Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
20344/21.7T8LSB.L2-6
Relator: MARIA TERESA MASCARENHAS GARCIA
Descritores: PERÍCIA
LAUDO
SOCIEDADE COMERCIAL
ESPANHOLA
REPRESENTAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/23/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: Sumário (elaborado pela relatora):
I. Não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objecto de impugnação não forem susceptíveis, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do C.P.C.).
II.. É absolutamente irrelevante, tanto do ponto de vista de facto como da sua pertinência para a resolução da questão de direito, saber quem é ou quem são os proprietários do imóveis sobre os quais recairiam os projectos levados a cabo pela Autora, na medida em que a legitimidade para contratar serviços que incidam sobre imóveis não tem, necessariamente, de coincidir com a identidade dos proprietários desses imóveis, da mesma forma que não recai sobre os proprietários de imóveis a responsabilidade pelo cumprimento de contrato em que não foram parte contratante.
III. A circunstância de uma sociedade terceira ao contrato ter sido quem procedeu ao pagamento de parte do preço do mesmo é irrelevante na medida em que, nos termos do disposto no art.767.º do CPC, “a prestação tanto pode ser feita pelo devedor, como por terceiro, interessado ou não no cumprimento da obrigação”, não tendo esse pagamento por terceiro a virtualidade de alterar os sujeitos obrigados por força do contrato. Relevante é, isso sim, quem acordou a realização desses serviços.
IV. Não é de incluir nos factos provados que a Ré não encomendou nenhum projecto à Autora, na medida em que,enquanto facto constitutivo da causa de pedir da Autora, cabia apenas a esta fazer prova do contrato celebrado entre si e a Ré e seus contornos. À Ré cabia fazer contra-prova deste facto, o que é substancialmente diverso de dizer que lhe cabia fazer prova de que não havia solicitado qualquer projecto.
V. É de indeferir a pretensão da Autora de alteração de um facto provado acrescentando que “o trabalho entregue, em alguns casos, tinha uma definição e grau bastante superior ao de um ante-projecto”, na medida em que tal afirmação é valorativa e destituída de utilidade posto que o trabalho apresentado não correspondia ainda à fase evolutiva seguinte: projecto-base.
VI. O Parecer do Colégio Oficial de Arquitectos das Ilhas Canárias não consubstancia uma uma perícia/laudo realizado no âmbito dos presentes autos, com garantias de imparcialidade, representatividade e contraditório, não assumindo força probatória suficiente para atestar, com rigor, a dimensão e características do trabalho desenvolvido pela Autora, em termos tais que pudesse fundamentar a obrigação de pagamento, pela Ré, de um valor superior àquele que foi consignado nas facturas.
VII. Sendo a causa de pedir nos presentes autos o incumprimento contratual, com base na mora da Ré (sem que tenha sido alegada qualquer resolução contratual) e tendo a Autora confessado na sua petição inicial que o acordado foi o pagamento de 10% - independentemente do valor total do trabalho já feito – com a entrega do anteprojecto, torna-se absolutamente irrelevante – para efeitos da impugnação da matéria de facto - a aferição de medida de trabalho desenvolvido diversa da acordada.
VIII. Sendo as sociedades comerciais, enquanto pessoas colectivas de direito privado, centros de imputação de normas jurídicas e com aptidão para agir juridicamente, cumprindo obrigações e exercendo direitos, através dos seus órgãos, os actos praticados pelos titulares destes órgãos projectam-se, de modo automático e directo, na sociedade a que pertencem, através de vínculos de organicidade, que dão lugar a uma representação orgânica.
IX. Sendo a sociedade Ré uma sociedade espanhola a sua representação poderá assumir uma de três realidades: (i) Administrador único; (ii) Dois ou mais administradores solidários; (iii) Dois ou mais administradores mancomunados, sendo que, no caso da administração solidária qualquer um dos administradores pode representar a empresa, sem necessidade que o resto dos administradores actuem simultaneamente; e na administração de mão comum, para actuar em nome da empresa, necessário se torna a intervenção de todos os administradores.
X. Sendo a administração da Ré Solidária – como o comprova documento junto aos autos como doc. 8 com a contestação - torna-se absolutamente irrelevante, para vinculação da sociedade, a intervenção ou não dos restantes administradores.
XII. Tendo os presentes autos como causa de pedir um incumprimento contratual e tendo as partes acordado que o pagamento a efectuar contra a apresentação do Anteprojecto seriam 10% do valor do projecto, jamais se poderia considerar incumprimento todo o excedente do valor que resultasse da diferença entre a percentagem do trabalho efectivamente desenvolvido e os 10% que foram facturados.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

Relatório:
AA-arquitectos, Lda. intentou acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra multicines atlântida lanzarote s.l. pedindo que:
- se condene a Ré a pagar ao Autor o montante indemnizatório que se cifra em € 461.691,75, acrescido, de juros vencidos e vincendos, até integral pagamento, nos termos e com os fundamentos supra expostos, com as legais consequências.
Alegou em síntese a Autora que:
- é um dos mais reconhecidos gabinetes de arquitectura, em Portugal e no mundo, tendo, visibilidade e o mérito do trabalho desenvolvido, nas últimas décadas, lhe valido atribuição de diversos prémios, nacionais e internacionais, granjeando-lhe um prestígio inigualável, no panorama da arquitectura internacional;
- em 2017 foi convidada pela Ré a elaborar um conjunto de cinco projectos de arquitectura a desenvolver na Ilha de Lanzarote, nomeadamente,
- em Junho de 2017 foi-lhe solicitada a elaboração de projecto de arquitectura do Hotel Playa Blanca, hotel de 5 estrelas em frente ao mar, com áreas destinadas a q2uartos, áreas de tratamento e bem-estar, salas de estar e de refeição e espaços de apoio à actividade hoteleira, incluindo áreas de arranjos exteriores;
- Em Fevereiro de 2019 o Réu solicitou ao Autor a elaboração do projecto de arquitectura do Edifício Atlântida, que consistia na remodelação do edifício Multicines, sito em Arrecife-Lanzarote e na transformação do conjunto de áreas afectas à hotelaria, zonas de restauração, bares, supermercado e zona de venda de produtos da região;
- na mesma altura a Ré dirigiu à Autora um novo pedido atinente à elaboração de projecto de arquitectura de uma Quinta, sita em La Geria, que envolvia a remodelação e adaptação de uma casa e espaços de apoio em casa particular/turismo de habitação, incluindo áreas de arranjos exteriores;
- o esquema conceptual do projecto Hotel Playa Blanca foi entregue pela Autor à Ré em Dezembro de 2017 e o estudo prévio em Março de 2019; o estudo prévio do Edifício Atlântica foi entregue em Março de 2019 e o estudo prévio do projecto Quinta La Geria foi entregue em Maio de 2019, tendo sido realizada uma exposição destes 3 projectos no atelier da Autora, em Lisboa, em Novembro de 2019;
- em paralelo, o Réu, em Maio/Junho de 2020, solicitou à Autora a elaboração de mais 2 projectos a saber: Casa dos Calles e Casa en frente a la Iglesia, ambas em Lanzarote;
- concluídos os trabalhos solicitados, em 30-06-2020 a
Autora enviou à Ré, via postal e via correio electrónico, os anteprojectos do 5 projectos supra identificados, Acompanhados das respectivas facturas pró-forma, no valor, respectivamente, de € 73 760,00, € 97 060,00, € 5670,00, € 5210,00 e € 4200,00.

- tais facturas correspondiam a 10% do valor total do projecto, quando tipicamente a percentagem do trabalho corresponde a 25% do seu valor;
- já em Fevereiro de 2020 a Autora havia enviado ao Réu as propostas de honorários respeitantes aos três primeiros projectos, as quais não foram rejeitadas pela Ré, nem motivaram qualquer contestação, apenas um pedido de redução atentos os custos elevados com intervenções de terceiros nos projectos;
- as propostas de honorários dos dois últimos projectos foram apresentados à Ré em 24-06-2020, a qual os aceitou de forma expressa e inequívoca;
- até ao momento, não obstantes as várias interpelações, a Ré não procedeu ao pagamento de qualquer valor respeitante aos estudos prévios e anteprojectos dos 5 trabalhos apresentados;
- dos 5 projectos apenas foi pago pela Ré o valor inicial de € 6000,00 correspondente ao estudo conceptual do projecto Hotel Playa Blanca;
- tal configura uma violação da principal obrigação contratual da Ré, atentatória do principio da boa fé contratual, na medida em que as comunicações trocadas sempre se revelaram inequívocas da natureza onerosa dos serviços prestados;
- não obstante as várias interpelações verbais, escritas, formais e informais a situação de incumprimento mantem-se até hoje inalterada;
- em Janeiro de 2021 a Autora endereçou à Ré, através dos seus mandatários, interpelação para pagamento da quantia em dívida, missiva esta que não surtiu qualquer efeito, rejeitando qualquer obrigação de pagamento dos serviços de arquitectura prestados, escudando-se no facto de não ter sido assinado, pelas partes, qualquer contrato escrito, formalmente intitulado como tal;
- invocando ainda que os estudos prévios e anteprojectos mais não são do que esboços;
- perante tais asserções, o Autor em Abril de 2021 solicitou ao Colégio Oficial de Arquitectos das Olhas Canárias, a emissão de parecer relativo à natureza dos trabalhos realizados pelo Autor relativamente aos 5 projectos em Lanzarote, tendo a 3-06-2021 sido emitido parecer por tal colégio, atestando que os trabalhos entregues correspondem, na prática a verdadeiros Anteprojectos e, pelas regras aplicáveis, o valor facturado deveria ter sido, não 10% do valor da obra a realizar, mas sim 21,75%, nuns casos e 25% noutros.
Conclui assim pela procedência da presente acção e consequente condenação da Ré no pagamento do valor devido e reconhecido pelo Colégio Oficial de Arquitectos das Ilhas Canárias no valor de € 461 691,75.
Devidamente citada veio a Ré contestar, excepcionando a incompetência absoluta dos Tribunais Portugueses (uma vez que A Ré tem a sua sede em Espanha, os imóveis objecto dos projectos de arquitectura situam-se em Espanha; as partes reuniram-se (alegadamente) para analisar e discutir os supra referidos (ante)projectos em Espanha; a Autora realiza parte da prestação a que se obrigou em Espanha; a Autora envia os projectos para Espanha; é em Espanha o local de desenvolvimento/execução dos projectos; é em castelhano que as partes comunicam).
Ainda excepcionando:
- alega a Ré a sua ilegitimidade substantiva, na medida em que em momento algum solicitou à Autora ou contratou com esta a elaboração de quaisquer projectos de arquitectura, desde logo por não ser proprietária desses imóveis, nem deter qualquer direito sobre os mesmos;
- a Autora e a Ré já tiveram relações comerciais no passado e os respectivos representantes legais mantêm há vários anos uma relação de proximidade, mas BB, para além de ser um administrador da Ré é também administrador de várias outras sociedades;
- qualquer contacto efectuado por BB com a Autora poderá, eventualmente, ter sido feito a título pessoal ou em representação de outras sociedades, mas nunca. Garantidamente, em representação da Ré;
No mais, a Ré impugnou expressamente os factos articulados na petição inicial, alegando:
- a proposta apresentada à Autora, para o Hotel Playa Blanca, foi de orçamentação da elaboração do anteprojecto, e, posteriormente, a orçamentação da realização do projecto de construção, não tendo havido qualquer adjudicação;
- o mesmo se diga para os projectos Edifício Atlântida e Quinta La Geria, em que se pergunta da possibilidade de realizar o projecto, sem compromissos e se pede um orçamento;
- Não tem sentido a apresentação de orçamentos em momento posterior à alegada adjudicação, sendo que, de todo o modo, em relação aos orçamentos apresentados pela Autora, CC os considerou excessivos;
- a quantia de € 6000,00 que a Autora alega ter recebido no âmbito do projecto Playa Blanca não foram facturados à Ré nem por esta pagos, mas sim pela sociedade Vista Calida S.L.;
- sem prejuízo de tudo o anteriormente exposto, alega a Ré que o valor peticionado não tem razão de ser porque (i) é a própria autora que adianta que só realizou integralmente 3 dos 5 projectos; (ii) o valor corresponde a projectos e o efectivamente apresentado terão sido esboços preliminares, incompletos e contrários às normas urbanísticas e de ordenamento do território espanholas; (iii) independentemente do Parecer elaborado pelo Colégio de Arquitectos de Tenerife, é o próprio a afirmar que arquitecto e clientes são livres de estipular os honorários que entenderem, sendo certo que a Autora orçamentou a realização dos ante3porjectos no valor que entendeu por ade2quados de € 189 900,00 e fixou em 10% o total dos honorários previstos para a fase do anteprojecto.
Termina assim requerendo a procedência da excepção dilatória de incompetência e consequente absolvição da instância, e, para o caso de assim não se entender, a sua absolvição do pedido.
A 24-11-2022 foi proferido despacho em que se dispensou a realização de audiência prévia e se conheceu da excepção de incompetência do Tribunal em razão da nacionalidade e, julgando a mesma procedente, se determinou a absolvição da Ré da instância.
Inconformada veio a Autora interpor recurso do despacho que, conhecendo da incompetência do tribunal em razão da nacionalidade, absolveu a Ré da instância, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão de 14-03-2023, revogado a decisão recorrida, declarando o Tribunal recorrido internacionalmente competente para conhecer da acção.
Foi designada data para a realização de audiência prévia, a qual ocorreu a 18-01-2024, na qual se proferiu despacho saneador tabelar e relegou para final o conhecimento da excepção de ilegitimidade substantiva, se fixou valor à acção, bem como se elencou o objecto do litígio e respectivos temas de prova, proferiu despacho sobre requerimentos probatórios e agendou data para realização de audiência de discussão e julgamento.
Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento e em 19-11-2024 foi proferida sentença na qual se decidiu julgar a acção parcialmente procedente e em consequência:
A. Condenou-se a Ré a pagar à Autora a quantia total de € 185.900,00 (cento e oitenta e cinco mil e novecentos euros), acrescida de juros de mora, devidos à taxa legal para os créditos comerciais, desde a citação até integral pagamento;
B. Absolveu-a do demais valor peticionado.
Inconformada com a sentença proferida nos autos veio a Ré apelar, tendo apresentado alegações, em que formulou as seguintes conclusões:
“a) A decisão recorrida incorre nos seguintes vícios: erro e falta de apreciação da prova documental constante dos autos e testemunhal produzida, erro na selecção da matéria de facto dada como provada e erro na aplicação do direito.
b) O Tribunal a quo incorreu em erro e falta de apreciação da prova documental constante dos autos (docs. 3 a 7 juntos à Contestação), ao não elencar os proprietários dos cinco imóveis a que respeitam os cinco projetos de arquitectura em causa nos presentes autos, quando deu como provado o facto constante do n.º 29, devendo, por isso, ser aditado aos factos provados os seguintes: 1. “O imóvel onde se insere o projeto “Hotel Playa Blanca” é propriedade de: VISTA CALIDA S.L.; 2. O imóvel onde se insere o projeto “Edifício Atlântida” é propriedade de: DD; 3. O imóvel onde se insere o projeto “Quinta La Geria” é propriedade de VOLCAN DEL SOL, S.L.; 4. O imóvel onde se insere o projeto “Casa dos Calles” é propriedade de: EE (20%) e TIENDAS ESPECIALIZADAS DE CANARIAS, S.L. (80%) e, 5. O imóvel onde se insere o projeto “Casa frente a la Iglesia” é propriedade de MAYORISTA CANARIAS, S.L..
c) O Tribunal a quo incorreu em erro e falta de apreciação da prova documental, quando deu como provado o facto n.º 3, fundado «directa ou indirectamente, da prova documental produzida por ambas as partes».
d) Porquanto, verifica-se que, nos autos, não existe qualquer documento que demonstre que, em 2017, BB convidou a Autora, ora Apelada, à execução dos 5 projectos de arquitectura.
e) Pelo contrário, conforme é a própria Autora quem alega, só o projecto “Hotel Playa Blanca” foi apresentado em 2017 (cfr. art. 5.º da p.i. e doc. 3 junto à mesma), datando os restantes de Fevereiro de 2019 (“Edifício Atlântida” e “Quinta La Geria”) e em Maio/Junho de 2020 (“Casa dos Calles” e “Casa en frente a la Iglesia”) – cfr. artigos 8.º e 17.º da p.i. e Docs. 4 a 7 e 12 a 13 juntos à mesma).
f) Resultando ainda, do doc. n.º 3 da p.i. que sustenta o facto n.º 3, tratar-se de um email enviado por CC, e não por BB.
g) Este facto está ainda em contradição com os factos provados n.º 7 e 9, porque de duas uma: ou foi BB quem convidou a Autora à elaboração destes projectos, conforme consta (erradamente) do facto n.º 3, ou foi a Ré, conforme consta (também erradamente) dos facto n.º 7 e 8.
h) Sabendo que a pessoa física do gerente/administrador ou do sócio não se confunde com a pessoa jurídica da sociedade, tratando-se de pessoas diferentes, com distintas personalidades jurídicas e autonomia, e estas não se confundem.
i) Do exposto resulta, pois, evidenciado, que o facto provado n.º 3 deve, pura e simplesmente, ser excluído do elenco de Factos provados e não provados, por não alegado, ou, caso assim não se entenda, ser julgado não provado.
j) O Tribunal a quo incorreu em erro e falta de apreciação da prova documental constante dos autos e testemunhal produzida, quando deu como provado o facto constante do n.º 5, fundado no doc. 3 junto à p.i. e nas declarações de parte do legal representante da Autora.
k) Desde logo, porque o doc. n.º 3 junto à p.i. foi enviado por CC, que não tem, nem nunca teve, qualquer vínculo com a Ré, tratando-se, naquela data, de um mero estudante de arquitectura e entusiasta.
l) Não resultando, do teor deste email, qualquer adjudicação deste projecto, até porque o seu remetente não tinha quaisquer poderes para o efeito, mas uma solicitação de orçamento para a eventual realização do mesmo.
m) E porque, ao contrário do que acontece com os restantes projectos, no caso do projecto “Hotel Playa Blanca”, existe prova documental bastante de que a contraparte deste projeto era a empresa “Vista Calida SL”, proprietária deste edifício (cfr. docs. 26 a 37 da p.i., doc. 3 da contestação e facto n.º 1 a aditar) e não BB ou a Ré.
n) A quem, aliás, foi enviada pela Autora uma proposta de honorários para o estudo conceptual deste projecto e com quem foi firmado um contrato de prestação de serviços, cfr. docs. 9 e 10 da Contestação.
o) Do exposto resulta, pois, evidenciado, que o facto provado n.º 5 deve ser julgado não provado, ou, em alternativa, passar a ter a seguinte redacção: “5. CC convidou a Autora para a elaboração do projecto de arquitectura do hotel Playa Blanca, um estabelecimento hoteleiro de 5 estrelas localizado em frente ao mar, contendo áreas destinadas a quartos, a tratamento e bem-estar, salas de estar e de refeição e espaços de apoio à actividade hoteleira, incluindo áreas de arranjos exteriores afectas aos hóspedes”.
p) O Tribunal a quo incorreu ainda em erro e falta de apreciação da prova documental constante dos autos e da testemunhal produzida, quando deu como provados os factos constantes do n.º 7, 9 e 26, fundado nos docs. 4 a 7 da p.i., prova indirecta e nas declarações de parte da Autora e Ré.
q) Sucede que o entendimento do Tribunal a quo é contrário à lei, ao ferir o elementar princípio da atribuição da personalidade jurídica às sociedades e da separação de patrimónios, confundido aquela que é a Ré, ora Apelante, com o seu administrador e com o filho deste último!
r) Sendo totalmente irrelevante estarmos ou não perante um grupo familiar, já que esta circunstância não prescinde dos poderes de decisão de quem realmente administra as sociedades que eventualmente o componham, não resultando de qualquer documento junto aos autos ou confissão, que CC alguma vez tenha tido quaisquer poderes para representar a Ré, ora Apelante, não dispondo sequer de um vínculo laboral com esta empresa.
s) Contrariando, aliás, o facto provado n.º 30, do qual resulta que «os administradores da Ré, e únicos com poderes para representar e vincular a sociedade, são: BB, BB e FF».
t) O que era sobejamente conhecido pelo legal representante da Autora e pelas testemunhas por ela arroladas, conforme os depoimentos que prestaram.
u) Mas, com ainda maior relevância, acresce que, conforme resulta demonstrado dos docs. 4 e 5 juntos com a contestação e factos provados n.ºs 2 e 3 a aditar, a Ré não é proprietária dos dois imóveis a que se referem os factos provados n.ºs 7 e 9 (e 26).
v) Por outro lado, conforme consta do facto provado n.º 4, resultou provado que BB é também administrador de outras empresas espanholas para além da empresa Ré/Apelante, não podendo confundir-se a personalidade jurídica e patrimónios do próprio com os das sociedades que possa deter participações.
w) Seguindo o raciocínio da Mta. Juíza do Tribunal a quo, então a Autora sempre podia escolher a empresa a quem facturar os seus trabalhos, podendo fazê-lo quer à Ré Multicines, quer a qualquer outra das restantes empresas das quais é sócio BB, com o argumento de que são todas do mesmo grupo económico, o que é absolutamente insustentável à luz do ordenamento jurídico português e/ou espanhol!
x) Sendo errado o entendimento da Autora, e do Tribunal a quo que o acompanhou, no sentido de que, por ter trabalhado anteriormente para a empresa Multicines, todos e quaisquer trabalhos que fizesse daí para a frente, o seriam também.
y) Não se alcançando ainda, do teor dos documentos que motivaram a decisão do Tribunal a quo quanto a estes factos, qualquer acto de adjudicação dos projectos “Edifício Atlântida” e “Quinta La Geria”.
z) Veja-se que, no que respeita ao “Edifício Atlântida”, o Tribunal a quo assenta o seu entendimento nos docs. 4 a 6 juntos com a p.i., porém, só o doc. 4 da p.i. se refere a este projecto, ainda assim, sem que, neste email, exista qualquer referência à «remodelação do edifício “Multicines”» mas, sim, do “Edifício Atlântida”.
aa) Por outro lado, no que respeita ao facto n.º 9 dado como provado, o Tribunal a quo faz tábua rasa da prova documental e testemunhal produzida pela Apelante, a qual demonstra, inequivocamente, que, a ter lugar, o projecto “Quinta La Geria” nunca foi um projecto da Ré Multicines, mas movido a título pessoal de BB, cfr. doc. 4 da p.i. e declarações de parte da Autora.
bb) Mais uma vez, não resultando qualquer referência aos projectos terem sido adjudicados, solicitando-se apenas honorários para o efeito (cfr. ainda o doc. 6 da p.i.).
cc) Do exposto resulta, pois, evidenciado, que os factos provados n.º 7 e 9 devem ser julgados não provados ou, em alternativa, passarem a ter a seguinte redacção única: “BB consultou o legal representante da Autora acerca da possibilidade da elaboração do projecto de arquitectura que consistia na remodelação do edifício “Atlântida”, sito em Arrecife, Lanzarote, e na transformação do conjunto em áreas afectas à hotelaria, zonas de restauração, bares, supermercado e zona de venda de produtos regionais, bem como do projecto de arquitectura de uma quinta, sita em La Geria, que envolvia a remodelação e adaptação de uma casa e espaços de apoio em casa particular/turismo de habitação ou rural, incluindo áreas de arranjos exteriores”.
dd) Resultando ainda evidenciado que o facto provado n.º 26 deve, pura e simplesmente, ser excluído do elenco de Factos provados e não provados, por não ter sido alegado, e muito menos provado!
ee) O Tribunal a quo incorreu em erro e falta de apreciação da prova documental, quando deu como provado o facto constante do n.º 20, na parte que se refere aos «trabalhos solicitados» pela Ré, fundado nos docs. 17 a 21 juntos à p.i., quando, nem destes, nem de nenhum outro documento, resulta qualquer prova desta adjudicação, a confirmação de quaisquer honorários de que sempre dependeriam ou qualquer contrato celebrado entre as partes naquele sentido.
ff) O Tribunal a quo incorreu novamente em erro, ao dar como provado o facto constante do n.º 23, julgando sem cuidar de aferir os estatutos desta empresa ou a legislação aplicável às sociedades comerciais de direito espanhol, nem sequer equacionando (e fundamentando!) a eventual desconsideração da personalidade jurídica da Apelante, e ignorando, ou desconsiderando, que a Ré não é proprietária dos imóveis em questão.
gg) Do exposto resulta, pois, evidenciado, que o facto provado n.º 20 deve passar a ter a seguinte redacção: “20. A Autora, em 30 de Julho de 2020, enviou à Ré, por via postal e por correio electrónico, os Anteprojectos dos 5 projectos identificados anteriormente, acompanhados das respectivas facturas pró-forma (cf. docs. 17 a 21) (…)”.
hh) Devendo, por sua vez, o facto provado n.º 23 passar a ter a seguinte redacção: “23. Em Fevereiro de 2020, a Autora enviara a CC, as propostas de honorários respeitantes a cada projecto – “Hotel Playa Blanca”, “La Geria “e “Edifício Atlântida” -, individualmente considerado, de acordo com a percentagem correspondente a cada fase do trabalho a realizar/realizado, como o “Anteprojecto, o Projecto Base, o Projecto de Execução e Direcção de Obra” (cf. doc. 22)””
ii) O Tribunal a quo incorreu em erro e falta de apreciação da prova documental, quando deu como provado o facto constante do n.º 22, fundado nos docs. 29 e 40 juntos à p.i., já que, em parte alguma, quer nestes documentos, quer nos restantes juntos aos autos, existe qualquer estimativa apresentada pela Autora e, em consequência, aceite. Pelo contrário, encontrando-se o doc. 23 junto à p.i., no qual, não só não se aceitam os honorários apresentados pela Apelada, como são postos em causa.
jj) Mais uma vez, decidindo o Tribunal a quo ignorar a prova documental junta aos autos, só assim podendo sustentar a sua tese, nomeadamente, o doc. 24 junto à p.i., onde é referida a realização de uma reunião com os todos os proprietários dos imóveis objecto destes projectos, para chegar a acordo quanto aos honorários devidos pelos mesmos e o teor dos docs. 3, 4 e 6, em todos eles, peticionando-se à Autora que enviasse os seus honorários para análise.
kk) Neste sentido, resulta, pois, evidenciado, que o facto provado n.º 22 deve ser julgado não provado.
ll) O Tribunal a quo incorreu em erro e falta de apreciação da prova documental e testemunhal produzida quando deu como provado o facto n.º 24.
mm) Pois, para além de ter ficado demonstrado que a Ré não é proprietária dos imóveis aqui em questão, ficou também demonstrado que CC não representa nem vincula a empresa Ré (cfr. facto provado n.º 30), sendo totalmente irrelevante – para efeitos de imputação de responsabilidade à Ré aqui Apelante – que aquele tenha aceitado, ou não, expressa ou tacitamente, quaisquer honorários, tão-pouco sendo a Ré proprietária dos imóveis em causa (cfr. facto provado n.º 29).
nn) Do exposto resulta, pois, evidenciado, que o facto provado n.º 24 deve ser julgado não provado ou, em alternativa, passar a ter a seguinte redacção: “24. Quanto aos projectos das “Casa que da a dos Calles” e “Casa frente a la Iglesia”, as respectivas propostas de honorários foram apresentadas pela Autora a CC, em 24 de Junho de 2020”.
oo) O Tribunal a quo incorreu em erro e falta de apreciação da prova documental quando deu como provado o facto n.º 25, resultando perfeitamente expresso e demonstrado dos docs. n.º 11 e 12 juntos à Contestação, não ter sido a Ré quem realizou o referido pagamento de € 6.000,00 à Autora, mas sim a empresa “Vista Calida S.L.” – proprietária do imóvel em questão, conforme resultou provado -, com base numa proposta de honorários e um contrato firmado entre estas empresas, relativos ao projecto do “Hotel Playa Blanca”, conforme docs. n.º 9 e 10 juntos à Contestação.
pp) Do exposto urge a necessidade de alterar a redacção do facto provado n.º 25, devendo passar a ler-se o seguinte: “25. A empresa Vista Calida S.L. pagou à Autora um valor inicial de € 6000 correspondente ao pagamento do “estudo conceptual” do projecto do “Hotel Playa Blanca”, enviado em 2017)”.
qq) O Tribunal a quo incorreu em erro e falta de apreciação da prova documental e testemunhal produzida quando deu como provado o facto n.º 31, uma vez mais, atropelando e ferindo as mais elementares regras legais de funcionamento das sociedades comerciais, quer nacionais ou espanholas, presumindo uma colaboração de CC na gestão de todas as sociedades das quais BB é administrador, ainda que não exista qualquer evidência desses mesmos poderes, nem sequer sendo mencionadas as restantes empresas, que não a Ré, nos presentes autos.
rr) Resultando evidente, de todas as comunicações enviadas por CC, que a sua colaboração sempre se limitou às suas competências técnicas, nomeadamente, ligadas ao mundo da arquitectura, e o que foi corroborado, que pelo representante legal da Autora, quer pela testemunha GG.
ss) Do exposto resulta, pois, evidenciado, que o facto provado n.º 31 deve ser julgado não provado.
tt) Entende, ainda, a A./Apelante que o facto a) foi incorrectamente julgado como não provado, revelando um grave erro de julgamento ao dar como não provado não ter sido a Ré, a solicitar a elaboração dos projectos de arquitectura aqui em causa.
uu) Tratando-se de um mero “feeling” sem sustentação da Mta. Juíza do Tribunal a quo, que contraria o facto provado n.º 29 e a prova documental produzida (docs. 4, 26, 37 da p.i. e docs. 9 a 12 juntos à Contestação), finalmente, contrariando as regras que regulam o funcionamento das sociedades comerciais, nomeadamente, quanto à desconsideração da personalidade jurídica desta empresa, que em momento algum teve lugar.
vv) Nestes termos deverá eliminar-se o facto a) do factos não provados e substituir-se pelo seguinte facto PROVADO a aditar:
“A Ré em nenhum momento solicitou à Autora a elaboração de qualquer projecto de arquitectura referente os imóveis supra identificados (artigo 40º da contestação)”.
