Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
23/21.6PJAMD-D.L1-3
Relator: RUI GONÇALVES
Descritores: BUSCAS
ESTABELECIMENTO COMERCIAL
NULIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/26/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: No caso de o arguido ser detido em flagrante por crime de tráfico de estupefacientes, da previsão no n.º 1, do art.º 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, com referência às Tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma legal, não carece de validade judicial a busca levada no ato pelos agentes da PSP que efetuaram a detenção.

Quanto a este tipo legal de crime de tráfico de estupefacientes da previsão do n.º 1 do referido art.º 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, ex vi do art.º do 51.º do mesmo diploma legal, aplica-se o regime especial de buscas contido no n.º 1 do art.º 251.º do Código de Processo Penal que prescinde da autorização ou ordem prévia para execução da mesma.

Só assim não é, tratando-se de busca domiciliária.

A urgência da medida e alguma preocupação com a salvaguarda de eficácia da investigação justificam a atribuição de competência ao OPC para a sua prática.
O art.º 251.º CPP é uma disposição processual de natureza cautelar e de segurança de natureza policial.
No que se refere à busca realizada num estabelecimento comercial a mesma pela sua própria natureza apresenta-se como não domiciliária e em geral. c) do n.º 5 do art.º 174.º CPP.

Inexiste qualquer nulidade na realização da busca ao estabelecimento comercial em causa em situação de flagrante delito, bem como das apreensões em causa nos precisos termos em que o foram, já oportunamente validadas por despacho do Senhor magistrado do Ministério Público titular do respetivo Inquérito-Crime, não se mostrando minimamente beliscados os preceitos constitucionais e legais referidos pelo arguido/recorrente [n.º 2 do art.º 18.º, n.º 1 do art.º 26.º, n.º 8 do art.º 32.º e art.º 34.º da Constituição da República Portuguesa, bem como o n.º 3 do art.º 126.º, e a alínea c) do n.º 5 do, 174.º, n.º 5, estes ambos do Código de Processo Penal].
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na 3.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. RELATÓRIO

1.1. Inconformado com o despacho de 24-jun.-2022, da Senhora Juíza de Direito do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste - Juízo de Instrução Criminal da Amadora, que decidiu, no que ao caso releva:
«(…) Inexiste nulidade alguma na realização da busca, em situação de flagrante delito, seja ao estabelecimento comercial do arguido, seja ao seu veículo automóvel, o que se decide.” (…)
«Nesta conformidade, o arguido aguardará os ulteriores termos processuais na situação de prisão preventiva.
Tudo nos termos dos artigos 191º a 194, 196º, 202º, nº 1, als. a), b), c) e e), 203º, nº 2, al. b) e 204º, als. a), b) e c), todos do C.P.P..» [cf. p. 34 dos presentes autos (vol. 1.º) — Referência Citius: 138394173).

MC__, solteiro, comerciante, nascido em 10-dez.-1974, natural de São Tomé e Príncipe, com domicílio quando em liberdade na Av. G, Amadora.
Interpôs em 25-jul.-2022, o presente recurso que motivou formulando as seguintes Conclusões:
«I. A nulidade da busca e apreensão efetuadas no espaço reservado do  estabelecimento comercial sito na Av. G, Amadora.
«1. Resulta dos autos que foi realizada uma busca e apreensão de objetos no estabelecimento comercial denominado Equador, sito na Av. G, Amadora, no dia 23 de junho de 2022.
«2. A referida busca é, salvo melhor entendimento, nula.
«3. O arguido entende que o local concreto onde foi encontrado o produto estupefaciente não se trata de um espaço de livre acesso ao público (para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 174.º do C.P.P. a contrario) e que tal busca não podia ser realizada ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 5 do Artigo 174.º do C.P.P.
«4. Por um lado, as fotografias do estabelecimento comercial juntas pelo arguido em sede de interrogatório mostram que a máquina de café onde foi encontrado o produto estupefaciente encontra-se num espaço reservado, onde os clientes não têm acesso e, como tal, a respetiva busca e apreensão carecia de autorização judicial - o que não sucedeu na referida data (ao contrário do já sucedido, conforme resulta de fls. 1660).
«5. Por outro lado, é nosso entendimento que a leitura conjugada do n.º 1 do Artigo 256.º com alínea c) do n.º 3 do Artigo 174.º, ambos do C.P.P. não permitia a realização de busca no estabelecimento comercial sito na Av. G, Amadora.
«6. Em primeiro lugar, ressalta do n.º 1 do artigo 174.º do C.P.P. que “quando houver indícios de que alguém oculta na sua pessoa quaisquer objetos relacionados com um crime ou que possam servir de prova, é ordenada revista”.
