Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA DA GRAÇA DOS SANTOS SILVA | ||
Descritores: | DOCUMENTO CONFIDENCIALIDADE DIREITO DA CONCORRÊNCIA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 12/18/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
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Sumário: | A decisão de classificação de um documento como confidencial, em sede de direito da concorrência, está condicionada pelo cumprimento pelo visado de um triplo ónus a que se reportam as supra citadas normas, a saber: de identificação das informações que considera confidenciais; de fundamentação de tal entendimento e de fornecimento de cópia não confidencial dos documentos pertinentes, expurgado das informações confidenciais. A tutela do segredo de negócio tem por limite a não restrição infundada da publicidade do processo e os direitos de defesa dos demais visados. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes, em conferência, na 3ª Secção Criminal, deste Tribunal: I – Relatório: No decurso da faze administrativa de processo movido pela Autoridade da Concorrência (doravante AdC) a M------ SA (doravante M------) impugnou judicialmente a decisão que não admitiu as versões não confidenciais remetidas por si com as comunicações de 13/08/2018, de 20/08/ 2018, de 05/11/2018, de 07/11/2018 e de 08/11/2018, em requerimento e respostas a pedidos de informações da AdC. Produzida sentença a confirmar a decisão recorrida, veio M------ recorrer da mesma decisão. No decurso do processado junto do Tribunal a quo foi proferido despacho, 12/05/2019, que converteu o efeito do recurso de suspensivo da decisão para suspensivo dos termos do processo administrativo, o Ministério Público (doravante MP) e a Adc vieram recorrer do mesmo. *** A- Recurso principal: I- Teor do recurso e contra-motivações: A M------ concluiu as alegações nos termos que se transcrevem: « I. Objecto do recurso A. Na fase organicamente administrativa do processo contra-ordenacional a que respeita o presente recurso, a M------ foi notificada para indicar quais as informações que considerava serem confidenciais, por motivos de segredo de negócio, constantes dos documentos juntos aos autos e, bem assim, para entregar à AdC Versões Não Confidenciais ('VNC') desses mesmos documentos para subsequente divulgação aos demais co-Visados e eventuais Terceiros. B. Cumprido o procedimento a que respeita o artigo 30.º da Lei da Concorrência, a AdC veio a indeferir a classificação de confidencialidades apresentada pela M------ e, em consequência, determinou que as Versões Confidenciais da Visada fossem integralmente divulgadas junto das demais co- Visadas. C. O presente recurso tem por objecto a decisão do TCRS que declarou integralmente improcedente a pretensão da M------ de que fossem admitidas as Versões Não Confidenciais de documentos por si apresentados perante a AdC na fase organicamente administrativa do processo. D. Uma decisão que, diga-se desde já, e sempre salvo o devido respeito, não pode proceder, essencialmente por dois motivos: (i) porque promoveu a divulgação de todas as VNC com fundamento no argumento de que basta um dos segmentos ocultados não ser confidencial para tudo ter de ser divulgado (incluindo segmentos que o próprio Tribunal considera estarem abrangidos por segredo de negócio); e (ii) porque considerou não abrangidas por segredo comercial informações que manifestamente o são. Mas antes, lI. Questão prévia: o efeito do recurso. (….) III. Os limites ao reexame de mérito por parte do Tribunal lI. Em face da ausência ou da improcedência da fundamentação da AdC para não aceitar a classificação de confidencialidades apresentada pela Visada, esta requereu ao Tribunal que avaliasse os respectivos fundamentos e se pronunciasse quanto à confidencialidade dos documentos, peticionando, a final, que admitisse as versões não confidenciais por si remetidas com as comunicações de 13.08.2018, 20.08.2018, 5.11.2018, 7.11.2018 e 8.11.2018, e determinando-se, em consequência, que serão estas as únicas versões a serem disponibilizadas pela Autoridade da Concorrência para efeitos de acesso ao processo pelas Co-Visados nos termos do artigo 33.°, nº 1 da Lei da Concorrência. JJ. O Tribunal, por seu turno, pronunciou-se quanto à confidencialidade de alguns dos documentos, mas, ao fazê-lo, e salvo o devido respeito, errou no que respeita aos seus poderes e deveres de cognição: considerou que o facto de uma concreta VNC conter informação não confidencial ocultada imporia a divulgação integral da respectiva informação confidencial, mesmo que dela constasse informação que o próprio Tribunal reconhece ser confidencial. KK. Fê-lo por entender que, tendo a Recorrente peticionado apenas que fossem admitidas as VNC por si apresentadas (e não também que, em caso de deferimento parcial, pudessem ser parcialmente aproveitadas), não poderia o Tribunal admiti-las na íntegra quando das mesmas conste informação por si considerada não confidencial. LL. Ao invés de procurar uma solução que permitisse simultaneamente revelar a informação considerada não confidencial aos co-Visados e tutelar o segredo de negócio da Visada, o Tribunal adoptou uma solução de tudo ou nada, em manifesto prejuízo dos direitos fundamentais da Visada e sem qualquer interesse atendível que o justifique. MM. E assim sucede, desde logo, porque o princípio do pedido não se aplica ao processo contra-ordenacional com a mesma rigidez com que se aplica ao processo civil. Não se tutelam aqui interesses (exclusivamente) privados e não estamos perante um processo de partes. Tutelam-se, sim, interesses públicos e direitos fundamentais dos Visados, cuja lesão, potencial e efectiva, decorre do exercício de poderes públicos. NN. Por esses motivos, o Tribunal, reconhecendo o mérito parcial da pretensão da Recorrente, deve adaptar o seu sentido decisório à solução que melhor compatibilize os interesses em confronto e que reduza a lesão de direitos fundamentais provocada por esses mesmos poderes públicos, em concreto declarar, no mínimo, parcialmente procedente o recurso, interpelando-se a Recorrente para, em prazo determinado, juntar aos autos novas VNC em conformidade com a decisão judicial. 00. Por tudo quanto se referiu, no que concerne às informações que o Tribunal reconheceu estarem abrangidas por segredo de negócio ou outro fundamento de confidencialidade (designadamente a protecção de dados pessoais), deverá ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que permita à Visada juntar novas VNC que apenas ocultem a informação identificada pelo Tribunal como confidencial, a saber: (i) A tabela 2 da VNC da Resposta da M------ de 16 de Agosto, tal como apresentada na Resposta da M------ de 8 de Novembro, que diz respeito ao detalhe das vendas da Recorrente no mercado da distribuição retalhista de bens alimentares para o período de 2003 a 2017 (cf. os parágrafos 76 e 150 da decisão recorrida); (ii) Os nomes dos cinco principais fornecedores da M------ por produto/mercado, constantes das tabelas disponibilizadas à AdC nas Respostas da M------ de 25 de Julho e de 18 de Setembro (cf. os parágrafos 94 e 95 da decisão recorrida); e (iii) A substituição por siglas dos nomes dos colaboradores da M------ com responsabilidade de direcção, constantes da resposta da M------ de 17 de Julho e das VNC juntas com as respostas de 7 de Novembro e 8 de Novembro (cf. os parágrafos 137 e 150 da decisão recorrida). IV. As confidencialidades a) As quotas de mercado PP. Na decisão ora recorrida, o TCRS rejeitou o pedido de confidencialidade da informação relativa às quotas de mercado da M------ no mercado da distribuição retalhista de base alimentar em Portugal, relativamente aos anos 2004-2016, por considerar não demonstrada a natureza secreta destas informações, face a uma quota de mercado referida em dois documentos juntos pela AdC nas suas contra-alegações, a "Apresentação da S------', de Junho de 2018 (preparada no contexto do projectado IPO da S------), e uma notícia do Jornal Económico de 4 de Setembro de 2018 sobre versão mais recente daquela apresentação. QQ. Esta conclusão é surpreendente, pois no oficio da AdC de 7 de Fevereiro de 2019, objecto do recurso de impugnação judicial nos presentes autos, a AdC não se havia oposto à confidencialidade da informação sobre quotas de mercado em causa, tendo apenas discordado da VNC apresentada pela M------ na Resposta de 7 de Novembro. RR. Os dados que a AdC afirma estarem divulgados na Apresentação da "S------" têm natureza inteiramente distinta das quotas de mercado solicitadas à M------ pela AdC, pelas razões que se passam a explicar. SS. As quotas de mercado transmitidas à AdC nas Respostas de 17 de Julho e 16 de Agosto foram calculadas pela M------. após indicação da própria AdC, especificamente por referência ao mercado da distribuição retalhista de base alimentar em Portugal, previamente definido pela AdC na