No que respeita à matéria de direito:
ww) Em suma, o Tribunal a quo decidiu ter ficado demonstrado ter sido celebrado um contrato de prestação de serviços de arquitectura entre a Autora e a Ré, a quem aquela prestou e facturou os serviços prestados, que não foram pagos por esta última, por essa razão, sendo a Autora credora da Ré e esta devedora daquela, dos valores inseridos em cada uma das facturas emitidas no âmbito deste contrato, que perfazem um total de € 185.000,00.
xx) Sucede que a Ré é uma sociedade comercial de direito espanhol que, conforme acontece no plano nacional, é dotada de plena autonomia jurídica, com personalidade e patrimónios próprios que não se confundem com os seus sócios e administradores.
yy) Sendo que, conforme o facto provado n.º 30, só os administradores da Ré – BB, BB e FF – têm poderes para representar e vincular a sociedade.
zz) Com excepção do primeiro, nenhum outro administrador teve qualquer intervenção nos autos ou contacto com a Autora.
aaa) E como sobejamente se demonstrou, ao contrário da tese da Autora, que o Tribunal a quo erradamente acompanhou, BB, em nenhum momento, representou a Ré Multicines ou delegou a terceiros esta tarefa (nomeadamente, a CC, seu filho e, ao tempo destes projectos, estudante de arquitectura).
bbb) Não existindo nos autos qualquer documento que comprove a adjudicação destes cinco projectos por parte de BB, seja a título pessoal, seja em representação da Ré, ou aceitando quaisquer honorários.
ccc) Pelo contrário, existindo prova documental bastante, da qual resulta que, a terem lugar, os trabalhos pela Autora sempre seriam pessoais ou destinados aos proprietários de cada um desses edifícios (cfr. doc. 4, 24, 26 e 37 da p.i.).
ddd) Pelo que, não existindo qualquer prova de que BB – e muito menos CC – actuou em nome e representação da Ré Multicines, o Tribunal não podia, como o fez, presumir essa representação.
eee) Sempre seria necessário recorrer ao instituto da desconsideração da personalidade jurídica, o que não fez, e que, como sabemos, só de forma absolutamente excepcional pode ser utilizado, perante uma situação de fraude e de abuso, que aqui tão-pouco teve lugar.
fff) Resumindo não existindo qualquer relação contratual entre as Partes, a ora Apelante sempre será parte ilegítima, não podendo ser responsável pelo pagamento de quaisquer facturas respeitantes a serviços que, afinal, não contratou, não havendo qualquer incumprimento contratual que motive a condenação da Ré.
ggg) A douta sentença recorrida viola o disposto nos artigos 232º, 258º (a contrario), 268º, 342º e 351º do Código Civil.
Pelo exposto e pelo douto suprimento do Venerando Tribunal ad quem, deve o presente recurso de Apelação ser julgado procedente, por provado, e ser revogada a douta sentença recorrida, a qual deve ser substituída por douto Acórdão que julgue a presente acção totalmente procedente.
Em alternativa, o que apenas se concede por mera cautela de patrocínio, deverá a douta sentença recorrida ser substituída por douto Acórdão que julgue a presente acção parcialmente procedente, absolvendo a Ré do pagamento da factura pro-
forma referente ao Anteprojecto do “Hotel Playa Blanca”, no valor de € 73.760,00, e da factura pro- forma referente ao Anteprojecto da “Quinta La Geria”, no valor de € 5.670,00, condenando-a ao pagamento das restantes facturas pró-forma.
Só assim decidindo será feita JUSTIÇA!!!”
Devidamente notificada veio a Autora/Recorrida apresentar as suas contra-alegações e interpor recurso subordinado, formulando as seguintes conclusões:
Delimitação do Objecto do Recurso Subordinado
1. Não obstante a correção da Sentença Recorrida na quase totalidade do decidido tal como acima exposto no Ponto I, a Autora discorda da quantificação da condenação proferida pelo Tribunal a quo, ou seja, do valor que a Ré foi condenada a pagar à Autora, pelos serviços de arquitetura efetivamente prestados.
2. Isto porque na sua ótica o valor deverá ser, como vimos, bastante superior.
Da Valorização / Quantificação dos Serviços Prestados pela Autora à Ré
Razão de Ordem / Introdução
3. A Autora através do presente recurso subordinado pretende colocar em causa a Sentença Recorrida relativamente à valorização / quantificação dos serviços prestados pela Autora à Ré.
4. Isto porque apesar de o Tribunal a quo ter à sua disposição extensa prova tanto documental como testemunhal no sentido de o valor dos serviços prestados ser superior ao da condenação parcial concedida na Sentença Recorrida, o mesmo decidiu erradamente, optando pela condenação apenas do valor das faturas pró- forma emitidas.
5. Por forma a que a decisão reflita a prova que foi produzida nos autos, deverá ser alterada a redação de certos factos provados, em concreto os factos provados n.ºs 20, 21 e 27 da Sentença Recorrida.
6. Para além disso, e por força da prova produzida, deverão ser dados como provados outros factos que são essenciais para uma correta decisão nos presentes autos relativamente à quantificação dos serviços e que ficaram amplamente provados.
Alteração Redação Facto Provado n.º 20 da Sentença Recorrida
7. O Tribunal a quo considerou na Sentença Recorrida o facto provado n.º 20. 8. Sucede, porém, que o referido facto provado contém um lapso que deverá ser corrigido.
9. No referido facto provado, faz-se referência a que os valores das faturas pró-forma correspondem a “10% do valor total da obra.”.
10. O que é um lapso, pois a percentagem de 10% constante do valor das faturas pró- forma reporta-se ao valor total dos projetos e não ao valor das obras.
11. É isto que resulta das propostas de honorários dos diversos projetos em causa nos presentes autos – cfr. Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial.
12. Vejamos, a título de mero exemplo, a proposta de honorários referente ao projecto “La Geria” – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
13. Do mesmo resulta que o valor da obra estimado é de € 629.800,00, sendo que o valor dos honorários para os serviços de arquitetura da Autora é de € 56.700,00, sendo 10 % do referido projeto o valor de € 5.670,00, tal como consta da respectiva fatura pró-forma – cfr. Documentos n.ºs 22 e 19 da Petição Inicial.
14. O mesmo acontecendo nos restantes projetos.
15. Pelo exposto resulta que o facto provado n.º 20 da Sentença Recorrida deverá passar a ter a seguinte redação, o que se requer:
“20. Uma vez concluídos os trabalhos solicitados, a Autora, em 30 de Julho de 2020, enviou à Ré, por via postal e por correio electrónico, os Anteprojectos dos 5 projectos identificados anteriormente, acompanhados das respectivas facturas pró- forma (cf. docs. 17 a 21):
i. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Hotel Playa Blanca”, no valor de € 73.760,00, correspondente a 10% do valor total do projeto;
ii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Edifício Atlântida”, no valor de € 97.060,00, correspondente a 10% do valor total do projeto;
iii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Quinta La Geria”, no valor de € 5.670,00, correspondente a 10% do valor total do projeto;
iv. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa dos Calles”, no valor de € 5.210,00, correspondente a 10% do valor total do projeto;
v. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa frente a la Iglesia”, no valor de € 4.200,00, correspondente a 10% do valor total do projeto.”
Alteração Redação Facto Provado n.º 21 da Sentença Recorrida e Aditamento Facto Provado (Percentagem Anteprojeto)
16. Vejamos agora o pedido de reapreciação do facto provado n.º 21 da Sentença Recorrida, considerando que na ótica da Autora deverá ser alterada a sua redação, bem como acrescentado um novo facto provado no elenco dos mesmos.
17. O referido pedido de aditamento será aqui realizado por estar directamente relacionado com o facto provado n.º 21 cuja redação é aqui impugnada.
18. A motivação do Tribunal a quo para dar tal facto como provado consta das págs. 12 e 13 da Sentença Recorrida.
19. Ou seja, no fundo, o Tribunal a quo considera que tal facto é dado com provado devido às faturas pro forma juntas – cfr. Documentos n.ºs 17 a 21 da Petição Inicial – bem como o depoimento da testemunha HH.
20. Sucede, porém, que a prova é bastante mais extensa do que aquela que consta dessas faturas, onde anteprojeto apenas aparece na sua descrição.
21. Assim, na ótica da Autora, tal ponto deverá ser alterado e deverá ser acrescentado um novo facto à matéria de facto considerada provada pela Sentença Recorrida.
22. Isto porque da redação do referido ponto dado como provado parece dar a entender que a entrega foi realizada com um detalhe correspondente a um “Anteprojeto” apenas devido às faturas, quando da prova produzida resulta, de forma clara, que em alguns casos o trabalho entregue apresentou uma definição e grau bastante superior.
23. Não tendo ficado plasmado no elenco dos factos provados, paralelamente, qual a percentagem a que correspondente um Anteprojeto num projeto de arquitetura e neste caso em concreto, é algo que, como iremos ver, é essencial para os presentes autos, designadamente para a quantificação dos serviços prestados pela Autora à Ré.
24. Em relação ao facto provado n.º 21 da Sentença Recorrida e à necessidade de alteração da sua redação existe extensa prova testemunhal, e até documental, produzida nos autos que aponta nesse sentido.
25. Antes de entrarmos nos depoimentos das testemunhas e declarações de parte do legal representante da Autora, é necessário referir, desde logo, pela sua importância que os projetos entregues pela Autora à Ré constam dos Documentos n.ºs 15 e 16 da Petição Inicial, sobretudo deste último, onde se pode ver, como foi explicado amplamente pelas testemunhas, o detalhe dos projetos entregues.
26. Para além disso, é importante vermos, de forma sumária, quais são as fases de um projeto de arquitetura, por forma a entender-se como é que o mesmo se desenrola, antes de aferirmos no caso concreto até que fase e nível de desenvolvimento foram os projetos em causa nos presentes autos – cfr. depoimento da testemunha II prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_10-53-49 – 00:18:24” com início às 10:53 e fim às 11:12) – excerto constante do período [00:08:41] a [00:10:15] e acima transcrito na pág. 105 do presente recurso subordinado.
27. Sendo que tal divisão, com exceção do estudo prévio e das fases das obras, encontra-se plasmada nas propostas de honorários constantes dos presentes autos – cfr. Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial.
28. Ou seja, um projeto de arquitetura divide-se nas seguintes fases: (i) Estudo prévio;
(ii) Anteprojeto; (iii) Projeto-Base e (iv) Projeto de Execução e direção da obra.
29. Em relação à fase em que os projetos em causa nos presentes autos chegaram existe diversa prova sobre a referida matéria.
30. Em relação à prova por declarações de parte sobre esta matéria vejam-se declarações de parte do legal representante da Autora, JJ, prestadas na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_09-38-32 — 01:12:26” com início às 09:38 e fim às 10:51) – excertos constantes dos períodos [00:12:05] a [00:18:38] e [00:20:50] a [00:21:09] e acima transcritos nas págs. 106 a 109 do presente recurso subordinado.
31. Em relação à prova testemunhal veja-se a seguinte:
a. Depoimento da testemunha II prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_10-53-49 – 00:18:24” com início às 10:53 e fim às 11:12) – excertos constantes dos períodos [00:07:37] a [00:08:58] e [00:10:15] a [00:12:48] e acima transcritos nas págs. 109 e 110 do presente recurso subordinado.
b. Depoimento da testemunha KK prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344- 21.7T8LSB_2024-09-23_14-47-41 – 00:15:40” com início às 14:47 e fim às 15:03) – excerto constante do período [00:08:14] a [00:11:12] e acima transcritos nas págs. 111 e 112 do presente recurso subordinado.
c. Depoimento da testemunha HH prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_11-13-08 – 00:20:54” com início às 11:13 e fim às 11:34) – excerto constante do período [00:05:50] a [00:08:10] e acima transcrito nas págs. 112 e 113 do presente recurso subordinado.
d. Depoimento da testemunha GG prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_14-13-31 – 00:33:16” com início às 14:13 e fim às 14:46) – excerto constante do período [00:12:44] a [00:16:37] e acima transcrito nas págs. 113 a 115 do presente recurso subordinado.
32. A acrescentar à prova testemunhal acima referida, veja-se, também, o Documento n.º 42 da Petição Inicial, que consubstancia um email enviado pela Arq. HH ao legal representante da Ré – BB – e o seu filho – CC – onde se faz um resumo / ponto de situação de tudo o que foi feito nos projetos e onde se conclui que estamos perante anteprojetos.
33. Ainda sobre esta matéria é ainda importante fazer referência a uma exposição que foi realizada, no dia 12.11.2019, nas instalações da Autora – cfr. facto n.º 14 da matéria de facto considerada provada pela Sentença Recorrida.
34. A referida exposição foi realizada com o objetivo de demonstrar o trabalho que estava a ser realizado até à data nos processos que se encontravam em curso, à data, ou seja, “Hotel Playa Blanca”, “Edifício Atlântida” e “Quinta La Geria”.
35. Projetos esses que já se encontravam, à data, bastantes avançados, pois caso contrário uma exposição daquela dimensão não teria sido possível.
36. Relativamente à referida exposição, objetivos, nível de detalhe dos projetos bem como se era algo normal, vejamos a seguinte prova testemunhal:
a. Depoimento da testemunha II prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344- 21.7T8LSB_2024-09-23_10-53-49 – 00:18:24” com início às 10:53 e fim às 11:12) – excerto constante do período [00:05:03] a [00:07:44] e acima transcrito nas págs. 117 e 118 do presente recurso subordinado.
b. Depoimento da testemunha GG prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_14-13-31 – 00:33:16” com início às 14:13 e fim às 14:46) – excertos constantes dos períodos [00:06:05] a [00:08:00] e [00:08:38] a [00:09:30] e acima transcritos nas págs. 119 e 120 do presente recurso subordinado.
c. Depoimento da testemunha KK prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344- 21.7T8LSB_2024-09-23_14-47-41 – 00:15:40” com início às 14:47 e fim às 15:03) – excerto constante do período [00:04:06] a [00:06:07] e acima transcrito nas págs. 120 e 121 do presente recurso subordinado.
37. Pelo exposto resulta claro, por um lado, que os elementos enviados pela Autora à Ré, ou seja, os trabalhos realizados têm o detalhe correspondente a, pelo menos, um “Anteprojeto”, ainda que as testemunhas até admitam que possamos estar perante um grau e definição bastante superior, já de um projeto base.
38. Neste sentido, deverá o facto provado n.º 21 da Sentença Recorrida passar a ter a seguinte redação, o que se requer:
“21. Os elementos enviados (peças desenhadas e peças escritas) foram entregues com o detalhe correspondente a, pelo menos, um “Anteprojeto”, ainda que, em alguns casos, o trabalho entregue apresente uma definição e grau bastante superior.”
39. Por outro lado, resulta, também, claro, do acima referido, que a fase de arquitectura correspondente a um Anteprojeto corresponde a 25% de um total de um projecto de arquitetura – cfr. depoimento da testemunha HH prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_11-13-08 – 00:20:54” com início às 11:13 e fim às 11:34) – [00:07:33] a [00:08:07]) – e as declarações de parte do legal representante da Autora, JJ, prestadas na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_09-38-32 — 01:12:26” com início às 09:38 e fim às 10:51) –[00:20:50] a [00:21:09]) – remetendo-se para os excertos acima transcritos nas págs. 108, 112 e 113, por motivos de economia processual.
40. Sendo tal facto reforçado, para além de toda a prova testemunhal acima referida, pelo facto provado n.º 28 da Sentença Recorrida.
41. Neste sentido, e devido à sua importância para a quantificação dos serviços prestados pela Autora à Ré deverá ser aditado o seguinte facto ao elenco dos factos provados constantes da Sentença Recorrida, o que se requer:
“21.a. O Anteprojeto corresponde a 25% do total de um projeto de arquitetura.”.
Aditamento Factos Provados – Faturação vs Trabalhos Efetivamente Realizados
42. Na Sentença Recorrida, o Tribunal a quo condenou a Ré ao pagamento do valor de € 185.900,00 por serviços prestados pela Autora à Ré e que não foram pagos.
43. Tal montante, e que está na base da condenação, corresponde ao valor das faturas pró-forma dos cinco projetos em causa nos presentes autos e que foi faturado à Ré – cfr. Documentos n.ºs 17 a 21 da Petição Inicial e facto provado n.º 20 da Sentença Recorrida.
44. O que corresponderia a 10% do valor total de cada projeto aqui em causa – cfr. propostas de honorários juntas como Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial e as referidas faturas pró-forma, bem como do facto provado n.º 20 da Sentença Recorrida com a nova redação acima referida.
45. Sucede, porém, que como vimos pelo facto provado n.º 21, na nova redação dada acima, bem como pelo aditamento do facto provado 21.a., os trabalhos efetivamente realizados pela Autora à Ré, correspondem, pelo menos, a um Anteprojeto e, portanto, a 25% do total de cada projeto e não apenas a 10% do projeto tal como consta das faturas pró-forma.
46. Sendo que o Tribunal a quo, salvo o devido respeito, não teve em consideração certos factos, que deverão ser aditados, nos termos expostos abaixo, que são essenciais na ótica da Autora para a apreciação dos presentes autos e correta quantificação dos serviços prestados pela Autora à Ré.
47. E esses factos estão relacionados com o facto de a faturação realizada e as suas percentagens não serem correspondentes aos trabalhos efetivamente realizados nos projetos aqui em causa.
48. Ou seja, uma coisa é a faturação / plano de pagamentos acordado entre as partes, ou seja o calendário de pagamentos estabelecido e no qual se prevê o momento em que cada parte/percentagem do valor total a pagar pela realização do projecto é, efetivamente paga. Outra coisa, completamente diferente, são os trabalhos compreendidos em cada fase dos projetos de arquitetura a realizar.
49. Neste contexto é importante chamar a atenção para o facto de a calendarização fixada para efeitos de faturação não ter necessariamente correspondência com o exato trabalho que é, efetivamente, realizado em cada fase do projeto.
50. Veja-se sobre esta matéria as declarações de parte do legal representante da Autora, JJ, prestadas na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_09-38-32 — 01:12:26” com início às 09:38 e fim às 10:51) – excerto constante do período [00:18:49] a [00:21:43] e acima transcrito nas págs. 125 e 126 do presente recurso subordinado.
51. E o depoimento da testemunha HH prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_11-13-08 – 00:20:54” com início às 11:13 e fim às 11:34) – excerto constante do período [00:07:18] a [00:10:01] e acima transcrito nas págs. 126 e 127 do presente recurso subordinado.
52. Pelo exposto resulta de forma clara pela prova acima transcrita que o que está nas propostas de honorários é a percentagem de cada fase ao nível da faturação / plano de pagamentos, não correspondendo necessariamente aos trabalhos efectivamente realizados ou a realizar em cada fase do projeto.
53. Algo que é perfeitamente normal e que resulta, desde logo, da experiência comum, pelo que o afirmado através da prova referida tem todo o cabimento e deverá ser considerado.
54. Sendo que da experiência comum percebe-se, também, que é perfeitamente normal que o pagamento de 10% pressuponha a continuação dos projetos até ao fim, pois estamos perante um mero plano de pagamentos, sendo que caso os projetos não sejam concluídos, deverão ser pagos todos os serviços efectivamente realizados até esse momento e não apenas aqueles correspondentes ao plano de pagamentos acordado.
55. Como vimos, e foi explicado pelo Arq. JJ, a nível de facturação até poderia ter sido combinado pagar tudo apenas no fim, pois estamos perante questões completamente distintas.
56. Por um lado, temos a faturação e pagamento dos trabalhos em momentos específicos por referência a fases dos projetos e, por outro lado, os trabalhos efetivamente realizados.
57. Nesta sequência, e pela sua importância, quanto ao facto de o trabalho realizado ser superior ao faturado, atente-se, para além de tudo o que já vimos acima que aponta nesse sentido, nos Documentos n.ºs 42 e 44 da Petição Inicial.
58. E não se diga que o facto de na carta de interpelação enviada – cfr. Documento n.º 45 da Petição Inicial e facto provado n.º 27 da Sentença Recorrida – ser pedido apenas o pagamento do valor das faturas pró-forma, ou seja, de € 185.900,00 coloca em causa a legitimidade de a Autora vir aqui peticionar o valor dos trabalhos efetivamente realizados.
59. Isto porque a Autora podia legitimamente, para evitar um litígio e resolver as coisas a bem, considerar “fechar” este tema pelo referido valor e não existindo acordo, em sede judicial peticionar, como o fez, o valor dos trabalhos efectivamente realizados.
60. Assim, pelo exposto resulta que deverão ser aditados os seguintes factos provados à Sentença Recorrida, o que se requer:
“33. Os valores constantes das faturas pró-forma enviadas pela Autora à Ré não correspondem ao trabalho efetivamente realizado pela Autora nos projetos em causa nos presentes autos.
34. Os esquemas de faturação previstos nas propostas de honorários – Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial – são indexados às várias fases dos projetos apenas para efeitos de fixação do momento temporal da faturação, não apresentando qualquer correspondência com os trabalhos que são efetivamente realizados em cada fase do projeto.”
Alteração Facto Provado n.º 27 da Sentença Recorrida
61. O Tribunal a quo deu como provado o facto n.º 27.
62. Sucede, porém, que o mesmo contém um lapso / imprecisão que necessita de ser corrigido.
63. Na referida carta de interpelação é solicitado o pagamento do montante de € 185.900,00 – cfr. Documento n.º 45 da Petição Inicial.
64. E o Tribunal a quo considerou que tal interpelação “correspondente ao preço dos serviços prestados.”
65. No entanto, como vimos, tal não corresponde à verdade.
66. Na referida carta de interpelação foi solicitado o pagamento do montante correspondente ao valor constante das faturas pró-forma – cfr. Documentos n.ºs 17 a 21 da Petição Inicial.
67. O que, como vimos supra, não significa que isso tenha sido o trabalho dos valores efetivamente realizados / prestados.
68. Aliás, como vimos acima, ficou demonstrado que o valor das faturas pró-forma não corresponde ao trabalho efetivamente realizado pela Autora nos projetos em causa nos presentes autos – cfr. págs. 124 a 131 acima e facto n.º 33 cujo aditamento acima se requereu.
69. Sendo que a Autora podia legitimamente, para evitar um litígio e resolver as coisas a bem, considerar “fechar” este tema pelo valor constante das faturas pró-forma, independentemente de o mesmo não corresponder aos trabalhos efectivamente realizados.
70. Assim, e por tudo o que acima foi exposto, designadamente no pedido de aditamento de factos provados, conclui-se que a redação do facto provado n.º 27 deverá passar a ser a seguinte, o que se requer:
“27. Em Janeiro de 2021, a Autora endereçou à Ré uma comunicação interpelando-a para a liquidação da quantia correspondente ao valor constante das faturas pró-forma no montante total de € 185.900,00 – cf. doc. 45.”
Aditamento Factos Provados – Valores Propostas Honorários
71. Nos factos n.ºs 23 e 24 considerados provados pela Sentença Recorrida, são feitas referências às propostas de honorários para cada projeto em causa nos presentes autos – cfr. Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial.