«7. O n.º 2 do mesmo artigo diz-nos que “Quando houver indícios de que os objetos referidos no número anterior, ou o arguido, ou outra pessoa que deva ser detida, se encontram em lugar reservado ou não livremente acessível ao público, é ordenada busca”.
«8. Assim, os objetos em causa deverão dizer respeito tão só e apenas à pessoa que foi detida, pois é sobre ela que recaem as principais suspeitas.
«9. Contrariamente, o OPC realizou uma busca a um estabelecimento gerido por uma pessoa que foi indicada como vendedor de estupefaciente daquela que foi detida.
«10. Entendemos que a alínea c) do n.º 5 do artigo 174.º deverá ser interpretada e aplicada no sentido de ser permitida a realização de uma busca para a obtenção de objetos que estejam relacionados com o crime em apreço, mas que sejam diretamente relativos à pessoa que foi detida e não a qualquer outro interveniente no alegado — o que não aconteceu.
«11. A busca e apreensão realizadas no estabelecimento comercial sito na Av. G, Amadora nos termos constantes dos autos corresponde a uma intromissão ilegal na correspondência, que determinada a sua nulidade (nos termos do disposto no n.º 8 do Artigo 32.º da C.R.P.).
«12. Segundo o disposto nos n.ºs 1 e 3 do Artigo 126.º do C.P.P., tal meio de prova não pode ser utilizado.
«13. A busca e apreensão estabelecimento comercial sito na Av. G, Amadora, sem que tivesse ordem judicial para o efeito, existe uma violação dos artigos 18.º, n.º 2, 26.º, n.º 1, 32.º n.º 8, e 34.º da C.RP., e dos artigos 126.º, n.º 3, 174.º, n.º 5, alínea c), ambos do C.P.P.
«14. Por conseguinte, mesma deverá ser declarada nula — o que deverá levar à revogação do despacho recorrido no que à prisão preventiva diz respeito, devendo o arguido aguardar os ulteriores termos processuais à mesma medida de coação a que se encontrava sujeito ou sujeito às medidas de coação de proibição de frequentar as imediações do estabelecimento comercial que gere ou, em derradeira hipótese, à proibição de frequentar a cidade da Amadora (Concelho do local que é concretamente indicado como espaço de venda).
«Se assim não se entender,
«II. A desconformidade da decisão face aos princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade da medida de coação de prisão preventiva fixada ao Recorrente.
«15. O arguido compreende que o Tribunal a quo tenha entendido que “O perigo de continuação da atividade criminosa é por demais evidente”.
«16. Julgamos, contudo, que os factos pelos quais o arguido se encontra indiciado e os elementos probatórios que constam dos autos permitem a aplicação de outra medida de coação menos lesiva da liberdade do arguido e que satisfaz as exigências cautelares que se fazem sentir.
«17. A MMª. Juiz de Instrução Criminal que resulta dos autos, a título indiciário, que o arguido se dedica à venda de produto estupefaciente.
«18. Essa venda encontra-se perfeitamente delimitada, quer no modo de execução, quer no local de execução.
«19. Os factos indiciariamente imputados ao arguido refletem uma venda direta ao consumidor, venda essa que é concretamente realizada no estabelecimento comercial sito na Av. G onde os toxicodependentes se dirigem, sem que exista qualquer contacto prévio.
«20. Apelando ao princípio da proporcionalidade, acreditamos que, ficando o arguido impedido de frequentar o estabelecimento comercial que geria, a continuação da atividade criminosa mostra-se impossível, era ali (e apenas ali) que os consumidores se dirigiam.
«21. Cumpre ainda referir que a artéria onde se situa o estabelecimento comercial do arguido é controlada por CCTV 24 horas por dia — o que permitiria um controlo instantâneo do arguido (o que, na verdade, já sucedeu, pois as imagens constantes do processo são dá extraídas).
«22. Pelo que também poderia o arguido ficar proibido de frequentar a cidade da Amadora, pois reside em Queluz.
«23. Se assim não se entender, o arguido considera que o Tribunal a quo procedeu a uma interpretação contrária ao espírito das normas constantes do n.º 3 do Artigo 193.º e Artigo 201.º, ambos do C.P.P., tendo procedido a uma incorreta aplicação.
«24. O Tribunal deve prevalência à medida de OPHVE sempre que estiver em causa a aplicação de medida de coação privativa da liberdade e sempre que com tal medida seja possível acautelar os perigos constantes do Artigo 204.º do C.P.P.
«25. Certo é que a atividade delituosa do arguido que lhe é imputada resume-se à alegada venda produto estupefaciente diretamente ao consumidor final, num espaço específico e distante da sua residência.
«26. Inexiste qualquer prova que indique o arguido vendesse a partir da sua residência (que, como já se referiu, é distante do local nevrálgico de tráfico).
