Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CONCEIÇÃO SAAVEDRA | ||
Descritores: | ACÇÃO EXECUTIVA DESERÇÃO DA INSTÂNCIA IMPULSO PROCESSUAL NEGLIGÊNCIA PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 06/16/2015 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I- À luz do Código de Processo Civil de 2013, na ação executiva a deserção da instância opera de forma automática, não dependendo de decisão judicial, desde que, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses; II- Não deixará, no entanto, o juiz de avaliar, em concreto, ao julgar a deserção, se houve efetiva negligência das partes motivadora da paralisação do processo por mais de seis meses; III- A imediata e gravosa consequência que hoje pode associar-se a um tal período de inatividade do processo, aconselham, face ao quadro normativo anterior, uma cautelosa ponderação dos requisitos que poderá passar, em caso de dúvida, e atendendo ao princípio da cooperação previsto no art. 7 do C.P.C., pela audição das partes ou pela sua notificação prévia com aquela expressa cominação; IV- Tal necessidade é acrescida na ação executiva, considerando, designadamente, as competências cometidas ao agente de execução e a circunstância do exequente não estar obrigado a nomear bens à penhora no requerimento executivo. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa: I- Relatório: JS e AS vieram, em 14.7.2010, propor contra AM, ação executiva comum para pagamento de quantia certa, atribuindo à execução o valor de € 14.559,87. Apresentam como título executivo documentos particulares subscritos pelo executado em que este assume pagar aos exequentes, em diversos momentos, certas quantias em dinheiro, concluindo que permanece em dívida o montante de € 14.025,00 desde 31.6.2009 a que acrescem juros entretanto vencidos. Nomearam à penhora o vencimento auferido pelo executado junto da Caixa ..., S.A.. Foram realizadas, por oficial de justiça conforme requerido, diligências de penhora no aludido salário, informando a entidade patronal, a fls. 20, que não podia iniciar o desconto dado estar em curso uma penhora de 1/3 por ordem de outro processo, encontrando-se em espera ainda um outro desconto por execução fiscal. Em consequência, em 14.9.2010, a fls. 22, informaram os exequentes manter interesse na referida penhora, solicitando, entretanto, a realização de mais diligências de averiguação de bens penhoráveis e subsequente penhora. Frustradas as novas diligências ordenadas (cfr. fls. 25 a 32), foram os exequentes notificados dos resultados obtidos (fls. 33), requerendo, em 4.11.2010, a penhora de saldos bancários (fls. 35). A fls. 41, em 26.11.2010, determinou o Tribunal, além do mais, que as funções de agente de execução ficassem a cargo de solicitador de execução. Em 7.1.2011, a fls. 45, foram remetidos à solicitadora de execução nomeada o requerimento executivo e documentos, tendo a mesma requerido, em 27.1.2011, a remessa de cópia de todos os atos praticados por oficial de justiça bem como “das respostas das entidades notificadas e das consultas efectuadas, para evitar a repetição de actos pela signatária”. Foi ordenada essa remessa em 1.2.2011, a fls. 47. Em 6.1.2015, a fls. 48, foi proferido o seguinte despacho: “Considerando a inércia das partes e ao hiato temporal decorrido, declaro deserta a instância, nos termos do artigo 281.º, n.º 5 do C.P.Civil e, consequentemente, extinta a presente execução [artigo 277.º, alínea c) do C.P.Civil]. Pelo que, ordeno o levantamento das penhoras efectuadas. Registe, notifique e oportunamente arquive.” Inconformados, interpuseram recurso os exequentes, apresentando as respetivas alegações que culminam com as conclusões a seguir transcritas: “ 1.Os Recorrentes propuseram acção executiva contra o Executado, para pagamento de quantia certa, no valor de € 14.559,87 (catorze mil quinhentos e cinquenta e nove euros e oitenta e sete cêntimos), aí tendo requerido a penhora do salário do Executado. 2.Por informação emitida pela Caixa ..., S.A., foi o Tribunal recorrido informado que de momento, não era possível iniciar os descontos requeridos no vencimento do empregado/Executado, porquanto já se encontravam a deduzir uma penhora no valor mensal de € 600,00, correspondente a 1/3 dos valores líquidos do referido vencimento, ordenada pelo Processo n.