72. Sucede, porém, que considerando a sua importância, para a quantificação dos serviços prestados pela Autora à Ré, a Autora considera que deverão ser aditados factos relativos aos valores dos honorários de cada projeto aqui em causa.
73. Pois, só com esses montantes é que, em rigor, se poderão determinar os montantes aqui devidos em termos percentuais, face aos trabalhos efetivamente realizados, “exercício” que se realizará no próximo subcapítulo.
74. E não obstante tais factos serem incontrovertidos, e resultantes da prova documental junta, os mesmos não constam do elenco de factos provados da Sentença Recorrida.
75. Em relação ao projeto “La Geria” o valor total do projeto é de € 56.700,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
76. Em relação ao projeto “Edifício Atlântida” o valor total do projeto é de € 970.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
77. Em relação ao projeto “Hotel Playa Blanca” o valor total do projeto é de € 737.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
78. Em relação ao projeto “Casa en Frente a La Iglesia” o valor total do projeto é de € 42.000,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.
79. Em relação ao projeto “Casa dos Calles” o valor total do projeto é de € 52.100,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.
80. Assim, e como consequência, deverão ser aditados os seguintes factos:
“23.a. Em relação ao projeto “La Geria” o valor total do projeto é de € 56.700,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
23.b. Em relação ao projeto “Edifício Atlântida” o valor total do projeto é de € 970.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
23.c. Em relação ao projeto “Hotel Playa Blanca” o valor total do projeto é de € 737.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
24.a. Em relação ao projeto “Casa en Frente a La Iglesia” o valor total do projeto é de € 42.000,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.
24.b. Em relação ao projeto “Casa dos Calles” o valor total do projeto é de € 52.100,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.”
Alteração Quantificação e Condenação – apreciação meios probatórios
81. É necessário fazer uma apreciação da prova produzida ao longo dos presentes autos para se aferir qual a quantificação correta dos serviços prestados pela Autora à Ré.
82. O Tribunal a quo na Sentença Recorrida considerou que o montante devido pela Ré à Autora é o valor constante das faturas pró-forma – cfr. Documentos n.ºs 17 a 21 da Petição Inicial –, ou seja, € 185.900,00.
83. Sendo que, o Tribunal a quo não considerou para efeitos de quantificação do referido valor o parecer constante do facto provado n.º 28 da Sentença Recorrida que considera um valor superior face aos trabalhos efetivamente realizados.
84. Sucede, porém, que como vimos, e ao contrário do que o Tribunal a quo considerou, existe muito mais prova para além do referido parecer no sentido de que os trabalhos efetivamente realizados são superiores ao valor constante das faturas pró-forma, que, no fundo, correspondem a apenas 10% do valor do total dos honorários para cada projeto.
85. E, portanto, em relação à quantificação da condenação, a Sentença Recorrida deverá ser alterada por existir quanto a esse um ponto um erro de julgamento, resultado da errada apreciação da prova produzida nos autos, seja ela testemunhal ou documental.
86. Pelo exposto resulta que os serviços prestados, e sobre os quais a Ré não procedeu a qualquer pagamento à Autora, correspondem a, pelo menos, 25% do valor total dos trabalhos a prestar para cada projeto em causa nos presentes autos.
87. Assim, nesta sequência, é necessário aferir qual o valor de honorários que corresponde a prestação de serviços de 25% de cada projeto.
88. Em relação ao projeto “La Geria” o valor total do projeto é de € 56.700,00 – cfr.Documento n.º 22 da Petição Inicial e facto provado n.º 23.a. acima aditado – pelo que 25% do projeto corresponde ao montante de € 14.175,00.
89. Em relação ao projeto “Edifício Atlântida” o valor total do projeto é de € 970.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial e facto provado n.º 23.b. acima aditado – pelo que 25% do projeto corresponde ao montante de € 242.650,00.
90. Em relação ao projeto “Hotel Playa Blanca” o valor total do projeto é de € 737.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial e facto provado n.º 23.c. acima aditado – pelo que 25% do projeto corresponde ao montante de € 184.400,00.
91. Em relação ao projeto “Casa en Frente a La Iglesia” o valor total do projeto é de € 42.000,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial e facto provado n.º 24.a. acima aditado – pelo que 25% do projeto corresponde ao montante de € 10.500,00.
92. Em relação ao projeto “Casa dos Calles” o valor total do projeto é de € 52.100,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial e facto provado n.º 24.b. acima aditado – pelo que 25% do projeto corresponde ao montante de € 13.025,00.
93. Totalizando o valor de 25% referente ao total dos projetos em causa nos presentes autos, o valor de € 464.750,00.
94. Ora, tal valor é superior ao pedido constante da Petição Inicial, que foi de € 461.691,75, discriminado conforme o constante no artigo 56.º da Petição Inicial.
95. Contudo, da prova produzida nos presentes autos, resultou que o nível dos serviços efetivamente prestados foi de, pelo menos, 25% do valor total de cada projeto, ou seja, ligeiramente superior ao peticionado.
96. Logo, e devido às limitações constantes dos artigos 3.º, n.º 1 e 609.º do CPC, o valor que a Ré deverá se condenada é de € 461.691,75.
97. Deverá, assim, a Sentença Recorrida ser substituída por outra que condene totalmente a Ré, em concreto no pagamento desta à Autora no montante de € 461.697,75.
Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão,
Deverá ser dado provimento ao presente recurso de apelação subordinado e, em consequência, deve ser parcialmente revogada a Sentença Recorrida, sendo substituída por outra na qual o Ré seja condenada ao pagamento do montante de € 461.691,75, acrescido de juros vencidos e vincendos até integral pagamento.
POIS SÓ ASSIM SE FARÁ A COSTUMADA JUSTIÇA!”
Veio a Ré juntar contra-alegações ao recurso subordinado apresentado pela Autora, terminando com as seguintes conclusões:
i. Veio a Autora/Apelada interpor recurso subordinado, impugnando a sentença recorrida na parte em que ficou vencida, peticionando, a final que seja a Ré/Apelante condenada na totalidade do pedido por si deduzido;
ii. Sendo o presente recurso subordinado, o conhecimento do mesmo pelo Venerando Tribunal ad quem encontra-se condicionado ao não provimento do recurso principal interposto pela Ré/Apelante, de cujo conhecimento a mesma não prescinde;
iii. Assim, oferece a Ré/Apelante as presentes contra-alegações de recurso por mera cautela de patrocínio e sem conceder quanto ao mérito do recurso principal;
iv. Tratando-se a situação sub judice de uma relação jurídica controvertida, importa, antes de mais, precisar que a lei aplicável aos “contratos” que constituem causae petendi dos presentes autos é a lei portuguesa, em virtude de ser a lei da sede do prestador de serviços, nos termos do art.º 4.º, n.º 1, alínea b), do Regulamento Roma I;
v. Pretende a Autora/Apelada ver alterada a redacção do ponto n.º 20 dos factos considerados provados, ponto esse que refere os “trabalhos solicitados”;
vi. Ora, a Ré/Apelante não solicitou, em momento algum, quaisquer trabalhos, nem sendo sequer proprietária dos imóveis onde os projectos sub judice seriam realizados – cfr. Documentos n.ºs 3 a 7 juntos à contestação;
vii. E mais: foi celebrado contrato entre a Autora/Apelada e a sociedade Vista Cálida, S.L. – proprietária do imóvel em apreço – com vista à elaboração de “estudo conceptual” relativo ao projecto “Hotel Playa Blanca” – cfr. Documentos n.ºs 3 e 11 junto à contestação;
viii. Sendo ainda claro da leitura dos Documentos n.ºs 3, 26 e 37 juntos à petição inicial que o projecto “Hotel Playa Blanca” nada tem a ver com a Ré/Apelante;
ix. Relativamente ao “Edifício Atlântida”, cumpre frisar que tal imóvel é propriedade do Senhor DD – cfr. Documento n.º 4 junto à contestação – pelo que é o mesmo inteiramente alheio à Ré/Apelante;
x. Tendo, relativamente a tal projecto, sido solicitado orçamento pelo Senhor BB – cfr. Documento n.º 37 junto à petição inicial – sem que, contudo, tenha sido carreada para os autos prova de qualquer adjudicação;
xi. O imóvel no qual iria ser executado o projecto “Quinta La Geria” é propriedade da sociedade Volcán del Sol, S.L. – cfr. Documento n.º 5 junto à contestação – tendo o Senhor BB indicado que tal projecto teria carácter pessoal – cfr. Documento n.º 4 junto à petição inicial, pelo que o mesmo é inteiramente alheio à Ré/Apelante;
xii. E veio o Senhor BB solicitar a 1 de Abril de 2019 o envio de proposta de honorários – cfr. Documento n.º 6 junto à contestação – sem que, contudo, tenha ocorrido qualquer adjudicação, tendo ainda o Senhor CC reiterado tal pedido de envio de proposta de honorários – cfr. Documento n.º 7 junto à contestação;
xiii. Relativamente aos projectos “Casa frente a la Iglesia” e “Casa que da a dos calles”, há que notar que tais imóveis são outrossim propriedade de terceiros – Documentos n.ºs 6 e 7 juntos à contestação – e que todas as solicitações de propostas de honorários foram realizadas pelo Senhor CC, o qual não tinha quaisquer poderes de representação ou de decisão relativamente à Ré/Apelante, faltando-lhe, pois, qualquer legitimidade para agir em nome e por conta desta – cfr. Documentos n.ºs 8, 12 a 14 juntos à petição inicial, declarações de parte do legal representante da Ré/Apelante entre os minutos 00:20:18 e 00:22:39, declarações de parte do legal representante da Autora/Apelada entre os minutos 00:30:56 e 00:31:09, depoimento da testemunha GG entre os minutos 00:19:52 e 00:19:56 e 00:21:22 e 00:22:01 e ponto n.º 30 dos factos considerados provados;
xiv. Não existiram, portanto, quaisquer “trabalhos solicitados” pela Ré/Apelante;
xv. No entanto, assiste razão à Autora/Apelada quanto ao facto de a sentença recorrida enfermar de lapso quando se refere “10% do valor total da obra”, uma vez que as facturas pro forma foram emitidas em valor correspondente a 10 % (dez por cento) do projecto;
xvi. Motivo pelo qual, não deve o ponto n.º 20 dos factos considerados provados ser alterado nos termos requeridos pela Autora/Apelada, antes deve ser alterado nos termos requeridos pela Ré/Apelante nas suas alegações de recurso, aceitando-se, no entanto, a correcção do lapso vertido na sentença (não detectado pela Ré/Apelante aquando das suas alegações de recurso) por forma a constar que os 10% incidem sobre o valor dos projectos e não das obras.
xvii. Impugna ainda a Autora/Apelada o ponto n.º 21 dos factos julgados provados, suscitando que o trabalho entregue pela Autora/Apelada tem um grau de detalhe manifestamente superior ao que seria expectável de um anteprojecto;
xviii. Ora, as fases de um projecto de arquitectura não estão balizadas por qualquer delimitação rígida e imperativa, salvo no que respeita a projectos que respeitem a empreitadas de obras públicas, encontrando-se, portanto, no plano da liberdade contratual;
xix. Cumpre, no entanto, notar que, nos projectos de obras públicas, existem, em conformidade com o disposto no regime anexo à Portaria n.º 255/2023, de 7 de Agosto, as seguintes fases: programa base, estudo prévio, anteprojecto (ou projecto-base) e projecto de execução e assistência técnica;
xx. Optou, no entanto, a Autora/Apelada por utilizar fraseologia fundamentalmente distinta da aplicável a projectos de obras públicas, dividindo, deste modo, o seu projecto nas seguintes fases: anteprojecto, projecto-base, projecto de execução e direcção/apoio técnico à obra;
xxi. Correspondia, nas propostas de honorários elaboradas pela Autora/Apelada, o anteprojecto no desenvolvimento dos aspectos fundamentais e das características gerais da obra, com o objectivo de fornecer uma primeira imagem global da obra e de estabelecer uma antecipação do orçamento, incluindo, assim, a elaboração de uma memória, e planos gráficos gerais, de uma estimativa de orçamento e de maquetes de estúdio – cfr. Documentos n.ºs 13 e 22 juntos à petição inicial;
xxii. Já o projecto-base correspondia à fase em que são apresentados os aspectos fundamentais das características gerais da obra: funcionais, formais, construtivas e económicas, com o objectivo de dar uma imagem global da obra e estabelecer um orçamento, sendo o seu conteúdo suficiente para solicitar a licença municipal ou outras autorizações administrativas, englobando a elaboração de uma memória, de planos às escalas de 1:100 e 1:20, a elaboração de um orçamento com estimativa global, de documentos complementares e projectos parciais e maquetes de estúdio – cfr. Documentos n.ºs 13 e 22 juntos à petição inicial;
xxiii. Compulsada a prova carreada para os autos, verifica-se que a documentação elaborada pela Autora/Apelada relativamente aos projectos por si elaborados indica expressamente que o trabalho elaborado se trata de um “anteprojecto” – cfr. Documento n.º 16 junto à petição inicial;
xxiv. Verificando-se, aliás, que as plantas dos projectos foram elaboradas em escala 1:200 ou maior, encontrando-se as plantas desprovidas de qualquer detalhe de relevo;
xxv. Apenas algumas plantas no projecto “La Geria” estão em escala 1:100, indicando, em todo o caso, tratar-se de um anteprojecto, bem se compreendendo o recurso a uma escala menor para expor um esboço uma vez que, tratando-se de um conjunto rural, o recurso a escala maior impossibilitaria qualquer compreensão da ideia da Autora/Apelada;
xxvi. O trabalho elaborado pela Autora/Apelada é bastante genérico e visa sobretudo dar aos proprietários dos prédios uma ideia geral da obra e seus custos de forma a possibilitar uma avaliação perfunctória da viabilidade da mesma, sendo, com efeito, as memórias descritivas elaboradas e as peças desenhadas meros esboços do trabalho final prefigurado pela Autora/Apelada;
xxvii. Bem se compreende, assim, que a Autora/Apelada tenha emitido facturas pro forma a 29 de Julho de 2020 nas quais, mau grado o erro na identificação do destinatário, indica correctamente que o trabalho realizado se trata de um anteprojecto – cfr. Documentos n.ºs 17 a 21 juntos à petição inicial;
xxviii. Decorre claramente das regras da experiência, atendíveis para a valoração da prova por presunções hominis, nos termos do art.º 351.º do CC, que, caso tivesse a Autora/Apelada realizado até então trabalho para além dos limites do mero anteprojecto, teria procedido à emissão de facturas em valores que contemplassem tal acréscimo de trabalho;
xxix. Bem como não faria qualquer sentido que, caso a Autora/Apelada tivesse realizado trabalho que constituísse um plus relativamente à fase de anteprojecto, viesse interpelar a Ré/Apelante por carta enviada por Advogados – cfr. Documento n.º 45 junto à petição inicial – solicitando apenas o pagamento dos honorários relativos à fase de anteprojecto, ignorando o valor de trabalhos que tivessem sido realizados a jusante;
xxx. A Autora/Apelada não facturou nem interpelou a Ré/Apelante para o pagamento de valores superiores aos referentes aos anteprojectos porque bem sabia que os projectos em curso se encontravam na fase de anteprojecto, não se tendo iniciado quaisquer trabalhos relativos à fase do projecto-base, tal como definidas pela Autora/Apelada;
xxxi. Nem faria, aliás, sentido que, encontrando-se por pagar os honorários referentes à fase de anteprojecto nos projectos sub judice, a Autora/Apelada continuasse a trabalhar sem nada receber das sociedades proprietárias dos imóveis, não sendo tal conduta razoavelmente expectável de um atelier de arquitectos de renome internacional;
xxxii. O facto de que o trabalho desenvolvido corresponde à fase de anteprojecto é reconhecido no e-mail da Senhora Arq.ª HH no e-mail de 23 de Setembro de 2020 – cfr. Documento n.º 42 junto à contestação – no qual é feito um ponto de situação dos trabalhos realizados pela Autora/Apelada e é ainda enviado um conjunto de imagens de cujas legendas mencionam “estudo prévio” ou “anteprojecto”, ficando, portanto, claro que o trabalho desenvolvido não passou da fase de anteprojecto;
xxxiii. Era, aliás, o trabalho realizado nos projectos “La Geria” e “Edifício Atlântida” inexequível por violar normas urbanísticas – cfr. depoimento da testemunha Senhora LL entre os minutos 00:09:04 e 00:13:52;
xxxiv. Tendo, em todo o caso, o legal representante da Autora/Apelada Senhor Arq. JJ indicado, de forma peremptória, que o trabalho realizado corresponde a um anteprojecto – cfr. declarações de parte do Senhor Arq. JJ entre os minutos 00:14:29 e 00:15:20;
xxxv. Ficando ainda demonstrado que a Autora/Apelada cobra honorários mais baixos nas fases iniciais do projecto como forma de fidelizar o cliente – cfr. declarações de parte do Senhor JJ entre os minutos 00:18:48 e 00:19:21;
xxxvi. Corresponde, pois, à fase de anteprojecto, nas propostas de honorários apresentadas pela Autora/Apelada, 10 % (dez por cento) do valor total do projecto – cfr. Documentos n.ºs 13 e 22 juntos à petição inicial;
xxxvii. E, caso se aplicasse à faseologia do projecto de arquitectura a terminologia vigente em matéria de empreitadas de obras públicas em Portugal, tendo em atenção o carácter genérico do trabalho apresentado e a sua função de enquadramento geral, o mesmo corresponderia ao programa base tal como definido nos art.ºs 1.º, alínea r), e 4.º, n.º 1, ambos da Portaria n.º 255/2023, de 7 de Agosto, e dos art.ºs 1.º, alínea m), e 4.º, n.º 1, ambos do regime anexo à Portaria n.º 701-H/2008, de 29 de Julho; xxxviii. Tendo, portanto, o valor relativo de 10 % (dez por cento) do valor total do projecto, nos termos do art.º 12.º, n.º 1, da Portaria n.º 255/2023 e do art.º 12.º do regime anexo à Portaria n.º 701-H/2008, de 29 de Julho, de 10 % (dez por cento) do valor total do projecto;
xxxix. Deve, portanto, manter-se a redacção contante da sentença quanto ao ponto 21 dos factos considerados provados.;
xl. Pretende ainda a Autora/Apelada aditar o ponto 21A ao rol dos factos considerados provados, pretendendo que o Venerando Tribunal ad quem considere como provado que o anteprojecto corresponde a 25 % (vinte e cinco por cento) do total de um projecto de arquitectura;
xli. Dando-se, antes de mais, por integralmente reproduzidas todas as considerações tecidas supra a respeito de que os honorários devidos pela elaboração dos anteprojectos corresponderiam a 10 % (dez por cento) do valor total dos projectos – cfr., em especial, os Documentos n.º 13 e 22 juntos à petição inicial – cumpre ainda notar que o laudo de honorários junto como Documento n.º 28 à petição inicial enferma de graves defeitos que esvaziam por completo a sua força probatória;
xlii. Ora, o laudo de honorários desconsidera, em primeiro lugar, que a lei aplicável aos contratos sub judice é a lei portuguesa, sendo proferido em violação da proibição vigente em Espanha de as ordens profissionais se pronunciarem em matéria de honorários – cfr. art.º 14.º da Lei n.º 2/1974, na redacção actualmente em vigor;
xliii. Acresce ainda que o laudo é emitido pelo Colégio Oficial de Arquitectos de Tenerife, La Gomera e El Hierro, o qual sempre seria territorialmente incompetente uma vez que todos os projectos sub judice seriam realizados na ilha de Lanzarote, pelo que, caso houvesse lugar a intervenção de associação pública profissional, a mesma deveria ser solicitada ao Colégio Oficial de Arquitectos de Lanzarote;
xliv. Tal laudo foi solicitado pelo Senhor Arq. MM, o qual, sendo colaborador da Autora/Apelada nos projectos sub judice, era ainda, à data da emissão do laudo, dirigente de tal Colégio de Arquitectos, o que compromete irremediavelmente a imparcialidade do órgão emissor do laudo;
xlv. É ainda preconizada a aplicação da tarifação prevista no ponto 1.12. do Real Decreto n.º 2512/1977 quando os honorários dos arquitectos foram liberalizados por força da Lei n.º 7/1997, de 14 de Abril;
xlvi. Não tendo, portanto, o laudo em apreço qualquer credibilidade, pelo que o mesmo deve ser integralmente desconsiderado pelo Venerando Tribunal ad quem, indeferindo-se o aditamento do ponto 21A aos factos considerados provados;
xlvii. A Autora/Apelada pretende ademais aditar os pontos 33 e 34 aos factos considerados provados, suscitando que os valores das facturas pro forma não correspondem ao trabalho efectivamente realizado pela Autora nos projectos sub judice e que a repartição dos valores prevista nas propostas de honorários existe tão-só para fixação do momento da facturação, não tendo qualquer correspondência com os trabalhos efectivamente realizados em cada fase do projecto;
xlviii. Há, portanto, que reiterar na presente sede, conforme já oportunamente notado nas considerações expendidas supra, que os trabalhos realizados pela Autora/Apelada não passaram da fase de anteprojecto;
xlix. E foram tais trabalhos realizados no seguimento de propostas de honorários – cfr, Documentos n.ºs 13 e 22 juntos à petição inicial, que indicavam que o anteprojecto seria remunerado com valor correspondente a 10 % (dez por cento) do valor total do projecto;
l. Sem que, contudo, as mesmas indicassem quais as condições de pagamento, pelo que se conclui que a divisão dos honorários por fases do projecto não se reporta à facturação, mas antes à repartição da remuneração do trabalho a efectuar por cada fase dos mesmos;
li. Deve, por conseguinte, ser indeferido o aditamento dos pontos 33 e 34 aos
factos considerados provados;
lii. E pretende a Autora/Apelada ainda a alteração do ponto 27 dos factos considerados provados com vista a que a redacção do mesmo reflicta a sua tese de que o valor dos trabalhos efectuados ultrapassa aquele dos trabalhos facturados;
liii. Ora, conforme já frisado anteriormente, os valores referidos nas facturas correspondem aos honorários devidos pela elaboração de anteprojectos, de harmonia com as propostas de honorários constantes dos autos como Documentos n.ºs 13 e 22 juntos à petição inicial;
liv. Pelo que, ainda que a Ré/Apelante não seja parte em quaisquer contratos de prestação de serviços e, como tal, não ser devedora de quaisquer montantes à Autora/Apelada, a verdade é que os valores constantes das facturas correspondem, em face da prova carreada para os autos, ao montante objectivamente devido pelos serviços prestados, devendo, por conseguinte, ser indeferida a alteração pretendida ao ponto n.º 27 dos factos considerados provados;
lv. Queda, em face do supra-exposto, evidente que a Ré/Apelante não é parte em qualquer dos contratos sub judice, uma vez que não é possível encontrar qualquer manifestação de vontade realizada por qualquer dos administradores da Ré/Apelante agindo nessa qualidade;
lvi. Sendo os administradores quem representa a sociedade, nos termos do art.º 233.º, n.º 2, alínea b), da Lei de Sociedades de Capitais espanhola, aplicável por força da norma de conflitos constante do art.º 3.º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais, não é possível, salvo nos casos de representação voluntária, imputar qualquer acto à Ré/Apelante sem que no mesmo intervenha administrador agindo em tal qualidade;
lvii. Não é, em face da prova carreada para os autos, possível descortinar se a Autora/Apelada celebrou efectivamente contratos relativamente aos projectos sub judice, salvo quanto ao projecto “Hotel Playa Blanca”, o qual foi encomendado pela sociedade Vista Cálida, S.L.;
lviii. E, caso assim não se entenda, o que não se concede e apenas a benefício de raciocínio se concebe, foram celebrados com a Autora/Apelada contratos de prestação de serviços relativos aos imóveis “La Geria”, “Edifício Atlântida”, “Hotel Playa Blanca”, “Casa en frente a la Iglesia” e “Casa dos Calles”, nos termos do art.º 1154.º do CC;
lix. Contratos esses que são onerosos, em face de a Autora/Apelada ter por objecto a prestação de serviços de arquitectura, nos termos do art.º 1158.º, n.º 1, 2.ª parte, aplicável ex vi art.º 1156.º, ambos do CC;
lx. Ora, a remuneração do prestador de serviços de arquitectura é livremente fixada pelas partes, nos termos do art.º 1158.º, n.º 2, aplicável ex vi art.º 1156.º, ambos do CC;
lxi. Deve, portanto, o arquitecto definir claramente as fases do projecto e a respectiva remuneração, nos termos do art.º 56.º, n.º 2, alínea a), do Estatuto da Ordem dos Arquitectos, devendo a remuneração constar de documento escrito, nos termos do art.º 9.º, alínea a), do Regulamento de Deontologia e Procedimento Disciplinar da Ordem dos Arquitectos;
lxii. Inexiste, portanto, qualquer imposição legal relativa à fixação dos honorários dos arquitectos, podendo as partes livremente convencionar o seu valor, ainda que tal acordo deva revestir a forma escrita;
lxiii. Atento o iter contractus, verifica-se que a Autora/Apelada elaborou propostas de honorários nas quais indicou as condições mediante as quais prestaria os seus serviços, discriminando, em obediência ao comando normativo vertido no art.º 56.º, n.º 2, alínea a), do Estatuto da Ordem dos Arquitectos, o valor total dos projectos, as fases dos mesmos e a concomitante repartição dos honorários por fases;
lxiv. As propostas de honorários enviadas consubstanciam declarações negociais para os efeitos dos art.ºs 217.º, n.º 1, e 224.º, n.º 1, ambos do CC;
lxv. Procedeu a Autora/Apelada, em tais propostas de honorários, a repartir os honorários a serem por si percebidos pelas fases do projecto da seguinte forma:
i. Anteprojecto – 10 % (dez por cento) do valor total do projecto;
ii. Projecto base – 30 % (trinta por cento) do valor total do projecto;
iii. Projecto de execução – 30 % (trinta por cento) do valor total do projecto;
iv. Direcção de obra – 30 % (trinta por cento) do valor total do projecto;
lxvi. Qualquer actuação subsequente por parte da Autora/Apelada relativa à execução dos projectos de arquitectura sub judice teria de assentar forçosamente numa aceitação – expressa ou tácita, nos termos dos art.ºs 217.º, n.ºs 1 e 2, e 234.º, ambos do CC – mas sempre revestindo a forma escrita, nos termos do art.º 9.º, alínea a), do Regulamento de Deontologia e Procedimento Disciplinar da Ordem dos Arquitectos;
lxvii. As fases do projecto de arquitectura e os honorários devidos pela execução de cada fase são registos pelas propostas de honorários, pelo que a Autora/Apelada se obrigaria a executar, no anteprojecto, as peças escritas e desenhadas indicadas em tais documentos, recebendo, em contrapartida, honorários correspondentes a 10 % (dez por cento) do valor total do projecto;
lxviii. A opção de se remunerar a elaboração do anteprojecto com uma parte do valor total do projecto decorre da autonomia privada das partes e, em especial, da iniciativa da Autora/Apelada nesse sentido, sendo, aliás, opção assumida por esta última cobrar valores relativamente mais baixos nas primeiras fases dos projectos como forma de fidelizar os clientes;
lxix. Assim, é evidente que a repartição dos honorários contemplada nas propostas de honorários visa destrinçar a remuneração da Autora/Apelada pela execução de cada fase e não, contrariamente ao que a Autora/Apelada quer fazer parecer, uma mera divisão cronológica da facturação;
lxx. A divisão dos honorários prevista nas propostas de honorários tem por subjacente o sinalagma contratual existente entre a prestação de serviços pela Autora/Apelada e a remuneração a cargo da contraparte respectiva;
lxxi. Bem se compreendendo, em todo o caso, que se tenha optado por remunerar os anteprojectos com o valor de 10 % (dez por cento) do valor total de cada projecto uma vez que, tal fase corresponde, na terminologia em uso no domínio das empreitadas de obras públicas, a um programa base nos termos dos art.ºs 1.º, alínea m), e 4.º, do então vigente regime anexo à Portaria n.º 701-H/2008, de 29 de Julho, ao qual corresponde o valor parcelar de 10 % (dez por cento) do projecto nos termos do art.º 12.º do diploma supra-referido;
lxxii. E, mesmo que fosse aplicável o direito espanhol aos contratos sub judice, jamais poderia a Autora/Apelada reclamar mais do que 10 % (dez por cento) do valor total dos projectos, porquanto os honorários dos arquitectos foram liberalizados pela Lei n.º 7/1997, de 14 de Abril, sendo, deste então, os mesmos fixados de livre acordo entre as partes;
lxxiii. O arquitecto, quando convencione prestar os seus serviços no quadro de
um acordo de preço fixo, não pode, nos termos do art.º 1593.º do Código Civil espanhol, reclamar montante maior do que o acordado, salvo quando tenha ocorrido aumento de trabalho, o que não sucedeu;
lxxiv. E improcede ainda, de forma gritante, a invocação sub-reptícia do já revogado Real Decreto n.º 2512/1977, a qual assenta, aliás, num laudo proferido por entidade incompetente à qual é legalmente vedada a emissão de tais documentos e cuja imparcialidade é posta em causa pelo facto de o laudo ter sido requerido por arquitecto parceiro da Autora/Apelada que era, à data da sua prolação, membro dos órgãos de direcção da entidade emitente;
lxxv. Claro é, portanto, que, independentemente do direito aplicável, vigora o princípio pacta sunt servanda, segundo o qual a Autora/Apelada não poderá exigir mais do que o acordado;
lxxvi. Definidas que foram as fases dos projectos nas propostas de honorários elaboradas e estabelecida a remuneração parcelar de cada uma, é esse valor que deve vigorar, não podendo, portanto, a remuneração da Autora/Apelada exceder os 10 % (dez por cento) do valor total de cada projecto, em face de ser esse o valor indicado pela Autora/Apelada;
lxxvii. Improcede, portanto, in totum o recurso subordinado interposto pela Autora/Apelada, devendo ser negado o provimento ao mesmo.
