Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
29754/21.9T8LSB.L1-4
Relator: ALVES DUARTE
Descritores: ISENÇÃO DE HORÁRIO DE TRABALHO
PRESTAÇÃO COMPLEMENTAR
DESPEDIMENTO ILÍCITO
INDEMNIZAÇÃO POR DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/10/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADO EM PARTE
Sumário: I. O subsídio por isenção do horário de trabalho é um complemento da e por isso integra a retribuição, não pressupõe uma efectiva prestação de trabalho sendo devida em relação a todos os dias do mês (art.ºs 258.º e 262.º do CT).
II. Merecem a tutela do direito e por isso constituem danos não patrimoniais ter o trabalhador em consequência do despedimento vivido em constante angústia, inquietação e desânimo, com consequência ao nível físico, nomeadamente, dores de cabeça, falta de apetite, perturbações gástricas, insónias prolongadas à noite, irritabilidade e apatia que lhe provocou sofrimento emocional, baixa auto-estima, vergonha, ansiedade e isolamento perante os seus amigos e familiares, afectando a sua estabilidade emocional e psicológica quando antes sentia orgulho no seu percurso profissional de mais de 25 anos de carreira em cargos de direcção (art.º 496.º, n.º 1 do CC).
Decisão Texto Parcial:Acordam, na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

I - Relatório.
AA intentou a presente acção declarativa, com processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, contra Adene ‒ Agência Para A Energia, tendo apresentado formulário legal no qual requereu que fosse declarada a ilicitude ou a irregularidade do seu despedimento, com as legais consequências.

Citada a ré, foi convocada e realizada audiência de partes, na qual as mesmas não quiseram acordar sobre o litígio que as divide.

Na sequência da notificação para esse efeito, a ré apresentou o seu articulado de motivação do despedimento, no qual aceitou que entre ambas vigorou aquele contrato de trabalho e que o mesmo cessou, por despedimento com justa causa do autor e juntou o processo disciplinar.

O trabalhador contestou, invocando a violação do princípio da vinculação temática (por constarem do articulado de motivação do despedimento factos não constantes da nota de culpa e do seu aditamento), a invalidade do procedimento disciplinar (por falta de descrição circunstanciada dos factos imputados ao trabalhador na nota de culpa e no aditamento à nota de culpa) e impugnando a generalidade dos factos que lhe são imputados e/ou a respectiva relevância disciplinar; e deduziu reconvenção na qual pediu que:
i. o Tribunal declarasse:
a) inatendíveis para justificar a justa causa do despedimento do Autor, todos os factos que a Ré invocou no articulado motivador do despedimento e que não constam dos artigos 1.º a 133.º, da nota de culpa, e dos artigos 1.º a 115.º, do aditamento à nota de culpa;
b) que o procedimento disciplinar é inválido, nos termos do disposto no artigo 382.º, n.º 2, alínea a), do Código do Trabalho, porque os artigos 15.º, 16.º, 33.º, 57.º, 58.º, 68.º, 69.º, 99.º e 118.º, da nota de culpa, não contêm uma descrição circunstanciada dos factos imputados ao Autor, em violação do disposto no artigo 353.º, n.º 1, do Código do Trabalho, coarctando o seu direito de defesa;
 c) que o procedimento disciplinar é inválido, nos termos do disposto no artigo 382.º, n.º 2, alínea a), do Código do Trabalho, porque os artigos 10.º B, 10.º C, 10.º D, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 20º, 22.º, 24.º, 25.º, 26.º, 28.º, 31.º, 40.º, 55.º, 60.º, 61.º, 63.º, 64.º e 65.º, 80.º, 100.º, 110.º, 111.º, 112.º, 114.º e 115.º, do aditamento à nota de culpa, não contêm uma descrição circunstanciada dos factos imputados ao Autor, em violação do disposto no artigo 353.º, n.º 1, do Código do Trabalho, coarctando o seu direito de defesa;
d) ilícito o despedimento do Autor, nos termos do disposto no artigo 381.º, alínea b), do Código do Trabalho, porque os motivos justificativos do mesmo são improcedentes;
ii. e condenasse a ré:
e) a pagar-lhe a quantia correspondente à diferença entre o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho que se encontra estabelecido no artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, e o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho correspondente a 20% da retribuição base mensal, entre o dia 02 de Abril de 2007 e a data da cessação do contrato de trabalho, a liquidar em execução de sentença, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde as respectivas datas de vencimento e até integral pagamento;
f) a pagar ao Autor as retribuições que o mesmo deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, acrescida de juros de mora vencidos desde a data de liquidação e vincendos à taxa legal até integral pagamento;
g) a reintegrá-lo no mesmo estabelecimento da ré, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade ou, em alternativa, a pagar-lhe uma indemnização, cabendo ao Tribunal determinar o seu montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude do seu despedimento, devendo o Tribunal atender ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial, e não podendo ser inferior ao valor correspondente a três meses de retribuição base e diuturnidades, acrescida de juros de mora vencidos desde a data da citação da Ré e vincendos à taxa legal até integral pagamento;
h) a quantia de €138,44 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde a data da citação e até integral pagamento;
i) a quantia anual de €2.597,35 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde a data da citação e até integral pagamento;
j) a título de danos não patrimoniais, a quantia de, pelo menos, €25.000,00, acrescida dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde a data da citação e até integral pagamento.

A empregadora respondeu às excepções, pugnando pela regularidade do procedimento disciplinar e pela licitude do despedimento, concluindo pela sua improcedência.
Foi admitida reconvenção do autor, dispensada a realização de audiência prévia, fixado valor da causa, lavrado despacho saneador, no qual foi verificada a regularidade da instância, relegado para final o conhecimento da suscitada invalidade do procedimento disciplinar, fixado o objecto do litígio e delimitados os temas da prova, admitidas as provas e reafirmada a data para realização da audiência de julgamento.

