Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | EDGAR TABORDA LOPES | ||
Descritores: | REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL GUARDA DE MENOR GUARDA PARTILHADA FACTORES A ATENDER ACORDO DE AMBOS OS PROGENITORES | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 11/07/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I – Constituição, Convenção dos Direitos da Criança, Código Civil e Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo criam um sistema que permite adaptar as necessidades de protecção do superior interesse da criança aos concretos perigos que sobre esta incidam. II – Os princípios da proporcionalidade e actualidade, da responsabilidade parental, da prevalência da família e da continuidade das relações psicológicas profundas, estão também presentes nas decisões a tomar quanto à guarda das crianças, no âmbito dos processos de regulação das responsabilidades parentais (de forma a que qualquer intervenção respeite o direito da criança à preservação das relações afectivas estruturantes de grande significado e de referência para o seu saudável e harmónico desenvolvimento, devendo prevalecer medidas que garantam a continuidade de uma vinculação securizante). III - O acordo dos pais não sendo condição necessária para a fixação de um regime de responsabilidades parentais, mas apenas um dos factores que têm de ser considerados, o qual, existindo, se torna muito mais facilitador de todo o processo, pois confere segurança aos filhos (ao passo que o desacordo, lhes gera insegurança e instabilidade), de modo que aos progenitores cabe o desafio de - responsavelmente - ultrapassarem as divergências que se revelem contrárias ao interesse dos filhos. IV - A presença física constante e em pé de igualdade dos dois progenitores na vida da criança gera vivências únicas e irrepetíveis ao(s)/à(s) filhos/as, sendo este contributo que os/as faz crescer, estruturar e ganhar identidade própria. Isso será, em cada caso, a concretização do “superior interesse do menor”. V - Cada progenitor tem de saber ter a lucidez de perceber que, ao dar por findo o seu projecto pessoal de comunhão com o/a outro/a, tem de lograr fazer – desde logo por Amor ao/à filho/a – um esforço (às vezes quase inumano) de abstracção pelo novo rumo que seguiu a vida desse/a outro/a (o seu novo projecto, a sua nova relação), combatendo o despeito, a raiva, ou mesmo o ódio que, por compreensíveis que sejam, havendo um/a filho/a comum, têm de ser subvalorizados ou colocados em plano secundário. VI - Quem tem de ganhar neste tipo de processos é quem perde de certeza se os pais não ajudarem: o/a(s) filho/a(s). VII – A guarda partilhada ou alternada é o regime – em abstracto – mais susceptível de trazer benefícios à criança ou jovem, mas não a qualquer custo, devendo – sempre sem perder de vista o farol do seu superior interesse - ser levados em consideração, entre outros, factores como a distância geográfica entre as residências dos progenitores, os sacrifícios suceptíveis de se originarem, o (eventual) histórico de violência doméstica, a desmesurada conflitualidade entre os progenitores, ou mesmo a vontade do próprio menor (considerando a sua maturidade e argumentação que possa demostrar). VIII – É de confirmar uma Sentença que decide por uma guarda partilhada com residência alternada na situação de uma criança de 2 anos e 7 meses, cujos progenitores estão em conflito, mas demonstram ter ambos competências parentais, ambos constituem figuras de referência para ela, ambos têm condições económicas e logísticas para a terem consigo, não existirem obstáculos geográficos e tal não implica sacrifícios exagerados, incomportáveis ou inexigíveis, estando ainda determinado o acompanhamento da execução do regime estabelecido pelos serviços de assessoria técnica, nos termos do n.º 6 do artigo 40.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa Relatório A… intentou contra F… a presente acção de regulação do exercício de responsabilidades parentais, relativa ao menor – filho comum – L…. Foi realizada a primeira sessão da tentativa de conciliação a 5 de Julho de 2022, não sendo alcançado acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais pelos progenitores, pretendendo o pai a fixação de uma residência alternada e a mãe a fixação da residência do menor consigo, com convívios com o pai em fins de semana alternados e ainda num dia útil na semana. Após o exercício do contraditório o tribunal fixou um regime provisório de regulação das responsabilidades parentais, a prever a residência da criança com a mãe, com previsão de convívios com o pai em fins de semana alternados, e quinzenalmente, na semana que antecede o fim de semana que o menor passa com a mãe, entre as 19h de sexta-feira e a manhã de sábado, e de terça para quarta-feira, e fixando em 120€ a prestação de alimentos a cargo do pai, à qual acresce a repartição entre os progenitores das despesas extraordinárias de saúde e de educação. Decorrida a fase de mediação (audição técnica especializada) não foi alcançado pelos pais acordo, mantendo-se o dissídio relativamente à residência da criança, pretendendo a mãe a residência exclusiva e o pai a residência alternada. Realizada nova sessão de conferência de pais, aditou o tribunal ao regime provisório de regulação das responsabilidades parentais a repartição dos tempos do menor nas datas festivas do Natal e Ano Novo entre ambos os progenitores e bem assim nas interrupções lectivas da Páscoa e do Verão, dando, posteriormente cumprimento ao disposto no artigo 39.º, n.º 4, do RGPTC, na sequência do que ambos os progenitores apresentaram alegações e requerimento probatório. Foi realizada a audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo, sendo proferida Sentença, a qual termina com o seguinte Decisão: “Pelo exposto, decido fixar a seguinte regulação das responsabilidades parentais, nos seguintes termos: 1. – O menor L…, nascido a 12-11-2020, residirá alternadamente com ambos os progenitores, por períodos de 3 dias alternados, ocorrendo as trocas pelas 18h00 do terceiro dia, na escolar/creche/ama ou na casa do progenitor com quem passou os 3 dias consecutivos, exercendo cada qual as responsabilidades parentais nos questões do quotidiano nos dias que têm o menor a cargo, exercendo ambos, em simultâneo, os progenitores as funções de encarregado de educação do menor. 2. – Cada um dos progenitores poderá realizar videochamada para comunicar com o filho, quando não o tenha a seu cargo, sem prejuízo dos horários de descanso e escolares da criança. 3. – Nas questões de particular importância na vida do menor, designadamente em matéria de intervenções médico-cirúrgicas não urgentes, tratamento médicos com perigo grave para a integridade física ou perigo para a vida, viagens para fora do espaço Schengen (europeu), representação patrimonial e judiciária, prática de desportos radicais, escolha de ama/creche ou de estabelecimento de ensino, e educação religiosa, as responsabilidades parentais serão exercidas em conjunto por ambos os progenitores. 4. – O menor passará com cada um dos pais metade das interrupções letivas do Natal, ocorrendo as trocas no dia 26 de dezembro ou no dia 1 de janeiro, pelas 18h00m, sendo que na próxima quadra festiva do Natal o menor passará com a mãe o período compreendido entre o dia seguinte ao termo da atividade letiva e o dia 26 de dezembro, e com o pai entre este dia e o dia 1 de janeiro, pelas 18h00m. 5. – Na interrupção letiva da Páscoa e do verão o menor passará com cada um dos progenitores metade destes períodos, os quais não poderão exceder o período de uma semana consecutiva no caso das férias das Páscoa e de 15 dias consecutivos nas férias do verão, devendo o menor ter convívios com o progenitor com quem não está de férias, no domingo que medeia a quinzena, caso o progenitor de férias não se ausente da ilha, cabendo à mãe na próximas interrupções letivas em referência a primeira semana da Páscoa e a primeira quinzena do verão, alternando nos anos seguintes. 6. – Sempre que o menor viage para fora da ilha de São Miguel, o progenitor que o acompanha deverá informar o outro do local onde pernoitará com o menor, bem como datas e horas das viagens de ida e de regresso, sinalizando a sua chegada e partida, através de mensagem escrita. 7.- O menor passará com o pai o Dia do Pai e o dia de aniversário deste, com a mãe o Dia da Mãe e o dia aniversário desta, sendo o próprio dia de aniversário do menor repartido entre ambos os progenitores, de forma a que almoce com um e jante com o outro. No próximo aniversário o menor tomará com o pai a refeição do jantar, alternando nos anos seguintes. 8.- As despesas extraordinárias em saúde com o menor na medida em que não cobertas por qualquer sistema público ou privado de saúde, tais como aparelhos, próteses auditivas, dentárias, óculos, consultas médicas de especialidade, despesas medicamentosas medicamente prescritas em valor igual ou superior a 20,00€ mensais, bem como as despesas escolares do início de ano letivo, com a aquisição de livros e de material escolar, na parte não comparticipada pela ação social escolar, e ainda as despesas em ama, creche ou ATL, serão suportadas entre ambos os progenitores na proporção de metade. 9. - Para o efeito devendo o progenitor que suportar a despesa, no prazo de 10 dias seguintes após efetuar a despesa, comunicá-la ao outro progenitor, por escrito e com cópia dos comprovativos, cabendo a este, nos 10 dias seguintes à comunicação, depositar na conta da mãe a metade que lhe corresponde. Sendo elevado o risco de incumprimento da presente regulação a presente sentença será acompanhada pela EMAT, nos termos do artigo 40º/6, pelo período de 6 meses, durante o qual terá intervenção do Centro de Terapia Familiar, em vista a debelar as dificuldades de comunicação entre os progenitores. Custas pelos progenitores, em partes iguais. Notifique, registe e após trânsito em julgado cumpra o disposto nos artigos 78° do C.R.C, e 1920°-B, a) do Código Civil. Comunique à EMAT – Equipa Tutelar Cível”. É desta Sentença que vem interposto recurso por parte da progenitora Requerente, a qual apresentou ALEGAÇÕES, terminando com as seguintes Conclusões: “1 – Ditou a decisão recorrida a guarda partilhada do menor L…, nascido em 12/11/2020, por períodos de três dias alternados com a recorrente / mãe e o recorrido / progenitor F…. E obriga a recorrente e recorrido a terapia familiar de forma a que esse acordo seja respeitado. 2- O regime da guarda partilhada, idealmente, o mais adequado à regulação das responsabilidades parentais encontra-se condicionada à existência de consenso entre os progenitores, despida de conflitos. Convergência de valores ou metas na edução e contactos com os menores. Respeito pela necessidade de rotinas e estabilidade do menor. 3 - Os pressupostos enunciados não se verificam no caso concreto e a sujeição dos progenitores ao regime da guarda partilhada quando ambos não dialogam e, encontram-se separados sobre modelo educacional e bem estar do menor, e disso o tribunal recorrido tem consciência pois obriga-os a terapia familiar determinam que deverá a decisão recorrida ser revogada por não preencher os superiores interesses da criança, 4 – Tanto mais que, a decisão recorrida impõe uma residência alternada entre os progenitores de 3 em 3 dias, obrigando à mudança de casa 2 vezes por semana, 8 vezes por mês e a 24 viagens semanais entre um e outro lar com os sacrifícios – emocionais, físicos e psicológicos- daí decorrentes, 5- Merecendo igual censura a decisão recorrida na parte em que não determinou o agendamento da residência alternada permitindo, por esta omissão, que o recorrido tenha imposto unilateralmente que o menor esteja com ele todos os fins de semana enquanto a recorrente fica com aquele durante a semana ( segunda a quinta – feira), Desta forma e pelos razões expostas, devendo a decisão recorrida ser revogada e, em alternativa ser convertido em definitivo o regime de regulação das responsabilidades parentais que provisoriamente vigorou. Ou, no caso não esperado de tal não ser entendido, ser o período de residência do menor com os progenitores espaçado para uma semana de forma a obstar à conduta do recorrido que impede a recorrente de estar com o filho ao fim de semana assim se fazendo a habitual Justiça”. O progenitor Recorrido veio apresentar Contra-Alegações, culminando-as com as seguintes Conclusões: 1. O Recorrido entende que a decisão do Tribunal a quo encontra-se correta e não deve ser alterada. 