Termos em que V. Exas. negarão o provimento ao presente recurso, mantendo-se a douta decisão recorrida, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!
*
Admitido o recurso neste tribunal e colhidos os vistos, cumpre decidir.
*
II. Objecto do Recurso - Questões a decidir:
O objecto do recurso é definido pelas conclusões da recorrente (arts. 5.º, 635.º n.º3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do CPC), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.
Importa assim, saber se, no caso concreto:
a)- apreciar a impugnação da matéria de facto
a.1 Recurso Principal
Factos provados
a.1.a) Introdução de 5 novos factos com o seguinte teor:
A) O imóvel onde se insere o projecto “Hotel Playa Blanca” é propriedade de VISTA CALIDA S.L.;
B) O imóvel onde se insere o projecto “Edifício Atlântida” é propriedade de:
DD;
C) O imóvel onde se insere o projecto “Quinta La Geria” é propriedade de VOLCAN DEL SOL, S.L.;
D) O imóvel onde se insere o projecto “Casa dos Calles” é propriedade de: EE (20%) e TIENDAS ESPECIALIZADAS DE CANARIAS, S.L. (80%) e,
E) O imóvel onde se insere o projecto “Casa frente a la Iglesia” é propriedade de
MAYORISTA CANARIAS, S.L.;
a.1.b) exclusão do facto 3 do elenco dos factos provados;
a.1.c) exclusão do facto 5 do elenco dos factos provados ou alteração da sua redacção para “CC convidou a Autora para a elaboração do projecto de arquitectura do hotel Playa Blanca, um estabelecimento hoteleiro de 5 estrelas localizado em frente ao mar, contendo áreas destinadas a quartos, a tratamento e bem-estar, salas de estar e de refeição e espaços de apoio à actividade hoteleira, incluindo áreas de arranjos exteriores afectas aos hóspedes”.
a.1.d) exclusão dos factos 7, 9 e 26 do elenco dos factos provados ou, no limite, alterar a redacção dos dois primeiros para a seguinte redacção única: ““BB consultou o legal representante da Autora acerca da possibilidade da elaboração do projecto de arquitectura que consistia na remodelação do edifício “Atlântida”, sito em Arrecife, Lanzarote, e na transformação do conjunto em áreas afectas à hotelaria, zonas de restauração, bares, supermercado e zona de venda de produtos regionais, bem como do projecto de arquitectura de uma quinta, sita em La Geria, que envolvia a remodelação e adaptação de uma casa e
espaços de apoio em casa particular/turismo de habitação ou rural, incluindo áreas de arranjos exteriores”.
a.1.e) Alteração da redacção dos factos 20 e 23 para a seguinte redacção
“20. A Autora, em 30 de Julho de 2020, enviou à Ré, por via postal e por correio electrónico, os Anteprojectos dos 5 projectos identificados anteriormente, acompanhados das respectivas facturas pró-forma (cf. docs. 17 a 21) (…)”.
“23. Em Fevereiro de 2020, a Autora enviara a CC, as
propostas de honorários respeitantes a cada projecto – “Hotel Playa Blanca”, “La Geria “e “Edifício Atlântida” -, individualmente considerado, de acordo com a percentagem correspondente a cada fase do trabalho a realizar/realizado, como o “Anteprojecto, o Projecto Base, o Projecto de Execução e Direcção de Obra” (cf. doc. 22)”
a.1.f) eliminação do facto 22 dos factos provados.
a.1.g) Eliminação do facto 24 do elenco dos factos provados ou, em alternativa, alteração da sua redacção para a seguinte “24. Quanto aos projectos das “Casa que da a dos Calles” e “Casa frente a la Iglesia”, as respectivas propostas de honorários foram apresentadas pela Autora a CC, em 24 de Junho de 2020”.
a.1.h) alteração da redacção do ponto 25 passando o mesmo a ter a seguinte redacção ““25. A empresa Vista Calida S.L. pagou à Autora um valor inicial de € 6000 correspondente ao pagamento do “estudo conceptual” do projecto do “Hotel Playa Blanca”, enviado em 2017)”.
a.1.i) passagem do facto 31. para o elenco dos factos não provados.
Factos Não provados
a.1.j) Eliminação do facto a) dos factos não provados e acrescentar-se aos factos provados o seguinte facto: “A Ré em nenhum momento solicitou à Autora a elaboração de qualquer projecto de arquitectura referente os imóveis supra identificados (artigo 40º da contestação)”.
a.2 Recurso Subordinado
a.2.a) Alteração da redacção dos factos 20, 21 e 27 dos Factos Provados e introdução de um facto 21.a;
a.2.b) introdução de um novos factos – 33 e 34 – com o seguinte teor:
“33. Os valores constantes das faturas pró-forma enviadas pela Autora à Ré não correspondem ao trabalho efetivamente realizado pela Autora nos projetos em causa nos presentes autos.
34. Os esquemas de faturação previstos nas propostas de honorários – Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial – são indexados às várias fases dos projetos apenas para efeitos de fixação do momento temporal da faturação, não apresentando qualquer correspondência com os trabalhos que são efetivamente realizados em cada fase do projeto.”
a.2.c) alteração do facto 27 dos factos provados, passando o mesmo a ter o seguinte teor:
“27. Em Janeiro de 2021, a Autora endereçou à Ré uma comunicação interpelando-a para a liquidação da quantia correspondente ao valor constante das faturas pró-forma no montante total de € 185.900,00 – cf. doc. 45.”
a.2.d) aditamentos de 5 factos (23.a, 23.b, 23c, 24a e 24b) com o seguinte teor:
“23.a. Em relação ao projeto “La Geria” o valor total do projeto é de € 56.700,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
23.b. Em relação ao projeto “Edifício Atlântida” o valor total do projeto é de € 970.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
23.c. Em relação ao projeto “Hotel Playa Blanca” o valor total do projeto é de € 737.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
24.a. Em relação ao projeto “Casa en Frente a La Iglesia” o valor total do projeto é de € 42.000,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.
24.b. Em relação ao projeto “Casa dos Calles” o valor total do projeto é de € 52.100,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.”
b) – Apreciação Jurídica
b.1. Recurso Principal
b.1.a)- da vinculação da sociedade Ré apenas com a intervenção de um administrador;
b.1.b)- da ausência de contrato
b.1.c) - do eventual recurso ao instituto da desconsideração da personalidade jurídica
b.2. Recurso Subordinado
b.2.a) da alteração da quantificação da condenação em função dos serviços efectivamente prestados.
*
III. Fundamentação:
Na primeira instância foram considerados provados os seguintes:
Factos provados
1. A Autora é um gabinete de arquitectura sediado em Portugal de renome internacional.
2. A visibilidade e o mérito do trabalho desenvolvido pelo seu legal representante, JJ, valeu-lhe a atribuição de diversos prémios, nacionais e internacionais, granjeando-lhe prestígio no panorama da arquitectura internacional.
3. Entre 2017 e 2019 a Autora recebeu convites de BB, para a elaboração de um total de 5 projectos de arquitectura a desenvolver na ilha de Lanzarote (arquipélago das Canárias) - ALTERADO.1
4. BB é responsável pela administração de diversas sociedades de direito espanhol, sediadas em Lanzarote, entre as quais a Ré.
5. Um desses projectos foi o projecto de arquitectura do hotel Playa Blanca, um estabelecimento hoteleiro de 5 estrelas localizado em frente ao mar, contendo áreas destinadas a quartos, a tratamento e bem-estar, salas de estar e de refeição e espaços de apoio à actividade hoteleira, incluindo áreas de arranjos exteriores afectas aos hóspedes (doc. 3).
6. Esse Hotel tinha uma área bruta total projectada de 10.210m2 e um custo de obra estimado de € 11.176.000,00.
7. Em Fevereiro de 2019, a Ré, na pessoa, quer de BB, quer de CC, solicitou ao legal representante da Autora a elaboração do projecto de arquitectura do Edifício Atlântida, que consistia na remodelação do edifício “Multicines”, sito em Arrecife, Lanzarote, e na transformação do conjunto em áreas afectas à hotelaria, zonas de restauração, bares, supermercado e zona de venda de produtos regionais (docs. 4 a 6).
8. Esse Edifício tinha uma área bruta total de 16.780m2 e um custo de obra estimado de € 15.167.000,00.
9. Nessa mesma época, a Ré, na pessoa, quer de BB, quer de CC, solicitou ao legal representante da Autora a elaboração do projecto de arquitectura de uma quinta, sita em La Geria, que envolvia a remodelação e adaptação de uma casa e espaços de apoio em casa particular/turismo de habitação ou rural, incluindo áreas de arranjos exteriores (doc. 7).
10. Esta Quinta tinha uma área bruta total projectada de 519m² e um custo de obra estimado de € 629.800,00.
11. O “Esquema conceptual" do projecto do “Hotel Playa Blanca”, foi entregue pela Autora em Dezembro de 2017 e o respectivo Estudo Prévio foi entregue em Março de 2019 (docs. 8 e 9).
12. O Estudo Prévio referente ao projecto do “Edifício Atlântida” foi entregue em Março de 2019.
13. O Estudo Prévio do projecto da “Quinta La Geria” foi entregue em Maio de 2019.
14. Na sequência do desenvolvimento dos 3 projectos identificados supra, foi realizada uma exposição dos mesmos no atelier da Autora, em Lisboa, em Novembro de 2019, tendo nessa ocasião sido apresentados diversos desenhos e maquetes a diversas escalas, relativos a cada um dos projectos.
15. Em paralelo, foi solicitada à Autora a elaboração de mais 2 projectos de arquitectura, a saber: a “Casa dos Calles” e a “Casa en frente a la Iglesia” (docs. 12 a 14).
16. O projecto referente à “Casa dos Calles” corresponde à remodelação de um edifício existente no centro de Arrecife - Lanzarote, com vista à sua adaptação a espaço comercial com actividades culturais no piso térreo e com área residencial ou de estúdio no primeiro piso.
17. Esta Casa tinha uma área bruta total projectada de 419m² e um custo de obra estimado de € 557.100,00.
18. O projecto referente à “Casa en frente a la Iglesia” envolvia a remodelação de um edifício existente no centro de Arrecife – Lanzarote, com a respectiva adaptação a espaço comercial ligado à restauração e com actividades culturais.
19. Esta Casa tinha uma área bruta total projectada de 262m² e um custo de obra estimado de € 365.200,00.
20. Uma vez concluídos os trabalhos solicitados, a Autora, em 30 de Julho de 2020, enviou à Ré, por via postal e por correio electrónico, os Anteprojectos dos 5 projectos identificados anteriormente, acompanhados das respectivas facturas pró-forma (cf. docs. 17 a 21):
i. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Hotel Playa Blanca”, no valor de € 73.760,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
ii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Edifício Atlântida”, no valor de € 97.060,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
iii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Quinta La Geria”, no valor de € 5.670,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
iv. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa dos Calles”, no valor de € 5.210,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
v. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa frente a la Iglesia”, no valor de € 4.200,00, correspondente a 10% do valor total do projecto. ALTERADO 2
21. Os elementos enviados (peças desenhadas e peças escritas) foram entregues com o detalhe correspondente a um “Anteprojecto”, tal como consta das facturas emitidas.
22. Na fase inicial do trabalho, a Autora deu a conhecer a CC as estimativas de custos de cada uma das obras a realizar, pese embora o grau de incerteza inerente a uma estimativa feita numa fase prematura do processo, os quais foram aceites.
23. Em Fevereiro de 2020, a Autora enviara à Ré, na pessoa, quer de BB, quer de CC, as propostas de honorários respeitantes a cada projecto – “Hotel Playa Blanca”, “La Geria “e “Edifício Atlântida” -, individualmente considerado, de acordo com a percentagem correspondente a cada fase do trabalho a realizar/realizado, como o “Anteprojecto, o Projecto Base, o Projecto de Execução e Direcção de Obra” (cf. doc. 22).
24. Quanto aos projectos das “Casa que da a dos Calles” e “Casa frente a la Iglesia”, também as respectivas propostas de honorários foram oportunamente apresentadas pela Autora à Ré, na pessoa de CC, em 24 de Junho de 2020, que as aceitou, de forma expressa e inequívoca, por mensagem de correio electrónica remetida em 2 de Julho de 2020.
25. Dos 5 projectos realizados, apenas foi pago à Autora um valor inicial de € 6000 correspondente ao pagamento do “estudo conceptual” do projecto do “Hotel Playa Blanca”, enviado em 2017.
26. Durante todo o período de execução do contrato – que se iniciou em Setembro de 2017 e findou em Julho de 2020 – a Ré, na pessoa, quer de BB, quer de CC, dirigiu à Autora inúmeras e reiteradas solicitações, verbais e escritas, no sentido de se avançar com os vários projectos em curso.
27. Em Janeiro de 2021, a Autora endereçou à Ré uma comunicação interpelando-a para a liquidação da quantia correspondente ao valor das facturas pró-forma, no montante total de € 185.900,00 – cf. doc. 45. - ALTERADO 3
28. Perante a circunstância de a Ré ter posto em causa os valores solicitados, o Autor solicitou ao Colégio Oficial de Arquitectos das Ilhas Canárias a emissão de parecer relativamente ao estado/natureza dos trabalhos correspondentes aos 5 projectos, parecer esse que foi emitido em 03.06.2021 com o seguinte teor, além do mais que se dá por reproduzido conforme doc. 46 junto com a p.i., no sentido em que o trabalho elaborado pela Autora, traduzido em anteprojectos (relativamente a cada um dos imóveis) corresponde a 25% do total de cada projecto desses imóveis.
29. A Ré não é proprietária de nenhum dos imóveis relativamente aos quais a Autora prestou os seus serviços.
30. Os Administradores da Ré, e únicos com poderes para representar e vincular a sociedade, são: BB BB e FF.
31. CC é filho de BB, colaborando com o pai na gestão das sociedades de que o primeiro é administrador.
32. Os contactos com a Autora e com o seu representante, JJ, com vista à elaboração dos trabalhos de arquitectura relativos aos imóveis id. em 20. foram mantidos, quer por BB, quer por CC.
factos não provados
a) Eliminado 4
b) Que os anteprojectos realizados pela Autora estavam incompletos e eram contrários às normas urbanísticas espanholas, correspondendo, por isso, a projectos insusceptíveis de ser realizados na prática (artigos 91º e 92º da contestação);
c) Que os trabalhos entregues e facturados pela Autora constituem meros esboços ou desenhos/rascunhos, de cariz precário e insusceptíveis de viabilidade ou aplicabilidade no terreno (artigo 113º da contestação).
Não existem outros factos provados nem outros factos não provados.
*
A restante matéria dos autos constitui alegação conclusiva e/ou de Direito, ou meramente instrumental, sem relevância para a apreciação do mérito da causa. Consigna-se que a matéria e/ou documentos não seleccionados dos articulados é mera repetição, conclusiva, de direito, de mera impugnação, meras suposições, não incumbe o ónus da prova da mesma a quem a alega e não se selecciona o facto na negativa ou não assume qualquer relevância para a decisão da causa, só tendo relevado, para além dos constantes dos articulados, os factos essenciais, complementares e instrumentais que se consideraram relevantes para a decisão, considerando o disposto no artigo 5º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
O Direito:
Impugnação da Matéria de Facto - generalidades
Dispõe o art. 662.º n.º 1 do Código de Processo Civil:
A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos por assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Tem sido entendido que, ao abrigo do disposto no citado preceito, a Relação tem os mesmos poderes de apreciação da prova do que a 1ª instância, por forma a garantir um segundo grau de jurisdição em matéria de facto.
Donde, deve a Relação apreciar a prova e sindicar a formação da convicção do juiz, analisando o processo lógico da decisão e recorrendo às regras de experiência comum e demais princípios da livre apreciação da prova, reexaminando as provas indicadas pelo recorrente, pelo recorrido e na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto - neste sentido, vide António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição, pág. 287.
O actual art. 662.º representa uma clara evolução no sentido que já antes se anunciava, ficando claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia.
O Tribunal não está vinculado a optar entre alterar a decisão no sentido pugnado pelo recorrente ou manter a mesma tal como se encontra, antes goza de inteira liberdade para apreciar a prova, respeitando obviamente os mesmos princípios e limites a que a 1ª instância se acha vinculada.
Sobre o ónus a cargo do(s) recorrente(s) que impugne(m) a decisão relativa à matéria de facto, dispõe o art.º 640º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, que:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos nºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.
Assim, os requisitos a observar pelo(s) recorrente(s) que impugne(m) a decisão sobre a matéria de facto, são os seguintes:
- A concretização dos pontos de facto incorrectamente julgados;
- A especificação dos meios probatórios que no entender do recorrente imponham uma solução diversa;
- A decisão alternativa que é pretendida.
A este respeito, cumpre recordar duas restrições a uma leitura literal e formal destes ónus processuais inerentes ao exercício da faculdade de impugnação da matéria de facto.
Deverá ter-se em atenção a tendência consolidada da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, no sentido de não se exponenciarem os efeitos cominatórios previstos no art. 640.º do CPC e de realçar a necessidade de extrair do texto legal soluções capazes de integrar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, “dando prevalência aos aspectos de ordem material”, na expressão de Abrantes Geraldes, ob. cit., pg. 171 (nota 279) e 174.
Em primeiro lugar, apenas se mostra vinculativa a identificação dos pontos de facto impugnados nas conclusões recursórias; as respostas alternativas propostas pelo recorrente, os fundamentos da impugnação e a enumeração dos meios probatórios que sustentam uma decisão diferente, podem ser explicitados no segmento da motivação, entendendo-se como cumprido o ónus de impugnação nesses termos.
No que tange à decisão alternativa, tenha-se em atenção o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 12/2023, de 17/10/2023, publicado no Diário da República nº 220/2023, Série I, de 14/11/2023, com o seguinte dispositivo:
Nos termos da alínea c), do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações.
Quanto aos restantes requisitos, vejam-se os Acórdãos do Supremo Tribunal, de 01/10/2015 (Ana Luísa Geraldes), de 14/01/2016 (Mário Belo Morgado), de 19/2/2015 (Tomé Gomes); de 22/09/2015 (Pinto de Almeida), de 29/09/2015 (Lopes do Rego) e de 31/5/2016 (Garcia Calejo), todos disponíveis na citada base de dados, citando-se o primeiro:
«(…) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objecto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.»
Em segundo lugar, cumpre distinguir, quanto às explicitações exigidas ao impugnante e no que se refere à eficácia impeditiva do seu incumprimento, para a apreciação da impugnação, em dois graus de desvalor.
Se o incumprimento dos ónus processuais previstos no n.º 1 do citado art. 640.º implica a imediata rejeição da impugnação, já o incumprimento dos ónus exigidos no nº 2 do mesmo preceito (…indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso…) tem visto essa eficácia limitada aos casos em que essa omissão dificulte gravemente o exercício do contraditório pela parte contrária ou o exame pelo tribunal de recurso, pela complexidade dos facos controvertidos, extensão dos meios de prova produzidos ou ausência de transcrição dos trechos relevantes.
A esse respeito, veja-se o Acórdão de 11/02/2021 (Maria da Graça Trigo) consultável em www.dgsi.pt:
I. O respeito pelas exigências do n.º 1 do art. 640.º do CPC tem de ser feito à luz do princípio da proporcionalidade dos ónus, cominações e preclusões impostos pela lei processual, princípio que constitui uma manifestação do princípio da proporcionalidade das restrições, consagrado no art. 18.º, n.ºs 2 e 3 da Constituição, e da garantia do processo equitativo, consagrada no art. 20.º, n.º 4 da Constituição.
II. No caso dos autos, afigura-se que o fundamento de rejeição da impugnação de facto é excessivamente formal, já que a substância do juízo probatório impugnado se afigura susceptível de ser apreendida, tendo sido, aliás, efectivamente apreendida pelos apelados ao exercerem o contraditório de forma especificada.
III. Trata-se de uma acção relativamente simples, com um reduzido número de factos provados e de factos não provados, em que a pretensão dos réus justificantes é facilmente apreensível e reconduzível aos factos por si alegados para demonstrarem a usucapião e que encontram evidente ou imediato reflexo nos factos não provados que pretendem que sejam reapreciados, factos esses correspondentes, em grande medida, à matéria objecto da escritura de justificação.
De igual modo decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão de 29/10/2015 (Lopes do Rego), consultável em www.dgsi.pt:
1. Face aos regimes processuais que têm vigorado quanto aos pressupostos do exercício do duplo grau de jurisdição sobre a matéria de facto, é possível distinguir um ónus primário ou fundamental de delimitação do objecto e de fundamentação concludente da impugnação - que tem subsistido sem alterações relevantes e consta actualmente do nº1 do art. 640º do CPC; e um ónus secundário – tendente, não propriamente a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado, no seu conteúdo prático, ao longo dos anos e das várias reformas – indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exacta das passagens da gravação relevantes ( e que consta actualmente do art. 640º, nº2, al. a) do CPC) .
2. Este ónus de indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando – apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exacta e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento - como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da acta, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento complemente tal indicação é complementada com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objecto do recurso.
Veja-se, também do Supremo Tribunal, o Acórdão de 21/03/2019 (Rosa Tching), disponível em www.dgsi.pt:
«I. Para efeitos do disposto nos artigos 640.º e 662.°, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, impõe- se distinguir, de um lado, a exigência da concretização dos pontos de facto incorrectamente julgados, da especificação dos concretos meios probatórios convocados e da indicação da decisão a proferir, previstas nas alíneas a), b) e c) do n.º l do citado artigo 640°, que integram um ónus primário, na medida em que têm por função delimitar o objecto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto. E, por outro lado, a exigência da indicação exacta das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, contemplada na alínea a) do n° 2 do mesmo artigo 640°, que integra um ónus secundário, tendente a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida.
II. Na verificação do cumprimento dos ónus de impugnação previstos no citado artigo 640.°, os aspectos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
III. Nesta conformidade, enquanto a falta de especificação dos requisitos enunciados no n.º l, alíneas a), b) e c) do referido artigo 640.° implica a imediata rejeição do recurso na parte infirmada, já, quanto à falta ou imprecisão da indicação das passagens da gravação dos depoimentos a que alude o n° 2, alínea a) do mesmo artigo, tal sanção só se justifica nos casos em que essa omissão ou inexactidão dificulte, gravemente, o exercício do contraditório pela parte contrária e/ou o exame pelo tribunal de recurso.
IV. Tendo o recorrente, indicado, nas conclusões das alegações de recurso, o início e o termo de cada um dos depoimentos das testemunhas ou indicado o ficheiro em que os mesmos se encontram gravados no suporte técnico e complementado estas indicações com a transcrição, no corpo das alegações, dos excertos dos depoimentos relevantes para o julgamento do objecto do recurso, tanto basta para se concluir que o recorrente cumpriu o núcleo essencial do ónus de indicação das passagens da gravação tidas por relevantes, nos termos prescritos no artigo 640°, n° 2, al. a) do CPC, nada obstando a que o Tribunal da Relação tome conhecimento dos fundamentos do recurso de impugnação da decisão sobre a matéria de facto.».
