Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
13610/21.3T8SNT-A.L1-7
Relator: CONCEIÇÃO SAAVEDRA
Descritores: TÍTULO EXECUTIVO COMPLEXO
CONTRATO DE ARRENDAMENTO
NRAU
FIADOR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/27/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: O título executivo complexo formado nos termos do art. 14-A do NRAU abrange, não só o arrendatário, mas também o fiador, e integra igualmente a indemnização devida pelo atraso na restituição do locado, nos termos do art. 1045 do C.C..

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

IRelatório:

A [Sandro ….]  veio, em 24.11.2021, deduzir oposição por embargos à execução comum, com o valor de € 9.400,00, que contra si foi instaurada por B […..Investimentos Imobiliários, Lda. ].Tendo esta, invocando o art. 14-A do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), dado como título executivo contrato de arrendamento acompanhado do comprovativo de comunicação ao executado, fiador do arrendatário, do montante em dívida, sustenta o embargante a inexequibilidade do título, alegando que a notificação indicada na referida norma só permite formar título executivo contra o arrendatário e não contra o fiador. Mais invoca a extinção da fiança por não ser responsável pelo valor reclamado, respeitante apenas ao incumprimento do arrendatário quanto à devolução do locado, posto que não contribuiu para a demora na restituição. Pede a procedência dos embargos e a extinção da execução.

Recebidos os embargos, contestou a exequente invocando, no essencial, que o título executivo referido no art. 14-A do NRAU se forma também relativamente ao fiador, como é entendimento dominante da jurisprudência, pelo que o envio ao embargante da comunicação do valor em dívida acompanhada do contrato de arrendamento que este subscreveu constitui contra o mesmo título executivo bastante. Mais refere que o embargante é responsável pela dívida exequenda nos termos contratados, tanto mais que esta foi corretamente identificada na comunicação efetuada ao mesmo. Conclui pela improcedência dos embargos e pelo prosseguimento da execução.

Em 27.3.2022, foi dispensada a realização de audiência prévia e proferido despacho saneador que conferiu a validade formal da instância e, considerando que o estado dos autos já o permitia, decidiu nos seguintes termos: “(…) julgo IMPROCEDENTES os presentes embargos de executado e, por conseguinte, os autos de execução deverão prosseguir os seus ulteriores termos.

Custas pelo executado/embargante – artigo 527.°, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Fixa-se o valor da causa no montante da causa dos autos de execução a que se reporta, ou seja, em €9.400,00 (nove mil e quatrocentos Euros), nos termos do disposto nos artigos 306º, n.ºs 1 e 2, e 307.°, n.° 1, do Código de Processo Civil.

(…).”

Inconformado, interpôs recurso o embargante/executado, apresentando as respetivas alegações que culmina com as conclusões que aqui se transcrevem:


A.O Tribunal de 1.ª instância julgou improcedentes, em sede de despacho saneador, os embargos de executado apresentado pelos Recorrente;
B.A Recorrida e o Senhor Francisco ….. celebraram um contrato de arrendamento para habitação referente à fração autónoma destinada a habitação, designada pela letra "F", correspondente ao 3º andar Direito do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Avenida ..... ..... ....., número ….., em ....., União das freguesias de ..... e ....., concelho de Sintra, descrito na Conservatória do Registo Predial de ..... sob o n.º ...., e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...., com a Licença de Utilização n.º ..., emitida pela Câmara Municipal de Sintra, em 27.01.1961, tendo o Recorrente se constituído fiador do referido contrato;
C.Sucede que a Recorrida intentou um processo no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4, no âmbito dos autos que correram termos sob o Processo n.º 2259/19.0YLPRT contra o arrendatário Francisco ....., no qual este foi condenado, com especial interesse nestes autos, a pagar à aqui Recorrida a título de indemnização por atraso na entrega do locado, a quantia que, nesta data, se cifra em nove mil euros, acrescida do montante mensal de quatrocentos euros relativo aos meses que decorrerem desde fevereiro de 2018 até á data efetiva entrega do locado à Autora, aqui Recorrida;
D.O Recorrente não foi parte no processo identificado em C);
E.Não obstante, por carta registada datada de 17 de fevereiro de 2021 foi o Recorrente interpelado pela Recorrida para efetuar o pagamento de € 9.400 (nove mil e quatrocentos euros) a título de indemnização por entrega tardia do locado;
F.–Uma vez que o Recorrente não pagou (e desconhece-se se o arrendatário Francisco ….), a Recorrida intentou ação executiva, apresentando como título a missiva referida em E.;
G.–O Recorrente quando foi citado apresentou os seus respetivos embargos tendo o Tribunal a quojulgado no Despacho Saneador que os mesmos eram improcedentes;

H.–Em sede de embargos o Recorrente alegou em síntese duas situações:
i.-Da não vinculação do Recorrente a sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4, no âmbito dos autos que correram termos sob o Processo n.º 2259/19.0YLPRT, o qual condenou o arrendatário no pagamento de uma indemnização de € 9.000 pela entrega tardia do locado;
ii.-Da irresponsabilidade do fiador após a cessação do contrato de arrendamento;