2. Andou bem o Tribunal a quo ao fixar o regime de guarda alternada, por se encontrarem reunidos todos os pressupostos para o efeito. 3. Aliás, esta foi uma decisão tomada com base em relatórios da equipa EMAT que avaliaram todas as condições de ambas as figuras e entenderam também que estavam reunidas as condições. 4. A idêntica solução se chegou através da análise dos elementos probatórias depois de realizada audiência de discussão e julgamento. 5. Relativamente à situação laboral do progenitor, a mesma alterou-se, conforme documentação junta ao processo e depoimentos da testemunha D… e do próprio progenitor. 6. Aliás, já tem em vigor o seu novo horário de Agosto do seu segundo trabalho, que permite conciliar o regime da guarda alternada. 7. Os pais mantêm um nível adequado de comunicação entre si para tomar as decisões relativas ao menor, como recentemente decidiram quanto às creches a frequentar e quanto ao dia a dia do menor. 8. Mesmo que o Tribunal entenda que não existe comunicação entre os progenitores, veja-se que a guarda partilhada ainda assim é a solução para o caso concreto. 9. Até porque, a existir uma guarda partilhada existirá apenas uma troca semanal que poderá ser na creche. 10. O superior interesse do menor, quando ambos os progenitores dispõem de competências parentais, condições económicas, sociais e relacionais, é de conviver durante os mesmos períodos quer com a figura materna, quer com a figura paterna. 11. Ficou provado que o menor se encontra bem cuidado com qualquer um dos progenitores, sendo assim do seu superior interesse que a regulação seja dividida em tempos idênticos quer sejam de 3 dias quer seja de uma semana. 12. Em relação ao alegado sobre o progenitor estar todos os fins-de-semana com o pai e durante a semana com o pai o mesmo não corresponde à verdade. 13. O pai juntou nesta resposta tabelas que provam que o alegado pela mãe não acontece. 14. Da conjugação destas tabelas é de observar que vai variando os dias da semana que o menor passa com cada um dos pais. 15. Ora passa fins-de-semana inteiros com um e ora com outro bem como partes do fim-de-semana, variando sempre de semana para semana os dias que o menor está com cada um dos cônjuges. O Ministério Público, por seu turno, apresentou Contra-Alegações, indicando as seguintes Conclusões: “1 – 1. O Ministério de Público, na salvaguarda do superior interesse das menores manifesta a integral concordância com o Regime de Exercício das Responsabilidades Parentais proferido nos presentes autos; 2. A matéria de facto fixada na douta sentença recorrida reflecte de forma isenta, assertiva e exacta a prova produzida nas várias sessões de julgamento; 3. Merece-nos, pois, inteira concordância a par da fundamentação de facto quer da decisão proferida pela Mmª Juiz, a qual se encontra devidamente fundamentada no que tange ao direito aplicado; 4. O regime de guarda alternada salvaguarda o interesse superior da criança, tal como supra referimos, não se vislumbrando que, que seja posto em risco a segurança do vínculo primário da criança com a sua mãe, até porquanto resulta que a mesma mantém relação afectiva de qualidade com ambos os progenitores; 5. O são desenvolvimento da criança a nível emocional será assegurado com a presença na sua vida de ambos os progenitores; 6. Como bem refere a Mmª Juiz a quo no enquadramento efectuado da situação concreta, “tendo o menor L… relação de vinculação estabelecida com ambos os progenitores, e tendo ambos os progenitores competências e condições económicas, pessoais e habitacionais para dele cuidarem, a implementação de um modelo de residência alternada, mesmo à margem do acordo dos progenitores, é aquele que melhores condições oferece para concretização do imperativo legal de promoção de amplas oportunidades de contactos do menor com ambos os progenitores, através da manutenção do convívio corrente da criança com ambas as figuras parentais, e de partilha entre ambos os progenitores da responsabilidade pela educação e formação desta criança, proporcionando ao menor uma linha de continuidade nas relações de afeto de qualidade e significativas que tem com ambos os progenitores; 7. Os princípios da igualdade entre os progenitores e da inseparabilidade dos filhos aos progenitores e do superior interesse da criança, isolada e conjuntamente, associados aos indicadores positivos ao nível da saúde da criança que a psicologia e a pedopsiquiatria têm associado à implementação da residência alternada, desmistificando os tradicionais argumentos em prol da residência única, no sentido de que a residência alternada cria instabilidade na criança, que a figura materna é a principal referência em termos de vinculação e que dormir em duas casas distintas proporciona desequilíbrio à criança, também reforçam dever ser aquele o modelo preferencial”. 8. Assim, e sem prejuízo de um eventual reajustamento ao regime de residência alternada fixado no sentido de evitar que a criança passe sempre os fins de semana com o mesmo progenitor, deverá ser mantida a sentença recorrida”. Questões a Decidir São as Conclusões do(s)/a(s) recorrente(s) que, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, delimitam objectivamente a esfera de actuação do Tribunal ad quem (exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial, como refere, Abrantes Geraldes[1]), sendo certo que, tal limitação, já não abarca o que concerne às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil), aqui se incluindo qualificação jurídica e/ou a apreciação de questões de conhecimento oficioso. Verificadas as Alegações e Conclusões da Recorrente importará decidir neste Recurso da correcção do regime das responsabilidades parentais fixado relativamente ao L…, nomeadamente no que concerne à guarda alternada. Corridos que se mostram os Vistos, cumpre decidir. *** Fundamentação de Facto Releva para a presente decisão a seguinte factualidade: 1. – L… nasceu a 12 de Novembro de 2020[2]. 2. – É filho de A… e de F…. 3. – Foi fixado a 5-07-2022 um regime provisório do exercício das responsabilidades parentais, a fixar a residência da criança com a mãe, com previsão de convívios com o pai em fins de semana alternados, e quinzenalmente, na semana que antecede o fim de semana que o menor passa com a mãe, entre as 19h de sexta-feira e a manhã de sábado, e de terça para quarta-feira, e fixando em €120 a prestação de alimentos a cargo do pai, à qual acresce a repartição entre os progenitores das despesas extraordinárias de saúde e de educação. 4.- O menor reside com a sua mãe desde que nasceu, sendo esta uma figura de referência para o filho, tanto ao nível afectivo como relacional e em matéria de prestação de cuidados, mantendo com o L… um vínculo securizante. 5. – A figura materna demonstra nutrir afetos genuínos pelo filho e motivação e interesse para continuar a assumir os seus cuidados. 6. - Mostra-se implicada na organização das rotinas quotidianas da vida do filho, pautadas por práticas normativas e, globalmente, adequadas à faixa etária e fase de desenvolvimento deste, revelando alguma rigidez na operacionalização das mesmas. 7. – Está envolvida no processo desenvolvimental, educativo e de socialização do filho, bem como ao nível do seu acompanhamento em matéria de saúde, conhecendo todos os dados relativos à vida da criança. 8. - Possui conhecimento das principais caraterísticas temperamentais de L…, bem como das suas habilidades e preferências, em particular lúdicas e alimentares, mostrando-se presente nas rotinas da criança. 9. – A mesma sente prazer e satisfação no desempenho do papel parental, entendendo que, face à idade de L…, deverá assumir uma função de protecção, mas também de dedicação e envolvimento. 10. - Considera-se como mãe competente e funcional, embora reconheça que poderá melhorar a sua parentalidade, em específico, proporcionar ao L… maior autonomia e diminuir a sua sobreprotecção, entendendo que a mesma poderá impactar negativamente no seu desenvolvimento. 11. - Reconhece a existência de competências parentais na figura paterna, caracterizando o pai como brincalhão, mas permissivo e imaturo. 12. - Não obstante revelar uma atitude tendente ao cumprimento do estipulado judicialmente em matéria de contactos/convívios paterno filiais, demonstra não valorizar a presença da figura paterna na vida da criança, não estando disponível para flexibilizar qualquer alteração ao regime de convívios, evidenciando, na generalidade, alguma rigidez quando surgem outras oportunidades de interacção do filho com o pai que não as judicialmente estipuladas. 13. - Entende que não deverá recorrer ao pai na eventualidade de impossibilidade ou de imprevisto por parte da própria, ou até mesmo perante o surgimento de algum problema, beneficiando de suporte familiar por parte da sua mãe (quando esta permanece na ilha de São Miguel, cerca de 3 a 4 vezes por ano) e da amiga R…, sempre que se torna necessário. 14. – Tem diagnóstico, desde 2013, de esclerose múltipla, doença que se encontra estável e controlada, sem ocorrências de crises, sendo acompanhada na consulta externa de neurologia (no HDES), beneficiando de medicação regular por forma a dirimir a sintomatologia associada (maior cansaço), provocando-lhe a medicação efeitos secundários, que demandam uma boa higiene de sono, o que não colide com a asseveração de cuidados à criança, sendo a sua principal preocupação a expectável diminuição de mobilidade que poderá advir. 15. – O agregado materno é composto pela própria e pelo filho L…, residindo em apartamento em Ponta Delgada, constituído por dois quartos, um dos quais partilhado pela figura materna e criança, habitação que dispõe de adequadas condições, possuindo os equipamentos domésticos e mobiliários necessários. 16. – A figura materna exerce funções enquanto Técnica de Qualidade Alimentar, laborando de 2.ª a 6.ª feira, das 07.30h às 16.30h, e sábados alternados das 07.30h às 12.30h, e ocasionalmente, exerce funções, à jornada, enquanto explicadora e nutricionista, subsistindo dos seus rendimentos de trabalho, prestação familiar (abono de família) relativo ao L… e pensão de alimentos a favor da criança, totalizando um montante mensal de €1.115. 17. – As despesas mensais mais significativas de L… a cargo da mãe perfazem €29,75 de despesas de saúde (medicação e consultas), €60 de alimentação fornecida à ama, €20 em vestuário, €60, de mensalidade devida à ama e € 48 em produtos de puericultura. 18. – A progenitora tem ainda como encargos fixos mensais as despesas relativas à saúde da própria (€15,33), prestação bancária e seguros associados à aquisição da habitação (€330) e a um crédito automóvel (€50), de alimentação (€120), de combustível e despesas com o veículo (€73,40) e consumos domésticos (€133). 19. - Pese embora o reduzido tempo de convivência entre a criança e o pai, este também constitui uma figura de referência para o filho, tanto ao nível afectivo como relacional e em matéria de prestação de cuidados, por esta via mantendo com o L… um vínculo securizante. 20. – A figura paterna sente prazer e satisfação no desempenho do papel parental, entendendo que, face à idade de L…, deverá assumir uma função de protecção, estimulação e participação. 21. - Revela envolvimento no processo desenvolvimental, educativo e de socialização do filho, bem como ao nível do seu acompanhamento em matéria de saúde, conhecendo todos os dados relativos à vida da criança. 22. - Preocupa-se com o processo desenvolvimental de L…, envolvendo-se na procura de respostas que possam colmatar as fragilidades desenvolvimentais do filho (ligeiro atraso da aquisição da linguagem oral), dedicando bastante do seu tempo à estimulação do mesmo. 23. – Possui conhecimento das principais caraterísticas temperamentais do L…, bem como das suas habilidades e preferências, em particular lúdicas e alimentares, mostrando-se presente nas rotinas da criança. 24. – Nutre afectos genuínos pelo filho e motivação e interesse para aumentar a asseveração de cuidados ao mesmo. 25. – Cumpre com o estipulado judicialmente em matéria de contactos/convívios paternofiliais, e além disso visita com frequência, durante a manhã, o filho na ama, sendo que, quando não o faz, estabelece contacto telefónico com a ama no sentido de apurar o bem-estar da criança. 