º 900/04.9TBPDL-B, encontrando-se – à data de 05/08/2010 – ainda por regularizar a verba de € 63.164,57, bem como que já se encontrava em espera uma outra penhora, referente ao Processo n.º 2992200601001167, ordenada pela Repartição de Finanças de Ponta Delgada, no montante de € 8.465,16. 3.Os Recorrentes, por forma a garantirem o lugar seguinte na penhora do salário do Executado, logo requereram ao Tribunal recorrido, que fosse efectuada a imediata penhora no vencimento do Executado – sem prejuízo de a mesma ter que ficar em espera, até que as penhoras anteriores atingissem os respectivos términus 4.Bem sabendo o tempo previsível, que demorariam a ser efectuadas e até chegarem ao fim, as duas penhoras anteriores, ainda assim os Recorrentes logo manifestaram interesse na requerida penhora. 5.Sem prejuízo da penhora de vencimento do Executado, requerida, os Recorrentes têm tentado apurar, através de outras diligências, conforme resulta dos autos, se o Executado possui quaisquer outros bens, nomeadamente, contas bancárias, bens imóveis, veículos automóveis, recheio de casa de morada de família. 6.Conforme resulta da informação de fls..., no que concerne à pesquisa no Registo Automóvel, não foram encontrados quaisquer veículos em nome do Executado. 7.No que concerne à penhora de vencimentos requerida, relativamente ao trabalho dependente alegadamente prestado pelo Executado para a firma “A., Lda” – de que o próprio Executado é sócio, também nada se logrou penhorar, pois conforme resulta de ofício junto aos autos a fls..., em 04/10/2010, assinado pelo próprio Executado “o signatário não aufere qualquer tipo de vencimento através desta empresa”. 8.Face à inexistências desses bens, os Recorrentes efectuaram novas diligências e requereram a penhora de saldos bancários de que o Executado pudesse ser titular em quaisquer instituições bancárias. 9.Enquanto se aguardava o levantamento do sigilo bancário, foi efectuada nova pesquisa e consulta ao registo informático de execuções, por parte da Sr.ª Agente de Execução, sendo que, conforme resulta de fls... dos autos, não foram encontrados em nome do Executado, quaisquer bens imóveis, e quaisquer veículos automóveis. 10.Igualmente não foi encontrado qualquer registo do Executado no resultado de pesquisa de sociedades unipessoais, assim como nas pensões a receber pela Caixa Geral de Aposentações. 11.Informaram os Recorrentes a Senhora Agente de Execução, que pretendiam ver penhorados os saldos bancários das instituições por si indicadas, em concreto, Caixa.., S.A., Banco M e Banco B – conforme requerimento junto aos autos a fls... – pese embora sem sucesso, porquanto, conforme resulta das informações prestadas pelas respectivas entidades bancárias, juntas aos autos a fls... não existia qualquer valor penhorável nessas mesmas contas. 12.Sem prejuízo das requeridas penhoras das contas bancárias, os Recorrentes pese embora tendo conhecimento que o vencimento auferido pelo Executado já se encontrava penhorado, para além de se encontrar uma outra penhora em espera – insistiram na penhora do vencimento do Executado, mesmo tendo noção que teriam que aguardar vários anos, para que fosse dado início à penhora por si requerida. 13. Não obstante, os Recorrentes insistiram em requerer ao tribunal recorrido, que fosse ordenada a imediata penhora do vencimento do Executado, em prejuízo dessa mesma penhora ter que ficar em espera, até que as penhoras anteriores atingissem os respectivos terminus. 14.Por determinação do Tribunal recorrido, a Caixa.., S.A. notificada para proceder à penhora do vencimento/salário do Executado – conforme resulta do ofício de fls... dos autos. 15.Nessa sequência, por notificação da Senhora Agente de Execução de 04/03/2011, foi a Caixa..., S.A. notificada de que “a penhora efectuada pela oficial de justiça ..., cuja cópia se junta, fica graduada em 3.º lugar, iniciando-se os descontos após o términus da anterior.” 16.Foram os Recorrentes notificados, em 22/03/2011, que “o vencimento do executado já foi penhorado, encontrando-se a aguardar a sua vez na ordem de prioridade de recebimento de notificações para penhora de vencimento”. 17.A requerida penhora do vencimento auferido pelo Executado, foi concretizada e que desde sempre, os Recorrentes, demonstraram manter interesse na mesma – sob pena de assim não ser, não virem a lograr obter quaisquer outros bens susceptíveis de penhora, que pudessem assegurar o pagamento da quantia exequenda. 18.Sem prejuízo de já terem a sua penhora graduada em 3.