I.–Quanto a i) não obstante o título apresentado a execução ser uma carta enviada pela Recorrida ao Recorrente a verdade é que, do teor da mesma é pedido o pagamento de € 9.400 (nove mil e quatrocentos euros) a título de indemnização que havia sido decidido no âmbito do Processo n.°2259/19.0YLPRT, no qual o Recorrente não foi parte;
J.–Quanto a ii) diga-se que tem sido entendimento dos nossos tribunais que o pagamento da indemnização prevista no nº 2 do art. 1045º nº 1 do C. Civil, não é da responsabilidade do fiador mas sim, do próprio arrendatário;
K.–O Fiador (aqui Recorrente) não pode ser responsabilizado pela entrega tardia de um Locado, quando não pode ter qualquer controle sobre o arrendatário;
L.–A responsabilidade do fiador, em situações como a presente, em que aquele se comprometeu a garantir as obrigações do arrendatário perante a senhoria, aqui Embargada, até à entrega do locado, respeitam à renda em singelo até à efetiva desocupação e entrega (cfr. Acórdão do STJ de 9.11.1999 – proc. nº 99A668), mas não pode abarcar a responsabilidade pelo incumprimento na devolução, exceto se se provasse que o próprio fiador, pessoalmente, contribuíra ou colaborara na demora da restituição, o que não é o caso.
M.–Nestes termos, a exigência ao fiador, aqui Recorrente, da indemnização pelo atraso na devolução, a que se reporta o n.º 2 do art. 1045º do C. Civil, não é exigível a este, uma vez que este para além não ter sido prontamente informado da cessação do contrato (facto este que foi alegado em sede de embargos e que o Tribunal a quo não ser importante para a boa decisão da causa) e da necessidade de entrega do locado, este nunca iria obstar ou dificultar a entrega do mesmo, podendo inclusive auxiliado na entrega imediata do mesmo.
N.–Por tudo o exposto, deveria o Tribunal decidido pela procedência dos embargos de executados apresentados pelo Recorrente.

Normas Violadas:
Art. 1045/nº 2 do CC
Art. 703º do CPC
Art. 14.º-A (Título para pagamento de rendas, encargos ou despesas) da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro (que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano, na redação introduzida pela Lei n.º 31/2012 de 14 de Agosto).”

Pede a procedência do recurso e a revogação da decisão recorrida.

Em contra-alegações, defende a embargada o acerto do julgado, alinhando as seguintes conclusões:


A)–Para se formar o título executivo a que alude o artigo 14°-A do NRAU por força do artigo 9°, n.° 7, do NRAU, ex-vi artigo 1084°, n.° 2, do Código Civil, basta a interpelação acompanhada do contrato de arrendamento, na qual, se discrimine a origem da dívida e respectivo cômputo;
B)–O título que serve de base à execução sub judice, é [1] a comunicação da autoria do mandatário da Recorrida, datada de 17 de Fevereiro de 2021, [2] acompanhada do contrato de arrendamento;
C)–Afigura-se absoluta e inequivocamente irrelevante para/na apreciação do mérito dos presentes autos, a intervenção ou não do Recorrente, naqueloutros que correram termos sob o Processo n.° 2259/19.0YLPRT, no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4, e consequentemente, a sua vinculação ou não à sentença aí proferida;
D)–Sendo certo que, o direito de defesa do Recorrente, sempre estaria assegurado, precisamente, conforme o fez, deduzindo embargos à execução que contra si moveu a Recorrida;
E)–A Recorrida entendeu por bem, anexar a sentença em apreço àquela interpelação - única e exclusivamente -, como documento suporte, susceptível de demonstrar a liquidação dos valores em dívida, ou seja, todos os dados para o cálculo aritmético dos montantes em dívida.
F)–Nos termos contratualizados, o Recorrido, na qualidade de fiador, é solidária e pessoalmente responsável pelas obrigações advenientes do contrato, nas quais expressamente aí se incluem as indemnizações, pela entrega tardia do locado.
G)–A fiança assim prestada deverá pois, subsistir até à efectiva restituição do local livre e devoluto e nas condições estipuladas;
H)–A fiança não se extingue com a cessação do contrato de arrendamento;
I)–Devendo responder também, pelo valor devido a título de indemnização pelo atraso na entrega do locado;
J)–A posição jurisprudencial dominante à presente data, é a de que o legislador equipara as quantias devidas nos termos do artigo 1045° do CC, a rendas.”

O recurso foi admitido como apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

*

II–Fundamentos de Facto:

A decisão da 1ª instância fixou como provada a seguinte factualidade:
1)–No dia 10 de Setembro de 2021, foi dada em execução sentença, que aqui se dá por integralmente reproduzida, proferida a 6 de Janeiro de 2021, no âmbito do processo n.° 2259/19.0YLPRT, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4.
2)–Nesses autos a exequente figurou como autora e como réu Francisco ….. ..

