmou ser consumidor de haxixe à data, despendendo € 10 em cada aquisição, e, apesar de num primeiro momento ter dito que não comprava naquele local, acabou por admitir ter comprado a BB pelo menos numa ocasião.
JJ admitiu que se deslocava, em 2023, ao café para adquirir haxixe para seu consumo, cerca de uma vez por mês e adquirindo, em cada uma das vezes, € 10,00, o que ocorreu durante cerca de seis meses. Adquiriu a vários indivíduos, apenas sabendo dizer que se tratavam de indivíduos negros, debaixo do viaduto. Confrontada com o relatório de vigilância n.º 19, a folhas 40-41 do apenso respectivo, admitiu ser a própria a pessoa retratada numa das fotografias.
HHHH, consumidor de estupefacientes e frequentador ocasional do café, admitiu ter adquirido uma ou duas vezes haxixe junto do ..., tendo pago € 10,00, mas não se lembra a quem. Mais afirmou que DD trabalhava no café a servir bebidas.
IIII, que conhece os arguidos DD e CC do café, ao qual se deslocava cerca de uma vez por mês, admitiu ser consumidor de haxixe e ter adquirido tal substância uma vez a este último pelo montante de € 10,00.
GG que também conhece os arguidos DD e CC pois vivia ao lado do café onde os mesmos costumam estar, referiu que consumia haxixe e que, depois de ter vindo a travar conhecimento com CC soube que o mesmo fumava e pedia que lhe dispensasse, o que veio a suceder duas vezes. Não o via como ..., mas como uma pessoa que também consumia e lhe dispensou haxixe por € 5,00, quando o preço mínimo de venda na altura era € 10,00. Tal sucedeu porque não conhecia mais ninguém na zona. Num primeiro momento, referiu não ter obtido de mais nenhum dos arguidos haxixe, mas, confrontado com o teor do relatório de vigilância n.º 16, de folhas 31-33, confirmou conduzir o veículo de matricula ..-EN-.. e admitiu como possível ter parado o veículo no estacionamento debaixo do viaduto para comprar estupefaciente. DD trabalhava no café, tendo chegado a servir-lhe café por duas ou três vezes.
JJJJ, referiu conhecer os arguidos do café, que todos frequentavam. Declarou não ser consumidor de haxixe em 2022 e 2023, tendo retomado o consumo de tal substância em 2024. Nunca adquiriu haxixe aos arguidos, nem se lembra de os ver vender. DD ajudava no café (montava esplanada, arrumava compras) e AA deslocava-se ao local raramente.
QQQ afirmou não conhecer os arguidos e deslocar-se pontualmente ao café ..., não sabendo concretizar quantas. Consumia socialmente haxixe, mas não sabe concretizar a periodicidade, admitindo como possível ter consumido junto do café. É condutor do veículo de marca Opel e matrícula ..-QS-... Chegou a comprar estupefaciente no café, mais de uma vez embora não saiba quantas, nunca tendo comprado mais de € 10,00. Também não sabe se comprou à mesma pessoa pois estava lá muita gente ao ponto de o abordarem para lhe venderem no trajecto que fazia entre o carro e o balcão do estabelecimento.
KKKK, proprietária do café ..., também conhecido por café da Tia, enunciou o horário de funcionamento do café, e referiu que, a partir de ...de 2021, nos períodos em que ficava sem trabalhar na ..., DD ajudava-a no período nocturno, pagando-lhe quantias variáveis por tal auxílio. Os demais arguidos eram clientes o café, ficando, a maioria das vezes, na esplanada. Não se apercebia do que se passava na esplanada, mas a dada altura a polícia informou que eles fumavam na rua e que, inclusivamente, os vizinhos denunciavam que o cheiro lhes entrava por casa adentro. Confrontou o BB, que lhe disse tratar-se de “ganza”.
Os meios probatórios acima referidos conjugados com os relatórios de vigilância que constituem o apenso respectivo, revelaram-se fundamentais para prova dos factos relativos à actividade desenvolvida pelos arguidos em termos genéricos e funções exercidas por cada um deles, nos termos melhor explanados abaixo a propósito de cada uma das situações concretas dadas por provadas.
Relativamente aos factos ocorridos no dia ...-...-2023 (factos provados 3.º a 6.º), atendeu-se ao relatório de vigilância n.º 2, a folhas 3-5, nos quais se encontram descritos, tendo sido presenciados pela testemunha UUU. No referido relatório, bem como nos demais, é mencionado o nome de II, quando na verdade o indivíduo em causa se trata do arguido CC, cujos elementos identificativos apenas foram cabalmente conhecidos aquando da sua detenção, pois o mesmo, apesar de instado para tanto, nunca exibiu qualquer documento de identificação tendo, inclusivamente, indicado três nomes diferentes (cf. aditamentos e auto de notícia de folhas 38, 173, 359-368). Pese embora não tenha sido apreendido qualquer estupefaciente, das movimentações realizadas por cada um dos indivíduos observados, o tipo de objectos transaccionados, directamente observados pelos agentes que procederam à vigilância, designadamente saco contendo saquetas de plástico, dissimulação do mesmo nos arbustos, onde, a ...-...-2023, veio ser apreendida canábis, bem como entrega de saqueta de plástico, contendo um objecto visualmente semelhante a haxixe, conjuntamente com a prova testemunhal acima referida da qual resulta que várias pessoas adquiriram a estes arguidos haxixe, e o estupefaciente que lhes veio a ser apreendido, não pode senão concluir-se, à luz das regras da experiência e critérios de normalidade, que todos detinham tal substância para cedência, em união e conjugação de esforços, tendo BB efectivamente cedido a mesma por duas vezes neste dia. A circunstância de DD também trabalhar a tempo parcial no café em causa, como referido pelo próprio, e por várias testemunhas, incluindo a proprietária do estabelecimento, em nada infirma tal conclusão, antes pelo contrário já que, uma vez que se encontrava também a trabalhar, é natural que as entregas directas aos consumidores fossem maioritariamente feitas pelos demais arguidos e não pelo próprio.
