Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
10871/24.0T8LSB.L1-2
Relator: FERNANDO ALBERTO CAETANO BESTEIRO
Descritores: CONCLUSÕES
RECURSO
CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
PROCEDIMENTO CAUTELAR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/05/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: SUMÁRIO (art. 663º, n.º7, do CPC):
I. Constando das conclusões da alegação recursória a delimitação do objecto do recurso e o sentido da solução jurídica pugnada pelo recorrente e verificando-se que o recorrido teve plena percepção de tal, podendo contraditá-lo, é de considerar, tendo em conta o disposto no art. 5.º, n.º 3, do CPC, que seria acto inútil, logo ilícito (cf. art. 130.º do CPC), o convite ao aperfeiçoamento daquelas conclusões.
II. Dispondo a requerente de meio processual idóneo a colocá-la a salvo da situação lesiva que invoca, não tendo, por isso, necessidade de deitar mão do presente procedimento cautelar, não ocorre o perigo de ocorrência de lesão grave e de difícil reparação que constitui fundamento para a procedência do procedimento.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

I.
X & Y – Comércio Internacional, S.A., intentou, contra Abanca Corporation Bancaria, SA., Sucursal em Portugal, o presente procedimento cautelar comum pedindo:
a) que seja declarada a ilicitude do vencimento antecipado do MÚTUO e/ou resolução do mesmo;
b) que seja declarado inexistente o correspectivo direito a preencher e executar qualquer uma das Livranças entregues, em especial a livrança com o número mecanográfico (…)61;
c) que seja ordenado ao Requerido que se abstenha de accionar por execução intentada contra a mutuária e garantes pessoais a referida livrança.
A requerente pediu, também, a dispensa do contraditório prévio do requerido e a inversão do contencioso.
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Por despacho proferido a 07-05-20224, indeferiu-se a dispensa do contraditório prévio e determinou-se a citação da requerida.
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A 06-06-2024, a requerente comunicou que o PER foi homologado em processo próprio e juntou documentos.
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A 07-06-2024, a requerida apresentou oposição pugnando pela improcedência do procedimento.
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A produção de prova ocorreu nos dias 27-06-2024 e 12-07-2024.
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Por decisão proferida a 16-07-2024, julgou-se o presente procedimento cautelar improcedente.
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Inconformada, a requerente interpôs recurso da decisão referida, que culminou com as seguintes conclusões (transcrição):
A. A Recorrente pugna pela revogação da sentença recorrida, por entender que o Tribunal a quo apreciou incorretamente a matéria de facto e em consequência, de Direito, sobre o qual versa o presente processo.
B. A Recorrente intentou Providência Cautelar não Especificada, pedindo que fosse declarada a ilicitude do vencimento antecipado de Contrato de MÚTUO e/ou resolução do mesmo, sendo ainda declarado inexistente o correspectivo direito a preencher e executar qualquer uma das Livranças entregues, em especial a Livrança com o número mecanográfico (…)61; ordenando ao Recorrido abster-se de acionar por execução intentada contra a mutuária e garantes pessoais a referida livrança; sendo declarado, caso já tivesse sido, entretanto, accionada, o abuso de direito do Recorrido ao executar a mencionada Livrança.
C. O objecto do litígio que separa a Recorrente e o Recorrido decorre de Contrato de Mútuo com o n.º (…)90-1 (“MÚTUO”), celebrado entre a Recorrente e o DEUTSCHE BANK AG, Sucursal em Portugal, o qual se veio a transmitir a favor do Recorrido, produzindo os seus efeitos a partir do dia 09/06/2019, conforme melhor referidos na Petição Inicial, DEUTSCHE BANK AG no MÚTUO e a respectiva qualidade de “Mutuante".
D. Por considerar ilegal a declaração do vencimento antecipado do MÚTUO, com o consequente preenchimento e execução da Livrança, a Recorrente deu entrada de Providência Cautelar Não Especificada, cujos pedidos estão supramencionados.
E. A Sentença proferida desconsidera a actuação e consequente ameaça do Recorrido de pretender preencher e executar uma Livrança durante o decurso do PER.
F. Desconsiderando a prova carreada para os autos e a prova produzida em sede de Audiência Final, pelo que mal andou o Tribunal a quo porquanto indevidamente considerou lícito o vencimento antecipado do MÚTUO e consequente resolução.
G. Da análise do MÚTUO, da sua renegociação, das reuniões mantidas entre a Recorrente e o Recorrido, dos pedidos de esclarecimentos reiterados apresentados pela Recorrente, do PER em curso e das comunicações trocadas, nunca poderia o Recorrido ter declarado o vencimento antecipado da dívida do MÚTUO, fosse por que via fosse. Muito menos, poderia o Tribunal a quo considerar como válida tal actuação por parte do Recorrido.
H. O MÚTUO foi objecto de nove aditamentos, tendo o último aditamento sido celebrado em 09.02.2022.
I. Em virtude desses mesmos contrato e aditamentos, foram emitidas em diferentes momentos três livranças pela Recorrente, as quais se encontram avalizadas pelos referidos Administradores.
J. O Recorrido detém indevidamente todas as Livranças emitidas pela Recorrente, com a seguinte numeração mecanográfica: (…)15, (…)32 e (…)61.
K. Como resulta da Sentença recorrida, a Livrança com o número mecanográfico (…)61 é a única garantia prestada pela Recorrente que se encontra válida e cuja detenção pelo Recorrido está legitimada pelo MÚTUO e seus aditamentos, pelo que a detenção das demais livranças é ilegal.
L. O MÚTUO celebrado entre as Partes em vigor é apenas um, tendo sido objecto de reestruturações ao longo dos anos, a última das quais ocorreu em Março de 2022, desta feita já com o crédito titulado pelo aqui Recorrido e negociado directamente com este, com vista a ser definido um novo plano financeiro para o seu reembolso.
M. No PLANO estabeleceu-se um período de carência de capital de 6 meses (de Março a Agosto de 2022), iniciando-se o pagamento dos valores devidos a título de capital e juros a partir de Setembro de 2022.
N. Apenas em Março de 2023 é que a Recorrente tomou conhecimento que aparentemente, aquando do términus do período de carência do MÚTUO (em Setembro de 2022), o Recorrido considerou que o PLANO já estava desactualizado, embora não tenha sido transmitida tal informação à Recorrente.
O. O alegado incumprimento contratual e a mora que existia era exclusivamente da responsabilidade do Recorrido ao efectuar uma alteração unilateral do PLANO e a sua subsequente substituição pelo NOVO PLANO, sem comunicar tal facto à Recorrente.
P. O Recorrido procedeu a uma alteração do PLANO, o qual foi ajustado em função da evolução da Euribor a 12 meses, dando assim origem a um NOVO PLANO, o que veio a impactar no plano financeiro do MÚTUO e nas prestações mensais devidas pela Recorrente.
Q. O Recorrido fez uso da faculdade prevista no MÚTUO de rever a taxa de juro aplicável ao mesmo, em função da evolução da Euribor que lhe servia de referência, incumprindo, contudo, com o seu Dever Legal de Informação para com a Recorrente.
R. As novas prestações, devidas por via do NOVO PLANO e que o Recorrido pretendeu impor à Recorrente, eram de valor superior às iniciais previstas no PLANO.
S. As verbas que vinham sendo depositadas mensalmente pela Recorrente na conta DO estavam absolutamente correctas e em conformidade com as prestações que eram devidas ao abrigo do PLANO. Mas já não, em relação ao NOVO PLANO, que se desconhecia em absoluto.
T. Perante a completa omissão de informação por parte do Recorrido, a Recorrente veio a descobrir mais tarde que as sobreditas verbas que escrupulosamente depositava na conta DO, paulatina e contratualmente, se revelavam insuficientes para pagamento integral das prestações devidas ao abrigo do PLANO, porque estariam a ser debitadas em valores ao abrigo do NOVO PLANO, o que levaria a um alegado e superficial incumprimento.
U. Sem prejuízo da violação dos deveres de informação a que o Recorrido estava obrigado, sem qualquer aviso prévio, decidiu debitar outros valores na conta DO, a título de comissões de incumprimento e juros de mora.
V. A Recorrente apresentou de imediato uma proposta, propondo-se pagar o capital em dívida, com o perdão de comissões e juros de mora, por entender que não eram devidos uma vez que resultavam da violação de deveres de informação a que o Requerido estava obrigado, no entanto, tal proposta foi recusada pelo Recorrido.
W. Nessa sequência, a Recorrente foi interpelada no dia 24.04.2023 para proceder ao pagamento das prestações correspondentes a parte do mês de Janeiro, Fevereiro, Março e Abril de 2024, num total de € 6.032.85, prestações vencidas e não pagas em função da aplicação do NOVO PLANO.
X. Interpelação esta, que esta foi a única interpelação para o incumprimento contratual que a Recorrente recebeu da Recorrida.
Y. Sem prejuízo, os montantes que se encontravam em dívida e que resultaram da comunicação de 24.04.2023 foram integralmente pagos pela Recorrente.
Z. Não obstante a Recorrente não ter recebido qualquer resposta às suas mais de dez comunicações, finalmente foi a Recorrente convocada para uma reunião presencial na sede do Recorrido, o que veio a suceder no dia 19.09.2023.
AA. A Recorrente explicou o início da relação comercial entre ambas, os meandros de todo este processo e manifestou, ainda, o seu maior desagrado pela total ausência de resposta por parte do Recorrido a todas as propostas apresentadas e comunicações que lhe foram dirigidas pela Recorrente.
BB. Depois de proferida a sentença, a Recorrente recebeu já comunicação de mora no cumprimento e valor em dívida, bem como comunicação de responsabilidade por atrasos no pagamento de prestações do MÚTUO.
CC. Pelo que o Tribunal a quo, ao pretender legitimar a resolução do MÚTUO, está a praticar um acto que não lhe foi requerido, declarando uma legitimidade que nem o próprio Recorrido reconhece, como bem atestam os documentos que o mesmo emitiu e remeteu à Recorrente, o que consubstancia uma clara violação da lei e sério prejuízo da Recorrente, que se encontra em PER.
DD. A Recorrente viu-se forçada a recorrer no passado dia 08.11.2023 a Processo Especial de Revitalização.
EE.O Recorrido, na qualidade de credor comum, votou contra a homologação do mesmo. Apenas o Recorrido e dois outros credores votaram desfavoravelmente.
FF. Sendo o Recorrido detentor de um crédito inferior a 5% do total dos créditos reconhecidos no PER, apesar de ter sido devidamente convocado pela Recorrente para activamente participar nas negociações que se impunham, o Recorrido sempre se manifestou contra, não tendo em nenhum momento apresentado uma postura transparente e colaborante.
GG. O período de votação do PER terminou no dia 18.04.2024, tendo o mesmo sido aprovado por maioria dos votos expressos, e homologado pelo Tribunal no dia 17.05.2024, sem prejuízo de ter sido apresentado recurso daquela decisão por parte do Credor Banco BIC Português S.A., o qual corre os seus trâmites.
HH. Independentemente do Acórdão que venha a ser proferido em sede do recurso apresentado pelo referido Credor, o PER - per si - está já a ser cumprido pela Recorrente, sendo mensalmente realizados os pagamentos previstos, dando cumprimento ao que resultou homologado em 17.05.2024.
II. Os Administradores da Recorrente e garantes da Livrança não foram interpelados para o preenchimento da mesma, nem tão pouco está identificado de forma correcta o alegado valor que estaria em divida e que deveria ser pago.
JJ. Destinando-se o PER a concluir um acordo do devedor com os credores, de modo a possibilitar a recuperação económica do primeiro, esta finalidade ficaria seriamente comprometida, se qualquer credor pudesse praticar actos com óbvias repercussões negativas relativamente à obtenção de consensos necessários à viabilização do devedor; e com isso prejudicar os demais credores e, ainda, o próprio devedor.