«27. Isto é: a conduta criminalmente relevante para efeitos de preenchimento do tipo do crime de tráfico de estupefacientes é, única e exclusivamente, a venda a terceiros, consumidores, numa concreta área da cidade da Amadora.
«28. Pelo que consideramos ser de concluir que a conduta ilícita do ora recorrente esgota-se no referido tipo de venda e que tal conduta poderá ser acautelada mediante a aplicação da medida de coação de permanência na habitação com recurso a vigilância eletrónica.
«29. Pelo que os Artigos 193º e 204.º do C.P.P. não foram devidamente interpretados e aplicados.
«30. Ao decidir como fez, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 193º, n.º 1 a 3, 196º, 198º, 200º, 201º, 202º e 204º, todos do C.P.P., incorrendo em erro de interpretação dos referidos normativos e em erro de subsunção dos mesmos ao caso concreto.
«31. Por todo o exposto, deverá o despacho recorrido ser revogado e substituído por douto acórdão que determine:
«A) A declaração de nulidade da busca e apreensão efetuadas no espaço reservado do estabelecimento comercial sito na Av. G, Amadora no dia 23 de junho de 2022, ficando o arguido a aguardar os ulteriores termos processuais à mesma medida de coação a que se encontrava sujeito ou sujeito às medidas de coação de proibição de frequentar as imediações do estabelecimento comercial que gere ou, em derradeira hipótese, à proibição de frequentar a cidade da Amadora (Concelho do local que é concretamente indicado como espaço de venda).

«Se assim não se entender,
«B) A aplicação da medida de coação de termo de identidade e residência ao arguido MC__, cumulada com proibição de frequentar as imediações do estabelecimento comercial que gere ou, em derradeira hipótese, à proibição de frequentar a cidade da Amadora (Concelho do local que é concretamente indicado como espaço de venda).
«C) A aplicação da medida de coação de termo de identidade e residência ao arguido MC__ cumulada a obrigação de permanência na habitação com recurso a vigilância eletrónica.» ([1]).
***
1.2. No Tribunal de 1.ª instância, por despacho de 05-ago.-2022, inserido nos autos a fls. 2 (vol. 1.º) ([2]), foi admitido o recurso, sendo este o próprio, tempestivamente interposto por quem tem legitimidade e interesse em agir, recebido com efeito, modo e momento de subida corretos, nada obstando ao conhecimento do seu objeto.
***
1.3. Na primeira instância, em 08-ago.-2022, houve resposta do Ministério Público ao referido recurso, que remata do seguinte modo:
«Nestes termos, conclui-se:
«1) Não ter sido violada qualquer disposição legal;
«2) O MMº Juiz ter efetuado uma correta apreciação dos requisitos e aplicabilidade do disposto nos artigos 191º a 194º, 196º, 202º, n.º 1, als. a), b), c) e e), 203º, n.º 2, al. b) e 204º, als. a), b) e c), todos do C.P.P..
«Vossas Excelências, porém, decidirão como for de JUSTIÇA!» ([3])
***
1.4. Nos termos do disposto no n.º 4 do art.º 414.º do Código de Processo Penal, em 09-ago.-2022, a Senhora juíza de direito sustentou as decisões recorridas nos seguintes termos:
«Venerandos Desembargadores:
 Por entender agravo não ter sido feito com as decisões recorridas, mantenho-as nos seus precisos termos.
Vossas Excelências, porém, decidirão como for de JUSTIÇA! » ([4]).
***
1.5. Nesta Relação, em 16-ago.-2022, o Senhor procurador-geral adjunto de turno emitiu o seu douto parecer ([5]), do seguinte modo:
«(…)[E]mite-se parecer no sentido da manutenção do decidido, pois que se concorda com os fundamentos de facto e de Direito contidos, quer na resposta do Ministério Público, quer na decisão recorrida.
«Com efeito, afigura-se-nos que deverá o arguido aguardar os ulteriores termos do processo em prisão preventiva, medida que em concreto é legal (art.º 191º, nº 1 do CPP), necessária, adequada e proporcional. (artº 193º do CPP).
«É manifesto o perigo que decorre do estado de liberdade do arguido (periculum libertatis), manifestamente pessoa violenta, em face da forte possibilidade de fazer perigar a ordem pública.
«Consequentemente se pugna pela improcedência do recurso. (…)»
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1.6. Cumprido o n.º 2 do art.º 417.º do Código de Processo Penal não foi apresentada qualquer resposta.
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1.7. Foram colhidos os vistos legais, sendo os autos remetidos à Conferência à qual se procedeu com observância do legal formalismo, cumprindo apreciar e decidir.