º lugar, os Recorrentes continuaram a efectuar diligências no sentido de apurar a existência de outros bens penhoráveis, nomeadamente, a penhora de eventuais reembolsos de IRS que o Executado pudesse vir a auferir. 19.Conforme informações constantes dos autos, enviadas pela Senhora Agente de Execução para a Direcção Geral dos Impostos, foi requerida a penhora de créditos que o Executado pudesse vir a ter relativamente à D.G.I., em consequência de reembolso de IRS – vd. notificação para penhora de créditos junta a fls... 20.Na sequência de requerimento apresentado pelos Recorrentes, foram estes notificados, na pessoa da sua Advogada, pela Sr.ª Agente de Execução, que ainda não havia sido recebida qualquer resposta por parte da Direcção de Serviços de Reembolsos, quanto às requeridas penhoras de IRS. 21. Não restou aos Recorrentes, qualquer outra alternativa, a não ser aguardar a respectiva resposta. 22.Por força de todas as diligências de pesquisa de bens, susceptíveis de penhora e todas elas infrutíferas, com excepção da penhora de vencimento, entretanto já graduada em 3.º lugar, - os Recorrentes, não têm quaisquer outras hipóteses de penhora, por inexistência de bens penhoráveis. 23.O que equivale a dizer que, não têm qualquer outra alternativa, a não ser aguardar pela requerida penhora de vencimento, graduada em 3.º lugar, e pela requerida penhora de eventuais reembolsos de IRS, cuja resposta ainda continuam a aguardar! 24.Ainda assim, decidiu o Meritíssimo Juiz do Tribunal ora recorrido, declarar deserta a instância, por força de alegada inércia das partes e do hiato temporal decorrido, e por conseguinte, julgar extinta a presente execução, mais tendo ordenado o levantamento das penhoras efectuadas. 25.Os Recorrentes não podem aceitar/concordar com o Despacho proferido! 26.Os Recorrentes tudo têm feito, o que está ao seu alcance, por forma a lograr penhorar quaisquer bens que sejam ao Executado, para tentarem assegurar o pagamento da quantia exequenda que lhes é devida. 27.Ninguém tem mais interesse na rápida resolução dos presentes autos, do que os próprios Recorrentes, pois tal equivaleria a dizer que ficariam ressarcidos do pagamento da quantia em dívida. 28.Ao resultar das diligências efectuadas e documentalmente constantes dos autos, que o Executado não possui quaisquer outros bens, escusado será dizer que, por muito que gostariam, os Recorrentes, lamentavelmente, não têm oportunidade de verem ser penhorados outros bens ao Executado. 29.Tal assim já não sucede, em relação ao salário por este auferido na Caixa..., S.A. e cuja penhora se encontra graduada em 3.º lugar. Não obstante e porque se encontram duas penhoras já registadas e anteriores à dos Recorrentes, não têm os mesmos alternativa, a não ser aguardar que essas duas penhoras cheguem aos respectivos terminus, pois só então se poderá dar início à penhora de vencimento por estes requerida! 30.O mesmo se aplica no que concerne às já requeridas penhoras de eventuais reembolsos de IRS pelo Executado. 31.Os Recorrentes requereram essas penhoras há já bastante tempo e desde então têm estado a aguardar. 32.Lamentavelmente, não lhes resta alternativa a não ser aguardar, pois sempre terão que ficar na dependência da informação da Direcção Geral dos Impostos e respectiva penhora, caso haja lugar ao pagamento de reembolsos. 33.Nunca os Recorrentes declararam nos presentes autos terem perdido o interesse na presente execução ou até mesmo, no que concerne à requerida penhora de vencimento do Executado. 34.Salvo o devido respeito por melhor opinião, nunca poderia o Meritíssimo Juiz proferir o Despacho ora recorrido, não antes, sem pelo menos, notificar as partes para em prazo para o efeito, se pronunciarem sobre se mantinham interesse nos autos ou até mesmo para se pronunciarem sobre uma eventual extinção da execução, por força do hiato temporal decorrido. 35.Importa considerar que estamos perante uma acção executiva em que até já se encontra pendente e requerida a penhora do salário do Executado, que inclusive se encontra graduada em 3.º lugar. 36.Deve o presente Despacho ora recorrido, sem dado sem efeito, por desprovido de razão e fundamento, e por conseguinte, ser mantida a presente execução. 