Os factos ocorridos a ...-...-2023 e a ...-...-2023 (factos provados 7.º a 11.º) foram considerados provados com base nos relatórios de vigilância n.º 3 e n.º 4, respectivamente a folhas 6-7 e 8-10 do correspondente apenso, conjugados com o teor dos depoimentos dos seus autores YYY e UUU, que corroboraram o seu teor. Valem aqui as considerações tecidas a propósito do anterior conjunto de factos, sendo que a circunstância de LLLL ter recebido um pedaço de canábis em nada contraria as conclusões do tribunal já que, como resulta do teor do relatório social elaborado a respeito do próprio, o mesmo, tal como os demais arguidos, era consumidor de tal produto. Tendo EEEE sido cabalmente identificado por contacto visual do agente que procedeu à vigilância, não pode merecer credibilidade o seu depoimento quando negou ter recebido estupefaciente em tais circunstâncias.
Quanto à detenção de estupefaciente por DD no dia ...-...-2023 (facto provado 12.º), designadamente circunstâncias de tempo e lugar em que ocorreu, atendeu-se ao auto de notícia por detenção de folhas 4-5, auto de apreensão de folhas 6, autos de exame directo de folhas 12-15, fotogramas de folhas 16-18, todos do NUIPC 195/23.5PFBRR. Relativamente à natureza e quantidade de estupefaciente detido pelo mesmo, valorou-se o relatório de exame pericial de folhas 1499 sendo que o mesmo expressa, contrariamente à acusação, as designações legais das substâncias em causa, daqui resultando a formulação do facto assente.
A factualidade ocorrida a ...-...-2023, (factos provados 13.º e 14.º) encontra-se documentada no relatório de vigilância n.º 6, de folhas 14-15 do apenso respectivo, tal como observada por YYY; a ocorrida a ...-...-2023 (factos provados 15.º e 17.º), no relatório de vigilância n.º 9, de folhas 18-19, e depoimentos dos respectivos subscritores. A circunstância de BB ocultar um saco de plástico debaixo das pedras, local onde, de acordo com a prova testemunhal, designadamente depoimento de MMMM, era dissimulado estupefaciente, leva-nos a concluir, de acordo com as regras da experiência e critérios de normalidade, conter canábis. No relatório de vigilância n.º 9, de folhas 18-19, é pela, primeira vez, feita referência a OO que, como resulta do depoimento dos agentes responsáveis pela investigação e de folhas 151 e 163, se veio a pensar tratar-se de NNNN, mas que na realidade se tratava do arguido AAcomo veio a ser ulteriormente identificado.
Os factos de ...-...-2023 (factos provados 18.º e 19.º) encontram-se descritos no relatório de vigilância n.º 10, de folhas 21-22; os de ...-...-2023 (factos provados 20.º a 21º.º), no relatório de vigilância n.º 11, de folhas 23-24, sendo neste expressamente identificado o indivíduo conhecido como EE, razão pela qual se teve tal facto como provado; os de ...-...-2023 (factos provados 22.º e 23.º), no relatório de vigilância n.º 13, de folhas 26-27; os de ...-...-2023 (facto provado 24.º) no relatório de vigilância n.º 14, de folhas 28; os de ...-...-2023 (factos provados 25.º e 26.º), no relatório de vigilância n.º 15, de folhas 29-30, todos do apenso respectivo.
Quanto aos factos de ...-...-2023 (factos provados 27.º a 35.º), atendeu-se ao relatório de vigilância n.º 16, de folhas 31-33, do apenso respectivo, e ainda ao depoimento de GG, que, pese embora referindo que quem habitualmente lhe cedia estupefaciente era CC, confirmou conduzir habitualmente o veículo de matrícula ..-EN-.. e admitiu, de modo espontâneo, poder ter parado o veículo no estacionamento debaixo do viaduto para comprar estupefaciente, tendo-se dado por provado tal facto, mais resultando o valor da cedência também do depoimento da testemunha. Perante o teor do relatório, e da circunstância de FF ser conhecido pelos agentes investigadores, conforme feito constar, também não restam dúvidas sobre a factualidade em que o mesmo é interveniente, pese embora o seu depoimento evasivo, a que não será alheio a circunstância de ser frequentador habitual do café em causa tal como os arguidos.
Relativamente aos factos de ...-...-2023 (factos provados 36.º a 41.º), atendeu-se ao relatório de vigilância n.º 17, de folhas 34-36, do apenso respectivo, onde os mesmos se encontram documentados tal directamente observados por YYY, UUU e ZZZ, bem como no depoimento de HH, que de modo distanciado admitiu deslocar-se ao local no seu veiculo, de matricula ..-..-LI para adquirir haxixe, embora não saiba exactamente a quem, sempre pelo preço de € 10,00 que, como tal, se teve por provado; e, ainda, de II, testemunha que igualmente reconheceu ter adquirido várias vezes estupefaciente a BB.
Teve-se por assente a factualidade ocorrida a ...-...-2023 (factos provados 42.º a 44.º) com base no relatório de vigilância n.º 19, a folhas 40-41, do apenso respectivo, conjugado com o depoimento de JJ, que admitiu deslocar-se ao local no período em causa para adquirir haxixe, e reconhecer-se na fotografia constante do relatório.
Os factos ocorridos a ...-...-2023 (facto provado 44.º) encontram-se descritos no relatório de vigilância n.º 21, de folhas 43-44; os ocorridos a ...-...-2024 (factos provados 45.º e 46.º), no relatório de vigilância n.º 22, a folhas 45-47; os ocorridos a ...-...-2023 (facto provado 48.º), no relatório de vigilância n.º 23, a folhas 48-48, valendo aqui as considerações já tecidas a propósito do depoimento de FF; os ocorridos a ...-...-2023 (factos provados 49.º a 52.º), no relatório de vigilância n.º 24, de folhas 50-51; os ocorridos a ...-...-2023 (factos provados 53.º a 59.º), no relatório de vigilância n.º 25, de folhas 52-56; os ocorridos a ...-...-2023 (facto provado 60.º) no relatório de vigilância n.º 26, de folhas 57; os ocorridos a ...-...-2023 (factos provados 61.º a 63.º), no relatório de vigilância n.º 27, de folhas 58-59, tendo-se dado por provada a exacta dinâmica ai descrita.