sua prática decisória anterior, tendo a M------ utilizado no respectivo cálculo (i) dados internos não acessíveis ao público, bem como (ii) as suas próprias análises e conhecimento internos e metodologias específicas na estimativa da dimensão total do mercado e das suas próprias vendas. TT. Em contraste, a quota de mercado atribuída à S------ na Apresentação junta pela AdC foi estimada pela "P------" (cf a nota de rodapé 1 na p. 3 e a "Fonte" no rodapé da p. 6), uma plataforma online independente de subscrição. Os dados da P------ consistem em informação externa, independente e pública, isto é, acessível a qualquer pessoa individual ou colectiva, desde que pretenda pagar por ela. Foi, aliás, por se tratar de informação externa, independente e pública, que os dados P------ foram utilizados no contexto do projectado IPO da S------. UU. Acresce que, contrariamente aos dados internos da M------, que excluem as categorias de produtos não alimentares, de acordo com uma metodologia específica e não pública, a quota da S------ estimada pela P------ inclui todas as categorias de produtos constantes da oferta disponível nas lojas dos operadores abrangidos, sejam eles alimentares ou não. VV. As diferenças significativas entre os pressupostos e as metodologias adoptados na determinação das quotas internas da M------ e das quotas da P------ são evidenciadas pelas assimetria entre as próprias percentagens. Em particular, os dados P------ atribuem à Sonae Me uma quota de 21,9 em 2017, a qual é 60 (sessenta) por cento superior à quota de mercado estimada internamente pela M------ para 2016 (13,56), diferença essa que é inteiramente implausível tendo em conta a evolução recente do mercado e a sua relativa estabilidade ao longo dos anos. WW. Tendo as quotas estimadas pela P------ natureza e âmbito inteiramente distintos dos das quotas de mercado solicitadas à M------ pela AdC, a divulgação das primeiras na Apresentação comunicada à CMVM em nada interfere com a natureza secreta das segundas, que permanecem no conhecimento de um número restrito de pessoas. XX. A divulgação pública das quotas calculadas internamente pela M------ é susceptível de afectar a capacidade competitiva da empresa, na medida em que o conhecimento da posição de mercado precisa da M------ confere uma vantagem a terceiros (em particular, a operadores concorrentes), os quais, na ausência de tais quotas, não teriam possibilidade de conhecer, com o mesmo grau de certeza, a posição de mercado ocupada pela M------. YY. É, de resto, por esta razão que tanto as orientações da Comissão Europeia como da própria AdC reconhecem expressamente que as quotas de mercado não acessíveis publicamente constituem segredos de negócio ~ e se toma. por conseguinte, necessário substituí-las por intervalos, através da preparação de versões não confidenciais. ZZ. Importa pois concluir que (i) as quotas de mercado preparadas internamente pela M------ constituem segredos de negócio, para os efeitos do artigo 30.º da LdC, e que, por isso, (ii) o TCRS cometeu um erro de direito ao rejeitar a sua confidencialidade. b) Os detalhes de vendas por produto/mercado e em função do tipo de marca em causa (MDF ou MDD). AAA. A Sentença ora recorrida rejeitou igualmente a VNC da resposta da M------ à questão 5 do pedido de informações constante do ofício S-AdC/201811548, que contém o detalhe das suas vendas em cada um dos anos de 2010 a 2017. desagregadas por produtos e desagregadas ainda, ano-a-ano e conforme se trata de vendas de produtos MDF e vendas de produtos MDD), por considerar que os intervalos propostos peja M------ «são demasiado desajustados face à realidade que se visa ocultar». BBB. A decisão recorrida não questiona que a informação sobre as vendas anuais da M------ em causa constitui segredo de negócio, nos termos e para os efeitos do artigo 30.0 da LdC. CCC. Os intervalos apresentados são aqueles que permitem a preservação da natureza sensível da informação em causa e/ou prevenir o dano associado ao conhecimento dessa informação pelos seus concorrentes e pelo Co-visado seu fornecedor. DDD. No que respeita em particular ao detalhe sobre as vendas de produtos MDF e de produtos MDD, é nos próprios valores que reside a vantagem competitiva da M------, pelo que a sua revelação, mesmo em intervalos eventualmente mais próximos, é susceptível de destruir a capacidade competitiva acrescida da M------ que é protegida pelo segredo de negócio. EEE. Em particular, a revelação de tais dados em intervalos eventualmente mais curtos - intervalos esses que nem a AdC, nem o Tribunal, identificaram ou procuraram concretizar, nem mesmo através de exemplos - poderia colocar a M------ em desvantagem competitiva perante os seus concorrentes, pois permitiria dar a conhecer, relativamente a cada um dos produtos ou categorias de produtos em causa, a opção ou decisão da M------ de apostar ou não, em cada ano, em produtos de marca de distribuidor versus marca de fornecedor e o maior ou menor sucesso das suas vendas em mercados determinados. FFF. Do mesmo modo, a divulgação ao Co- Visado seu fornecedor destes dados, em intervalos eventualmente mais curtos, seria igualmente lesiva dos interesses da M------, na medida em que permitiria a esse fornecedor inferir automaticamente qual o peso de fornecedores concorrentes e de MDD, em cada ano, nas vendas da M------ e, bem assim, revelar aspectos da estratégia e aposta comercial da M------ nos produtos em questão, o que poderia e pode enfraquecer a posição e força negocia! da M------ face a este seu fornecedor. GGG. Ao considerar que, para salvaguardar o segredo de negócio resultante da informação sobre as vendas anuais, nos termos e para os efeitos do artigo 30.º da LdC, a ora Recorrente não necessitaria de ter apresentado intervalos tão latos, a Sentença incorreu em erro de direito. Nestes termos e nos demais de direito aplicável, deverá ser declarado integralmente procedente o presente recurso e, em consequência, ser: a) (…). b) Revogada a decisão recorrida e substituída por outra que permita à Visada juntar novas VNC dos documentos referidos no parágrafo 47, (i) a (iii) do presente recurso, que ocultem a informação que o Tribunal considerou confidencial e revelem a informação que o Tribunal considerou não confidencial; e/ou c) Quanto ao mais, ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que admita, total ou parcialmente, as VNC apresentadas pela Recorrente e identificadas no Capítulo IV do presente recurso. ». *** Contra-alegou o MP, no sentido da improcedência do recurso. Mais contra-alegou a AdC, concluindo as alegações nos seguintes termos: «(i) Questão prévia: do efeito do presente recurso (…) (ii) Objeto do presente recurso Y. O presente recurso tem, pois, por objeto a Sentença proferida pelo Tribunal a quo em 7 de junho de 2019, invocando a Recorrente que incorreu em erro na aplicação do direito por duas razões de ordens: (i) entendeu que, apesar de certos excertos da informação contida na VNC apresentadas pela recorrente estarem - ou poderem estar- efetivamente abrangidos por segredo de negócio, a circunstância de haver apenas um ou mais segmentos desses documentos não merecedores dessa tutela permitiria ou legitimaria a sua divulgação integral; e (ii) considerou não abrangidas por segredo comercial informações que manifestamente o são. Z. Como se verá de seguida, a Sentença recorrida não se encontra ferida de qualquer vício suscetível de determinar a sua revogação, inexistindo qualquer nulidade, omissão de pronúncia ou qualquer erro na aplicação do direito. (iii) Do procedimento de confidencialidades seguido pela AdC AA. Por um lado, nos termos do artigo 30.° da Lei da Concorrência, a AdC tem o dever de acautelar o legítimo interesse dos visados na não divulgação dos seus segredos de negócio. BB. Por outro lado, de acordo com o n.º 1 do artigo 32.° da Lei da Concorrência o processo é, em regra, público e, ainda que nos termos e nos limites dispostos no artigo 33.° da Lei da Concorrência, (todos) os visados num processo de contraordenação têm acesso ao processo para efeitos de exercício dos seus direitos de defesa. CC. Daqui resulta, portanto, que a ponderação entre o direito ao segredo de negócio, por um lado e, por outro, o direito de defesa, deve ser casuística e fundadamente ponderada pela AdC. (cfr. parágrafo 17 da sentença). DD. Ora, prevê o n.º 2 e n.º 3 do artigo 30.° da Lei da Concorrência que, após a apreensão de elementos ou quando pretenda a AdC juntar ao processo determinados documentos, notifica o visado e respetivo titular dos mesmos para identificar, de maneira fundamentada, as informações recolhidas que considere confidenciais por motivo de segredo de negócio (juntando, sendo esse o caso, uma versão não confidencial, já expurgada das respetivas confidencial idades), o que sucedeu no caso concreto. EE. Neste sentido, dos n.ºs 2 e 4 do artigo 30.