Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA | ||
Descritores: | CONTRATO DE MEDIAÇÃO REMUNERAÇÃO PRESSUPOSTOS ÓNUS DA PROVA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/24/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | Para os efeitos do disposto no nº 2 do Artigo 19º da Lei nº 15/2013, de 8.2., incumbe à empresa mediadora alegar e provar que angariou um interessado e que este estava pronto a celebrar o contrato visado, isto é, cabe à mediadora demonstrar que o interessado angariado dispunha de fundos financeiros imediatos que o habilitassem a pagar o preço ou, em alternativa, que disporia dos mesmos aquando da projetada celebração da compra e venda. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO AB – Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda. intentou ação contra CD pedindo a condenação da R. no pagamento da quantia global de €9.382,41, relativa a capital, juros de mora e taxa de justiça. Para tanto, alegou que se dedica à atividade da mediação imobiliária e, no âmbito daquela sua atividade, a R. procurou os seus serviços, tendo as partes celebrado contrato de mediação em regime de exclusividade, obrigando-se a angariar comprador para o imóvel da R. pelo preço de €149.000,00. No exercício daquela sua atividade, logrou angariar proponente, logo em 06/06/2020, tendo apresentado junto da R. a correspetiva proposta de aquisição formulada por aquele, proposta esta que igualou e satisfez as condições de venda (designadamente, tendo atingido o preço anunciado) pretendidas pela R. e, depois de ser confrontada com tal proposta, a R. informou (em 10/06/2020) que já não pretendia prosseguir com o negócio de venda, alegando razões pessoais que não concretizou. Mais refere que a ideia comunicada à A. pela R. sobre a desistência superveniente da intenção de venda do imóvel não se veio a revelar verdadeira, pois algum tempo volvido, o seu imóvel voltou a ser posto à venda noutra empresa de mediação imobiliária. Refere ainda que cumpriu com a totalidade das obrigações contratuais que lhe estavam impostas, tendo angariado um comprador para o imóvel, assim realizando com sucesso o seu objetivo, através da apresentação de proposta que satisfez integralmente as condições de venda. Pelo que, nos termos do n.º 2 do artigo 19º da Lei nº 15/2013, de 08 de fevereiro, lhe assiste o direito a receber a sua remuneração (no valor de 5% do negócio, acrescido do IVA à taxa legal aplicável à data, num total de €8.791,00), e tendo interpelado a R. para proceder ao pagamento não obteve qualquer resposta. A Ré contestou, invocando a ineptidão da petição inicial por falta de causa de pedir, pois alega que a A. não concretizou os termos exatos da proposta apresentada à R., nem em que data a mesma foi apresentada à R.. Mais invocou a inexistência de obrigação do pagamento do valor peticionado, e que no dia 10/06/2020 informou a A. que tinha decidido manter o imóvel e à data não tinha conhecimento de qualquer proposta para aquisição do imóvel, e que podia revogar o contrato unilateralmente. Só voltou a colocar o imóvel à venda em fevereiro de 2021, ou seja, já depois de decorrido o prazo de 6 meses estipulado no contrato, pugnando pela improcedência da ação. A A. exerceu o direito ao contraditório quanto à exceção invocada, pugnando pela sua improcedência. Após julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente, absolvendo a ré do pedido. * Não se conformando com a decisão, dela apelou a requerente, formulando, no final das suas alegações, as seguintes CONCLUSÕES: « A. O presente recurso é interposto da douta Sentença proferida em 23.05.2023, a qual julgou a presente ação totalmente improcedente, entendendo não haver direito da Autora a perceber a sua remuneração, não obstante ter diligenciado e almejado a angariação de um interessado e proponente na aquisição do imóvel que constituía propriedade da Ré, igualando o preço de venda por aquela pretendido, e fixado em contrato de mediação imobiliária, por seu turno celebrado em regime de exclusividade. B. Ora, salvo o devido respeito pelo entendimento espelhado na sentença em crise, certo é que a Recorrente não se pode conformar com tal sufrágio e entende que a decisão em apreço incorreu em erro de julgamento e concomitante violação de lei, máxime, do disposto no n.º 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 08 de fevereiro. C. Com efeito, entende modestamente a Recorrente que houve uma errada apreciação e análise dos factos principais e instrumentais trazidos à liça, designadamente: - Que a Ré (não) soube do conteúdo da proposta antes de «desistir» do negócio de venda do seu imóvel; - Que a Ré havia aceitado, por telefone, a referida proposta em 06.06.2020, estando até disposta a aliená-lo com a mobília incluída, facto demonstrativo que já havia aceitado o negócio transmissivo; D. Pelo contrário, resultou evidente da audiência de discussão e julgamento, a total falta de credibilidade das declarações da Ré (que aqui e ali o Tribunal a quo também notou e fez a devida menção), desde logo, porquanto a Ré não foi honesta quanto ao número de vezes que a colaboradora da mediadora imobiliária PL se deslocou ao seu imóvel, depois a Ré voltou a mentir ao tribunal quando afirmou solenemente em julgamento que a Autora nunca a havia contactado telefonicamente, designadamente para efeitos de apresentação e reporte da dita proposta, quando resultou indiscutível (da prova documental junta em audiência - cf. Doc. n.º 5 - conversação telefónica em 06.06.2020, pelas 19h40m13s, com duração exata de 9m00s) que aquele telefonema existiu efetivamente, embora aqui o Tribunal não fazendo uma acertada interpretação do seu conteúdo, tendo voltado a mentir quando negou ter sido confrontada com a proposta, por escrito, na reunião realizada no estabelecimento comercial da Autora. E. Além de que a Ré nunca mostrou qualquer coerência e credibilidade na explicação da dinâmica de execução do contrato, pois começou por afirmar que não pretendia vender o seu imóvel, mas que apenas almejava uma sua avaliação, para logo a seguir assumir que havia efetivamente assinado um contrato de mediação imobiliária destinado à venda daquele imóvel por um preço (€149.000,00) que ela fixou como mínimo (cf. Doc. n.º 8). F. De igual sorte, é bem patente a falta total de consistência do seu comportamento e atitude contratual, revelando uma indisfarçável má-fé no decurso de todo o período de execução do contrato, G. Dado que inicialmente (mas obviamente já depois de saber da proposta concreta de aquisição do seu imóvel, por via telefónica, em 06.06.2020) alegou que já não pretendia a venda por razões económicas (mas curiosamente veio a vender tal imóvel por um preço inferior através de outra mediadora imobiliária), H. Depois, já alegando razões de saúde que lhe impediam de tomar tal decisão, mas conforme também resultou demonstrado, de modo inequívoco, pouco tempo volvido após a cessação do contrato de mediação imobiliária celebrado com a Autora, em regime de exclusividade (termo do contrato - 29.11.2020), a Ré logo tratou de promover a venda desse mesmo imóvel, como se afinal as supostas razões graves de saúde se tivessem rapidamente dissipado, I. Com o devido respeito, o Tribunal errou, desde logo, ao desconsiderar vários factos principais e instrumentais (que resultaram flagrantemente evidentes da instrução do processo), como seja a circunstância indesmentível de que a Ré, antes de «desistir» do negócio, já sabia perfeitamente da proposta concreta de compra do seu imóvel (identidade do proponente, preço oferecido - a igualar o pretendido, e demais condições principais, tendo ainda sido informada que se tratava de comprador devidamente qualificado e já tendo pago, inclusivamente, um montante a título de caução/reserva contratual). J. E note-se que, tanto quanto se alcança da douta Sentença, o não reconhecimento do direito da Autora à sua remuneração apenas advém do facto de o tribunal ter considerado que a Ré «desistiu» do negócio antes de saber da dita proposta de compra, o que não é verdade, K. Tendo ainda, ao que nos parece, o tribunal julgado necessário e imprescindível para fazer atuar o n.