Finalmente, quanto aos factos ocorridos a ...-...-2023 (factos provados 64.º a 75.º), atendeu-se, primeiramente, ao relatório de vigilância n.º 30, de folhas 63-65 do apenso respectivo, conjugados com o auto de notícia por detenção de folhas 359-368, e elementos que seguidamente enunciaremos.
Concretamente quanto à cedência de estupefaciente a KK (facto provado 64.º), como acima referimos, pese embora a testemunha tenha dito ter sempre adquirido estupefaciente a BB, como resulta do relatório de vigilância, esta adquiriu-o nesta data aos arguidos CC e AA, como observado pelo agente UUU, que fez constar a factualidade por si presenciada. Pese embora tenha referido que o ... do seu veículo é Clio, e não ... como consta do relatório, perante a matrícula indicada dúvidas inexistem de que se trata do veículo da testemunha, sendo de concluir que efectivamente adquiriu a estes arguidos. O valor da transacção foi dado por provado com base no depoimento da testemunha que, nesta parte, não ofereceu dúvidas.
Relativamente à venda de canábis a XX (facto provado 65.º), pese embora o mesmo tenha negado ter comprado canábis nestas circunstâncias, a venda por admitida por AA, a que acresce ter sido directamente observada pelos agentes que procederam à vigilância, conforme feito constar no relatório. Quanto à quantidade e natureza do estupefaciente vendido, atendeu-se ao auto de apreensão de folhas 329, exame de folhas 330, e exame pericial de folhas 689-696.
Quanto à venda a MM (facto provado 66.º), atendeu-se ao depoimento do próprio, do seu amigo AAAA e de YYY que descreveu a abordagem. Pese embora a testemunha não tenha logrado identificar a quem comprou, considerando o teor do relatório de vigilância, dúvidas inexistem de que se tratou de CC. A prova da quantidade e natureza do estupefaciente vendido, resulta ao auto de apreensão de folhas 322, exame de folhas 324, e exame pericial de folhas 689-696.
A prova da venda de canábis a BBBB por BB (facto provado 67.º), resulta do relatório de vigilância já referido, bem como do depoimento do primeiro, nos termos já enunciados.
Relativamente ao estupefaciente e objectos apreendidos a BB, tanto quando se encontrava o café, como na sua residência (factos provados 68.º e 74.º), atendeu-se aos autos de autos de apreensão de folhas 268-269, 270, 271-272, 279-28; nos quais os mesmos se encontram cabalmente discriminados; quanto aos apreendidos a CC (factos provados 69.º e 75.º) nos autos de revista e apreensão e busca e apreensão de folhas 292-293 e 296-297; quanto a AA (factos provados 70.º e 73.º), nos autos de revista e apreensão e busca e apreensão de folhas 217-218, e 221-225); e quanto a DD (facto provado 72.º), no auto de busca e apreensão de folhas 192-194; quando ao produto contido no maço de tabaco ... (facto provado 71), em folhas 293.
A quantidade, natureza, grau de pureza bem como número de doses individuais dos estupefacientes apreendidos aos arguidos, resultou rigorosamente demonstrada no exame pericial de folhas 689-696, do qual resulta, de resto, as designações das substâncias tal como definidas legalmente, e nas quais não se incluem as expressões “liamba” (canábis em Folhas e sumidades) e “ecstasy” (MDMA).
Relativamente à periodicidade, natureza do estupefaciente vendido, número de vendas realizado por AA e DD, e respectivo período, (factos provados 76.º e 77.º), atendeu-se às declarações dos próprios, que admitiram tal realidade.
Perante todos os elementos probatórios vindos de descrever, designadamente substâncias apreendidas a cada um dos arguidos, depoimentos das pessoas que lhes adquiriam estupefaciente, bem como todas as trocas realizadas, não pode serão concluir-se pela prova da factualidade controvertida nos termos em que o foi, designadamente quanto à união e conjugação de esforços para venda de canábis.
Com efeito, a circunstância de DD entregar sacos, contendo saquetas, ao indivíduo conhecido por EE e CC (factos provados 5.º 39.º), sendo que estes depois vinham a ceder estupefacientes, e receber do primeiro notas (facto provado 21.º) a circunstância dos demais arguidos ocultarem estupefacientes em locais onde todos iam buscar saquetas (factos provados 3.º, 16.º) de venderem estupefacientes nos mesmos locais (factos provados 42.º e 43.º), de realizarem tarefas em conjunto, designadamente corte de estupefaciente (factos provados 48.º, 55.º), ponderando à luz das regras da experiência comum, levam-nos a concluir que efectivamente agiram em união e conjugação de esforços na venda de tal estupefacientes, e que o faziam como modo de vida considerando o tempo que dedicavam a tal actividade, sem prejuízo de desenvolverem outras (factos provados 1.º, 78.º e 79.º). De resto, a circunstância de DD também trabalhar no café, conforme referido pela respectiva proprietária, apenas facilitava o desenvolvimento da actividade.
Já no que respeita à venda de MDMA por AA e DD (factos provados 1.º e 79.º), a sua prova extrai-se da circunstância de deterem tal substância nas quantidades em que a detinham, sendo que DD detinha quantidade suficiente para 10 doses (facto provado 12.º), não resultando da prova produzida que consumisse tal substância, e AA quantidade suficiente para 8617 doses (facto provado 73.º), muito superior à necessária ao seu consumo individual.
O próprio DD admitiu, como se referiu, ter transaccionado cocaína (factos provados 1.º e 79.º).