3)–Por força dessa sentença, transitada em julgado, este último foi condenado nos seguintes termos:

5.–Decisão.
Em face do exposto,
a)-Declaro a instância extinta por inutilidade superveniente da lide no que tange ao pagamento das rendas referentes aos meses de junho de 2018 a setembro de 2018 e à quantia de dois mil e duzentos euros quanto ao pagamento da indemnização por atraso na entrega do locado;
b)-Julgo a ação procedente, por provada, quanto ao mais e, em consequência:
1.Condeno o R a proceder à imediata entrega da fração autónoma destinada a habitação, designada pela letra "F", correspondente ao 3° andar Direito do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Avenida ..... ..... ....., número ..., ... e ..., em Queluz, União das freguesias de Queluz e Belas, concelho de Sintra, descrito na Conservatória do Registo Predial de Queluz sob o n.° ...., e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...., com a Licença de Utilização n.° ..., emitida pela Câmara Municipal de Sintra, em 27.01.1961 à A. livre e devoluto de pessoas e bens,
2.Condeno a R a pagar à A, a titulo de indemnização por atraso na entrega do locado, a quantia que, nesta data, se cifra em nove mil euros, acrescida do montante mensal de quatrocentos euros relativo aos meses que decorrerem desde fevereiro de 2018 até à efetiva entrega do locado à A.

4)– No requerimento executivo alega nos factos:

«1º-A Exequente é a dona e legítima proprietária da fracção autónoma destinada a habitação, designada pela letra "F", correspondente ao ...° andar Direito do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Avenida ..... ..... ....., número ..., ... e ..., em ....., União das freguesias de ..... e ....., concelho de Sintra, descrito na Conservatória do Registo Predial de ..... sob o n° ...., e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...., com a Licença de Utilização n.° ..., emitida pela Câmara Municipal de Sintra, em 27.01.1961, conforme documento n.° 1, que se junta e dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais.
2º-Em 1 de Setembro de 2015, a Exequente, mediante contrato escrito celebrado com o arrendatário, Francisco ….. e com o ora Executado, A, este, na qualidade de fiador, deu àquele de arrendamento a fracção autónoma acima identificada, para fim habitacional, que aqui se dá por integralmente reproduzido sob documento n.° 2.
3º-O contrato foi celebrado com prazo certo de 1 (um) ano, com início em 1 de Setembro de 2015, tacitamente renovado por iguais e sucessivos períodos de um ano, (cfr. Cláusula Segunda do documento n.° 2).
4º-As partes contraentes estipularam a obrigação de pagamento da renda mensal de 400,00 (quatrocentos euros) – a qual, se mantém inalterada à presente data -, com vencimento no primeiro dia do mês a que dissesse respeito (cfr. Cláusula Quarta do documento n.º 2),
5º-Sucedeu porém, que o arrendatário não pagou o valor de 9.400,00 (nove mil e quatrocentos ouros), a título de indemnização por atraso na entrega do locado,
- Nem o fez posteriormente.
7º- Razão pela qual, a ora Exequente se viu forçada a recorrer ao procedimento especial de despejo, não apenas com vista à desocupação do locado livre e pessoas de bens, mas também, com vista ao pagamento daquele valor indemnizatório.
8º-Na sequência de tal procedimento, o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4, no âmbito dos autos que correram termos sob o Processo n.° 2259/19.0YLPRT, sentenciou, condenando o arrendatário, Francisco …., para além na desocupação do locado, também, no pagamento de 9.400,00 €, a título de indemnização por atraso na entrega daquele, conforme documento n.° 3, que se junta e dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais.
9º-Atento o incumprimento do arrendatário no pagamento daquela quantia, a Exequente – por intermédio do seu mandatário –, interpelou o ora Executado, por carta registrada com aviso de recepção, datada de 17 de Fevereiro de 2021, conforme documento n.° 4, que se junta e dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais.
10º-Ocorre porém, que, não obstante, tal interpelação, também o ora Executado, também não procedeu a qualquer pagamento, até à presente data.
11º-Sendo certo que, atenta a sua qualidade de fiador do arrendatário, Francisco ……, encontra-se adstrito ao cumprimento de tal obrigação (cfr. Cláusula Décima Primeira do documento n.° 2).
12º-Ora, nos termos do disposto no artigo 14° A, do NRAU, o contrato de arrendamento [documento nº 2], quando acompanhado do comprovativo da comunicação do montante da divida [documento nº 4], é título executivo para execução para o pagamento da(s) respectivas quantia(s) em dívida(s).
12º-Finalmente, importa referir, que a dívida exequenda sub judice se afigura certa, líquida e exigível.».