Realizada esta ao longo de oito sessões, foi em seguida proferida sentença, na qual o Mm.º Juiz declarou ilícito o despedimento do trabalhador promovido pela entidade empregadora e, em consequência:
a) condenou-a:
• a reintegrar o trabalhador no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
• a pagar-lhe as quantias, a liquidar, relativas às retribuições - incluindo férias, subsídios de férias e subsídios de Natal - devidas desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da presente decisão, acrescidas de juros, à taxa legal de 4%, desde o vencimento de cada uma dessas prestações e até integral pagamento (descontadas das importâncias que o trabalhador tenha obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e do subsídio de desemprego atribuído no referido período, a entregar pelo empregador à segurança social); e

b) absolveu-a do demais peticionado.

Em parte, inconformado o autor recorreu pedindo que nessa medida a sentença proferida seja revogada, culminando a alegação com as seguintes conclusões:
"1. O presente recurso de apelação vem interposto da sentença proferida no dia 03 de Agosto de 2023, e não se conformando com tal decisão, na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação da Recorrida (i) a pagar ao Recorrente a quantia correspondente à diferença entre o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho que se encontra estabelecido no artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, e o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho correspondente a 20% da retribuição base mensal, entre o dia 02 de Abril de 2007 e a data da cessação do contrato de trabalho, a liquidar em execução de sentença, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde as respectivas datas de vencimento e até integral pagamento, (ii) o pedido de condenação da Recorrida a pagar ao Recorrente, a quantia de €138,44 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde a data da citação e até integral pagamento, e (iii) o pedido de condenação da Recorrida a pagar ao Recorrente, a título de danos não patrimoniais, em resultado directo do seu despedimento ilícito, a quantia de, pelo menos, 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros), acrescida dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde a data da citação e até integral pagamento, doravante designada por «decisão recorrida»;
2. O Recorrente considera incorrectamente julgados os pontos da matéria de facto correspondentes aos artigos 332.º, 333.º e 334.º, da contestação, que a decisão recorrida considerou como não provados, no caso dos artigos 332.º e 333.º, da contestação, e que a decisão recorrida não considerou como provado, nem como não provado, no caso do artigo 334.º, da contestação; os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão diversa, são a confissão da Recorrida e os docs. n.ºs 17 e 18, juntos com a contestação, os quais não foram impugnados pela Recorrida; e a decisão que, no entender da Recorrente, deve ser proferida é a de Provado que no dia 22 de Janeiro de 2021, o Recorrente procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €127,65 apresentado pela Recorrida no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, no dia 19 de Janeiro de 2021, que no dia 07 de Maio de 2021, o Recorrente procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €10,79 apresentado pela Recorrida no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, e que a Recorrida não reembolsou ao Recorrente os referidos valores de €127, 65 e €10,79.
3. A Recorrida, na Réplica que apresentou ao abrigo do artigo 98.º-L, n.º 4, do Código de Processo do Trabalho, no dia 13 de Abril de 2022, com a referência: 41934989, não impugnou os artigos 332.º, 333.º e 334.º, da contestação, que estão integrados no capítulo A) Créditos Laborais, da Reconvenção que foi deduzida pelo Recorrente na sua contestação, omitindo qualquer referência aos mesmos, pelo que estes se consideram confessados pela Recorrida ou admitidos por acordo;
4. O doc. n.º 17, junto com a contestação, e que não foi impugnado pela Recorrida, prova que o Recorrente, no dia 22 de Janeiro de 2021, procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €127,65 apresentado pela Recorrida no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, no dia 19 de Janeiro de 2021;
5. O doc. n.º 18, junto com a contestação, e que não foi impugnado pela Recorrida, prova que o Recorrente, no dia 07 de Maio de 2021, procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €10,79 apresentado pela Recorrida no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual;
6. Os artigos 332.º, 333.º e 334.º, da contestação, que a decisão recorrida considerou como não provados, no caso dos artigos 332.º e 333.º, da contestação, e que a decisão recorrida não considerou como provado, nem como não provado, no caso do artigo 334.º, da contestação, encontra-se provados pela confissão da Recorrida, ou admitidos por acordo, e pelos docs. n.ºs 17 e 18, juntos com a contestação, os quais não foram impugnados pela Recorrida, pelo que se requer, ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que os mesmos sejam aditado aos factos provados, com a redacção seguinte: «No dia 22 de Janeiro de 2021, o Recorrente procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €127,65 apresentado pela Recorrida no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, no dia 19 de Janeiro de 2021; No dia 07 de Maio de 2021, o Recorrente procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €10,79 apresentado pela Recorrida no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual; A Recorrida não reembolsou ao Recorrente os referidos valores de €127,65 e €10,79»;
7. Atento o disposto no artigo 258.º, do Código do Trabalho, a retribuição do Recorrente integrava as prestações regulares e periódicas seguintes: Retribuição base mensal no valor de 2.722,50€, a partir de Outubro de 2014; Quantia mensal a título de despesas de representação, correspondente a 24,26% do valor da retribuição base mensal, entre 02 de Abril de 2007 e Setembro de 2014, e a 20% do valor da retribuição base mensal, a partir de Outubro de 2014; Subsídio de comissão de serviço, correspondente a 15% do valor da retribuição base mensal, a partir de Novembro de 2014; Retribuição de isenção de horário de trabalho no valor correspondente a 20% da sua retribuição base mensal;
8. Até ao dia 31 de Julho de 2012, o trabalho suplementar era pago pelo valor da retribuição horária com o acréscimo de 50% pela primeira hora – artigo 268.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, e a partir do dia 01 de Agosto de 2012, com a entrada em vigor da Lei n.º 23/2012, de 25 de Junho, o trabalho suplementar passou a ser pago pelo valor da retribuição horária com o acréscimo de 25% pela primeira hora – artigo 268.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho;