Quanto aos elementos subjectivos do tipo (facto provado 80.º e 81.º), os mesmos inferem-se do comportamento exterior e visível dos arguidos e traduzidos na prática dos factos objectivos dados por provados, ponderados à luz das regras da experiência e critérios de normalidade, não sendo plausível as declarações de AA ao referir não ter consciência da gravidade da sua conduta, considerando o elevado volume de estupefaciente que mantinha em seu poder, sendo que a circunstância de o mesmo, e os objectos necessários ao seu processamento, se encontrarem espalhados e escondidos por vários locais do quarto com vista à sua melhor ocultação (sendo que apenas o arguido tinha o domínio de facto da referida diviso), bem denota o conhecimento do desvalor da sua conduta. De resto, as próprias declarações do arguido carecem de coerência interna pois, caso não se tratasse de uma actividade proibida, não teria qualquer sentido que alguém lhe pedisse para guardar estupefaciente e produtos para seu processamento, mediante uma compensação, ainda que fosse uma placa de haxixe como o próprio reconhece.
No atinente aos factos dados por provados a respeito das condições pessoais e socioeconómicas dos arguidos, valorou-se os relatórios sociais elaborados pela DGRSP e juntos a certificados de registo criminal de folhas 1483 (AA), 1484-1485 (DD), 1486 (BB), 1487 (CC), cujo teor foi essencialmente corroborado por ambos, ressalvadas algumas precisões que o tribunal ponderou.
Atendeu-se ainda às declarações do próprio, mas primordialmente às de OOOO, quanto à colaboração que este lhe prestava, à data, no estabelecimento comercial e montantes variáveis que lhe pagava (facto provado 105.º).
Mais se atendeu, quanto a BB, aos depoimentos de PP sua namorada, e de QQ, primo do mesmo, os quais se pronunciaram sobre a sua personalidade e comportamento, e nos mereceram credibilidade, ressalvado o depoimento de PP quanto à proveniência da quantia monetária apreendida (facto provado 74.º). Com efeito, considerando que o arguido não tinha qualquer actividade profissional, embora realizasse apostas desportivas, recorrendo ao tráfico de estupefacientes para obter rendimento, o local onde a quantia se encontrava apreendida, não pode senão concluir-se, à luz das regras da experiência e critérios de normalidade, que tal quantia provinha da actividade de tráfico desenvolvida.
Quanto a AA, atendeu-se ainda depoimento da sua irmã PPPP que o caracterizou como trabalhador e reservado, denotando-se surpresa com a sua participação nos factos. A respeito da inserção laboral do arguido, atendeu-se aos documentos juntos a folhas 971, 1323-1324.
Relativamente a CC, atendeu-se ao depoimento da sua namorada TTT, que o caracterizou como boa pessoa.
Os antecedentes criminais de DD, e a ausência de antecedentes criminais dos demais encontram-se certificados nos autos, a folhas 1483 (AA), 1484-1485 (DD), 1486 (BB), 1487 (CC).
Quanto aos factos não provados, a decisão resulta à ausência de prova sobre a sua verificação e/ou prova de realidade diversa, ou ausência de prova suficiente sobre os mesmos.
Assim, relativamente aos factos não provados a., c. e v., a decisão resulta da insuficiência de prova sobre a sua verificação, sendo que a circunstância de vários indivíduos venderem estupefaciente no aludido café, e o lapso temporal entre a apreensão de Janeiro e os factos ocorridos a partir de ... de 2023, não permitem ter por certo que os arguidos desde então desenvolvessem tal actividade e o estupefaciente apreendidos a ...-...-2023 lhes pertencesse. Não foi feita qualquer prova de que BB e CC transaccionassem qualquer outra substância para além de canábis sendo que, apesar de ter sido apreendido ao primeiro MDMA (facto provado 74.º), a quantidade apreendida faz presumir poder destinar-se ao seu consumo pessoal, nos termos do artigo 40.º, n.º 3, a contrario, do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22 de Janeiro.
Quanto ao facto não provado b., a prova produzida não permite concluir com segurança que DD tivesse uma posição mais relevante do que os demais arguidos. O facto de trabalhar no café e ter-lhe sido apreendido, em ...-...-2025, estupefaciente pode ter contribuído para que fizesse menos vendas directas, não podendo extrair-se apenas da circunstância de ter entregue sacos contendo estupefacientes que vieram a ser objecto de venda direita por duas vezes (factos provados 5.º 39.º), e ser visto a contar dinheiro numa ocasião (facto provado 21.º) (o que também sucedeu com BB (facto provado 60.º), que os demais agiam sobre as suas ordens e instruções.
Não foi produzida prova quantos aos factos não provados e. a g., resultando do relatório de vigilância n.º 5, que terá sido outrem a agir do modo descrito.
Do mesmo modo, não foi produzida prova quanto aos factos não provados i., j., k, l., pois desconhece-se como foram identificados tais indivíduos, sendo que quanto ao h., não foi provado de forma suficiente o conteúdo de tal saco, pois não foi directamente visualizado.
Relativamente ao facto não provado m., a decisão resulta do teor do relatório de vigilância n.º 27, do qual resulta dinâmica algo diversa e que foi dada por provada.
Quanto às quantidades e natureza do estupefaciente a que respeita os factos não provados d., n., o., p., q. r., s., t., u., a decisão resulta de se ter provado realidade diversa, com base nos relatórios periciais já referidos a propósito dos factos provados, nos quais foram apuradas com maior rigor no que nos autos de exame directo realizados aquando das respectivas apreensões, nos quais se baseoua acusação.
***
IV. Do Mérito do Recurso
IVa) Impugnação da matéria de facto
De acordo com o disposto no artigo 410.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, “sempre que a lei não restringir a cognição do tribunal ou os respetivos poderes, o recurso pode ter como fundamento quaisquer questões de que pudesse conhecer a decisão recorrida” e, nos termos do artigo 428.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, “as relações conhecem de facto e de direito”.
No que se refere à matéria de facto, há duas formas de a impugnar:
• Através da invocação de vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2 do Código de Processo Penal - impugnação em sentido estrito, a chamada revista alargada -, sendo que o vício pode resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, tendo por fundamento:
– Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
– Contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, ou
– Erro notório na apreciação da prova.
• ou mediante a impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.ºs 3, 4 e 6 do Código de Processo Penal - impugnação em sentido lato.
Quanto à primeira situação - impugnação em sentido estrito - insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e o erro notório na apreciação da prova -, sendo de conhecimento oficioso, deve resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência, sem recurso a quaisquer provas documentadas, limitando-se a atuação do tribunal de recurso à sua verificação na sentença/acórdão e, não podendo saná-los, à determinação do reenvio, total ou parcial, do processo para novo julgamento (artigo 426.º, n.º 1 do Código de Processo Penal).