No mesmo sentido, o Acórdão de 19/1/2016 (Sebastião Póvoas), disponível na mesma base de dados:
“ (…)
5) A falta da indicação exacta e precisa do segmento da gravação em que se funda o recurso, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 640.º do CPC não implica, só por si a rejeição do pedido de impugnação sobre a decisão da matéria de facto, desde que o recorrente se reporte à fixação electrónica/digital e transcreva os excertos que entenda relevantes de forma a permitir a reanálise dos factos e o contraditório.”
Por outro lado há ainda que ter em atenção que, qualquer alteração pretendida pressupõe em comum um pressuposto: a relevância da alteração para o mérito da demanda.
A impugnação de factos que tenham sido considerados provados ou não provados e que não sejam importantes para a decisão da causa, não deve ser apreciada, na medida em que alteração pretendida não é susceptível de interferir na mesma, atenta a inutilidade de tal acto, sendo certo que de acordo com o princípio da limitação dos actos, previsto no art.º 130.º do Código de Processo Civil não é sequer lícita a prática de actos inúteis no processo.
Veja-se o Acórdão do STJ de 17/05/2017 (Fernanda Isabel Pereira), também disponível em www.dgsi.pt:
“O princípio da limitação de actos, consagrado no artigo 130.º do Código de Processo Civil para os actos processuais em geral, proíbe a sua prática no processo – pelo juiz, pela secretaria e pelas partes – desde que não se revelem úteis para este alcançar o seu termo.
Trata-se de uma das manifestações do princípio da economia processual, também aflorado, entre outros, no art. 611.º, que consagra a atendibilidade dos factos jurídicos supervenientes, e no art. 608.º, n.º 2, quando prescreve que, embora deva resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, o juiz não apreciará aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Nada impede que também no âmbito do conhecimento da impugnação da decisão fáctica seja observado tal princípio, se a análise da situação concreta em apreciação evidenciar, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, que desse conhecimento não advirá qualquer elemento factual, cuja relevância se projecte na decisão de mérito a proferir.
Com efeito, aos tribunais cabe dar resposta às questão que tenham, directa ou indirectamente, repercussão na decisão que aprecia a providência judiciária requerida pela(s) parte(s) e não a outras que, no contexto, se apresentem como irrelevantes e, nessa medida, inúteis.”
E, ainda, os Acórdãos da Relação de Guimarães, de 15/12/2016 (Maria João Matos) e desta Relação de 26/09/2019 (Carlos Castelo Branco), também da citada base de dados: Não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objecto de impugnação não forem susceptíveis, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do C.P.C.).
Dito isto, cumpre apreciar a impugnação da matéria de facto concretamente efectuada pelos Recorrente.
Antes de se entrar na análise da impugnação da matéria de facto propriamente dita, cumpre dizer que o Tribunal, para além da consulta dos documentos e depoimentos referenciados, cirúrgica, redutora e convenientemente, nas respectivas impugnações da matéria de facto, procedeu à análise da toda a prova documental junta aos autos e à audição de toda a prova produzida, a saber:
- declarações de parte do legal representante da Autora, JJ;
- declarações de parte do legal representante da Ré, BB;
- do depoimento das testemunhas NN, HH, GG, OO, LL e PP.
Impugnação de matéria de facto por banda da Ré/Recorrente
a.1) Introdução de 5 novos factos de onde conste a propriedade dos imóveis a que se referem os projectos
Pretende a Ré recorrente que se insira no elenco dos factos provados os seguintes:
A) O imóvel onde se insere o projeto “Hotel Playa Blanca” é propriedade de VISTA CALIDA S.L.;
B) O imóvel onde se insere o projeto “Edifício Atlântida” é propriedade de:
DD;
C) O imóvel onde se insere o projeto “Quinta La Geria” é propriedade de VOLCAN DEL SOL, S.L.;
D) O imóvel onde se insere o projeto “Casa dos Calles” é propriedade de: EE (20%) e TIENDAS ESPECIALIZADAS DE CANARIAS, S.L. (80%) e,
E) O imóvel onde se insere o projeto “Casa frente a la Iglesia” é propriedade de
MAYORISTA CANARIAS, S.L.;
Refere a recorrente que tais factos se encontram demonstrados através dos documentos 3, 4, 5, 6 e 7 juntos com a contestação e que não foram impugnados pela Autora, tendo, aliás, sido com base nestes documentos que o Tribunal deu como provado o facto 29.
Mais alega a Ré/Recorrente que tais factos são obviamente importantes para analisar e decidir sobre a responsabilidade da Ré no pagamento dos projectos de arquitectura dos referidos imóveis.
E começamos exactamente por este argumento da Ré/Recorrente.
Entende a Recorrente que a propriedade dos imóveis é importante para analisar a responsabilidade contratual.
Ora, nada mais errado!
A legitimidade para contratar serviços que incidam sobre imóveis não tem, necessariamente, de coincidir com a identidade dos proprietários desses imóveis.
Da mesma forma que não recai sobre os proprietários de imóveis a responsabilidade pelo cumprimento de contrato em que não foram parte contratante. Os efeitos da responsabilidade contratual não se afere pela qualidade de proprietário do bem sobre o qual incide o objecto do contrato, mas sim pelas partes que intervieram na relação contratual/obrigacional.
É por isso absolutamente irrelevante, tanto do ponto de vista de facto como da sua pertinência para a resolução da questão de direito, saber quem é ou quem são os proprietários do imóveis sobre os quais recairiam os projectos levados a cabo pela Autora.
Na óptica da responsabilidade contratual – que é aquela que está subjacente aos presentes autos e que constitui a respectiva causa de pedir – interessa, isso sim, saber quem foram as partes contratantes, quem solicitou os serviços, quem os prestou e quem se obrigou, reciprocamente, nesse acordo de vontades.
Interessa por isso aferir entre quem se estabeleceu ou concluiu o acordo relativamente à concretização de um ou vários projectos projecto.
Se quem estabeleceu e concluiu o acordo com a Autora foi a Ré, no âmbito de um encontro consensual de vontades, então será esta a responsável pelo cumprimento desse mesmo acordo, independentemente de a mesma ser, ou não, proprietária dos respectivos imóveis.
A título de exemplo colocamos a seguinte questão académica: Um comodatário ou arrendatário não pode contratar um projecto de arquitectura para um imóvel, cujo gozo lhe está atribuído? Terá de ser o proprietário a fazê-lo? Impõe-se a resposta afirmativa à primeira pergunta e negativa à segunda!
E nesse caso quem será responsável pelo cumprimento do contrato? Quem contratou? Ou o proprietário? Mais uma vez duvidas não se nos suscitam que será a parte contratante a responsável perante a parte com quem contratou!
É absolutamente irrelevante, e não se convoca para a decisão da questão jurídica da causa, a que título um terceiro não proprietário contrata um serviço tendo por objecto intervenção um imóvel propriedade de terceiro. As causas e o seu interesse poderão ser várias, mas na relação contratual são absolutamente inócuas.
Improcede por isso esta primeira pretensão da Ré/Apelante de introdução de cinco novos factos consignando a propriedade dos imóveis.
a.2) Exclusão do facto 3 do elenco dos factos provados
É o seguinte o teor do facto 3:
“3. Em 2017, a Autora recebeu um convite de BB, para a elaboração de um conjunto de 5 projectos de arquitectura a desenvolver na ilha de Lanzarote (arquipélago das Canárias). “
A fundamentação do Tribunal a este facto foi feita em conjunto com os factos 1, 2, 4, 27, 29 e 30 nos seguintes termos: “Desde logo, parte dos factos apurados resulta, directa ou indirectamente, da prova documental produzida por ambas as partes, sendo até, por isso, factualidade assente por acordo, implícito ou explícito – pontos 1. a 4., 27., 29. e 30. dos factos provados – razão pela qual nenhuma outra consideração será feita no âmbito da presente fundamentação, por manifestamente desnecessária.”
A este respeito alega a Ré/Recorrente que:
“Sucede que, se é certo que os factos provados n.ºs 27, 29 e 30, resultam directamente da prova documental produzida, o mesmo não acontece com o facto n.º 3, não existindo, nos presentes autos, qualquer documento que, directa ou indirectamente, demonstre que, em 2017, BB convidou a Autora, ora Apelada, à execução daqueles projectos.
Antes de mais, haverá que referir que os cinco projectos a que o Tribunal a quo se refere reportam-se aos seguintes imóveis, situados em Lanzarote, Tenerife:
1) Hotel Playa Blanca;
2) Edifício Atlântida;
3) Quinta La Geria;
4) Casa dos Calles;
5) Casa en frente a la Iglesia.
Sucede que, contrariamente ao referido pelo Tribunal a quo, só o projecto “Hotel Playa Blanca” terá sido apresentado à Autora, ora Apelada, no ano de 2017, sendo esta quem refere, na petição inicial, que «em Junho de 2017, o Réu solicitou ao Autor a elaboração do projecto de arquitectura do Hotel Playa Blanca (…)» - cfr. artigo 5.º da p.i. e Doc. 3 junto à mesma.
O mesmo não acontece com os restantes projectos, referindo a Autora terem estes sido solicitados pela Apelante em Fevereiro de 2019 (Edifício Atlântida e Quinta La Geria) e em Maio/Junho de 2020 (Casa dos Calles e Casa en frente a la Iglesia) – cfr. artigos 8.º e 17.º da p.i. e Docs. 4 a 7 e 12 a 13 juntos à mesma).
Não havendo, em qualquer outro documento ou depoimentos das testemunhas, referência a estes projectos anterior àquelas datas, não se concebendo, por isso, outro entendimento por parte do Tribunal a quo. (…)
De resto, este facto (n.º 3) está em contradição com os factos provados n.ºs 7 e 9, que referem que BB, em representação da Ré aqui Apelante, convidou a Autora à elaboração dos projectos aí referidos.”
Continuando adiante que : “Assim, de duas uma: ou teria sido BB quem convidou a Autora à elaboração destes projectos, conforme consta (erradamente) do facto n.º 3, ou teria sido a Ré, conforme consta (também erradamente) dos facto n.º 7 e 8.
Sabendo que a pessoa física do gerente/administrador ou do sócio não se confunde com a pessoa jurídica da sociedade, tratando-se de pessoas diferentes, com distintas personalidades jurídicas e autonomia, não pode o Tribunal a quo confundi-las, conforme erradamente o faz ao longo de toda a sentença, o que a enviesa, tratando-se de um grave erro de julgamento e impondo, por isso, a sua revogação.”
Comecemos por analisar se existe alguma contradição entre o facto 3 e os factos 27., 29 e 30.
Relativamente ao facto 29 vamo-nos dispensar de analisar qualquer contradição. Conforme já tivemos ocasião de referir nada exige que haja coincidência – para efeitos contratuais e de responsabilidade contratual – entre quem contrata e quem assume a qualidade de proprietário do objecto sobre o qual incide o contrato.
Mas, basta ler os factos 27 e 30 para concluir, com facilidade, que nenhuma contradição se verifica entre o facto 3 e aqueles. Nos factos 3 e 27 o Tribunal limita-se a passar para os factos provados a versão dos factos alegada pela própria Autora e de que se convenceu:
- foi BB quem endereçou o convite à Autora para a elaboração dos projectos (facto 3);
- e posteriormente, a Autora endereçou à Ré – e não a BB – a comunicação em que a interpelava para pagamento dos serviços prestados (facto 27).
Quando muito, aquilo que poderíamos ter aqui – mas isso terá o seu campo de análise na apreciação jurídica – seria uma inconcludente ou incongruente exposição de factos pela Autora, mas numa uma contradição entre os factos.
O mesmo se diga do facto 30: a sua relevância é meramente jurídica, mas não encerra em si qualquer contradição insanável do facto 3 com o mesmo. Sabendo-se quem era os administradores da Ré (como se sabe pelo facto 30) a questão que se colocaria (em termos jurídicos) seria, apenas e tão só, a da vinculação da sociedade.
Portanto, contradição é ponto assente que inexiste. Aquilo que poderá existir é uma inconcludência jurídica, mas essa questão será apreciada posteriormente.
Analisando agora a errónea apreciação dos factos.
O facto 3 tem de facto uma imprecisão: A prova documental não permite retirar que os convites foram todos eles dirigidos à Autora em 2017 ( isso mesmo o revela os documentos juntos pela Autora com a sua petição inicial e a que a fundamentação da sentença alude). De acordo com a prova documental as comunicações iniciaram-se em 2017, mas foram-se desenrolando ao longo do tempo. Efectivamente, a prova documental não nos permite fazer tal afirmação.
Mas e a restante prova?
Para apreciação de toda a impugnação da matéria de facto levada a cabo no recurso de apelação e na apelação subordinada da Autora, o Tribunal não só analisou a documentação junta como ainda ouviu toda a prova – testemunhal e declarações de partes - produzida.
E da restante prova produzida também não resultou que os três projectos tenham sido solicitados em conjunto em 2017. A solicitação iniciou-se em 2017 e foi decorrendo ao longo do tempo e das relações de proximidade que se foram estabelecendo.
E que dizer da prova testemunhal e por declarações de parte?
Destes meios de prova resultou exactamente o mesmo. Reforçando assim a cronologia que resulta dos emails. A este respeito relevou essencialmente o depoimento de GG, mulher do legal representante da Autora (e que trabalha nesse mesmo gabinete) e que afirmou que no ano de 2019 acompanhou o seu marido a Lanzarotte, tendo sido nessa altura que foram pedidos mais projectos a acrescer ao projecto de Playa Blanca e que os mesmos lhes foram dados a conhecer. Tal depoimento, para além de credível, encontra sustentação nos emails enviados em Março de 2019 que fazem exactamente alusão a essa deslocação da Autora a Lanzarote.
Quanto a quem dirigiu o convite à Autora, não obstante o Tribunal a quo apenas ter feito referência à prova documental - e a prova documental por si só não atestar o convite por parte de BB relativamente a todos os projectos – não é menos certo que da prova testemunhal (essencialmente GG) e por declarações de Parte (JJ) resultou explicita e convictamente demonstrado que os contactos telefónicos e as reuniões presenciais foram essencialmente feitas com BB, sendo este quem dirigiu os convites e activamente deu seguimento aos mesmos (na expressão do legal representante da Autora, “era o pai quem comandava as operações.“.
Não é a circunstância de o Tribunal a quo, na motivação de facto, ter apenas feito referência à prova documental e a recorrente impugnar a matéria de facto apontando cirurgicamente a insuficiência dessa prova para a demonstração total dos factos encerrados no ponto 3, que dispensa o Tribunal de recurso de fazer uma global e abrangente ponderação de toda a prova, confirmando, informando ou alterando a convicção do primeiro, sob pena de se transformar a reapreciação de facto numa tarefa redutora em que qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência.
Assim, em conformidade com a prova documental constante dos autos e depoimentos prestados em conformidade altera-se a redacção do facto 3 para a seguinte:
“3. Entre 2017 e 2019 a Autora recebeu convites de BB, para a elaboração de um total de 5 projectos de arquitectura a desenvolver na ilha de Lanzarote (arquipélago das Canárias). “
a.3) Exclusão do facto 5 do elenco dos factos provados ou alteração da sua redacção
É o seguinte o teor do ponto 5 dos factos provados:
“5. Um desses projectos foi o projecto de arquitectura do hotel Playa Blanca, um estabelecimento hoteleiro de 5 estrelas localizado em frente ao mar, contendo áreas destinadas a quartos, a tratamento e bem-estar, salas de estar e de refeição e espaços de apoio à actividade hoteleira, incluindo áreas de arranjos exteriores afectas aos hóspedes (doc. 3).”
O Tribunal a quo motivou a prova deste facto da seguinte forma:
“Assim, para prova dos pontos 5. e 6., valeu o documento 3 junto com a petição, cujo conteúdo foi esclarecido e complementado pelas declarações de parte prestadas pelo Autor, a que adiante se fará melhor referência.”
Nas suas alegações de recurso insurge-se a Ré/Recorrente quanto a ter-se dado como provado este facto nos seguintes termos:
“(…)
Porém, fundamenta a sua decisão de forma muitíssimo insuficiente e parcial desconsiderando a restante prova documental e testemunhal produzida pela Apelante, qual, devidamente apreciada, sempre teria de resultar num entendimento diverso.
É que, ao contrário do que acontece com os restantes projectos, no caso do projecto “Hotel Playa Blanca”, não só existe uma proposta de honorários para a sua execução apresentada pela Autora (Doc. 9 da Contestação), como um contrato de prestação de serviços celebrado, tendo por objecto este mesmo projecto (Doc. 10 da Contestação).
Ora, dos referidos documentos resulta inequivocamente demonstrado que a contraparte deste projeto era a empresa “Vista Calida SL”, e não BB, e muito menos a Ré aqui Apelada.
Acresce que é a empresa “Vista Calida SL” que é proprietária deste imóvel e não a Ré aqui Apelante, conforme Doc. 3 da Contestação e facto provado n.º 1 que atrás se requereu que seja aditado.
Aliás, foi à referida empresa Vista Calida SL que foi faturada a quantia de € 6.000,00, a qual foi paga à Autora por conta do “estudo conceptual” do projecto deste mesmo Hotel Playa Blanca, referida no facto provado n.º 25.
Não podendo, assim, existir quaisquer dúvidas de que este projecto não tem qualquer relação com a Ré, nem com BB!
Aliás, esta realidade é perfeitamente conhecida pela Apelada, que juntou aos autos dois emails nos quais se evidencia a empresa “Vista Calida SL”, proprietária deste imóvel, como destinatária dos seus serviços (Docs. 26 e 37 da p.i.)
(…)
Pelo que, é claramente errada a consideração feita pelo Tribunal a quo, à mercê do alegado pela Autora, que foi BB quem convidou a Autora à realização deste projecto, para a final, condenar a Ré no pagamento da factura que se reporta ao mesmo, ainda para mais, quando o faz baseando-se no Doc. 3 da p.i. que, ao contrário do que a Apelada alega, trata-se meramente de uma proposta acompanhada de uma solicitação de orçamento e não de uma qualquer adjudicação: (…)”
No que a este facto diz respeito somos do entendimento que bem andou o Tribunal a quo e que a recorrente se apaga em demasia ao que está na prova documental (da mesma forma que se apegou ao longo de todo o processo negando a existência de um contrato, por inexistir documento a formalizá-lo, como se os contratos não pudesse revestir forma consensual e tivessem necessariamente, para existirem e serem fonte de obrigações, de revestir a forma escrita). Como é óbvio, subjacente a emails enviados estão conversas telefónicas, reuniões e trocas de ideias não documentadas, que apenas podem chegar ao tribunal pela mão das partes ou das testemunhas.
Por outro lado, não é a circunstância de haver uma facturação a uma entidade que a torna, ipso facto, parte no contrato.
É a própria lei que permite no art. 767.º do CPC, ao estatuir que “A prestação pode ser feita tanto pelo devedor como por terceiro, interessado ou não no cumprimento da obrigação”.
Por isso, ainda que tenha havido uma facturação a uma sociedade terceira e um eventual pagamento feita por esta, tal não é determinante de se considerar a mesma como parte no contrato, com exclusão da Ré.
O Tribunal a quo conjugou a prova documental com as declarações de parte do legal representante da Autora, fazendo assim uma leitura abrangente dos factos para além daquilo que está documentado por escrito.
Ouvida e ponderada toda a prova produzida não vemos razões para alterar a decisão de facto da primeira instância.
Por várias ordens de razões:
A primeira delas prende-se com o entendimento, pacífico na jurisprudência, que o Tribunal da Relação só deve alterar a matéria de facto se formar a convicção segura da ocorrência de erro na apreciação dos factos impugnados.
Isto porque o julgamento da matéria de facto é o resultado da ponderação de toda a prova produzida. Cada elemento de prova tem de ser ponderado por si, mas, também, em relação/articulação com os demais. O depoimento de cada testemunha, as declarações de parte, têm de ser conjugados com os das outras testemunhas e todos eles com os demais elementos de prova.
Quando o pedido de reapreciação da prova se baseie em elementos de características subjectivas – como a prova testemunhal e declarações das partes –, a respectiva sindicância tem de ser exercida com o máximo cuidado e o tribunal de 2.ª instância só deve alterar os factos incorporados em registos fonográficos quando, efectivamente, se convença, com base em elementos lógicos ou objectivos e com uma margem de segurança elevada, que houve erro na 1.ª instância – neste sentido ver Ac. R.P. de 30-04-2000, Ac. R.P. de 05-12-2024)
Ora, nos presentes autos, ouvidos os registos fonográficos, não só não ficou o Tribunal convencido de que houve erro da 1.ª instância na apreciação dos factos, como – mais do que isso – ficou convencido da bondade da convicção ali formada.
A leitura feita pelo Tribunal recorrido, conjugando os documentos com as declarações de parte do legal representante (a que podíamos adicionar o depoimento de GG) foi a correcta, não se antevendo qualquer razão para eliminar ou mesmo alterar a versão do facto fixada pelo tribunal a quo. O depoimento de parte do legal representante da Autora foi esclarecedor quando, de forma inequívoca e convincente, disse que o seu cliente naquela altura, como noutras anteriores, sempre havia sido a Multicines e que entidades terceiras apenas eram convocadas, quando o eram e apenas de forma excepcional, apenas para efeitos de facturação.
Assim sendo improcede esta concreta impugnação da matéria de facto.
a.4) Exclusão dos factos 7, 9 e 26 dos factos provados ou, no limite, a alteração da sua redacção
É o seguinte o teor dos factos impugnados:
7. Em Fevereiro de 2019, a Ré, na pessoa, quer de BB, quer de CC, solicitou ao legal representante da Autora a elaboração do projecto de arquitectura do Edifício Atlântida, que consistia na remodelação do edifício “Multicines”, sito em Arrecife, Lanzarote, e na transformação do conjunto em áreas afectas à hotelaria, zonas de restauração, bares, supermercado e zona de venda de produtos regionais (docs. 4 a 6).
9. Nessa mesma época, a Ré, na pessoa, quer de BB, quer de CC, solicitou ao legal representante da Autora a elaboração do projecto de arquitectura de uma quinta, sita em La Geria, que envolvia a remodelação e adaptação de uma casa e espaços de apoio em casa particular/turismo de habitação ou rural, incluindo áreas de arranjos exteriores (doc. 7).
26. Durante todo o período de execução do contrato – que se iniciou em Setembro de 2017 e findou em Julho de 2020 – a Ré, na pessoa, quer de BB, quer de CC, dirigiu à Autora inúmeras e reiteradas solicitações, verbais e escritas, no sentido de se avançar com os vários projectos em curso.
E foi a seguinte a motivação dada pelo Tribunal a quo a tais factos:
“Quanto aos pontos 7. a 10. e 26., o Tribunal considerou o teor das comunicações aí mencionadas (docs. 4 a 7 com a p.i.), remetidas, tanto por BB (“BB pai”), como por CC (“CC filho”), descortinando-se a autoria de um e de outro (quanto às comunicações), quer atendendo à identificação no final (em que o segundo se identifica como “CC”), quer, também, quanto ao endereço electrónico remetente – o primeiro, com o endereço ... e o segundo ...; como, também, o legal representante da Autora esclareceu. Ora, destas comunicações, foi possível retirar, pelo menos, duas conclusões: a primeira, de que pai e filho, no tema referente à contratação dos serviços da Autora, falavam a uma só voz, mostrando-se implausíveis as justificações dadas pelo legal representante da Ré (BB) em sede de declarações de parte (das quais se destaca a suposta admiração que o filho, na altura, estudante de arquitectura, nutriria pelo Arq. JJ, o que justificaria um suposto entusiasmo pelo trabalho desenvolvido pela Autora, que não teria expressão na prática); a segunda, que um e outro, nessa abordagem comum, pretenderam estabelecer essa relação contratual com a Autora relativamente ao desenvolvimento de cinco projectos diferentes, que foram apresentados conjuntamente no âmbito de uma iniciativa global, o “Projecto Lanzarote”. Quanto à circunstância de esses projectos haverem de ser facturados à Ré, Multicines, cumpre afirmar que essa é uma factualidade retirada de prova indirecta, na medida em que, das declarações de parte do próprio, se retirou facilmente o facto de que BB pai é representante de várias sociedades do grupo, através das quais a família QQ desenvolve a sua actividade na ilha de Lanzarote – sendo, aliás, da experiência comum a noção de que, frequentemente, no âmbito de várias empresas pertencentes aos mesmos sócios, a facturação é solicitada a uma ou a outra em função de mera conveniência contabilística ou financeira (razão pela qual, também, é irrelevante a alegação e/ou demonstração de que a Ré não é proprietária de nenhum dos imóveis sobre que versam os trabalhos efectuados pela Autora); por outro lado, foi também irrelevante a alegação de que CC não teria poderes de representação da Ré: primeiro, na medida em que, tratando-se de um grupo familiar, o próprio também ali contribuía para o desenvolvimento da actividade das empresas, segundo, considerando o facto de todas as comunicações seguirem, pelo menos, com conhecimento do pai – o que inculca, com segurança, a ideia, contrária à alegação da defesa, de que o filho agiria em nome próprio e sem vincular a Ré ou o grupo/família QQ.
Valeu, também, para o enquadramento desta factualidade e complementarmente ao conteúdo das comunicações escritas acima mencionadas, a apreciação crítica das declarações de parte prestadas pelo legal representante da Autora. Com efeito, através da apreciação destas declarações foi possível percepcionar o clima de entusiasmo e de voluntarismo na concretização das propostas elaboradas pela Autora para os empreendimentos imobiliários da família QQ em Lanzarote, bem como um circunstancialismo de confiança e informalidade no âmbito do qual, apesar de não existirem orçamentos formalmente apresentados, o valor do trabalho desenvolvido pela Autora não foi posto em causa (excepção feita ao projecto de cariz familiar, por isso, não afecto à actividade lucrativa das empresas, a merecer um desconto), circunstancialismo, esse, portanto, apto a criar na Autora a expectativa – legítima – de que os valores facturados, correspondente a parte do valor total já anteriormente enunciado na troca de correspondência, seria, efectivamente, liquidado pela Ré.”
Relativamente a estes concretos factos insurge-se a Ré apelante alegando, em suma, que:
Dos factos dados como provados n.ºs 7, 9 e 26, verifica-se um denominador comum: «a Ré, na pessoa, quer de BB, quer de CC», vindo o Tribunal a quo, auxiliado nesta expressão, imputar à Ré Apelante a responsabilidade pelo pagamento das facturas em crise, com fundamento no teor das comunicações juntas pela Apelada como Docs. 4 a 7.
Porém, não é possível acompanhar minimamente o entendimento do Tribunal a quo, ao ferir o elementar princípio da atribuição da personalidade jurídica às sociedades e da separação de patrimónios, confundido aquela que é a Ré, ora Apelante, com o seu administrador e com o filho deste último!