9. O valor da retribuição horária previsto no artigo 268.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, é calculado de acordo com a fórmula estabelecida no artigo 271.º, do Código do Trabalho, para a qual, a retribuição mensal (Rm), inclui a retribuição base mensal, a quantia mensal a título de despesas de representação, correspondente a 24,26% do valor da retribuição base mensal, entre 02 de Abril de 2007 e Setembro de 2014, e a 20% do valor da retribuição base mensal, a partir de Novembro de 2014, e o subsídio de comissão de serviço, correspondente a 15% do valor da retribuição base mensal, a partir de Novembro de 2014, e não apenas a retribuição base mensal, tal como decidiu, mas mal, a decisão recorrida;
10. A retribuição de isenção de horário de trabalho não é uma prestação complementar ou acessória, como é o caso, por exemplo, do subsídio de Natal, e, em consequência, a sua base de cálculo não é constituída apenas e tão-só pela retribuição base e diuturnidades, por aplicação do disposto no artigo 262.º, n.º 1, do Código do Trabalho, tal como decidiu, mas mal, a decisão recorrida;
11. A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem entendido de forma pacífica que, para efeitos do cálculo da retribuição específica devida pela isenção de horário de trabalho, devem ser considerados todos os dias do mês e não apenas o número de dias úteis do mês;
12. O valor da retribuição de isenção de horário de trabalho que se encontra estabelecido no artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, ou seja, uma hora de trabalho suplementar por dia, é sempre superior ao valor da retribuição de isenção de horário de trabalho correspondente a 20% da retribuição base mensal, porque o valor da retribuição horária previsto no artigo 268.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, é calculado de acordo com a fórmula estabelecida no artigo 271.º, do Código do Trabalho, para a qual a retribuição mensal (Rm), inclui a retribuição base mensal, a quantia mensal a título de despesas de representação, correspondente a 24,26% do valor da retribuição base mensal, entre 02 de Abril de 2007 e Setembro de 2014, e a 20% do valor da retribuição base mensal, a partir de Novembro de 2014, e o subsídio de comissão de serviço, correspondente a 15% do valor da retribuição base mensal, a partir de Novembro de 2014, e não apenas a retribuição base mensal, como decidiu, mas mal, a decisão recorrida, e porque, para efeitos do cálculo da retribuição específica devida pela isenção de horário de trabalho, devem ser considerados todos os dias do mês e não apenas o número de dias úteis do mês;
13. A Recorrida deve ao Recorrente a quantia correspondente à diferença entre o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho que se encontra estabelecido no artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, que corresponde a uma hora de trabalho suplementar por dia, considerando que o valor da retribuição horária previsto no artigo 268.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, é calculado de acordo com a fórmula estabelecida no artigo 271.º, do Código do Trabalho, para a qual a retribuição mensal (Rm), inclui a retribuição base mensal, a quantia mensal a título de despesas de representação, correspondente a 24,26% do valor da retribuição base mensal, entre 02 de Abril de 2007 e Setembro de 2014, e a 20% do valor da retribuição base mensal, a partir de Novembro de 2014, e o subsídio de comissão de serviço, correspondente a 15% do valor da retribuição base mensal, a partir de Novembro de 2014, e não apenas a retribuição base mensal, como decidiu, mas mal, a decisão recorrida, e que, para efeitos do cálculo da retribuição específica devida pela isenção de horário de trabalho, devem ser considerados todos os dias do mês e não apenas o número de dias úteis do mês, e o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho correspondente a 20% da retribuição base mensal, entre o dia 02 de Abril de 2007 e a data da cessação do contrato de trabalho, a liquidar em execução de sentença, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde as respectivas datas de vencimento e até integral pagamento;
14. A decisão recorrida, ao ter julgado improcedente o pedido de condenação da Recorrida a pagar ao Recorrente a quantia correspondente à diferença entre o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho que se encontra estabelecido no artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, e o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho correspondente a 20% da retribuição base mensal, entre o dia 02 de Abril de 2007 e a data da cessação do contrato de trabalho, a liquidar em execução de sentença, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde as respectivas datas de vencimento e até integral pagamento, violou o disposto nos artigos 265.º, n.º 1, alínea a), 268.º, n.º 1, alínea a), e 271.º, do Código do Trabalho, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito.
15. No dia 22 de Janeiro de 2021, o Recorrente procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €127,65 apresentado pela Recorrida no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, no dia 19 de Janeiro de 2021, e no dia 07 de Maio de 2021, o Recorrente procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €10,79 apresentado pela Recorrida no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, não tendo a Recorrida reembolsado ao Recorrente os referidos valores de €127, 65 e €10,79, pelo que lhe deve a quantia de €138,44 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde a data da citação e até integral pagamento;
16. A decisão recorrida, ao ter julgado improcedente o pedido de condenação da Recorrida a pagar ao Recorrente a quantia de €138,44 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde a data da citação e até integral pagamento, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito;
17. Os factos que a decisão recorrida considerou como provados, com relevância para a decisão do pedido de condenação da Recorrida a pagar ao Recorrente, a título de danos não patrimoniais, em resultado directo do seu despedimento ilícito, a quantia de, pelo menos, 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros), acrescida dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde a data da citação e até integral pagamento, têm gravidade mais do que suficiente para merecer a tutela do direito, pelo que o Recorrente tem o direito de ser ressarcido dos danos não patrimoniais sofridos, em resultado directo do seu despedimento ilícito, nos termos do disposto no artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, e nos artigos 483.º e 496.º, n.º 1, do Código Civil, computando os mesmos em, pelo menos, 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros).
18. A decisão recorrida, ao ter julgado improcedente o pedido de condenação da Recorrida a pagar ao Autor, a título de danos não patrimoniais, em resultado directo do seu despedimento ilícito, a quantia de, pelo menos, 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros), acrescida dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde a data da citação e até integral pagamento, violou o disposto no artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, e nos artigos 483.º e 496.º, n.º 1, do Código Civil, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito".