KK. A decisão judicial da aceitação do PER obsta, sem mais, à instauração de quaisquer acções executivas para cobrança de créditos durante um período máximo de quatro meses.
LL.A homologação do PER, nos exactos termos previstos e aprovados pela maioria dos credores, determina a regularização dos créditos de todos, incluindo o crédito do Recorrido decorrente do MÚTUO e, em virtude da homologação, a Recorrente passará a estar numa situação de cumprimento.
MM. Todas as obrigações contratuais da Recorrente perante os seus credores – ainda que garantidas por Garantias Bancárias on first demand (ou à primeira solicitação) ou por Livranças, como é aqui o caso, encontram-se em dia por via da decisão homologatória proferida, embora ainda não transitada em julgado, o que implica, em consequência, ainda, o prosseguimento da actividade comercial da Recorrente, fundamental à sua viabilidade económica, execução e cumprimento do PER.
NN. A actuação do Recorrido, nomeadamente, a resolução unilateral do PLANO e a imposição da aplicação do NOVO PLANO sem qualquer aviso prévio, viola o estatuído do artigo 14º do DL n.º 133/2009, de 02 de Junho, na medida que, não obstante se considerar possível o Recorrido alterar o PLANO, as mesmas têm de ser devidamente comunicadas antes da sua entrada em vigor (NOVO PLANO), o que comprovadamente não sucedeu.
OO. A pretensão do Recorrido ao querer preencher a Livrança resulta num claro exercício de abuso de direito, nos termos e para os efeitos do artigo 334º do Código Civil.
PP. Não pode, contudo, o Recorrido, na pendência do PER, e ainda antes da sua homologação e trânsito em julgado, pretender preencher e executar a Livrança e com esta actuação praticar um acto conflituante com a recuperabilidade e exercício da actividade comercial da Recorrente.
QQ. A decisão de homologação do PER, a transitar em julgado, determina a regularização, nos exactos termos previstos nos planos de amortização insertos no PER, dos créditos que todos os credores (incluindo o aqui Recorrido) detêm sobre a Recorrente e que, em virtude da homologação, passam a estar em situação regular.
RR. No que ao Recorrido respeita, o plano prevê o pagamento de 50% da dívida de capital consolidada e reconhecida, com perdão de juros vencidos e vincendos, mediante o pagamento de 144 prestações mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira 30 dias após o trânsito em julgado da sentença de homologação do PER, sendo que nesta data já se encontra em cumprimento.
SS. Termos em que sempre deveria o Tribunal a quo ter reconhecido o abuso de direito perpetrado pelo Recorrido e, em consequência, devia ter ordenado que o Recorrido se abstenha de preencher e/ou accionar a Livrança, o que não fez.
TT.Existe, por isso, uma omissão de pronúncia do Tribunal a quo que deve ser qualificada como tal.
UU. Da sentença sub judice e na parte que se recorre, infere-se que, para o sentido decisório da mesma, foram decisivos factos erradamente dados como provados.
VV. Com efeito, o Tribunal a quo não tomou em devida consideração elementos probatórios determinantes, dando como provados factos que claramente não o foram e que estão até em contradição com outros igualmente dados como provados.
WW. Conforme é dado como provado pelo Tribunal no facto 29 dos Factos Provados, a Recorrente procedeu, em devido tempo, ao pagamento das quantias que alegadamente se encontravam em dívida e para as quais tinha sido interpelada.
XX. O Tribunal a quo deu como provado o facto 50, por conta das declarações prestadas pela testemunha “B”, extraindo-se igualmente da análise do extrato da conta junto como Doc 8, com o requerimento inicial e da carta enviada a 24.04.2023.
YY. De tal facto, resulta uma contradição flagrante do Tribunal a quo que procura justificar o vencimento antecipado com uma obrigação que foi integralmente cumprida pela Recorrente, ainda antes da apresentação do PER, como se viu e se deu por provado.
ZZ.Pelo que o Tribunal a quo decidiu mal, quando deu como provado que antes do PER encontrava-se a Recorrente em situação de mora, por conta das cartas de interpelação enviadas à Requerente e avalistas a 24/04/2023, o que não se compreende, por não corresponder à verdade dos factos e à prova produzida.
AAA. O Tribunal a quo deu, ainda, como provado o seguinte facto: “54. À data das alterações das taxas de juro, essa informação era inserida no extrato do empréstimo enviada à mesma, sendo que, dos referidos extratos resulta a informação do valor das prestações do empréstimo, taxas, indexantes.”
BBB. Em nenhum momento, logrou o Recorrido provar perante o Tribunal a quo que tinha efectivamente enviado à Recorrente tais extratos com a informação sobre a alteração das taxas de juro.
CCC. O Tribunal a quo entendeu, no entanto, que este facto ficou provado, resultante “do teor do documento 8 que consubstancia os referidos extratos e contém a morada da sede de requerente que consta do seu registo comercial, tendo a testemunha “BB” confirmado que tais extratos são os que seguem pelo correio, sendo ainda disponibilizada a mesma informação no site do homebanking, embora declare que não pode garantir que a requerente aceda a esse site.”.
DDD. A este respeito veja-se o depoimento prestado pela testemunha “BB”, acima já melhor identificado do depoimento da testemunha não resulta em nenhuma passagem que os extratos bancários tenham sido efectivamente recebidos pela Recorrente. A testemunha conclui, inclusive, reconhecendo que as mesmas não terão sido recebidas.
EEE. Tal resulta expresso dos referidos extratos, quando no cabeçalho referem “Correspondência Devolvida” (cfr. DOC junto sob o n.º 8 com a Petição Inicial e DOC junto sob o n.º 8 da Oposição), no entanto a Testemunha não conseguiu comprovar em que termos é que as mesmas foram enviadas, quando e por quem, e o motivo de tal menção constar nos tais extratos.
FFF. Conforme, resulta do depoimento daquela testemunha, a Recorrente nunca recebeu extratos bancários, pelo que dúvidas não podem subsistir a este respeito.
GGG. Pelo que de forma clara, precisa e inequívoca foi transmitido ao Tribunal a quo que os extratos não foram recebidos pela Recorrente. Ora, pura e simplesmente, tal depoimento foi ignorado pelo Tribunal a quo, considerando-se que a Recorrente tinha obrigação de os ter recebido.
HHH. Por seu turno, da sentença sub judice e na parte que se recorre, infere-se que, para o sentido decisório da mesma, foram muito importantes os factos dados como não provados, constantes em 1., 2., 3. e 4. dos Factos Não Provados.
III. O Tribunal a quo não tomou em devida consideração elementos probatórios determinantes, que comprovam de forma cabal os pagamentos realizados pela Recorrente, o momento em que a Recorrente tomou conhecimento do NOVO PLANO e a imposição de novos valores pelo Recorrido, os quais nunca foram comunicados à Recorrente.
JJJ. Resulta, assim, expresso que o Tribunal a quo considerou como não provada matéria que resulta do depoimento prestado pela testemunha “B”. Decidiu, por isso, não atribuir relevância às declarações prestadas pela dita testemunha, o que, por si só, representa um erro de interpretação, quer das declarações prestadas, quer do Documento 8 junto com a Petição Inicial.
KKK. O Tribunal a quo entendeu igualmente que este facto não ficou provado, pois “(…) O extracto de conta junto como doc 8 do requerimento inicial evidencia os diversos incumprimentos da requerente no pagamento das prestações, mesmo após o aditamento de fevereiro de 2022, quer quanto às datas em que eram realizados os depósitos, quer quanto aos montantes, não sendo depositado qualquer valor entre 20/01/2023 e 07/07/2023 impede o tribunal de considerar provado quer o facto 1, quer o facto 2 do elenco de factos não provados. Teve-se ainda em conta o teor do plano de pagamentos enviado ao requerente em fevereiro de 2022 de que resultavam discriminadas as prestações de juros e de capital até final do prazo do empréstimo, com a advertência de que a partir de agosto de 2023 se ajustaria a taxa de juro em função do valor da Euribor, conforme cláusula quinta do contrato de 2013.”.
LLL. Não se compreende as razões nem a argumentação do Tribunal, que confunde os pagamentos que foram sendo realizados pela Recorrente de acordo com o PLANO, com o NOVO PLANO que não foi sequer previamente comunicado, com o incumprimento que veio a ser sanado.
MMM. O incumprimento da Recorrente (que foi entretanto sanado) em nada deve afectar a interpretação de que efectivamente os pagamentos que foram realizados corresponderam aos montantes previstos no PLANO.
NNN. Veja-se o que resulta do facto 12 dos Factos Provados: “12. De forma a provisionar as prestações vincendas, em Março de 2022, a Requerente começou a fazer depósitos na respectiva conta à ordem, designada por “DO”.” Em confronto com o documento 8 junto com a Petição Inicial, após o período de carência de 6 meses a Recorrente fez diversos depósitos, com caracter mensal, no montante de € 1.650,00.
OOO. Este facto 1 dado como não provado está por isso em contradição com o facto 12 dado como provado, conforme resulta aliás do confronto com o documento 8 junto com a Petição Inicial.
PPP. Não se compreende novamente como é que o Tribunal a quo considerou como não provado que “2. Só em março de 2023 a Requerente tomou conhecimento de que haveria um novo plano financeiro para amortização do MÚTUO, diferente do PLANO anteriormente acordado (…)”, quando dá como provado o facto 13, do qual resulta “13. Em março de 2023 a requerente foi contactada pelo requerido que a informou que os valores que depositava na conta DO se revelavam insuficientes para pagamento integral das prestações devidas.”.
QQQ. Existe, portanto, uma reiterada e flagrante contradição do Tribunal a quo quanto aos factos que são dados como provados e nos que não o são, em claro prejuízo da Recorrente.
RRR. Não pode, por um lado, o Tribunal dar como assente certa matéria e mais à frente, em claro conflito de argumentos, dar a mesma ou semelhante matéria já como não assente, sustentando a sua interpretação em incumprimento, o que não foi sequer alegado pelo Recorrido.
SSS. O único incumprimento que existiu e para o qual a Recorrente foi interpelada resultou de comunicação datada de 24.04.2023, o qual foi sanado, não tendo existido nenhuma outra interpelação de idêntico teor.
TTT. A sentença vai, no entanto, para além do que é razoável interpretar de acordo com o que resulta dos documentos e da prova testemunhal.
UUU. O Tribunal a quo considerou ainda erradamente como não provado os seguintes factos:
“3. As prestações devidas por via do NOVO PLANO que o Requerido, sem informação prévia, pretendeu impor à data, eram de valor superior àquelas previstas no PLANO entregue inicialmente à requerente e por tal motivo, as verbas depositadas na conta DO pela Requerente para pagamento do PLANO, estavam absolutamente correctas e em conformidade com o valor que era devido ao abrigo do PLANO.
4. O Requerido decidiu começar a aplicar um valor de prestações superior, unilateralmente e sem comunicar à Requerente.”.
VVV. Sobre os factos 3. e 4. dos Factos Não Provados, o Tribunal a quo refere apenas na Sentença que “(…), como base nestes meios de prova, não ficaram demonstrados os factos 3 e 4 do respectivo elenco”.
WWW. Depois de toda a prova produzida, não se compreende tal conclusão. A prova documental e a prova testemunhal permitem de facto perceber que as prestações passaram a ser de valor superior, que os depósitos que vinham sendo realizados na Conta DO eram suficientes para o cumprimento do PLANO e que o Recorrido impôs, sem qualquer aviso prévio, prestações de valor superior.
XXX. Porquanto, ficou inequivocamente demonstrado que as prestações sofreram uma alteração, que não foi comunicada e que a Recorrente vinha a realizar depósitos na Conta DO suficientes para o cumprimento do PLANO.