Com efeito, tal entendimento não pode ser admitido por contrário à lei, sendo totalmente irrelevante estarmos ou não perante um grupo familiar, já que esta circunstância não prescinde dos poderes de decisão de quem realmente administra as sociedades que eventualmente o componham.
CC não tem, nem nunca teve – nem isso resulta de qualquer documento junto aos autos ou de confissão - quaisquer poderes para representar a Ré, ora Apelante, não dispondo sequer de um vínculo laboral com esta empresa, tratando- se, sim, à data dos factos, de um estudante de arquitectura que, nessa qualidade apenas, acompanhava os vários projectos que pudessem estar a ser desenvolvidos (ou pretendidos) directamente pelos elementos da sua família ou por qualquer uma das empresas que aqueles detivessem.
É, pois, absolutamente incompreensível que o Tribunal a quo considere irrelevante este facto, como o faz, bem sabendo que a Apelante não pode ficar vinculada por qualquer decisão que não seja tomada por quem a represente – neste caso, BB e demais administradores –, ou por procurador mandatado para o efeito (contrariando, aliás, o facto n.º 30 que dá como provado: «os administradores da Ré, e únicos com poderes para representar e vincular a sociedade, são: BBBB e FF»).
Veja-se, aliás, que, não só o representante legal da Autora, como duas das testemunhas por si arroladas, reconhecem que só BB detinha poderes de decisão:
(…)
Não se concebendo, por isso, a afirmação do Tribunal a quo, de que os projectos tinham de ser facturados à Multicines pelo simples facto de BB ser «representante de várias sociedades do grupo, através das quais a família QQ desenvolve a sua actividade na ilha de Lanzarote», presumindo, sem qualquer sustento factual ou probatório, de que estaríamos perante um esquema fiscal frequente «no âmbito de várias empresas pertencentes aos mesmos sócios, a facturação [ser] solicitada a uma ou a outra em função de mera conveniência contabilística ou financeira».
Aliás, se seguíssemos o raciocínio da Mta. Juíza do Tribunal a quo, então a Autora sempre podia escolher a empresa a quem facturar os seus trabalhos, podendo fazê-lo quer à Ré Multicines, quer a qualquer outra das restantes empresas das quais é sócio BB, com o argumento de que são todas do mesmo grupo económico! (…)”
Analisando:
Começar-se-á por dizer que a Ré/Recorrente confunde factos provados – que são o que são – com consequências jurídicas a extrair!
É um facto de CC não tinha poderes de administração na Ré. Mas tendo ou não tendo esses poderes de administração, alguns contactos foram feitos por ele: isso o demonstram os documentos e a generalidade dos depoimentos prestados e das declarações de parte de ambos os representantes legais.
Não poderia por isso o Tribunal – adaptando os factos ao direito – dar por provado outra realidade que não aquela que ficou demonstrada nos autos. Sob pena de estar a moldar os factos à decisão jurídica a tomar. Aquilo que temos é, isso sim, uma absoluta honestidade intelectual do Tribunal a quo no relato factual que apurou em julgamento.
Tudo o mais, serão questões a analisar em sede de apreciação jurídica.
Por outro lado, acompanhamos todo o raciocínio de formação da convicção do Tribunal – de que este Tribunal ad quem partilha – acrescentando em reforço da actuação de BB ter sido feita em nome da Ré – o seguinte: atente-se no teor do email que consubstancia doc. 4 junto com a p.i. da autoria inegável de BB
“(….)
3. Por otro lado, y aunque supongo que ustedes tienen exceso de trabajo, sin ningún compromiso, quería consultarte sobre la posibilidad de que ustedes nos realicen otros proyectos que queremos desarrollar en esta isla, uno de ellos es la reestructuración del edificio “Atlantida” donde están nuestras oficinas, junto al “Charco de San Gines” para transformarlo en un centro multifuncional con Cines, Palacio de Congresos y Hotel y otro proyecto consiste en la rehabilitación de unas viviendas y paisaje de una finca que he comprado en la zona de “La Geria” en el volcán (este proyecto no sería de la empresa, sino a nivel particular). (…)”
Fala-se neste email de inícios de 2019 no projecto do edifício Atlântica e da reabilitação da casa em La Geria.
E fala quem? BB.
Em que qualidade? Na qualidade de representante da Multicines. E o porquê desta afirmação encontra-se no teor do email: edifício “Atlântida” donde están nuestras oficinas”.
Refere a Ré apelante que: Aliás, no que respeita ao “Edifício Atlântida”, apesar do Tribunal a quo assentar o seu entendimento nos Docs. 4 a 6 juntos com a p.i., certo é que, da análise dos documentos, constata-se só o Doc. 4 da p.i. fazer referência a este projecto, não existindo, neste email, qualquer indicação de que se tratasse de uma «remodelação do edifício “Multicines”» mas, sim, do “Edifício Atlântida”.
Ora, foi sobejamente referido ao longo de todo o processo por partes e testemunhas que os escritórios da Multicines eram no edifício Atlântida. Logo, naquele email de BB, o mesmo, ao referir-se a um local onde se localizam “nuestras oficinas”, não poderia deixar de estar a referir-se ao pronome possessivo (gramaticalmente falando) da Multicines.
Quanto à circunstância alegada pela Ré de que o facto 26 deverá ser eliminado na medida em que não foi sequer alegado, e menos ainda provado, temos a dizer o seguinte:
- em primeiro lugar não corresponde à verdade que este facto não tenha sido alegado. Ele não resultou da mera imaginação ou criatividade do Tribunal. Ele consta expressamente do art. 37.º da petição inicial, que tem o seguinte teor:
“37.º
Durante todo o período de execução contratual – que se iniciou em setembro de 2017 e findou em julho de 2020 – o Réu dirigiu ao Autor inúmeras e reiteradas solicitações, verbais e escritas, no sentido de se avançar com os vários projetos em curso, revelando, sempre, um enorme entusiasmo no desenvolvimento dos trabalhos e uma grande pressão para que o Autor empregasse a máxima energia e dedicação aos seus projetos.”
O Tribunal, aquilo que fez foi restringir, apenas e tão só, o âmbito do que deu como provado, relativamente ao que havia sido alegado.
Mas, ainda que assim não fosse, na concretização do princípio do primado da verdade material que imbuiu toda a alteração ao CPC, o art. 5.º do CPC estabelece que “2. Além dos factos articulados pelas partes são ainda considerados pelo juiz:
A. Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa;
B. Os factos que sejam complemento ou concretização do que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa (…)
(…)”
Pelo que não estava vedado ao Tribunal, em consonância com o que tivesse resultado da instrução da causa, considerar factos instrumentais ou complementares.
Improcede assim esta concreta impugnação aos factos 7, 9 e 26.
a.5) Alteração de redacção dos factos 20 e 23.
É o seguinte o teor dos factos 20 e 23:
20. Uma vez concluídos os trabalhos solicitados, a Autora, em 30 de Julho de 2020, enviou à Ré, por via postal e por correio electrónico, os Anteprojectos dos 5 projectos identificados anteriormente, acompanhados das respectivas facturas pró-forma (cf. docs. 17 a 21):
i. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Hotel Playa Blanca”, no valor de € 73.760,00, correspondente a 10% do valor total da obra;
ii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Edifício Atlântida”, no valor de € 97.060,00, correspondente a 10% do valor total da obra;
iii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Quinta La Geria”, no valor de € 5.670,00, correspondente a 10% do valor total da obra;
iv. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa dos Calles”, no valor de € 5.210,00, correspondente a 10% do valor total da obra;
v. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa frente a la Iglesia”, no valor de € 4.200,00, correspondente a 10% do valor total da obra.
23. Em Fevereiro de 2020, a Autora enviara à Ré, na pessoa, quer de BB, quer de CC, as propostas de honorários respeitantes a cada projecto – “Hotel Playa Blanca”, “La Geria “e “Edifício Atlântida” -, individualmente considerado, de acordo com a percentagem correspondente a cada fase do trabalho a realizar/realizado, como o “Anteprojecto, o Projecto Base, o Projecto de Execução e Direcção de Obra” (cf. doc. 22).
O Tribunal motivou a sua convicção acerca de tais factos da seguinte forma:
“Para prova dos pontos 20., 21. e 23., valeram os documentos aí mencionados, que corporizam as facturas pró-forma, conjugadamente com o depoimento, já mencionado, de HH, responsável pelo seu envio a CC filho. Aliás, a circunstância de a comunicação a que respeita o doc. 22 ter sido remetida ao filho, não impediu o pai de tomar a devida posição sobre os valores facturados, sem questionar o envio ou colocar em causa que o filho tivesse legitimidade para receber tais comunicações - cf. doc. 39 com a p.i..”
Insurge-se a recorrente quanto à resposta dada pelo Tribunal a estes factos nos seguintes termos:
“Ora, no que respeita ao facto provado n.º 20, não pode a Apelante concordar na parte em que o Tribunal a quo refere «trabalhos solicitados» porquanto o mesmo pressupõe uma adjudicação que, aproveitando o que supra se disse, não ocorreu, não constando de qualquer um dos documentos indicados – 17 a 21 juntos à p.i. –, ou qualquer outro, a prova desta adjudicação, a confirmação de quaisquer honorários de que sempre dependeriam ou qualquer contrato celebrado entre as partes naquele sentido.
Quanto ao facto provado n.º 23, reitera-se o supra referido, quanto à necessária separação da personalidade jurídica e patrimónios da Apelante, de BB, e de CC, assim como, quanto a este último, a falta de poderes de representação ou vinculação da Ré e, por fim, os imóveis em questão não são propriedade da Ré aqui Apelante.”
Quanto a esta concreta impugnação não há muito a acrescentar aquilo que, a propósito de outros factos, se referiu anteriormente: se “trabalhos solicitados” pressupõe ou não “adjudicação” e “adjudicação escrita”, se essa “adjudicação” ocorreu é questão que se prende com a apreciação jurídica do recurso, mas já não com impugnação da matéria de facto.
O Tribunal deu como assente que os trabalhos foram solicitados. E nessa sequência foram enviados os documentos que foram denominados e categorizados pela Autora como “ante-projectos” e enviadas as facturas pro-forma, que estão nos autos e que são exactamente aquelas a que se refere a motivação da sentença.
Que as facturas e os anteprojectos são dirigidos à Ré é-nos dito pelos próprios documentos! O próprios anteprojectos (todos eles) identificam o cliente como sendo Multicines S.L.!
Estranho é, por isso, que para todo o trabalho e comunicações desenvolvidas a identificação do Cliente como Multicines S.L. nunca tenha sido tema ou questão, nem mesmo tenha sido questão com a recepção das facturas, ou até mesmo no email do legal representante da Ré de 23-09-2020, e que o tenha passado a ser apenas para efeitos da presente acção !
Improcede por isso esta concreta impugnação da matéria de facto relativamente aos factos 20 e 23, mantendo-se os mesmos inalterados (sem prejuízo do que se apreciará infra a propósito da impugnação da Autora relativamente ao facto 20).
a.6) Eliminação do facto 22. Dos factos provados
É o seguinte o teor do facto 22:
22. Na fase inicial do trabalho, a Autora deu a conhecer a CC as estimativas de custos de cada uma das obras a realizar, pese embora o grau de incerteza inerente a uma estimativa feita numa fase prematura do processo, os quais foram aceites.
E foi a seguinte a motivação do Tribunal recorrido:
“Quanto ao ponto 22., trata-se de um facto cuja demonstração emerge da generalidade dos documentos atestativos das comunicações mantidas entre a Autora e os seus interlocutores, CC pai e filho; veja-se, por exemplo, a mensagem de remetida por CC filho à Autora (com o conhecimento de GG e JJ), em 22.03.2019 (doc. 29 com a p.i.), onde, além do mais, aquele comenta que se propõe enviar informação suficiente para a definição dos honorários para um dos edifícios. Valeu, também, a comunicação a que corresponde o doc. 40 com a p.i., na qual, pese embora a Autora (na pessoa do seu legal representante) ter admitido que o envio das facturas foi um erro, afirmou que as facturas só deveriam ter sido enviadas após a contabilização completa e separada dos honorários devidos por cada um dos diferentes trabalhos (daí o erro), tendo feito notar, também, que já em momentos anteriores o atelier tinha enviado estimativas dos custos referentes aos diversos projectos; aí, também se salientou, quanto aos honorários, que o único comentário recebido pela Autora referia-se a um pedido de desconto referente ao projecto de cariz familiar (e não lucrativo, como os demais), referente à “Casa de la Geria” – cf. comunicação da Autora de 28.07.2020, doc. 15 com a p.i..”
A este propósito refere a recorrente nas suas alegações que: “Mais, referindo-se expressamente no doc. 24 junto à p.i. que «en relación a los honorarios justo antes de que pasase todo esto, íbamos a reunirnos todos los proprietarios para llegar a un acuerdo y acordar los honorarios». Sendo que esta referência, por sua vez, reforça e demonstra inequivocamente que o destinatário destes projectos nunca foi a empresa a Ré (veja-se que, quanto à “Casa de la Geria” o Tribunal a quo chega mesmo a referir aqui tratar-se de um projecto de cariz familiar (e não lucrativo, como os demais), ainda assim, teimando em julgar a Apelante responsável pelo seu pagamento…
Infelizmente, tendo estes documentos sido totalmente ignorados pelo Tribunal a quo, o que muito se condena, até porque, pelo contrário, são várias as comunicações nas quais se evidencia a necessidade da Apelada apresentar os seus honorários contrariando a tese de que as estimativas de custo, numa fase inicial “foram aceites”.
Senão, atente-se ao teor dos emails juntos à p.i. como docs. 3, 4, e 6 (em todos eles peticionando-se a apresentação de honorários para os projectos a que fazem referência).
Sendo totalmente irrelevante se, para projectos anteriores, estas estimativas tenham sido efectivamente enviadas!
Pelo que, é totalmente falso e contrário à prova documental produzida que o único comentário recebido pela Autora seja aquele referente à “Casa de la Geria” (cfr. doc. 15 junto à p.i.).
Neste sentido, resulta, pois, evidenciado, que o facto provado n.º 22 deve ser julgado não provado.
Mais uma vez a Ré/Recorrente é cirúrgica e redutora nos documentos que escolhe para impugnar a matéria de facto, ignorando ou passando ao largo de tantos outros, de que é exemplo o doc. 29, em que CC refere “La semana que viene les enviaremos la información suficiente para que puedan definir los honorarios del edifício Atlantida, y en cuanto podamos planos en .dwg que definan correctamente toda la edificación,
Sentimos mucho este retraso,
Esperemos que no sea un inconveniente,”
Ou do Doc. 40, enviado por JJ a BB e CC com a seguinte referência “ (…) Hace ya algún tiempo os he enviado una estimativa de costes de construcción de los distintos proyectos y me comentasteis que os parecían bien en general.
Más tarde, os envié la propuesta de honorarios y vuestros comentarios fueran de que quizás os parecían un poco altos, en el caso del hotel, y me pedisteis también una reducción en los honorarios de la Geria, por tratarse de una casa familiar.
Lo que quería comentaros ahora, es que siempre hemos seguido trabajando y produciendo elementos para vosotros y eso es nuestro trabajo, y como en todos los trabajos o productos que se encargan, deben ser pagados. Y tengo total confianza que vosotros pensáis lo mismo. He invertido muchísimo en todos estos trabajos, de los cuales me siento orgulloso y el hecho de que puedan existir dudas sobre si queréis avanzar con las obras o no, por ahora, no es de mi responsabilidad. Pienso que en este momento de crisis, en los que vosotros ponéis como hipótesis la posibilidad de no avanzar con todos los proyectos o fasearlos, es el momento indicado para que se haga un punto de situación y se clarifiquen los próximos pasos. (…)
E do Doc. 14, enviado por CC a JJ:
“(…)
1. Casa de la Iglesia, nos parecen bien los honorarios y por nuestra parte nos gustaría que empieces cuanto antes con el proyecto.
(…)
2. Casa entre dos calles
(…)
Por nuestra parte, damos por confirmados los honorarios y puedes empezar trabajar cuando quieras, si prefieres enviar contratos para firmar no hay problema,
(…)”
Enfim, o acervo documental é abundante e permite a leitura e convicção formada pelo Tribunal recorrido, que acompanhamos de perto, não sendo os documentos chamados à colação pela Ré – mais uma vez, repita-se, de forma cirúrgica e desgarrada de todo o contexto – aptos a fazer abalar a convicção do Tribunal.
Pelo que improcede esta concreta impugnação de facto relativamente ao facto 22.
a.7) Eliminação ou alteração do facto 24.
É o seguinte o teor do facto 24:
24. Quanto aos projectos das “Casa que da a dos Calles” e “Casa frente a la Iglesia”, também as respectivas propostas de honorários foram oportunamente apresentadas pela Autora à Ré, na pessoa de CC, em 24 de Junho de 2020, que as aceitou, de forma expressa e inequívoca, por mensagem de correio electrónica remetida em 2 de Julho de 2020.
E foi a seguinte a motivação do Tribunal a quo:
“Idêntica conclusão se pode retirar quanto ao ponto 24. (por referência à motivação do ponto 22.), desta feita por referência aos documentos 13 e 14 da p.i. (destacando-se, quanto ao último destes documentos, o seguinte comentário, de CC filho, em tradução livre: “vamos em frente, escrevo-te para confirmar os honorários”).
A este propósito alega a recorrente que:
“Ora, em primeiro lugar, se aquele escreve “para confirmar honorários”, é porque os honorários não foram confirmados, isto é, aceites.
Por outro lado, não pode ainda acompanhar-se o entendimento do Tribunal a quo, no sentido de que os honorários tenham sido enviados oportunamente, quando o próprio Tribunal refere que os mesmos foram enviados no mesmo acto em que apresentaram as propostas.
Isto é, a Autora, ora Apelada, decidiu unilateralmente o valor do seu trabalho, impondo-o à Apelante, o que não tem qualquer cabimento legal.
Mas, mais importante, reitera-se o que se referiu atrás quanto aos demais factos impugnados: Não ficou demonstrado que CC representa ou vincula a empresa Ré, sendo totalmente irrelevante – para efeitos de imputação de responsabilidade à Ré aqui Apelante - que aquele tenha aceite, ou não, expressa ou tacitamente, quaisquer honorários, lembrando, ainda, que, conforme é o próprio Tribunal a quo que dá por provado, a Ré, ora Apelante, «não é proprietária de nenhum dos imóveis relativamente aos quais a Autora prestou os seus serviços» (facto provado n.º 29) e «os Administradores da Ré, e únicos com poderes para representar e vincular a
sociedade, são: BB, BB
e FF» – sublinhado e negrito nosso – (facto provado n.º 30).
Do exposto resulta, pois, evidenciado, que o facto provado n.º 24 deve ser julgado não provado ou, em alternativa, passar a ter a seguinte redacção: “24. Quanto aos projectos das “Casa que da a dos Calles” e “Casa frente a la Iglesia”, as respectiva propostas de honorários foram apresentadas pela Autora a CC, em 24 de Junho de 2020”.
Mais uma vez se refira que pretende a Ré escrever a história dos factos, em causa nos presentes autos, tendo sempre como background a resolução jurídica do caso.
É um facto que a Autora não propôs um preço antecipadamente para a elaboração dos projectos. A questão já foi falada anteriormente e resulta à saciedade dos documentos: a apresentação desses honorários estava dependente da estimativa de custos. E essa estimativa não estava feita pela Ré. Foi inclusive a Autora quem a ajudou a fazer. Sem essa estimativa de custos não estava a Autora em condições de enviar a sua nota de honorários.
Isso mesmo é reconhecido na comunicação de CC que consubstancia o doc. 29: “La semana que viene les enviaremos la información suficiente para que puedan definir los honorarios del edifício Atlantida, y en cuanto podamos planos en .dwg que definan correctamente toda la edificación,
Sentimos mucho este retraso,
Não houve por isso um preço previamente acordado para o Trabalho da Autora. Não porque a Autora quisesse começar a trabalhar sem a definição desses honorários, mas acima de tudo, porque essa definição estava, em parte, dependente de elementos a fornecer pela Ré, que não estavam fornecidos e, como tal, não permitiam a estabilização do projecto. Isso resulta dos documentos mas também, e de uma forma muito clara, do depoimento da testemunha GG.
Depois não podemos esquecer que nunca houve uma única comunicação com qualquer correio electrónico da Ré. As comunicações sempre foram feitas para os emails de BB e CC. E quer os projectos, quer as facturas identificavam como cliente a Ré Multicines S.L.
Ela era a destinatária dos projectos e o sujeito da facturação. Raia a má-fé vir agora invocar que os emails e comunicações com os projectos e propostas de honorários foram enviados a CC e não à Ré! Se CC colaborava com a Ré, esteve presente nas conversações, o seu pai admitiu a permanente troca de informações, conhecimento da mesma e do seu teor e recebeu toda a comunicação que identificava a Ré como destinatária, era sua obrigação transmiti-la à Ré!
Não era exigível à Autora que actuasse de outra forma e com outra diligência.
Se é facto que a o tratamento jurídico da questão terá lugar supra, não deixaremos que trazer desde já à colação o disposto no art, 800.º do CC: “1. O devedor é responsável perante o credor pelos actos dos seus representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados pelo próprio devedor.“
Improcede, por isso, a impugnação referente ao facto 24.
a.8) Alteração de redacção do facto 25.
É o seguinte o teor do facto 25:
25. Dos 5 projectos realizados, apenas foi pago à Autora um valor inicial de € 6000 correspondente ao pagamento do “estudo conceptual” do projecto do “Hotel Playa Blanca”, enviado em 2017.
Foi a seguinte a motivação do Tribunal relativamente ao facto 25: “O ponto 25. emerge de toda a prova produzida e da circunstância de a Ré não ter demonstrado ter feito à Autora qualquer outro pagamento que não aquele que aqui consta mencionado.”
Insurge-se a Ré/Apelante contra a redacção deste ponto 25.
Alega que: Salvo o devido respeito, esta motivação é totalmente desprovida de fundamento, contrariando a prova documental junta aos autos pela ora Apelante, que não foi posta em crise, e que demonstra, inequivocamente, uma realidade totalmente diversa daquela referida pelo Tribunal a quo.
É que, conforme resulta perfeitamente expresso e demonstrado dos docs. n.º 11 e 12 juntos à Contestação, não foi a Ré, ora Apelante, quem realizou o referido pagamento de € 6.000,00 à Autora, ora Apelada, mas sim a empresa “Vista Calida S.L.” (– proprietária do imóvel em questão, conforme resultou provado -). E fê-lo, com base numa proposta de honorários e um contrato firmado entre estas empresas, relativos ao projecto do “Hotel Playa Blanca”, conforme docs. n.º 9 e 10 juntos à Contestação.
Pretende assim a Ré que a redacção dada a este ponto 25 seja a seguinte:
“25. A empresa Vista Calida S.L. pagou à Autora um valor inicial de € 6000 correspondente ao pagamento do “estudo conceptual” do projecto do “Hotel Playa Blanca”, enviado em 2017)”.
Convoca-se aqui o que se disse a propósito do ponto a.1): é irrelevante quem pagou à Autora o valor inicial do projecto Playa Blanca.
Relevante é, isso sim, quem acordou a realização desses serviços.
Até porque, como já vimos supra, nos termos do disposto no art.767.º do CPC a prestação tanto pode ser feita pelo devedor, como por terceiro, interessado ou não no cumprimento da obrigação, não tendo esse pagamento por terceiro a virtualidade de alterar os sujeitos obrigados por força do contrato.
Pelo exposto, improcede a impugnação à matéria de facto do ponto 25 dos factos provados.
a.9) Passagem do facto 31 para o elenco dos factos não provados
É o seguinte o teor do facto 31:
31. CC é filho de BB, colaborando com o pai na gestão das sociedades de que o primeiro é administrador.
E foi a seguinte a motivação da sentença recorrida quanto a este facto:
“A igual conclusão se chegou, aliás, quanto à matéria consignada nos pontos 31. e 32., os quais, apesar de consignarem factos instrumentais, resultam demonstrados da globalidade da prova produzida e constituem decorrências lógicas dos restantes factos apurados; a sua menção neste elenco revela-se necessária, todavia, por se considerar útil para uma boa percepção, quer da natureza da relação contratual mantida entre as partes, quer para melhor compreensão da falta de plausibilidade da alegação da Ré.”
A este respeito diz a Ré que:
“Uma vez mais, o Tribunal a quo atropelou e feriu as mais elementares regras legais de funcionamento das sociedades comerciais, quer nacionais ou espanholas, presumindo uma colaboração de CC na gestão, veja-se, de todas as sociedades das quais BB é administrador, ainda que não exista qualquer evidência desses mesmos poderes (nem sequer sendo mencionadas as restantes empresas, que não a Ré, nos presentes autos!).
Pelo contrário, resultando evidente, de todas as comunicações enviadas por CC, que a sua colaboração sempre se limitou às suas competências técnicas, nomeadamente, ligadas ao mundo da arquitectura!
(…)
O que, de resto, se retira dos depoimentos e das declarações do legal representante da Autora e da testemunha da Autora, GG, que a seguir se transcrevem:
(…)
Não podendo o Tribunal a quo ignorar, como o faz, que a gestão das sociedades comerciais cabe, dependendo das suas características, aos seus administradores directores ou gerentes.
De resto, conforme resultou provado, a empresa Ré aqui Apelante tem outros administradores (facto provado 30), pelo que, qualquer colaboração com a gestão d empresa – que nunca existiu, como se deixou demonstrado -, sê-lo-ia necessariamente com todos os administradores e não apenas com o administrador BB Francês!”
Do exposto resulta, pois, evidenciado, que o facto provado n.º 31 deve ser julgado não provado.
A Tribunal a quo não ignora, assim como este Tribunal igualmente não ignora, que existem normas de societário que estipulam sobre os poderes de gestão e a quem cabem os mesmos.
Mas o facto é que é momento algum do singelo facto 31 se diz que CC tem poderes de gestão!
Aquilo que se diz é que colabora com o pai na gestão das sociedades.
Gestão das sociedades entendida esta com a amplitude que a mesma comporta. Essa gestão da sociedade comportar também, no seu conteúdo programático, a tomada de posições sobre projectos que comportam componentes técnicas. Mas mais do que isso, percorrendo as comunicações entre CC e a Autora, seja na pessoa do legal representante, quer dos diversos colaboradores da Autora que participaram nos projectos, vemos amiúde a referência a que exprime o seu sentir e o sentir do seu pai, o que aliás não foi desmentido por este nas suas declarações de parte, ainda que devidamente medidas e comedidas!