° da Lei da Concorrência decorrem, para os visados titulares de informações confidenciais, "três ónus (. . .) sob pena de ficarem sujeitos à cominação legal de classificação das informações como não confidenciais. Tais ónus são: (i) ónus de identificação das informações que considera confidencias; (ii) ónus de fundamentação de tal identificação; (iii) e ónus de fornecimento de uma cópia não confidencial dos documentos que contenham informações confidenciais expurga das das mesmas." (cf. Sentença proferida pelo TCRS, no âmbito do Processo n. o 194/16.3YUSTR; e parágrafo 42 da sentença ora recorrida). FF. Ou seja, por um lado, para que a AdC deva, ao abrigo da lei, acautelar eventuais segredos de negócio, cabe ao interessado, colaborando com aquela, fundamentar o respetivo pedido de proteção de confidencialidades. GG. Concretizando, cabe ao titular do segredo de negócio explicar à AdC as razões para aquelas informações não poderem ser divulgadas e qual o prejuízo daí decorrente para a Recorrente, uma vez que o tratamento como confidencial dessa informação implica um desvio à regra da publicidade do processo. HH. Dito de outro modo e olhando para o caso concreto: perante um conjunto de documentos (v.g., identificação de cargos de administração ou direção, volumes de vendas, etc.) a empresa tem de ser capaz de explicar que essa informacão é reservada, foi sempre tratada como reservada e que sendo divulgada lhe pode causar prejuízo sério. Não existe uma confidencialidade automática em função da temática; existe um ónus de fundamentação. II. A Recorrente requereu a proteção como confidencial de um conjunto de informação facultada à AdC na sequência de pedidos de elementos, num processo de contraordenação que tem em regra natureza pública e em que existem co-Visados. Nos termos da lei, cabe à empresa explicar e demonstrar de forma clara as razões para que essa informação deva fundamentar um desvio à regra da publicidade e cabe à AdC avaliar a suficiência dessa fundamentação. JJ. Por outro lado, e sempre assumindo que a fundamentação do tratamento confidencial está suficientemente completa, a Lei da Concorrência determina ainda que a confidencialidade requerida só pode ser aceite se as versões não confidenciais apresentadas pela empresa permitirem apreender o teor da informação confidencial suprimida. KK. Daqui decorre a obrigatoriedade de a empresa fornecer uma breve descrição ou resumo das informações suprimidas. LL. Neste sentido, a AdC fornece às empresas orientações (víde anexo 2 ao ofício S- AdC/2018/1548 de 3 de julho de 2018) para a identificação fundamentada de informações confidenciais nos termos da Lei da Concorrência, o que sucedeu no caso concreto e está em anexo a todos os pedidos de informação da AdC (consistindo num conjunto de orientações bastante concretas sobre a necessidade de se explicar o caráter secreto de uma informação, o valor comercial dessa informação por ser secreta, as diligências adotadas pela empresa para preservar o caráter secreto da informação e o prejuízo concreto adveniente para a empresa da divulgação desses segredos). MM. Esta metodologia visa, nomeadamente, a uniformização do tratamento de confidencialidades por parte da AdC, para que desse modo se acautele a transparência na sua interação com todas as empresas visadas em processos contraordenacionais. NN. Nos ofícios enviados à Autora a AdC especifica como deve ser fundamentada a confidencialidade. No caso concreto, e como decorre das diversas tabelas de proteção de confidencial idade, a AdC justifica o motivo de indeferimento: falta/insuficiência de fundamentação dada pela empresa visada, ou falta/insuficiência de descritivo. OO. Ora, resulta óbvio que aquelas tabelas (juntas em anexo em CD) devem ser lidas juntamente com o ofício relativamente ao qual são anexadas para daí se retirar a justificação da decisão da AdC. PP. Assim, a AdC considera que a "confidencialidade" assinalada pela Recorrente padece de falta/insuficiência de fundamentação porquanto, não explicita a razão pela qual a informação em causa constitui alegadamente segredo de negócio. QQ. Nomeadamente, não esclarece que a informação não constitui segredo de negócio ou outro tipo de segredo por: (i) Não ser secreta; (ii) Não ter valor comercial por ser secreta; (iii) Não ter sido objeto de diligências consideráveis para a manter secreta; (iv) Não ter ficado demonstrado pela empresa que a sua divulgação pública ou mera transmissão a pessoas diferentes daquelas que as forneceram ou que delas tenham conhecimento (por exemplo, Co-visadas no processo contraordenacional) é suscetível de lesar gravemente os interesses da empresa. RR. Por outro lado, a AdC considerou também que a confidencialidade assinalada padece de falta/insuficiência de descritivo por entender que o sumário ou a descrição resumida da informação suprimida não permitia apreender o seu conteúdo e matéria. SS. Por último, a AdC deferiu provisoriamente, ainda, os pedidos de confidencialidades nas situações em que a empresa, em manifesto incumprimento das diretrizes fornecidas, suprimiu dos documentos informação respeitante à identificação de pessoas singulares visadas pelo processo, nomeadamente cargos ou área e empresas aos quais pertenciam mesmo quando essa informação não consta do original, mas sem a qual não é possível apreender o sujeito do email. TT. Assim, se as versões não confidenciais entregues não estiverem de acordo com as orientações fornecidas pela AdC, isto é, se a informação classificada como confidencial não constituir efetivamente segredo de negócio, ou se o descritivo não corresponder ao segmento de informação considerado confidencial não permitindo intuir o teor ou a realidade de tal informação, a AdC levanta a confidencialidade de todo o documento, independentemente de alguma informação daquele documento constituir segredo de negócio. UU. Importa, por último, referir, que a AdC não considera informação confidencial se efetivamente a empresa não enviar pedidos de proteção de confidencialidades, uma vez que não procede ao tratamento de qualquer documento ou informação constante do processo, sendo tal ónus adstrito à própria empresa visada. VV. Em conclusão, não se pode deixar de dar nota que foram dadas três possibilidades à Recorrente de envio de pedidos de proteção de confidencialidades, sem, todavia, nenhum estar de acordo com as diretrizes constantes dos ofícios da AdC, sendo manifesta e reiterada a posição da Recorrente em não colaborar com a AdC. WW. Como resulta dos autos a empresa teve várias interações com a AdC e várias possibilidades de apresentar e tentar melhorar a fundamentação para os pedidos de confidencialidade, mais tendo sido transmitidas indicações claras por parte da AdC sobre casos concretos de insuficiência de fundamentação antes de uma qualquer decisão final. Não foi todavia possível identificar na argumentação apresentada pela empresa nos diferentes momentos, e considerando desde logo as orientações transmitidas pela AdC para facilitar o cumprimento do disposto no artigo 32.º da Lei da Concorrência, fundamentos bastantes para considerar aqueles documentos em concreto como confidenciais por conterem segredos de negócio. XX. Com efeito, a AdC apenas tem o dever de permitir às empresas que identifiquem a informação confidencial constante no processo, uma única vez. Não obstante, a AdC, numa segunda tentativa, permite às empresas que se pronunciem sobre o tratamento do pedido de confidencialidades apresentado e apresentem novas versões não confidenciais dos documentos em função do seu tratamento e das suas diretrizes. E, por fim, num terceiro momento, no qual decide definitivamente sobre o tratamento do pedido de confidencial idades, ainda permite às empresas que apresentem versões não confidenciais dos documentos de acordo com a sua decisão final. YY. Ora, depreende-se um claro empenho da AdC em acautelar quer o direito ao segredo de negócio da visada, quer os direitos de defesa das co-Visadas. ZZ. Por fim, importa referir que a análise crítica e consequente aceitação ou não dos pedidos de proteção de confidencialidade por parte das empresas é um momento processual crucial na marcha do processo porquanto a decisão quanto a esta matéria terá impacto significativo nos momentos posteriores do processo, designadamente na fase do exercício dos direitos de defesa das co-Visadas. AAA. Ao contrário do que a Recorrente pretende fazer crer, as decisões que a AdC toma quanto a matéria de confidencial idades e de proteção de segredos de negócio não são concretizadas de ânimo leve. Note-se que para a AdC, em termos de envolvimento no processo de classificação de confidencialidades, seria imensamente mais fácil aceitar acriticamente os pedidos de proteção tal como apresentados pelas empresas visadas, reduzindo significativamente os níveis de litigância de decisão interlocutória. BBB. Sucede que a posição que a AdC adotar neste processo de classificação vai refletir-se diretamente no exercício de direitos de defesa das co-Visadas, designadamente quando pretenderem aceder ao processo. CCC. Com efeito, e não obstante a nova redação do n.