YYY. Acresce que a Recorrente foi agora confrontada com o envio de dois documentos, a saber, “Extrato Integrado”, datado de 30.06.2024, e “Lançamento de Crédito”, datado de 01.07.2024, ambos enviados pelo Recorrido, em que expressamente aquele reconhece que o MÚTUO se encontra em vigor, com o capital em dívida de € 87.948,24 e data de vencimento em 08.02.2028 (cfr. DOCS. 1 e 2 ora juntos).
ZZZ. O documento “Lançamento de Crédito” identifica, por sua vez, o capital vencido não pago de € 18.372,92, com a especificação de cada uma das prestações em falta desde 09.05.2024 até 07.07.2024, com a concretização das comissões de incumprimento e juros de mora. Certo é que uma das rubricas do documento “Lançamento de Crédito” é precisamente “Capital Vincendo”, no montante de € 69.572,32.
AAAA. Mais, o Recorrido dirigiu ainda duas outras comunicações aos Avalistas, datadas de 09.07.2024, em que, por referência ao MÚTUO, reconhece existir capital vencido de € 19.730,48, a que acrescem as comissões de incumprimento e juros de mora, no valor global de € 27.782,96 (cfr. DOCS. 3 e 4 ora juntos).
BBBB. As duas comunicações dirigias aos Avalistas são de idêntico teor, que, embora não estejam concretizadas e não se perceba o intuito do seu envio, resulta claro que o vencimento antecipado do MÚTUO, nos termos da comunicação de 01.04.2024, não produziu efeitos, caso contrário estas comunicações não teriam sido remetidas à Recorrente e Avalistas.
CCCC. Resulta à evidência o reconhecimento por parte do Recorrido que o MÚTUO não foi resolvido com base no alegado incumprimento da Recorrente, nem tão pouco pelo facto da Recorrente se ter apresentado a PER.
DDDD. Deve, por isso, para os devidos e legais efeitos, ser valorada esta tomada de posição do Recorrido, dando-se sem efeito o vencimento antecipado do MÚTUO e resolução do mesmo.
EEEE. Não existindo, assim, fundamento para o preenchimento e accionamento da Livrança contra a Recorrente ou contra os Avalistas.
FFFF. Devendo ser ordenada a alteração da matéria de facto dada como provada e daquela dada como não provada, substituindo-se a sentença proferida a quo por uma que ordene a Providência Cautelar.
Na peça processual em referência, requer-se a junção de quatro documentos, alegando, para tanto, que:
- a recorrente foi confrontada com os documentos 1 e 2, datados de 30-06-2024 e 01-07-2024, ambos remetidos pela requerida, em que expressamente aquele reconhece que o contrato de mútuo em referência nos autos se encontra em vigor, com o capital em dívida de € 87 948,24 e data de vencimento em 08-02-2028;
- um dos documentos, o “Lançamento de Crédito”, identifica, por sua vez, o capital vencido não pago de € 18 372,92, com a especificação de cada uma das prestações em falta desde 09-05-2024 até 07-07-2024, com a concretização das comissões de incumprimento e juros de mora;
- uma das rubricas do documento “Lançamento de Crédito” é precisamente “Capital Vincendo”, no montante de € 69.572,32;
- o Recorrido dirigiu ainda duas outras comunicações aos Avalistas, datadas de 09-07-2024, em que, por referência ao contrato de mútuo, reconhece existir capital vencido de € 19 730,48, a que acrescem as comissões de incumprimento e juros de mora, no valor global de € 27 782,96 (cfr. docs. 3 e 4 ora juntos);
- as duas comunicações dirigias aos avalistas são de idêntico teor, que, embora não estejam concretizadas e não se perceba o intuito do seu envio, resulta claro que o vencimento antecipado do contrato de mútuo, nos termos da comunicação de 01-04-2024, não produziu efeitos, caso contrário estas comunicações não teriam sido remetidas a si e avalistas;
- esqueceu-se, no entanto, o recorrido, de que o PER foi homologado e muito embora ainda não tenha transitado em julgado está já a ser cumprido, pelo que os valores que resultam destas comunicações não têm em conta o perdão de 50% de capital, o perdão total de juros e o período temporal em que o mesmo será executado;
- sem prejuízo, resulta à evidência o reconhecimento por parte do Recorrido que o contrato de mútuo não foi resolvido com base no alegado incumprimento da Recorrente, nem tão pouco pelo facto da recorrente se ter apresentado a PER;
- deve, por isso, para os devidos e legais efeitos, ser valorada esta tomada de posição do recorrido, dando-se sem efeito o vencimento antecipado do contrato de mútuo e resolução do mesmo;
- não existindo, assim, fundamento para o preenchimento e accionamento da livrança contra a recorrente ou contra os avalistas;
- devendo ser ordenada a alteração da matéria de facto dada como provada e daquela dada como não provada, substituindo-se a sentença proferida a quo por uma que ordene a providência cautelar.
No termo da peça processual em referência, conclui-se pela procedência do recurso e, em consequência, pela revogação da decisão impugnada e sua substituição por outra que ordene a providência cautelar não especificada requerida, resultando da alteração da matéria de facto dada como provada nos pontos 50 e 54, substituindo-a, conforme descrito e com as legais consequências daí resultantes, alterando o fundamento da motivação decisória para a prova produzida (Ponto 1 a 4), ordenando-a em conformidade, e que, por consequência, seja:
a. declarada a ilicitude do vencimento antecipado do MÚTUO e/ou resolução do mesmo;
b. declarado inexistente o correspectivo direito a preencher e executar qualquer uma das Livranças entregues, em especial a livrança com o número mecanográfico (…)61;
c. ordenado ao requerido abster-se de accionar por execução intentada contra a mutuária e garantes pessoais a referida livrança;
d. declarado, caso já tenha sido, entretanto, accionada, o abuso de direito do Requerido ao executar a supra mencionada Livrança.
*
A requerida respondeu a 16-09-2024, pugnando pela improcedência do recurso.
Apresentou as conclusões que se transcrevem:
1. Face à douta Sentença proferida, a Recorrente limita-se a plasmar nas suas Alegações a mesma argumentação que consta da petição inicial do procedimento cautelar, no que concerne à ilegitimidade da Recorrida para declarar o vencimento antecipado do Contrato e preencher a livrança, no decurso do PER a que a Recorrente se apresentou.
2. Sendo certo que, no que concerne ao recurso da matéria de direito, a Recorrente não argumenta quais as normas legais que considera que a douta Sentença violou ou o sentido com que deveriam ter sido interpretadas e aplicadas, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 639.º do CPC, de forma a que se considerem cumpridos os requisitos necessários ao decretamento da providência cautelar.
3. Desta forma, entende a Recorrida que o recurso não pode ser aceite, por estar, ele próprio em direta contradição com as normas processuais que determinam os elementos essenciais e obrigatórios que uma instância recursiva deve conter.
4. Como se constata, a Recorrente pretende que a decisão do douto Tribunal da Relação incida sobre a questão da licitude/ilicitude da declaração do vencimento antecipado do Contrato e preenchimento da livrança no decurso do PER, sem que justifique de que forma tal alteraria a decisão do Tribunal a quo, no que concerne à verificação dos pressupostos necessários ao decretamento da providência cautelar.
5. Para todos os efeitos, conforme alegado em sede de Oposição pela Recorrida, a Recorrente não logrou comprovar o preenchimento dos requisitos da providência cautelar nem justificar que este será o meio processual adequado a reagir à declaração de vencimento antecipado e preenchimento da livrança.
6. Entende a aqui Recorrida, que o presente recurso deve ser liminarmente indeferido por não conter os requisitos legais a que obriga o disposto no artigo 639º do CPC.
7. Nos presentes autos, alega a Recorrente que com a declaração de vencimento antecipado do Contrato e a possibilidade de apresentação de execução, encontra-se em risco a continuação da sua actividade comercial e o cumprimento dos termos definidos no Plano de Revitalização.
8. Segundo a Recorrente, uma eventual apresentação de execução seria passível de a colocar em situação de insolvência, não obstante a eventual homologação do Plano de Revitalização no âmbito do processo n.º (…)/23.0T8SNT, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo de Comércio de Sintra, Juiz (…).
9. Sem prejuízo da análise da licitude/ilicitude da declaração de vencimento antecipado e do preenchimento da livrança, certo é, que a Recorrente em momento algum justificou suficientemente a verificação dos pressupostos do procedimento cautelar.
10. Como bem entendeu o Tribunal a quo, não se verificou o preenchimento dos requisitos cumulativos para que seja decretada a providência cautelar.
11. Desde logo, não foi demonstrado nos autos que as vicissitudes apontadas pela Recorrente estão verificadas nos seus precisos termos e que não existe outro meio processual que acautele o seu alegado direito.
12. Como alegado em sede de Oposição, é admissível à Requerida a prossecução de execução contra os avalistas no Contrato de Mútuo n.º (…)090-1, sendo que, a apresentação a Processo Especial de Revitalização pela mutuária e a eventual homologação do Plano de Revitalização, não lhes pode aproveitar para se eximirem das suas obrigações.
13. As limitações impostas aos credores na pendência do Processo Especial de Revitalização não poderão, assim, ser utilizadas como forma de impedir a prossecução da cobrança judicial do crédito contra eventuais terceiros garantes da obrigação, que volte a frisar-se, não se encontram abrangidos pelas respectivas normas.
14. Em momento algum a Recorrida adoptou qualquer conduta que possa integrar requisito do periculum in mora, porquanto jamais actuou ou aceitou qualquer conduta nos termos invocados pela Recorrente, susceptível de causar qualquer lesão.
15. O facto de ter procedido à declaração do vencimento antecipado do Contrato para efeitos de eventual apresentação de execução contra os avalistas em nada fere os direitos conferidos à devedora, ora Recorrente, no Processo Especial de Revitalização, nem tão pouco coloca em causa o cumprimento do Plano que eventualmente possa ser homologado, conforme alega.
16. A própria adequação da presente providência à situação de lesão iminente é colocada em causa, em primeiro lugar por inexistência de qualquer lesão iminente referente à Recorrente, e em segundo lugar por não ser o meio adequado de reacção contra uma eventual acção executiva a apresentar contra os avalistas.
17. Ainda que, por hipótese de raciocínio, a acção executiva fosse intentada contra a mutuária e avalistas, uma vez que a mesma seguiria a forma ordinária, sendo necessária a citação prévia dos executados, a ora Recorrente detém outros meios de reacção e defesa nessa mesma acção executiva, pela via da apresentação de embargos de executado.
18. Assim, poderia a ora Recorrente, caso fosse o caso, opor-se à execução mediante embargos, requerendo a sua absolvição da instância ao abrigo do artigo 17.º-E do CIRE, por apresentação a PER e eventual homologação do Plano.
19. Ora, uma vez que não nos encontramos perante a existência de probabilidade séria de lesão iminente de um direito, nada existe a acautelar numa sede como é o presente procedimento cautelar.
20. E salvo o devido respeito, não seria esta a forma adequada de reacção contra a possibilidade de apresentação de acção executiva, tendo a Recorrente outros meios à sua disposição.
21. Pelo exposto, é completamente desprovido de senso jurídico, que a ora Recorrida, por meio de procedimento cautelar, seja obrigada a abster-se de prosseguir com uma execução contra os avalistas, os quais nem são parte na presente acção, face a uma eventual declaração de ilicitude do vencimento antecipado operado para o efeito, ou que seja declarado inexistente o seu direito de proceder ao preenchimento da livrança, como peticionado pela Recorrente.
22. Assim, inexistindo os requisitos estabelecidos legalmente para o decretamento de uma providência cautelar não especificada, é manifesto que a presente ação deverá improceder, como bem entendeu o Tribunal a quo.
23. Apesar de não se encontrarem verificados os requisitos necessários ao decretamento da presente providência cautelar, vem a Recorrente reiterar em sede de recurso o alegado na sua petição inicial, insistindo na narrativa de que se observou uma alteração superveniente das circunstâncias e que o incumprimento contratual apenas se deveu à conduta da ora Recorrida.