Contra-alegou a ré, sustentando a improcedência do recurso, concluindo assim:
"A) Na sua reconvenção, havia o Recorrente pedido que a Recorrida fosse condenada a pagar-lhe 'a quantia correspondente à diferença entre o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho que se encontra estabelecido no artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, e o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho correspondente a 20% da retribuição base mensal, entre o dia 02 de Abril de 2007 e a data da cessação do contrato de trabalho, a liquidar em execução de sentença, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde as respectivas datas de vencimento e até integral pagamento'.
B) O Recorrente fundou este pedido em dois argumentos: (i) no cálculo do valor da retribuição de IHT devem ser consideradas as quantias que o Recorrente recebia a título de despesas de representação e de subsídio de comissão de serviço; (ii) no cálculo do valor do subsídio de IHT devem ser considerados todos os dias do mês, não apenas os úteis. Nenhum destes argumentos é atendível.
C) O primeiro argumento contraria frontalmente o disposto no artigo 262.º/1 CT.
D) Nem adianta sustentar que é o cálculo da hora de trabalho suplementar, que por sua vez serve de referência para o cálculo do subsídio de IHT (cf. artigos 265.º/1-a, 268.º/1-a e 271.º CT), que deve tomar em consideração todas as prestações percebidas pelo trabalho ao cabo de cada mês. Esta sugestão é totalmente inopinada e infundada, tendo a nossa jurisprudência, como acima pluralmente se exemplificou, esclarecido que no cálculo do valor da hora de trabalho suplementar atende-se exclusivamente ao valor da retribuição base.
E) E, dentre outras, há uma claríssima e lógica razão para que assim seja: a ser como diz o Recorrente, para calcular o subsídio de IHT, deveríamos considerar o subsídio de comissão de serviço e as despesas de representação; para calcular o subsídio de comissão de serviço deveríamos tomar em conta o subsídio de IHT e as despesas de representação. De cada vez que realizássemos esta segunda operação, estaríamos alterando a base de cálculo do subsídio de IHT, que teríamos de computar outra vez. E com isso alteraríamos a base de cálculo do subsídio de comissão de serviço, que teríamos de calcular novamente. E assim sucessivamente num regresso infinito...
F) O segundo argumento improcede igualmente: o trabalhador está isento de horário de trabalho nos dias em que está a trabalhar; nos dias de descanso (que o Recorrente sempre observou), não tem horário de trabalho, não se justificando falar de isenção; logo, o número de dias a considerar no cálculo do valor mínimo do subsídio de IHT são os dias em que o trabalhador presta trabalho normalmente, ou seja, no caso do Recorrente, os dias úteis de cada mês.
G) Tal como supra se apurou, o montante recebido pelo Recorrente a título de subsídio de IHT superava em mais de 100€ o montante mínimo calculado nos termos do artigo 265.º/1 CT.
H) Acresce que, atendendo ao disposto no artigo 265.º/2 CT e à circunstância de o Recorrente exercer na Recorrida um cargo de direcção, poderia aquele renunciar a qualquer retribuição pela IHT. Por maioria de razão, se poderia renunciar, poderia aceitar uma fórmula de cálculo de retribuição diferente da que a lei prevê, ainda que, o que nem sequer é o caso, conduzisse a um valor retributivo inferior ao previsto no artigo 265.º/1-a CT.
I) Como vimos, está previsto no contrato de trabalho e respetivo aditamento, que vinculou o Recorrente até ao seu despedimento, que o seu subsídio de IHT se computava como uma percentagem de 20% da retribuição base. É o que basta para se julgar totalmente desprovida de fundamento qualquer pretensão do Recorrente a este respeito.
J) Quanto à pretensão indemnizatória por danos patrimoniais na sequência de despedimento ilícito, importa ter presente que do artigo 389.º/1-a CT e o dos artigos 496.º e 494.º CC, bem como da muito rica jurisprudência que acima abundantemente se citou, decorre que não basta a ilicitude do despedimento para que surja o direito à indemnização por danos não patrimoniais: é ainda necessário que esses danos sejam graves, a culpa do empregador seja manifesta e se afigure evidente o nexo causal entre os prejuízos alegados pelo trabalhador e a conduta do empregador.
K) Ora, no caso sub judice, os danos sofridos pelo Recorrente não apresentam uma gravidade juridicamente relevante, ou seja, não vão além do incómodo normal de quem se encontra sujeito ao poder disciplinar do empregador.
L) Além disso, e com extrema relevância, como muito detalhadamente se exemplificou, são múltiplas as infracções disciplinares que a sentença imputa ao Recorrente, tendo concluí do que 'a apreciação global da prestação do trabalhador, no exercício das suas funções de Director Financeiro, é idónea a causar na empregadora uma justificada desconfiança quanto à idoneidade do mesmo para continuar a assegurar tais funções de elevada responsabilidade e que pressupõem especial confiança'.
M) Na verdade, o despedimento só não foi julgado lícito, porquanto o Recorrente estava vinculado à Recorrida por um contrato no qual se obrigava a prestar trabalho com o cargo de diretor-adjunto.
N) Em suma, não tendo sido demonstrada a gravidade juridicamente relevante dos danos não patrimoniais sofridos pelo Recorrente e tendo ficado positivamente demonstrada a violação plúrima de deveres laborais pelo Recorrente, do que decorre a culpa diminuta da Recorrida, andou muito bem a sentença ao julgar improcedente o pedido de indemnização por danos não patrimoniais".