º 4 do artigo 33.º da Lei da Concorrência que passa a tratar de forma indiferenciada a documentação classificada como confidencial (inculpatória ou exculpatória), a verdade é que o acesso a informação confidencial para exercício de direitos de defesa por parte da empresa fica bastante condicionado. Deste modo, e sem prejuízo de a AdC dever acautelar o interesse legítimo das empresas na não divulgação dos seus segredos de negócio, a AdC não pode ignorar o impacto que essa proteção vai ter nos direitos de defesa das outras visadas pelo processo contraordenacional. DDD. O rigor e a fundamentação que a AdC exige às empresas no procedimento de proteção de confidencialidades são necessários, adequados e proporcionais à proteção dos direitos de defesa das demais empresas visadas no processo. EEE. Seguramente que a Recorrente reconhecerá que quando pretender aceder à informação das empresas co-Visadas no presente processo contraordenacional para efeitos de exercício dos seus direitos de defesa, é distinto ter de aceder por intermédio do seu mandatário a informação integralmente confidencial nas instalações da AdC ou poder aceder livremente a essa informação através de cópias ou através de versões não confidenciais. FFF. Está em causa, pois, um equilíbrio que recai sobre a AdC assegurar entre proteção de segredos de negócio e direitos de defesa. Esse equilíbrio não é, no entanto, alcançado caso a AdC aceite a classificação de confidencialidades proposta pela Recorrente M------, não devendo confundir-se rigor e exigência de fundamentação com "arbitrariedade" ou "ilegalidade" (iv) Dos limites ao reexame de mérito por parte do Tribunal GGG. A Recorrente alega que o Tribunal a quo ao pronunciar-se sobre a confidencialidade de alguns documentos, incorreu em erro no que respeita aos seus poderes e deveres de cognição: Considerou que o facto de uma concreta VNC conter informação não confidencial ocultada imporia a divulgação integral da respetiva informação confidencial, mesmo que nela constasse informação que o próprio Tribunal a quo reconheceu ser confidencial. HHH. Com efeito, a Recorrente afirma que o Tribunal a quo, confrontado com a VNC que ocultava, simultaneamente, matéria considerada confidencial e matéria considerada não confidencial, entendeu que toda a VNC seria integralmente inadmissível, impondo-se a divulgação de toda a versão confidencial dos documentos. III. A Recorrente alega que a solução mais correta seria a de que "reconhecendo o mérito parcial da pretensão da recorrente, deve adaptar o seu sentido decisório à solução que melhor compatibilize os interesses em confronto e que reduza a lesão de direitos fundamentais [. .. r Posição da AdC JJJ. A decisão recorrida (cfr. parágrafo 62) decisão corrobora o entendimento da decisão final da AdC. Conforme explicitado supra se num documento existir segmentos de informação classificados como confidenciais e efetivamente não o forem ou os seus descritivos não permitem intuir o seu conteúdo, a AdC levanta a confidencialidade de todo o documento, considerando-se não confidencial. KKK. Esta consequência resulta do n.º 4 do artigo 30.º da Lei da Concorrência, em concreto do ónus de fornecer cópia não confidencial dos documentos que contenham as informações confidenciais, expurgada das mesmas. LLL. A AdC concede três oportunidades às visadas para apresentarem os pedidos de proteção de confidencialidades: num primeiro momento concede as orientações necessárias para realizarem o tratamento de confidencialidades; num segundo momento envia um sentido provisório da decisão desse tratamento dando oportunidade às visadas de apresentarem as versões conforme o entendimento da AdC em caso de discordância com as orientações fornecidas; e, ainda, por fim, num terceiro momento e após decisão final, concede prazo para apresentar novas versões não confidenciais em consonância com tal decisão. MMM. Após estas oportunidades concedidas pela AdC, se num documento considerado parcialmente confidencial, a sua versão não confidencial é apresentada de forma errada, ocultando informação que a AdC considerou não constituir segredo de negócio ou o descritivo apresentado não permitir intuir o teor da informação expurgada, a única consequência possível é o levantamento da confidencialidade de todo o documento, uma vez que a AdC tem como princípio não modificar o tratamento de confidencial idades dos documentos do processo, cabendo esse ónus só e apenas às empresas visadas de acordo com o n.º 2 e 3 do artigo 30.º da Lei da Concorrência. NNN. Neste sentido, andou bem o Tribunal ao não admitir a confidencialidade de documentos, cujas versões não confidenciais são suscetíveis de conter informação ocultada que não deveria ser, levantando em consequência a confidencialidade total do documento, não incorrendo em qualquer erro. (v) Das confidencialidades a) As quotas de mercado OOO.A Recorrente alega que o Tribunal a quo incorreu em erro de direito ao rejeitar a confidencialidade das quotas de mercado preparadas internamente pela M------, uma vez que esta informação constitui segredo de negócio à luz do artigo 30.º da Lei da Concorrência. Posição da AdC PPP. O Tribunal a quo considerou que "Face aos elementos juntos a fis. 547 (notícia do Jornal Económico) e a fis. 549 (apresentação da S------) terá de se concluir pela não demonstração da natureza secreta desta informação. É certo que pode não haver inteira sobreposição e que tais quotas publicamente divulga das podem não ser exatas. Contudo, há pelo menos, razões para se duvidar da alegação da Recorrente, sendo, nesta medida, insuficiente.”. QQQ. Efetivamente o Tribunal a quo entendeu ter sido ilidida a presunção de que as quotas de mercado constituem, em regra, segredo de negócio, ao juntar-se elementos que permitem duvidar da fundamentação fornecida pela Recorrente para caracterizar tal informação como confidencial. RRR. Acresce que esta informação é bastante importante para garantia de direitos de defesa das co-Visadas no processo de contraordenação em causa, de modo a percecionar a capacidade da M------ em pressionar os seus fornecedores. SSS. Deste modo, conclui-se que a sentença recorrida não padece de qualquer erro na apreciação do direito. b) Os detalhes de vendas por produto/mercado e em função do tipo de marca em causa (MOF ou MOO) TTT. A Recorrente alega que a sentença recorrida incorreu em erro de direto, uma vez que considerou que a informação sobre vendas anuais deveria ter sido apresentado em intervalos de valor condizentes com a realidade ocultada, violando, deste modo, o artigo 30.º da Lei da Concorrência. Posição da AdC UUU. A AdC considerou, na sua decisão, que a informação sobre vendas anuais da M------ em causa, incluindo a destrinça conforme se trata de vendas de produtos MDF (marca de fornecedor) e vendas de produtos MOO (marca própria), constitui efetivamente segredo de negócio para efeitos do disposto no artigo 30.º da Lei da Concorrência. VVV. Não obstante, a AdC indeferiu o pedido de proteção de confidencialidades por falta/insuficiência de descritivo uma vez que os intervalos de valores utilizados não permitiam intuir a realidade da informação ocultada. WWW. Ora, conforme explicitado supra, a utilização deste intervalo deve permitir intuir e comparar a dimensão dos diversos mercados apresentados. Veja-se por exemplo a comparação do volume de vendas para o mercado de cerveja em 2016 para marcas de fabricante e marcas de distribuidor (resposta de 18 de setembro de 2018 - resposta à questão 5), no qual o primeiro apresenta um valor correspondente a €427.716 e o segundo apresenta um valor correspondente a €44.447.263. Para ambos os casos a Recorrente utiliza o mesmo intervalo genérico de valor de < 50.000.000€], sendo o intervalo apresentado revelador de um critério perfeitamente genérico e arbitrário, não permitindo sequer, como se verifica, retirar uma perceção real do valor em causa. Acresce que para valores inexistentes, a Recorrente, da mesma forma, indica o mesmo intervalo de valor ([< 50.000.000€]), dando uma errada perceção de que o volume de negócios em determinado mercado é não nulo (vide por exemplo o mercado sidras na marca de distribuidor para os anos 2015 e 2016 (resposta de 18 de setembro de 2018 - resposta à questão 5). Em síntese, para valores manifestamente díspares e, portanto, realidades numéricas completamente distintas, a Recorrente apresenta invariavelmente o mesmo intervalo numérico: entre 0 e 50.000.000 €. XXX. Sem prejuízo dos inúmeros esclarecimentos e oportunidades fornecidas à Recorrente para apresentar este tipo de informação de acordo com as orientações da AdC, aquela em completa desconsideração e falta de colaboração insistiu em apresentar VNC em desconformidade com o indicado, em violação do terceiro ónus que a lei lhe impõe, pelo que a consequência foi o levantamento da confidencialidade integral do documento. YYY. O Tribunal a quo corroborou o entendimento da AdC numa dupla vertente: que a informação em causa constitui segredo de negócio; não obstante, os valores indicados pela M------ não se coadunam com a realidade ocultada, cfr. parágrafo 82. ZZZ. E, ainda, fundamenta de forma bastante clara o seu entendimento : “Da fundamentação da Recorrente não se consegue compreender porque é que o conhecimento da sua posição competitiva em relação a cada um dos produtos de forma mais aproximada lhe causará um prejuízo sério. Quanto à estratégia comercial, a utilização de intervalos mais curtos demonstrará uma diferença significativa entre produtos MDF e MDD, é verdade. Contudo, ainda que se reconheça alguma importância a essa informação, o certo é que daí não se retira necessariamente uma estratégia específica da Recorrente responsável por essa diferença.” AAAA. Assim entendeu o Tribunal a quo, que o ónus de fundamentação apresentada pela Recorrente para o fornecimento de tais intervalos de valores tao desconformes com a realidade, não se verifica no caso em apreço, pelo que não incorreu em qualquer erro na aplicação do direito, designadamente do artigo 30.