5)–A exequente apresentou igualmente como título executivo contrato de arrendamento, que aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual figura como senhoria, Francisco ….. e o ora embargante e único executado como fiador nos seguintes termos:
11ª
1.-Pelo presente contrato, o Terceiro Contraente obriga-se pessoalmente e solidariamente com o Segundo Contraente, com expressa renúncia ao benefício da excussão prévia, pelo cumprimento das obrigações previstas neste contrato de arrendamento e de qualquer das suas cláusulas, abrangendo, designadamente, o pagamento das rendas, despesas diversas, juros, penalidades, acréscimos legais, danos, prejuízos, indemnizações e outros encargos legalmente exigíveis ou previstos no presente contrato de arrendamento, que, pelo Segundo Contraente, porventura, venham a ser devidas, quer no período inicial quer ainda em todas as suas renovações, mesmo que haja alterações da renda agora fixada.

6)–A exequente apresentou igualmente como título executivo carta registada com aviso de recepção, que aqui se dá por integralmente reproduzida, dirigida ao executado/embargante datada de 17 de Fevereiro de 2021, na qual consta:
Solicitou-me a minha Exma. Cliente, sociedade comercial com a firma "…..Investimentos Imobiliários, Lda." - na qualidade de senhoria da fracção autónoma correspondente ao ...° andar Direito do prédio sito na Avenida ..... ....., n.° ..., em ..... e relativamente ao qual, é arrendatário Francisco ….. e V. Exa. fiador deste -, que procedesse à cobrança coerciva do valor global de 9.400,00 C (nove mil e quatrocentos euros), "(...) a título de indemnização por atraso na entrega do locado (...)", conforme resulta da sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4, no âmbito do Processo n.° 2259/19.0YIPRT, datada de 6 de Janeiro pp., em anexo.
Pelo que, aguardarei o pagamento voluntário daquele valor global de 9.400,00 (nove mil e quatrocentos euros), pelo prazo de cinco (5) dias.

*

III–Fundamentos de Direito:


Como é sabido, são as conclusões que delimitam o âmbito do recurso. Por outro lado, não deve o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido suscitadas no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar, a não ser que sejam de conhecimento oficioso.

Compulsadas as conclusões da apelação, cumpre apreciar:
- Do título executivo e da não vinculação do embargante à sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4, no âmbito do Processo n.º 2259/19.0YLPRT, que condenou o arrendatário no pagamento de uma indemnização de € 9.000,00 pela entrega tardia do locado;
- Da extinção da responsabilidade do executado/fiador com a cessação do contrato de arrendamento.
*

Na sentença recorrida entendeu-se que a exequente se encontrava munida de título executivo bastante e que a obrigação do executado, fiador no contrato de arrendamento, não se extinguira, do seguinte modo: “(…) É certo que a sentença não o abrange (ao embargante) na força de caso julgado. Daí que seja lícito ao executado deduzir a defesa que poderia ter deduzido nessa acção caso tivesse sido chamado aí a intervir.

Todavia, o título executivo não é a sentença, mas sim um título executivo complexo formado pela sentença, pelo contrato de arrendamento e a carta registada com aviso de recepção.

A sentença reconhece que o inquilino é devedor à exequente da quantia exequenda.

O contrato de arrendamento reconhece que o executado, na qualidade de fiador, é solidária e pessoalmente responsável pelas obrigações advenientes do contrato, nas quais expressamente aí se incluem as indemnizações. A obrigação exequenda consiste justamente em indemnização pela entrega tardia do locado.

A carta dá conhecimento ao executado da existência da obrigação exequenda, que acompanhada pela sentença, elucida o executado da origem da dívida.

Em bom rigor, o exequente nem precisaria da sentença para ficar munido de título executivo, dado que bastaria a referida interpelação acompanhada do contrato, na qual se discriminasse a origem da divida e respectivo cômputo para se forma o titulo executivo a que se alude no artigo 14.°-A do NRAU por força do artigo 9.°, n.° 7, do NRAU, ex vi artigo 1084º, n.° 2, do Código Civil.

Nesse sentido, cf., entre outros, o Ac. do TRC de 04-06-2019, processo n.° 7285/18.4T8CBR-B.C1, disponível in www.dgsi.pt, que, de forma elucidativa, afirma;

«Isto porque entendemos que a expressão "renda" foi empregue no referenciado art. 14º A do NRAU com sentido que abrange a indemnização prevista no art. 1045°, nos 1 e 2 do C.Civil, na medida em que o desiderato legal que faculta a cobrança executiva de verdadeiras "rendas" ao abrigo desse normativo é precisamente idêntico ao desiderato legal que justifica a cobrança de indemnizações que são sucedâneo de verdadeiras rendas, rectius, trata-se de uma "renda em dobro", devida a título de indemnização, mas que nem por isso deixa de corresponder a uma "renda" e a dever ser considerada enquanto tal.

(...)