24. Na verdade, em momento prévio à apresentação da Recorrente a PER, encontravam-se em mora prestações referentes ao Contrato de Mútuo n.º (…)090-1, conforme decorre das cartas de interpelação enviadas à Recorrente e avalistas a 24/04/2023, juntas à Oposição como Doc. 6 e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais.
25. O Contrato em apreço apresentava diversas prestações em atraso, conforme reconhecido pela Recorrente nas diversas trocas de correspondência havidas com a Recorrida, e extratos do empréstimo remetidos à Recorrente, juntos à Oposição como Docs. 7 e 8 e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais.
26. Conforme anteriormente alegado, a Recorrida e a Recorrente celebraram um Aditamento ao Contrato, a 09 de Fevereiro de 2022, junto à Oposição como Doc. 2, e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais, o qual previa um período de carência de capital de seis (6) meses, com início a 09 de Fevereiro de 2022 e término a 09 de Agosto de 2022.
27. A ora Requerente conhecia perfeitamente as condições da alteração contratual, tendo procedido à assinatura do Aditamento ao Contrato, com inclusão de 6 meses de carência, aumento de prazo e extinção do valor residual, sendo que, as alterações do valor das prestações resultantes da aplicação da taxa de juro variável encontravam-se reflectidas nos diversos extratos de conta, os quais eram periodicamente enviados à Recorrente (vide Doc. 8 já junto).
28. De qualquer modo, o plano financeiro resultante da alteração do Aditamento contratual, foi enviado à Recorrente no dia 08/03/2022.
29. Decorrido o contratado período de carência de capital o empréstimo passaria a vencer prestações de capital, juros e respectivo imposto de acordo com o indexante à Euribor, o qual era do total conhecimento da Recorrente.
30. Uma vez que o Contrato previa uma taxa de juro variável, indexada à Euribor, tendo ocorrido alterações ao indexante, o valor da prestação foi actualizado em conformidade.
31. À data das alterações das taxas de juro, a Recorrente foi devidamente informada das alterações do indexante, através de informação do extrato do empréstimo enviada à mesma, cfr. Doc. 8 junto à Oposição, sendo que, dos referidos extratos resulta a informação do valor das prestações do empréstimo, taxas e indexantes.
32. Desta forma, ao contrário do alegado pela Recorrente, não foi implementado “unilateralmente” pelo Banco qualquer novo “Plano Financeiro”, o que sucedeu foi a verificação do término do período de carência de capital contratado com a Recorrente, em consequência da actualização do indexante da taxa de juro à taxa Euribor, a prestação do empréstimo foi actualizada, sem que a Recorrente provisionasse a Conta DO associada ao empréstimo com o valor necessário para o pagamento das prestações, logo a partir do mês de Setembro de 2022.
33. Mais, como admitido pela própria Recorrente, ocorreram diversas reuniões com o Banco, na pessoa do Gestor Dr. “C” e nessas mesmas reuniões foram prestados todos os esclarecimentos solicitados, acerca do plano financeiro do empréstimo, sendo do perfeito conhecimento da Recorrente a existência da situação de incumprimento do Contrato.
34. Toda a informação relativa ao empréstimo, respectivos valores, prestações, taxas de juros e indexantes, sempre foram fornecidos à Requerente através dos extratos do empréstimo que lhe eram remetidos, tendo a Recorrida prestado todos os esclarecimentos necessários, conforme resulta dos documentos juntos à Oposição e como foi confirmado pela testemunha Dra. “BB”.
35. Tanto assim o era, que a Recorrente apresentou uma proposta de pagamento para a regularização da dívida, o que novamente admite nos artigos 42 e 43 das Alegações agora apresentadas.
36. A Recorrente, apesar de reiteradamente reconhecer a verificação de valores em dívida no empréstimo, no que respeitava às prestações vencidas, permaneceu em incumprimento, não liquidando as prestações vencidas nem as prestações que se iam vencendo, mantendo e agravando a situação de mora.
37. Destarte, a Recorrente chegou nesta fase a efectuar alguns pagamentos, mas que não foram suficientes para liquidar os valores em mora e que, consequentemente, geraram o incumprimento contratual.
38. Sucede que, o montante em mora de € 6.032,85 à data de 21/04/2023, expresso nas cartas de interpelação enviadas à Recorrente e avalistas a 24/04/2023, dizia respeito à prestação parcial vencida em Janeiro de 2023, e às prestações completas vencidas em Fevereiro, Março e Abril de 2023.
39. Os pagamentos já mencionados, foram efectuados em Julho, Agosto e Setembro de 2023, tendo sido imputados às prestações anteriores em mora.
40. Como se compreende, continuaram a vencer-se prestações após a submissão das cartas de mora, pelo que, à data em que foram efectuados pagamentos pela Recorrente, o valor em dívida seria já bastante superior ao comunicado nas missivas de 24/04/2023.
41. Uma vez que os pagamentos realizados não permitiram a liquidação integral dos valores em mora, continuou a verificar-se o incumprimento do Contrato, o qual era do conhecimento da Recorrente, pois se seria passível de se considerar um eventual desconhecimento dos valores das prestações em momento prévio, o mesmo já não será viável após as reuniões realizadas e interpelações que lhe foram remetidas.
42. Assim sendo, não compreende a Recorrida o alegado pela Recorrente, ao invocar o desconhecimento dos termos contratuais e que o incumprimento do Contrato resultou de alegadas alterações unilaterais ao Contrato promovidas pela Recorrida.
43. A Recorrente e os avalistas tinham perfeito conhecimento dos termos do Aditamento celebrado, não tendo em momento algum impugnado ou alegado a falsidade das assinaturas aí apostas, não se verificando qualquer alteração unilateral aos termos contratuais.
44. Ademais, as questões suscitadas quanto ao incumprimento do Contrato são, para efeitos da verificação dos pressupostos da providência cautelar, secundárias, pois, como bem refere o douto Tribunal a quo “não é próprio do procedimento cautelar definir o direito, em termos definitivos, sendo na acção comum que tais pedidos deverão ser apreciados e conhecidos.” (sublinhado nosso).
45. Ainda assim, entende a aqui Recorrida, que bem esteve o douto Tribunal a quo ao considerar dado como provada a pendência de valores em mora decorrentes do incumprimento do Contrato e que resultaram na declaração de vencimento antecipado do mesmo.
46. Ao contrário do alegado pela Recorrente, não corresponde à verdade que os pagamentos efectuados tenham sido suficientes para sanar a situação de mora que se verificava, nem tão pouco, que a Recorrente tenha procedido às respectivas transferências em tempo devido.
47. Como já exposto, os primeiros pagamentos parciais dos valores em mora ocorreu apenas a 07/07/2023, ou seja, sensivelmente 2 meses e meio após a interpelação remetida, tendo o último pagamento sido efectuado a 14/09/2023, praticamente 5 meses após a submissão das missivas à Recorrente e avalistas.
48. Como se disse, no período que mediou entre a interpelação remetida à mutuária e avalistas e o pagamento parcial das quantias em mora, decorreram praticamente 5 meses, durante os quais se continuaram a vencer as respectivas prestações mensais, até eventual declaração do vencimento antecipado do Contrato.
49. Assim, o douto Tribunal a quo não incorreu em qualquer erro na matéria de facto, ao considerar que se verificava a existência de prestações em dívida em momento anterior à apresentação da Recorrente a PER.
50. Os valores em mora nunca foram integralmente liquidados, mas apenas parcialmente, sendo que as prestações continuaram a vencer-se após a interpelação remetida a 24/04/2023.
51. Em momento algum do depoimento do Sr. “B” ou da Dra. “BB” é possível aferir que a situação de mora ficou integralmente sanada, tanto assim é que os extratos juntos à Oposição e comunicados à Recorrente comprovam que a situação de mora se manteve, com incremento das prestações que se foram vencendo após a interpelação ocorrida, referente aos meses subsequentes.
52. Nestes termos, não compreende a ora Recorrida como poderá a Recorrente alegar que a declaração de vencimento antecipado é referente a uma obrigação que se encontrava cumprida.
53. A tabela de reembolso do empréstimo que consta do Doc. 8 junto à Oposição discriminava as prestações subsequentes à data da interpelação de mora remetida.
54. Ainda que não se verificassem as alterações desses montantes, cujo indexante estava sujeito à taxa Euribor, certo é, que a Recorrente sempre teve conhecimento de que se continuariam a vencer prestações mensais até término do Contrato, previsto a 09/02/2028.
55. À revelia destes factos, não se tendo verificado quaisquer pagamentos adicionais, vem a Recorrente alegar que a situação de mora ficou sanada, o que não corresponde, de todo, à verdade.
56. A situação de mora manteve-se, nunca tendo sido regularizada integralmente até à declaração de vencimento antecipado do Contrato.
57. A realidade factual é que a Recorrente foi devidamente informada do plano financeiro do empréstimo e das respectivas actualizações da taxa de juro variável pela Recorrida, estando sempre ciente de que os pagamentos efectuados nunca foram suficientes para a liquidação integral dos valores em mora.
58. Alega também a Recorrente, que não foi dado como provado que os extratos juntos à Oposição como Doc. 8, com a informação sobre a alteração das taxas de juro, lhe tenham sido remetidos.
59. Não obstante estar prevista nas cláusulas contratuais o reajuste automático das taxas de juro aplicáveis, sem necessidade de comunicação à Recorrente, bem entendeu o Tribunal a quo ao considerar que as comunicações remetidas foram válidas e eficazes, não sendo imputável à Recorrida o alegado desconhecimento da Recorrente.
60. Independentemente da recepção ou não recepção dos extratos bancários, a prova documental e o depoimento da testemunha Dra. “BB” atestam que as missivas e extratos foram remetidos para a morada comercial e contratual da Recorrente.
61. A ora Recorrida adere totalmente ao entendimento do douto Tribunal a quo, muito estranhando que uma sociedade comercial se encontre totalmente alheada dos valores a liquidar por conta do empréstimo contraído, refugiando-se na alegação de que desconhecia as alterações às taxas de juro e que os extratos bancários e outras comunicações nunca foram por si recepcionadas, nem teria conhecimento do eventual incumprimento das obrigações contratuais.
62. Ainda que fosse viável a narrativa de que a Recorrente nunca recebeu os extratos remetidos pela Recorrida, o que não se concede, certo é que terá recebido as comunicações remetidas via e-mail, nas quais constavam os planos financeiros, com as devidas actualizações, aplicáveis a partir Fevereiro de 2022 e Julho de 2023, tendo também sido informada do incumprimento nas várias reuniões realizadas.
63. Assim sendo, será de concluir que a Recorrente tinha perfeito conhecimento das prestações vencidas e vincendas, bem como, que nunca procedeu à liquidação integral dos valores em mora.
64. O depoimento do Sr. “B”, referido pela Recorrente, não é passível de comprovar os factos dados como não provados, nomeadamente, os que constam do n.º 1 a 4 elencados na douta Sentença, pois encontram-se em directa contradição com a restante prova produzida, pelo que, bem esteve o Tribunal a quo na sua fundamentação da motivação e fundamentação jurídica da decisão proferida.
65. Face ao exposto, salvo o devido respeito, não se verifica qualquer erro na apreciação da matéria de facto pelo Tribunal a quo, sendo que os elementos probatórios confirmam as comunicações remetidas à Recorrente, não tendo esta logrado demonstrar, como lhe incumbia, factos impeditivos à sua recepção.
66. Ainda que lograsse demonstrar os factos impeditivos à recepção das comunicações, como a própria Recorrente admite em sede de petição inicial e nas suas alegações, certo é, que em momento prévio à interpelação para declaração do vencimento antecipado do Contrato, lhe foi dado conhecimento do incumprimento tendo despoletado a troca de diversas comunicações e agendamento de reuniões entre a Recorrente e Recorrida.