37.Acresce que dos documentos juntos pela Senhora Agente de Execução, a fls... dos autos, resulta que as penhoras de reembolsos foram requeridas e em virtude de não terem sido identificados outros bens susceptíveis de penhora, foi efectuada a penhora de eventuais créditos de IRS. 38.Mais resulta que tal penhora é efectuada no Portal das Finanças, sem que até à presente data tenha havido qualquer comunicação da Autoridade Tributária com a Senhora Agente de execução, a não ser a actualização dos dados no Portal das Finanças. 39.Não podem os Recorrentes, verem a sua pretensão prejudicada por força dessa situação. 40.Resulta de documento junto aos autos a fls... pela Senhora Agente de Execução, que:“No exercício das suas funções a Autoridade Tributária informou à signatária que a mesma tem de aguardar pelo apuramento de tais créditos, de acordo com os normais procedimentos tributários, não havendo tratamento diferenciado não obstante haver uma penhora de créditos registada” 41.Conforme referido pela Senhora Agente de Execução no documento por si junto aos autos: “Tal penhora, torna moroso um processo executivo, dá a aparência de inércia no processo, e não se coaduna com os prazos previstos no CPC. No entanto, é um direito da exequente penhorar tais créditos. Assim, estando pendente uma penhora de créditos de IRS, que ainda não foi declarada não concretizada pela Autoridade Tributária, deverá ser dado sem efeito o despacho com a referencia 39596210.” 42.Os Recorrentes, não só entendem terem direito a penhorar tais créditos – decorrentes de eventual reembolso de IRS – como mantêm interesse nessa mesma penhora, por si requerida e acima de tudo não podem ser prejudicados, pela demora da Autoridade Tributária – situação distinta de inércia no processo. 43.Assim, i) estando já penhorado o vencimento do Executado, sem prejuízo da penhora se encontrar graduada em 3.º lugar, ii) inexistindo quaisquer outros bens susceptíveis de penhora e iii) tendo já sido requerida a penhora de eventuais créditos de IRS, pela Senhora Agente de Execução, junto do Portal das Finanças, sem que até ao presente momento tenha havido resposta por parte da Autoridade Tributária, pese embora a Autoridade Tributária tenha informado a Agente de Execução que tem que se aguardar pelo apuramento de tais créditos, de acordo com os normais procedimentos tributários, não havendo tratamento diferenciado não obstante haver uma penhora de créditos registada, iv) o que se afigura um processo moroso e v) sendo um direito dos Exequentes penhorarem tais créditos vi) na penhora dos quais continuam a manter interesse – deve o Despacho recorrido ser dado sem efeito, uma vez que não se pode concluir pela inércia das partes e nem por referência ao hiato temporal decorrido – que não está dependente das próprias partes – pelo que, não pode a presente execução ser declarada extinta!” Pedem a revogação do decidido, sendo ordenado o prosseguimento da execução. Não se mostram apresentadas contra-alegações. O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo. Sustentou ainda o Tribunal a quo não padecer o despacho recorrido de qualquer vício, salientando que quando o mesmo foi proferido “já há muito a instância se encontrava deserta, tendo em conta que a última comunicação da Srª Agente de Execução data de 8.05.2013 (…)”. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. *** II- Fundamentos de Facto: A factualidade a ponderar é a que acima consta do relatório e resulta dos autos em suporte de papel, resultando ainda da consulta do histórico do processo que: 1) Em 1.3.2011, procedeu, sem êxito, a Solicitadora de Execução (S.E.) à consulta das bases de dados da Segurança Social e do Registo Automóvel, bem como de outras entidades com vista à penhora de bens do executado; 2) Na mesma data requereu a S.E. ao Tribunal, “no seguimento da indicação à penhora de saldos de contas bancárias, efectuada pela exequente”, a autorização para “a penhora dos saldos de todos os depósitos bancários, bem como de quaisquer valores mobiliários escriturais e titulados integrados em sistema centralizado e bem assim, a outros valores mobiliários, quaisquer aplicações financeiras, escriturais ou titulados, integrados em sistema centralizado, registados ou depositados, de que seja titular o executado nas entidades que a seguir se indicam: …, bem como, quaisquer outras a indicar pela exequente”; 3) Em 4.3.2011, a referida S.E. informou a Caixa ..., S.A.., nos seguintes termos: “Na sequência da notificação para penhora do vencimento/ /salário do executado adiante indicado, venho