26. - Valoriza a presença de ambas as figuras parentais na vida da criança e encontra-se disponível para promover momentos de contacto/convívio materno-filial sempre que o L… permanecer aos seus cuidados, entendendo que deverá recorrer à mãe na eventualidade de impossibilidade ou de imprevisto por parte do próprio, ou até mesmo perante o surgimento de algum problema ou dificuldade associada à parentalidade. 28. - O progenitor vive com a sua companheira e tem, além do L…, outra filha de outra relação anterior, já maior de idade, actualmente a estudar fora do país, designadamente em Cambridge. 29. – Exerce funções de escriturário na empresa Insco de 2.ª a 6.ª feiras das 12h às 20h (com possibilidade de as exercer em regime de teletrabalho) e sábados das 9h às 13h, em teletrabalho realizado a partir da sua habitação, mas em paralelo e em regime parcial, trabalha, de 2.ª a 6.ª feiras, enquanto segurança no Aeroporto através da empresa ICTS, cumprindo o seguinte horário em semanas alternadas: 8h-11h e 5h-11h, e, por último, ainda assegura a manutenção e limpeza de um prédio de apartamentos, no que aufere, mensalmente, o montante de €1.538. 30. – Está disponível para alterar a actividade laboral secundária como segurança, de forma a estar disponível para cuidar do filho para além dos tempos estipulados no regime provisório do exercício das responsabilidades parentais. 31. – Após a separação o progenitor e antes de fixar residência em habitação sita em frente do Parque urbano, em Ponta Delgada, residiu em duas casas diferentes, sitas respectivamente na Lagoa e no Paim, das quais saiu, no primeiro caso por entender não ter condições, e no segundo caso por não lhe emitirem recibo de renda. 32. – O progenitor despende mensalmente com o filho L… €100 em alimentação, €35 em vestuário, €60 com mensalidade devida à ama, € 24 em produtos de puericultura e €120 em pensão de alimentos. 33. – Tem como encargos fixos mensais, a renda habitacional, despesas de alimentação (€105), despesas com combustível e veículo (€90,10), consumos domésticos (€79), encargo a particular com a compra de um automóvel (€100) e, por último, o montante referente à pensão de alimentos a favor da filha maior de idade (€100). 34. – Possui ainda uma dívida (no valor de €7.000) junto de uma Instituição Bancária, posteriormente remetida ao Banco de Portugal, encontrando-se esta situação ainda por regularizar. 35. – A habitação do progenitor dispõe de dois quartos de cama, sendo um para o casal e outro para o menor L…, que actualmente pernoita no berço no quarto do pai, uma sala comum, uma casa de banho, uma cozinha e um logradouro relvado. 36. – Apesar de o menor L… ter sido colocado aos cuidados da ama AM…, por decisão conjunta de ambos os pais, existiu dissídio relativamente à sua permanência na ama, que os pais ao longo da pendência deste processo de regulação das responsabilidades parentais conseguiram ultrapassar, inscrevendo o menor em diversas creches e acordando na integração do filho no próximo ano na creche que disponibilizar vaga, de entre as escolhidas pelos progenitores. 37. – A comunicação entre os progenitores é escassa, por ser evitada por ambos, e realizada através de mensagens escritas, por regra na plataforma “Messenger”, apesar de ambos actualmente terem o contacto telefónico um do outro, sendo pautada por inflexibilidade de parte a parte, revelando ambos os progenitores serem detentores de personalidades antagónicas, sendo a mãe muito disciplinada e organizada e o pai brincalhão e descontraído. ** Factos não provados a) A “esclerose múltipla”, de que progenitora padece, afecte a sua capacidade de cuidar do filho; b) Os progenitores mantêm o dissídio relativamente à permanência do filho na ama; c) Os progenitores não têm capacidade para consensualizar as questões de particular importância na vida do filho, por força do conflito parental. ** Fundamentação de Direito A Recorrente manifesta uma total discordância quanto à fixação de um regime de guarda partilhada na situação dos autos, no que não é acompanhada pelo Ministério Público. Vejamos, antes de mais, em que termos e bases de raciocínio assenta a Sentença proferida: I - os artigos 36.º, n.º 3 e n.º 5, da Constituição da República Portuguesa consagram o princípio da igualdade dos cônjuges, nos direitos e nos deveres, quanto à capacidade civil e política e à manutenção e educação dos filhos, afirmando que os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos (acrescentando o artigo 69.º n.º 1, que as crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições; II - A Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, reformulou o regime do poder paternal, rebaptizando-o de “responsabilidades parentais” e abandonando a secular nomenclatura que vinha sendo usada até então. III - O artigo 1878.º, n.º 1, do Código Civil, concretiza o conteúdo das responsabilidades parentais, dispondo competir aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens. IV - O artigo 1906.º do Código Civil aponta os critérios legais em Portugal no quadro do regime das responsabilidades parentais, dispondo, nos seus n.º 1 e 2, que “As responsabilidades parentais relativas a questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em conjunto por ambos os progenitores”, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível. V - Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores (artigo 1906.º, n.º 2), sendo que, quanto aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente (ou ao progenitor com quem se encontra temporariamente, embora, neste caso, sem dever contrariar as orientações educativas mais relevantes definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente – artigo 1906.º, n.º 3). VI - O progenitor a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício (artigo 1906.º, n.º 4), sendo que o tribunal determina a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro (n.º 5)”, podendo, quando “corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação da prestação de alimentos” (artigo 1906.º, n.º 6), o que possibilita a “guarda” “partilhada” (entendida esta como o exercício conjunto por ambos os progenitores das responsabilidades parentais, designadamente em questões de particular importância na vida da criança, podendo a “residência” da criança ser “exclusiva” junto de um único progenitor ou “alternada”, junto de ambos os progenitores, neste último caso abrangendo os casos em que, num contexto de divórcio ou separação, a criança divide o seu tempo entre as residências de ambos os progenitores, de forma tendencialmente igualitária). VII - “O tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles” (n.º 8 do artigo 1906.º). VIII - O tribunal procede à audição da criança, nos termos previstos nos artigos 4.º e 5.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (artigo 1906.º, n.º 9). IX – Conjugando os artigos 1906.º do Código Civil e 40.º do Regime Geral dos Processos Tutelares Cíveis, a modalidade da residência a consagrar é regulada de harmonia com o interesse do menor, como também o referem vários textos de direito internacional, nomeadamente no Anexo à Recomendação N.º R (84) 4 sobre as responsabilidades parentais, no seu Princípio 2, e no art.º 3º da Convenção de Nova Iorque (considerando-se, salvo situações excecionais, que são os pais aqueles que melhor defendem o seu interesse). X - Também o artigo 9.º, n.º 1, da Convenção Sobre os Direitos da Criança, prevê que “Os Estados Partes garantem que a criança não é separada de seus pais contra a vontade destes, salvo se as autoridades competentes decidirem, sem prejuízo de revisão judicial e de harmonia com a legislação e o processo aplicáveis, que essa separação é necessária no interesse superior da criança” (e tal decisão pode mostrar-se necessária no caso de, por exemplo, os pais maltratarem ou negligenciarem a criança ou no caso de os pais viverem separados e uma decisão sobre o lugar da residência da criança tiver de ser tomada). XI - O artigo 24.º, n.ºs 1, 2 e 3 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, a par de garantir o direito das crianças à proteção e aos cuidados necessários ao seu bem-estar, e de exprimir livremente a sua opinião, que será tomada em consideração nos assuntos que lhes digam respeito, em função da sua idade e maturidade, proclama o direito da criança de manter regularmente relações pessoais e contactos diretos com ambos os progenitores, exceto se isso for contrário aos seus interesses. XII - “As decisões dos nossos tribunais superiores permitem, em traços largos, identificar quatro grandes posições das nossas Relações em matéria de fixação judicial do regime da residência alternada ou homologação de acordos que a prevejam. Em primeiro lugar, existem decisões que propugnam a tese segundo a qual a residência alternada é intrinsecamente desadequada ao superior interesse da criança, porquanto não asseguraria a necessária estabilidade ao crescimento harmonioso da criança, obrigando-a a constantes mudanças e adaptações. Em segundo lugar, surge a tese que somente admite a residência alternada numa fase já relativamente adiantada de crescimento da criança, tipicamente após os 10 anos idade – definido, nalgumas decisões, como a “idade charneira”. Esta posição surge frequentemente associada a uma outra – a terceira – que exige como condição da residência alternada o acordo dos progenitores ou, pelo menos, a ausência de um conflito relevante. E, enfim, a última posição – e que parece tender a expandir-se que não subordina a fixação judicial da residência alternada a outro requisito que não seja o superior interesse da criança, admitindo-a em qualquer idade desta e independentemente da existência de conflito parental. Neste caso, a residência alternada é aclamada como o regime “ideal” e que, consequentemente, deverá ser adotado sempre que não se verifiquem impedimentos de monta. Estas correntes não são estanques, surgindo frequentemente combinadas nos acórdãos das nossas Relações. Assim, por exemplo, são diversas as decisões que admitem a residência alternada somente nos casos em que, cumulativamente, existe acordo parental e as crianças não são de tenra idade” – cit. Nuno Cardoso Ribeiro, in “A residência alternada e a jurisprudência dos Tribunais da Relação”, pp. 5)”. XIII - A terceira tese é a que se apresenta actualmente maioritária nas nossas Relações, fazendo depender a admissibilidade da fixação do modelo da residência alternada da existência de acordo entre os progenitores ou, pelo menos, da ausência de um conflito parental relevante, entendimento este que permitirá ultrapassar as principais críticas que lhe tecem os detratores da residência alternada, permitindo estabilidade e constância de regras, rotinas e planos educativos. XIV - A quarta tese relativa à prossecução do superior interesse da criança alicerça-se em numerosos estudos de investigação na área da Psicologia (tendo em conta aspetos como a vinculação, desenvolvimento infantil e o ciclo de vida familiar), que permitem concluir que a residência alternada se assume como a resposta que melhor salvaguarda o superior interesse da criança, conclusão que se baseia em estudos empíricos que demonstram que as crianças que usufruem de um regime de residência alternada apresentam níveis de ajustamento semelhantes ao das crianças que vivem com as famílias nucleares, sendo o regime que melhor acautela o direito de a criança manter relações afetivas próximas com ambos os progenitores, na sequência da igualdade entre ambos proclamada no art.º 36.