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2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. DA QUESTÃO DE FACTO
Resultam dos autos as seguintes ocorrências processuais relevantes para a decisão do presente recurso:
2.1.1. Por despacho proferido pela Senhora juíza do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste Norte - Juízo de Instrução Criminal da Amadora, datado de 24-jun.-2022, certificado a fls. 1, que integra fls. 24-35 dos autos (vol. 1.º), ora decisões em crise, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi decidido, no que ao caso releva:
(i) “Inexiste nulidade alguma na realização da busca, em situação de flagrante delito, seja ao estabelecimento comercial do arguido, seja ao seu veículo automóvel, o que se decide”;
(ii) “Decretar a prisão preventiva do arguido MC__, porquanto se entendeu demonstrada a existência de factos que indiciavam a prática pelo mesmo de:
— 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art.º 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-jan., por referência às Tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma legal;
— 1 (um) crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 2.º, n.º 1, al. ax), 3.º, n.º 1, al. e) e 86º, n.º 1, alínea d), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23-fev..
Considerou-se estarem verificados os perigos de fuga; para a aquisição, conservação e veracidade da prova; de continuação de atividade criminosa; e para a ordem e tranquilidade públicas.
2.1.2. No âmbito da diligência de 1.º Interrogatório Judicial de Arguido Detido realizada em 24-jun.-2022 (e não em 24-abr.-2022 como por lapsus calami consta do Auto — Referência Citius: 138394173([6]) certificado a fls. 1 (cf. fls. 15-35 destes autos — vol. 1.º), de relevante para apreciação do presente recurso mostra-se aí consignado:
«(…) Em seguida, a Mm.ª Juiz informou o arguido dos direitos referidos no art.º 61º do C.P. Penal.
«Após, pela Mm.ª Juiz foi dado a conhecer ao arguido, dos motivos da detenção, comunicou-lhe e expôs-lhe os factos que concretamente lhe são imputados, bem como dos elementos do processo que o indiciam:
«Desde data não concretamente apurada, mas pelo menos desde abril de 2021, que os arguidos JV, FS e o seu filho MS se dedicam à compra no estrangeiro de produto estupefaciente a terceiros, deslocando-se para o efeito ao estrangeiro, nomeadamente Holanda, onde adquirirem produto estupefaciente, o qual transportam para Portugal, para posteriormente venderem na zona de Lisboa e Amadora.
«Nomeadamente entregam algumas quantidades de heroína e cocaína ao arguido MC__, o qual, servindo-se do estabelecimento que explora (denominado Equador), vende produto estupefaciente a consumidores.
«No dia 10 de setembro de 2021 (fls. 321 a fls. 322, Vol. II), o arguido MC__ saiu do interior do seu estabelecimento de restauração denominado “Equador” sito nº da Av. G, Amadora, e deslocou-se para junto de uns Ecopontos onde contacta com um cidadão toxicodependente a fim de lhe fornecer produto estupefaciente.
«No dia 06 de outubro de 2021 (fls. 481 a fls. 486, Vol. II), o arguido MC__, no interior do estabelecimento Comercial denominado “Equador” sito no n.º da Av. G, Amadora, e deslocou-se para junto de uns Ecopontos onde contacta com um cidadão toxicodependente a fim de lhe fornecer produto estupefaciente.
«No dia 06 de outubro de 2021 (fls. 481 a fls. 486, Vol. II), o arguido MC__, no interior do seu estabelecimento comercial denominado “Equador” sito no n.º da Av. G, Amadora, sendo que ao seu interior desloca-se um cidadão toxicodependente a fim de adquirir produto estupefaciente, tendo sido intercetado após sair do estabelecimento na posse de 02 (duas) embalagens de Heroína com peso de 0.62 gramas.
«Nesse mesmo dia o arguido MC__, junto do seu estabelecimento denominado “Equador”, foi contactado por um toxicodependente e logo de seguida entram ambos par o estabelecimento, pelo que volvidos 2 (dois) minutos o toxicodependente abandona o local, com estupefaciente que o arguido MC__ lhe havia vendido.
«No dia 02-01-2022 sito na Av. G e nº …, Amadora, explorado pelo arguido MC__. (auto de busca e apreensão a fls. 1664 e ss):
«- 01 (uma) balança de precisão localizada na parte superior de uma vitrina frigorífica vertical.
«- Uma bolsa de cor preta da marca THE WITE COMPANY, contendo no seu interior 2.800,00 Euros em numerário localizado por baixo da máquina de cerveja a pressão.
«- Uma bolsa de cor preta da marca Comfort Itens contendo no seu interior 215 Euros em numerário, localizada em cima do barril de cerveja.
«- Um copo plástico com 19 euros em numerário, localizado ao lado da caixa registadora.
«- 20 (vinte) embalagens de Cocaína, em doses individuais.
«- 31 (trinta e uma) embalagens de Heroína, em doses individuais.