Admitido o recurso e remetido a esta Relação, foram os autos com vista ao Ministério Público, tendo a Exm.ª Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta aderido aos fundamentos da apelada e sido de parecer que aquele não merece provimento.

Nenhuma das partes respondeu ao parecer do Ministério Público.

Colhidos os vistos,[1] cumpre agora apreciar o mérito do recurso, cujo objecto, como pacificamente se considera, é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, ainda que sem prejuízo de se ter que atender às questões que o tribunal conhece ex officio.[2] Assim, porque em qualquer caso nenhuma destas nele se coloca, importa conhecer:
a) a impugnação da decisão proferida acerca da matéria de facto:
• julgar provado o alegado nos art.ºs 332.º e 333.º da contestação, julgados não provados;
• julgar provado o alegado no art.º 334.º da contestação, não julgado provado nem não provado;

b) o direito do apelante à condenação da apelada a pagar-lhe:
(i) a quantia correspondente à diferença entre o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho que se encontra estabelecido no artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, e o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho correspondente a 20% da retribuição base mensal, entre o dia 02 de Abril de 2007 e a data da cessação do contrato de trabalho, a liquidar em execução de sentença, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde as respectivas datas de vencimento e até integral pagamento;
(ii) a quantia de €138,44 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde a data da citação e até integral pagamento, e
(iii) a quantia de, pelo menos, €25.000,00, a título de danos não patrimoniais, em resultado directo do seu despedimento ilícito, acrescida dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde a data da citação e até integral pagamento.
***
II - Fundamentos.
1. Factos julgados provados:
(…)

2. Factos julgados não provados:
(…)

3. A motivação da decisão.
(…)

4. O direito
4.1 A impugnação da matéria de facto.
O apelante impugna a decisão proferida acerca dos factos alegados nos art.ºs  332.º, 333.º e 334.º da contestação, sendo que aqueles foram julgados não provados e este não foi objecto de decisão, mas em todo o caso pretende sejam agora julgados provados.

Esses factos dizem o seguinte:
"Art.º 332.º
Por outro lado, no dia 19 de Janeiro de 2021, o Autor procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €127,65 apresentado pela Ré no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (doc. n.º 17, que se junta e cujos termos se dá por reproduzido para todos os efeitos legais).
333.º
E no dia 07 de Maio de 2021, o Autor procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €10,79 apresentado pela Ré no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (doc. n.º 18, que se junta e cujos termos se dá por reproduzido para todos os efeitos legais).
334.º
A Ré não reembolsou ao Autor os referidos valores de €127,65 e €10,79".

Para o efeito, especificou os documentos n.ºs 17 e 18 juntos com a contestação, sustentando que a apelada nada disse sobre a questão na resposta e não impugnou os documentos, pelo que se deve considerá-los provados por confissão ou admitidos por acordo.

Por sua vez, a apelada nada disse na contra-alegação.

Finalmente, a sentença referiu apenas que "quanto à factualidade não provada, tal ficou a dever-se à circunstância de não ter sido produzida prova bastante, susceptível de fundar a convicção do Tribunal com o grau de certeza exigido, sendo que a eventual prova indiciária decorrente dos meios de prova supra descritos se mostra insuficiente para sustentar uma resposta positiva os respectivos artigos, considerando o disposto nos artigos 414.º do CPC (aplicável ex vi do artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do CPT) e 342.º, n.ºs 1 e 2, do CC". S; sendo de realçar que ao contrário do que fez relativamente a outros factos objecto da decisão, não especificou qualquer prova em abono da mesma.

E apreciando se dirá, muito sinteticamente, que tem razão o apelante e seguramente apenas por manifesto lapso o Tribunal a quo assim não terá logo considerado, o que é mais que compreensível dada a grande densidade da decisão, pelo que se julgarão provados os factos, tendo em conta que os documentos especificados pelo apelante não foram impugnados pela apelada (foram emitidos pela Caixa Central de Crédito Agrícola com referência aos ditos pagamentos ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial) e o disposto nos art.ºs 373.º, n.º 1 e 376.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil e 572.º, n.º 1, 573.º, n.º 1 e 574.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.; pelo que se aditarão esses factos aos provados.

4.2 As questões jurídicas.
4.2.1 Pretende o apelante que a apelada seja condenada a pagar-lhe (i) a quantia correspondente à diferença entre o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho que se encontra estabelecido no artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, e o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho correspondente a 20% da retribuição base mensal, entre o dia 02 de Abril de 2007 e a data da cessação do contrato de trabalho, a liquidar em execução de sentença, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde as respectivas datas de vencimento e até integral pagamento e (ii) em todos os dias do mês e não apenas no número de dias úteis do mês.