º da Constituição. XV - O conceito indeterminado de interesse do menor tem sido densificado pela doutrina e jurisprudência, não sendo suscetível de ser definido em abstrato, mas sim em cada caso concreto. XVI – Clara Sottomayor distingue entre o núcleo do conceito, passível de ser preenchido através do recurso a valorações objetivas, e o halo do conceito, em que haveria o recurso a princípios jurídicos gerais ou aos valores gerais vigentes, e que exigem, pois, do juiz uma decisão pessoal, afirmando-se na sentença que “em cada caso, a análise terá de passar obrigatoriamente por fatores relacionados com a criança, com os progenitores e com o meio onde a criança se irá inserir. No que diz respeito à criança há que determinar as suas necessidades físicas, intelectuais e materiais. Para além destes fatores há que se ter em conta igualmente a idade, o sexo, o grau de desenvolvimento físico e psíquico, a sua integração no ambiente onde se move, o seu relacionamento afetivo com cada um dos progenitores e os efeitos que poderiam advir de uma mudança do estado de coisas existente. Relativamente aos pais, o enfoque é posto na capacidade parental de se relacionar afetivamente com o menor e incentivar que este se relacione com o outro, de lhe proporcionar os cuidados de saúde e a educação necessárias ao seu sexo e idade, bem como o facto de dispor de tempo disponível para cuidar deste. Para além destes fatores releva ainda a sua conduta, a sua situação financeira e a estabilidade que pode facultar. No que concerne ao meio onde a criança se irá inserir, o primeiro fator a destacar é a característica física da habitação e sua localização referentemente ao espaço onde o menor desenvolve as suas atividades escolares, religiosas, familiares e de amizade”. XVII - No caso presente não existe dissídio entre os progenitores quanto ao exercício das responsabilidades parentais relativamente às questões de particular importância na vida do menor L… (entre outras: intervenções cirúrgicas das quais possam resultar riscos acrescidos para a sua saúde; outros tratamentos médicos com perigo para a vida ou perigo grave para a sua integridade física; prática de actividades desportivas radicais; saída para fora do espaço Schengen; matrícula em colégio privado ou a mudança de colégio privado ou mesmo de ama; escolha do estabelecimento de ensino; mudança de residência do menor para local distinto da do progenitor a quem for confiado; representação patrimonial e judiciária do menor; sua educação religiosa), pelo que deve ser deferido, em conjunto, a ambos os progenitores. XVIII - Relativamente aos actos da vida corrente do L…, o exercício das responsabilidades parentais caberá ao progenitor a cargo de quem ele se encontrar, nos precisos termos do disposto no artigo 1906.º, n.º 3, 1.ª parte. XIX - Em matéria de fixação da residência do L…(nascido a 12-11-2020, de 2 anos e 7 meses), que vive com a mãe desde que nasceu, é pretensão da mãe que se mantenha a residir consigo e aos seus cuidados, e que conviva com o pai em fins de semana alternados, e ainda durante a semana, nos termos fixados no regime provisório. XX - Os grandes argumentos maternos residem na estabilidade e educação segundo o mesmo modelo educativo que apenas uma residência única da criança consigo consegue proporcionar. XXI - A pretensão do pai é a de que o L… resida alternadamente com os dois progenitores, de forma a que possa estar por inteiro com ambos os progenitores, embora por períodos alternados. XXII - Na decisão a proferir, parte-se do pressuposto que a “criança precisa, por força das necessidades decorrentes da vinculação e dos pais serem os seus modelos principais, feminino e masculino, que cada um dos pais confirme como válido o outro, indicando-os como elementos de segurança, deixando assim a criança segura, e a partir desse `base segura´ efetuar a necessária exploração do mundo, e com ela o desejado desenvolvimento com a descoberta de si mesma e dos outros. Com conflitos parentais, por força da predisposição genética das crianças para compreender os elementos emocionais dos pais, dos vinculadores, o que se transmite aos filhos por ricochete é que o modelo de pai, mãe, ou ambos, são fonte de perigo, inseguros, e com isso deixam a criança stressada, sem `lugar´, como espaço de reorganização necessária por força da exposição ao caos”, e que “a criança, para efetuar um desenvolvimento de acordo com o seu superior interesse, como expressão das suas potencialidades genéticas, precisa de um relacionamento amistoso entre pai e mãe, sendo ele que determina a qualidade do relacionamento de cada um deles com o filho. Precisa de um triângulo que se feche, de um relacionamento seguro entre pai-filho, mãe-filho, mas também pai-mãe” (cit. Rodrigues, 2011, cf. Ac. do TRL de 22-10-2013, in http://WWW.dgsi.pt), e Joaquim Silva, in “A Família das Crianças na Separação dos pais, p. 131). Teremos ainda presente que apesar dos “processos de vinculação se estabelecerem ao longo da vida, é nos primeiros anos da vida da criança que assumem uma importância decisiva para que os vínculos de filiação se mantenham e aprofundem, o que torna assim particularmente vulneráveis todas as crianças que nunca viveram com ambos ou algum dos pais, ou em que viveram uma separação mos primeiros meses ou anos de vida, por força das dificuldades desta em manterem contactos regulares com ambos os vinculadores” (cf. Isabel Soares, 2007, in “Desenvolvimento da teoria e da investigação da vinculação, pp. 13-45, citado por Joaquim Manuel da Silva, in “A Família das Crianças na Separação dos pais, p. 86).)…” “Importa ainda acrescentar que a vinculação só se constrói a partir das interações repetidas com as figuras de vinculação. Não há vinculação segura sem abraço, cuidar, presença, tudo com muita regularidade, grande proximidade, como dispõe o artigo 1906º/7 do CC. Já o fundamento que qualifica o pai e a mãe como os melhores vinculadores principais é cultural, e tem a ver com o conhecimento um património genético que vem dos nosso pais, avós, etc., elementos profundos de identidade, e que fundamenta o direito da criança a ver correspondido o registo da sua filiação com a verdade biológica” (cit. Joaquim Manuel da Silva, in “A Família das Crianças na Separação dos pais, p. 87)”. XXIII – Considerou-se ainda que o menor L… possui uma noção de tempo muito limitada, que não vai além do “hoje” e do “amanhã”, e que “alternâncias com intervalos de tempo que vão para além daquilo que a criança compreende, aumentam a probabilidade de esta experienciar stresse, com impacto negativo na relação que estabelece com cada um dos progenitores” (cit. Agulhas & Anciães, 2017, in Avaliação pericial no âmbito do exercício das responsabilidades parentais: Que contribuição para a atribuição de residência alternada. In S. Marinho e S. Correia (Eds). Uma família parental, duas casas (pp. 207-229). Lisboa: Sílabo). XXIV - O Tribunal já tem fixado a residência alternada, com exercício conjunto das responsabilidades parentais por ambos os pais nas questões de particular importância na vida da criança, em situações de coparentalidade positiva e amplo entendimento dos progenitores sobre as orientações educativas a dar à criança, e também em situações de conflitualidade média, de forma a evitar o distanciamento da criança em relação a um dos progenitores (o não residente), e a sua exposição aos conflitos dos pais que a residência alternada consegue evitar, porquanto elimina ou pelo menos atenua as desconfianças de alienação dos filhos que geralmente o progenitor não residente imputa ao progenitor residente. XXV - No caso concreto, tendo o L… relação de vinculação estabelecida com ambos os progenitores, e tendo ambos os progenitores competências e condições económicas, pessoais e habitacionais para dele cuidarem, a implementação de um modelo de residência alternada, mesmo à margem do acordo dos progenitores, é aquele que melhores condições oferece para concretização do imperativo legal de promoção de amplas oportunidades de contactos do menor com ambos os progenitores, através da manutenção do convívio corrente da criança com ambas as figuras parentais, e de partilha entre ambos os progenitores da responsabilidade pela educação e formação desta criança, proporcionando ao menor uma linha de continuidade nas relações de afeto de qualidade e significativas que tem com ambos os progenitores. XXVI - Ademais os princípios da igualdade entre os progenitores e da inseparabilidade dos filhos aos progenitores e do superior interesse da criança, isolada e conjuntamente, associados aos indicadores positivos ao nível da saúde da criança que a psicologia e a pedopsiquiatria têm associado à implementação da residência alternada, desmistificando os tradicionais argumentos em prol da residência única, no sentido de que a residência alternada cria instabilidade na criança, que a figura materna é a principal referência em termos de vinculação e que dormir em duas casas distintas proporciona desequilíbrio à criança, também reforçam dever ser aquele o modelo preferencial. XXVII – O modelo de residência alternada promove a igualdade de direitos e as responsabilidades entre os pais, consagrada no artigo 36.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, evita que o progenitor não residente assuma um papel secundário, e se acomode e delegue no outro progenitor a responsabilidade pela educação e acompanhamento do filho, e que os laços filio-parentais se desvaneçam por falta de entrosamento e interligação afetiva entre pai e filho, mas sobretudo promove o direito da criança a manter com ambos os seus vinculadores preferenciais, pai e mãe, uma relação de proximidade física indispensável à construção de uma ligação afetiva de vinculação forte e segura. XXVIII - No caso concreto, o processo de vinculação está em curso relativamente a ambos os progenitores, e não só relativamente à mãe, como parece esta sustentar ao alegar ser a figura afetiva de referência do L…, tendo do relatório da EMAT, que o pai também é uma figura de referência afetiva para a criança, apesar de privar com ela menos tempo. XXIX - Assim, deverá fixar-se uma residência alternada do menor com cada um dos progenitores, por períodos de 3 dias alternados, ocorrendo as trocas pelas 18h00 do terceiro dia, na escolar/creche/ama ou na casa do progenitor com quem passou os 3 dias consecutivos, exercendo cada qual as responsabilidades parentais nos questões do quotidiano nos dias que têm o menor a cargo, exercendo ambos, em simultâneo, os progenitores as funções de encarregado de educação do menor. XXX - Em referência às datas festivas do Natal e Ano Novo, em vista à partilha equitativa destas datas de celebração familiar com cada um dos progenitores e considerando não serem os progenitores naturais da ilha de São Miguel, sendo por isso normal que nestas datas queiram deslocar-se com o filho para junto da família alargada, decide-se que: - o menor passará com cada um dos pais metade das interrupções lectivas do Natal, ocorrendo as trocas no dia 26 de dezembro ou no dia 1 de Janeiro, pelas 18h, sendo que na próxima quadra festiva do Natal o menor passará com a mãe o período compreendido entre o dia seguinte ao termo da actividade lectiva e o dia 26 de Dezembro, e com o pai entre este dia e o dia 1 de Janeiro, pelas 18h; - na interrupção lectiva da Páscoa e do Verão o menor passará com cada um dos progenitores metade destes períodos, os quais não poderão exceder o período de uma semana consecutiva no caso das férias das Páscoa e de 15 dias consecutivos nas férias do verão, devendo ter convívios com o progenitor com quem não está de férias, no domingo que medeia a quinzena, caso o progenitor de férias não se ausente da ilha, cabendo à mãe na próximas interrupções lectivas em referência a primeira semana da Páscoa e a primeira quinzena do Verão, alternando nos anos seguintes; - sempre que o menor viagem para fora da ilha de São Miguel, o progenitor que o acompanha deverá informar o outro do local onde pernoitará com ele, bem como datas e horas das viagens de ida e de regresso, sinalizando a sua chegada e partida, através de mensagem escrita; - sem prejuízo, o menor passará com o pai o Dia do Pai e o dia de aniversário deste, com a mãe o Dia da Mãe e o dia aniversário desta, sendo o próprio dia de aniversário do menor repartido entre ambos os progenitores, de forma a que almoce com um e jante com o outro (no próximo, o menor tomará com o pai a refeição do jantar, alternando nos anos seguintes). XXXI - No que respeita a alimentos (que corresponde à obrigação legal de cada progenitor contribuir para o sustento do filho), estando abrangido tudo o que é indispensável ao sustento, habitação, vestuário, instrução e educação das crianças (artigo 2003º do Código Civil), e tendo em consideração os meios dos obrigados a alimentos e as necessidades do menor (artigo 2004º do Código Civil), na medida em que as despesas correntes de alimentação, educação, saúde e calçado serão suportadas pelo progenitor com quem a criança esteja a residir, importa apenas prever a repartição equitativa das despesas extraordinárias de saúde (aquisição de óculos, outras próteses, aparelhos dentários, consultas de especialidade) e de educação do início do ano lectivo (com a aquisição de livros e de material escolar), bem como as despesas em ama, creche ou ATL, por estas representarem um esforço financeiro acrescido