«No dia 06-10-2021 PF_ deslocou-se ao estabelecimento comercial, denominado “Equador” sito na Av. G n.º…   – Amadora e entrou em contacto com o arguido MC__.
«PF_ solicitou ao arguido duas doses de heroína, ao que o arguido entregou as duas doses de heroína a PF_, após este ter entregue a quantia de €10,00.
«No dia 23-06-2022 JS___ deslocou-se ao estabelecimento comercial, denominado “Equador” sito na Av. G n.º… – Amadora e entrou em contacto com o arguido MC__.
«JS___ solicitou ao arguido €20 de heroína e cocaína, ao que o arguido entregou a JS___ duas doses de heroína, com o peso total de 0,83 gramas e uma dose de cocaína, com o peso total de 0,11 gramas.
«No dia 23-06-2022, cerca das 10:20, no interior do Estabelecimento comercial, denominado “Equador” sito na Av. G n.º … – Amadora, e entrou em contacto com o arguido MC__:
«- Duas embalagens multivitaminas, acondicionadas no interior da máquina de café, no interior das quais o arguido detinha:
«a) 23 embalagens individualizadas de cocaína, com o peso total de 6,45 gramas;
«b) 77 embalagens individualizadas de heroína, com o peso total de 28,94 gramas.
«- A quantia de €1161,70, fracionados em 21 notas de €20,00, 57 notas de €10,00, 19 de €5,00, 10 moedas de €2,00, 23 moedas de €1,00, 5 moedas de €0,50, 82 moedas de €0,10 e 15 moedas de €0,05.
«Mais detinha o arguido MC__ uma faca, com lâmina de 6,5 cm, a qual, quando retraída, fica oculta dentro do cabo, sendo que a mesma lâmina se estende e retrai a partir de uma abertura lateral do cabo, vulgarmente designada como faca de ponta e mola.
«Na sua posse o arguido MC__ detinha a quantia de €15,00
«No dia 23-06-2022, cerca das 11:30, no interior do veículo de matrícula 96-EN-20, utilizado pelo arguido, este detinha a quantia de €1650,00 fracionados em 31 notas de €5,00, 1 nota de €100,00 e duas notas de 100 Francos.
«O arguido obteve tais produtos diretamente junto de produtores, e destinava tais produtos à venda a intermediários, que posteriormente os venderiam a consumidores, logrando desse modo adquirir avultadas quantias monetárias.
«O arguido conhecia as características estupefacientes dos produtos que transacionava, guardava e que detinha, nas circunstâncias supra descritas, tendo-o feito de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que a respetiva detenção, cedência e venda a terceiros os fazia incorrer em crime.
«Com a conduta descrita, atuaram os arguidos de forma livre, voluntária e consciente, previamente concertados e atuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas, conhecedores das características e natureza dos produtos, visando obter com a venda dos mesmos avultadas quantias monetárias, bem sabendo que a detenção ou a venda de tais produtos nas circunstâncias relatadas é proibida por lei e criminalmente punida.
«Não obstante, detinham aquelas substâncias estupefacientes, destinando-as à venda a indivíduos consumidores daqueles tipos de produtos.
«O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que não poderia deter ou transportar a faca, com tais características, e que não tinham licença para o seu uso e porte.
«Agiram de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
«Pelo exposto, encontra-se fortemente indiciada a prática, pelos arguidos, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21º, nº 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, por referência à Tabela I-C anexa a tal diploma, agravado nos termos do artigo 24º, alíneas c) e j), do mesmo diploma legal.
«Mais praticou o arguido um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 3º, nº 4 alínea a) e 86º, n.º 1, alínea c), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro.