º 2 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013 que a Ré também tivesse que ter assinado (antes) a proposta contratual do proponente, o que não é uma exigência da lei, L. O que obviamente constitui um erro na aplicação do Direito, dado que a lei não exige para a formação da culpa do cliente (pressuposto do direito à remuneração no caso de não conclusão do negócio) que ele tenha forçosamente de ter antes assinado qualquer documento, M. Dado que releva antes que o mesmo, por ação sua, tenha boicotado ou frustrado a referida venda, nos moldes contratualizados, o que efetivamente veio a acontecer; N. A Ré logo impediu que a venda ocorresse e durante todo o período de execução do contrato de mediação imobiliária (até 29.11.2020), além de que (é bom não olvidar), a Ré havia aceitado em 06.06.2020 tal proposta comunicada por telefone (aliás, era uma proposta que igualava o preço por si pretendido e com um prazo normal/standard de outorga do contrato promessa, pelo que se ajustava automaticamente às condições exigidas por si - em rigor nem haveria, pois, razões de discordância ou de não aceitação). O. E a prova da culpa do cliente, pressuposto legal do direito à remuneração da Autora, vem a ser o facto de aquela ter, logo a partir de 10.06.2020 doravante impedido a Autora de prosseguir com a sua atividade contratada (em regime de exclusividade), pois se pretendia um preço superior, porque não indicou à Autora um novo preço?! P. Não permitindo mais visitas ao seu imóvel, e comunicando que não faria a venda, por razões económicas - primeiro, e por razões imperiosas de saúde, num segundo momento [e mesmo estas, quer umas, quer outras, rapidamente se revelaram não corresponder, de todo, à verdade] - assim obliterando e impossibilitando que a Autora prosseguisse, do seu lado, com a execução do contrato, Q. E ao contrário do preconizado na douta Sentença, nem se diga que o cliente pode livremente «desistir» do negócio, revogando-o unilateralmente sem qualquer lógica ou motivo de força maior e objetivamente justificável, R. Pois então o contrato de mediação imobiliária, celebrado em exclusividade, nenhuma garantia remuneratória assegurava para a Autora (e restante universo de empresas que operam neste setor), o que é deveras injusto e desleal, configurando-se, a defesa de tal posição, a ratificação judicial de um clamoroso abuso do direito por parte do cliente - entendimento e sufrágio que se reputa de intolerável e não aceitável - cf. artigo 334.º do CC. S. Abuso do direito mais nítido e severo quando antes desse alegado exercício de faculdade até já a mediadora imobiliária havia angariado o proponente e dado conhecimento da proposta contratual de compra do imóvel, igualando precisamente as condições exigidas pelo cliente, pelo que apenas por culpa deste ocorre a violação do contrato, uma vez que a Autora já havia cumprido finalisticamente com a sua obrigação de meios, nada mais dependendo da sua vontade ou concurso de ação. T. E se, obviamente, o cliente - proprietário do imóvel, é soberano quanto à decisão de (não) vender, o mesmo já não se passa no plano do sinalagma contratual, dado que está adstrito a certas obrigações e deveres, e um deles primacial consiste no ónus de remunerar a mediadora, contratada no regime de exclusividade, se esta angariou proponente concreto e o negócio só não se veio a concretizar por força da atuação do cliente (que foi o caso dos autos). U. A Recorrente dissente do julgamento da matéria de facto, entendendo que merece censura quanto tal juízo quanto à factualidade assente no ponto 6, a qual se mostra parcial e incompleta, pois (e tal resulta inequívoco do Doc. n.º 4) devia, porque relevante para a sorte do litígio, ter também dado como provado [factos 6A e 6B) que o proponente subscreveu e assinou uma proposta contratual e pagou o montante da caução/reserva, em 06.06.2020, V. Proponente esse que havia sido aquele que realizou a visita ao imóvel em 05.06.2020 (cf. Doc. n.º 3 e tal facto é igualmente decisivo para se compreender que o proponente era sério e qualificado, com pleno conhecimento do imóvel. W. Da mesma forma, o Tribunal só podia ter dado como provado que a Ré soube do conteúdo integral da proposta aquando do telefonema, em 06.06.2020 - e o Tribunal ignora a data da conferência telefónica, não lhe fazendo menção alguma - cf. Doc. n.º 5 (vide facto assente 7 que apenas parcialmente reproduz, com fidelidade a factualidade ocorrida) e que a Ré a aceitou (naturalmente de forma verbal), nessa mesma data, até se disponibilizando para vender o seu imóvel com as mobílias. X. E com tal alteração à matéria de facto (conhecimento pela Ré da proposta de compra, em 06.06.2020. e sua aceitação), fica totalmente destituído e desprovido de fundamento e sentido o raciocínio da Sentença que considera legítima a «desistência» porquanto feita pelo cliente antes do conhecimento da proposta) - até porque a lei não exige que o conhecimento da proposta tenha que ser feito necessariamente pela via escrita. Y. E neste sentido a Sentença até padece de nulidade, nos termos do consignado na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, que ora se invoca para os devidos efeitos legais, dado que, se julga provado que uma proposta foi comunicada à Ré, embora esta nunca a tenha assinado, e insere cronologicamente tal factualidade antes da comunicação escrita da Ré para a Autora de 10.06.2020 (facto provado n.º 9), como pode depois decidir que a «desistência» foi válida e inconsequente (quanto à quebra culposa do contrato de mediação imobiliária) porque anterior à comunicação da proposta?! Z. Ou houve comunicação da proposta antes da «desistência» ou não houve comunicação da proposta antes da desistência formulada pela Ré em 10.06.2020, mas se o Tribunal a dá como provada (a comunicação da Autora sobre a dita proposta, por telefonema - e o Doc. n.º 5 não deixa margem para dúvidas sobre a data de tal telefonema) como pode o tribunal decidir depois que a Ré desistiu sem saber dessa proposta (que foi comunicada antes)! AA. É normal na verdade que a Autora informe (tem todo o interesse nisso) imediatamente o seu cliente (a Ré), tendo escolhido fazê-lo através de um meio comunicacional mais direto e personalizado (telefonema), de que conseguiu angariar um proponente, comunicando-lhe naturalmente o preço proposto por este (no caso, o preço pretendido de venda) a sua identidade (sendo que foi a pessoa que de véspera realizou a visita ao imóvel), etc. BB. Tendo sido este o procedimento usado, conforme é da praxis, sempre movida pela boa-fé contratual, é igualmente consentâneo com a experiência comum, que a Autora tenha, depois de comunicado a proposta verbalmente, e a cliente a ter aceitado (por corresponder ao negócio contratualizado), informado a cliente de que seria necessária a sua presença no estabelecimento comercial para aceitar (igualmente), por escrito, tal proposta contratual. CC. Como está ainda perfeitamente alinhado com lógica e a natureza das coisas, e corresponde fielmente ao que se passou, a Ré não se ter apresentado no estabelecimento comercial e ter, pouco tempo depois, redigido a comunicação de 10.06.2020 a alegar que já não pretendia o negócio (ora, não pretendia porque antes foi informada que o negócio estava «realizado». DD. De que outra forma compreender e assimilar o alcance da comunicação da Ré (cf. Doc. n.º 6) de 10.06.2020, e interpretar corretamente o seu conteúdo, quando afinal esta se lamenta pelo preço de venda - pouca margem de lucro "(...) só tenho a perder com a venda da mesma" - afirmou nesse email (preço fixado pouco tempo antes - em 29.05.2020, aquando da outorga do contrato de mediação imobiliária), se não tivesse antes sido informada que se angariou proponente para aquele preço e que, portanto, o negócio se iria concretizar, naqueles termos?! EE. Ora, mesmo acreditando na tese do tribunal a quo, então teria sido um milagre de coincidência logo em 10.06.2020 a Ré ter «desistido» do negócio sem saber de proposta de compra alguma, mas e simultaneamente como compatibilizar tal asserção com a comunicação, por telefone, da proposta, o que ocorreu em 06.06.2020! Trata-se assim de um caso de nulidade de sentença, por contradição ou obscuridade entre os fundamentos e a decisão, que ora se invoca para todos os devidos efeitos legais. FF. No mesmo sentido insurge-se a Recorrente contra o facto provado 14, quando ali se pretende inculcar como factualidade provada a circunstância de a Ré não ter sido (antes de 10.06.2020) informada (foi dito por telefone) do conteúdo da dita proposta de compra do seu imóvel, facto que até está em contradição com o facto provado n.º 7 e n.º 8, e que assim não se pode manter na matéria dada como assente - já que ambos têm pressuposto que a proposta era do conhecimento prévio da Ré. GG. Portanto, em face da presente impugnação da matéria de facto, resulta evidente para a Autora que o Tribunal a quo devia ter proferido a seguinte decisão sobre estas questões controvertidas, tendo julgado assente a seguinte factualidade, a qual deve ser aditada ao rol de factos provados: - Que o proponente subscreveu efetivamente uma proposta de compra do referido imóvel, pelo preço anunciado de €149.000,00, que assinou em 06.06.2020, tendo pago inclusivamente o valor de €2.500,00, nesse mesmo dia, por transferência bancária, para efeitos de caução/reserva, sendo este proponente a pessoa que realizou de véspera a visita ao imóvel (além do Doc. n.