67. Nestes termos, entende a Recorrida que não poderá colher provimento a tese da Recorrente, pois, como se viu, o incumprimento manteve-se e agravou-se nos meses subsequentes às primeiras interpelações, nunca tendo sido liquidado integralmente, ao contrário do alegado pela Recorrente.
68. Escuda-se também a Recorrente na apresentação de alegadas propostas dirigidas à Recorrida, com a finalidade de liquidar o valor do capital em dívida, sendo que as mesmas não foram aceites.
69. Como a própria Recorrente admite, as propostas englobavam o perdão de comissões e juros de mora, por entender que não eram devidos.
70. Sucede que, como se demonstrou nos presentes autos, a mora no pagamento das prestações mensais é apenas imputável à Recorrente, pelo que, a Recorrida não tinha qualquer obrigação de aceitar as referidas propostas, que implicavam um perdão de juros, comissões e outras despesas, que eram devidos nos termos das cláusulas contratuais.
71. Alega a Recorrente que a declaração de vencimento antecipado do Contrato é ilícita, pois procedeu à regularização dos valores em mora em tempo e não incumpriu qualquer obrigação decorrente do Contrato.
72. É entendimento da Recorrente, que a declaração de vencimento antecipado apenas teve  como fundamento a sua apresentação a PER, insistindo na narrativa de que não existia qualquer incumprimento nem se verificavam valores em mora, pelo que tal configuraria uma violação do regime de protecção do devedor no PER.
73. Alega também, que a Recorrida votou desfavoravelmente o Plano apresentado, não tendo formulado quaisquer propostas de alteração e reformulação do mesmo, que entende como uma posição de bloqueio que culminou na declaração de vencimento antecipado e apresentação da livrança a pagamento.
74. Antes de mais, volte a frisar-se, o incumprimento contratual ficou expressamente demonstrado pela prova produzida, não correspondendo à verdade que a declaração de vencimento antecipado do Contrato ficou a dever-se, como alega a Recorrente, à sua apresentação a PER.
75. Mais, se o regime de protecção é aplicável à Recorrente, enquanto devedora que se apresentou a Processo Especial de Revitalização, questão diferente será a aplicação/extensão desse regime aos avalistas no Contrato.
76. Como anteriormente alegado, à data de nomeação de Administrador Judicial Provisório no Processo Especial de Revitalização, verificava-se, de facto, o incumprimento contratual, sendo que, em momento prévio, em 24/04/2023, a Requerente e avalistas foram interpelados para a regularização dos valores em mora, conforme Doc. 6 já junto.
77. Se pelo disposto no artigo 17.º-E do CIRE, a ora Recorrida encontra-se impedida de promover a cobrança judicial do seu crédito, mediante a apresentação de acção executiva contra a devedora que se apresentou a Processo Especial de Revitalização, salvo o devido respeito, tal não será aplicável aos avalistas no Contrato.
78. Por esse motivo, ao abrigo da Cláusula 14.ª do Contrato, a 01/04/2024, a Requerente e avalistas foram interpelados pela Requerida da declaração de vencimento antecipado do Contrato, sendo que, na mesma missiva foi apresentada a livrança a pagamento pelo valor de € 94.855,27, com vencimento a 11 de Abril de 2024, conforme missiva junta à Oposição como Doc. 11, cujo conteúdo se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
79. No caso da livrança dada em garantia do Contrato, a Recorrente, sociedade mutuária X & Y – Comércio Internacional, S.A. foi subscritora da mesma, tendo os srs. “F” e “A” concedido os seus avais, sendo a ora Recorrida portadora da dita livrança.
80. Dúvidas não existem que os avalistas são obrigados cambiários, encontrando-se a sua assinatura no verso da livrança, o que significa que se obrigaram ao pagamento da mesma, de harmonia com o disposto no artigo 31.º, aplicável ex vi dos artigos 78.º e 77.º, da LULL.
81. O aval, nos termos do artigo 30.º da LULL, é o acto pelo qual um terceiro signatário da letra ou de uma livrança garante o pagamento desse título, por parte de um dos respectivos subscritores.
82. A função do aval é uma função de garantia, inserida ao lado da obrigação de um certo subscritor cambiário, a cobri-la ou caucioná-la, sendo o dador de aval, nos termos do n.º 1 do artigo 32.º da LULL, responsável da mesma maneira que o subscritor, o que significa que a medida da responsabilidade do avalista é a do avalizado.
83. Mais, como decorre dos artigos 43.º a 48.º da LULL., aplicável ex vi do artigo 77º do mesmo diploma, o portador pode exercer o seu direito de acção contra qualquer obrigado cambiário, reclamando o pagamento da livrança não paga e juros, despesas de protesto, avisos dados e outras despesas.
84. Assim, os avalistas obrigam-se ao pagamento da quantia titulada no título de crédito, que por virtude da autonomia da obrigação cartular, permanecerá independentemente das vicissitudes e alterações da obrigação causal.
85. Acresce que, como decorre do nº 4 do artigo 217.º do CIRE que “As providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afectam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os condevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas poderão agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos”.
86. Ao Processo Especial de Revitalização aplicam-se, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência, incluindo-se o supra referido artigo 217.º do CIRE.
87. Perante o estatuído no artigo n.º 1 do artigo 17º-E, no confronto com a previsão do n.º 1 do artigo 88.º do CIRE, segundo o qual “A declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência; porém, se houver outros executados, a execução prossegue contra estes”, encontra-se salvaguardada a possibilidade de prossecução de acção contra os demais devedores/garantes, sendo que a posição e o legítimo interesse dos credores no ressarcimento do seu crédito, passa pela continuidade ou prosseguimento de acção executiva.
88. A eventual homologação do PER da sociedade mutuária, subscritora da livrança, vencida e não paga, não aproveita aos avalistas.
89. Como resulta das normas previstas na LULL e CIRE já mencionadas, nada obsta à resolução do Contrato e eventual instauração de execução contra os avalistas, ainda que tal ocorra na pendência de Processo Especial de Revitalização da mutuária, ora Recorrente.
90. Sendo prerrogativa da Recorrida a possibilidade de apresentar execução contra os avalistas, também aqui não se poderá aceitar o alegado abuso do direito, uma vez que as normas de protecção aplicáveis à devedora no Processo Especial de Revitalização, ora Recorrente, não vêm a sua aplicação extensível aos avalistas no Contrato.
91. Ademais, com a interpelação de vencimento antecipado do Contrato e respectiva apresentação da livrança a pagamento, em momento algum a Recorrida violou as obrigações a que está adstrita no âmbito do Processo Especial de Revitalização, não tendo procedido à apresentação de acção executiva contra a devedora, ora Recorrente.
92. Ainda que a acção executiva fosse apresentada contra a Recorrente, como já atrás se mencionou, a mesma dispõe de outros meios de defesa adequados, tanto em sede da própria acção executiva mediante embargos, como pela via de acção comum, sendo que a providência cautelar apresentada não se poderá destinar a produzir os efeitos pretendidos.
93. Como exposto, ao contrário do alegado pela Recorrente, a declaração de vencimento antecipado do Contrato resultou do seu incumprimento e não da mera apresentação a PER, como esta insiste na sua narrativa.
94. Resulta também de tudo o quanto foi alegado, que a Recorrida não se encontra impedida de acionar a livrança a prosseguir com a apresentação de execução contra os avalistas no Contrato, o que é pacífico na jurisprudência.
95. Em momento algum a Recorrente logrou justificar de que forma a apresentação de acção executiva contra os avalistas colocaria em risco o cumprimento do PER ou a sua situação económica, nunca tendo comprovado quaisquer prejuízos que daí possam advir.
96. Inexiste assim, salvo o devido respeito, fundamento para que o douto Tribunal ordene que a Requerida se abstenha de preencher e/ou accionar a livrança.
97. Por fim, refere a Recorrente ter recebido da Recorrida dois extratos, um denominado de “Extrato Integrado”, datado de 30/06/2024, e outro como “Lançamento de Crédito”, datado de 01/07/2024, bem como, duas outras comunicações dirigidas aos Avalistas, datadas de 09/07/2024, entendendo que os documentos apresentados comprovam que o Contrato de Mútuo permanece em vigor, considerando-se dado sem efeito o vencimento antecipado do Contrato
98. Sucede que, os documentos ora juntos pela Recorrente não são idóneos a comprovar que o vencimento antecipado não tenha ocorrido, pelo que, desde já, vem a ora Recorrida requerer o seu desentranhamento.
99. Com efeito, a declaração de vencimento antecipado é uma declaração negocial expressa, decorrente das comunicações remetidas à Recorrente, as quais foram dadas como provadas nos autos.
100. Assim, não se pode depreender pelos documentos em apreço que exista uma declaração de "não resolução" do Contrato, que invalide o efeito da declaração de vencimento antecipado anterior, nem houve qualquer declaração negocial expressa da Recorrida nesse sentido.
101. Acresce que, nem a Recorrida nem a Recorrente acordaram numa eventual retoma do Contrato, desde logo porque a situação de incumprimento que se verificava anteriormente mantém-se, como se extrai dos próprios documentos juntos.
102. Em sentido diverso ao entendimento da Recorrente, os documentos que a mesma junta aos autos comprovam tudo o quanto foi alegado pela ora Recorrida, verificando-se a existência de capital vencido não pago, comprovando que a situação de mora nunca ficou sanada.
103. Desta forma, não corresponde à realidade a narrativa da Recorrente, apenas se podendo considerar, salvo o devido respeito, que a declaração de vencimento antecipado do Contrato mantém-se face ao incumprimento do mesmo.
104. Neste sentido, uma vez que não se encontram preenchidos os requisitos para que seja decretada a presente providência cautelar, é entendimento da Recorrida que o alegado pela Recorrente não tem qualquer fundamento de facto ou de direito, devendo manter-se a Sentença proferida pelo douto Tribunal a quo.
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A 07-06-2024, o recurso foi admitido como de apelação, com subida nos autos e efeito suspensivo, o que não foi alterado neste Tribunal.
*
II.
1.
As conclusões da alegação do recorrente delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo da ampliação deste a requerimento do recorrido (arts. 635º, n.º4, 636º e 639º, n.º1 e 2 do CPC). Não é, assim, possível conhecer de questões nelas não contidas, salvo se forem do conhecimento oficioso (art. 608º, n.º2, parte final, ex vi do art. 663º, n.º2, parte final, ambos do CPC).
Também não é possível conhecer de questões novas – isto é, de questões que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida –, uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais, destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação.
Tendo isto presente, no caso, atendendo às conclusões transcritas, a intervenção deste Tribunal de recurso é circunscrita às seguintes questões:
1.ª Saber se deve ser deferida a junção aos autos dos quatro documentos apresentados pela recorrente;
2.ª Saber se o recurso deve ser rejeitado por falta de indicação de elementos referidos no art. 639º, n.º2, do CPC;
3.ª Saber se a decisão é nula por omissão de pronúncia (art. 615º, n.º1, al. d), do CPC);
4.ª Impugnação da decisão da matéria de facto: saber se o Tribunal a quo fez uma incorreta interpretação e valoração da prova constante dos autos quanto aos pontos da matéria de facto que o recorrente especifica, a saber: a constante dos pontos 50 e 51 da matéria provada; a constante dos pontos 1 a 4 da matéria não provada;
5.ª Saber se, face à procedência da impugnação da matéria de facto, existe uma situação de ilegalidade na resolução do contrato de mútuo celebrado entre as partes e, por via disso, de ilegitimidade na futura execução da recorrente com fundamento na livrança dada como garantia do cumprimento de tal contrato, e, em caso positivo, de ocorre fundamento para decretar a providência requerida.
*
2.