«Prova, a dos autos, nomeadamente:
«1) Auto de notícia, a fls. 4-6;
«2) Relatório de diligências externas, a fls. 17-21, 66-84, 169-176, 187-192, 318-322, 399-402, 405-408, 464-486, 498-502, 553-561, 621-623, 627-628, 632-633, 718-732, 735-736, 891-902, 1036-1042, 1051-1067;
«3) Audição de interceções telefónicas, a fls. 140-143, 196, 266-267, 273-274, 278, 331-335, 343, 409, 413, 416, 421, 503, 509, 513, 565-566, 573, 583, 635, 642, 645, 647, 649, 651-652, 737, 741, 748, 750, 752, 754, 793-817, 831, 836, 847, 850, 910-911, 915, 929-930, 977, 986, 1120, 1122, 1126, 1129-1130, 1133, 1140;
«4) Auto de Apreensão, a fls. 458;
«5) Teste rápido, a fls. 490;
«6) Auto de notícia, a fls. 1043-1045;
«7) Relatório de Vigilância, a fls. 1287-1293;
«8) Relatório de Vigilância, a fls. 1294-1323;
«9) Relatório de Vigilância, a fls. 1324-1330;
«10) Relatório de Vigilância, a fls. 1345-1357;
«11) Relatório de Vigilância, a fls. 1358-1363;
«12) Relatório de Vigilância, a fls. 1364-1369;
«13) Auto de notícia por detenção, a fls. 1424-1427;
«14) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1433-1436;
«15) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1437-1438;
«16) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1439-1440;
«17) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1451-1453;
«18) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1454-1455;
«19) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1456-1457;
«20) Teste Rápido, a fls. 1460;
«21) Reportagem Fotográfica, a fls. 1465-1473;
«22) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1474;
«23) Relatório de Vigilância, a fls. 1528-1530;
«24) Auto de Apreensão, a fls. 1531-1534;
«25) Bilhetes, a fls. 1535-1538;
«26) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1541-1557;
«27) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1558-1559;
«28) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1564-1565;
«29) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1566-1567;
«30) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1568-1570;
«31) Auto de notícia por detenção, constante de fls. 1586-1590;
«32) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1593-1598;
«33) Teste Rápido, a fls. 1601;
«34) Auto e Exame e Avaliação, a fls. 1605-1606;
«35) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1607-1608;
«36) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1609-1610;
«37) Fotografias, a fls. 1612-1614;
«38) Auto de notícia por detenção, a fls. 1615-1617;
«39) Auto de busca e apreensão, a fls. 1620-1626;
«40) Inquirição de Tatiana Lucy Lopes, a fls. 1629-1630;
«41) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1631-1632;
«42) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1633-1634;
«43) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1635-1636;
«44) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1637-1638;
«45) Auto de busca e apreensão, a fls. 1643-1645;
«46) Auto de busca e apreensão, a fls. 1664-1671;
«47) Teste Rápido, a fls. 1673;
«48) Auto de notícia por detenção, a fls. 1680-1682;
«49) Inquirição de PF_, a fls. 3222-3223;
«50) Inquirição de JC___, a fls. 3224;
«51) Inquirição de R___, a fls. 3226;
«52) Auto de Apreensão, a fls. 3235-3236;
«53) Teste Rápido, a fls. 3238;
«54) Inquirição de JS___, a fls. 3239-3240;
«55) Relatório de visionamento, a fls. 3242-3244;
«56) Auto de Apreensão, a fls. 3245-3246;
«57) Auto de Busca e Apreensão, a fls. 3247-3249;
«58) Teste Rápido, a fls. 3251;
«59) Saco de plástico, a fls. 3252;
«60) Auto de exame e avaliação, a fls. 3253-3254;
«61) Fotografias, a fls. 3255-3259;
«62) Auto de Busca e Apreensão, a fls. 3260-3261;
«63) Inquirição de JS__, a fls. 3262-3263;
«Auto de notícia por detenção, a fls. 3270-3273.
*
O arguido [ora recorrente MC__] não prestou declarações em sede de 1.º interrogatório judicial de arguido detido (art.º 141.º do Código de Processo Penal) quanto aos factos indiciados, apenas tendo esclarecido a sua condição socioeconómica.
2.1.3. No despacho judicial de 24-jun.-2022 referido em 2.1.1., que integra as ora decisões recorridas, no que aqui releva expressou-se:
(i) Quanto à arguida nulidade da busca no estabelecimento comercial:
«Uma vez que o Distinto Defensor veio arguir a nulidade da busca realizada no estabelecimento comercial do arguido, concomitante com as apreensões resultantes e a detenção do arguido, antes de mais, cumpre da mesma apreciar e decidir:
«Resulta dos autos que, agora mormente após fls. 3222, a autoridade policial vem verificando a existência de movimentação de clientela ao estabelecimento comercial do arguido, não para consumo de restauração de bebidas que ali comercializa legitimamente, mas para aquisição de produtos estupefacientes, conforme relatos de testemunhas documentados nos autos.
«Isso mesmo sucedeu no dia de ontem: a autoridade policial presenciou a entrada e saída de cidadão consumidor que logo abordou e inquiriu na qualidade de testemunha, constatando que o arguido a este havia acabado de vender produtos estupefacientes, imediatamente avançando com a abordagem do arguido e dos seus estabelecimento comercial e veículo, realizando busca, da qual resultaram as apreensões documentadas e a detenção do arguido em flagrante delito.
«Nos termos do artº 174º do C.P.P.: (…)
«Para compreensão do conceito de flagrante delito importa atentar no disposto no artº 256º do C.P.P.: (…) Ora, não se quedam dúvidas de que a autoridade policial presenciou a entrada e a saída de consumidores do estabelecimento comercial do arguido, designadamente JS___  em 23-6-2022, que logo abordou à saída do estabelecimento, na detenção de produtos que afirmou com seriedade e verosimilhança que adquiriu a MC__, referindo até o local onde o mesmo arrecadava os produtos estupefacientes, debaixo da grade da máquina de café, sítio também referenciado por João da Silva.