º 4, não impugnado); - Que pelo telefonema, datado de 06.06.2020 a colaboradora da Autora informou a Ré da proposta de compra, identidade do comprador, etc., tendo esta ficado ciente das condições essenciais do negócio, e - Que a Ré aceitou tal proposta (que aliás igualava as condições por si pretendidas - motivo de satisfação que demonstrou), afirmando que a casa estava quase vendida, até se mostrando disponível para vender o imóvel com as mobílias incluídas, e só então (depois) desistiu do negócio, por razões meramente económicas (não gerava o lucro suficiente). HH. E além de tal factualidade principal, o Tribunal também não poderia ter deixado de dar como provado, a título instrumental, que o proponente concretamente angariado pela Autora, no decurso do cumprimento das suas obrigações contratuais de prestação de serviços de mediação imobiliária, estava devidamente qualificado e apto a prosseguir com o negócio, que foi exclusivamente frustrado pela Ré. II. Com efeito, também tal facto devia ter integrado a factualidade assente: - O Proponente angariado pela Autora estava em condições financeiras de prosseguir com o negócio de aquisição do imóvel, E para tal, mostra-se sólido, credível e coerente o depoimento das seguintes testemunhas, às quais genericamente o Tribunal atribuiu confiança e seriedade (com a notória exclusão, ao menos parcial, das declarações da própria Ré), JJ. Tendo a Autora provado toda a meticulosa metodologia que emprega no procedimento de mediação (por entre departamentos comercial, processual e financeiro - intermediação de crédito) com que angaria e avalia a seriedade da intenção de compra de um interessado. KK. Da mesma forma, dado tratar-se de um facto primacial para a sorte do litígio, e resultou abundantemente evidenciado no julgamento realizado, tendo inclusivamente sido confessado pela Ré, devia o Tribunal a quo ter dado com provado o seguinte facto: - Logo em 10.06.2020, a Ré impossibilitou a Autora de doravante executar o contrato de mediação imobiliária, ao exigir-lhe a devolução imediata das chaves do imóvel, impedindo e inutilizando os seus serviços, não obstante a própria admitir a vigência do mesmo até 29.11.2020. LL. Por fim, e quanto à factualidade que o Tribunal deu como provada não pode deixar de merecer ainda censura a circunstância de o julgador não ter tomado em devida consideração que os argumentos invocados pela Ré para «desistir» do negócio (razões económicas e depois razões de saúde) não se revelaram, conforme a evolução factual atesta (cf. factos provados n.ºs 17 e 18) verdadeiros e honestos, tendo o imóvel sido (muito pouco tempo após a cessação do contrato de mediação imobiliária - 29.11.2020) sido promovido por outra mediadora e logo depois alienado (até por preço inferior - quando a evolução de mercado era favorável). MM. Em consequência de tal factualidade, não pode o Direito deixar de lhe ser permeável e côngruo, pelo que nunca o Tribunal poderia ter julgado (na subsunção jurídica) não culposo o incumprimento manifestamente imputável à Ré, na violação do contrato de mediação imobiliária, e de boa-fé, celebrado com a Autora (que nele legitimamente confiou). NN. Aliás, ficou nítido que a Ré desistiu do negócio apenas porque depois de saber da proposta, terá então refletido sobre ela com familiares, e entendido que não teria afinal o lucro que pretendia, e por isso desistiu da venda- mas depois, conforme é sabido, foi contraditoriamente vender o imóvel por preço inferior (ainda que a remuneração daquela mediadora fosse - e é, menor). OO. A douta Sentença preconiza o seguinte entendimento: "O contrato de mediação trata-se de um contrato de prestação de serviços, pelo que para que o mediador cumpra a sua prestação contratual não é suficiente que desenvolva determinada atividade, mas, que através dela proporcione à outra parte um determinado resultado (artigo 1154º do Código Civil). O resultado a que o mediador imobiliário se obriga é a concretização de um determinado negócio entre o proprietário do imóvel e o terceiro interessado". Ora, a primeira falácia do raciocínio da decisão em crise vem a ser o facto do Tribunal colocar sob a Autora uma responsabilidade pela conclusão do negócio (ou obrigação de resultado), PP. Quando a jurisprudência é firme e unânime em que a sua prestação de serviços configura uma mera obrigação de meios - com efeito, em caso algum a vontade e energia da mediadora se sobrepõe à das partes, ou depende, ao menos exclusivamente dela, ou principalmente dela, a conclusão do negócio, que está inextricavelmente dependente, claro está, das próprias partes. QQ. Ora, mesmo com apelo a este raciocínio, e em face dos factos provados, não se pode afirmar, de modo algum, que a Ré pôs termo ao contrato, desistindo do negócio (depois de já ter tido conhecimento da referida proposta que igualava o preço por si estabelecido) por qualquer motivo de força maior e/ou estranho à sua vontade. RR. Na verdade, a Ré foi clara, e confessou-o abertamente, desistiu do negócio porque achou que a venda lhe daria [afinal] pouco lucro (isto mesmo a despeito de toda a contraditoriedade do seu comportamento posterior - com venda a realizar-se a preço inferior); SS. Ou seja, e o Tribunal não tem como fugir ou escapar do fundamento real e objetivo que presidiu à desistência do negócio (alegada ponderação sobre melhor preço possível), mas se assim irretorquivelmente foi, então é inequivocamente de julgar como culposo o incumprimento imputável à Ré, TT. Sob pena de ser lícito ao cliente-proprietário, para mais depois de saber que existe uma proposta angariada pela mediadora, fugir às suas responsabilidades, de forma livre e descomprometida, frustrando totalmente o direito à remuneração da contraparte que estava dependente unicamente de um facto que efetivamente proporcionou - a angariação de um proponente com capacidade de realização do negócio. UU. E toda a postura da Ré, a partir de 10.06.2020 (não obstante o contrato estar plenamente em vigor até 29.11.2020, pelo que sempre soube da referida proposta, independentemente de até ter sido em 06.06.2020 ou depois), foi de uma atuação movida pela má-fé, de molde a doravante impossibilitar o cumprimento e execução do contrato pela Autora, frustrando definitivamente o seu direito remuneratório (pedindo a devolução imediata das chaves). VV. Ora, tendo o contrato sido celebrado em regime de exclusividade, o artigo 19.º, n.º 2, da referida Lei, não consente outra interpretação que não seja a salvaguarda do direito remuneratório da mediadora quando o negócio não se concretize por vontade/razão imputável ao cliente, WW. Que foi manifestamente o caso, nada distinguindo o legislador sobre o momento em que o cliente desiste ou afasta a possibilidade de realização do negócio (até antes ou depois de saber de uma proposta concretizada de compra), conquanto o seu motivo não deixe de lhe ser censurável (o tal pressuposto juízo de culpa). XX. Aqui chegados, apenas podemos inferir que tendo a Ré alterado a sua posição quanto ao preço de venda, conhecida a proposta angariada pela Autora, desistindo definitivamente da venda, e impossibilitando a parte contrária de executar doravante o contrato, indo depois recrutar os serviços de outra mediadora e concretizar a venda desse mesmo imóvel por seu intermédio, não pode deixar de estar subjacente um juízo jurídico de culpa normativa, o qual é pressuposto do tal direito remuneratório, até pela violação das regras da boa-fé e do abuso do direito. YY. E depois a Sentença, sempre com o devido respeito e vénia, apenas confere, mas ilegitimamente, credibilidade à proposta se apresentada unicamente por escrito, quando nada na lei exige tal solenidade ou formalismo ad substanciam, a qual foi recusada pela Ré, mas só depois de lhe ter sido verbalmente apresentada a mesmíssima proposta (só há uma proposta), e que esta aceitou, mostrando satisfação na venda. ZZ. Ora, nem a lei distingue ou exige a forma como deve ser comunicada a proposta de compra, como sobretudo não se antolha razoável a exigência erigida pela Sentença na única forma de comunicação de uma proposta contratual - se foi identificado o proponente (pessoa que fez a visita ao imóvel na véspera), se foi identificado o preço de compra, que mais condições seriam licitamente exigidas pela cliente para poder formar a sua vontade? Sendo que as restantes condições eram as normais - contrato promessa a celebrar no prazo de 20 dias (cf. ponto 12 do Doc. n.º 4). AAA. Por outro lado, a Sentença envida por um raciocínio, sempre com o devido respeito, enviesado, porque parte do princípio (especulação) que só a proposta apresentada pela via escrita é séria e credível, e já não a [mesma] proposta apresentada pela via verbal, e sobretudo confunde os factos, decidindo ao contrário do que antes havia julgado como provado. BBB. Além de que, e isso é que releva, a proposta que foi verbalmente apresentada/comunicada, primitivamente, existia ou não existia, na sua forma escrita? Ou seja, aquela comunicação tinha ou não tinha uma proposta escrita e já assinada subjacente? CCC. A resposta só pode ser uma e o Tribunal conhece-a. DDD. A proposta foi inicialmente comunicada em 06.06.2020, verbalmente (por telefone), cerca das 19h40m13s (cf. Doc. n.º 5), porque se pretendia, desde logo (como é lógico), comunicar à cliente o sucesso do trabalho feito, e porque essa mesma proposta de compra já existia (houve a preocupação de estar formalmente salvaguardada tal situação), na sua forma escrita, conforme prova o Doc. n.