Na decisão impugnada, foram considerados como indiciariamente provados os seguintes factos:
1. A Requerente X & Y – COMÉRCIO INTERNACIONAL, S.A. é uma sociedade comercial constituída em 1993, que que tem por objeto social “importação e exportação de bens e serviços, nomeadamente, vestuário e acessórios”.
2. No dia 09 de Fevereiro de 2013, a Requerente celebrou com o DEUTSCHE BANK AG, Sucursal em Portugal, com o NIPC (…)79, com sede na Rua (…), em Lisboa, um Contrato de Mútuo com o n.º (…)90-1.
3. Por escritura pública celebrada no dia 07 de Junho de 2019, o DEUTSCHE BANK AG transmitiu a favor do Requerido, a título de trespasse, o ramo de actividade de clientes privados e comerciais, denominado “Private and Commercial Clients” da sua sucursal portuguesa, do qual o MÚTUO fazia parte, tendo o Contrato de Trespasse produzido os seus efeitos a partir do dia 09 de Junho de 2019.
4. Por via do mencionado Contrato de Trespasse e a partir da referida data, o Requerido assumiu a posição contratual anteriormente assumida pelo DEUTSCHE BANK AG no MÚTUO e a respectiva qualidade de “Mutuante".
5. O MÚTUO foi objecto de nove aditamentos, conforme seguem:
• Aditamento de 01/07/2013;
• Aditamento de 09/01/2014;
• Aditamento de 05/08/2014;
• Aditamento de 12/02/2015;
• Aditamento de 12/02/2015;
• Aditamento de 31/07/2015;
• Aditamento de 09/02/2016;
• Aditamento de 06/02/2017;
• Aditamento de 09/02/2022;
6. Em virtude do MÚTUO e dos supra mencionados aditamentos, foram emitidas três livranças pela Requerente, as quais se encontram avalizadas pelos seus Administradores, a saber:
• “A”; e
• “F”.
7. As Livranças emitidas pela Requerente e actualmente na posse do Requerido, têm a seguinte numeração mecanográfica:
• (…)15,
• (…)32,
• (…)61.
8. As duas primeiras foram substituídas pela 3ª Livrança emitida com o número mecanográfico (…)61, mas não foram entregues ao requerente.
9. Cauciona esta Livrança – como todas as demais – responsabilidades decorrentes do MÚTUO referido.
10. O MÚTUO celebrado entre as Partes foi sendo objecto de reestruturações ao longo dos anos, tendo em Março de 2022 sido realizada a última reestruturação, desta feita já com o crédito titulado pelo aqui Requerido e negociado directamente com esta, com vista a ser definido um novo plano financeiro para o seu reembolso.
11. Nos termos desse plano, estabeleceu-se um período de carência de capital de 6 meses (de Março a Agosto de 2022), iniciando-se o pagamento dos valores devidos a título de capital e juros a partir de Setembro de 2022.
12. De forma a provisionar as prestações vincendas, em Março de 2022, a Requerente começou a fazer depósitos na respectiva conta à ordem, designada por “DO”.
13. Em março de 2023 a requerente foi contactada pelo requerido que a informou que os valores que depositava na conta DO se revelavam insuficientes para pagamento integral das prestações devidas.
14. A Requerente não usava esta conta DO no seu giro comercial corrente, mantendo o relacionamento com o Requerido apenas para pagamento desta dívida, o que obrigava a todos os meses na altura devida, proceder a depósitos na conta DO do valor para pagamento das prestações devidas.
15. O requerido utilizou os valores mensais que a requerente depositava para proceder a pagamentos parciais das prestações, afectando parte desses montantes ao pagamento das comissões de incumprimento e outros encargos relacionados com o atraso.
16. No dia 21.04.2023, a Requerente realizou uma reunião nas instalações do Requerido, com o Sr. “C”, gestor de conta da Requerente.
17. Nessa reunião, a Requerente disponibilizou-se para efectuar o pagamento dos valores alegadamente em dívida imediatamente e numa só prestação, desde que o Requerido assumisse que a alegada situação de incumprimento tinha resultado da violação dos deveres de informação quanto à entrada em vigor do NOVO PLANO e ausência de aviso prévio quanto à situação de incumprimento e cobrança de comissões e juros, propondo que não fossem cobrados quaisquer valores a título de comissões de incumprimento e juros de mora.
18. A proposta apresentada pela Requerente naquele imediato momento não foi aceite pelo Requerido
19. A requerida enviou à requerente carta datada de 24 de abril de 2023 comunicando o seguinte: “(…) o valor em dívida resultante do incumprimento dos contratos à data de 21 de Abril de 2023 cifrava-se em 6.032,85 euros (seis mil e trinta e dois euros e oitenta e cinco cêntimos). Mais informamos que à data do incumprimento se encontravam em mora: 3 prestações completas e 1 parcial do contrato nº 500-3025-1090-1, no valor de 6.007,96 euros – 24,89 euros a descoberto na conta DO nº 304-3025-000624-5. Para melhor esclarecimento queiram V. Exas considerar a informação infra:
(…) Nestes termos, solicitamos a V. Exas se dignem regularizar no prazo máximo de 10 dias a situação de mora, findos os quais seremos obrigados a proceder à reclamação judicial dos montantes em dívida, assim como a declarar o vencimento antecipado, nos termos das cláusulas contratuais, bem como a proceder ao acionamento das garantias prestadas a favor da nossa constituinte. Na falta de declaração de V. Exa nos termos do ponto anterior, reservamo-nos o direito de imputar os pagamentos efectuados de acordo com as regras estabelecidas nos art.s 784º e 785º CC.”
20. No dia 02.05.2023, foi remetido pela Requerente uma comunicação com o seguinte teor: “No seguimento da nossa reunião da passada 6ª. Feira, 21/4, vimos apresentar a seguinte proposta, que se afigura como a forma mais exequível e realista, de forma a podermos acomodar na nossa tesouraria a regularização do montante em atraso conjuntamente com o pagamento atempado das prestações a vencer a partir deste mês de Maio. Assim sendo, propomos dividir o pagamento do valor actualmente em dívida em 3 prestações mensais e sucessivas, a primeira de imediato, com as restantes duas no início de Junho/2023 e Julho/2023. Solicitamos ainda que nos seja enviado plano financeiro actualizado do emprésmo em curso.”
21. No dia 05.05.2023, foi remetida nova comunicação pela Requerente com o seguinte teor: “Tenho tentado insistentemente o contacto consigo, sem sucesso. Aliás, nem sequer através da linha geral do balcão consigo ver os meus telefonemas atendidos. O meu contacto vem no sentido de aferir se já há novidades sobre a nossa proposta de regularização da dívida, uma vez que até agora não tivemos qualquer feedback. Temos noção de que no próximo dia 9 de Maio se vence mais uma prestação do empréstimo, que, tal como mencionado na nossa proposta, queremos honrar. No entanto, necessitamos do compromisso da v/parte de que o valor a transferir será atribuído a essa mesma prestação e não a valores anteriores, para os quais foi apresentada a referida proposta de regularização. Caso contrário, ser-nos-á debitada mais uma comissão de incumprimento, por razões que nos transcendem. Por outro lado, volto a solicitar novo plano financeiro actualizado, que aguardamos desde o dia 2 de Maio, de forma a conhecermos o valor da prestação a vencer no dia 9 de Maio.”.
22. Na mesma data, foi remetido um e-mail aos Mandatários do Requerido com o seguinte teor: “No seguimento do nosso mail infra, de 2 de Maio de 2023 e do qual não obvemos qualquer reacção da v/parte, vimos de novo ao contacto com V.Exas, no sendo de obter uma resposta ao plano de regularização que foi por nós apresentado. Temos tentado sucessivos contactos, quer para o nosso gestor, quer para a linha de telefone fixo do balcão, sem que ninguém nos atenda o telefone. De igual forma, temos tentado o contacto telefónico com o v/escritório, sendo que não conseguimos passar de uma mensagem gravada, que nos diz para aguardarmos. As esperas são superiores a 15 minutos sem se conseguir falar com alguém! Temos noção de que no próximo dia 9 de Maio se vence mais uma prestação do empréstimo, que, tal como mencionado na nossa proposta, queremos honrar. No entanto, necessitamos do compromisso por parte do Abanca, de que o valor a transferir será atribuído a essa mesma prestação e não a valores anteriores, para os quais foi apresentada a referida proposta de regularização. Caso contrário, ser-nos-á debitada mais uma comissão de incumprimento, por razões que nos transcendem. Conforme referido e apesar das sucessivas tentativas de contacto, seja para o nosso gestor de conta, seja para o balcão, ou ainda para os v/escritórios, sem qualquer sucesso, não conseguimos ainda obter qualquer informação. De igual forma, desde o dia 2 de Maio que solicitámos ao Abanca o envio do plano financeiro actualizado, que ainda não nos foi facultado. Queremos deixar bem claro que da nossa parte existe a firme intenção de pagar a prestação de Maio, pelo que solicitamos resposta urgente.” (Cfr. DOC 11).
23. Em 08.05.2023, a Requerente, na pessoa do seu Director Financeiro, Dr. “B”, teve uma conversa telefónica com os serviços do Requerido, seguida do envio de um e-mail com o seguinte teor: “No seguimento da nossa conversa telefónica desta manhã, a opção de fazer a transferência para o pagamento da prestação de amanhã, apresenta o cenário que nós temos vindo a tentar evitar, ou seja, o valor irá ser atribuído às prestações mais antigas, ficando a de Maio como “não paga” e originando assim uma nova comissão de incumprimento, uma vez que, segundo a sua explicação, o v/sistema atribui de forma automática os valores. Assim sendo, queremos deixar bem claro que estaremos preparados para fazer a transferência hoje, desde que haja o v/compromisso de não nos ser debitada qualquer comissão de incumprimento. Além disso, volto de novo a insisr no envio do plano financeiro actualizado, que tem sido pedido insistentemente, uma vez que estamos sem saber qual o valor a ser transferido.
24. No mesmo dia foi enviada nova comunicação com o seguinte teor: “Venho insistir no envio do plano financeiro actualizado do empréstimo. Mais uma vez queremos deixar bem claro que queremos cumprir com o pagamento da prestação que se vence amanhã, de forma a não acumular o valor em dívida, mas torna-se dicil de o fazer, sem saber de que valor estamos a falar. Não entendemos o motivo pelo qual não nos é enviado o plano financeiro, que andamos a pedir de forma insistente desde o passado dia 2 de Maio.”
25. No dia 11 de Maio de 2023, a Requerente foi contactada pelos Mandatários do Requerido através de e-mail com o seguinte teor: “Na qualidade de mandatários da Abanca Corporación Bancaria, S.A., Sucursal em Portugal, vimos pelo presente, transmitir a V. Exa. que a proposta remetida por V. Exa. foi colocada à consideração da nossa Constituinte, permanecendo sob análise. Assim que obtivermos instruções quanto à mesma informaremos V. Exa. em conformidade. Informamos ainda, no que concerne à imputação de eventuais pagamentos às prestações vencidas, nos termos dos artigos 783.º a 785.º do Código Civil, estes consideram-se imputáveis à prestação que primeiro se tenha vencido, sendo que, em princípio, as prestações vencidas mais antigas serão as mais onerosas em consequência da contabilização de juros de mora.”
26. Subsequentemente, nos dias 15 e 19 de Maio de 2023 foram enviados novos e-mails a insistir numa resposta ao pedido de envio de plano financeiro e da proposta.
27. No dia 02.06.2023, a Requerente tomou a iniciativa de publicar uma exposição detalhada no site principal do Requerido, cópia da qual foi enviada aos Mandatários do Requerido e onde se pontuaram todas as acções e esforços desenvolvidos para resolver esta situação, tanto junto do banco como dos seus Mandatários, sem que tenha sido possível alcançar qualquer resultado.