Quanto à segunda situação - impugnação em sentido lato -, impõe-se, conforme resulta do disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 412.º do Código de Processo Penal, que:
• o recorrente enumere/especifique os pontos de facto que considera incorretamente julgados (artigo 412.º, n.º 3, alínea) do Código de Processo Penal);
• indique as provas que, no seu entendimento, impõem decisão diversa da recorrida, e que especifique, com referência aos suportes técnicos, a prova gravada (alínea b) do número).
• As provas que devem ser renovadas, sendo caso disso (alínea c) do mesmo número).
Nos termos do n.º 4 do mesmo preceito legal, “quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação”.
Estamos perante dois institutos diferentes com natureza e consequências distintas. Os vícios previstos no referido artigo 410.º, n.º 2 devem resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência e aí se ficam. A impugnação ampla da decisão da matéria de facto analisa a fundo a apreciação da prova.
A existência de um dos vícios do referido artigo 410.° demonstra que há algo de errado na decisão, mas a circunstância de se não verificar nenhum daqueles vícios, não garante que a matéria de facto haja sido bem julgada. O mesmo é dizer que podem não existir os vícios previstos no n.° 2 do artigo 410.° do Código de Processo Penal e, no entanto, a prova ter sido mal apreciada.
Invoca o recorrente AA a existência de erro na apreciação da prova, pois, no seu entender, não se podia ter dado como provado que vendia MDMA - factos 1.º e 79.º.
Como se escreve no Ac. RC de 04.02.20152Há erro notório na apreciação da prova quando se dão factos como provados que, face às regras da experiência comum e a lógica normal da vida, não se poderiam ter verificado ou são contraditados por documentos que fazem prova plena e que não tenham sido arguidos de falsidade: trata-se de um vício de raciocínio na apreciação das provas, evidenciada pela simples leitura do texto da decisão, erro tão evidente que salta aos olhos do leitor médio, pois as provas revelam um sentido e a decisão recorrida extrai ilação contrária, incluindo quanto à matéria de facto provada – realce nosso.
Ora, no caso em análise, lido atentamente o acórdão em apreciação, não vislumbramos que exista erro na apreciação da prova. Foram dados os factos como provados, que não estão em contradição com os não provados, e em perfeita harmonia com a fundamentação que se fez dos factos, não se conseguindo obter qualquer decisão diversa se conjugarmos tudo o que foi dito com as regras da experiência comum.
O que na verdade se verifica é que o arguido deseja que a sua versão dos factos seja dada como provada. O arguido insurge-se com o facto de se ter dado como assente que procedia à venda de MDMA. Segundo o recorrente, “não basta que conste na acusação genericamente que o arguido se dedicava à venda de MDMA (ponto 1 da acusação). Para que um arguido seja condenado pela prática de um determinado crime, impõe-se precisar as circunstâncias de tempo, modo e lugar, em que terá ocorrido a prática desse crime”.
Nos pontos identificados pelo recorrente – 1.º e 79.º - ficou efetivamente assente que o arguido vendia MDMA e para fundamentar estar afirmação, ficou consignado no acórdão “Já no que respeita à venda de MDMA por AA e DD (factos provados 1.º e 79.º), a sua prova extrai-se da circunstância de deterem tal substância nas quantidades em que a detinham, sendo que DD detinha quantidade suficiente para 10 doses (facto provado 12.º), não resultando da prova produzida que consumisse tal substância, e AA quantidade suficiente para 8617 doses (facto provado 73.º), muito superior à necessária ao seu consumo individual”.
Ora, perante a apreensão efetuada, não podemos deixar de concordar com a decisão recorrida. Tendo o arguido AA na sua posse 8617 doses de MDMA e admitindo ele que vendia produto estupefaciente, as regras da experiência dizem-nos que o MDMA que detinha também era para vender, não se encontrando qualquer outra explicação plausível para deter quantidade tão elevada de produto estupefaciente.
Acresce que também não fazem muito sentido as explicações trazidas pelo arguido, que afirma que apenas guardava o produto a pedido de terceiro – que não identifica - e que recebia em troca de uma placa de haxixe. Não se consegue encontrar uma explicação adequada e credível para o recorrente fazer esse favor a um terceiro, não faz sentido alguém guardar 8617 doses de MDMA de um terceiro, quando assumidamente afirma que vendia produto estupefaciente, recebendo em troca apenas uma placa de haxixe. O risco era demasiado elevado para se aceitar receber em troca apenas uma placa de haxixe. Esta explicação do arguido também viola as regras da experiência comum, não merecendo, por isso, acolhimento por parte do tribunal.
Pelo que fica dito, conclui-se que é irrelevante que não haja prova testemunhal de consumidores a confirmar que compravam MDMA ao arguido.
Em todo caso, sabemos que deter aquela quantidade de produto estupefaciente, como confessadamente o arguido detinha, integra a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, pelo que sempre a sua conduta teria de ser punida.
Em suma, lendo a decisão recorrida não detetámos qualquer erro de julgamento da matéria de facto, o tribunal apreciou criticamente as provas e de acordo com as regras da experiência, pelo que improcede o recurso neste segmento.
*
IVb) Da qualificação jurídica dos factos
O recorrente AA também defende que devia ter sido condenado pela prática de um crime de tráfico de menor gravidade, pp. no artigo 25.º do D.L. 15/93, de 22 de janeiro, porquanto “In casu, excepcionando a quantidade, todos os demais factores que constroem a imagem global do ilícito praticado pelo Recorrente aponta para uma situação de tráfico, aqui no sentido de actos de venda, de tráfico de rua praticado de uma forma imediata e simplista, sem organização ou rede, exposta de forma directa, assumindo os riscos, ocorreram em local frequentado por consumidores, que declararam ser consumidores habituais há anos, sem indução de novos consumos, durante um período de tempo restricto (duas vendas entre as quintas feiras e o sábado, nos meses de ... e ... de 2023), destinava o produto da venda à sua estrita sobrevivência em face da situação económica precária em que se encontrava, não visando lucro para despesas supérfluas ou sumptuárias, sendo diminuto este lucro (a título de exemplo, no facto provado 65.º, consta a venda de um pedaço com 2,235 grs pelo valor de € 10, suficiente para 9 doses).