mas necessário, que não deve ficar apenas a cargo de um dos progenitores”. A decisão é exemplar em termos de clareza, estruturação, compreensibilidade e justificação, restando verificar se foi correcta. Não são nunca situações fáceis as que chegam a um Tribunal de recurso na área da regulação das responsabilidades parentais, desde logo porque se o fossem, não era necessário virem a Tribunal[3]. Se quiséssemos uma situação ideal, o progenitor e a progenitora teriam mantido o seu projecto de vida comum e viveriam felizes e contentes para sempre com o/a(s) filho/a(s) que geraram. Mas a vida não é um conto de fadas e a felicidade não é unívoca e pode obter-se de muitas formas e por muitas vias. O problema é que a infelicidade também, correspondendo a outra face desta moeda. E o tipo de guerra que se estabelece entre pais desavindos é, precisamente, uma fonte de infelicidade para todos/as, nomeadamente quando esquecem (ou não percebem) que o seu projecto comum (in casu, por exemplo, incluindo um/a filho/a), só acabou no que respeita a si próprios, mantendo-se - no que aos presentes autos concerne - ao L…. Com os/as filhos/as existe um projecto vivo e permanente em que os egoísmos, aversões e desejos íntimos dos progenitores devem ficar na sombra, para realçar efectivamente o interesse daqueles/as. É essa luz que tem de os motivar e fazer adaptar. Por isso, têm de assumir e compreender que a presença física constante e em pé de igualdade[4] dos dois progenitores gera vivências únicas e irrepetíveis aos/às filhos/as (num contexto em que ambos são pais responsáveis que amam o/a seu/sua filho/a[5]). E é esse contributo que o/a(s) faz crescer, estruturar e ganhar identidade própria. Isso será, em cada caso, a concretização do “superior interesse do menor”[6]. Cada progenitor tem de saber ter a lucidez de perceber que, ao dar por findo o seu projecto pessoal de comunhão com o/a outro/a, tem de lograr fazer – desde logo por Amor ao/à filho/a – um esforço (às vezes quase inumano) de abstracção, pelo novo rumo que seguiu a vida desse/a outro/a (o seu novo projecto, a sua nova relação), combatendo o despeito, a raiva (ou mesmo o ódio) que, por compreensíveis que sejam, havendo um/a filho/a comum, têm de ser subvalorizados ou colocados em plano secundário. O Amor de cada progenitor, quando se quer sobrepor ao do outro, quando o quer esmagar ou apagar, ou desvalorizar, ou menosprezar, acaba por ser fonte de sofrimento para os/as filhos/as, para quem já é suficiente desgosto a alteração de vida ocorrida. Esse Amor, deve implicar Respeito pelo/a(s) filho/a(s) e consciência da necessidade de Partilha, sendo aí que deve ser procurado o superior interesse da criança, que terá sempre de ter uma implementação temporizada e calendarizada (adequada às concretas circunstâncias de cada caso), para se poder tornar – usando as palavras de Guilherme de Oliveira – na “expressão visível – depois da separação dos titulares das responsabilidades parentais – daquilo que verdadeiramente importa: a partilha das responsabilidades”[7]. As crianças, na sequência de situações de ruptura entre os seus progenitores, podem (se estes deixarem…) – efectivamente e em plenitude – ganhar mais uma família, porque o pai e a mãe fazem parte da sua essência enquanto ser e essa família, usando as palavras do psiquiatra António Gomes, “como palco de relações, não pode prescindir do corpo comum das palavras partilhadas. Do lugar dos olhares cruzados. Uma família é um lugar por dentro das pessoas todas. Tem bastidores, lugares reservados de reencontro, silêncios de crescimento e lágrimas secretas; mas, como um palco, exposto e ao vivo, é um lugar por dentro das pessoas todas, incorpora a reserva e a exposição, o íntimo e o partilhado, o silêncio e a palavra, a ponderação e o risco, a revolta e a aceitação (não a domesticação). Uma família, como palco de relações, é uma dinâmica de forças, não de astenias e demissões; tem divergências, mas o palco, por inerência, é uma convergência ampla de tensões e apaziguamentos que ajudam a crescer”[8]. Quem tem de ganhar neste tipo de processos é o/a mesmo/a que perde - de certeza - se os pais não ajudarem: o/a(s) filho/a(s)[9]. Todas estas palavras valem de forma muito especial na situação evidenciada nestes autos, em que a manutenção de uma situação conflitual e de desentendimento entre Requerente e Requerido, em nada tem contribui para minorar os efeitos da separação ocorrida junto do L… (ainda muito jovem, mas com capacidade para apreender situações de tensão). Mais. Os comportamentos dos progenitores (com os seus egoísmos que, por compreensíveis que sejam, acabam por ser factores de perturbação emocional do L…), conjugados com as circunstâncias de vida de cada um deles, exacerbam a vontade de cada um se sentir vencedor, o que acaba apenas por prejudicar o interesse do L…. Não se duvida um só segundo da real e legítima preocupação dos progenitores com o seu filho, mas também não pode deixar de se levar em consideração que se lhes exige uma posição de serenidade colaborante, sem hostilidade, desconfiança ou arrogância[10], impondo-se a ambos uma verdadeira auto-crítica. Já se vê pelo que acabámos de expor que temos como o regime abstractamente mais adequado para uma criança ou jovem, a guarda partilhada. Mas não a qualquer custo. Outros factores têm de ser levados em consideração, como a distância geográfica entre as residências dos progenitores, os sacrifícios suceptíveis de serem feitos, ou mesmo a vontade do próprio menor (considerando a maturidade e argumentação que possa demostrar, situação que pela pouca idade do L…, se não coloca, in casu). Repare-se e sublinhe-se que o acordo dos pais não é condição necessária para a fixação de um regime de residência alternada, mas apenas um dos factores que têm de ser considerados (sendo que, existindo, se torna muito mais facilitador de todo o processo). Como se expôs de forma certeira no texto do Acórdão da Relação de Évora de 09/11/2017 (Processo n.º 1997/15.1T8STR.E1-Francisco Matos), quando este regime é interiorizado e desejado por “ambos os progenitores, reunirá melhores condições de sucesso, do que as condições que resultarão da disputa, pelos progenitores, para que o filho resida habitualmente com um deles. Mas esta condição não é exclusiva da residência filho e abrange todos as vertentes das responsabilidades parentais; o acordo dos pais confere segurança aos filhos o desacordo, quando deles conhecido, insegurança e instabilidade[11]. Aos pais incumbe o desafio de responsavelmente ultrapassarem as divergências que se revelem contrárias ao interesse dos filhos”[12]. Por outro lado, é ainda certo que este regime “é susceptível de criar algum desconforto e influir, mormente nos primeiros tempos, nas rotinas diárias do menor, mas estes nefastos efeitos têm que ser aferidos e comparados com aqueles que resultariam da falta de contacto do menor com ambos os progenitores, de modo a usufruir em pleno e em termos paritários, do afeto, apoio e segurança que cada um deles lhe proporcionará”. E este é o desafio que sempre se coloca aos/às progenitores/as em cada concreto caso, sempre tendo presente como pano de fundo: - a Constituição da República Portuguesa[13]; - a Declaração dos Direitos da Criança[14]; - a Convenção Sobre os Direitos da Criança[15] (sempre convocada para a apreciação deste tipo de matérias - até por ter um estatuto supra-legal); - os artigos 1877.º e 1878.º do Código Civil[16]. Fazendo a apreciação exaustiva do regime, problemática e consequências da guarda conjunta com residência alternada e permitindo uma visão alargada e actualizada do “estado da arte”, nos Acórdãos desta Relação de 15 de Dezembro de 2020 (Processo n.º 7090/10.6TBSXL-B.L1-7-Luís Filipe Pires de Sousa) e de 11 de Janeiro de 2022 (Processo n.º 20994/15.0T8SNT-E-7-Luís Filipe Pires de Sousa)[17] tecem-se considerações genéricas que aqui assumimos na íntegra e que se passam a transcrever: “Nos termos do Artigo 1906º do Código Civil: “1 - As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível. 2 - Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o Tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores. 3 - O exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente ou a progenitor com quem ele se encontra temporariamente; porém este último, ao exercer as suas responsabilidades, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes, tal como elas são definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente. 4 – O progenitor a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente poder exercê-las por si ou delegar o seu exercício. 5 - O Tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro. 6 — Quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação da prestação de alimentos. 7 – Ao progenitor que não exerça, no todo ou em parte, as responsabilidades parentais assiste o direito de ser informado sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação e as condições de vida do filho. 8 - O Tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles. 9 — O tribunal procede à audição da criança, nos termos previstos nos artigos 4.º e 5.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível”. Os números 6 e 9 foram aditados pela Lei nº 65/2020, de 4.11, com entrada em vigor em 1.12.2020 (cf. Artigo 3º). Nos termos do Artigo 12º, nº2, segunda parte, do Código Civil, a nova redação do Artigo 1906º do Código Civil aplica-se ao caso em apreço, na medida em que a lei nova deve aplicar-se às situações jurídicas (=consequências duradouras de factos jurídicos) que se constituíram na vigência da lei antiga (alteração da regulação das responsabilidades parentais) e que transitam para o domínio da lei nova (cf. Miguel Teixeira de Sousa, Introdução ao Direito, 2013, pp. 281 e 286). Ou seja, na medida em que a nova redação dissocia os efeitos das regulações das responsabilidades parentais dos factos que originaram tais regulações, a lei nova pode, sem retroatividade ser objeto de aplicação imediata e, deste modo, reger os efeitos futuros das situações em curso (cf. Maria João Fernandes, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, p. 62). A questão da residência alternada tem vindo a ser objeto de larga análise na doutrina e na jurisprudência, havendo argumentos a favor deste regime e argumentos que o questionam. A favor da instituição de regime com residência alternada do menor são aduzidos os seguintes argumentos. Jorge Duarte Pinheiro, Estudos de Direito das Famílias e das Crianças, AAFDL Editora, 2015, pp. 338-339, defende que a regra deve ser a concessão a cada um dos progenitores de igual tempo de contacto ou residência, com o filho, e a atribuição da titularidade do exercício de todas as responsabilidades parentais a cada um dos progenitores que estiver, e enquanto estiver, com o filho, indicando as seguintes quatro fortes razões em abono do exercício alternado das responsabilidades parentais: 1. É um modo de tentar dar à criança dois pais em vez de um só ou de um meio; 2. É uma forma de organização que contribui para criar uma cultura autêntica de partilha das responsabilidades entre os pais; 3. É a modalidade que satisfaz o princípio da igualdade dos progenitores, imposto pelos Artigos 36º, nº5 e 13º da CRP e pelo Artigo 18º da Convenção Sobre os direitos da Criança; 4. É a forma de organização que melhor se adequa ao princípio de que os filhos não devem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles (Artigo 36º, nº6, da CRP). «A residência alternada permite que os pais continuem a dividir atribuições, responsabilidades e tomadas de decisões em iguais condições, reconhecendo as suas diferenças e limitações bem como o valor do papel de cada para com a criança. Esta diferença clara e coerente de papéis materno e paterno é fundamental para o saudável crescimento dos filhos pois permite uma estruturante identificação aos modelos parentais, fundamental para um normal desenvolvimento da sua identidade pessoal» - Ana Vasconcelos, “Do cérebro à empatia. Do divórcio à Guarda Partilhada com Residência Alternada”, in A Tutela Cível do Superior Interesse da Criança, Tomo I, julho 2014, Ebook CEJ, p. 10. Segundo um estudo de Edwark Kurk, “Arguments for an Equal Parental Responsibility Presumption In Contested Child Custody”, in The American Journal of Family Therapy, Volume 40, 2012, pp. 33-55, constituem argumentos que legitimam a imposição da residência alternada: 1. Preserva a relação da criança com ambos os pais. 2. Preserva a relação dos pais com a criança. 