28. No dia 05.06.2023 a Requerente recebeu uma comunicação dos Mandatários do Requerido com o seguinte teor: “Agradecemos a V. Exa. a cópia do email que nos foi remetida, sendo que, voltámos a insistir junto do Banco por ponto de situação quanto à análise da proposta apresentada. Assim que obtivermos instruções quanto à mesma informaremos V. Exa. em conformidade.”
29. Os montantes que estavam em dívida em 21 de Abril de 2023 foram pagos pela Requerente (Cfr. DOC 8), nos seguintes termos:
– em 07/07/2023 pagou o valor de 25,00 euros,
– em 07/07/2023 pagou o valor de 1.714,96 euros,
– em 09/08/2023 pagou o valor de 1.840,37 euros,
– em 08/09/2023 pagou o valor de 1.840,37 euros,
– em 14/09/2023 pagou o valor de 661,90 euros.
30. Foi a Requerente convocada para uma reunião presencial na sede do Requerido, o que veio a acontecer no dia 19 de Setembro de 2023.
31. Na dita reunião, em que estiveram presentes a Dra. “E”, Advogada do Requerido, e a Dra. “BB”, Responsável pelo Departamento de Contencioso do Requerido, a Requerente teve oportunidade de explicar o início da relação comercial entre ambas, bem como os meandros de todo este processo.
32. Nessa mesma reunião, a Requerente apresentou novamente proposta de pagamento dos valores entretanto vencidos.
33. A Requerente encontra-se em situação económica difícil, tendo recorrido, no passado dia 08.11.2023, a Processo Especial de Revitalização, o qual corre os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo do Comércio de Sintra – J(…), sob o número de processo (…)/23.0T8SNT.
34. Em 13/11/2023 foi nomeado Administrador Judicial Provisório.
35. Terminou, no dia 18/04/2024 o prazo para os credores exercerem o seu direito de voto ao plano de recuperação que foi publicitado no portal Citius no dia 08/04/2024, sendo o mesmo aprovado por maioria dos votos expressos.
36.  Apresentado que foi o PER para votação dos vários credores da Requerente, o Requerido, na qualidade de credor comum, votou contra a homologação do mesmo.
37. Apenas o Requerido e dois outros credores votaram desfavoravelmente.
38. O Requerido é detentor de um crédito inferior a 5% do total dos créditos reconhecidos no PER.
39. Apesar de ter sido devidamente convocado pela Requerente para activamente participar nas negociações que o PER impõe, sempre se manifestou contra.
40. O Requerido não formulou qualquer sugestão ou alteração às propostas de regularização apresentadas pela Requerente ou alegou, após publicação da versão do plano de recuperação no portal Citius, em conformidade com o que determina o n.º 2 do artigo 17º F do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa (doravante CIRE), o que melhor se adequasse às suas pretensões para que pudesse a Requerente, querendo, alterar o plano em conformidade.
41. A requerida enviou à Requerente uma comunicação datada do dia 01.04.2024, com o seguinte teor: “1. Face à apresentação a Processo Especial de Revitalização da sociedade X & Y, comércio Internacional, S.A., no âmbito do processo n.º 17356/23.0T8SNT, que corre termos no Tribunal (…), vimos em representação da Abanca Corporación Bancaria, S.A., Sucursal em Portugal, informar que, nos termos da Cláusula 14ª do Contrato se considera o vencimento antecipado do mesmo. 2. Mais informamos que temos instruções da nossa representada para proceder à execução da livrança subscrita por V. Exas., que é garantia do cumprimento do contrato”.
42. É, ainda, referido naquela comunicação que foi dirigida à Requerente o seguinte: “4. Lembramos que, aquando da celebração do Contrato, foi subscrita por V. Exas., uma Livrança para garantia das obrigações então assumidas, Livrança essa que se apresenta a pagamento, pelo valor de € 94.855, 27 (noventa e quatro mil oitocentos e cinquenta e cinco euros e vinte e sete cêntimos), com vencimento a 11 de Abril de 2024, pelo que interpelamos V. Exa. ao seu pagamento, sob pena de vir a ser executada judicialmente, acrescendo ao valor acima indicado, o montante de Imposto de Selo da Livrança correspondente a € 474,28. 5. Nestes termos, aguardaremos pelo prazo de 10 dias, para que proceda ao pagamento da quantia em dívida correspondente a € 105.050.33 (cento e cinco mil e cinquenta euros e trinta e três cêntimos), evitando dessa forma o recurso à via judicial e as despesas e encargos que lhe são inerentes.”
43. No seguimento daquela comunicação, a Requerente respondeu ao Requerido, por comunicação de 04.04.2024, dando conta que entendia que, por virtude da pendência do PER e em obediência ao disposto no art. 17ºE, nº10 CIRE, a requerida não poderia declarar o vencimento antecipado do MÚTUO, ou preencher e executar a Livrança.
44. Para garantia do cumprimento das obrigações contratuais assumidas no contrato de 09/02/2013 com as alterações introduzidas pelo aditamento de 09/02/2022, como resulta da Cláusula 12.ª do Contrato, a sociedade mutuária subscreveu e entregou à ora Requerida, uma livrança em branco, devidamente avalizada por “F” e “A”, conforme cópia que ora se junta como Doc. 3 cujo conteúdo se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
45. A livrança em apreço destinava-se a ser preenchida pela Requerida em caso de incumprimento do Contrato.
46. Face à apresentação da Requerente a Processo Especial de Revitalização, a aqui Requerida apresentou a devida reclamação de créditos no montante de € 101.478,63, decorrente do valor em dívida do Contrato de Mútuo n.º (…)090-1 e descoberto não autorizado que se verificava na Conta à Ordem n.º (…)624-5.
47. O crédito reclamado foi reconhecido em Lista Provisória de Credores, junta aos autos a 14/12/2023, conforme cópia que se junta como Doc. 5, cujo conteúdo se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
48. A 17/05/2023 foi proferido o Despacho de homologação do Plano de Revitalização.
49. Face à homologação do Plano de Revitalização, a 24/05/2024, o credor Banco BIC Português, S.A., apresentou alegações de recurso, considerando verificar-se a violação do princípio da igualdade entre os credores, pelo que, ainda aguardam os autos que seja proferido o respectivo acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
50. Em momento prévio à apresentação a Processo Especial de Revitalização, as prestações referentes ao Contrato de Mútuo n.º (…)090-1 encontravam-se em mora, conforme decorre das cartas de interpelação enviadas à Requerente e avalistas a 24/04/2023.
51. O plano financeiro resultante da alteração do Aditamento contratual, foi enviado à Requerente no dia 08/03/2022.
52. Decorrido o contratado período de carência de capital o empréstimo passaria a vencer prestações de capital, juros e respectivo imposto de acordo com o indexante à Euribor.
53. O Contrato previa uma taxa de juro variável, indexada à Euribor, pelo que, tendo ocorrido alterações ao indexante resultante da Euribor, o valor da prestação foi actualizado em conformidade.
54. À data das alterações das taxas de juro, essa informação era inserida no extrato do empréstimo enviada à mesma, sendo que, dos referidos extratos resulta a informação do valor das prestações do empréstimo, taxas, indexantes.
55. A Requerida enviou à requerente, a 24/07/2023, o plano financeiro que iria vigorar no ano subsequente.
56. Decorre da Cláusula 14.ª do Contrato que “14.1. Sem prejuízo de quaisquer outros direitos que lhe sejam conferidos por lei, pelo presente contrato, o Deutsche Bank poderá considerar automaticamente vencidas todas as obrigações ora assumidas pela Cliente, e exigir o seu cumprimento imediato, sempre que se verifique qualquer uma das seguintes situações: 14.1.(a) Se a Cliente não pagar, nas datas-valor previstas, quaisquer montantes devidos ao Deutsche Bank ao abrigo deste contrato, seja a que título for; 14.1(b) Se a Cliente e os Avalistas não cumprirem ou entrarem em mora no cumprimento de qualquer obrigação para si decorrente do presente contrato; (…) 14.1(d) Se a Cliente entrar em mora no cumprimento de quaisquer obrigações resultantes de outros empréstimos contraídos junto do sistema financeiro português ou estrangeiro; 14.1(e) Se o presente contrato deixar, por qualquer motivo, de constituir um compromisso válidos, nos seus precisos termos, para a Cliente e para os Avalistas.”.
*
Na decisão impugnada, foram considerados como não provados os seguintes factos:
1. Os pagamentos efectuados pela requerente corresponderam sempre ao montante previsto no PLANO que foi previamente acordado entre o Requerido e a Requerente.
2. Só em março de 2023 a Requerente tomou conhecimento de que haveria um novo plano financeiro para amortização do MÚTUO, diferente do PLANO anteriormente acordado (adiante “NOVO PLANO”), e para o qual a Requerente, por total e absoluto desconhecimento decorrente do incumprimento do Requerido na prestação de informação atempada, manteve pontualmente os reforços na conta “DO” para provisionar a mesma em conformidade, cumprindo com o PLANO.
3. As prestações devidas por via do NOVO PLANO que o Requerido, sem informação prévia, pretendeu impor à data, eram de valor superior àquelas previstas no PLANO entregue inicialmente à requerente e por tal motivo, as verbas depositadas na conta DO pela Requerente para pagamento do PLANO, estavam absolutamente correctas e em conformidade com o valor que era devido ao abrigo do PLANO.
4. O Requerido decidiu começar a aplicar um valor de prestações superior, unilateralmente e sem comunicar à Requerente. 5. A declaração de vencimento antecipado do Contrato e a possibilidade de apresentação de execução contra a requerente, levarão à sua ruptura financeira ao impedi-la de prosseguir com a sua actividade comercial.
*
3.
De acordo com o disposto no art. 651º, n.º1, do CPC, as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o art. 425º do mesmo código ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1.ª instância.
Da articulação entre os dois preceitos referidos – art. 425º e art. 651º, n.º1 – resulta que a junção de documentos na fase de recurso, sendo admitida a título excecional, depende da alegação e da prova pelo interessado de uma de duas situações:
a) A impossibilidade de apresentação do documento anteriormente ao recurso;
b) Ter o julgamento de primeira instância introduzido na acção um elemento de novidade que torne necessária a consideração de prova documental adicional.
A primeira situação está relacionada com a superveniência do documento, referida ao momento do julgamento em primeira instância, e pode ser caracterizada como superveniência objetiva ou superveniência subjetiva.
A segunda situação pressupõe a novidade ou a imprevisibilidade da decisão recorrida relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo (cf. acórdão do STJ de 30-04-2019, processo n.º 22946/11.0T2SNT-A.L1.S2, acessível em dgsi.pt).
Está em causa a primeira situação referida, posto que a recorrente alega que a remessa, pela recorrida, dos documentos mencionados ocorreu após o proferimento da decisão impugnada.
Por sua vez, a recorrida pugna pela inadmissibilidade dos documentos referidos com fundamento em que os mesmos não são idóneos a comprovar que o vencimento antecipado do contrato de mútuo em referência nos autos não tenha ocorrido (cf. ponto 98 das conclusões apresentadas pela recorrida).
A recorrida não questiona que o alegado pela recorrente no sentido de os documentos em referência terem sido remetidos em data posterior à data da decisão impugnada.
Face ao alegado pela recorrente e o acima referido, tem-se por verificada a superveniência objectiva legitimadora, face ao constante dos arts. 425º e 651º, n.º1, do CPC, da junção dos documentos na fase de recurso.
Importa referir que a aptidão probatória dos documentos não releva para aferir da sua admissibilidade ao processo.
Razão porque se decide admitir os quatro documentos juntos pela recorrente com as alegações do presente recurso.
*
4.
A recorrida defende que o recurso, no que respeita à matéria de direito, deve ser rejeitado, alegando que a recorrente não argumenta quais as normas legais que considera que a douta sentença violou ou o sentido com que deveriam ter sido interpretadas e aplicadas, não dando, assim, cumprimento ao disposto no art. 639º, n.º2, do CPC.