A sentença considerou o seguinte:
"A título de créditos laborais, reclama o trabalhador em sede de reconvenção, a condenação da empregadora a pagar a quantia correspondente à diferença entre o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho que se encontra estabelecido no artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho, e o valor da retribuição de isenção de horário de trabalho correspondente a 20% da retribuição base mensal, entre o dia 02 de Abril de 2007 e a data da cessação do contrato de trabalho, a liquidar em execução de sentença, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal em vigor, desde as respectivas datas de vencimento e até integral pagamento.
Salvo o devido respeito e melhor apreciação, afigura-se-nos que a este propósito assiste razão à empregadora, uma vez que o trabalhador pretende ver incluído no montante de retribuição mensal, para efeitos de cálculo do valor mínimo previsto da retribuição especial prevista no artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do CT, componentes que a lei expressamente afasta desse cômputo, conforme decorre do disposto no artigo 262.º, n.º 1, do CT.
Improcede, pois, este pedido".

O apelante discorda desde logo por considerar que a IHT não é uma prestação complementar ou acessória, mas a verdade é que neste ponto lhe não assiste razão.

E assim é desde logo atendendo ao elemento literal, em que complementar é algo que se junta a outra parte (na economia do art.º 262.º do Código do Trabalho, à retribuição base e diuturnidades) para com ela formar um todo completo (a retribuição a que se refere o art.º 258.º do Código do Trabalho).

De resto, em linha com isto, e sublinha-se, refere Diogo Vaz Marecos, Código do Trabalho, Comentado, 2020, 4.ª edição, Almedina, Coimbra, página 685 que "a retribuição por isenção de horário de trabalho é um complemento remuneratório que se prende com o modo específico como a actividade é exercida e/ou com a responsabilidade acrescida inerente ao exercício da actividade".

Finalmente, decorre do n.º 1 do art.º 265.º do Código do Trabalho que a retribuição por isenção de horário de trabalho está intimamente ligada à do trabalho suplementar, e a propósito desta lembrou o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24-05-2023, no processo n.º 18987/21.8T8LSB.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt, que "é jurisprudência consensual de que 'a retribuição mensal atendível para o cálculo do trabalho suplementar é a retribuição-base delineada no critério supletivo constante do art.º 250.º/1 do Código do Trabalho (art.º 262.º/1 do CT/2009)'".[3] Devendo salientar-se ainda, com data venia à apelada:
"15. Deve aliás notar-se que o entendimento proposto pelo Recorrente conduziria a um paradoxo matemático, sempre que o trabalhador auferisse mais do que uma prestação complementar ou acessória.
16. Repare-se: para calcular o subsídio de IHT, deveríamos considerar o subsídio de comissão de serviço e as despesas de representação; para calcular o subsídio de comissão de serviço deveríamos tomar em conta o subsídio de IHT e as despesas de representação. De cada vez que realizássemos esta segunda operação, estaríamos alterando a base de cálculo do subsídio de IHT, que teríamos de computar outra vez. E com isso alteraríamos a base de cálculo do subsídio de comissão de serviço, que teríamos de calcular novamente. E assim num regresso infinito, num problema que mimetiza o princípio da incerteza descrito por Heisenberg".

Já no que concerne ao segundo segmento não se acompanha a tese da sentença, mas a do apelante; e a despeito da apelada a não ter encontrado, é verdade que existe abundante jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça no sentido propugnado pelo apelante,[4] de que é exemplo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-01-2005, no processo n.º 04S923, publicado em http://www.dgsi.pt, assim sumariado na parte relevante:
"A referida retribuição especial não pressupõe uma efectiva prestação de trabalho extraordinário, revestindo carácter regular e permanente e, como tal, integra o conceito de retribuição nos termos do art.º 82.º da LCT e é devida em relação a todos os dias do mês, independentemente da prestação efectiva de qualquer trabalho, acrescendo à retribuição de base".

E o argumento alinhado no dito aresto é de racionalidade lapidar, como de resto seria de supor. Disse o Supremo:
"Trata-se de uma retribuição especial, que tem por objectivo compensar aqueles trabalhadores da maior penosidade e esforço acrescido inerentes à sua actividade, tendo sido atribuída pela consideração de que essa actividade impõe, normalmente, a prestação de trabalho extraordinário de difícil controlo. Mas não pressupõe uma efectiva prestação de trabalho extraordinário, revestindo carácter regular e permanente e, como tal, integrando a retribuição.
Por isso, a mesma é devida em relação a todos os dias do mês, independentemente da prestação efectiva de qualquer trabalho, acrescendo à retribuição de base devida".

Note-se que desse aresto consta uma robusta retrospectiva da jurisprudência tirada nessa matéria pelo Supremo Tribunal de Justiça, que de resto depois continuou a perfilhar, como foi nos seguintes arestos:
"I - A retribuição prevista na cláusula 74.ª, n.º 7, do CCT celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU consiste numa retribuição complementar destinada a compensar o trabalhador pela maior penosidade e risco decorrentes da possibilidade de desempenho de funções no estrangeiro e pela disponibilidade para uma tal prestação de trabalho, fazendo, assim, parte da retribuição global, cabendo no conceito legal de retribuição, não tendo que ver com a realização efectiva de trabalho extraordinário, aproximando-se da figura da compensação, ou “retribuição estabelecida” aos trabalhadores em geral pela isenção de horário de trabalho.
II - Assim, desempenhando o trabalhador – ao abrigo do contrato de trabalho firmado com a entidade empregadora – as suas funções de motorista nos transportes rodoviários de mercadorias, é-lhe devida a sobredita retribuição, independentemente das suas concretas deslocações ao estrangeiro.
III - O pagamento de tal retribuição, porque mensal e, por isso, regular e permanente, deve reportar-se a todos os dias do mês e não apenas a 22 dias úteis de trabalho".
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17-12-2009, no processo n.º 949/06.7TTMTS.S1, publicado em http://www.dgsi.pt

"2 - Tal retribuição, embora seja calculada com referência a duas horas de “trabalho extraordinário” por dia, não pressupõe nem exige a efectiva prestação de qualquer trabalho suplementar, respeitando tal referência apenas ao seu modo de cálculo".
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24-02-2015, no processo n.º 365/13.4TTVNG.P1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt

"2 - Tal retribuição, embora seja calculada com referência a duas horas de 'trabalho extraordinário' por dia, não pressupõe nem exige a efectiva prestação de qualquer trabalho suplementar, respeitando tal referência apenas ao seu modo de cálculo".
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 03-05-2016, no processo n.º 729/13.3TTVNG.P1.S2, publicado em http://www.dgsi.pt

Quanto a este aspecto, portanto, tem razão o apelante autor.