º 4 e comprovativo de transferência contemporaneamente realizados (documentos não impugnados). EEE. Logo, e sempre com a devida ressalva e vénia, se o Tribunal exige que a proposta seja apresentada por escrito (foi verbalmente comunicada no sábado 06.06.2020), e pedido à cliente para se dirigir ao estabelecimento para esta ser confrontada com o documento assinado (dita proposta formal), esta responde afirmativamente, mas depois de alterar o seu pensamento sobre a venda, já não comparece mais [antes de desistir do negócio], naturalmente que apenas por culpa da Ré não tomou esta conhecimento da dita proposta previamente - designadamente, na segunda-feira 08.06.2020. FFF. Ou seja, é a Ré quem, com má-fé, não quis conhecer antes (logo em 08.06.2020) a existência da proposta escrita, tal como lhe foi comunicado no sábado (06.06.2020), pelo que o Tribunal aproveitar tal situação para não reconhecer o direito da Autora é afinal beneficiar a infratora, e ir contra os factos provados n.ºs 6, 7 e 8, articuladamente considerados. GGG. Se a proposta foi assinada em 06.06.2020 e pago o valor da caução/reserva nessa data, não tendo sido tais documentos impugnados, como pode pretender-se defender que não foi por culpa da Ré que esta não tomou conhecimento da proposta escrita - aliás, e facto deveras importante, a Ré até nega que lhe tenha sido alguma vez apresentada a proposta escrita- facto falso e inverosímil. HHH. E tal como entende a nossa jurisprudência, essa «desistência» do negócio, em contrato celebrado no regime de exclusividade não pode ser livre ou discricionária, sendo que nenhum motivo de força maior existiu (nem a Sentença recorrida sequer o mencionou): III. E sendo manifesto que a não conclusão do negócio se deveu à Ré, o direito à remuneração da Autora tem de ser necessariamente deferido, sob pena de total arbitrariedade e das disposições contratuais em nada protegerem o trabalho da mediadora e se fazer tabula rasa do contrato. JJJ. Ora, no caso dos autos é notório que o negócio não se concretizou por razões puramente imputáveis à Ré, que por se arrepender do valor de venda (não obstante ter vindo a vender por menos, pouco tempo volvido), frustrou, impossibilitando, o negócio imobiliário. KKK. Ao decidir como o fez, a sentença violou, inter alia, o disposto nos artigos 334.º, 406.º, n.º 1, 762.º, n.º 2, todos do CC, e artigo 19.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2013, de 08 de fevereiro, razão pela qual não se pode manter na ordem jurídica, devendo nessa medida ser revogada, e substituída por outra decisão que condene a Ré no pagamento dos pedidos formulados, o que expressamente se requer. Nestes termos e nos melhores de Direito aplicáveis, sempre com o mui douto amparo de V. Exas., requer-se a revogação da douta sentença recorrida, reconhecendo-se e declarando-se a sua nulidade, e em qualquer caso, determinando-se a peticionada alteração da decisão sobre a matéria de facto, nos termos acima propugnados e pelos fundamentos ex ante expostos, substituindo-se por outra que julgue inteiramente procedente a presente ação, com todas as legais consequências, com o que se fará a devida e costumeira JUSTIÇA!» * Contra-alegou a apelada, formulando as seguintes conclusões: A) A Apelante nas suas alegações não identifica claramente o que é impugnação da decisão relativa à matéria de facto e o que é impugnação da decisão relativa à matéria de direito, não se vislumbrando que a Apelante refira os concretos meios probatórios que constam do processo e que impõem decisão diferente com referência a cada um dos factos que pretende ver alterados, apenas invocando os depoimentos das testemunhas que transcreve sem especificar a propósito de cada um, em que medida impunham uma resposta diferente da que foi dada pelo tribunal “a quo”, cumprindo a Apelante, de uma forma débil, os requisitos consagrados nos artigos 639º e 640º do Código do Processo Civil, o que constitui um óbvio obstáculo ao exercício esclarecido do seu direito de resposta da Apelada. B) A Douta Sentença proferida nos autos não padece, ao contrário do invocado pela Apelante de qualquer nulidade, nem incorreu em erro de julgamento, nem viola a Lei, nomeadamente o disposto do n.º 2 do artigo 19.º, da Lei 15/2013 de 08 de Fevereiro. C) O Tribunal a quo julgou a presente questão, formando a sua convicção com base na análise da prova produzida em julgamento e na ponderação daí advinda, à luz das regras do senso comum e da experiência, tendo ainda recorrido ao raciocínio permitido pela utilização das presunções judiciais relacionado com a restante prova produzida conforme estatui o artigo 351º, do Código Civil. D) De acordo com o arrazoado da Apelante, a existência de um telefonema, entre as partes era suficiente para gerar a obrigação do pagamento da remuneração devida nos termos do n.º 2, do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013 de 08 de Fevereiro, contudo a experiência e bom senso dizem obviamente o contrário. E) E neste ponto a Douta Sentença explana, na sua página 15, de forma clara e inequívoca, que é necessário um “conhecimento, por escrito da proposta de compra subscrita pelo interessado na compra, pois só assim fica demonstrado perante o cliente a vontade séria e real do terceiro na aquisição do imóvel.” F) A Apelante nunca apresentou à Apelada, em suporte duradouro, a existência de um verdadeiro interessado, prévia ou posteriormente à denúncia do contrato efetuado por esta desta última, sendo manifestamente insuficiente, conforme consta da Douta Sentença recorrida, a realização de um eventual telefonema, para originar a obrigação de renumeração. G) A Apelante não efetuou qualquer comunicação por escrito porquanto à data não era ainda certo que o potencial interessado reunisse todas as condições, o que se refletiu nos presentes autos não logrando a Apelante provar que o potencial interessado cumpria todas os requisitos para ser considerado um verdadeiro interessado. H) Porquanto conforme consta do referido documento 4 junto pela Apelante na audiência de discussão e julgamento denominado “Pedido de reserva e proposta contratual”, no ponto 5, que a Apelante procede à devolução da quantia em seu poder ao proponente, sempre que o negócio não se conclua, nomeadamente, conforme alínea b) “Não for concedido empréstimo bancário suficiente ao(s) proponente(s), quando requerido (....), sendo que a apelante apenas efetuou simulações bancárias, não tendo demonstrando, como era o seu ónus, de que efetivamente o interessado reunia condições efetivas para realizar o negócio. I) Desconhece-se assim se efetivamente o interessado reunia condições económicas para levar por diante um potencial negócio, sendo que caso não reunisse, o que se desconhece, a caução seria devolvida ao proponente, sem o negócio se concretizar, pelo que o supra mencionado documento 4, demonstra apenas que existia eventualmente um potencial interessado, cuja vontade efetiva estaria dependente de terceiro, nomeadamente da instituição bancária. J) Não se pode reconhecer que o mediador, in COSU, a Apelada tenha direito à retribuição, quando obteve apenas um potencial destinatário no negócio, e a Apelada denunciou o contrato antes do conhecimento efetivo de tal interesse. K) Conforme consta da Douta Sentença era a Apelante que tinha de alegar e provar que apresentou ao cliente/vendedor alguém efetivamente interessado na aquisição do imóvel, um concreto comprador, por um preço concreto, pronto a celebrar o negócio, e que o negócio só não se realizou por causa imputável ao cliente, o que não logrou fazer. L) Deste modo, ao invés do alegado pela Apelante, a Douta Sentença proferida nos autos não padece de nulidade, nem de qualquer erro de julgamento, quanto à matéria de facto, quanto à matéria de direito, não tendo sido violadas as normas invocadas pela mesma, pelo que não merece qualquer censura as conclusões vertidas na Douta Sentença recorrida. M) Apenas se pode “censurar” a Douta Sentença por olvidar questão de direito essencial, que em nada ofende a decisão corretamente julgada e decidida, mas pelo contrário a reforçaria e por tal facto, e prevenindo-se a hipótese, de procederem as questões levantadas pela Apelante, a Apelada ao abrigo do n.º2 do artigo 636.º do Código de Processo Civil, requer a ampliação do âmbito do recurso, relativamente ao facto provado sob o n.º 2. N) Conforme consta no ponto III da Douta Sentença, eram duas as questões a decidir, a primeira respeitante ao contrato celebrado entre a Apelante e a Apelada e a segunda se a Apelante tinha direito a receber da Apelada a quantia peticionada, correspondente à renumeração acordada. O) O Tribunal a quo deu como provado sob o facto n.