º da Lei da Concorrência. BBBB. Por fim, importa referir que da factualidade em apreço (vejam-se as tabelas enviadas em anexo ao ofício da AdC com a referência S-AdC/2019/439) resulta evidente que a Recorrente não cumpriu, da forma detalhada que se lhe impunha, o ónus de identificação e fundamentação que impunha a classificação como confidencial da documentação junta aos autos e que, sem esse ónus devidamente cumprido, não tem sequer base legal a Recorrente para deferir o tratamento confidencial: recorda-se que, por outro lado, esse tratamento confidencial restringirá a publicidade do processo e os direitos de defesa dos demais visados. CCCC. De resto, e como está bom de ver, a AdC, enquanto entidade administrativa independente, não tem qualquer interesse em indeferir, sem mais, os pedidos de tratamento confidencial ou de tornar públicos segredos de negócio: o que a AdC tem é de, em estrita observância da lei, ponderar casuisticamente os direitos em confronto para, em face dos elementos e fundamentos que os visados disponibilizam, então sim restringir os respetivos direitos de defesa de forma proporcional, adequada e necessária. DDDD. Donde é forçoso concluir que, face às respostas que a Recorrente foi prestando à AdC, entre 17.07.2018 e 14.02.2019, não se encontra devidamente identificada e/ou fundamentada a existência de um segredo de negócio ao qual a Requerente possa conceder tratamento confidencial à luz do artigo 30.º da Lei da Concorrência, sem prejuízo de a Requerente ter tido diferentes oportunidades para suprir as falhas apontadas ao pedido de classificação de informação como confidencial. EEEE. Efetivamente, não se pode confundir (como pretende a Recorrente com os exemplos contantes das suas alegações) uma descrição sobre o teor de determinado documento, acompanhada de preocupações sobre a divulgação de determinada informação, com a fundamentação do caráter secreto ou confidencial dessa informação. FFFF. Conclui-se, deste modo, que a decisão recorrida deve manter-se, e o recurso ser considerado totalmente improcedente. Nestes termos, e nos melhores de direito que V.Exas doutamente suprirão, não deve ser dado provimento ao recurso, mantendo-se na íntegra a sentença recorrida.». *** Nesta instância, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta escreveu “visto”. *** II- Questões a decidir: Do artº 412º/1, do CPP resulta que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente, definem as questões a decidir em cada caso ([1]), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso ([2]). A questão colocada em sede de motivação de recurso e respectivas conclusões, relativa ao efeito do recurso agora em análise não se reporta à decisão recorrida. É uma questão da exclusiva competência do relator (artigo 417º/7-a) do CPP) e mostra-se decidida no despacho de recebimento do presente recurso, motivo pelo qual não é objecto de análise e decisão nesta sede. A questão colocada pela recorrente é a discordância com a decisão recorrida na medida em que: - Promoveu a divulgação de todas as VNC com fundamento no argumento de que basta um dos segmentos ocultados não ser confidencial para tudo ter de ser divulgado (incluindo segmentos que o próprio Tribunal considera estarem abrangidos por segredo de negócio); - Considerou não abrangidas por segredo comercial informações que a recorrente entende que o são. *** III- Fundamentação de facto: Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes os factos: a.No âmbito de um processo de contraordenação - com o n.° PRC/2016/4 -, a AdC apreendeu 6 mensagens de correio electrónico nas instalações da Recorrente, sitas na E------, 762, -------, Porto e 2974 mensagens de correio electrónico em instalações da Recorrente, sitas na O------, 118, -----, ----- Carnaxide (cf. fls. 268 a 310). b. Desde então, a AdC ordenou a extracção de certidão do acervo probatório constante do referido processo para subsequente integração em pelo menos 6 (seis) outros processos contra-ordenacionais, nomeadamente o processo PRC/2017/13 (cf. As. 268 a 310). c. No âmbito deste PRC/2017/13 e com relevo no contexto da decisão recorrida, a Recorrente apresentou àquela Autoridade, no dia 10 de Julho, em resposta a pedido de informações notificado por Ofício S- AdC/2018/1548 - PRC 2017/13 de 03.07.2018 um pedido de esclarecimentos (cfr. Pedido de esclarecimentos relativamente ao pedido de informações no processo PRC 2017/13, de 10.07.2018, de ora em diante apenas “Pedido da M------ de 10 de Julho) - cuja cópia consta a fls. 319 dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor. d. E respondeu ao referido Ofício S-AdC/2018/1548 - PRC 2017/13, em primeiro lugar e a título parcial, por comunicação remetida à AdC a 17 de Julho (Resposta da M------ de 17 de Julho) na sua Versão-Confidencial, tendo a VNC respectiva sido apresentada a 18 de Julho, cujas cópias constam a fls. 325 a 359 e fls. 361 a 366, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor; e. Posteriormente, a Recorrente remeteu à AdC informação complementar à resposta anteriormente dada, nas suas versões confidencial e não- confidencial, nos dias (i) 18 de Julho (Resposta complementar de 18 de Julho), cuja cópia consta a fls. 361 a 366, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor, (ii) 25 de Julho (Resposta complementar de 25 de Julho), cuja cópia consta a fls. 368 a 386 (iii) 16 de Agosto (Resposta complementar de 16 de Agosto), cuja cópia consta a fls. 412 a 417, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor (iv) 18 de Setembro (Resposta complementar de 18 de Setembro), cuja cópia consta a fls. 419 a 429, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor, e (v), por fim, a 1 de Outubro não sendo porém, esta última, alvo de análise na Pronúncia. f. Paralelamente às comunicações acima referidas, a Recorrente remeteu ainda, em 13 de Agosto, à AdC, no âmbito deste PRC/2017/13, um Requerimento relativo à não divulgação de comunicados ou notícias neste processo e à sujeição do mesmo a segredo de justiça, nas suas versões confidencial e não confidencial (cfr. Requerimento da M------ apresentado à AdC relativo à não divulgação de comunicado, de 13.08.2018, de ora em diante apenas Requerimento da M------ de 13 de Agosto, cuja cópia consta a fls. 395 a 410 dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor). g. E, ainda, respondeu ao Ofício S-AdC 2018/1899 - PRC 2017/13 com pedido de elementos relativo a Co-Visada ex-trabalhadora da M------, resposta essa apresentada nas suas versões confidencial e não-confidencial no passado dia 20 de Agosto (Resposta da M------ de 20 de Agosto), cuja cópia consta a fls. 431 e 432, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor e complementada a 27 de Setembro com dados entretanto obtidos, não sendo, porém, esta última, alvo de análise no recurso. h. A Recorrente foi notificada, a 24 de Setembro, do ofício S-AdC/2018/2375 - PRC/2017/13, no qual a AdC lhe comunicou a sua posição relativamente às versões não-confidenciais dos documentos acima referidos (com exclusão dos que não são alvo de análise no recurso), cuja cópia consta a fls. 3445 e 3446. i. Decorre do texto e das notas de rodapé de página do referido ofício que são Co-Visados, no PRC/2017/13 a sociedade S------, S.A. (“S------”), fornecedora da Requerente, e, bem assim, as sociedades P------, S.A., A------, S.A. e I------, S.A., todas sociedades concorrentes da Requerente e ainda as seguintes pessoas singulares: P------, J------, M--- (estes colaboradores da S------), T------, D------, (colaboradores da aqui Recorrente) e H------, antiga colaboradora da aqui Recorrente (conjuntamente designados nesta peça por “Co-Visados”). j. No referido ofício, a AdC concedeu à recorrente prazo para (i) se pronunciar sobre as intenções de não qualificar as informações como segredo de negócio comunicadas, por alegada “falta de fundamentação” da confidencialidade respectiva, (ii) reformular as descrições resumidas (“descritivo”) das passagens truncadas não aceites pela AdC por insuficiência de descritivo e (iii) apresentar versão revista dos documentos respectivos tendo em conta a reformulação referida em (ii). k. A Recorrente apresentou no dia 25 de Outubro uma resposta (parcial) ao referido ofício relativamente a Co-Visados (de ora em diante Resposta da M------ de 25 de Outubro), cuja cópia consta a fls. 437 e no suporte de gravação de fls. 563, pasta “Anexo Documento n.