Aliás, não se deixa de estranhar a circunstância de CC não ter sido arrolado como testemunha de viva voz para vir informar isso mesmo ao Tribunal, e o tenha sido a sua irmã RR! Ninguém melhor que CC para confirmar a versão da Ré de que a sua actuação se situava apenas e tão só na área técnica e que tudo o que por si foi assumido o foi em revelia à posição do seu pai e extravasando os poderes de facto por este conferidos!
O facto de se exigir que a colaboração na gestão da sociedade fosse extensível aos restantes administradores é uma questão de suficiência dos factos relativamente ao quadro normativo aplicável, que será apreciado posteriormente.
Improcede pois, em face da prova produzida – quer documental, quer testemunhal quer por declarações de parte – esta impugnação de facto, mantendo-se o facto 31 no elenco dos factos provados com a mesmíssima redacção, na medida em que foi isso e apenas isso que resultou da prova dos autos.
a.10) Passagem da al. a) dos factos não provados para os factos provados
É o seguinte o teor da al. a) dos factos não provados:
a. a) Que a Ré em nenhum momento solicitou à Autora a elaboração de qualquer projecto de arquitectura referente aos imóveis supra identificados (artigo 40º da contestação);
Foi a seguinte a motivação do Tribunal a quo: “No que concerne aos factos não provados, a convicção do Tribunal é resultado lógico e consequente da falta de prova por banda da Ré, considerando que se tratava de factualidade invocada em sede de defesa/impugnação motivada e matéria de excepção peremptória; pelo que, recaindo o ónus desta prova sobre a Ré, se deu tal factualidade como não provada. É de referir, a este propósito, que a prova produzida em juízo pela Ré se revelou inconsistente, vaga e pouco reveladora de conhecimento directo dos factos; destaca-se, a propósito, o depoimento da testemunha LL(filha de BB e irmã de CC filho, responsável pelo departamento jurídico do família QQ), que se esforçou por acentuar que os trabalhos realizados pela Autora, mesmo considerando-se como Anteprojectos, não cumpriam regras de ordenamento do território, pelo que nunca seriam viáveis, o que constituiria, também, um cumprimento defeituoso por banda da Autora (no limite, supostamente, fundamentando uma excepção de não cumprimento da obrigação de pagamento do preço); mas as comunicações mantidas entre as partes (e anteriormente referidas) demonstram, abundantemente, que a família QQ não teria qualquer problema em providenciar pela alteração dos instrumentos de ordenamento do território, junto das entidades administrativas competentes, em sentido favorável aos seus interesses – como se conclui, claramente, por exemplo, dos documentos 38 e 39 juntos com a p.i.. O que, mais uma vez, reforça a convicção no sentido da falta de razão da Ré na sua defesa.”
Não obstante discordarmos de parte da motivação da decisão recorrida, entendemos que este facto é de eliminar, qua tale, e não passar para o elenco dos factos provados!.
Não era ónus da prova da Ré provar que não tinha encomendado nenhum projecto à Autora.
Vejamos: enquanto facto constitutivo da causa de pedir da Autora, cabia apenas a esta fazer prova do contrato celebrado entre si e a Ré e seus contornos.
À Ré cabia fazer contra-prova deste facto, o que é substancialmente diverso de dizer que lhe cabia fazer prova de que não havia solicitado qualquer projecto!
Podia a Ré ter invocado, enquanto facto impeditivo/modificativo do direito da Autor, que os contratos se tinham estabelecido com outras partes que não a Ré! Mas nem mesmo isso foi feito pela Ré, que se limitou a invocar que os proprietários dos imóveis eram outras entidades que não a Ré, e que o pagamento de um dos projectos tinha sido feito por outra sociedade que não a Ré! Nunca tendo adiantado que os contratos, que originaram uma inequívoca conversação entre as partes por mais de 4 anos, haviam sido solicitados pelas respectivas proprietárias.
Ora, a obrigação que está em causa nos autos não é uma obrigação propter rem, nem real. Estamos no âmbito das relações contratuais, pelo que nos movemos apenas e tão só no campo dos sujeitos/partes no contrato.
Em face do exposto elimina-se a al. a) do elenco dos factos provados na medida em que o mesmo não consubstancia um facto constitutivo, impeditivo, modificativo ou extintivo, mas uma mera negação do facto (esse sim constitutivo) alegado pela Autora.
Impugnação da matéria de facto pela Autora no Recurso Subordinado
Conforme se refere no Ac. do STJ de 26-01-2027, “interposto recurso subordinado pode a parte que o deduziu integrar no mesmo as questões em que tenha ficado vencida, sejam questões de direito ou também questões de facto”.
É o caso dos autos em que a Autor, tendo ficado parcialmente vencida, vem impugnar a matéria de facto e igualmente questões de direito.
a.11) Alteração do ponto 20 dos factos provados
É o seguinte o teor do facto 20:
20. Uma vez concluídos os trabalhos solicitados, a Autora, em 30 de Julho de 2020, enviou à Ré, por via postal e por correio electrónico, os Anteprojectos dos 5 projectos identificados anteriormente, acompanhados das respectivas facturas pró-forma (cf. docs. 17 a 21):
i. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Hotel Playa Blanca”, no valor de € 73.760,00, correspondente a 10% do valor total da obra;
ii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Edifício Atlântida”, no valor de € 97.060,00, correspondente a 10% do valor total da obra;
iii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Quinta La Geria”, no valor de € 5.670,00, correspondente a 10% do valor total da obra;
iv. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa dos Calles”, no valor de € 5.210,00, correspondente a 10% do valor total da obra;
v. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa frente a la Iglesia”, no valor de € 4.200,00, correspondente a 10% do valor total da obra.
O Tribunal motivou a sua convicção acerca de tais factos da seguinte forma:
“Para prova dos pontos 20., 21. e 23., valeram os documentos aí mencionados, que corporizam as facturas pró-forma, conjugadamente com o depoimento, já mencionado, de HH, responsável pelo seu envio a CC filho. Aliás, a circunstância de a comunicação a que respeita o doc. 22 ter sido remetida ao filho, não impediu o pai de tomar a devida posição sobre os valores facturados, sem questionar o envio ou colocar em causa que o filho tivesse legitimidade para receber tais comunicações - cf. doc. 39 com a p.i..”
Alega a Autora, mais do que uma efectiva impugnação da matéria de facto, um lapso no teor do art. 20. Diz a mesma que “Sucede, porém, que o referido facto provado contém um lapso que deverá ser corrigido.
Senão vejamos,
No referido facto provado, faz-se referência a que os valores das faturas pró-forma correspondem a “10% do valor total da obra.”.
O que é um lapso, pois a percentagem de 10% constante do valor das faturas pró-forma reporta-se ao valor total dos projetos e não ao valor das obras.
É isto que resulta das propostas de honorários dos diversos projetos em causa nos presentes autos – cfr. Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial.
Vejamos, a título de mero exemplo, a proposta de honorários referente ao projeto “La Geria” – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
Do mesmo resulta que o valor da obra estimado é de € 629.800,00, sendo que o valor dos honorários para os serviços de arquitetura da Autora é de € 56.700,00, sendo 10 % do referido projeto o valor de € 5.670,00, tal como consta da respetiva fatura pró-forma – cfr. Documentos n.ºs 22 e 19 da Petição Inicial.”
Sem necessidade de grandes considerandos, afigura-se-nos que assiste razão à Autora. Muito embora os honorários fossem apresentados pela Autora à Ré em função do valor total da obra (foi isso que resultou da generalidade dos depoimentos), o valor a pagar, reclamado nas facturas aludidas no ponto 20, não é 10% do valor da obra, mas sim 10% do valor total dos honorários.
Assim, altera-se o ponto 20 passando o mesmo a ter o seguinte teor:
20. Uma vez concluídos os trabalhos solicitados, a Autora, em 30 de Julho de 2020, enviou à Ré, por via postal e por correio electrónico, os Anteprojectos dos 5 projectos identificados anteriormente, acompanhados das respectivas facturas pró-forma (cf. docs. 17 a 21):
i. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Hotel Playa Blanca”, no valor de € 73.760,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
ii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Edifício Atlântida”, no valor de € 97.060,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
iii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Quinta La Geria”, no valor de € 5.670,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
iv. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa dos Calles”, no valor de € 5.210,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
v. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa frente a la Iglesia”, no valor de € 4.200,00, correspondente a 10% do valor total do projecto.
a.12) Alteração do facto 21 dos factos provados
É o seguinte o teor do facto 21:
21. Os elementos enviados (peças desenhadas e peças escritas) foram entregues com o detalhe correspondente a um “Anteprojecto”, tal como consta das facturas emitidas.
A motivação é a seguinte:” Para prova dos pontos 20., 21. e 23., valeram os documentos aí mencionados, que corporizam as facturas pró-forma, conjugadamente com o depoimento, já mencionado, de HH, responsável pelo seu envio a CC filho. Aliás, a circunstância de a comunicação a que respeita o doc. 22 ter sido remetida ao filho, não impediu o pai de tomar a devida posição sobre os valores facturados, sem questionar o envio ou colocar em causa que o filho tivesse legitimidade para receber tais comunicações - cf. doc. 39 com a p.i..
Pretende a Autora que a redacção seja alterada para a seguinte:
“21. Os elementos enviados (peças desenhadas e peças escritas) foram entregues com o detalhe correspondente a, pelo menos, um “Anteprojeto”, ainda que, em alguns casos, o trabalho entregue apresente uma definição e grau bastante superior.”
Alega, sumariamente, que “Antes de entrarmos nos depoimentos das testemunhas e declarações de parte do legal representante da Autora, é necessário referir, desde logo, pela sua importância que os projetos entregues pela Autora à Ré constam dos Documentos n.ºs 15 e 16 da Petição Inicial, sobretudo deste último, onde se pode ver, como foi explicado amplamente pelas testemunhas, e como iremos ver abaixo, o detalhe dos projetos entregues Para além disso, é importante vermos, de forma sumária, quais são as fases de um projecto de arquitetura, por forma a entender-se como é que o mesmo se desenrola, antes de aferirmos no caso concreto até que fase e nível de desenvolvimento foram os projetos em causa nos presentes autos. (…)
Sendo que tal divisão, com exceção do estudo prévio e das fases das obras, encontra-se plasmada nas propostas de honorários constantes dos presentes autos – cfr. Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial.
Ou seja, um projeto de arquitetura divide-se nas seguintes fases:
i. Estudo prévio;
ii. Anteprojeto;
iii. Projeto-Base;
iv. Projeto de Execução e direção da obra.”
Em suma, pretende a Autora que se acrescente que o trabalho entregue, em alguns casos, tinha uma definição e grau bastante superior ao de um ante-projecto.
Afigura-se-nos completamente despiciente e irrelevante alterar o ponto 21 dos factos provados.
Por várias ordens de razões:
- é um facto que a versão pretendida pela Autora corresponde aquilo que foi por si alegado no art. 25.º da petição inicial. Mas o que é uma definição e grau bastante superior? Afigura-se-nos ser uma afirmação valorativa destituída de utilidade.
Diferente seria se a Autora dissesse que o entregue correspondia já a um projecto-base (fase seguinte dos projectos de arquitectura). Mas, não só a Autora não disse isso, como nem sequer da instrução da causa resultou que, o grau de definição e pormenor, fosse inequivocamente compatível com verdadeiros projecto base.
Como a própria Autora /Recorrente cita nas suas alegações de recurso:
GG: Para mim, é um projeto-base. Estamos a meio de um projeto-
base. Os franceses dividem o projeto base em dois: sommaire e définitif. Seria um
sommaire, um meio projeto-base, acho eu. Isto também depende da dimensão do
projeto.
[00:16:37]”
Ora, se estamos a meio de um projecto base não temos ainda um projecto base concluído. E em termos de projecto de arquitectura só interessava saber a concreta fase e não o estado dessa concreta fase: Estudo prévio? Ante-projecto? Projecto Base? Projecto de Execução? Só estas fases interessavam sem necessidade de valorar cada uma das fases adjectivando o trabalho desenvolvido.
Assim sendo, julga-se improcedente esta concreta impugnação da matéria de facto com vista à alteração de redacção do facto 21.
a.13) aditamento de um facto 21.a)
No seu recurso subordinado, em sede de impugnação da matéria de facto, defende a Autora/Recorrente a introdução de um facto 21 a) com o seguinte teor:
“21.a. O Anteprojeto corresponde a 25% do total de um projeto de arquitetura.”.
A este respeito alega a Autora nas suas alegações que: “Por outro lado, resulta, também, claro, do acima referido, que a fase de arquitectura correspondente a um Anteprojeto corresponde a 25% de um total de um projeto de arquitetura – cfr. depoimento da testemunha HH prestado na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09- 23_11-13-08 – 00:20:54” com início às 11:13 e fim às 11:34) – [00:07:33] a [00:08:07]) – e as declarações de parte do legal representante da Autora, JJ, prestadas na audiência de julgamento do dia 23.09.2024 (ficheiro áudio “Diligencia_20344-21.7T8LSB_2024-09-23_09-38-32 — 01:12:26” com início às 09:38 e fim às 10:51) – [00:20:50] a [00:21:09]) – remetendo-se para os excertos acima transcritos nas págs. 108, 112 e 113, por motivos de economia processual.
Sendo tal facto reforçado, para além de toda a prova testemunhal acima referida, pelo facto provado n.º 28 da Sentença Recorrida que dispõe o seguinte: “28. Perante a circunstância de a Ré ter posto em causa os valores solicitados, o Autor solicitou ao Colégio Oficial de Arquitetos das Ilhas Canárias a emissão de parecer relativamente ao estado/natureza dos trabalhos correspondentes aos 5 projetos, parecer esse que foi emitido em 03.06.2021 com o seguinte teor, além do mais que se dá por reproduzido conforme doc. 46 junto com a p.i., no sentido de que o trabalho elaborado pela Autora traduzido em anteprojetos (relativamente a cada um dos imóveis) corresponde a 25% do total de cada projeto desses imóveis.” (sublinhado nosso).
O Tribunal a quo relativamente ao referido parecer e à sua importância para a quantificação dos trabalhos prestados pela Autora à Ré refere o seguinte na Sentença Recorrida:
“Finalmente, quanto ao ponto 28., valeu, naturalmente, o teor do documento aí mencionado, conjugadamente com os esclarecimentos prestados pelo legal representante da Autora, que prestou o devido enquadramento relativamente a esta solicitação, perante a circunstância (também alegada no âmbito da presente acção) de a Ré ter posto em causa a natureza e valor dos trabalhos efectuados pela Autora. Note-se que, para este efeito, pouco releva a circunstância de a entidade emissora do parecer ter ou não jurisdição sobre a localização geográfica dos empreendimentos relativamente aos quais a Autora desenvolveu o seu trabalho, sendo certo, para além disso, que este não é um elemento de prova de natureza pericial; foi, sim, um meio de prova documental que serviu para formar a convicção do Tribunal, conjugadamente com os demais meios de prova apresentados e produzidos em juízo, no sentido de apurar a natureza e características do trabalho desenvolvido pela Autora e adequação do preço por si peticionado por tal trabalho, seja em termos absolutos, seja no quadro da relação contratual aqui em análise.
Porém, cumpre aqui salientar que esta prova, precisamente também atenta a sua natureza, não tem a virtualidade – pelo menos, no âmbito da causa de pedir desta acção – de fazer demonstrar que o valor devido pelos serviços prestados, no âmbito do contrato, é o correspondente às percentagens consignadas no parecer. De facto, não sendo um laudo produzido no âmbito da instrução da acção (artigos 388º e 389º do Código Civil), não assume a força probatória suficiente para atestar, com rigor, a dimensão e características do trabalho desenvolvido pela Autora, em termos tais que pudesse fundamentar a obrigação de pagamento, pela Ré, de um valor superior àquele que foi consignado nas facturas. Note-se, aliás, que, dos elementos disponíveis nos autos, este parecer foi solicitado, precisamente, na sequência da recusa da Ré em liquidar os valores facturados e não para sustentar qualquer outra interpelação para pagamento, de valor superior ao das facturas. Pelo que serviu, apenas, como meio de prova apto a demonstrar o conteúdo da obrigação por referência aos valores facturados, e nada mais.” – cfr. págs. 13 e 14 da Sentença Recorrida.
Contudo, e como vimos amplamente acima, o facto de o anteprojeto corresponder a 25% de um projeto de arquitetura e dos trabalhos efetivamente realizados no presente caso não consta apenas do referido parecer, mas, também, de prova testemunhal que corrobora tal facto.”
Nas suas contra-alegações ao recurso subordinado defende a Ré/Recorrida a improcedência de tal impugnação, convocando para essa sua posição o valor probatório do Laude de Honorários junto aos autos pela Autora.
Analisando:
Na presente acção a Autora começa por alegar o incumprimento da Ré, nomeadamente pautado pela falta de pagamento do valor das cinco facturas pró-forma emitidas (cf. art. 32.º).
Mais refere que, nos termos acordados, com a entrega do projecto seriam devidos 10% do valor do projecto a levar a cabo pela Autora (art. 25.º da petição inicial).
Ouvida toda a prova foi isso mesmo que resultou:
- as facturas emitidas respeitaram o acordado: não facturaram a totalidade do trabalho feito, mas apenas 10% do total do valor do trabalho da Autora. A própria testemunha GG atestou esse mesmo facto de uma forma muito nítida: foi clara e evidentemente uma opção das partes.
É certo que no art. 55.º da sua petição inicial a Autora alega que foi emitido o parecer do Colégio Oficial de Arquitector e que o mesmo atestou que os trabalhos entregues correspondem a verdadeiros anteprojectos e que (…) o valor facturado deveria ter sido não 10% do valor da obra a realizar, mas sim 21,75 nuns casos e 25% noutros.
Ora o Parecer do Colégio Oficial, como bem refere o Tribunal a quo na sua fundamentação de facto e respectiva motivação do facto 28, foi pedido e foi dado. Nos termos que constam do facto 28 dado por provado.
O Tribunal com certeza e segurança, e em consciência, apenas pode dizer que foi emitido aquele Parecer por banda do Colégio Oficial de Arquitectos das Ilhas Canárias e que o mesmo se pronunciou no sentido que o Trabalho elaborado pela Autora correspondia a 25% do total de cada projecto.
Note-se que não estamos no contexto de uma perícia/laudo realizado no âmbito dos presentes autos, com garantias de imparcialidade, representatividade e contraditório. Estamos, isso sim, perante um parecer solicitado – e presumivelmente pago – pela Autora, sem que nem o Tribunal, nem a parte contrária, tivessem tido oportunidade de colocar questões que entendessem pertinentes.
Como bem refere a sentença recorrida: “Porém, cumpre aqui salientar que esta prova, precisamente também atenta a sua natureza, não tem a virtualidade – pelo menos, no âmbito da causa de pedir desta acção – de fazer demonstrar que o valor devido pelos serviços prestados, no âmbito do contrato, é o correspondente às percentagens consignadas no parecer. De facto, não sendo um laudo produzido no âmbito da instrução da acção (artigos 388º e 389º do Código Civil), não assume a força probatória suficiente para atestar, com rigor, a dimensão e características do trabalho desenvolvido pela Autora, em termos tais que pudesse fundamentar a obrigação de pagamento, pela Ré, de um valor superior àquele que foi consignado nas facturas. Note-se, aliás, que, dos elementos disponíveis nos autos, este parecer foi solicitado, precisamente, na sequência da recusa da Ré em liquidar os valores facturados e não para sustentar qualquer outra interpelação para pagamento, de valor superior ao das facturas. Pelo que serviu, apenas, como meio de prova apto a demonstrar o conteúdo da obrigação por referência aos valores facturados, e nada mais.”
Aderindo na íntegra à motivação do Tribunal a quo - acrescentando ainda que a prova testemunhal produzida não foi de molde a, num tema rodeado de tanta tecnicidade, permitir a afirmação conscienciosa de que o trabalho desenvolvido corresponde a 25% do total do projecto - entende-se que não é de aditar o facto 21 a), sendo bastantes e fieis à prova produzida o teor dos factos 21. E 28.
Pelo exposto, improcede o aditamento requerido de um facto 21 a) ao elenco dos factos provados.
a.14) Introdução de novos factos 33 e 34
Pretende ainda a Autora, em sede de impugnação da matéria de facto, que se introduzam dois novos factos com o seguinte teor:
“33. Os valores constantes das faturas pró-forma enviadas pela Autora à Ré não correspondem ao trabalho efetivamente realizado pela Autora nos projetos em causa nos presentes autos.
34. Os esquemas de faturação previstos nas propostas de honorários – Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial – são indexados às várias fases dos projetos apenas para efeitos de fixação do momento temporal da faturação, não apresentando qualquer correspondência com os trabalhos que são efetivamente realizados em cada fase do projeto.”
Para defesa deste seu entendimento convoca a Autora a prova produzida nos autos – quer documental, quer testemunhal – e termina com a seguinte argumentação “E não se diga que o facto de na carta de interpelação enviada – cfr. Documento n.º 45 da Petição Inicial e facto provado n.º 27 da Sentença Recorrida – ser pedido apenas o pagamento do valor das faturas pró-forma, ou seja, de € 185.900,00 coloca em causa a legitimidade de a Autora vir aqui peticionar o valor dos trabalhos efetivamente realizados.
Isto porque a Autora podia legitimamente, para evitar um litígio e resolver as coisas a bem, considerar “fechar” este tema pelo referido valor e não existindo acordo, em sede judicial peticionar, como o fez, o valor dos trabalhos efetivamente realizados.”
Vejamos:
Por um lado, os factos que a Autora pretende introduzir são essencialmente conclusivos! Repare-se que bastaria o facto 20 (que escalpeliza a facturação feita pela Autora) conjugado com um eventual facto 21 a) para chegarmos à conclusão ínsita nos propostos factos 33 e 34, cuja inclusão a Autora/Recorrente pretende, sem necessidade de os elencar, por tautológicos.
Convocamos, ainda, para a análise da pertinência da inclusão destes dois factos aquilo que já referimento supra a propósito de outros factos : A impugnação de factos que tenham sido considerados provados ou não provados e que não sejam importantes para a decisão da causa, não deve ser apreciada, na medida em que alteração pretendida não é susceptível de interferir na mesma, atenta a inutilidade de tal acto, sendo certo que de acordo com o princípio da limitação dos actos, previsto no art.º 130.º do Código de Processo Civil não é sequer lícita a prática de actos inúteis no processo (Acórdão do STJ de 17/05/2017 (Fernanda Isabel Pereira), também disponível em www.dgsi.pt).
Ora, nos presentes autos a causa de pedir é o incumprimento contratual, com base na mora da Ré. Nada nos autos nos diz que, qualquer uma das partes, tenha resolvido o contrato. Por isso é com base no contrato – e nas condições acordadas – que tem se ser decidido este incumprimento contratual.
E é a própria autora a confessar que o acordo foi o pagamento de 10% - independentemente do valor total do trabalho já feito – com a entrega do anteprojecto. Foi com base nesse acordo consensual que a Autora emitiu as facturas que aqui reclama.
Não tem nenhum sentido, por isso, convocar-se para a decisão do incumprimento contratual – mora – a aferição de medida de trabalho desenvolvido diversa da acordada!
A Autora podia ter acordado que os honorários seriam pagos de acordo com o trabalho efectivamente desenvolvido. Podia, mas não foi isso que acordou! E se não foi isso que acordou não releva – para decisão dos presentes autos – as circunstâncias inerentes aquilo que podendo ter sido acordado não o foi.
Como se disse, não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objecto de impugnação não forem susceptíveis, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do C.P.C.), da mesma forma que é de evitar a inclusão na matéria de facto de afirmações conclusivas ou valorativas, como é o caso das afirmações cuja inserção é sugerida pela Autora.
Pelo que se julga improcedente esta concreta impugnação da matéria de facto, não se introduzindo tais afirmações na factualidade provada.
a.15) Alteração do facto 27
É o seguinte o teor do facto 27:
27. Em Janeiro de 2021, a Autora endereçou à Ré uma comunicação interpelando-a para a liquidação da quantia correspondente ao preço dos serviços prestados, no montante total de € 185.900,00 – cf. doc. 45.
A este respeito alega a Autora que este facto tem um lapso /imprecisão que necessita de correcção, na medida em que:
“Na referida carta de interpelação é solicitado o pagamento do montante de € 185.900,00 – cfr. Documento n.º 45 da Petição Inicial.
E o Tribunal a quo considerou que tal interpelação “correspondente ao preço dos serviços prestados.”
No entanto, como vimos, tal não corresponde à verdade.
Na referida carta de interpelação foi solicitado o pagamento do montante correspondente ao valor constante das faturas pró-forma – cfr. Documentos n.ºs 17 a 21 da Petição Inicial.
O que, como vimos supra, não significa que isso tenha sido o trabalho dos valores efetivamente realizados / prestados.
Aliás, como vimos acima, ficou demonstrado que o valor das faturas pró-forma não corresponde ao trabalho efetivamente realizado pela Autora nos projetos em causa nos presentes autos – cfr. págs. 124 a 131 acima e facto n.º 33 cujo aditamento acima se requereu.
Analisando:
Poderá efectivamente existir uma imprecisão do facto dado por provado em 7, no seu confronto com a totalidade e globalidade da prova produzida.
Mas, diga-se desde já, tal erro foi um “erro de simpatia” a que o Tribunal foi induzido pela própria Autora na sua petição inicial!
Aquilo que se constata e que no ponto 27 dos factos provados o Tribunal limita-se a reproduzir, expurgado de considerações, aquilo que é alegado no art. 50.º da petição inicial:
“Em janeiro de 2021, o Autor endereçou ao Réu, através dos seus mandatários, uma missiva dirigida à interpelação daquele para repor a legalidade da situação presente, através do pagamento da quantia em dívida, correspondente ao preço contratual dos serviços de arquitectura prestados, no montante total de € 185.900,00 (…)”
Se é um facto que foi a alegação da Autora que induziu à redacção do ponto 27 dos Factos Provados, não é menos verdade que tendo resultado algo diverso da prova produzida, a redacção do facto se deveria aproximar, tão fielmente quanto possível, da realidade apurada.
Em face do exposto, e levando em consideração as declarações de parte, o depoimento de GG e HH altera-se a redacção do ponto 27 que passará a ser a seguinte:
27. Em Janeiro de 2021, a Autora endereçou à Ré uma comunicação interpelando-a para a liquidação da quantia correspondente ao valor das facturas pro-forma, no montante total de € 185.900,00 – cf. doc. 45.
A.16) Aditamento de novos factos com as propostas de honorários para os respectivos projectos.