Todavia, com relevo para a apreciar do direito invocado apenas se provou que "o trabalhador, desde que foi admitido ao serviço da ADENE, em 2 de Abril de 2007, auferiu uma retribuição de isenção de horário de trabalho no valor correspondente a 20% da sua retribuição base mensal" (facto 204) e "a quantia que o trabalhador auferia a titulo de retribuição de isenção de horário de trabalho era paga 14 vezes por ano, ou seja, era paga no mês de férias, no subsídio de férias e no subsídio de Natal" (facto 205), mas não se tal aconteceu por referência a todos dias do mês ou apenas aos dias úteis ou de efectiva prestação de trabalho.

A este propósito prescreve o n.º 2 do art.º 609.º do Código de Processo Civil que "se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida".

Porém, como disse o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 15-02-2023, no processo n.º 10376/18.8T8SNT.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt, "sabendo-se que há/houve dano, não pode, por não estar provado o seu exacto quantum, negar-se a indemnização (só quando a existência dos danos é ainda uma incógnita, hipótese em que falta um dos elementos constitutivos do direito indemnizatório, é que não pode haver condenação)".

Ora, está bem de ver que este é precisamente o caso ressalvado no citado aresto, vale dizer, não se sabe (não se provou) se a apelada pagou ao apelante o subsídio por isenção de horário de trabalho por referência apenas aos dias úteis do mês e isso equivale a dizer que se não sabe (não se provou) se o apelante tem direito a receber mais do que recebeu da apelada; pelo que a conclusão a retirar daí é que também nesta parte se não pode conceder a apelação.

4.2.2 A segunda questão suscitada pelo apelante prende-se com o seu pedido de condenação da apelada a pagar-lhe a quantia de €138,44, acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, contados desde a citação até integral pagamento.

Como vimos atrás, provou-se agora que:
"205-A No dia 19 de Janeiro de 2021, o Autor procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €127,65 apresentado pela Ré no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual.
205-B E no dia 07 de Maio de 2021, o Autor procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €10,79 apresentado pela Ré no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual.
205-C A Ré não reembolsou ao Autor os referidos valores de €127,65 e €10,79".

Trata-se, portanto, de quantias correspondentes a actos praticados pelo apelante para a pelada em que aquele adiantou os respectivos custos.

Assim sendo, nesta parte procede a apelação (art.ºs 126.º, n.ºs 1 e 2 do Código do Trabalho e 405.º, n.º 1, 406.º, n.º 1 e 762.º, n.º 1 e 799.º, n.º 1 do Código Civil); incluindo quanto aos juros de mora vencidos, à taxa de 4% ao ano, desde a citação até efectivo pagamento (art.ºs 323.º, n.ºs 1 e 2 do Código do Trabalho e 559.º, n.º 1, 798.º, 804.º, n.º 1 e 805.º, n.º 2, alínea b) e 806.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil e Portaria n.º 291/03, de 8 de Abril).

4.2.3 Por fim, o apelante pretende que a apelada seja condenada a pagar-lhe a quantia de, pelo menos, €25.000,00, a título de danos não patrimoniais, em resultado directo do seu despedimento ilícito, acrescida dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde a data da citação e até integral pagamento.

A este propósito estatui o n.º 1 do art.º 496.º do Código Civil que "na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito".

Com relevo provado os seguintes factos:
"208. Em consequência do seu despedimento, o trabalhador tem vivido numa situação de constante angústia, inquietação e desânimo, com consequência ao nível físico, nomeadamente, dores de cabeça, falta de apetite, perturbações gástricas, insónias prolongadas à noite, irritabilidade e apatia.
209. Tal provocou no trabalhador sofrimento emocional, com reflexos no seu relacionamento familiar e afectivo, afectando a sua estabilidade emocional e psicológica.
210. O trabalhador sentia orgulho no seu percurso profissional de mais de 25 anos de carreira em cargos de direcção.
211. Com o seu despedimento, o trabalhador começou a revelar uma baixa auto-estima, vergonha, ansiedade e isolamento perante os seus amigos e familiares".

Perante isto e convocando respeitável jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça concluiu a sentença que "os danos efectivamente sofridos pelo trabalhador não vão para além daqueles «…que, comummente, se verificam em idênticas situações, como os do desgosto, da angústia e da injustiça…», não consubstanciam «…uma lesão grave, que vá para além daquela que sempre acontece em situações similares de despedimento…» [cfr. o citado acórdão do SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA de 25 de Janeiro de 2012], o que conduz necessariamente à conclusão do seu não ressarcimento em concreto, «…porque o direito a indemnização com fundamento em danos não patrimoniais não é de admitir como regra, mas apenas no caso singular de haver uma justificação segura, que leve a concluir pela necessidade de reparar uma lesão que restaria apodicticamente não satisfeita» [idem]. Improcede, pois, este pedido do trabalhador".

