Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
0277003
Nº Convencional: JTRL00005963
Relator: DINIS ALVES
Descritores: FALSIDADE
FALSIDADE INTELECTUAL
FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO
INDÍCIOS
OMISSÃO
OMISSÃO DE DILIGÊNCIAS ESSENCIAIS
INDÍCIOS SUFICIENTES
OMISSÃO
DOLO
OMISSÃO
NEGLIGÊNCIA
Nº do Documento: RL199205200277003
Data do Acordão: 05/20/1992
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: PROVIDO.
Área Temática: DIR CRIM.
DIR PROC PENAL.
Legislação Nacional: CP82 ART228 N1 B ART233 N3 ART13.
Sumário: I - No despacho de pronúncia consigna-se que os arguidos eram os únicos sócios da sociedade por quotas; no dia 4.12.1985 (sic), num Cartório Notarial,representados por M.N.C., celebraram escritura pública de dissolução e liquidação da sociedade; fizeram aí constar que a sociedade não tinha activo nem passivo; mas, a mesma havia sacado 5 letras, no valor global de 64800, escudos aceites pela sociedade B. & L., Lda; as letras de câmbio foram descontadas por BFB, que entregou a sua importância aos arguidos; as letras não foram pagas no vencimento, nem posteriormente, sendo protestadas; o BFB, em acção judicial, exigiu aos arguidos e à B. &
L., Lda o pagamento daquela quantia acrescida de juros, sendo, então, confrontado com a existência da escritura; sabiam os arguidos que deviam essa quantia ao BFB e que a B. & L., Lda não se obrigara perante o Banco; sabiam também que não correspondia à verdade o que haviam feito constar da escritura e que, com a sua actuação, prejudicavam o BFB e, além disso, punham em crise a credibilidade merecida pelas escrituras públicas, de modo proibido por lei.
II - O resultado da pronúncia não coincide, porém, com a matéria do processo: - é que este compulsado - não permite a conclusão (por falta de indícios) de que os arguidos tivessem agido, com a intenção de causar prejuízo ao Banco que descontou as letras, a qualquer outra pessoa ou ao Estado, quando naquela escritura de dissolução fizeram a declaração de não haver lugar a partilha, dado a dissolvida não ter activo nem passivo, pelo que, devido a carência de elemento subjectivo típico do crime de falsificação, descrito no artigo 228, n 1, al.b), e 2, do Código Penal (CP), o mesmo não ocorre aqui.
III - Outrossim - dados os factos-, não se tipifica o crime descrito no artigo 233, n. 2, CP, em que se não exige o prejuízo patrimonial, pois o bem jurídico protegido
é a credibilidade dos documentos a que a Lei atribui fé pública, não só porque a instrução preparatória não foi directamente dirigida à recolha de indícios de que os arguidos conhecessem a existência de passivo na sua sociedade, mas também, sobre o pagamento ou não das letras sacadas pela sociedade, aceites por B & L, Lda, nem sequer foi ouvido o legal representante desta; não obstante, a favor do conhecimento da dívida, pode argumentar-se que, quando foi lavrado o protesto pelo não pagamento das letras, os arguidos, como gerentes da sociedade e sacadores responsáveis pelo seu pagamento, foram notificados do não pagamento de uma das letras. Só que, porém, a notificação do protesto quanto à letra no valor de 13100 escudos foi feita antes de 20.10.1982 e a execução sumária foi instaurada em 22.07.1985; a citação do arguido A, na qualidade de legal representante da sociedade sacadora, verificou-se em 19.11.1985, enquanto a escritura de dissolução da sociedade foi celebrada em 4.10.1985, - donde deriva a dificuldade em sustentar tivessem os arguidos conhecimento do não pagamento dessa letra de tão reduzido montante e quando já haviam decorrido quase três anos sobre a data do protesto. É possivel hajam eles actuado com negligência, mas o crime descrito no artigo 233, n. 2, CP é essencialmente doloso, como
é a regra, e, aqui, não há excepção (artigo 13 CP).