Ainda assim, sempre se diga que se nos afigura como claramente prevalecente o entendimento jurisprudencial no sentido de que estando ambos vinculados pelo contrato de arrendamento e constando efetuada a comunicação ao fiador nos mesmos termos que a efetuada ao arrendatário, nenhuma razão existe para excluir o fiador do título executivo em causa a que alude o citado art. 14°-A do NRAU».

Donde, não só existe título executivo contra o executado (fiador) como o mesmo, não obstante a resolução do contrato por falta de pagamento de rendas, é responsável, por força do próprio contrato, pela indemnização na entrega tardia do locado por assim se ter obrigado no contrato.

A resolução do contrato não conduz a eximir o fiador das obrigações que pela resolução advieram para o arrendatário por força do próprio regime da resolução dos contratos e carácter da fiança.

Acresce que a exequente não peticiona juros de mora vencidos antes da instauração da execução, nem a impossibilidade de o fiador impor ao arrendatário a entrega do locado constituem fundamentos legais de excluir a responsabilidade do fiador pela indemnização em causa.

O fiador, igualmente, não consegue impor que o inquilino pague a renda e, nem por isso, deixa de ser responsável por tal pagamento acrescido das penalizações.

A falta de entrega do locado gera uma indemnização. A responsabilidade pessoal pelo pagamento dessa indemnização é do arrendatário, mas, igualmente, de forma solidária, do fiador que renunciou ao benefício da excussão prévia.

(…).”

No recurso, defende o apelante, em primeira linha, que a sentença proferida no Proc. 2259/19.0YLPRT que correu termos no Juízo Local Cível de Sintra, Juiz 4, não o vincula, posto que não foi naquela ação demandado, e que a comunicação que lhe foi dirigida remete para aquela decisão, sendo reclamado o pagamento relativo à indemnização pela não entrega do locado.

Ou seja, o apelante não discute exatamente que o título executivo a que se refere o art. 14-A do NRAU se forme contra o fiador. Insiste é que a sentença proferida no Proc. 2259/19.0YLPRT não o vincula.

Vejamos.

Como é evidente, a questão tem de ser analisada na perspetiva da formação do título executivo em apreço.

Dispõe o nº 1 do art. 14-A do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), na versão conferida pela Lei nº 13/2019, de 12.2, que: “O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário.”

A disposição corresponde ao anterior art. 15, nº 2, do NRAU, antes da alteração introduzida pela Lei nº 31/2012, de 14.8, que aditou aquele art. 14-A.

Tendo sido muito discutida a abrangência do título executivo complexo assim formado, foi-se consolidando jurisprudência maioritária no sentido da formação de título executivo contra o fiador do arrendatário que teve intervenção pessoal no contrato de arrendamento, subscrevendo-o([1]), sendo esse, aliás, o sentido único da jurisprudência do STJ([2])([3]).

Como se afirma no indicado Ac. do STJ de 21.6.2022, ainda que possam subsistir dúvidas de interpretação do dito art. 14-A do NRAU, tendo-se firmado a jurisprudência do STJ em determinado sentido, como neste caso, “em matéria de natureza essencialmente adjetiva, os valores da segurança e da previsibilidade decisória merecerão ser preservados quando a solução interpretativa não conduza a um resultado injusto do ponto de vista da tutela dos interesses do recorrente.”

Seguimos, de todo o modo, o entendimento maioritário no sentido de que o título executivo previsto no art. 14-A do NRAU se forma igualmente contra o fiador do arrendatário, desde que este seja notificado diretamente dos montantes em dívida (art. 1041, nº 5 e 6 do C.C.).

Com efeito, a norma não enuncia, em termos excludentes, o sujeito em relação ao qual o título executivo pode ser feito valer, antes definindo a estrutura constitutiva do mesmo (integrado pelo contrato de arrendamento e pela comunicação do montante em dívida), e delimitando ainda o tipo de créditos que o integram (rendas, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário).

Por sua vez, a própria natureza da fiança, moldada na obrigação do devedor garantido, justifica que o senhorio possa deitar mão da ação executiva contra o fiador do mesmo modo que o poderá fazer contra o arrendatário.

O art. 2 da Lei nº 6/2006, de 27.2, revogou o anterior art. 655 do C.C.([4]), passando a prever o art. 1076, nº 2, do C.C., na redação conferida pela mesma Lei nº 6/2006, uma possibilidade geral de caucionar o cumprimento das obrigações das partes. Assim, as partes contratantes podem, no âmbito do NRAU, acordar qualquer forma de garantia do cumprimento das obrigações recíprocas, onde se enquadrará, naturalmente, a fiança nos termos gerais, deixando de existir uma especial “fiança do locatário”([5]).

Por sua vez, relembra-se que através da fiança um terceiro, o fiador, assegura, com o seu património([6]), uma obrigação alheia, ficando pessoalmente obrigado perante o credor (art. 627, nº 1, do C.C.). Esta sua obrigação é acessória da que recai sobre o principal devedor (art. 627, nº 2, do C.C.) e tem, nos termos do art. 634 do C.C., o conteúdo da obrigação principal, cobrindo “as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do devedor.