«Nesta sequência e no imediato, foram acionados os meios policiais para abordagem, busca, apreensão e detenção do estabelecimento comercial e do arguido, com o resultado documentado nos autos.
«O intervalo temporal de cerca de uma hora, referido pela Defesa para afastar a existência de flagrante delito não merece esse valor, sendo até desprezível, quanto mais não fora olhando ao disposto no nº 2 do artº 256º do C.P.P., sendo certo que o Tribunal considera integrada a existência de flagrante delito nos termos do nº 1 do mesmo preceito.
«Em verdade, mantendo-se o arguido como explorador e quem naquela data estava no local a atender os clientes do estabelecimento, designadamente a “tirar cafés”, não se quedam dúvidas de que o mesmo era quem, no dia de ontem, 23-6-2022, se mantinha no domínio do interior do balcão do seu estabelecimento, já que acabara de vender droga a JS___  e pouco depois logo foi abordado pela autoridade policial.
«Quando assim não fora, importa que não se olvide que o crime de tráfico de estupefacientes se basta com a mera detenção, sendo esta encabeçada pelo arguido MC__, que se encontrava, como já se disse, no café, a atender os clientes do mesmo, seja ao nível da restauração e bebidas, seja ao nível da venda de drogas.
«Nos termos do art.º 118º, nº 1 do C.P.P., a violação ou a inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do ato quando esta for expressamente cominada na lei.
«Ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações sem o consentimento do respetivo titular, dispõe o nº 3, do art.º 126º do C.P.P..
«Ora, como se vem dizendo e não restarão agora dúvidas, inexiste nulidade alguma na realização da busca, em situação de flagrante delito, seja ao estabelecimento comercial do arguido, seja ao seu veículo automóvel, o que se decide.»
*
(ii) «Julgo válida a detenção do arguido efetuada numa situação de flagrante delito e tempestiva a sua apresentação em juízo – artigos 254.º, n.º 1, al. a), 255.º, n.º 1, al. a) e 256.º, nºs 1 e 2, todos do CPP»
*
(iii) Consideraram-se fortemente indiciados os seguintes factos:
1. «Desde data não concretamente apurada, mas pelo menos desde abril de 2021, que os arguidos JV, FS e o seu filho MS se dedicam à compra no estrangeiro de produto estupefaciente a terceiros, deslocando-se para o efeito ao estrangeiro, nomeadamente Holanda, onde adquirirem produto estupefaciente, o qual transportam para Portugal, para posteriormente venderem na zona de Lisboa e Amadora.
2. «Nomeadamente entregam algumas quantidades de heroína e cocaína ao arguido MC__, o qual, servindo-se do estabelecimento que explora (denominado Equador), vende produto estupefaciente a consumidores.
3. «No dia 10 de setembro de 2021 (fls. 321 a fls. 322, Vol. II), o arguido MC__ saiu do interior do seu estabelecimento de restauração denominado “Equador” sito nº da Av. G, Amadora, e deslocou-se para junto de uns Ecopontos onde contacta com um cidadão toxicodependente a fim de lhe fornecer produto estupefaciente.
4. «No dia 06 de outubro de 2021 (fls. 481 a fls. 486, Vol. II), o arguido MC__, no interior do estabelecimento Comercial denominado “Equador” sito no n.º da Av. G, Amadora, e deslocou-se para junto de uns Ecopontos onde contacta com um cidadão toxicodependente a fim de lhe fornecer produto estupefaciente.
5. «No dia 06 de outubro de 2021 (fls. 481 a fls. 486, Vol. II), o arguido MC__, no interior do seu estabelecimento comercial denominado “Equador” sito no n.º da Av. G, Amadora, sendo que ao seu interior desloca-se um cidadão toxicodependente a fim de adquirir produto estupefaciente, tendo sido intercetado após sair do estabelecimento na posse de 02 (duas) embalagens de Heroína com peso de 0.62 gramas.
6. «Nesse mesmo dia o arguido MC__, junto do seu estabelecimento denominado “Equador”, foi contactado por um toxicodependente e logo de seguida entram ambos par o estabelecimento, pelo que volvidos 2 (dois) minutos o toxicodependente abandona o local, com estupefaciente que o arguido MC__ lhe havia vendido.
7. «No dia 02-01-2022 sito na Av. G e nº…, Amadora, explorado pelo arguido MC__. (auto de busca e apreensão a fls. 1664 e ss):
«- 01 (uma) balança de precisão localizada na parte superior de uma vitrina frigorífica vertical.