° 17”, acompanhada de um pedido de esclarecimentos relativamente à (i) razão de ser de diferentes motivos de indeferimento aplicáveis a situações equivalentes e (ii) quanto à abordagem a seguir, em sede de preparação de VNC, na truncatura de informação quantitativa ou outra de elevado grau de sensibilidade, pedido de esclarecimentos que veio a ser respondido pela AdC no que respeita ao ponto (ii) no dia 5 de Novembro por Ofício S-AdC/2018/2759 PRC2017/13, cuja cópia consta a fls. 440. l. A 5 de Novembro, a Recorrente remeteu à AdC uma versão rectificada dos elementos remetidos a 25 de Outubro no que se refere (apenas) à resposta a Pedidos de Elementos para Co-Visados (Rectificação da M------ de 5 de Novembro), cuja cópia consta a fls. 442 e no suporte de gravação de fls. 563, pasta “Anexo Documento n.° 19”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. m. No dia 7 de Novembro, a M------ remeteu à AdC a sua resposta ao ofício S- AdC/2018/2375 - PRC/2017/13 relativamente a Terceiros (Resposta da M------ de 7 de Novembro), incorporando já as alterações necessária para acomodar tais VNCs à resposta recebida da AdC por Ofício S-AdC/2018/2759 - PRC2017/13, cuja cópia consta a fls. 445 e no suporte de gravação de fls. 563, pasta “Anexo Documento n.° 20”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. n. No dia 8 de Novembro a Recorrente apresentou, ainda, em complemento da sua resposta de 25 de outubro, versões revistas das VNCs destinadas a adequar as mesmas ao Ofício S-AdC/2018/2759 - PRC2017/13, cuja cópia consta a fls. 448 a 504, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu conteúdo. o. A Recorrente foi notificada, no dia 7 de Fevereiro, da pronúncia final da AdC quanto às confidencialidades dos referidos documentos relativamente a Co-Visados e a Terceiros (cfr. Ofício S-AdC 2019/439 - PRC 2017/13), pronúncia essa que é objecto do presente recurso e que se mostra junta a fls. 506-507 e no suporte de gravação de fls. 563, pasta “Anexo Documento n.° 22”. p. O sentido preliminar e definitivo da posição da AdC encontra-se vertido nos ficheiros Excel anexos ao Ofício S-AdC 2019/439 - PRC 2017/13, de 7.02.2019, a saber, o Excel “PRC201713_ M------_ Confidencialidades_ Respostas PE_Co-Visadas_DF” (Excel PE Co-Visadas”) e o Excel “PRC201713_M------_ Confidencialidades_ Respostas PE_Terceiros DF” (Excel PE Terceiros”), cada um deles composto por uma folha de cálculo intitulada “M------”, que constam na pasta referida no ponto precedente. q. Os referidos ficheiros Excel contêm também as justificações de confidencialidades apresentadas pela Recorrente. r. A folha de cálculo segue uma estrutura básica contendo, em cada linha, os segmentos de documentos concretamente em causa sobre os quais a AdC se pronunciou e, em cada coluna, detalhes da identificação adicional do segmento em causa (ex.: assunto, data de entrada na AdC, confidencialidade assinalada) e as respectivas posições quanto à confidencialidade assinalada, adoptadas pela Recorrente e pela AdC e apresentadas sucessivamente mediante a adição de novas colunas no documento, em função das interacções ocorridas entre a Recorrente e a AdC. s. Com relevo para o que aqui nos interessa, cumpre salientar a coluna E do referido Excel de 7 de Fevereiro, com o título “Confidencialidade assinalada”, que identifica o segmento concretamente em causa, ou seja, o segmento que a Recorrente se propôs truncar como confidencial e sobre o qual a AdC se pronuncia. t. Na mesma folha e ficheiro, as colunas F e G, com os títulos “Motivo do indeferimento” e “Descritivo”, contêm as objecções preliminarmente suscitadas pela AdC à qualificação de confidencialidade da Recorrente. u. E nas colunas seguintes - H e I -, com os títulos “Co-Visados” e “Terceiros”, a AdC apôs indicação sobre se se trata de informação que a AdC reputa, preliminarmente, de confidencial ou não-confidencial face a cada um daqueles leques de entidades. v. Das colunas J e K, sob os títulos “Tipo de Intervenção” e “Fundamentação adicional de confidencialidade” consta o trabalho de densificação adicional das confidencialidades efectuado pela Recorrente e remetido à AdC em 25.10.2018 (quanto ao Excel PE Co-Visadas) e em 7.11.2018 (quanto ao Excel PE terceiros), sendo de salientar que, de entre essas colunas, na coluna J, “Tipo de Intervenção” regista-se, como o próprio nome indica, se foi ou não efectuada, em sede de resposta à AdC, alguma alteração sobre a VNC originalmente apresentada, e a coluna K, “Fundamentação adicional confidencialidade”, explicita a justificação adicional aduzida para sustentar a confidencialidade do documento ou segmento de documento em causa. w. Seguem-se, por fim, as colunas L e M, com os títulos “Deferido” e “Decisão AdC Co-Visados”, sendo de salientar que a coluna L contém a posição final da AdC sobre o pedido de proteção de confidencialidade aduzido pela Recorrente tendo em conta nomeadamente as clarificações trazidas pela justificação adicional de confidencialidades, e a coluna M contém informação sobre se o documento em causa será disponibilizado para efeitos de acesso ao processo por meio de obtenção de cópias na sua versão integral (mediante o preenchimento da coluna com “Não confidencial”), ou na sua versão parcialmente confidencial (mediante o preenchimento da coluna com “VNCI Aceite” ou “VNCF Aceite” ou ainda “VNCP Aceite” conforme se trate, respectivamente, da versão não confidencial inicial, da versão não confidencial final ou de versão não confidencial provisoriamente aceite pela AdC) ou ainda se o mesmo não será disponibilizado (mediante o preenchimento da coluna com “C” ou “Confidencial”), tudo conforme a Pronúncia de 7 de fevereiro. *** Factos não provados: Não há. *** IV- Fundamentação probatória: O Tribunal a quo justificou a aquisição probatória considerando o teor dos documentos em suporte de papel e informático, juntos aos autos. *** V- Fundamentos de direito: A primeira das questões colocadas – a determinação de divulgação de todas as VNC com fundamento de que basta um dos segmentos ocultados não ser confidencial para tudo ter de ser divulgado (incluindo segmentos que o próprio Tribunal considera estarem abrangidos por segredo de negócio) – reporta-se a três situações, segundo a recorrente, a saber: (i) À tabela 2 da VNC da Resposta da M------ de 16 de Agosto, tal como apresentada na Resposta da M------ de 8 de Novembro, que diz respeito ao detalhe das vendas da Recorrente no mercado da distribuição retalhista de bens alimentares para o período de 2003 a 2017 (cf. os parágrafos 76 e 150 da decisão recorrida); (ii) Aos nomes dos cinco principais fornecedores da M------ por produto/mercado, constantes das tabelas disponibilizadas à AdC nas Respostas da M------ de 25 de Julho e de 18 de Setembro (cf. os parágrafos 94 e 95 da decisão recorrida); e (iii) À substituição por siglas dos nomes dos colaboradores da M------ com responsabilidade de direcção, constantes da resposta da M------ de 17 de Julho e das VNC juntas com as respostas de 7 de Novembro e 8 de Novembro (cf. os parágrafos 137 e 150 da decisão recorrida). Pretende a recorrente que lhe seja dada novo oportunidade de juntar novas VNC que apenas ocultem a informação identificada pelo Tribunal como confidencial, com fundamento em que: 1- A decisão prejudica os direitos fundamentais da visada e sem qualquer interesse atendível que o justifique; 2- O Tribunal deve adaptar a solução que melhor compatibilize os interesses em confronto e que reduza a lesão de direitos fundamentais provocada por esses mesmos poderes públicos; 3- O princípio do pedido não se aplica ao processo contra-ordenacional na medida em que se tutelam interesses públicos e direitos fundamentais dos visados, cuja lesão, potencial e efectiva, decorre do exercício de poderes públicos. Vejamos: Na verdade a decisão recorrida considerou que, no que respeita às vendas no mercado retalhista de bens alimentares, a tabela 2 da VNC da Resposta complementar de 16 de Agosto, tal como apresentada na Resposta da M------ de 8 de Novembro, que diz respeito ao detalhe das vendas da Recorrente no mercado da distribuição retalhista de