Pretende a Autora que se introduzam nos autos 5 novos factos com o seguinte teor:
“23.a. Em relação ao projeto “La Geria” o valor total do projeto é de € 56.700,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
23.b. Em relação ao projeto “Edifício Atlântida” o valor total do projeto é de € 970.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
23.c. Em relação ao projeto “Hotel Playa Blanca” o valor total do projeto é de € 737.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
24.a. Em relação ao projeto “Casa en Frente a La Iglesia” o valor total do projeto é de € 42.000,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.
24.b. Em relação ao projeto “Casa dos Calles” o valor total do projeto é de € 52.100,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.”
Para o efeito alega a Autora que: “Nos factos n.ºs 23 e 24 considerados provados pela Sentença Recorrida, são feitas referências às propostas de honorários para cada projeto em causa nos presentes autos – cfr. Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial.
Sucede, porém, que considerando a sua importância, para a quantificação dos serviços prestados pela Autora à Ré, a Autora considera que deverão ser aditados factos relativos aos valores dos honorários de cada projeto aqui em causa.
Pois, só com esses montantes é que, em rigor, se poderão determinar os montantes aqui devidos em termos percentuais, face aos trabalhos efetivamente realizados, “exercício” que se realizará no próximo subcapítulo.
E não obstante tais factos serem incontrovertidos, e resultantes da prova documental junta, os mesmos não constam do elenco de factos provados da Sentença Recorrida.
Em relação ao projeto “La Geria” o valor total do projeto é de € 56.700,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
Em relação ao projeto “Edifício Atlântida” o valor total do projeto é de € 970.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
Em relação ao projeto “Hotel Playa Blanca” o valor total do projeto é de € 737.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
Em relação ao projeto “Casa en Frente a La Iglesia” o valor total do projeto é de € 42.000,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.
Em relação ao projeto “Casa dos Calles” o valor total do projeto é de € 52.100,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.”
Analisando a pertinência do aditamento de tais factos cumpre desde já referir que, nos termos do art. 5.º do CPC “Às partes cabe alegar os factos essenciais que constituam a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas”.
Ora, percorrida e perscrutada a petição inicial não encontramos uma única referência que seja – em termos de alegação – ao valor total dos projectos.
É portanto matéria completamente nova que a Autora/Recorrente pretende agora introduzir.
Tal matéria apenas poderia e/ou deveria ter sido considerada pelo Tribunal caso o mesmo tivesse entendido que (i) havia resultado da instrução da causa e (ii) seriam susceptíveis de ser instrumentais ou complementares.
Nem necessidade de mais considerandos, por se afigurarem desnecessários, dir-se-á apenas que a pretensão da Autora é de improceder na medida em que:
- tal facto não foi alegado pela Autora;
- não tendo sido alegado pela Autora, o Tribunal apenas o poderia considerar se tivesse resultado da instrução da causa e fosse instrumental ou complementar;
- não só o valor dos projectos não resultou inequivocamente demonstrado – assentando a prova apresentada pela Autora num parecer pedido extrajudicialmente, sem faculdade de participação quer do Tribunal quer da Ré, manifestamente insuficiente para demonstração dos factos –, como ainda não se nos afigura que tais factos sejam de considerar como instrumentais ou complementares.
Considera-se assim improcedente esta impugnação de facto, não se aditando os factos 23 a.), 23b.), 23 c.), 24 a) e 24b).
Síntese conclusiva das alterações introduzidas à matéria de facto
Em jeito de conclusão, reponderada toda a prova produzida nos autos o Tribunal entendeu apenas proceder às alterações referidas supra que aqui se elencam sumariamente:
- a.2) alterando a redacção do facto 3 para o seguinte: “3. Entre 2017 e 2019 a Autora recebeu convites de BB, para a elaboração de um total de 5 projectos de arquitectura a desenvolver na ilha de Lanzarote (arquipélago das Canárias). “
-a.10) exclusão da al. a) dos Factos não provados com o seguinte teor: a) Que a Ré em nenhum momento solicitou à Autora a elaboração de qualquer projecto de arquitectura referente aos imóveis supra identificados (artigo 40º da contestação);
- a.11) alterando a redacção do facto 20 para o seguinte: “20. Uma vez concluídos os trabalhos solicitados, a Autora, em 30 de Julho de 2020, enviou à Ré, por via postal e por correio electrónico, os Anteprojectos dos 5 projectos identificados anteriormente, acompanhados das respectivas facturas pró-forma (cf. docs. 17 a 21):
i. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Hotel Playa Blanca”, no valor de € 73.760,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
ii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Edifício Atlântida”, no valor de € 97.060,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
iii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Quinta La Geria”, no valor de € 5.670,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
iv. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa dos Calles”, no valor de € 5.210,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
v. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa frente a la Iglesia”, no valor de € 4.200,00, correspondente a 10% do valor total do projecto.”
-a.15) alterando a redacção do facto 27 para o seguinte: 27. Em Janeiro de 2021, a Autora endereçou à Ré uma comunicação interpelando-a para a liquidação da quantia correspondente ao valor das facturas pró-forma, no montante total de € 185.900,00 – cf. doc. 45.
Em tudo o mais se mantendo a matéria de facto fixada pela 1.ª instância.
Apreciação Jurídica
Fixada assim a matéria de facto a análise jurídica da decisão recorrida torna-se quase despiciente, na medida em que o inconformismo com a solução de direito estava intimamente ligado ao pressuposto de que a matéria de facto se alteraria.
Mas, embora sem necessidade de grandes desenvolvimentos, vejamos:
b.1.) Recurso Principal da Ré /Apelante
Em sede de alegações e conclusões, no que tange à matéria de direito, suscita a Ré apelante:
b.1.a)- da vinculação da sociedade Ré apenas com a intervenção de um administrador;
b.1.b)- da ausência de contrato
b.1.c) - do eventual recurso ao instituto da desconsideração da personalidade jurídica.
b.1.a) Da vinculação da Sociedade Ré
A Ré coloca questão sob dois planos:
- o plano da actuação;
- o plano do direito.
No que respeita ao plano da actuação de BB, a análise desta questão – em termos jurídicos – estava dependente do Tribunal dar como não provado- como era ensejo da Ré - que o mesmo tivesse agido em representação da Multicines S.L.
Mantendo-se inalterada a redacção dos factos 7 e 9 (entre outros) perde sustentação o inconformismo jurídico com o teor da decisão recorrida.
No plano do direito, a questão coloca-se em termos de subsunção dos factos provados ao sistema de governo da Ré.
As pessoas colectivas não têm, naturalisticamente, vontade própria: para a formação e exteriorização da sua vontade são necessários titulares de órgãos que a expressem.
É o que sucede também com as sociedades comerciais, que, enquanto pessoas colectivas de direito privado, se constituem como centros de imputação de normas jurídicas, e têm aptidão para agir juridicamente, cumprindo obrigações e exercendo direitos, de modo permanente e directo, através dos seus órgãos: os actos praticados pelos titulares destes órgãos projectam-se, de modo automático e directo, na sociedade a que pertencem, através – segundo a orientação dominante – de vínculos de organicidade, que, portanto, dão lugar a uma representação orgânica.
Nas sociedades por quotas, como é o caso da sociedade Ré – Sociedade Espanhola - os poderes de representação são atribuídos, de harmonia com o sistema de governo escolhido pelo contrato, aos administradores
O órgão administrativo-executivo da sociedade pode ser singular ou plural. Se for singular a representação orgânica, tanto activa como passiva, competirá, evidentemente, ao administrador único; no caso de ser plural, o exercício dos poderes de representação pode ser organizado segundo o modelo da representação disjunta – cada um dos administradores tem poderes para vincular a sociedade – da conjunção integral – em que é necessária a intervenção de todos os administradores – da conjunção maioritária – que exige a intervenção da maioria dos administradores – e da conjunção minoritária – que reclama a intervenção da minoria dos administradores. Em Portugal assim é, e o regime resulta dos arts. 278.º, n.º 2, 390.º, n.º 2, e 424.º, nº 2, do CS Comerciais.
Qual o sistema de Governo escolhido pela Ré? Os factos provados – facto 30 - apenas nos dizem que “Os Administradores da Ré, e únicos com poderes para representar e vincular a sociedade, são: BB BB e FF.”.
Não diz qual o sistema de governo: se o modelo de representação disjunta, se da conjunção integral ou da conjunção maioritária ou qualquer outro.
Mas se este facto não diz, já o documento no qual o Tribunal baseou a resposta a este facto – doc. 8 junto com a contestação | Certificado de Registo Mercantil de Lanzarote – nos adianta a resposta: todos os administradores são solidários.
Efectivamente em Espanha poderá existir uma de três realidades:
i. Administrador único
ii. Dois ou mais administradores solidários;
iii. Dois ou mais administradores mancomunados.
No caso da administração solidária qualquer um dos administradores pode representar a empresa, sem necessidade que o resto dos administradores actuem simultaneamente.
Ao invés na administração de mão comum, para actuar em nome da empresa, necessário se torna a intervenção de todos os administradores.
Dito isto, sendo a administração da Ré Solidária – a prova deste facto só pode ser feita por documento e o documento está nos autos como doc. 8 com a contestação - torna-se absolutamente irrelevante, para vinculação da sociedade, a intervenção ou não dos restantes administradores.
Exemplo dessa prática pela Ré é o documento que ela própria junta com a sua contestação: basta atentar no contrato de prestação de serviços que consubstancia o doc. 2, em que são partes Multicines S.L. e AA-arquitectos, Lda., a primeira aparece representada apenas e tão somente por BB!
Quanto à intervenção de BB como sendo a título individual ou em representação da sociedade, seguimos de perto a jurisprudência do Ac. STJ de 6-12-2001 que concluiu que não resulta da letra do n.º 4 do art. 260.º do CSC que a indicação da qualidade de gerente tenha de ser necessariamente expressa”.
E se esta teses nos faz todo o sentido – na óptica de evitar decisões incompreensíveis e injustas aos olhos do cidadão comum e desadequadas à realidade – que dizer dos contratos consensuais que nem sequer são reduzidos a escrito como os presentes?!
Como é obvio há que recorrer às negociações, às comunicações escritas.
E foram exactamente essas negociações, comunicações escritas e sua conjugação com a prova testemunhal e por declarações de parte, que nos levaram a manter a convicção do Tribunal de que a intervenção de BB foi em nome e representação da Ré. Aliás até então a Autora apenas tinha tido contratos com a Ré, e nunca com BB a título individual ou com qualquer outra sociedade do mesmo. A Autora elaborou os estudos pondo o nome de cliente da Ré Multicines S.L. e nunca houve uma única chamada de atenção a dizer “Atenção que desta vez a cliente é outra sociedade”! O legal representante da Ré Multicines S.L. envia um email dizendo que o edifício Atlântida é onde se situam os nossos escritórios, quando os escritórios da Multicines são exactamente nesse local!
É obvio que o inconformismo da Ré relativamente a esta matéria de direito estava intimamente ligada à alteração da matéria de facto que não veio a ocorrer.
Portanto:
A vinculação contratual ocorreu – proposta e aceitação, com troca de correspondência quanto à obrigação de pagamento de honorários, estimativa de custos etc. – e estabeleceu-se entre a Autora e a Ré, enquanto pessoa colectiva, que se fez representar por um dos seus administradores solidários – BB – quer directamente, quer por interposta pessoa (o seu filho CC) que como resultou provado colaborava com o pai na gestão das sociedade de que o mesmo era administrador.
Quanto à intervenção de CC a manutenção do facto 31, nos mesmíssimos termos, no elenco dos factos provados acaba por prejudicar a análise da questão autonomamente, na medida em que valem aqui – mutatis mutandis – as considerações feitas em relação a BB.
b.1b) Da ausência de contrato
Mais uma vez se refira que o inconformismo com a apreciação jurídica da existência de um contrato e respectivo incumprimento contratual estava intimamente ligado e condicionado à alteração dos factos por força da respectiva impugnação e que, maioritariamente, soçobrou.
Continua a Ré batalhando-se pela ausência de qualquer documento e ausência de prova documental bastante que comprove a solicitação, adjudicação e aceitação de honorários.
Dispõe o art. 219.º do CC que A validade da declaração negocial não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei exigir.”
O contrato de Empreitada |Prestação de serviços está sujeito à regra da consensualidade ou da liberdade de forma (art.º 219º do Cód. Civil), por esta razão nada obriga a que haja um qualquer documento a formalizar a proposta, a adjudicação e a aceitação. Essa prova pode ser feita exclusivamente por prova testemunhal ou pode, como é o caso dos autos, resultar da conjugação - racional e dentro de parâmetros verosímeis e de normalidade – entre prova documental, prova testemunhal e por declarações de parte.
Este tribunal ad quem secundou a maioria dos factos e da convicção constante da decisão recorrida, pelo que a ausência de contrato como fundamento do inconformismo com a decisão jurídica fica praticamente destituída de substrato que lhe sirva de sustento: quer no que respeita à proposta dirigida à Autora, à sua aceitação por parte desta, à apresentação de honorários e à sua aceitação.
b.1.c) Desconsideração da Personalidade Jurídica
Mais uma vez se refira que a questão assim colocada nas conclusões eee) e ss. sempre partiria do pressuposto – inverificado – de se dar como não provado que quer BB quer CC actuaram em representação da Ré.
Ora não logrou a Ré apelante convencer o Tribunal na sua impugnação da matéria de facto relativamente aos factos 7, 9 e 31, que eram essencialmente os que relevavam para o efeito.
Ainda assim não se vislumbra como a Ré /recorrente convocaria tal instituto para os presentes autos. Afigura-se-nos que entende a Ré que o Tribunal, para proferir a decisão que proferiu, tinha de levantar a personalidade judiciária de BB sob pena de não poder condenar a sociedade(!?).
Parece ser isso que resulta da al. eee) das suas conclusões e das alegações de recurso: “Pelo que, não existindo qualquer prova de que BB – e muito menos CC - actuou em nome e representação da Ré Multicines, o Tribunal não podia, como o fez, presumir essa representação.
Sempre seria necessário recorrer ao instituto da desconsideração da personalidade jurídica, o que não fez, e que, como sabemos, só de forma absolutamente excepcional pode ser utilizado, perante uma situação de fraude e de abuso, que aqui tão-pouco teve lugar. “
E dizemos isto porque este instituto nasceu exactamente no polo inverso: desconsiderar a personalidade colectiva como forma de responsabilizar sócios ou accionistas, corrigindo comportamentos ilícitos e/ou fraudulentos.
Ou seja, normalmente com e3ste instituto pretende-se desconsiderar o benefício da responsabilidade limitada dos sócios nas sociedades de responsabilidade limitada ou desconsiderar a autonomia patrimonial correspondente à insensibilidade do património dos sócios às dividas sociais.
Ora, no presente caso é exactamente o inverso que sucede!
Estamos a responsabilizar contratualmente a Ré – sem nada desconsiderar – por se entender que foi a mesma quem contratou com a Autora directamente através do seu administrador ou indirectamente através deste (pela intervenção do colaborador do administrador em matérias de gestão).
Em suma, e face da improcedência maioritária da impugnação da matéria de facto e mantendo-se praticamente inalterada a factualidade provada (com excepção das referidas aqui) é de concluir que:
- está demonstrada a celebração de um contrato de prestação de serviços, na modalidade de empreitada de um projecto de arquitectura;
- está demonstrado que quem contratou esse serviço à Autora foi a Ré, sendo irrelevante que sejam entidades terceiras (que não a Ré) as proprietárias dos imóveis sobre os quais recaia o projecto) e sendo improcedente a invocação de falta de poderes de BB para sozinho, enquanto administrador, vincular a sociedade;
- está demonstrada a aceitação dos honorários;
- está demonstrado, e até mesmo admitido pela Ré, que não procedeu ao pagamento das facturas enviadas pela Autora.
Como se refere na sentença recorrida “Estabelece o artigo 798º do Código Civil, por seu turno, que «o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor». No artigo 799, n.º 1 consagra-se a regra geral da presunção de culpa no âmbito da responsabilidade contratual: «Incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua». Ora, foi essa prova que a Ré não logrou efectuar, sendo certo que era sobre si que recaía o ónus de demonstrar qualquer facto impeditivo, constitutivo ou modificativo da obrigação que para si emergia do contrato, designadamente, qualquer da factualidade alegada em sede de oposição que permitiria concluir no sentido em que os serviços prestados pela Autora teriam sido prestados de forma deficiente.
Nos presentes autos estamos perante uma obrigação pecuniária cujo prazo de pagamento ficou estabelecido. Trata-se de uma prestação que, ainda possível, não foi efectuada pela Ré no tempo devido e conforme o contratualmente fixado.
Nesta conformidade, verifica-se aqui uma situação de mora imputável à Ré (cfr. artigos 804º e 805º, n.º 1 e 2, a), do Código Civil), constituindo-se aquela na obrigação de reparar os danos causados à Autora em consequência da mesma. Como se trata de uma obrigação pecuniária, a indemnização corresponde aos juros a contar da constituição em mora – no caso, a citação para a presente acção, já que as facturas, pró-forma, não contêm data de vencimento nem a Autora peticionou diferentemente (artigo 609º, nº 1 do C.P.C.) –, sendo devidos os juros legais para os créditos comerciais, salvo se antes da mora for devido juro mais alto ou as partes tiverem convencionado um juro moratório diferente do legal (artigo 806º, do Código Civil). Deve, portanto, a Ré ser condenada no pagamento da quantia em dívida constante das facturas juntas aos autos, respeitantes aos serviços não pagos, e ainda, no pagamento dos juros de mora, à taxa legal devida para os créditos comerciais – cfr. artigos 559º do C. Civil e 102º, § 3 do C. Comercial, bem como as Portarias n.º n.ºs 597/2005, de 19.07, e 277/2013, de 26.08, desde a citação até efectivo e integral pagamento.”
b.2) Recurso Subordinado
b.2.a) Alteração da Quantificação da condenação
No que respeita ao recurso subordinado apresentado pela Autora /Apelante refere a mesma que:
“Como vimos acima, o Tribunal a quo na Sentença Recorrida considerou que o montante devido pela Ré à Autora é o valor constante das faturas pró-forma – cfr. Documentos n.ºs 17 a 21 da Petição Inicial –, ou seja, € 185.900,00.
Sendo que, o Tribunal a quo não considerou para efeitos de quantificação do referido valor o parecer constante do facto provado n.º 28 da Sentença Recorrida que considera um valor superior face aos trabalhos efetivamente realizados.
Sucede, porém, que como vimos, e ao contrário do que o Tribunal a quo considerou, existe muito mais prova para além do referido parecer no sentido de que os trabalhos efetivamente realizados são superiores ao valor constante das faturas pró-forma, que, no fundo, correspondem a apenas 10% do valor do total dos honorários para cada projeto.
E, portanto, em relação à quantificação da condenação, a Sentença Recorrida deverá ser alterada por existir quanto a esse um ponto um erro de julgamento, resultado da errada apreciação da prova produzida nos autos, seja ela testemunhal ou documental.
Sobre esta matéria da quantificação ficou provada a seguinte matéria de facto, já com as alterações e aditamentos acima requeridos aquando da impugnação da matéria de facto:
“21. Os elementos enviados (peças desenhadas e peças escritas) foram entregues com o detalhe correspondente a, pelo menos, um “Anteprojeto”, ainda que, em alguns casos, o trabalho entregue apresente uma definição e grau bastante superior.
21.a. O Anteprojeto corresponde a 25% do total de um projeto de arquitetura.
23.a. Em relação ao projeto “La Geria” o valor total do projeto é de € 56.700,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
23.b. Em relação ao projeto “Edifício Atlântida” o valor total do projeto é de € 970.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
23.c. Em relação ao projeto “Hotel Playa Blanca” o valor total do projeto é de € 737.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial.
24.a. Em relação ao projeto “Casa en Frente a La Iglesia” o valor total do projeto é de € 42.000,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.
24.b. Em relação ao projeto “Casa dos Calles” o valor total do projeto é de € 52.100,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial.
33. Os valores constantes das faturas pró-forma enviadas pela Autora à Ré não correspondem ao trabalho efetivamente realizado pela Autora nos projetos em causa nos presentes autos.
34. Os esquemas de faturação previstos nas propostas de honorários – Documentos n.ºs 13 e 22 da Petição Inicial – são indexados às várias fases dos projetos apenas para efeitos de fixação do momento temporal da faturação, não apresentando qualquer correspondência com os trabalhos que são efetivamente realizados em cada fase do projeto.”
Pelo exposto resulta que os serviços prestados, e sobre os quais a Ré não procedeu a qualquer pagamento à Autora, correspondem a, pelo menos, 25% do valor total dos trabalhos a prestar para cada projeto em causa nos presentes autos.
Assim, nesta sequência, é necessário aferir qual o valor de honorários que corresponde a prestação de serviços de 25% de cada projeto.
Em relação ao projeto “La Geria” o valor total do projeto é de € 56.700,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial e facto provado n.º 23.a. acima aditado – pelo que 25% do projecto corresponde ao montante de € 14.175,00.
Em relação ao projeto “Edifício Atlântida” o valor total do projeto é de € 970.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial e facto provado n.º 23.b. acima aditado – pelo que 25% do projeto corresponde ao montante de € 242.650,00.
Em relação ao projeto “Hotel Playa Blanca” o valor total do projeto é de € 737.600,00 – cfr. Documento n.º 22 da Petição Inicial e facto provado n.º 23.c. acima aditado – pelo que 25% do projeto corresponde ao montante de € 184.400,00.
Em relação ao projeto “Casa en Frente a La Iglesia” o valor total do projeto é de € 42.000,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial e facto provado n.º 24.a. acima aditado – pelo que 25% do projeto corresponde ao montante de € 10.500,00.
Em relação ao projeto “Casa dos Calles” o valor total do projeto é de € 52.100,00 – cfr. Documento n.º 13 da Petição Inicial e facto provado n.º 24.b. acima aditado – pelo que 25% do projeto corresponde ao montante de € 13.025,00.
Totalizando o valor de 25% referente ao total dos projetos em causa nos presentes autos, o valor de € 464.750,00.
Ora, tal valor é superior ao pedido constante da Petição Inicial, que foi de € 461.691,75, discriminado conforme o constante no artigo 56.º da Petição Inicial.
Contudo, da prova produzida nos presentes autos, resultou que o nível dos serviços efetivamente prestados foi de, pelo menos, 25% do valor total de cada projeto, ou seja, ligeiramente superior ao peticionado.
Logo, e devido às limitações constantes dos artigos 3.º, n.º 1 e 609.º do CPC, o valor que a Ré deverá se condenada é de € 461.691,75.
Deverá, assim, a Sentença Recorrida ser substituída por outra que condene totalmente a Ré, em concreto no pagamento desta à Autora no montante de € 461.697,75.”
Poderíamos dizer que as pretensões da Autora em alterar e ampliar matéria de facto - na qual faz assentar o sei pedido de reapreciação do montante em que a Ré foi condenada – foi maioritariamente gorada.
Tal circunstância, por si só, era suficiente para julgar improcedente o recurso subordinado.
Não obstante entendemos adequado deixar aqui umas breves considerações, na linha do que fomos referindo supra.
Os presentes autos têm como causa de pedir um incumprimento contratual. O tribunal entendeu que a Ré estava em mora no cumprimento da sua prestação. E qual era essa prestação? O pagamento contra a apresentação do Anteprojecto dos referidos 10% do valor do projecto. Esta era a obrigação da Ré à luz do acordado.
Não era obrigação da Ré – à luz do contrato – o pagamento de todo o trabalho desenvolvido até ao momento.
Se essa não era obrigação da Ré jamais se poderia considerar que o incumprimento abrangeria todo o excedente do valor que resultasse da diferença entre a percentagem do trabalho efectivamente desenvolvido e os 10% que foram facturados.
Em algum momento a Ré passou a ser responsável pelo pagamento de todo o trabalho efectivamente realizado pela Autora e que pudesse justificar a condenação da mesma na percentagem peticionada dos 25%?
Afigura-se-nos que não.
Enquanto o contrato não se resolver – e nada nos autos nos diz que as partes resolveram ou denunciaram o contrato – com a apresentação do Anteprojecto a obrigação da Ré é apenas e tão só o pagamento das quantias facturadas nas facturas referidas em 20.
Se a causa de pedir é o incumprimento contratual e o acordado ao abrigo desse contrato era o pagamento de 10% contra a entrega do anteprojecto, então inexiste qualquer causa de pedir que fundamente, legitime ou dê corpo – ainda que se provassem os factos que a Autora pretendia aditar - à pretensão da Autora de ver a Ré condenada na percentagem correspondente à totalidade dos trabalhos efectivamente realizados pela Autora.
Improcede, por isso, o recurso subordinado.
*
V. Decisão:
Por todo o exposto acordam os juízes desta Relação de Lisboa em:
- julgar improcedentes, por não provados, os recursos interpostos pela Apelante /Ré Multicines S.L (recurso independente) e pela Autora AA-arquitectos, Lda.. (recurso subordinado), mantendo nos seus precisos termos a decisão recorrida.
Custas por ambos os apelantes.
Notifique e Registe.
*
Lisboa, de 23 de Outubro de 2025
Maria Teresa Mascarenhas Garcia
Anabela Calafate
Elsa Melo
_______________________________________________________
1. Redacção alterada no ponto III.a.2) Exclusão do facto 3.
A redacção original era: “3. Em 2017, a Autora recebeu um convite de BB, para a elaboração de um conjunto de 5 projectos de arquitectura a desenvolver na ilha de Lanzarote (arquipélago das Canárias). “
2. Alterado em a.11)
Era a seguinte a versão primitiva do facto 20:
20. Uma vez concluídos os trabalhos solicitados, a Autora, em 30 de Julho de 2020, enviou à Ré, por via postal e por correio electrónico, os Anteprojectos dos 5 projectos identificados anteriormente, acompanhados das respectivas facturas pró-forma (cf. docs. 17 a 21):
i. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Hotel Playa Blanca”, no valor de € 73.760,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
ii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto do “Edifício Atlântida”, no valor de € 97.060,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
iii. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Quinta La Geria”, no valor de € 5.670,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
iv. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa dos Calles”, no valor de € 5.210,00, correspondente a 10% do valor total do projecto;
v. Factura pró-forma referente ao Anteprojecto da “Casa frente a la Iglesia”, no valor de € 4.200,00, correspondente a 10% do valor total do projecto.
3. Alterado em a.15)
A redacção original era: 27. Em Janeiro de 2021, a Autora endereçou à Ré uma comunicação interpelando-a para a liquidação da quantia correspondente ao preço dos serviços prestados, no montante total de € 185.900,00 – cf. doc. 45.
4. Eliminado no ponto a.10)
Era o seguinte o seu teor: Que a Ré em nenhum momento solicitou à Autora a elaboração de qualquer projecto de arquitectura referente aos imóveis supra identificados (artigo 40º da contestação);