De acordo, ainda, com o nº 1 do art. 628 do C.C., “A vontade de prestar fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal”, podendo ser prestada independentemente do consentimento ou do conhecimento do devedor e até contra a vontade deste (art. 628, nº 2, do C.C.).

Assim, a declaração do fiador terá de ser expressa pela forma que é exigida, por lei, para a obrigação principal. O nº 1 do art. 628 do C.C. refere-se, no entanto, à forma legal exigida e não à que foi concretamente adotada pelas partes, pelo que se a lei não exigir forma especial para a obrigação principal, a vontade de prestar fiança pode ser declarada verbalmente([7]). Essencial é que essa declaração de vontade seja expressa, resultando diretamente da declaração do fiador e correspondendo sempre a um acordo, seja entre o fiador e o credor, seja entre o fiador e o devedor([8]).

A natureza acessória da fiança impõe, por outro lado, que a obrigação do fiador não exceda a obrigação principal nem seja contraída em condições mais onerosas, mas podem ser contratadas especiais condições ou até o prazo de validade da fiança (art. 631 do C.C.).

O fiador pode ainda exigir a sua liberação nos casos previstos no art. 648 do C.C. e, em caso da fiança ser prestada para garantia de obrigação futura, porque o fiador nessas condições corre um risco especial, tem o mesmo a possibilidade de se libertar da garantia enquanto a obrigação se não constituir, nos termos do art. 654 do C.C.. Todavia, essa liberação não é automática e impõe ao fiador que, designadamente, dirija ao credor uma declaração negocial nesse sentido([9]).

Por último, o fiador goza do benefício da excussão, ou seja, de obstar à execução do seu património antes de haverem sido excutidos os bens do devedor, podendo todavia renunciar a tal benefício (cfr. arts. 638 a 640 do C.C.).

Vista a natureza da fiança e voltando ao art. 14-A do NRAU, inevitável será considerar que o legislador consagrou um título, de natureza complexa, a que em especial atribuiu força executiva (cfr. art. 703, nº 1, al. d), do C.P.C.), integrado pelo contrato de arrendamento e pela comunicação, ao respetivo devedor, do montante em dívida, que deve operar, nas mesmas condições e verificados os respetivos pressupostos, contra o arrendatário e o fiador, posto que ambos se obrigaram no contrato de arrendamento e de ambos o senhorio pode reclamar o pagamento de rendas, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário.

Em resumo, o título executivo complexo formado nos termos do art. 14-A do NRAU abrange, não só o arrendatário, mas também o fiador.

Aqui chegados, e revertendo para o caso em análise, concluímos necessariamente pela irrelevância da objeção do embargante no sentido de que não foi demandado no Proc. nº 2259/19.0YLPRT nem condenado na sentença aí proferida que condenou o arrendatário no pagamento de uma indemnização pela entrega tardia do locado (ao abrigo do art. 1045 do C.C.).

Como vimos demonstrando, o título que, em rigor, foi dado em execução é constituído pelo contrato de arrendamento e pela comunicação ao fiador do montante em dívida, factos que, em si mesmos, não são contrariados pelo embargante e constam da matéria assente (ver pontos 5 e 6 supra), constituindo a sentença proferida no dito no Proc. nº 2259/19.0YLPRT a mera ilustração/demonstração do valor liquidado da quantia em débito.

Em todo o caso, como é evidente, o interesse na junção de tal sentença pela exequente justifica-se por corresponder ao reconhecimento judicial da obrigação do arrendatário que o aqui embargante, à partida, contratualmente garante.

Ou seja, a referida sentença não faz caso julgado contra o embargante/fiador, nem é título executivo contra o mesmo, mas não foi esta que foi dada em execução, constituindo a sua apresentação, complementarmente, apenas o comprovativo de uma obrigação pecuniária do arrendatário, reconhecida em juízo, que se reclama do fiador à luz do contrato de arrendamento celebrado.

De resto, não tinha sequer a locadora de enviá-la ao fiador ou apresentá-la agora em juízo, sendo suficiente, para constituir o título executivo nos termos do art. 14-1 do NRAU que tivesse notificado aquele identificando, com clareza, os montantes em dívida e o respetivo fundamento (sem mencionar ou remeter para a sentença do Proc. nº 2259/19.0YLPRT).

Veja-se que é precisamente a circunstância de o embargante não ter sido convencido na referida ação que lhe permitiria exercer aqui os mais amplos direitos de defesa, tal como sucederia na ação declarativa em que tivesse sido demandado.

Por conseguinte, sendo indiscutível que o embargante subscreveu o contrato de arrendamento dado em execução na qualidade de fiador e que a locadora, ora exequente, lhe comunicou, como cumpria (e o embargante não nega), os valores devidos pelo locatário que a si caberia garantir, constituiu-se, à partida, formalmente, título executivo contra o mesmo, nos termos e para os efeitos do art. 14-A do NRAU, sendo inteiramente irrelevante para o caso que o embargante não esteja vinculado pela sentença proferida no Proc. nº 2259/19.0YLPRT (em ação deduzida contra o arrendatário).