Nos termos do artigo 21.º, n.º 1 do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro, “quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 40.°, plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos.”
Protegendo o bem jurídico “saúde pública”, a criminalização do tráfico teve como escopo “evitar a degradação e a destruição de seres humanos, provocadas pelo consumo de estupefacientes” que põe em causa não apenas “a vida, a integridade física e a liberdade dos potenciais consumidores”, mas também “a afetação da vida em sociedade, na medida em que o tráfico dificulta a inserção social dos consumidores e possui comprovados efeitos criminógenos”3.
Como condutas típicas do crime de tráfico, enuncia o legislador no sobredito artigo 21.º o cultivo, produção, fabrico, extração, preparação, oferta, colocação à venda, venda, distribuição, compra, cedência, recebimento, transporte, importação, exportação ou detenção de substâncias estupefacientes, sem a necessária autorização. Exigindo, por seu turno, o tipo subjetivo de ilícito o dolo do agente, isto é, conhecimento por parte do agente da natureza do produto e da proibição de todas as atividades com ele relacionadas.
Note-se que, tratando-se de um crime de perigo comum e abstrato (porque apenas pressupõe a perigosidade da ação para os bens jurídicos protegidos), o crime de tráfico “consuma-se logo que o arguido detenha produto estupefaciente, pelo que só a demonstração de ser outro o objetivo é que poderá excluir o crime de tráfico4.
Conforme é sabido, o tipo matricial ou tipo-base do crime de tráfico é o do artigo 21.º, n.º 1 do D.L. n.º 15/93, de 22.01, tipo esse que corresponde aos casos de tráfico normal e que, pela amplitude da respetiva moldura – 4 a 12 anos de prisão –, compreende os casos mais variados de tráfico de estupefacientes, considerados dentro de uma gravidade mínima, mas já suficientemente acentuada para caber no âmbito do padrão de ilicitude requerido pelo tipo, cujo limite inferior da pena aplicável é indiciador dessa gravidade, e de uma gravidade máxima, correspondente a um grau de ilicitude muito elevado – tão elevado que justifique a pena de 12 anos de prisão.
O artigo 24.º do mesmo D.L. está previsto para situações ainda mais graves, mas a enunciação das circunstâncias que agravam, nos termos do artigo 24.°, as penas previstas no artigo 21.° do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro, para o crime de tráfico de estupefacientes, revela uma heterogeneidade de motivos que não permite a construção de uma teoria geral sobre o fundamento da agravação.
Criou, no entanto, o legislador sob a epigrafe “tráfico de menor gravidade” – artigo 25.º - uma forma privilegiada do crime do artigo 21.º, tendo como pressuposto específico a existência de uma considerável diminuição da ilicitude.
E, por fim, o artigo 26.º pune de forma ainda mais branda quem praticar os factos descritos no artigo 21.º com a finalidade exclusiva de obter produto estupefaciente para uso pessoal.
Como se escreve no Ac. do STJ de 24.05.20025Importa analisar a forma como a jurisprudência tem interpretado os crimes mais frequentes, ou seja, os dos arts. 21.º, 25.º e 26.º. Embora timidamente enunciado, teve o legislador o propósito de não «meter no mesmo saco» todos os traficantes, distinguindo entre os casos «graves» (art. 21.°), os muito graves (art. 24.°), os pouco graves (art. 25.º) e os de gravidade reduzida (art. 26.°), redução essa motivada no fundo pela condição de toxicodependente do agente. Pois bem: a jurisprudência esvaziou quase completamente os arts. 25.º e 26.°, remetendo para o art. 21.° a generalidade das situações. Para tanto, faz uma interpretação «contra legem» do art. 25.º. Com efeito, estabelece este artigo que se aplica às situações em que «a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade» das drogas. A interpretação que parece mais consentânea com o texto (e com a epígrafe do artigo) é a de que o legislador quis incluir aqui todos os casos de menor gravidade, indicando exemplificativamente circunstâncias que poderão constituir essa situação. Assim, será correcto considerar-se preenchido este crime sempre que se constate a verificação de uma ou mais circunstâncias que diminuam consideravelmente a ilicitude, como poderá ser, por exemplo, uma quantidade reduzida de droga, ou esta ser uma «droga leve», ou quando a difusão é restrita, etc. O crime do art. 25.º é para o pequeno tráfico, para o pequeno «retalhista» de rua» (Eduardo Maia Costa, Direito penal da droga, RMP 74-103, ps. 114 e ss.)”.
Estabelecidos que estão os parâmetros relativos ao bem jurídico protegido e aos elementos típicos, objetivos e subjetivos a considerar, é altura de abordar o caso concreto dos autos.
Ficou consignado no acórdão recorrido:
“Quanto ao arguido AA, da factualidade provada resulta que, entre ... e ... de 2023, entre as quintas-feiras e sábados, o mesmo realizava pelo menos duas vendas de canábis (resina) diárias, recebendo por cada uma a quantia de € 10,00 (facto provado 76.º), entre as quais as nove descritas nos factos provados (factos provados 42.º, 44.º, 48.º, 49.º, 54.º, 61.º, 62.º, 64.º e 65.º).
No dia ...-...-2023, detinha este arguido as seguintes quantidades de canábis (resina): 4,696 gramas, com 33,4% de pureza, suficiente para 31 doses; 3,536 gramas, com 19,8 de pureza, suficiente para 14 doses (facto provado 70.º), e, na sua residência, 249,012 e 77,899 gramas com, respectivamente, 32,9% e 33,6% de pureza, suficiente para 1638 e 523 doses; 989,000 gramas com 33,8% de pureza, suficientes para 6685 doses; 34,704 e 16,405 gramas com, respectivamente, 20,5 % e 27,9 % de pureza, suficientes para 142 e 91 doses 15.945 gramas, 20,6% de pureza, suficiente para 65 doses; 880.000 e 496.000 gramas, com, respectivamente, 20.1% e 33,5 % de pureza, suficiente para 3537 e 3323 doses; 1.957.900 gramas, com 34,2% de pureza, suficiente para 13.392 doses; 0.708 gramas, com 34,0% de pureza, suficiente para 4 doses.
E as seguintes de MDMA: 14,359 gramas, com 60,7% de pureza, suficientes para 87 doses, 10,034 gramas, com 61.1% de pureza, suficiente para 61 doses, de 843,000 gramas, com 61.1 % de pureza, suficiente para 5150 doses, 449,000 e 89,930 gramas, com, respectivamente, 61.1 % e 61.6 % de pureza, suficiente para 2765 e 549 doses; 2,346 gramas, com 22,7% de pureza, suficiente para 5 doses.
Em suma, detinha 4.724,905 gramas de canábis (resina), suficiente para 29.445 doses, e 1.408,669 gramas de MDMA, suficiente para 8.623 doses (factos provados 70.º e 73.º).” – realce nosso.
O acórdão recorrido fez uma análise correta dos factos que ficaram provados. As elevadas quantidades de produto estupefaciente apreendido que o arguido destinava à venda evidenciam um tráfico já com alguma dimensão, o que afasta em absoluto que se possa considerar que se trata de um tráfico de menor gravidade, pois nada nos permite dizer que a estamos perante uma ilicitude do facto consideravelmente diminuída.
Em suma, também não merece acolhimento o recurso relativamente à qualificação jurídica dos factos.
*
IVc) Das penas aplicadas
Não sendo alterada a matéria de facto e nenhum reparo merecer a qualificação jurídica dos factos, passemos agora à questão suscitada nos dois recursos em apreciação e que se prende com a pena concreta imposta, que, segundo os recorrentes, é excessiva.
O arguido AA incorre numa pena de 4 a 12 anos – artigo 21.º do DL 15/93, de 22 de janeiro – e o arguido BB numa pena de 1 a 5 anos – artigo 25.º, alínea a) do mesmo diploma.
Analisemos.
Preceitua o n.º 1 do artigo 71.º do Código Penal que “a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.”
Culpa e prevenção constituem o binómio com auxílio do qual há de ser construído o ... da medida da pena.
De acordo com a lição de Figueiredo Dias, “através do requisito de que sejam levadas em conta as exigências de prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária de punição do facto concretamente praticado pelo agente e, consequentemente, à realização in casu das finalidades da pena; com a consideração da culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime - ligada ao mandamento incondicional de respeito pela eminente dignidade da pessoa do agente - limite de forma inultrapassável as exigências de prevenção.”6
A culpa constitui, pois, o pressuposto-fundamento da validade da pena e tem, ainda, por função estabelecer o limite máximo da pena concreta. Forçoso é, assim, concluir que não há pena sem culpa, não podendo a medida da pena ultrapassar a da culpa, tal como dispõe o n.º 2 do artigo 40.º do Código Penal.
Estabelece, ainda, o artigo 71.º, n.º 2 do Código Penal que, na determinação da medida concreta da pena, o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, nomeadamente, as que aí resultam especificadas nas alíneas a) a f).
Diremos, ainda, como se referiu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.05.20217, no que se reporta à decisão sobre a pena, mormente a sua medida, “que os recursos não são re-julgamentos da causa, mas tão só remédios jurídicos. Assim, também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico.
Daqui resulta que o tribunal de recurso intervém na pena, alterando-a, quando deteta incorreções ou distorções no processo aplicativo desenvolvido em primeira instância, na interpretação e aplicação das normas legais e constitucionais que regem a pena. Não decide como se o fizesse ex novo, como se inexistisse uma decisão de primeira instância. O recurso não visa, não pretende e não pode eliminar alguma margem de atuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do ato de julgar.”
Neste contexto, é de considerar que só em caso de desproporcionalidade manifesta na sua fixação ou necessidade de correcção dos critérios de determinação da pena concreta, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso, deverá intervir o Tribunal de recurso alterando a pena concreta fixada pela 1.ª instância.
Consignou-se na decisão recorrida:
“Transpondo tais noções para o caso em apreço, considerar-se-á, desde logo, que nos crimes de tráfico de estupefacientes as finalidades de prevenção geral impõem-se com particular acuidade, pela forte ressonância negativa, na consciência social, das actividades que os consubstanciam.
A comunidade conhece as gravíssimas consequências do consumo de estupefacientes, particularmente das comummente chamadas “drogas duras”, desde logo ao nível da saúde dos consumidores, mas também no plano da desinserção familiar e social que lhe anda, frequentemente, associada e sente os riscos que comporta para valores estruturantes da vida em sociedade.
No atinente à ilicitude, a mesma, no que respeita a AA, a mesma é mediana, dentro do respectivo tipo legal, pois, pese embora o curto período em que procedeu a vendas de canábis (cerca de dois meses), bem como reduzido número das mesmas (duas vendas diárias/três dias semanais), detinha 4.724,905 gramas de canábis (resina), suficiente para 29.445 doses, e 1.408,669 gramas de MDMA, suficiente para 8.623 doses, ou seja, detinha dois tipos de estupefaciente em quantias que permitiam a sua disseminação em termos significativos.
Dentro do tipo de tráfico privilegiado, há a considerar, quanto aos arguidos DD, BB, e CC, o período em que se desenvolveu a actividade, cerca de cinco meses (... a ... de 2023); A ilicitude da conduta de BB é elevada comparativamente à dos arguidos DD e CC, quedando-se a deste pela mediania atento o número de vendas que efectuaram e quantidade de estupefaciente que detinham.
Com efeito, pese embora tenha realizado apenas vendas directas a consumidores, sem qualquer grau de sofisticação, fê-lo por, pelo menos, trinta e uma vezes, além do que detinha 248,399 gramas de canábis, suficiente para 1650 doses, quantidade já revelante.
Há também que ponderar a natureza dos estupefacientes transaccionados e reconduzível a canábis no caso de BB e CC, a esta substância e MDMA, no caso de AA, e a todas estas e cocaína, no caso de DD, em graus de pureza variáveis.
O dolo com que todos os arguidos agiram é o comum ao tipo de crime, sendo que a circunstância de serem todos também consumidores de canábis, e bem assim vivenciarem, à data, constrangimentos económicos, poderá, de algum modo, ter influído na sua determinação para o exercício daquela actividade.
O arguido AA denota um percurso de inserção pessoal e sócio profissional, tendo iniciado actividade laboral aos 19 anos de idade. À data dos factos integrava o agregado familiar da mãe, um irmão e duas irmãs, cuja dinâmica familiar era funcional. O arguido, originário da ..., imigrou para Portugal, quando tinha 17 anos de idade, reunindo-se à sua mãe. Fez a maior parte dos seus estudos na ..., mas, já em Portugal, completou o 12.º ano de escolaridade, aos 19 anos de idade.
À data dos factos estava inactivo profissionalmente há cerca de quatro meses, tendo regressado de ... com o objectivo de tirar a carta de condução e de tirar um curso de “...”. Centrava as suas rotinas diárias em torno de actividades para tirar a carta de condução, frequência de aulas e estudo do código, convívio com amigos nas proximidades do café ...”, e prática de kickboxe. Era consumidor de canábis, por vezes em quantidades elevadas, mas também conseguia ficar abstinente nos dias em que tinha aulas de condução. Tinha experimentado MDMA e ingeria bebidas alcoólicas socialmente. Em contexto prisional, tem mantido um comportamento adequado, não tendo ocupação por razões inerentes ao estabelecimento prisional onde se entra. Não tem infracções registadas e recebe visitas da mãe e das irmãs que se demonstram disponíveis para o apoiar.
Admitiu objectivamente os factos provados a seu respeito, denotando arrependimento.
Do seu certificado de registo criminal não constam quaisquer antecedentes criminais.
(…) O arguido BB o veio para Portugal em 2019, para viver e estudar, situação que se alterou com a pandemia passando o arguido a viver com familiares em ... e depois no .... Em ambas as situações sentiu dificuldades de adaptação, ressentindo-se do facto de não existir relação anterior com os mesmos e encontrar uma organização familiar diferente do que estava habituado. Em razão de tal, em 2023, já no ... arrendou um quarto numa casa que partilhava com outros jovens.
Os seus pais separaram-se quando este estava no inicio da adolescência, ficando o arguido a viver com o progenitor, na ..., enquanto a mãe constituiu nova família e passou a viver no ... e actualmente na ....
Após os factos, e com vista a afastar-se da área de Lisboa dado o seu envolvimento nestes autos, desde ... de 2024, BB encontra-se a viver no ... com familiares maternos, tendo a sua integração ocorrido de modo positivo, uma vez que cumpre as regras familiares e existe disponibilidade do casal para continuarem a apoiá-lo, expressando agrado pelo apoio que lhe é prestado e pela boa relação que estabelece com os primos, num ambiente familiar tranquilo e organizado.
O arguido mantém uma relação de namoro, sendo a namorada considerada pelos familiares uma boa influência para este, por ser calma e ponderada. Tem uma descendente com dois anos de idade, fruto de um relacionamento anterior, actualmente a viver com os avós maternos, com a qual procura manter-se ligado, participando na sua manutenção.
Tem o 12.º ano de escolaridade, Curso de Formação Profissional de Condutor e Manobrador de Empilhadores e frequentou o 1.º ano do Curso Técnico Superior de Especialização Profissional em Construção Civil, interrompido em razão da pandemia e por constrangimentos económicos, ainda que mantenha uma atitude de investimento na obtenção de certificação para trabalhar
No momento, exerce a actividade profissional de operador ajudante, auferindo € 1.000, despendendo € 260 em arrendamento, € 75 em pensão de alimentos paga à filha, e € 100 em alimentação (entregue aos tios); atribui valor ao trabalho e mantém uma atitude empenhada e activa de procura do mesmo. Desde 2020 até à actualidade esteve ligado a empresas de trabalho temporário, sendo que o facto de ter estado mais de um ano com o título de residência em Portugal caducado, dificultou a obtenção de trabalho com vínculo duradouro.
À data dos factos, o consumo de substâncias ilícitas estava agravado, facilitado pelas pessoas que ia conhecendo e acompanhava, tendo sido identificado como consumidor e sujeito intervenções em ambulatório.
Do seu certificado de registo criminal não constam quaisquer antecedentes criminais”.
Posto isto, acolhendo a argumentação da 1.º Instância, que se mostra bem fundamentada, concluímos que as penas impostas não merecem qualquer reparo.
Não podemos deixar de dizer que a pretensão do recorrente BB nunca podia ser acolhida, pois o crime pelo qual foi condenado não é punido com multa.
Improcede, assim, o recurso em análise.
**
V. Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente os recursos interpostos, mantendo a decisão recorrida nos seus precisos termos.
**
Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC´s para cada um deles.
Notifique.
Lisboa, 07 de Outubro de 2025
Ana Lúcia Gordinho
Alda Tomé Casimiro
Ana Cristina Cardoso
_____________________________________________________
1. De acordo com o estatuído no artigo 412.º do Código de Processo Penal e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de outubro de 1995. Cf. também Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, vol. III, 2ª ed., pág. 335, e Simas Santos e Leal Henriques, in Recursos em Processo Penal, 7ª ed., pág. 89.
2. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/288bc792249cba1780257de9003d4436?OpenDocument
3. Cf. Maria Fernanda Palma, in “Consumo e Tráfico de Estupefacientes e Constituição: absorção do “direito penal da justiça” pelo “direito penal secundário”?”, Revista do Ministério Público, n.º 96, pág. 34.
4. cf., acórdão da Relação de Lisboa de 13.04.2000 (in, CJ, tomo II, pág. 157).
5. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/B64B56A2428BCE9C80256BF10048AE47
6. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português - Parte Geral – As consequências jurídicas do crime, II, Coimbra, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, §281.
7. No processo nº 10/18.1PELRA.S1, Relatora: Conselheira Ana Barata Brito, acessível em www.dgsi.pt.