pela presente informar que a signatária passou a assumir o cargo de agente de execução nos presentes autos. A penhora efectuada pela oficial de justiça ..., cuja cópia se junta, fica graduada em 3º lugar, iniciando-se os descontos após o términus da anterior”; 4) Por despacho de 10.3.2011, foi deferido o requerido no ponto 2 supra; 5) Por requerimento de 17.3.2011, insistiram os exequentes pela penhora do vencimento do executado junto da Caixa ..., S.A..; 6) Informando a S.E. os exequentes, em 22.3.2011, de que “O vencimento do executado já foi penhorado, encontrando-se a aguardar a sua vez na ordem de prioridade de recebimento de notificações para penhora de vencimento”; 7) Em 13.4.2011, requereram os exequentes à S.E. a penhora do “eventual reembolso de IRS a que o Executado tenha direito”; 8) Em 7.7.2011, a S.E. informou os exequentes das informações prestadas em resultado da penhora de saldos bancários; 9) Em 12.7.2011, a S.E. procedeu à notificação da Direção Geral dos Impostos nos seguintes termos: “Fica(m) pela presente formalmente notificado(s) que, nos termos do 856º do Código do Processo Civil, se considera penhorado o crédito que o executado AM detém em consequência de reembolso de IRS dos anos de 2010 e 2011, ficando este à ordem da signatária, até ao montante de 16.015,86€”; 10) Informando os exequentes, em 9.9.2011, de ainda não ter recebido “resposta da Direcção de Serviços de Reembolsos, quanto à penhora de IRS”; 11) Em 8.5.2013 consta da informação estatística da S.E. que há “Diligência de penhora em curso”; 12) Em 6.1.2015 foi proferido o despacho sob recurso acima transcrito. *** III- Fundamentos de Direito: Cumpre apreciar do objeto do recurso: Como é sabido, são as conclusões que delimitam o seu âmbito. Por outro lado, não deve o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido suscitadas no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar, a não ser que sejam de conhecimento oficioso. Percorrendo as conclusões acima transcritas, verificamos que a única questão a dilucidar respeita a saber se ocorre, no caso, causa de deserção da instância por força do art. 281, nº 1, do C.P.C. de 2013. Muito embora a presente execução tenha sido instaurada em 14.7.2010, não há dúvida de que o regime processual aplicável ao caso é o previsto no C.P.C. de 2013 aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26.6, tendo em conta o disposto no nº 1 do art. 6 da referida Lei. No domínio do C.P.C. de 1961, estipulava o art. 285 que a instância se interrompia “quando o processo estiver parado durante mais de um ano por negligência das partes em promover os seus termos ou os de algum incidente do qual dependa o seu andamento”, dispondo o art. 286 que tal interrupção cessava se o autor requeresse algum ato do processo ou do incidente de que dependesse o andamento do mesmo. Por outro lado, dispunha o nº 1 do art. 291 do mesmo Código que a instância se considerava deserta, independentemente de qualquer decisão judicial, quando estivesse interrompida durante dois anos, constituindo a deserção uma das causas de extinção da instância, nos termos da al. c) do art. 287 do mesmo diploma. Ao contrário do que se passava com a deserção da instância, que operava automaticamente pelo decurso do prazo, a interrupção da instância impunha a prolação de despacho judicial a verificar os requisitos da interrupção – paralisação do processo, por mais de um ano, em consequência da inércia das partes – divergindo apenas a jurisprudência sobre a natureza meramente declarativa ou constitutiva desse despacho. No atual C.P.C. de 2013 desapareceu a figura da interrupção da instância prevista nos aludidos arts. 285 e 286 do C.P.C. de 1961. Ao mesmo tempo, sob a epígrafe “Deserção da instância e dos recursos”, estabelece hoje o nº 1 do art. 281 do C.P.C., que “Sem prejuízo do disposto no n.