Neste ponto também não se acompanha a sentença apelada. Por um lado, o facto de certo facto ser em regra consequência de outro (causa) não significa menos merecimento na tutela do direito: o que importa é que seja grave a ponto de merecer a tutela do direito.

E é aqui que verdadeiramente se discorda da sentença. Repare-se:
• o apelante não experienciou apenas angústia (o que por si já não seria pouco, apesar do caminho que vem fazendo parte da nossa jurisprudência), mas, outrossim, "tem vivido numa situação de constante angústia, inquietação e desânimo", "começou a revelar uma baixa auto-estima, vergonha, ansiedade" e "irritabilidade e apatia";
• esse estado, obviamente de cariz psicológico, teve outras consequências: físicas ou com reflexo físico, como sendo "dores de cabeça, falta de apetite, perturbações gástricas, insónias prolongadas à noite"; mas também sociais, pois que "tal provocou no trabalhador sofrimento emocional, com reflexos no seu relacionamento familiar";
• tudo isto num trabalhador que "sentia orgulho no seu percurso profissional de mais de 25 anos de carreira em cargos de direcção", ou seja, que muito legitimamente via na relação com o trabalho parte da sua realização pessoal e de cidadão.

Assente que os danos sofridos pelo apelante em consequência da ilicitude do despedimento perpetrado pela apelada foram de tal gravidade que justificavam a tutela do direito, resta fixar agora o seu montante, para o que importa ter presente que "o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos dos números anteriores" (art.º 496.º, n.º 3 do Código Civil).

Olhando ao art.º 494.º do Código Civil, importa ao caso desde logo o grau de culpa da apelada (a sentença reconheceu a desproporcionalidade da sanção de despedimento) e a sua situação económica e do apelante, mas também as circunstâncias particulares do caso concreto.

Quanto a este último aspecto, é imperioso ter presente que o apelante é licenciado em Organização e Gestão de Empresas pelo Instituto de Novas Profissões (facto 152) e pós-graduado em Gestão e Avaliação Imobiliária pelo ISEG (facto 153), "frequentou o Mestrado de Gestão e Avaliação Imobiliária pelo IESEG (2009) com a área curricular concluída" (facto 154) pelo que, na ordem natural das coisas, é alguém para quem a profissão é muito importante pois só alcançável no final de um longo e naturalmente complicado percurso de vida; o que ganha acuidade quando considerado o seu longo percurso profissional de cerca de década e meia como trabalhador da apelada (factos 5 e 155 a 158), o que em todo o caso é atenuado pela decidida reintegração na mesma (note-se que a apelada a isso sequer se opôs, nessa parte a sentença transitou em julgado ‒ e ao que tudo indica foi voluntariamente cumprida ‒ o que deve ter-se em conta como vector relevante para a equidade); a situação económico-financeira das partes é desconhecida, embora não custe intuir, sobretudo da primeira dezena de factos provados que a apelada é uma empresa com relevante sucesso nesse domínio; e dos factos provados 196 a 206 que o apelante também não deixa de assim poder ser considerado, embora relativizando as coisas, como é evidente.

Em conclusão, dir-se-á que se ajusta ao caso uma compensação no valor de € 8.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, vencidos e vincendos desde a data da citação e até integral pagamento (art.ºs 559.º, n.º 1, 804.º, n.º 1 e 805.º, n.º 2, alínea b) e 806.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil e Portaria n.º 291/03, de 8 de Abril).
***
III - Decisão.
Termos em que se acorda conceder parcial provimento à apelação e, em consequência:
i. quanto à impugnação da decisão da matéria de facto, aditar aos provados os seguintes factos:
"205-A No dia 19 de Janeiro de 2021, o Autor procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €127,65 apresentado pela Ré no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual.
205-B E no dia 07 de Maio de 2021, o Autor procedeu ao pagamento da taxa devida por um pedido de registo de marca nacional, no valor de €10,79 apresentado pela Ré no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual.
205-C A Ré não reembolsou ao Autor os referidos valores de €127,65 e €10,79";

ii. na questão de direito, condenar a apelada a pagar ao apelante as seguintes quantias:
• €138,44 (cento e trinta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos) a título de reembolso;
• €8.000,00 (oito mil euros), a título de danos não patrimoniais;
• em ambos os casos, acrescidas de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, contados desde a data da citação e até integral pagamento;

iii. no mais, confirmar a sentença apelada.

Custas por ambas as partes, na proporção do decaimento (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil e 6.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela I-B a ele anexa).
*
Lisboa, 10-01-2024.
Alves Duarte
Francisca Mendes
Maria José Costa Pinto
_______________________________________________________
[1] Art.º 657.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
[2] Art.º 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil. A este propósito, Abrantes Geraldes, Recursos no Processo do Trabalho, Novo Regime, 2010, Almedina, páginas 64 e seguinte. 
[3] Entre as inúmeras decisões anteriores do Supremo Tribunal de Justiça sobre esta matéria podem ver-se, além dos citados pela apelada, de que é exemplo o acórdão de 11-05-2011, no processo n.º 273/06.5TTABT.S, de 12-03-2014, os tirados no processo n.º 294/11.6TTFIG.C1.S1 e de 03-07-2014, no processo n.º 532/12.8TTVNG.P1.S1, todos publicados em http://www.dgsi.pt.
[4] Embora nisto tenha a apelada razão: deve evitar-se convocar-se linhas doutrinais ou jurisprudenciais sem as identificar cabalmente (no caso, com datas de prolação e números de processo de acórdãos relevantes) de modo a que todos possam aceder com facilidade, embora no caso se esteja absolutamente em crer que tal não ocorreu com mala fides (até porque disso não aproveitava o apelante).
Decisão Texto Integral: