Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | FOLQUE DE MAGALHÃES | ||
Descritores: | ACEITAÇÃO DA HERANÇA CADUCIDADE REQUISITOS SUSPENSÃO INTERRUPÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 06/24/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | ALTERADA A DECISÃO | ||
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Sumário: | I - O prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine (art. 328º do C.Cv) II - O direito de aceitar a herança não está sujeito a qualquer regime especial que o sujeite à suspensão ou interrupção, sendo aplicável o regime regra estabelecido nos art. 328º e seguintes. III - Em princípio, basta o mero decurso do prazo de dez anos sobre a data do conhecimento do direito de aceitar a herança, para que a caducidade desse direito se desse, excepto se tiver havido reconhecimento do direito (nº 2 do art. 331º do CC). | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: 1. RELATÓRIO: 1.1. Das partes: 1.1.1. Autora: 1º - M. 2º - MA 1.1.2. Ré: 1º - C. 2º - M e marido, R. 3º - J e mulher, I. * 1.2. Acção e processo:Acção declarativa com processo ordinário. * 1.3. Objecto da apelação:1. A sentença de fls. 307 a 322, pela qual a acção foi julgada improcedente e a reconvenção procedente. * 1.4. Enunciado sucinto das questões a decidir:1. Da caducidade do direito de aceitar a herança. 2. Da condenação das AA. como litigantes de má fé. * 2. SANEAMENTO:Foram colhidos os vistos. Não se vislumbram obstáculos ao conhecimento do mérito do recurso, pelo que cumpre apreciar e decidir. * 3. FUNDAMENTOS:3.1. De facto: Factos que este Tribunal considera provados: Os constantes de fls. 310 a 314, para os quais se remete, nos termos do art. 713º nº 6 do C.P.C., em virtude de não terem sido impugnados nem ser de alterar oficiosamente. * 3.2. De direito:1. Da caducidade do direito de aceitar a herança. 2. Dizem as Recorrentes que a caducidade do direito de aceitação da herança é uma excepção cujo ónus de prova incumbia inteiramente aos RR, e estes não provaram mais do que o decurso do prazo legal de dez anos. Mais alegam que não foi dada oportunidade às AA. de provarem os factos que contra aquela caducidade tinham alegado. 3. Importa ver se é assim. 4. Dispõe o nº 1 do art. 2059º do C.Cv. que o direito de aceitar a herança caduca ao fim de dez anos, contados desde que o sucessível tem conhecimento de haver sido a ela chamado. Por sua vez, dispõe o nº 2 do art. 342º do C.Cv. que a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita. 5. Aplicando, concatenadamente, estas duas disposições ao caso dos autos, verifica-se o seguinte: as AA. pedem, na petição inicial, a declaração de que são herdeiras de J e M e que os RR. sejam condenados a reconhecer essa qualidade, e, para tanto alegam uma série de factos; a esse direito, opõem os RR. o facto da caducidade do mesmo; finalmente, as AA. alegam factos tendencialmente dirigidos ao afastamento da verificação da caducidade. 6. Ora, a aplicação ao caso dos autos da disposição legal citada relativa ao ónus da prova implica que ao direito invocado, em primeiro lugar, pelas AA. lhes caiba o ónus da prova dos respectivos factos; de seguida, quanto à caducidade, caberá aos RR. o respectivo ónus; e finalmente, quanto aos factos que impedem a verificação da caducidade, o ónus cabe às AA. 7. Que factos são necessários à invocação fundada de que o direito de aceitação da herança por parte das AA. caducou? São dois, conforme resulta do disposto no art. 2059º nº 1 do C.Cv. já citado: o conhecimento pelo sucessível de haver sido chamado à herança, e o facto de esse conhecimento se ter dado há mais de dez anos, ou seja, de terem decorrido mais de dez anos entre a data do facto do conhecimento e a data em que é invocada a caducidade do direito. 8. O facto da morte dos de cujus foi alegado pelas próprias AA., nos art. 3º e 4º da sua petição inicial, tendo ocorrido a do José Peixoto a 4-10-1975 e a da M a 25-7-1984. 9. Nada dos autos faz presumir que o conhecimento dessas mortes por parte das AA. não se deu por ocasião das mesmas. 10. Assim sendo, e tendo em consideração a data da entrada em juízo desta acção – 20-11-1998 – estão reunidos os elementos de facto que suportam a alegação de que o direito que as AA. pretendem ver reconhecido caducou. 11. Os RR. não careciam de alegar outros factos para que o Tribunal pudesse e devesse declarar a caducidade do dito direito. 12. As AA., porém, perante a alegação da caducidade, invocaram factos cuja prova tenderia a afastar o efeito jurídico da declaração de caducidade. Segundo elas, esses factos são os constantes dos art. 13º a 17º da réplica, os quais não foram levados à base instrutória. 13. Basicamente, nesses artigos, as AA. alegam que reclamaram da mãe e dos irmãos a partilha da herança do pai, tendo-o feito também nos dez anos que se seguiram à morte de Maria Bárbara Ferreira, em diferentes ocasiões. 14. Compulsada a base instrutória, verifica-se que tais factos não foram a ela levados. Mas, compulsado o processo, também se verifica que as AA. não reclamaram da sua não inclusão na base instrutória, nem quando foram notificadas daquela peça processual nem no início do julgamento, ao contrário do que os RR. fizeram relativamente aos factos que lhes diziam respeito. 