º 5, considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses”, dispondo o nº 4 daquele dispositivo que “A deserção é julgada no tribunal onde se verifique a falta, por simples despacho do juiz ou do relator”. De igual modo, a deserção continua a constituir uma das causas de extinção da instância, por força da al. c) do art. 277 do mesmo C.P.C. de 2013. Por conseguinte, e no novo quadro normativo, a deserção da instância passou a depender de decisão judicial que aprecie e valore o comportamento dos sujeitos processuais. Por seu turno, o nº 5 do referido art. 281 estabelece uma exceção para as ações executivas, dispondo que, nesses processos, se considera deserta a instância “independentemente de qualquer decisão judicial, quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses”([1]). É evidente que se na ação executiva a deserção opera de forma automática, não dependendo de decisão judicial, não é menos certo que tal só ocorrerá, ainda assim, se se verificarem determinados requisitos, isto é, a paralisação do processo, por mais de seis meses, em consequência da inércia das partes. Assim colocada a questão, é manifesto o infundado da decisão recorrida, posto que se o processo se encontrava sem movimento aparente há mais de seis meses, não se nos afigura que tal ocorresse por inércia dos exequentes. Com efeito, tal como estes salientam no recurso e se tem por assente, encontra-se penhorado nos autos o vencimento auferido pelo executado junto da Caixa ..., S.A.., a aguardar pelo início dos descontos depois da conclusão de outros em curso ou a realizar à ordem de dois processos com penhoras anteriores. Por outro lado, encontrando-se também realizada a penhora do crédito do executado por reembolso de IRS dos anos de 2010 e 2011, não resulta dos autos que os exequentes tenham sequer sido notificados do resultado dessa diligência quando, por força do disposto no art. 754, nº 1, al. a), do C.P.C., compete ao agente de execução, designadamente, “informar o exequente de todas as diligências efetuadas, bem como dos motivos da frustração da penhora”. De resto, a última informação disponível da S.E., datada de 8.5.2013, é no sentido de que existe “Diligência de penhora em curso”. Assim sendo, não se alcança de que forma o presente processo aguardava a iniciativa processual dos exequentes ou dependia do impulso destes. Já vimos que a circunstância da deserção operar na ação executiva independentemente de decisão judicial não dispensa a verificação concreta dos pressupostos correspondentes, pelo que é sempre indispensável avaliar se houve efetiva negligência das partes motivadora da paralisação do processo por mais de seis meses. De resto, a imediata e gravosa consequência que hoje pode associar-se a um tal período de imobilização, aconselham, face ao quadro normativo anterior, uma cautelosa ponderação dos requisitos que poderá passar, em caso de dúvida, e atendendo ao princípio da cooperação previsto no art. 7 do C.P.C., pela audição das partes ou pela sua notificação prévia com aquela expressa cominação([2]). No caso da ação executiva tal necessidade mais se adensa, considerando, designadamente, as competências cometidas ao agente de execução e a circunstância do exequente não estar obrigado a nomear bens à penhora no requerimento executivo (cfr. arts. 719 e 724, nº 1, al. i), e nº 2, do C.P.C.), sendo certo que, muitas das vezes até, a aparente inatividade do processo apenas se justifica pela conduta do próprio agente de execução que, por exemplo, não cumpriu devidamente o seu dever de informação e comunicação. Em suma, de acordo com os elementos disponíveis, a presente execução não se encontrará, em bom rigor, sequer paralisada – já que estão em marcha penhoras de créditos (vencimento e IRS) cujo resultado é ainda incerto ou desconhecido – nem se vislumbra que tenha havido qualquer negligência dos exequentes em promover os respetivos termos. Não se mostram, por conseguinte, verificados os requisitos indispensáveis para que se considere deserta a instância executiva, ao abrigo do nº 5 do art. 281 do C.P.C., não podendo manter-se o decidido. *** IV- Decisão: Termos em que e face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente a apelação, revogando, por consequência, a decisão recorrida e determinando o prosseguimento da execução. Sem custas. Notifique. *** Lisboa,16-6-2015 Maria da Conceição Saavedra Cristina Coelho Roque Nogueira [1] Já o nº 1 do art. 3 do DL nº 41/2013, de 11.1, que aprovou um conjunto de medidas urgentes de combate às pendências em atraso no domínio da ação executiva, dispunha que: “Os processos executivos cíveis para pagamento de quantia certa que se encontrem a aguardar impulso processual do exequente há mais de seis meses extinguem-se”. [2] Ver, a propósito, o Ac. da RL de 9.9.2014, Proc. 211/09.3TBLNH-J.L1-7, o Ac. da RP de 2.2.2015, Proc. 4178/12.2TBGDM.P1, e o Ac. da RL de 26.2.2015, Proc. 2254/10.5TBABF.L1-2, todos disponíveis em www.dgsi.pt. |