De acordo com tal preceito, versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada;
Por força do disposto no número 3 do mesmo artigo, quando, nas conclusões do recurso, se não tenha procedido às especificações mencionadas acima, o relator deve convidar o recorrente a completá-las ou esclarecê-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso na parte afectada, podendo o recorrido responder no prazo de cinco dias ao aditamento ou esclarecimento (cf. número 4 do mesmo artigo).
Como se refere no acórdão desta Relação de 26-10-2023 (processo n.º 3945/20.8t8ALM,L1-2, acessível em www.dgsi.pt), “o propósito do legislador ao enunciar os princípios constantes deste artigo [art. 639º do CPC], foi o de vincular os recorrentes a fornecer, nos recursos que interponham, a indicação, em moldes percetíveis, não só do que pretendem, como das disposições legais que afirmam terem sido violadas pela decisão impugnada.
Ora, resultando das conclusões do apelante qual o fundamento em que assenta a impugnação deduzida, a rejeição do recurso, com fundamento na ausência de especificação ou expressa menção das normas violadas, do sentido com que tais normas deveriam ser interpretadas e aplicadas, bem como, no caso de erro na determinação da norma aplicável imputado ao tribunal recorrido, da norma jurídica que, em alternativa, deveria ter sido aplicada, seria desconforme com a Constituição, porque assentaria numa leitura estritamente formal do consignado nas várias alíneas do n.º 2 do artigo 639.º do CPC.
Assim, se a parte nas alegações focou com objetividade a sua discordância sobre a decisão que impugna e tomou uma posição conclusiva de discordância relativamente a questões essenciais que referenciou, o Tribunal de recurso está em condições de conhecer do objeto do recurso.”
Por outro lado, entende-se que constando das conclusões da alegação recursória a delimitação do objecto do recurso e o sentido da solução jurídica pugnada pelo recorrente, e que o recorrido teve plena percepção de tal, podendo contraditá-lo (cf. Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, 7ª edição, Março de 2022, Livraria Almedina, Coimbra, p. 188), é de considerar, “tendo em conta o disposto no art. 5.º, n.º 3, do CPC, que seria acto inútil, logo ilícito (cf. art. 130.º do CPC), o convite ao aperfeiçoamento daquelas conclusões.           
No caso em apreço, entende-se que, das conclusões do recurso apresentadas pela recorrente consta a delimitação do seu objecto e o sentido da solução jurídica que defende, tendo a recorrida se pronunciado evidenciando percepção de tal, não estando em causa o exercício do contraditório que lhe assiste.
Em consequência do que se acaba de referir, o convite ao aperfeiçoamento previsto no art. 639º, n.º3, do CPC, constituiria um acto processual inútil e, em consequência, ilícito.
Face ao exposto, entende-se não existir fundamento para o não conhecimento do recurso previsto no art. 639º, n.º3, do CPC.
*
5.
Na conclusão TT, a recorrente invoca que a decisão recorrida padece de omissão de pronúncia, por nela não se conhecer da questão do abuso do direito da recorrida em preencher e/ou acionar a livrança em referência nos autos, que deve ser qualificada como tal, sem, contudo, o especificar.
Tendo presente que tal alegação se mostra constitutiva da nulidade da decisão prevista no art. 615º, n.º1, al. d), do CPC, e que, por isso, pode corresponder à arguição desse vício, passa-se a dele conhecer.
Uma das causas da nulidade da sentença (e, por via do disposto no art. 613º, n.º3, do CPC, de despachos judiciais) respeita à denominada omissão de pronúncia, que se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (art. 615º, n.º1, n.º1, al. d), do CPC), o que se coaduna com o estatuído no art. 608º, n.º2, do CPC, nos termos do qual “[o] juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.”
As “Questões” referidas no último artigo mencionado são “todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os pressupostos específicos de qualquer acto (processual) especial, quando realmente debatidos entre as partes” (Antunes Varela, RLJ, Ano 122.º, pág. 112), sendo que não podem confundir-se “as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão” (José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, Limitada, pág. 143).”
Importa, assim, distinguir entre questões a apreciar e razões ou argumentos apresentados pelas partes para defesa da solução que defendem para cada questão a resolver. "São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão" (Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, V Volume, Coimbra Editora, p. 143).
As questões postas, a resolver, "suscitadas pelas partes só podem ser devidamente individualizadas quando se souber não só quem põe a questão (sujeitos), qual o objeto dela (pedido), mas também qual o fundamento ou razão do pedido apresentado (causa de pedir)" (Alberto dos Reis, op. cit., pág. 54). Logo, "as "questões" a apreciar reportam-se aos assuntos juridicamente relevantes, pontos essenciais de facto ou direito em que as partes fundamentam as suas pretensões" (Ac. do STJ, de 16-04-2013, processo n.º 2449/08.1TBFAF.G1.S1, acessível em dgsi.pt) e não se confundem com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes (a estes não tem o Tribunal que dar resposta especificada ou individualizada, mas apenas aos que diretamente contendam com a substanciação da causa de pedir e do pedido).
Assim, a omissão de pronúncia reconduz-se às questões de que o Tribunal tenha o dever de conhecer para a decisão da causa e de que não haja conhecido, realidade distinta da invocação de um facto ou da invocação de um argumento pela parte sobre os quais o Tribunal não se tenha pronunciado.
A nulidade em referência só ocorrerá quando não exista pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição das partes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir, o pedido e as exceções, e não quando tão só ocorre mera ausência de discussão das "razões" ou dos "argumentos" invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas, deixando o juiz de os apreciar, conhecendo, contudo, da questão (cf. ac. do STJ de 21.12.2005, Pereira da Silva, Processo n.º 05B2287, acessível em dgsi.pt).
A referida nulidade da sentença por omissão de pronúncia não ocorre, no entanto, quando nela não se conhece de questão cuja decisão se mostra prejudicada pela solução dada anteriormente a outra (cf. ac. do STJ de 03-10-2002, processo n.º 02B1844, e ac. do STJ de 11-10-2022, processo n.º 602/15.0T8AGH.L1-A.S1, ambos acessíveis em dgsi.pt), o que se compreende, posto que o conhecimento de uma questão pode fazer-se tomando posição direta sobre ela ou resultar da ponderação ou decisão de outra conexa que a envolve ou a exclui (cf. ac. do STJ de 08-03-2001, processo n.º 00A3277, acessível em dgsi.pt).
Na decisão recorrida, foi convocado, como fundamento para a improcedência do procedimento cautelar deduzido pela recorrente, que, por força da pendência de PER respeitante a esta, do disposto no art. 17º E, n.º1, do CIRE, e da homologação do plano de pagamentos que modifica a dívida perante a recorrida,  esta, na qualidade de credora, não pode instaurar ou fazer seguir contra aquela qualquer acção de cobrança de dívidas, designadamente, com fundamento no incumprimento do contrato de mútuo referido na petição inicial e na livrança também aí mencionada, não sendo necessário o recurso ao presente procedimento cautelar para garantir o respeito de tal.
Na mesma decisão, também se refere estar demonstrado o incumprimento, por parte da recorrente, do aludido contrato de mútuo e o fundamento para a sua resolução, e que, caso a decisão de homologação do PER à mesma respeitante não se mantenha (em consequência de recurso interposto de tal decisão), deverá suportar os efeitos do incumprimento verificado, sendo que não se evidencia nem a ilicitude da resolução contratual comunicada pela requerida nem o preenchimento abusivo da livrança dada em garantia.
Atentando no requerimento inicial, verifica-se que a recorrente alicerça a invocação do abuso do direito por parte da recorrida, de preenchimento da livrança que identifica, na ausência de incumprimento do contrato de mútuo com aquela celebrado e, consequentemente, de fundamento para a sua resolução.
Como acima se referiu, na decisão recorrida apreciou-se a argumentação expendida pela recorrente para sustento da questão do abuso do direito por si invocada, tendo-se concluído, pelos motivos que nela constam, pela sua improcedência.
Entende-se, face ao exposto, que a decisão mencionada apreciou a questão do abuso do direito invocada pela recorrente no requerimento inicial, pelo que não padece do vício de omissão de pronúncia pela mesma apontado.
Conclui-se, assim, pela inexistência da nulidade da decisão impugnada por omissão de pronúncia, prevista no art. 615º, n.º1, al. d), do CPC.
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6.
Na decisão recorrida refere-se que nela apenas cumpre apreciar as questões que são suscitadas no presente procedimento na perspectiva dos direitos da requerente, não cabendo na mesma o conhecimento de tais questões na perspectiva dos direitos dos garantes, que não são partes no processo.
Como acima se referiu, um dos fundamentos invocados na decisão impugnada para a improcedência do procedimento cautelar respeita à ausência de necessidade de recurso ao presente procedimento cautelar para assegurar que a recorrida não intente ou não faça seguir contra a recorrente acção executiva fundada no incumprimento do contrato de mútuo celebrado entre ambas, por força da pendência do PER a esta última respeitante, que se mostra homologado, ainda que por decisão em relação à qual foi interposto recurso que se encontra pendente.
Também como se mencionou supra, o outro fundamento invocado na decisão impugnada para a improcedência do procedimento cautelar é a ausência de demonstração sumária da ilicitude da resolução do aludido contrato por parte da recorrida, tendo-se por sumariamente evidenciado o incumprimento contratual pela recorrente, sendo, por isso, legítimo o eventual preenchimento da livrança dada em garantia e sua execução, para o caso de a decisão homologatória do PER não ser mantida em sede de recurso da mesma interposto, no que à recorrente respeita.
Afere-se da motivação bem como das conclusões do recurso apresentadas pela recorrente que esta não questiona a verificação do primeiro fundamento referido, limitando-se a colocar em causa a existência do segundo fundamento mencionado, atinente ao incumprimento contratual e legalidade da resolução operada pela recorrida.
Importa reter, em concretização do primeiro fundamento decisório mencionado, que a recorrente, caso seja demandada, em sede de acção executiva, para cobrança da livrança que identifica, preenchida pela recorrida com fundamento no incumprimento e resolução do contrato de mútuo celebrado entre ambas (situação que a recorrente alega ser lesiva dos seus interesses e que pretende evitar com o presente procedimento cautelar), poderá a tal obstar deduzindo oposição à execução por embargos, nos termos do art. 728º, n.º1, do CPC, aí alegando a pendência do PER, podendo obter, sem prestação de caução, a suspensão da execução com fundamento no art. 733º, n.º 1, al. c), do mesmo código.
A recorrente dispõe, pois, de meio processual idóneo a colocá-la a salvo da situação lesiva que invoca, pelo que não tem necessidade de deitar mão do presente procedimento cautelar para tal, como assumido na decisão impugnada, mostrando-se, por isso, afastada a existência do fundado receio de ocorrência da lesão grave e dificilmente reparável na sua esfera jurídica que invoca, o que, face ao disposto no art. 362º, n.º1, do CPC, compromete a decretação da providência cautelar requerida.
Conclui-se, pelo exposto, pela improcedência do presente recurso.
Face ao referido, entende-se que a apreciação das quarta e quinta questões acima identificadas, atinentes à impugnação da matéria de facto e à procedência do procedimento cautelar com fundamento na ausência de incumprimento contratual por parte da recorrente, perdeu utilidade pelo que delas não se conhece.
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7.
Considerando a improcedência da apelação, a recorrente deverá suportar as custas do recurso (art. 527º, n.º1 e 2 do CPC).
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III.
Em face do exposto, acordam os Juízes Desembargadores que compõem o Colectivo desta 2ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa abaixo identificados em julgar o recurso interposto pela requerente improcedente e, em consequência, manter a decisão recorrida.
A requerente suportará as custas do processo.
Notifique.
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Lisboa, 05-12-2024.
Os Juízes Desembargadores,
Fernando Caetano Besteiro
António Moreira
Arlindo José Colaço Crua