A derradeira questão será então a de saber se a quantia exequenda, consubstanciada no valor devido pela entrega tardia do locado, ao abrigo do art. 1045 do C.C., se insere na delimitação do tipo de créditos referidos no art. 14-A do NRAU (rendas, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário).

Na verdade, o apelante defende também que nada deve porque a fiança se extinguiu com a cessação do contrato de arrendamento e que não pode ser responsabilizado pelo valor reclamado, respeitante ao incumprimento do arrendatário quanto à devolução do locado, posto que não contribuiu para a demora na restituição.

Mais uma vez, cremos que não lhe assiste razão.

Dispõe o art. 1045 do C.C., sob a epígrafe “Indemnização pelo atraso na restituição da coisa”, que: 1.- Se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, excepto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida.

2.Logo, porém, que o locatário se constitua em mora, a indemnização é elevada ao dobro.”

Por sua vez, no contrato de arrendamento em apreço que o embargante subscreveu na qualidade de fiador, obrigou-se o mesmo “pessoalmente e solidariamente com o Segundo Contraente (o arrendatário), com expressa renúncia ao benefício da excussão prévia, pelo cumprimento das obrigações previstas neste contrato de arrendamento e de qualquer das suas cláusulas, abrangendo, designadamente, o pagamento das rendas, despesas diversas, juros, penalidades, acréscimos legais, danos, prejuízos, indemnizações e outros encargos legalmente exigíveis ou previstos no presente contrato de arrendamento, que, pelo Segundo Contraente, porventura, venham a ser devidas, quer no período inicial quer ainda em todas as suas renovações, mesmo que haja alterações da renda agora fixada. (ponto 5 supra).

A indemnização devida pelo atraso na restituição da coisa locada prevista no art. 1045 do C.C. baseia-se no critério de que, apesar de extinto o contrato de arrendamento, o valor da renda, estabelecida pelas partes, constitui o referencial de equilíbrio nas prestações, correspondendo a uma presunção de existência de prejuízo do locador pela indisponibilidade do arrendado que o locatário não restituiu quando e como lhe competia (art. 1038, al. i), do C.C.).

Ora, para além do que acima dissemos sobre a obrigação do fiador em geral, surge como evidente, face à concreta estipulação contratual e à sua abrangência, que o embargante, enquanto fiador, se obrigou igualmente no contrato por qualquer indemnização que viesse a ser devida pelo arrendatário também por atraso na restituição do locado, sendo irrelevante para o efeito que não tenha contribuído para esse atraso (tal como será, naturalmente, irrelevante para a defesa do fiador o argumento de que não lhe cabe pagar as rendas em falta porque essa falta do arrendatário não lhe é imputável!).

Por sua vez, cremos que o art. 14-A do NRAU, ao referir que o título executivo constituído respeita “a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário”, quis integrar todas as obrigações pecuniárias emergentes para o locatário do contrato de arrendamento, designadamente por incumprimento do mesmo e, em consequência, todas as que correspondentemente caibam ao fiador, nos termos da lei e do contrato.

Só esta interpretação se compagina, a nosso ver, com o claro propósito do legislador em facilitar, pela via da ação executiva, a cobrança pelo senhorio de créditos, contra o arrendatário e o fiador, emergentes do contrato de arrendamento, mal se compreendendo que, numa interpretação restritiva do art. 14-A, tivesse aquele de recorrer à ação declarativa para cobrar, nomeadamente, a indemnização a que alude o art. 1045 do C.C..

Donde, entendemos que o título executivo complexo formado nos termos do art. 14-A do NRAU integra também, como será aqui o caso, a indemnização devida pelo atraso na restituição do locado([10]).

Acresce que a indemnização que é aqui concretamente exigida ao fiador, por ser a que foi judicialmente reconhecida ao arrendatário, corresponde, nos termos da sentença proferida no Proc. nº 2259/19.0YLPRT, ao valor das rendas em singelo, no valor unitário de € 400,00, desde Outubro de 2018 e até entrega efetiva (abatido o valor de € 2.200,00 pago pelo arrendatário), calculando-se o valor devido de € 9.000,00 à data da referida sentença, segundo a seguinte fórmula matemática expressamente enunciada na respetiva fundamentação de direito: “(…) (28 meses x €400,00 - €2.200,00)(…).”

Deste modo, ocioso se torna discutir sequer se a responsabilidade do fiador deve cingir-se à indemnização referida no nº 1 do art. 1045 do C.C. ou também estender-se à indicada no nº 2 do mesmo artigo, como parece sugerir o apelante (ver conclusões L) e M) do recurso).

Em resumo, não se mostra inexigível a quantia exequenda por extinção da fiança, conforme defendido pelo apelante/embargante.