3. Diminui o conflito parental e previne a violência na família. 4. Respeita as preferências da criança e a opinião da mesma acerca das suas necessidades e superior interesse. 5. Respeita as preferências dos pais e a opinião dos mesmos acerca das necessidades e superior interesse da criança. 6. Reflete o esquema de cuidados parentais praticado antes do divórcio; 7. Potencia a qualidade da relação progenitor/criança; 8. Reduz a atenção parental centrada na “matematização do tempo” e diminui a litigância; 9. Incentiva a negociação e a mediação interparental e o desenvolvimento de acordos do exercício das responsabilidades parentais; 10. Proporciona guidelines claras e consistentes para a tomada de decisão judicial; 11. Reduz o risco e a incidência da “alienação parental”, 12. Permite a execução dos regimes de exercício das responsabilidades parentais, pela maior probabilidade de cumprimento voluntário pelos pais. 13. Considera os imperativos de justiça social relativos aos direitos da criança; 14. Considera os imperativos de justiça social relativos à autoridade parental, à autonomia, à igualdade, direitos e responsabilidades; 15. O modelo “interesse superior da criança/guarda e exercício unilateral” não tem suporte empírico; 16. A presunção legal de igualdade na guarda e exercício das responsabilidades parentais rem suporte empírico. Analisando quarenta estudos realizados a nível internacional, Linda Nielsen, “Custódia física partilhada. 40 estudos sobre os seus efeitos nas crianças”, in Sofia Marinho e Sónia Vladimira Correia, Uma Família Parental, Duas Casas, Edições Sílabo, 2017, p. 67, afirma: «De modo geral, os 40 estudos chegaram a várias conclusões semelhantes. Em primeiro lugar, a custódia física partilhada está associada a melhores resultados de crianças de todas as idades ao longo de um amplo espetro de indicadores de desempenho e bem-estar emocional, comportamental e de saúde física. Em segundo lugar, não foram encontradas evidências de que as dormidas na casa do pai e custódia física partilhada estejam associadas a desempenhos negativos dos bebés e das crianças pequenas. Em terceiro lugar, quando as crianças têm um mau relacionamento com o pai os resultados não são tão positivos. Em quarto lugar, mesmo que tendencialmente os progenitores com custódia física partilhada tendam a ter rendimentos mais elevados e a manterem relações com menor conflito, estes dois fatores isolados não explicam os melhores desempenhos das crianças. E, por fim, ainda que a maioria das crianças em custódia física partilhada admita que viver em duas casas pode ser, por vezes, complicado, muitas sentem que os benefícios superam de longe os possíveis inconvenientes.» Daniel Sampaio, Dá-me a Tua Mão e Leva-me, Como Evoluiu a Relação Pai-Filho, Caminho, 2ª ed., 2020, pp. 146-147, analisa a questão nestes termos: «Conhecem-se hoje diversas vantagens no modelo de residência partilhada. A principal é a de que, deste modo, mantemos as relações familiares semelhantes às do momento pré-divórcio, porque os relacionamentos com o pai e a mãe se aproximam dos da família intacta. Este esquema leva a um diálogo entre os progenitores, embora em muitos casos seja difícil e feito apenas por e-mail (muitas vezes para “fazer processo” e mais tarde apresentar em tribunal), porque é necessário fazer acordos e negociar diversos aspetos da vida dos filhos. Os conflitos de lealdade que muitos jovens mostram (devo estar mais com a minha mãe ou o meu pai vai ficar aborrecido?) tendem a desparecer com a organização dos tempos em família e a igual importância dos pais na vida dos mais novos. Finalmente, a residência partilhada permite algum espaço individual a cada um dos pais, nos tempos em que estão sozinhos, o qual pode ser importante sobretudo quando aparecem novas relações afetivas. Quem não concorda com a residência partilhada argumenta que este regime só pode ser decretado nos casos em que o conflito entre os progenitores se reduziu ao mínimo, porque a manter-se a zanga ela seria ativada nas inevitáveis combinações do quotidiano. Não é essa a minha experiência, antes pelo contrário: nos caos em que tenho tido intervenção terapêutica, este regime atenua o conflito, pela razão simples de que “ninguém ganha” e a criança se “divide” entres os pais. (…) Na residência partilhada a criança convive com ambos os pais e essa constância de relacionamento permite um conhecimento mais direto e íntimo de cada um, o que torna a eventual influência negativa [reportando-se às práticas alienantes familiares] menos intensa.» Neste âmbito, merecem destaque as ponderosas e exaustivas considerações tecidas no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12.4.2018, Ondina Alves, 670/16: «As vantagens são inequívocas, porquanto além de eliminarem os conflitos, reduzem os efeitos do impacto da separação dos pais nas relações parentais, e nas que se estabelecem entre os progenitores e os respetivos filhos, com a envolvência direta e conjunta de ambos os pais, fortalecendo assim a atividade e os laços afetivos entre os filhos e os pais e reforçando, por esta via, o papel parental – cf. neste sentido Ac. TRL de 28.06.2012 (Pº 33/12.4TBBRR.L1-8), citando Waldir Grisard Filho, “Novo Modelo de Responsabilidade Parental” São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000. e ainda MARIA ALICE ZARATIN LOTUFO, A guarda e o exercício do direito de visita, Revista do Advogado, São Paulo, n. 91, maio, 2007, 93-102, acessível em https://aplicacao.aasp.org.br/aasp/servicos/revista_advogado/paginaveis/91/index.asp#/93/zoomed. A residência alternada pode, portanto, ser mais benéfica para o menor que a residência exclusiva com um dos progenitores, porquanto aquela será a que está mais próxima da que existia quando os pais viviam na mesma casa, já que a criança continuará a estar com ambos os pais por períodos prolongados e equivalentes, com ambos estabelecendo relações de maior intimidade. Com efeito, a criança sentirá que pertence aos dois lares em igualdade de circunstâncias e não se sentirá uma “visita” quando está com o outro progenitor e restantes pessoas do seu agregado familiar, mantendo em ambos os lares um «espaço» próprio para a criança e não um espaço sentido por ela sentido como «provisório» ou considerado como tal pelos outros elementos do agregado familiar. Acresce que a igualização dos direitos e responsabilidades dos pais diminui a conflitualidade e encoraja a cooperação entre estes, uma vez deixa de haver um perdedor e um vencedor, o que reduz a tentativa de denegrir a imagem um do outro através de acusações mútuas. Por outro lado, mesmo que num período inicial subsista alguma conflitualidade entre os pais estes tendem, com a passagem do tempo, a ultrapassarem os seus conflitos, adaptando-se à nova situação e relacionando-se de uma forma pragmática. (…) Conclui-se, portanto, que o regime de residência singular impede que o exercício das responsabilidades parentais, após a separação, possa ser o mais possível próximo de quando vigorava a união do casal, tanto mais que a permanência continuada da criança com apenas um dos progenitores implica, geralmente, que a separação dos pais tenha como consequência também a separação dos filhos daquele progenitor com quem apenas está durante o período estabelecido para as respetivas visitas. Pelo contrário, na residência alternada estabelece-se uma relação próxima da criança com ambos os progenitores, sendo unanimemente aceite que a vinculação afetiva se constrói no dia-a-dia. Entre os pais e a criança tem de existir uma proximidade física que possibilite uma interligação afetiva real e consistente, sob pena de os laços já existentes se desvanecerem e os ainda inexistentes nunca chegarem a acontecer. A residência alternada e a proximidade dos pais com os filhos, após a separação, é mais suscetível de minimizar os efeitos negativos da separação e pode constituir um fator inibidor de que o progenitor não residente se acomode e delegue no outro progenitor a responsabilidade pela educação e acompanhamento dos filhos, mesmo que o exercício das responsabilidades parentais seja conjunto. E, através da diminuição do sentimento de perda na sequência dessa separação pode, com grande probabilidade, levar a uma diminuição da conflitualidade entre os progenitores. Este regime tem, pois, como vantagens a maior proximidade entre a criança e cada um dos pais e o facto de a criança não ter de escolher um pai em detrimento do outro, para além de que os pais também não se sentem privados dos seus direitos, permitindo a continuação das responsabilidades de ambos, suscetível de criar um forte vínculo emocional de pais e filhos e o bom desenvolvimento da criança, já que a segurança nas crianças está ligada à resposta imediata em situações de stress, com carinho e envolvimento, pelo que a capacidade de manter padrões de comportamento faz crescer nas crianças sentimentos de respeito, maturidade e autoestima positiva.» Ainda na jurisprudência, é enfatizado que a residência alternada permite equilibrar o princípio da igualdade dos progenitores e o superior interesse da criança (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.6.2019, Ana Rodrigues da Silva, 29241/16), sendo o instituto com melhor aptidão para preservar as relações de afeto, proximidade e confiança que ligam o filho a ambos os pais (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24.1.2017, Rosa Coelho, 954-15). A doutrina e jurisprudência, que se pronunciam contra a residência alternada dos menores em caso de divórcio, invocam a seguinte ordem de argumentos: possibilidade de causar instabilidade à criança; constitui uma fonte de insegurança e de problemas de adaptabilidade; compromete a continuidade e unicidade da educação; é uma situação muito difícil e exigente para a criança; promove a hostilidade entre os progenitores (cf. Joana Salazar Gomes, O Superior Interesse da Criança e as Novas Formas de Guarda, UCP, 2017, pp. 75-80, 85-88; Pedro Raposo de Figueiredo, “A residência alternada no quadro do atual regime de exercício das responsabilidades parentais- A questão (pendente) do acordo dos progenitores”, in Julgar, nº 33, pp. 96-98; Maria Perquilhas, “O exercício das responsabilidades parentais: a residência partilhada (alternada): consensos e controvérsias”, in Divórcio e Parentalidade: Diferentes Olhares: do Direito à Psicologia, 2018, p. 69). Obtemperando à objeção da instabilidade, acompanhamos o raciocínio do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 2.11.2017, Eugénia Cunha, 996/16, quando aí se afirma que: «Não se deve exagerar o facto de a mudança de residência criar instabilidade e, por isso, representar inconveniente para a criança, pois que a instabilidade é uma realidade na vida de uma criança com pais separados, que, sempre, terão de se integrar em duas residências, sendo essa mais uma adaptação a fazer nas suas vidas, sendo certo que as crianças são dotadas de grande aptidão para se integrarem em situações novas.» Conforme refere Maria Teresa Bigote Chorão, O Superior Interesse da Criança e a Fixação da Residência Alternada em Caso de Divórcio, 2019, p. 35, «(…) note-se que qualquer que seja o regime, parece-nos inevitável que se crie esta instabilidade na vida da criança com o divórcio, dado que sempre implica uma alteração radical nos seus moldes de vida.» Refere ainda que: «[o] habitual discurso sobre as desvantagens e os malefícios para a criança do “andar para lá e para cá” deve ser ponderado face aos objetivos de assegurar a continuidade da implicação materna e paterna e da cooperação parental» (p. 33). Também não acompanhamos a argumentação no sentido de que este regime promove a hostilidade entre os progenitores. Além do que já foi mencionado supra (nomeadamente o texto de Daniel Sampaio), acompanhamos o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 6.2.2020, Pedro Martins, 6334/16, quando aí se afirma que: «Cremos ainda não poder dizer-se, sem mais, que a guarda/residência alternada fomenta o conflito entre os progenitores; ao invés, cremos que pode até concorrer para desvanecer os conflitos eventualmente existentes, pois que, com ela, nenhum deles se sentirá excluído ou preterido no seu direito de se relacionar com o filho e de participar ativamente, em termos práticos e psicológicos, no seu desenvolvimento como ser humano, sendo