º 2 que “No âmbito daquela sua atividade, a R. procurou os seus serviços, tendo as partes celebrado acordo, em 29/05/2020, denominado “contrato de mediação imobiliária” a que foi atribuído o nº 093200140-8023.” P) - Conforme resulta dos autos a Apelada assinou um contrato de mediação imobiliária em 29 de Maio de 2020, tendo a mesma nas declarações de parte que prestou, e que se encontram registadas no Sistema H@bilus Media Studio, com início às 10:38 h e fim às 11:21, e sobretudo a partir do minuto 4:20 e posteriormente a partir do a partir do minuto 29:30 a esclarecido que o referido contrato foi assinado em sua casa, na data constante do mesmo, ou seja, em 29 de Maio de 2020. Q) Também a testemunha PL, angariadora imobiliária que presta serviços para a Apelante depôs, a partir do minuto 21:08 no depoimento que se encontra registado no Sistema H@bilus Media Studio, com início às 11:55 h e fim às 12:27, que efetivamente o contrato foi assinado em casa da aqui Apelada e posteriormente foi remetido por email. R) Resulta assim de forma inequívoca que o contrato foi outorgado fora do estabelecimento comercial da Apelante, mais concretamente no domicílio da Apelada, em 29 de Maio de 2020. S) Também ficou demonstrado que a Apelada sentiu-se pressionada e compelida, pela atuação da angariadora ao serviço da Ré a celebrar um contrato de mediação imobiliária que na realidade não espelhava a sua real vontade, uma vez que a mesma não pretendia conceder à imobiliária a cláusula de exclusividade. T) Resulta ainda que não obstante o contrato ter sido assinado no dia 29 de Maio de 2020, a Apelada apenas teve acesso e cópia do contrato, agora concluído com a assinatura do responsável da Apelante, no dia 3 de Junho de 2020. U) Não corresponde à verdade o constante na parte final do contrato, isto é, de que o mesmo foi feito em duplicado, destinando-se um exemplar a cada uma das partes interveniente. V) Apesar de o contrato de mediação imobiliária estar regulada e as normas tipificadas, tal não desobriga a mediadora do competente dever de informação, sendo que no contrato em causa nos presentes autos não se mostram satisfeitas as exigências de comunicação e de informação das cláusulas ao contraente aderente. W) Face à prova produzida nos autos o ponto 2 da Douta sentença recorrida deveria ser retificado no sentido que o contrato foi celebrado em casa da aqui Apelante, após contacto inicial e por insistência da Apelada, sendo que a cópia do referido contrato com a oposição da assinatura da Apelante apenas foi facultado à Apelada em 03 de Junho de 2020. X) E tal questão reveste essencial importância porquanto, no dia 10 de Junho de 2020, tendo apenas decorrido 12 (doze) dias após a assinatura do contrato pela Apelante e uma semana após ter recebido cópia do mesmo, a Apelada remeteu um email onde denuncia o contrato, nos termos legais. Y) O contrato foi assinado em casa da Apelada, após contacto inicial e por insistência da Apelante, com cláusulas contratuais gerais, que não refletem toda a realidade contratual, nem são suficientemente esclarecedoras, pelo que dúvidas não restam que ao dito contrato é aplicável o Decreto-lei nº 24/2014 de 14 de Fevereiro. Z) Assistia à Apelada, recebido o contrato, o direito de livre resolução do mesmo, consagrado no artigo 10.º do supra citado diploma, como a mesma alegou na sua oposição, nos artigos 21 e 33.º, o que fez, no exercício de um direito legalmente consagrado. AA) Esta posição tem amplo acolhimento jurisprudencial, conforme Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 12 de Setembro de 2022, processo n.º 3099/20.0T8STS.P1, in www.dgsi.pt. BB) A Apelada tinha o direito de denunciar livremente o contrato nos termos constantes da alínea a) do nº 1 do artigo 10º do Decreto-lei nº 24/2014 de 14 de Fevereiro, o que fez tempestivamente, tendo a Apelante recebido e reconhecido tal denúncia. CC) Todo o arrazoado produzido pela Apelante nas suas alegações, sobre se o documento junto em sede de audiência de discussão e julgamento sob n.º 4, denominado “Pedido de reserva e proposta contratual” é inútil, e demonstra de forma clara o objetivo de obter vantagem patrimonial que bem sabe não ter direito. Face a todo o exposto e salvo melhor opinião, não houve qualquer violação dos normativos invocados pela Apelante, pelo que terá de improceder a pretensão da mesma, mantendo-se a final o sentido da Douta Sentença recorrida.» QUESTÕES A DECIDIR Nos termos dos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo um função semelhante à do pedido na petição inicial.[1] Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso, v.g., abuso de direito.[2] Nestes termos, as questões a decidir são as seguintes: i.Nulidade da sentença (conclusões Y a EE); ii.Impugnação da decisão da matéria de facto (conclusões U a X, FF a KK); iii.Ampliação do objeto do recurso (conclusões M e seguintes das contra-alegações); iv.Se é devida remuneração à autora nos termos do nº2 do Artigo 19º da Lei nº 15/2013, de 8.2. Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença sob recurso considerou como provada a seguinte factualidade: 1. A A. dedica-se à atividade da mediação imobiliária. 2. No âmbito daquela sua atividade, a R. procurou os seus serviços, tendo as partes celebrado acordo, em 29/05/2020, denominado “contrato de mediação imobiliária” a que foi atribuído o nº 093200140-8023. 3. Através desse contrato, a A. obrigou-se a diligenciar no sentido de conseguir interessados na compra do prédio urbano sito na Rua (...), nº 3, (...), (...), descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº (...), freguesia de (...), e inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo (...), freguesia de (...), propriedade da R., pelo preço de €149.000,00. 4. O contrato foi celebrado em regime de exclusividade, pelo prazo de 6 meses. 5. A R. obrigou-se a pagar à A., como contrapartida dos serviços prestados, e a título de comissão de venda, uma remuneração correspondente à quantia de 5% (cinco por cento) ou a quantia de €5.000,00 (cinco mil euros) quando aquela percentagem fosse inferior a esse montante, calculada sobre o preço pelo qual o negócio fosse concretizado, acrescida de IVA à taxa legal em vigor, a ser paga aquando da celebração do contrato promessa de compra e venda. 6. No exercício daquela sua atividade, a A. angariou um proponente em 06/06/2020, pelo preço pretendido pela R. de €149.000,00. 7. Nessa sequência, a A. comunicou, por telefone, à R. a proposta em causa, solicitando à R. que se deslocasse às instalações da A. a fim de lhe ser dado conhecimento, por escrito, da proposta apresentada e para que aquela assinasse a proposta. 8. Apesar do referido em 7. a R. não se deslocou às instalações da A., não tendo assinado a proposta. 9. No dia 10 de junho de 2020, a R. remeteu email à A., que o recebeu nessa data, do seguinte teor: “(...) CD vem, muito atenciosamente, informar V.ª Exª e a Imobiliária Era que desiste da venda do seu imóvel situado na Rua (...), nº 3, (...), freguesia de (...). Sendo do conhecimento da Senhora D. PL que me vou deslocar ao continente, por um período provável de 2 anos, para efetuar exames clínicos e respetivos tratamentos, os quais não se efetuam na RAA, estive a analisar com o auxílio de familiares as vantagens e desvantagens de enveredar pela venda da minha habitação, pelo que concluímos que só tenho a perder com a venda da mesma. Não sei o que me reserva o futuro, mas sei que daqui a 2 anos regresso à RAA para pedir a minha reforma. Sendo assim, tenho sempre a minha casa para me alojar. O pouco lucro que iria ter com a venda do meu imóvel não daria para comprar um apartamento no continente. Andei a fazer as devidas sondagens e foi o que constatei, assim como nenhum banco me concedia novo empréstimo para aquisição de um apartamento devido à minha idade, mesmo que a compra fosse efetuada em meu nome e no nome da minha filha, dado que prevalece sempre a idade da pessoa mais velha. Teria que começar nova vida nesta fase da vida pelo que a minha saúde já não me permite margens para o fazer. Peço à Senhora D. PL que possa entregar-me a chave da minha casa, conforme me prontifiquei na facultação da mesma. Peço desculpa pela minha precipitação na atitude que tomei e garanto-vos que no futuro jamais seria minha intenção recorrer a qualquer outra Imobiliária. Sou pessoa séria e sei os deveres que me competem cumprir. (...). 10. Depois de ter recebido o email referido em 9., a A. contactou a R. solicitando que se reunisse com a A. nas suas instalações, ao que a R. acedeu. 11. Na sequência do referido em 10., a R deslocou-se às instalações da A. onde se reuniu com PL, angariadora imobiliária da A., e que havia intermediado o acordo celebrado entre a A. e a R., e CV, diretora comercial da A.. 12. Aquando da reunião referida em 11., a R. foi confrontada com o documento “Pedido de reserva e proposta contratual”, subscrito pelo terceiro interessado na aquisição do prédio e caução prestada, informando a A. à R. que o serviço para o qual havia sido contratada foi feito e que iria cobrar a comissão devida pela R.. 13. A A. remeteu carta registada com aviso de receção à R., datada de 29/06/2020, que foi recebida pela R. em 01/07/2020, interpelando a R. para proceder ao pagamento da remuneração acordada, porquanto, havia cumprido a totalidade das suas obrigações, conforme documento junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. 