Indispensável será, como vimos dizendo, para se formar o título executivo previsto no art. 14-A do NRAU contra o fiador do arrendatário, que este, além do mais, seja notificado diretamente dos montantes em dívida (ver art. 1041, nºs 5 e 6 do C.C.), e que a dívida reclamada se enquadre no tipo de créditos aí definidos.

Na situação em análise, comprova-se que a locadora exequente notificou o ora embargante/executado, na qualidade de fiador, para pagar a referida indemnização devida pelo atraso do arrendatário na restituição do locado, anexando a sentença que condenou aquele arrendatário nesse pagamento e especificando o valor devido (ponto 6 supra).

Por sua vez, existe, e foi dado à execução, para além da referida comunicação, o contrato de arrendamento escrito no qual o embargante se constituiu como fiador garante do pagamento das obrigações do arrendatário nos moldes acima indicados (ponto 5 supra), o que inclui a indemnização em apreço.

Assim sendo, verificam-se, com relação ao fiador/ embargante/ executado, os dois elementos formais exigidos pelo art. 14-A da do NRAU.

Isto é, encontra-se formalmente constituído contra o mesmo título executivo bastante.

Consequentemente, não sendo deduzida outra defesa – para além da inexequibilidade do título e da inexigibilidade do valor reclamado por extinção da fiança, que afastámos – devem improceder, após os articulados e sem necessidade de outras provas, os embargos deduzidos, prosseguindo a execução, conforme decidido em 1ª instância.

Improcede, pois, necessariamente, o recurso.

*
IV–Decisão:

Termos em que e face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo apelante (embargante/executado).
Notifique.
*

Lisboa, 27.9.2022

Maria da Conceição Saavedra

Cristina Coelho  

Edgar Taborda Lopes

     
[1]Cfr. na jurisprudência das Relações, entre muitos outros e citando os mais recentes, os Acs. da RL de 12.2.2019, Proc. 11637/18.1T8LSB.L1-7, de 12.3.2019, Proc. 15962/17.0T8LSB-A.L1-7 (em que é relatora a aqui 1ª adjunta), de 18.1.2018, Proc. 5356/12.0TBVFX-B.L1, e de 7.6.2016, Proc. 5356/12.0TBVFX-B.L1-A (também subscrito pela aqui relatora como 2ª adjunta), o Ac. da RC de 4.6.2019, Proc. 7285/18.4T8CBR-B.C1, e o Ac. da RP de 6.3.2018, Proc. 13535/14.9T8PRT-A.P1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[2]Ver o recente Ac. do STJ de 21.6.2022, Proc. 9443/20.2T8SNT-A.L1.S1, e ainda os Acs. do STJ de 17.11.2020, Proc. 3794/18.3T8SNT-A.L1.S1, de 20.5.2021, Proc. 8520/20.4T8PRT-B.P1.S1, e de 26.11.2014, Proc. 1442/12.4TCLRS-L1.S1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[3]Ver, ainda, de forma desenvolvida quanto à diversidade de entendimentos sobre o tema, o citado Ac. do STJ de 17.11.2020.
[4]Este normativo dispunha, sob a epígrafe “Fiança do locatário”, que: “1. A fiança pelas obrigações do locatário abrange apenas, salvo estipulação em contrário, o período inicial de duração do contrato. 2. Obrigando-se o fiador relativamente aos períodos de renovação, sem se limitar o número destes, a fiança extingue-se, na falta de nova convenção, logo que haja alteração da renda ou decorra o prazo de cinco anos sobre o início da primeira prorrogação.”
[5]Estabelece hoje o nº 2 deste art. 1076 do C.C. que: “As partes podem caucionar, por qualquer das formas legalmente previstas, o cumprimento das obrigações respectivas.”
[6]Sem prejuízo do disposto no art. 602 do C.C., também aplicável ao fiador, que permite a limitação convencional da responsabilidade a certos bens.
[7]Cfr. Almeida e Costa, “Direito das Obrigações”, 4ª ed., págs. 616/617, Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, Vol. II, 7ª ed., pág. 486, Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, Vol. I, pág. 645. Ver, ainda, o Ac. do STJ de 4.10.2007, Proc. 07B2644, o Ac. da RL de 13.10.2009, Proc. 4651/07.4TBALM-A.L1, e o Ac. da RP de 6.1.2014, Proc. 856/12.4TTVCT.P1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[8]Cfr. Antunes Varela, ob. cit., págs. 482/483 e 486.
[9]Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pág. 672.
[10]Neste sentido, ver, entre outros e citando apenas os mais recentes, os Acs. da RL de 12.3.2019, Proc. 15962/17.0T8LSB-A.L1-7 (relatado pela aqui 1ª Adjunta), e de 18.1.2018, Proc. 10087/16.9T8LRS-B.L1-6, e o Ac. da RC de 4.6.2019, Proc. 7285/18.4T8CBR-B.C1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.