sabido que o progenitor “preterido”, movido pelo sentimento de exclusão que a maioria das vezes o assola, é levado a deixar de cumprir as suas obrigações parentais.» Acresce que, conforme referem Sofia Marinho e Sónia Vladimira Correia, Uma Família Parental, Duas Casas, Edições Sílabo, 2017, p. 257, «Ao invés da residência única, a residência alternada fomenta equilíbrios no desenvolvimento dos dois progenitores na parentalidade, pois permite não só que ambos tenham influência e responsabilidades sobre os cuidados e a educação de filhos e filhas no quotidiano, como também que ambos sejam autónomos e independentes no exercício da parentalidade. Nesta medida, esta é também um instrumento apaziguador de disputas sobre qual o progenitor que melhor serve o bem-estar da criança. (…) quando se favorece o envolvimento parental dos dois progenitores não é necessária uma relação de amizade para que ambos exerçam plenamente a sua parentalidade, pois ao contrário do que acontece na residência única não se atribui a um dos progenitores o poder de incluir ou excluir o outro da vida das crianças. Neste quadro, a concertação de atividades e de decisões entre progenitores ocorre em maior ou menor grau tanto numa relação em que o consenso é fácil como numa relação em que é difícil.» Quanto ao estado da doutrina nacional, anterior à alteração advinda da Lei nº 65/2020, Marianna Chaves, “Responsabilidades parentais e guarda física – Uma distinção necessária”, in Lex Familiae, Ano 16, nº 31-32 (2019), p. 114, resume que: «Mais cautelosa, a doutrina portuguesa considera que, um eventual acordo de exercício conjunto das responsabilidades parentais com residência alternada, somente poderá ser considerado diante de alguns pressupostos, que constituem critérios exemplificativos e orientadores, a serem ponderados pelos juízes e tribunais, tais como: a) capacidade de cooperação entre os progenitores; b) manifesta relação afetiva entre o filho e os pais; c) capacidade dos progenitores em colocar de lado as diferenças pessoais; d) capacidade de dar prioridade às necessidades dos filhos; e) idade e maturidade do filho; f) vontade manifestada pelo filho; g) identidade de estilos de vida e valores; h) capacidade de acordo sobre questões relativas a saúde, educação, religião (questões de particular importância); i) vontade de cooperar aliada a respeito e confiança mútuos; j) proximidade entre as residências dos pais e a escola da criança; k) flexibilidade de horários dos pais; l) ambiente laboral amigo da família.» Na jurisprudência, existe uma corrente significativa que sustenta que o regime da residência alternada não se justifica quando exista um clima de elevada conflitualidade entre os progenitores (cf., exemplificativamente, os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 7.5.2019, Rodrigues Pires, 1655/18, de 24.10.2019, Carlos Portela, 3852/18, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 27.4.2017, Maria João Areias, 4147/16). O histórico da conflitualidade dos progenitores, nomeadamente a sua persistência ou agudização após a separação dos progenitores, constitui um elemento a ponderar na decisão a tomar. Porém, não cremos que tenha um valor assim tão sintomático e perentório para a decisão a tomar pelo tribunal, como é assumido por tal corrente jurisprudencial. Com efeito, conforme se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.6.2019, Ana Rodrigues da Silva, 29241/16: «(…) o critério orientador da decisão a tomar deve ser o superior interesse da criança, sendo fundamental encontrar um equilíbrio entre as várias componentes da vida das crianças por forma a que as mesmas cresçam de forma sadia e equilibrada. Na maioria dos casos, e desde que reunidas as condições logísticas necessárias e que todos os intervenientes sejam emocionalmente estáveis, a única forma de que tal possa suceder é o estabelecimento de residência alternada entre ambos os progenitores, porquanto apenas esta permitirá à criança uma vivência plena com ambos e respetivas famílias alargadas. Não nos parece que o conflito parental possa ser limitador da escolha que melhor acautele o interesse das crianças, esse sim único critério a atender. O citado Ac. TRC de 9-10-2018, refere que “A ideia de que a guarda partilhada expõe a criança ao conflito tem implícita a afirmação de que, em caso de conflito, a criança fica mais protegida se confiada a um deles, o que é extremamente discutível: a confiança a um só dos progenitores ao atribuir a este um poder de facto sobre a criança (progenitor que, na prática tudo decide) em detrimento do outro, que assim se vê afastado do dia-a-dia da criança, alimentando a posição de irredutibilidade do progenitor guardião (que, face ao poder que a guarda exclusiva lhe dá não se vê na necessidade de fazer concessões) e aumentando o sentido de frustração do outro, é potenciador da conflitualidade entre os progenitores”. Por outro lado, e tal como se descreve neste aresto e em vários estudos publicados, a residência alternada diminui o conflito parental, porquanto permite a divisão de responsabilidades entre os pais na gestão quotidiana da vida dos filhos, assim afastando os pontos de discórdia entre ambos. Acresce que, estando as decisões sobre as questões de particular importância atribuídas a ambos os progenitores, esse conflito continuará sempre presente se os progenitores não encontrarem um modo de equilibrar as suas pretensões, atendendo aos interesses dos filhos, podendo a necessidade constante de interação com os filhos e de responsabilização efetiva de cada um dos progenitores na vida destes ser determinante para apaziguar as tensões e os conflitos existentes, muitas vezes relacionados com questões da vida quotidiana.»[18] São também pertinentes as considerações expendidas no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 6.2.2020, Pedro Martins, 6334/16: «III- O argumento da inexistência de conflito entre os progenitores como obstáculo à fixação da residência alternada não tem autonomia em relação aos requisitos negativos para o exercício conjunto das responsabilidades parentais previstos no art.º 1906-A do CC ou à exigência de respeito pelas orientações educativas mais relevantes tomadas pelos dois para esse exercício conjunto. IV- Se a falta de capacidade de diálogo, entendimento e cooperação entre os progenitores não impede o exercício conjunto das responsabilidades parentais, ela não impede também, nem poderia impedir, a residência alternada. Aquelas capacidades só têm a ver com a necessidade de respeito pelas orientações educativas mais relevantes por eles tomadas para o exercício em comum das responsabilidades parentais e de não se porem em causa as condições para esse exercício. V- A exigência de um projeto de vida em comum também não pode ir além da exigência de os progenitores acordarem entre si orientações educativas relevantes para o exercício em comum das responsabilidades parentais. A incapacidade para o fazerem pode ser suprida pelo tribunal e só deve ser impeditiva da residência alternada se puser em perigo a segurança, saúde, formação e educação dos filhos.» O conflito não constitui uma inevitabilidade adquirida, pelo contrário. Conforme se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 10.7.2018, Margarida Sousa, 1138/13: «“A ideia de que a guarda partilhada expõe a criança ao conflito tem implícita a afirmação de que, em caso de conflito a criança fica mais protegida se confiada a um deles, o que é extremamente discutível: a confiança a um só dos progenitores ao atribuir a este um poder de facto sobre a criança (progenitor que, na prática tudo decide) em detrimento do outro, que assim se vê afastado do dia-a-dia da criança, alimentando a posição de irredutibilidade do progenitor guardião (que, face ao poder que a guarda exclusiva lhe dá não se vê na necessidade de fazer concessões) e aumentando o sentido de frustração do outro, é potenciador da conflitualidade entre os progenitores” (Acórdão da Relação de Lisboa de 07.08.2017 – Relator, Pedro Martins). Com propriedade se pode, pois, dizer que: “O problema é, afinal e sempre, o conflito”. Tendo consciência disso, o legislador, ao aprovar um novo Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC), centrou o processo “no paradigma da gestão do conflito parental e em encontrar assim soluções que mantenham ambos os pais na vida da criança com grande proximidade”, sendo que, para tal, necessário se torna desenvolver “plataformas de funcionamento conjunto que criam novas emoções positivas, que depois contribuem para ultrapassar as memórias emocionais negativas vindas, em regra, da “separação conjugal” e, por outro lado, gerar “um envolvimento total dos mesmos (progenitores), que impede abandonos parentais” (autor e obra citados, pág.´s 134 e 135). O processo judicial deve, pois, servir para alterar comportamentos, não se aceitando o conflito como uma inevitabilidade, sendo, para o efeito, essencial o recurso pelo julgador a assessoria técnica com vista à avaliação e acompanhamento dos progenitores em conflito, por forma a alterar os paradigmas que os conduzem aos comportamentos conflituantes e a, desse modo, se alcançar a conciliação, a tentar em várias sessões, caso tal se revele necessário (neste sentido, ver obra e autor citados, págs. 102 a 104 e 109), o que implica uma diferente postura dos tribunais, um maior empenhamento destes na construção das aludidas plataformas de funcionamento com vista ao exercício conjunto das responsabilidades parentais» (sublinhado nosso). A recente alteração ao Artigo 1906º do Código Civil, efetuada pela Lei nº 65/2020, de 4.11, sana divergências doutrinárias e jurisprudenciais quanto à admissibilidade da residência alternada e regime desta, clarificando que a imposição de tal regime prescinde do acordo dos pais, mas não da competência e aptidão dos mesmos na medida em que o fundamento da imposição da residência alternada é sempre a salvaguarda do superior interesse da criança. Cremos, também, que esta redação não sana a discussão sobre a pertinência da residência alternada para crianças de tenra idade (cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.6.2020, Jorge Leal, 2973/18, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 7.5.2019, Rodrigues Pires, 1655/18, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11.12.2018, Alberto Ruço, 2311/18), discussão que não é pertinente neste processo. Desta nova redação do Artigo 1906º não resulta também que a residência alternada seja tida pelo legislador como o regime regra. Com efeito, o texto definitivo diverge, substancialmente, da Proposta de Lei nº 87/XIV/1ª do PS que tinha o seguinte teor: «O tribunal privilegia a residência alternada do filho com ambos os progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação de alimentos, sempre que, ponderadas todas as circunstâncias relevantes, tal corresponda ao superior interesse daquele» https://debates.parlamento.pt/catalogo/r3/dar/s2a/14/01/016/2019-11-19/32?pgs=31-33&org=PLC&plcdf=true. No que tange à primazia do interesse da criança, «(…) o interesse da criança é o núcleo duro que o legislador estabelece como o denominador intransponível nas decisões relativas à vida de uma criança sendo o pressuposto de qualquer decisão, e integrar tendo em conta a sua vida, os seus interesses e as consequências das opções e decisões, tendo em conta o seu desenvolvimento, identidade e dignidade» (Marisa Almeida Araújo, “A pluriparentalidade - O direito à convivência”, in Lex Familiae, Ano 16, N.º 31-32 (2019), p. 131). Segundo o Comentário geral n.