14. Em 7 de julho de 2020, a R. remeteu carta à A., que a recebeu, onde referia que não era devida qualquer comissão à A., pois quando enviou o email não tinha qualquer conhecimento de qualquer proposta de compra do imóvel, nunca lhe tendo sido dito ou exibido qualquer elemento concreto ou documento nesse sentido, conforme documento junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. 15. A A. remeteu carta registada com aviso de receção à R., datada de 22 de março de 2021, solicitando novamente o pagamento da remuneração, conforme documento junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. 16. No dia 2 de novembro de 2020 a R. remeteu carta à A., reportando-se ao contrato referido em 1., comunicando que “(...), venho por este meio e ao abrigo do disposto na sua cláusula contratual geral XI, denunciar este contrato de mediação imobiliária, o qual por isso não se renovará após o seu termo. Assim, vem a aqui signatária manifestar a sua oposição a qualquer renovação do referido contrato, o qual é pois ora denunciado para todos os efeitos legais. Pelo que, terminará o contrato no fim do prazo de 6 meses contados desde a data da sua celebração, ou seja, terminará a partir de 29-11-2020.”, conforme documento junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. 17. No dia 24 de fevereiro de 2021 a R. outorgou acordo com a sociedade (...) – Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda., denominado “contrato de mediação imobiliária, em regime de exclusividade, onde esta se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessados na compra do prédio urbano sito na Rua (...), nº 3, (...), (...), descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº (...), freguesia de (...), e inscrito na matriz prediz respetiva sob o artigo (...), freguesia de (...), pelo preço de € 135.000,00. 18. No dia 30 de abril de 2021 a R. vendeu a AMS, angariada pela sociedade (...) – Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda., o prédio identificado em 9.. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Nulidade da sentença Sustenta a apelante que a sentença padece de nulidade, nos termos do consignado na al. c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, porquanto julga provado que uma proposta foi comunicada à Ré, embora esta nunca a tenha assinado, e insere cronologicamente tal factualidade antes da comunicação escrita da Ré para a Autora de 10.06.2020 (facto provado n.º 9), vindo depois a decidir que a «desistência» foi válida e inconsequente (quanto à quebra culposa do contrato de mediação imobiliária) porque anterior à comunicação da proposta. Cumpre apreciar. A propósito da nulidade prevista na primeira parte da al. c), refere-se em Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa, Código de Processo Civil Anotado, I Vol., 2022, 3ª ed., Almedina, pp. 793-794: «A nulidade a que se reporta a 1ª parte da al. c) ocorre quando existe incompatibilidade entre os fundamentos de direito e a decisão, ou seja, em que a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final. Situação que, sendo violadora do chamado silogismo judiciário, em que as premissas devem condizer com a conclusão, também não se confunde com um eventual erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide contrariamente aos factos apurados ou contra norma jurídica que lhe impõe uma solução jurídica diferente (STJ 8-9-21, 1592/19, STJ 3-3-21, 3157/17, STJ 29-10-20, 1872/18). » «O art.º 615 do CPC, reporta-se às nulidades da sentença ali enunciadas, conhecidas a solicitação das partes, que como seus vícios intrínsecos, devem ser apreciados em função do texto e discurso lógico neles desenvolvida, não se confundindo com os erros na apreciação da matéria de facto, e possíveis ilações dela retirada, ou com a errada aplicação das normas jurídica aos factos dados como apurados ou tidos em consideração, que constituem erros de julgamento, a sindicar noutro âmbito» (cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 28.9.2022, Ana Resende, 3538/17, 31.11.2022, Fernando Batista, 2603/19). No caso em apreço, não ocorre tal nulidade porque existe conformidade entre a fundamentação de direito adotada (que entende que a Ré desistiu da venda antes de a autora lhe ter apresentado alguém efetivamente interessado na aquisição do imóvel, com um projeto de negócio concretizado formalizado por escrito), e o subsequente dispositivo. O que a apelante pretende arguir é erro de julgamento, no sentido de que o juiz decidiu à revelia dos factos provados e do enquadramento jurídico pertinente, sendo que o erro de julgamento constitui realidade diversa de nulidade da sentença. Termos em que improcede a arguição da nulidade. Impugnação da decisão da matéria de facto e ampliação do objeto do recurso. Pretende a apelante que sejam aditados como factos provados os seguintes: a) Que o proponente subscreveu efetivamente uma proposta de compra do referido imóvel, pelo preço anunciado de €149.000,00, que assinou em 06.06.2020, tendo pago inclusivamente o valor de €2.500,00, nesse mesmo dia, por transferência bancária, para efeitos de caução/reserva, sendo este proponente a pessoa que realizou de véspera a visita ao imóvel; b) Que pelo telefonema, datado de 06.06.2020 a colaboradora da Autora informou a Ré da proposta de compra, identidade do comprador, etc., tendo esta ficado ciente das condições essenciais do negócio, e c) Que a Ré aceitou tal proposta (que aliás igualava as condições por si pretendidas - motivo de satisfação que demonstrou), afirmando que a casa estava quase vendida, até se mostrando disponível para vender o imóvel com as mobílias incluídas, e só então (depois) desistiu do negócio, por razões meramente económicas (não gerava o lucro suficiente); d) O proponente angariado pela autora estava em condições financeiras de prosseguir com o negócio de aquisição do imóvel; e) Logo em 10.6.2020, a Ré impossibilitou a autora de doravante executar o contrato de mediação imobiliária, ao exigir-lhe a devolução imediata das chaves do imóvel, impedindo e inutilizando os seus serviços, não obstante a própria admitir a vigência do mesmo até 29.11.2020. Por sua vez, em sede de ampliação do objeto do recurso, a apelada pretende que seja alterada a redação do facto 2, aditando-se que o contrato foi assinado em casa da ré, em 29 de maio de 2020, bem como que a ré só teve acesso a cópia do contrato em 3.6.2020. Apreciando. Em primeiro lugar, há que notar que parte desta factualidade (sobretudo primeira parte da al. a) e al. b)) se sobrepõe – e nada de útil acrescenta - aos factos já provados sob 6 a 8: 6. No exercício daquela sua atividade, a A. angariou um proponente em 06/06/2020, pelo preço pretendido pela R. de €149.000,00. 7. Nessa sequência, a A. comunicou, por telefone, à R. a proposta em causa, solicitando à R. que se deslocasse às instalações da A. a fim de lhe ser dado conhecimento, por escrito, da proposta apresentada e para que aquela assinasse a proposta. 8. Apesar do referido em 7. a R. não se deslocou às instalações da A., não tendo assinado a proposta. Em segundo lugar, quanto ao que consta da segunda parte da al. a) (a partir de “tendo pago”), na totalidade das als. c) e d), bem como os factos que a apelada pretende aditar em sede de ampliação do objeto do recurso, verifica-se que tal factualidade não foi alegada pelas partes nos seus articulados, tratando-se de factos novos invocados nesta apelação. Ora, quanto aos factos que a apelada pretende aditar, tratando-se de factos que fundam exceções perentórias, deveria a apelada tê-los alegados oportunamente, não sendo admissível a sua adução em primeira mão no recurso de apelação (cf. Artigo 5º, nº1, do Código de Processo Civil ), sendo que não cabe ao Tribunal da Relação apreciar novas questões salvo as de conhecimento oficioso. O que acaba de dizer-se aplica-se mutatis mutandis ao facto d) (“O proponente angariado pela autora estava em condições financeiras de prosseguir com o negócio de aquisição do imóvel”), tratando-se de um facto essencial e principal que deveria ter sido alegado e subsequentemente demonstrado pela apelante em primeira instância. Quanto aos demais factos que a apelante pretende aditar, os mesmos poderão ser considerados factos complementares para os efeitos do Artigo 5º, nº 2, al. b), do Código de Processo Civil. Tais factos só poderiam ser introduzidos no processo no decurso do julgamento em primeira instância, mediante iniciativa da parte ou oficiosamente, sendo que, neste último caso, cabe ao juiz anunciar às partes que está a equacionar utilizar esse mecanismo de ampliação da matéria de facto, sob pena de proferir uma decisão-surpresa (cf. também: Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 7.2.2017, Pinto de Almeida, 1758/10, de 6.9.2022, Graça Amaral, 3714/15, de 30.11.2022, Barateiro Martins, 23994/16, de 30.5.2023, Jorge Dias, 529/21; Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 11.12.2018, Moreira do Carmo, 2053/14, de 13.9.2022, Moreira do Carmo, 3713/16; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19.12.2019, Castelo Branco, 11605/18). Em qualquer dessas circunstâncias, assiste à parte beneficiada pelo facto complementar e à contraparte a faculdade de requererem