15. Ficou, por isso, precludido o direito a ver quesitados tais factos, como decorre do disposto no art. 511º nº 3 do C.P.C. 16. Porém, sempre se diz que, ainda que pudessem ser levados à base instrutória, tais factos não são relevantes para o efeito pretendido (e talvez por isso mesmo não tenham sido seleccionados). 17. É que, como se diz no art. 328º do C.Cv., o prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine. 18. Compulsando o art. 2059º do C.Cv., onde se estabelece a sujeição do direito de aceitar a herança ao regime da caducidade, dele não consta a alusão a qualquer regime especial que o sujeite à suspensão ou interrupção. 19. Por isso, há que recorrer ao regime regra estabelecido nos art. 328º e seguintes para a caducidade. 20. Ora, no art. 331º indicam-se as causas impeditivas da caducidade, referindo o nº 1 que só impede a caducidade a prática de acto que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo. 21. No caso dos autos, o prazo foi estabelecido por lei, pelo que não há lugar a fixação convencional do mesmo. E da lei não consta a indicação de qualquer acto a que seja atribuído o efeito impeditivo. 22. Por isso, em princípio, bastaria o mero decurso do prazo de dez anos sobre a data do conhecimento do direito de aceitar a herança, para que a caducidade desse direito se desse. 23. Porém, dispõe ainda o nº 2 do art. 331º referido que impede a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido, quando se trate de prazo fixado por disposição legal relativa a direito disponível. 24. O direito em causa é manifestamente um direito disponível, razão pela qual está sujeito à disciplina do nº 2 citado. Assim sendo, para que as AA. tivessem impedido a verificação do efeito da caducidade do direito de que se arrogam era necessário que tivessem alegado e provado que os RR. haviam reconhecido o referido direito a si. 25. Ora, as AA. não alegam tal, ou seja, não dizem que os RR. em algum momento durante os dez anos subsequentes à morte dos pais as reconheceram como titulares do direito de aceitarem a herança deixada por aqueles. Apenas alegam que reclamaram dos irmãos a partilha, sem que, por isso, necessariamente, estes lhes tenham reconhecido a qualidade de herdeiros aceitantes da herança então aberta a seu favor. 26. Por isso, a afirmação supra da irrelevância da quesitação do alegado nos art. 13º a 17º da réplica. 27. Ou seja, em resumo, não é juridicamente possível afastar o mero decurso do tempo como factor único que releva para a verificação do fenómeno jurídico da caducidade do direito das AA. 28. Não assiste, assim, razão às Recorrentes quanto a esta questão. 29. Da condenação das AA. como litigantes de má fé. 30. Segundo as Recorrentes não ocorre qualquer fundamento para a condenação das AA. como litigantes de má fé. 31. Neste particular sufraga-se a posição assumida na sentença recorrida, para a qual se remete, apenas com a correcção do montante relativo à indemnização arbitrada, por se entender algo excessivo. 32. Na contestação, os RR. invocam que as AA. obrigaram estes a uma actividade processual, a despesas com advogado, despesas judiciais, deslocações suas e de testemunhas, tempo perdido e incómodos que se estimam na quantia de 200.000$00 para cada um. 33. Até à prolação da sentença, não foram alegadas e provadas concretas despesas nem honorários a pagar pelos RR. Após, os RR. apresentaram nota de custas de parte num total de € 225,77, ou seja, € 45,154 por cada um dos RR. 34. Das rubricas objecto de indemnização ficou-se a saber o montante das despesas, mas não o dos honorários que não foi apresentado, nem o relativo a eventuais concretos prejuízos sofridos pelos RR., além das deslocações com as testemunhas, do tempo perdido e dos incómodos. 35. Ao contrário do que se diz na sentença, pelo menos, relativamente à satisfação dos prejuízos que não sejam despesas ou honorários é relevante a situação económica dos lesantes e lesados, pois tal decorre dos princípios gerais da responsabilidade civil, e, no caso dos autos, não se sabe muito bem qual é a condição económica das partes, para além do que resulta de serem todos herdeiros de imóveis. 36. Por outro lado, há que ter em conta que a indemnização em causa não serve para as partes obterem um ganho à conta da actuação de má fé da contraparte. 37. Assim sendo, julga-se que satisfaz os requisitos legais a atribuição de € 500 por cada uma das pessoas dos RR., no total de € 2.500. 38. Julga-se, assim, parcialmente procedente a posição das Recorrentes neste particular. * 4 DECISÃO:39. 1. Por tudo o exposto, concede-se parcial provimento à apelação, e, em consequência, altera-se a decisão recorrida, apenas quanto ao montante arbitrado aos RR. a título de indemnização pela litigância de má fé, o qual se reduz para a quantia de € 500 por cada uma das pessoas dos RR., no total de € 2.500. 2. Custas pela parte Recorrente e Recorrida, na medida do respectivo decaimento (art. 446º nº 2 CPC). * Lisboa, 24.6.2008(Eduardo Folque de Sousa Magalhães) (Maria Alexandrina de Almeida Branquinho Ferreira) (Eurico José Marques dos Reis) |