bens alimentares para o período de 2003 a 2017, «inclui elementos que, à luz de parâmetros de normalidade e razoabilidade que não foram postos em causa, merecem ser qualificados como segredos de negócio. É certo que em relação aos valores com antiguidade superior a cinco anos deve-se assumir, à partida, que perderam relevância e sensibilidade, tal como a AdC salienta nas suas alegações. Contudo, não se pode concluir nestes termos no caso em particular, considerando que a AdC aceitou a confidencialidade total em relação a Terceiros e não se encontram razões, neste plano, para se diferenciar os Terceiros dos Co-visados. Relativamente ao ónus de apresentação de versões não confidenciais, pese embora o argumento apresentado pela Recorrente, por comparação com a decisão da AdC relativamente à tabela - similar - apresentada na VNC junta com a Resposta Complementar de 17 de julho (cf. fls. 452 verso), não seja inteiramente procedente, porque não se trata da mesma informação, ainda assim não se encontram razões específicas para se concluir que os intervalos apresentados pela Visada não sejam adequados, nem permitam caracterizar o mercado do bem ou serviço em causa e a posição da Recorrente neste mercado. Por conseguinte, nesta parte assiste-lhe razão». É igualmente verdade que a sentença em recurso considerou, quanto ao detalhe de compras e vendas por cada um dos cinco principais fornecedores da Recorrente por produto/mercado, com detalhe quanto ao tipo de marca em causa (MDF ou MDD), relativos à pronúncia de 7 de Fevereiro, que abrange informação relativa ao detalhe de compras e de vendas a cada um dos cinco principais fornecedores da Recorrente em cada um dos mercados de cerveja, águas lisas sem sabor, águas com gás sem sabor, refrigerantes com gás, bebidas iced tea, sangrias e sidras em cada um dos anos de 2015 a 2017, desagregado por MDF e MDD, que no «caso concreto, há, pelo menos, um fornecedor da Recorrente que não consubstancia qualquer segredo, designadamente a S------. Contudo, o problema relativamente à informação em causa não estava apenas na revelação da identidade dos fornecedores, mas dos cinco principais fornecedores, com indicação de volumes de venda, permitindo perceber o seu posicionamento relativo, o que é informação claramente muito sensível. Nesta medida, concorda-se com a Recorrente no sentido de que deveria ser ocultada a identificação dos fornecedores». Também é verdade que a decisão recorrida, no que se reporta à identificação de colaboradores com responsabilidades de direcção e/ou fiscalização, dados relativos à distribuição de pelouros e organização interna da Recorrente, constante da resposta da M------ de 17 de Julho, entendeu que quanto «à proteção ao abrigo do regime de proteção de dados pessoais, a Recorrente tem razão no que respeita à substituição dos nomes por siglas, pois a demais informação - cargo, área e empresa - resulta do próprio documento. E tal procedimento pode ser utilizado não só em relação a Terceiros, como também relativamente aos Co-visados, sem prejuízo de relativamente a estes a informação ser divulgada caso seja necessário para o exercício do seu direito de defesa, não estando sujeita ao regime previsto no artigo 33.°, n.° 4, do NRJC». Contudo, ocorre que a par da fundamentação exarada para o não provimento da impugnação judicial de que tais «elementos constam em versões não confidenciais que contêm outros elementos truncados, não admitidos, pelo que não é possível o seu aproveitamento ainda que parcial» surge uma outra com absoluta relevância nesta fase do processo. É que os pedidos formulado nessa impugnação foram “apenas” os de que fossem admitidas, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 30.°, n.° do NRJC, as versões não confidenciais remetidas pela Recorrente com as comunicações de 13 de Agosto de 2018, de 20 de Agosto de 2018, de 05 de Novembro de 2018, de 07 de Novembro de 2018 e de 08 de Novembro de 2018, determinando-se, em consequência, que seriam essas as únicas versões a serem disponibilizadas pela AdC para efeitos de acesso ao processo pelos co-visados e por terceiros nos termos do disposto no artigo 33.°, respetivamente, n.°s 1 e 3, do NRJC. Ou seja, a pretensão agora colocada é nova e não foi objecto de qualquer decisão anterior. Ainda que a sentença recorrida se tenha debruçado sobre a questão de saber se é, ou não, possível a consideração como confidencial informação que contem elementos confidenciais e não confidenciais, o facto é que não apreciou pedido semelhante ao agora formulado. Só é devido recurso de decisões judiciais. Se bem que o Tribunal conheça sempre de direito, a ausência de decisão sobre determinada questão, impede o Tribunal de recurso de sobre ela se pronunciar por ser questão nova. Ora, a questão agora em apreço, colocada a este Tribunal, não foi objecto de decisão na instância recorrida. Não tendo sido proferida qualquer decisão que a abranja está precludida a possibilidade de este Tribunal se pronunciar sobre o assunto. Contudo, ainda que assim não fosse, a argumentação agora aduzida não tem a virtualidade de transformar um ónus da visada num ónus da entidade administrativa. É que estando em causa documentos que a visada entende que não devem ser divulgados por conterem informações confidenciais, cabe-lhe o ónus de fornecer documentos integralmente expurgados dessas informações, nos termos do artigo 30º/2 e 4 da L 19/2012, sob pena de se considerar a não confidencialidade. A decisão de classificação de um documento como confidencial está condicionada pelo cumprimento pelo visado de um triplo ónus a que se reportam as supra citadas normas, a saber: de identificação das informações que considera confidenciais; de fundamentação de tal entendimento e de fornecimento de cópia não confidencial dos documentos pertinentes, expurgado das informações confidenciais. Ou seja, cabia à visada, mediante o cumprimento das directrizes aplicáveis, corresponder à solicitação feita pela AdC, em proveito do seu interesse na não divulgação dos seus segredos de negócio. No caso a denunciada não o fez, não obstante as diligências feitas pela AdC nesse sentido, o que sempre determinaria a improcedência da pretensão agora deduzida. Em face do exposto improcede a primeira questão colocada. *** No que se refere à segunda questão colocada pela recorrente, que considera que o Tribunal entendeu erradamente não abrangidas por segredo comercial determinadas informações que, em seu entender, deveriam estar abrangidas, há que analisar a questão caso a caso. A recorrente não põe me causa a noção de segredo de negócio que a decisão recorrida adoptou. Sufraga-se a excelente análise sobre a questão feita na sentença recorrida que refere que «43. Quanto àquilo que deve ser entendido como segredos de negócio retira-se da jurisprudência da União Europeia a necessidade de verificação dos seguintes requisitos cumulativos: (i) as informações têm de ser do conhecimento de um número restrito de pessoas; (ii) deve-se tratar de informações cuja divulgação possa causar um prejuízo sério à pessoa que as forneceu ou a terceiro; (iii) e é necessário que os interesses que possam ser lesados pela divulgação da informação sejam objetivamente dignos de proteção - cf. decisões proferidas nos processos T-474/04 Pergan Hilfsstoffe fur industrielle Prozesse v Comissão, EU:T:2007:306, §65, T-88/09, Idromacchine v Comissão, EU:T:2011:641, § 45, e, a propósito do âmbito mais geral do segredo profissional, as decisões proferidas nos processos T-198/03 Bank Austria Creditanstalt AG c. Comissão Europeia, § 71, e T-345/12, Akzo Nobel e Outros v Comissão, EU:T:2015:50, § 65, e Evonik Degussa v Comissão, EU:T:2015:51, § 94. 44. Como exemplos deste tipo de informações, podem citar-se os seguintes: “informações técnicas e/ou financeiras relativas ao saber-fazer, métodos de cálculo dos custos, segredos e processos de produção, fontes de abastecimento, quantidades produzidas e vendidas, quotas de mercado, listagens de clientes e de distribuidores, estratégia comercial, estruturas de custos e de preços e política de vendas de uma empresa” - ponto 18 da Comunicação da Comissão relativa às regras de acesso ao processo nos casos de aplicação dos artigos 81.° e 82.° do Tratado CE, artigos 53.°, 54.° e 57° do Acordo EEE e do Regulamento (CE) n.° 139/2004 do Conselho (publicada no JO 2005/C 325/07), alterada pela Comunicação de 08 de agosto de 2015 (publicada no JO 2015/C 256/03). Infra explicitar-se-á melhor o alcance destes exemplos. 45. Quanto à natureza atual ou não das informações importa ter presente, conforme adverte o Tribunal Central Administrativo do Sul, no acórdão de 12.02.2015, processo n.