a produção de novos meios de prova para fazer a prova ou contraprova dos novos factos complementares – cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa, Código de Processo Civil Anotado, I Vol., 2022, 3ª ed., Almedina, p. 32. Não tendo a apelante desencadeado tal mecanismo de ampliação fáctica nem tendo o mesmo sido utilizado oficiosamente pelo tribunal, está precludida a ampliação da matéria de facto com tal fundamento em sede de apelação porquanto o conteúdo da decisão seria excessivo por envolver a consideração de factos essenciais complementares ou concretizadores fora das condições previstas no art. 5º (cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa, Código de Processo Civil Anotado, I Vol., 2022, 3ª ed., Almedina, p. 860) ou, segundo Alberto dos Reis, ocorreria erro de julgamento por a sentença/acórdão se ter socorrido de elementos de que não podia socorrer-se (Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pp.. 145-146). Note-se que a ampliação da matéria de facto (Artigo 662º, nº2, al. c), in fine, do Código de Processo Civil) tem por limite a factualidade alegada, tempestivamente, pelas partes, não constituindo um sucedâneo do mecanismo sucedâneo do Artigo 5º, nº2, al. b), do Código de Processo Civil). Improcede a pretendida alteração da matéria de facto. Finalmente, quanto ao facto e), a prova do mesmo é absolutamente inócua para a solução final do litígio, colocando-se a questão central a montante da ocorrência de tal facto. O direito à impugnação da decisão de facto não subsiste a se mas assume um caráter instrumental face à decisão de mérito do pleito. Deste modo, por força dos princípios da utilidade, economia e celeridade processual, o Tribunal ad quem não deve reapreciar a matéria de facto quando o(s) facto(s) concreto(s) objeto da impugnação for insuscetível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente.[3] Dito de outra forma, o princípio da limitação dos atos, consagrado no Artigo 130º do Código de Processo Civil, deve ser observado no âmbito do conhecimento da impugnação da matéria de facto se a análise da situação concreta evidenciar, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, que desse conhecimento não advirá qualquer elemento factual cuja relevância se projete na decisão de mérito a proferir – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.5.2017, Isabel Pereira, 4111/13. Por todo o exposto, improcede a impugnação da decisão da matéria de facto. Se é devida remuneração à autora nos termos do nº2 do Artigo 19º da Lei nº 15/2013, de 8.2. O tribunal a quo julgou a ação improcedente essencialmente pelo seguinte raciocínio: «Ora, desta factualidade não resulta que a A. tenha apresentado à R., antes da mesma ter desistido da venda, e disso informado a A., alguém que estivesse efetivamente interessado na aquisição do imóvel colocado em venda, apenas se provou que, por telefone, a A. comunicou à R. que havia um interessado na compra pelo valor que a R. pretendia vender, mas o mesmo nunca foi apresentado à R., nem houve qualquer contacto direto entre esse interessado e a R., nem a R. teve conhecimento da proposta formalizada por escrito por esse interessado na compra, pois conforme resulta da factualidade provada, apenas lhe foi exibida a proposta de compra e comprovativo de caução prestada, quando a R. se deslocou às instalações da A. para uma reunião, mas nessa data já a R. havia desistido da venda e disso informado a A., e não assinou a proposta de compra nem foi celebrado qualquer contrato promessa. Na verdade, para que se possa considerar que foi apresentado um interessado ao cliente que apresentou uma proposta de compra credível é necessário algo mais do que uma simples comunicação por telefone, informar, sem mais, e por essa via, que há uma pessoa interessada no negócio, ainda que se nomeie a pessoa em questão, não significa que esse interesse exista, nem tão-pouco que essa pessoa tenha existência real, é preciso, pois, apresentar algo mais ao cliente, nomeadamente dando conhecimento, por escrito, da proposta de compra subscrita pelo interessado na compra, pois só assim fica demonstrado perante o cliente a vontade séria e real do terceiro na aquisição do imóvel. No caso em apreço, a A. não logrou provar que antes da R. desistir da venda, e de o ter comunicado à A., apresentou à R. alguém efetivamente interessado na aquisição do imóvel, com um projeto de negócio concretizado (formalizado por escrito), pois aquando da desistência da venda por parte da R. a A. ainda não lhe havia apresentado pessoa interessada, disposta e pronta a celebrar o contrato visado, e a proposta concreta, já que a mera comunicação por via de telefone é insuficiente. Diferente seria se a R., antes de desistir da venda, já tivesse assinado a proposta de compra subscrita pelo interessado, mas não foi o que sucedeu no caso em apreço, pois quando foi exibido à R. a proposta escrita já a mesma havia desistido da venda e comunicado tal facto à A..» Apreciando. Nos termos do Artigo 19º, nº 2, da Lei nº 13/2013, de 8.2, «É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.» A propósito desta norma, Higina Castelo, “Contrato de mediação imobiliária”, in DataVenia, Ano 4, nº 6, pp. 103-104, pronuncia-se nos seguintes termos: «O regime vigente alarga a exceção ao contrato de mediação exclusivo celebrado com o arrendatário trespassante, sendo esta a única alteração substancial (art.º 19, n.º 2, da Lei 15/2013). No entanto, a nova norma tem uma redação confusa: «É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel». O texto enferma de gralhas evidentes, estando manifestamente a mais as palavras que coloquei em itálico. Está em causa o contrato de mediação celebrado em regime de exclusividade e não o contrato visado celebrado em regime de exclusividade. Suprimidos os lapsos, a norma em causa determina que, no contrato de mediação celebrado em regime de exclusividade, com o proprietário do bem imóvel ou com o arrendatário trespassante, se o contrato visado não se concretizar por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, esta tem direito à remuneração. Esta norma, que em substância vem dos dois regimes anteriores, introduz na disciplina contratual uma diferença significativa relativamente ao regime geral do contrato de mediação, no qual a remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação (ou de sua promessa, quando assim tiver sido acordado no contrato de mediação). No regime geral, não se celebrando o contrato visado, ainda que por causa imputável ao cliente, não nasce o direito à remuneração, pois o cliente mantém intacta a sua liberdade de contratar (balizada apenas, nos termos gerais, perante o terceiro, pelo dever de boa fé nas negociações). Tendo sido estipulada uma cláusula de exclusividade num contrato de mediação celebrado com o proprietário ou com o arrendatário trespassante, o panorama altera-se. Nestes casos, a remuneração da mediadora não depende do evento futuro e incerto constituído pela celebração do contrato visado, quando este evento não se concretize por causa imputável ao cliente. A remuneração da mediadora depende aqui quase unicamente do cumprimento da sua obrigação e do sucesso desta. De enfatizar que a aplicação da norma contida no n.º 2 do art.º 19 implica a prova da efetiva obtenção de alguém genuinamente interessado e pronto a celebrar o contrato nos moldes em que foi concebido no âmbito do contrato de mediação. Provando a mediadora que efetuou com sucesso a sua prestação, o cliente poderá eximir-se à remuneração mediante a prova de que o contrato não se concretizou por causa que não lhe é imputável (porque, por exemplo, recebeu, entretanto e inesperadamente, uma ordem de expropriação, ou porque o terceiro não obteve o crédito necessário à realização do negócio).» Esta mesma posição, já havia sido expressa em Contrato de Mediação, Estudo das Prestações Principais, FDUNL, 2013, pp. 387/388, nestes termos: «De enfatizar que a aplicação da norma contida no art.º 19, n.