º 14 (2013) do Comité dos Direitos da Criança sobre o direito da criança a que o seu interesse superior seja tido primacialmente em consideração, p. 17, «O conceito do interesse superior da criança é, portanto, flexível e adaptável. Deverá ser ajustado e definido numa base individual, em conformidade com a situação específica da criança ou das crianças envolvidas, tendo em conta o seu contexto, situação e necessidades pessoais. Nas decisões individuais, o interesse superior da criança deve ser avaliado e determinado à luz das circunstâncias específicas da criança em particular. Nas decisões coletivas – tais como as que emanam do legislador – o interesse superior das crianças em geral deve ser avaliado e determinado à luz das circunstâncias do grupo específico e/ou das crianças em geral.» O superior interesse da criança integra uma orientação para o julgador perante o caso concreto «no sentido de que a primazia deve ser dada à figura da criança como sujeito de direito, nomeadamente ao direito de manter relações gratificantes e estáveis com ambos os progenitores, obrigando estes a respeitar e fazerem respeitar esse interesse do menor» (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 16.1.2017, Madeira Pinto, 2055/16)”. Neste contexto, sendo abstractamente mais adequada para uma criança ou jovem a guarda partilhada, e assumindo que o farol a levar em consideração numa decisão sobre esta matéria é sempre o do superior interesse do menor (como acima já assinalámos), concordamos com Magda Fernandes e Irene Teixeira de Oliveira quando escrevem[19] que, tratando-se este de um conceito amplo e indeterminado, tal implica o recurso a “um conjunto variado de elementos que o possam preencher”, nomeadamente: - a “análise do contexto familiar, verificando a relação que o menor apresenta com cada um dos progenitores e as condições psicológicas e práticas que estes demonstram para cuidar do menor, exercendo de forma conjunta e partilhada as responsabilidades parentais”; - a verificação de “critérios impeditivos”, como: - “a verificação de um histórico de violência doméstica ou de maus-tratos, a incapacidade prática de tratar do menor, seja por indisponibilidade temporal, seja por distanciamento emocional ou por questões práticas, como o não saber alimentar e prestar os cuidados básicos de saúde, entre outros”; - a “existência de uma diversidade acentuada no que respeita aos horários de refeição e às horas de sono é também um fator que desaconselha este regime, na medida em que essa diferença tenha repercussões nos hábitos alimentares, nas rotinas de sono e, por consequência, no rendimento escolar do menor”; - “Sintomas de desleixo no acompanhamento escolar, no incutir de irresponsabilidade pela permissão de faltas injustificadas a atividades escolares e extracurriculares é outro indicador desfavorável”; - “A elevada conflitualidade entre os pais, encontrando-se em permanente competição, inviabiliza a comunicação necessária para a eficiência deste regime, bem como a localização geográfica muito distante das residências de ambos os progenitores ou afastada da zona escolar que o menor frequenta”; - “o fator económico não deixa de ser ponderado, sendo desaconselhável a implementação deste regime quando as condições financeiras dos dois progenitores sejam discrepantes”; - a “idade da criança é também apontada, algumas vezes, como critério”. Feito este enquadramento, só podemos sancionar o raciocínio, considerações e conclusões que resultam da bem elaborada Sentença, a qual culmina – efectivamente – com uma decisão totalmente adequada ao circunstancialismo concreto que envolve o L…, seja pela idade deste, seja pelas competências dos progenitores, seja por ambos constituírem figuras de referência para ele, seja por ambos terem condições económicas e logísticas para terem consigo o filho, seja por não haver obstáculos geográficos, seja por inexistirem implicados quaisquer sacrifícios exagerados, incomportáveis ou inexigíveis, seja por haver até um equilíbrio temporal na separação do outro progenitor (de três em três dias). Esta questão dos três dias, sublinhe-se, certamente que com o passar do tempo se adaptará ao ritmo de vida do L… e dos seus progenitores e poderá sofrer adaptações e alterações, que estes mesmos verificarão e assumirão em concreto (ou que o Tribunal, se a sensatez não imperar, poderá apreciar) Por outro lado, também esta cadência, obsta acrítica de que qualquer dos progenitores tenham mais fins-de-semana com o L… que o/a outro/a. As divergências que entre os progenitores existem não são obstaculizadoras do regime fixado e até nisso o Tribunal ponderou, pois - assumindo a sua existência - não as sobrepôs ao interesse do L… e procurou criar, simultaneamente, condições para as mitigar e minorar, determinando, nos termos do artigo 40.º, n.º 6, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, pelo período de 6 meses, a intervenção do Centro de Terapia Familiar, “em vista a debelar as dificuldades de comunicação entre os progenitores”. O superior interesse do L… exige dos seus progenitores um esforço e uma responsabilização pelos seus próprios comportamentos, assumindo a situação como normal, natural, aprendendo a conviver com ela e aproveitando-a. Espera-se dos progenitores comportamentos colaborantes, preocupados e altruístas e demonstrando mais tolerância e atenção ao L… e às suas necessidades, aceitando nomeadamente a intervenção técnica que pode ajudar a continuar a reequilibrar todo este conjunto relacional, e permitindo-lhes assumir essa parentalidade positiva (respeitando o/a outro/a progenitor/a, respeitando o filho e o seu crescimento, desenvolvimento e evolução), criando assim as condições para que o panorama que se nos apresenta neste momento evolua de forma ainda mais favorável. Às vezes é preciso saber parar e fazer uma reflexão crítica sobre o se está a fazer e como se está a fazer (e ler com atenção e abertura de espírito o que os/as técnicos/as dizem), sem prejuízo da(s) razão(ões) que se te(ê)m ou se sente(m). Por um bem maior. É esse o superior interesse do L…. É esse o superior interesse dos progenitores em terem o filho L… (o mais) feliz (possível) e partilhando essa felicidade. ** DECISÃO Com o poder fundado no artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, e nos termos do artigo 663.º do Código de Processo Civil, decide-se, nesta 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, face à argumentação expendida e tendo em conta as disposições legais citadas, julgar improcedente o recurso e, em conformidade, confirmar a Sentença recorrida. Custas a cargo da Recorrente. Notifique e, oportunamente remeta à 1.ª Instância (artigo 669.º do Código de Processo Civil). ** Lisboa, 07 de Novembro de 2023 Edgar Taborda Lopes Cristina Coelho José Capacete _______________________________________________________ [1] António Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 6.ª edição Atualizada, Almedina, 2020, página 183. [2] Na Sentença consta “5 de julho de 2022”, o que corresponde a um manifesto lapso, verificável quer do teor da Sentença, quer da Certidão de Nascimento junta com o Requerimento Inicial, a 20/05/2022. [3] E seguiremos aqui o que se teve oportunidade de deixar expresso no Acórdão desta Relação de 10 de Maio de 2022 (Processo n.º 1832/17.6T8TVD-B.L1, disponível em https://aminhajurisprudencia.blogspot.com/2022/05/). [4] Com pertinência, Pedro Raposo de Figueiredo, sublinha que “a residência alternada promove o exercício da parentalidade positiva e uma consistente convivência com ambos os progenitores, sendo um fator relevante de pacificação de tensões e conflitos, sobretudo, por colocar os pais em posição de estrita igualdade” (“A residência alternada no quadro do atual regime de exercício das responsabilidades parentais- A questão (pendente) do acordo dos progenitores”, in Julgar, n.º 33, 2017, página 102, disponível em http://julgar.pt/wp-content/uploads/2017/09/04R-Pedro-Raposo-de-Figueiredo-A-resid%C3%AAncia-alternada-rectificado.pdf). [5] O que, cremos, ninguém nos autos coloca em causa, independentemente das divergências assumidas. [6] “O superior interesse da criança não deve ser apreciado segundo critérios subjetivos da vontade dos pais ou da própria criança” diz-se, com notável lucidez, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11/10/2018 (Processo n.º 27942/12.8T2SNT-F.L1-2-Gabriela Rodrigues), tratando-se, como se vê, de um conceito vago, indeterminado e genérico, mas que necessariamente envolve “o direito do menor ao desenvolvimento são e normal no plano físico, intelectual, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade”, como já em 1985, assinalava Almiro Rodrigues (vd., “Interesse do Menor, contributo para uma definição”, in Revista de Infância e Juventude, n.º 1, 1985, páginas 18 e 19, e Análise Psicológica, 1986, 3/4 (IV), páginas 461-482(468), também disponível em https://repositorio.ispa.pt/bitstream/10400.12/2135/1/1986_34_461.pdf [consultado a 26/12/2022]. [7] Guilherme de Oliveira, Manual de Direito da Família, 2.ª edição, Almedina, 2021, página 354. [8] António Gomes, Família(s): um palco para relações, in Revista do CEJ, 2020-I, CEJ/Almedina, 2020, página 320. [9] O Acórdão da Relação do Porto de 12 de Julho de 2017 (Processo n.º 554/14.4T2OBR-A.P1-Vieira e Cunha) afirma, de forma lapidar, que nas regulações das responsabilidades parentais “subsequentes a divórcios ou separações, não existem pais vencedores, ou mais valorosos que outros – trata-se de uma forma convencional, regulada por lei e arbitrada por um terceiro, o tribunal, de minorar os efeitos potencialmente negativos de uma separação em que os pais, por vezes, persistem em não se entender, relativamente ao destino dos seus filhos” (vd., também, da mesma Relação e Relator, o Acórdão de 28 de Abril de 2015, no Processo n.º 530/14.2TMPRT-E.P1). [10] E a arrogância nunca é boa conselheira. Porque prejudica os resultados. [11] Sublinhado e carregado nossos. [12] Assim, também, Acórdão da Relação de Évora de 14 de Julho de 2020 (Processo n.º 546/19.7T8PTM.E1-Mário Coelho). [13] Que define o regime essencial nesta matéria: - no artigo 69.º n.ºs 1 e 2, quando afirma que as crianças têm direito à protecção da sociedade e do Estado com vista ao seu desenvolvimento integral, em particular contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições, cabendo ao Estado, em especial, assegurar proteção às crianças órfãs, abandonadas ou por qualquer forma privadas de um ambiente familiar normal; - no artigo 36.º, n.ºs 5 e 6 quando estipula que os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos e não podem de estes ser separados, salvo quando não cumpram os deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial. [14] Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas 1836 (XIV), de 20 de Novembro de 1959. [15] Adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 20/11/1989, assinada por Portugal em 26/01/1990, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 20/90, de 12 de Setembro, e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 49/90, de 12 de Setembro. Nela se impõe aos Estados (para além de tomar medidas de protecção das crianças contra todas as formas de violência física ou mental, dano ou sevícia, abandono ou tratamento negligente, maus tratos ou exploração, quer se encontrem sob a guarda dos pais ou de qualquer outra pessoa a quem tenham sido confiadas - artigo 19.º, n.º 1), vele para que as crianças apenas sejam separadas de seus pais se essa separação se mostrar necessária “no interesse superior da criança”: é o que dispõe o se artigo 9.º, n.º 1 (“Os Estados Partes garantem que a criança não é separada dos seus pais contra a vontade destes, salvo se as autoridades competentes decidirem, sem prejuízo de revisão judicial e de harmonia com a legislação e o processo aplicáveis, que essa separação é necessária no interesse superior da criança. Tal decisão pode mostrar-se necessária no caso de, por exemplo, os pais maltratarem ou negligenciarem a criança ou no caso de os pais viverem separados e uma decisão sobre o lugar da residência da criança tiver de ser tomada”- itálico nosso). [16] Dos quais decorre que incumbe aos pais, no interesse dos filhos, velar pela sua segurança e saúde, prover ao seu sustento e dirigir a sua educação até à respetiva maioridade ou emancipação. [17] Ambos tendo como segundo adjunto o também aqui segundo adjunto (Juiz Desembargador José Capacete). [18] Em complemento à citação dos Acórdãos de Relação de Lisboa de 15 de Dezembro de 2020 e 11 de Janeiro de 2022, em que nos encontramos, acrescenta-se ainda, a propósito deste Acórdão da mesma Relação, de 18 de Junho de 2019, a anotação concordante de Margarida Silva Pereira, in Direito da Família, 3.ª edição-reimpressão, AAFDL, 2020, páginas 608-612. [19] Magda Fernandes-Irene Teixeira de Oliveira, Tendências jurisprudenciais e atuais da guarda partilhada: os eventuais impactos da pandemia neste regime de responsabilidades parentais [em linha], Julgar Online, Novembro de 2020, páginas 12 a 14, disponível em https://julgar.pt/wp-content/uploads/2020/11/20201120-JULGAR-Tend%C3%AAncias-atuais-da-Guarda-Partilhada-em-Portugal-Magda-FeTend%C3%AAncias-atuais-da-Guarda-Partilhada-em-Portugal-Magda-Fernandes-e-Irene-T-Oliveira.pdf. |