° 11809/15, que “[u]m segredo comercial não o deixa de ser, sem mais, pelo facto de conter elementos do ano passado'’”. Contudo, a informação passada pode perder relevância, sendo de sufragar, neste âmbito, o entendimento adotado pela jurisprudência da União Europeia traduzido no seguinte: “Há que lembrar que, por força de jurisprudência bem assente, não são secretas nem confidenciais as informações que o foram mas que datem de cinco anos ou mais e devam, por isso, ser consideradas históricas, a menos que, excecionalmente, o recorrente demonstre que, apesar da sua antiguidade, tais informações continuam a constituir elementos essenciais da sua posição comercial ou de um terceiro (despacho do Tribunal Geral de 15 de novembro de 1990, Rhône-Poulenc e o./Comissão, T-1/89 a T-4/89 e T-6/89 a T-15/89, Colet., p. II-637, n.° 23; v. despacho do presidente da Quarta Secção do Tribunal Geral de 22 de fevereiro de 2005, Hynix Semiconductor/Conselho, T-383/03, Colet., p. II-621, n.° 60 e jurisprudência aí referida; despachos do presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral de 8 de maio de 2012, Diamanthandel A. Spira/Comissão, T-108/07, n.° 65, e de 10 de maio de 2012, Diamanthandel A. Spira/Comissão, T-354/08, n.° 47)” - decisão proferida no processo T-341/12, EvonikDegussa v Commission, EU:T:2015:51, §84. 46. São estes os parâmetros gerais aplicáveis à matéria em questão. Face às especificidades do caso concreto e aos fundamentos do recurso e das alegações apresentadas pela AdC impõe-se tecer algumas considerações adicionais. (….) 54. (….)de acordo com os parâmetros resultantes da jurisprudência da UE, o ónus de fundamentação que recai sobre o titular da informação pressupõe que o mesmo demonstre que: (i) as informações são do conhecimento de um número restrito de pessoas; (ii) são informações cuja divulgação pode causar um prejuízo sério à pessoa que as forneceu ou a terceiro; (iii) e os interesses que podem ser lesados pela divulgação da informação são objetivamente dignos de proteção. (…) 57. (….) em síntese final, se conclui que o ónus de fundamentação se basta com a demonstração dos seguintes elementos: (i) as informações são do conhecimento de um número restrito de pessoas; (ii) são informações cuja divulgação pode causar um prejuízo sério à pessoa que as forneceu ou a terceiro; (iii) e os interesses que podem ser lesados pela divulgação da informação são objetivamente dignos de proteção.». Parametrizada a questão analisemos cada situação: a- No que concerne à rejeição do pedido de confidencialidade da informação relativa às quotas de mercado da M------ no mercado da distribuição retalhista de base alimentar em Portugal, relativamente aos anos 2004-2016, ela fundou-se no entendimento de que não está demonstrada a natureza secreta destas informações, face a uma quota de mercado referida em dois documentos juntos pela AdC nas suas contra-alegações, a saber: a "Apresentação da S------, de Junho de 2018 (preparada no contexto do projectado IPO da S------), e uma notícia do Jornal Económico de 4 de Setembro de 2018 sobre versão mais recente daquela apresentação. A recorrente alega o que consta das alíneas QQ a ZZ. A questão que se coloca é reportada às informações constantes da página 5 da resposta da M------ de 17 de Julho, relativamente aos anos 2012-2016, e da Tabela 1 da resposta da M------ de 16 de Agosto, relativamente aos anos 2004-2016, pelo que o conteúdo do oficio da AdC de 7 de Fevereiro de 2019 é irrelevante para a apreciação da questão. E o entendimento vazado, de que mediante a junção dos documentos públicos de folhas 547 e 549, respectivamente notícia do Jornal Económico que tem por fonte a S------ e a própria apresentação da S------, se referem tais quotas, o que inquina a natureza confidencial alegada, ainda que se admita divergências entre umas e outras, é lógico e inultrapassável. Desses elementos resulta que a própria recorrente não considera as quotas em causa elemento confidencial do negócio, independentemente das eventuais discrepâncias resultantes dos diferentes métodos de cálculo que estejam (ou não) em confronto. b- No que respeita à rejeição da VNC da resposta da M------ à questão 5 do pedido de informações constante do ofício S-AdC/201811548, que contém o detalhe das suas vendas em cada um dos anos de 2010 a 2017, desagregadas por produtos e desagregadas ainda, ano-a-ano e conforme se trata de vendas de produtos MDF e vendas de produtos MDD), a decisão recorrida fundamentou-a em que os intervalos propostos pela M------ são demasiado longos e desajustados face à realidade que se visa ocultar. A recorrente considera a decisão errada face à argumentação constante de AAA a GGG. A fundamentação para a rejeição da VNC foi de que em causa está a «adequação dos intervalos apresentados pela Recorrente. E quanto a estes intervalos considera-se que não assiste razão à Recorrente, pois os intervalos por si propostos são demasiado desajustados face à realidade que se visa ocultar, tendo em conta que, conforme salienta a AdC, que há valores a zero e valores muito distanciados dos limites utilizados. Nessa medida, os intervalos não permitem intuir praticamente nenhuma informação quanto ao posicionamento da Recorrente em cada um desses mercados e é isso que se pretende. Adicionalmente, não se mostra suficientemente fundamentado, pela Recorrente, que apenas essa forma de exposição garanta a proteção dos seus interesses, pois: estão em causa produtos diferenciados. Da fundamentação da Recorrente não se consegue compreender porque é que o conhecimento da sua posição competitiva em relação a cada um dos produtos de forma mais aproximada lhe causará um prejuízo sério. Quanto à estratégia comercial, a utilização de intervalos mais curtos demonstrará uma diferença significativa entre produtos MDF e MDD, é verdade. Contudo, ainda que se reconheça alguma importância a essa informação, o certo é que daí não se retira necessariamente uma estratégia específica da Recorrente responsável por essa diferença. Por conseguinte, não é possível concluir que a divulgação da informação em causa, através de intervalos mais curtos, seria suscetível de tornar transparente o seu contributo para essa diferença, decorrente de uma determinada aposta estratégica, e gerar os graves prejuízos que alega.». A argumentação aduzida não se mostra beliscada pela fundamentação da questão recorrida. A questão é que a tutela do segredo de negócio tem por limite a não restrição infundada da publicidade do processo e os direitos de defesa dos demais visados. Ou seja, de algum modo, a forma como a informação não confidencial é estruturável tem que respeitar a possibilidade de se intuir a realidade da informação ocultada, o que não sucede quando o intervalo apresentado é entre 0 e 50.000.000€ para realidades numéricas completamente distintas, valores manifestamente díspares e até para valores inexistentes. Face ao exposto, impõe-se a declaração de total improcedência do recurso da decisão de mérito. *** B- Dos recursos interlocutórios: Como de início se referiu, no decurso do processado junto do Tribunal a quo foi proferido despacho, 12/05/2019, que converteu o efeito do recurso de suspensivo da decisão ema suspensivo dos termos do processo administrativo e o Ministério Público e a AdC vieram recorrer do mesmo. O MP concluiu o recurso requerendo que se revogue o despacho recorrido na parte em que atribuiu efeito suspensivo da marcha do processo de contra-ordenação, na fase organicamente administrativa. A AdC pediu que se revogue o despacho recorrido na parte que fixou efeito suspensivo da marcha do processo na fase organicamente administrativa. O despacho recorrido, longamente fundamentado, decidiu converter o efeito do recurso de impugnação judicial de suspensão da decisão impugnada em suspensão do processo de contraordenação. Ora, uma vez que se encontra ultrapassada a fase do recurso de impugnação judicial da decisão administrativa é manifesta a inutilidade superveniente dos recursos interpostos, porquanto a decisão recorrida se limitou a fixar efeito ao recurso dessa decisão administrativa. Interposto recurso da decisão judicial, proferida pelo Tribunal a quo, o efeito fixado deixou de vigorar, tendo sido substituído pelo efeito agora fixado ao recurso interposto. Impõe-se, portanto, a declaração de extinção dos recursos em apreço por inutilidade superveniente. *** VI- Decisão: Acorda-se, pois, em: - Declarar os recursos interlocutórios extintos por supervenientemente inúteis; - Negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida nos seus precisos termos. Custas do recurso principal pela recorrente, com taxa de justiça de 3 ucs. *** Lisboa, 18/ 12/2019 Maria da Graça M. P. dos Santos Silva A.Augusto Lourenço _______________________________________________________ [1] Cf. Germano Marques da Silva, em «Curso de Processo Penal», III, 2ª edição, 2000, pág. 335, e Acs. do S.T.J. de 13/5/1998, em B.M.J. 477-º 263; de 25/6/1998,em B.M.J. 478º-242 e de 3/2/1999, em B.M.J. 477º-271. [2] Cf. Artºs 402º, 403º/1, 410º e 412º, todos do CPP e Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R., I – A Série, de 28/12/1995. |