º 2, do RJAMI implica, mais que a prova do cumprimento da obrigação do mediador – diligências no sentido da obtenção de um interessado –, a prova do sucesso desse cumprimento que satisfaz o interesse do credor – efetiva obtenção de um interessado, genuinamente interessado e pronto a celebrar o contrato nos moldes em que foi concebido no âmbito do contrato de mediação. Provando a mediadora que efetuou com sucesso a sua prestação, poderá o cliente eximir-se à remuneração mediante a prova de que o contrato não se concretizou por causa que não lhe é imputável (porque, por exemplo, recebeu, entretanto e inesperadamente, uma ordem de expropriação, ou porque o terceiro não obteve o crédito necessário à realização do negócio ou desistiu por qualquer outra razão).» Atenta a regra geral do ónus da prova (Artigo 342º, nº1, do Código Civil), cabia à Autora a alegação e prova de que angariou um interessado na compra do imóvel, bem como que esse interessado estava pronto a celebrar o contrato de compra e venda nos termos em que foi concebido no contrato de mediação. No caso, a autora não logrou alegar e subsequentemente demonstrar que o interessado que angariou estava pronto a celebrar o contrato visado, ou seja, cabia à autora demonstrar que o interessado angariado dispunha de fundos financeiros imediatos que o habilitassem a pagar o preço ou, em alternativa, que disporia dos mesmos aquando da projetada celebração da compra e venda. Para este efeito, só releva a apresentação de um interessado que tenha demonstradas condições financeiras de honrar o contrato, sob pena de a angariação de interessados inviáveis gerar a obrigação de pagamento da remuneração da mediadora, o que seria- de todo – iníquo. Ora, essa alegação e prova claudicou em toda a linha, razão suficiente da improcedência da ação. Conforme visto supra, a autora veio – intempestivamente – tentar emendar a mão em sede de impugnação, vindo agora alegar esse facto principal. Note-se que o próprio texto do contrato outorgado corrobora esta interpretação porquanto na Cláusula IX do mesmo é dito que «A remuneração será devida à Mediadora, se esta (…) conseguir encontrar interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato» (sublinhado nosso). Ou seja, é necessário que o interessado esteja em condições de concretizar o negócio, e não apenas demonstre interesse no mesmo. Em 10.6.2020, a Ré transmitiu à autora a sua decisão de desistir da venda do seu imóvel, sendo admissível tal desistência. Conforme refere, Higina Castelo, “Contrato de mediação imobiliária”, in DataVenia, Ano 4, nº 6, p. 115: «A existência de um prazo contratual – e o contrato de mediação está sempre sujeito a prazo, funcionando um supletivo de seis meses, quando as partes nada digam – significa que não pode ser posto termo ao contrato antecipadamente por declaração discricionária de uma das partes. Trata-se de decorrência lógica da basilar regra pacta sunt servanda, de resto, positivada no art.º 406 do CC. No entanto, encontramos ocasionalmente a defesa da chamada revogabilidade (aqui entendida como possibilidade de cessação por declaração unilateral e discricionária, à semelhança do seu emprego, por exemplo, no regime do mandato) do contrato de mediação, para se legitimar a desistência do cliente de celebrar o contrato visado. Sucede que livre revogabilidade do contrato de mediação e livre desistência de celebração do contrato visado são coisas distintas e a segunda não implica a primeira. Isto torna-se claro se nos lembrarmos de que a celebração do contrato visado não faz parte da prestação contratual da mediadora, sendo apenas uma circunstância de eventualidade de que depende o seu direito à remuneração. O cliente da mediadora num contrato de mediação imobiliária é sempre livre de desistir da celebração do contrato visado (sem prejuízo de, em alguns casos de contrato de mediação em regime de exclusividade, poder ter de pagar a remuneração, como vimos em 3.5.1.), mas não é livre de pôr fim ao contrato antes do seu aprazado termo, por declaração unilateral e imotivada.» Assim, a desistência da venda do imóvel pela ré é lícita e admissível, não carecendo de demonstrar um fundamento sério para a mesma. A Ré só incorreria no dever de remunerar a autora caso esta tivesse, antes de tal desistência, angariado um interessado pronto a celebrar o contrato visado, o que não ocorreu consoante explicitado supra. Não tendo a autora logrado provar os factos constitutivos do direito que veio arrogar-se em juízo, não há que apreciar factos impeditivos (Artigo 342º, nº2, do Código Civil), nomeadamente se a ré demonstrou que o contrato não se concretizou por motivo que não lhe é imputável. Em 2.11.2020, a Ré denunciou o contrato de mediação para o seu termo em 29.11.2020. O exercício deste direito é admissível. Conforme refere Vaz Serra, Anotação ao Acórdão do STJ de 7.3.1967, RLJ, Ano 100º, pp. 340/348: «Salvo estipulação em contrário, o contrato de mediação deve considerar-se revogável. Não se trata de uma aplicação analógica das regras do mandato e da comissão, mas de uma consequência da própria natureza do contrato, tal como ela é de presumir ser querida pelos contraentes, pois parece de presumir que o autor do encargo, ao celebrar o contrato de mediação, não quer privar-se da faculdade de prescindir dos serviços do mediador, já que pode oferecer-se-lhe oportunidade de realizar o negócio sem intermediário, ou aparecer-lhe outro intermediário mais conveniente, ou perder a confiança que depositara no primeiro, ou desistir do propósito de concluir o negócio; por outro lado, desde que o mediador só adquire direito à remuneração quando o negócio é concluído por efeito da sua intervenção...e a conclusão depende do autor do encargo, tem este o direito de revogação.» Conforme se explica no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11.11.2004, Salazar Casanova, 5439/2004: «(…) sendo em princípio admissível a denúncia do contrato de mediação, não podem valer os seus efeitos no sentido de a parte que interveio no contrato de mediação se querer eximir ao pagamento estipulado quando, pelas circunstâncias do caso, se verifique que a denúncia não constituiu senão um expediente, porventura grosseiro, destinado a dar ao denunciante a aparente liberdade negocial de contratar com a pessoa angariada sem qualquer responsabilização face ao mediador angariante. A tutela dos interesses do mediador no recebimento da comissão, uma vez consumado o negócio com o cliente que diligenciou conseguir, vai radicar no instituto do abuso do direito (artigo 334º do Código Civil). Estaremos então face à modalidade do abuso fundado na exceptio doli que se dá quando a parte pratica um determinado ato (a denúncia do contrato, no caso) com a finalidade de se eximir às suas responsabilidades (contratuais, no caso) utilizando um direito ( de denúncia) que, sendo excecional (artigo 406º do Código Civil), não é seguramente licitamente exercitável para possibilitar desvios aos princípios da boa fé e à observância do princípio da lealdade e cumprimento das obrigações livremente assumidas.» No caso em apreço, a denúncia feita pela ré não integra abuso de direito porquanto, desde logo, a Autora não demonstrou ter angariado um interessado pronto a celebrar o contato (cf. supra) e, por outro lado, o novo contrato de mediação que veio a celebrar dista três meses da cessação do dos autos, sendo este hiato temporal infirmador do intuito de apenas eximir-se ao pagamento de qualquer comissão à autora. Com efeito, posteriormente, em 24.2.2021, recorrendo a outra empresa de mediação imobiliária, a Ré vendeu o mesmo imóvel pelo preço de €135.000, não estando demonstrado que o adquirente foi o alegadamente angariado pela autora. Termos em que, sendo desnecessárias outras considerações, deve a apelação improceder. A fundamentação autónoma da condenação em custas só se tornará necessária se existir controvérsia no processo a esse propósito (cf. art.º 154º, nº1, do Código de Processo Civil; Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs. 303/2010, de 14.7.2010, Vítor Gomes, e 708/2013, de 15.10.2013, Maria João Antunes). DECISÃO Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida. Custas pela apelante na vertente de custas de parte (Artigos 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6 e 663º, nº 2, do Código de Processo Civil). Lisboa, 24.10.2023 Luís Filipe Pires de Sousa Ana Rodrigues da Silva Paulo Ramos de Faria _______________________________________________________ [1] Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7ª ed., 2022, p. 186. [2] Abrantes Geraldes, Op. Cit., pp. 139-140. Neste sentido, cf. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 9.4.2015, Silva Miguel, 353/13, de 10.12.2015, Melo Lima, 677/12, de 7.7.2016, Gonçalves Rocha, 156/12, de 17.11.2016, Ana Luísa Geraldes, 861/13, de 22.2.2017, Ribeiro Cardoso, 1519/15, de 25.10.2018, Helder Almeida, 3788/14, de 18.3.2021, Oliveira Abreu, 214/18, de 15.12.2022, Graça Trigo, 125/20, de 11.5.2023, Oliveira Abreu, 26881/15, de 25.5.2023, Sousa Pinto, 1864/21, de 11.7.2023, Jorge Leal, 331/21. O tribunal de recurso não pode conhecer de questões novas sob pena de violação do contraditório e do direito de defesa da parte contrária (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.12.2014, Fonseca Ramos, 971/12). [3] Cf.: Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 24.4.2012, Beça Pereira, 219/10, de 14.1.2014, Henrique Antunes, 6628/10, de 27.5.2014, Moreira do Carmo, 1024/12; Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 3.10.2019, Paulo Reis, 582/17; Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23.1.2020, Tomé Gomes, ECLI:PT:STJ:2020:4172.16.4T8FNC.L1.S1., de 24.9.2020, Graça Trigo, 127.16, ECLI, de 19.5.2021, Júlio Gomes, 1429/18, de 14.7.2021, Fernando Baptista, 65/18, de 25.10.2022, Lima Gonçalves, 721/18; Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 14.7.2020, Rita Romeira, 1429/18, de 12.4.2021, Eusébio Almeida, 6775/19; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27.10.2022, Castelo Branco, 7241/18; Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 25.5.2023, Albertina Pedroso, 1996/19. |