«- Uma bolsa de cor preta da marca THE WITE COMPANY, contendo no seu interior 2.800,00 Euros em numerário localizado por baixo da máquina de cerveja a pressão.
«- Uma bolsa de cor preta da marca Comfort Itens contendo no seu interior 215 Euros em numerário, localizada em cima do barril de cerveja.
«- Um copo plástico com 19 euros em numerário, localizado ao lado da caixa registadora.
«- 20 (vinte) embalagens de Cocaína, em doses individuais.
«- 31 (trinta e uma) embalagens de Heroína, em doses individuais.
8. «No dia 06-10-2021 PF_ deslocou-se ao estabelecimento comercial, denominado “Equador” sito na Av. G n.º … – Amadora e entrou em contacto com o arguido MC__.
9. «PF_ solicitou ao arguido duas doses de heroína, ao que o arguido entregou as duas doses de heroína a PF_, após este ter entregue a quantia de €10,00.
10. «No dia 23-06-2022 JS___ deslocou-se ao estabelecimento comercial, denominado “Equador” sito na Av. G n.º… – Amadora e entrou em contacto com o arguido MC__.
11. «JS___ solicitou ao arguido €20 de heroína e cocaína, ao que o arguido entregou a JS___ duas doses de heroína, com o peso total de 0,83 gramas e uma dose de cocaína, com o peso total de 0,11 gramas.
12. «No dia 23-06-2022, cerca das 10:20, no interior do Estabelecimento comercial, denominado “Equador” sito na Av. G n.º… – Amadora, e entrou em contacto com o arguido MC__:
«- Duas embalagens multivitaminas, acondicionadas no interior da máquina de café, no interior das quais o arguido detinha:
«a) 23 embalagens individualizadas de cocaína, com o peso total de 6,45 gramas;
«b) 77 embalagens individualizadas de heroína, com o peso total de 28,94 gramas.
«- A quantia de €1161,70, fracionados em 21 notas de €20,00, 57 notas de €10,00, 19 de €5,00, 10 moedas de €2,00, 23 moedas de €1,00, 5 moedas de €0,50, 82 moedas de €0,10 e 15 moedas de €0,05.
«Mais detinha o arguido MC__ uma faca, com lâmina de 6,5 cm, a qual, quando retraída, fica oculta dentro do cabo, sendo que a mesma lâmina se estende e retrai a partir de uma abertura lateral do cabo, vulgarmente designada como faca de ponta e mola.
«Na sua posse o arguido MC__ detinha a quantia de €15,00
13. «No dia 23-06-2022, cerca das 11:30, no interior do veículo de matrícula 96-EN-20, utilizado pelo arguido, este detinha a quantia de €1650,00 fracionados em 31 notas de €5,00, 1 nota de €100,00 e duas notas de 100 Francos.
14. «O arguido obteve tais produtos diretamente junto de produtores, e destinava tais produtos à venda a intermediários, que posteriormente os venderiam a consumidores, logrando desse modo adquirir avultadas quantias monetárias.
15. «O arguido conhecia as características estupefacientes dos produtos que transacionava, guardava e que detinha, nas circunstâncias supra descritas, tendo-o feito de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que a respetiva detenção, cedência e venda a terceiros os fazia incorrer em crime.
16. «Com a conduta descrita, atuaram os arguidos de forma livre, voluntária e consciente, previamente concertados e atuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas, conhecedores das características e natureza dos produtos, visando obter com a venda dos mesmos avultadas quantias monetárias, bem sabendo que a detenção ou a venda de tais produtos nas circunstâncias relatadas é proibida por lei e criminalmente punida.
17. «Não obstante, detinham aquelas substâncias estupefacientes, destinando-as à venda a indivíduos consumidores daqueles tipos de produtos.
18. «O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que não poderia deter ou transportar a faca, com tais características, e que não tinham licença para o seu uso e porte.
19. «Agiram de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
20. «O arguido MC__ foi já condenado pela prática em 2006 de um crime de roubo, por acórdão de 19-10-2007, transitado em julgado em 19-11-2007, na pena de 6 anos de prisão, a qual se mostra extinta; pela prática em 14-10-2006 de um crime de roubo, por acórdão de 7-7-2008, transitado em julgado em 12-11-2009, na pena de 4 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 4 anos, mediante regime de prova, a qual se mostra extinta; pela prática em 24-8-2013 de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, por sentença de 4-9-2013, transitada em julgado em 9-10-2013, nas penas de 60 dias de multa e de 3 meses de proibição de conduzir veículos motorizados, as quais se mostram extintas e pela prática em 1-8-2016 de um crime de ofensa à integridade física qualificada e de dois crimes de detenção de arma proibida, por acórdão de 13-3-2018, transitado em julgado em 24-4-2018, na pena única de 2 anos e 9 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, mediante sujeição a deveres, a qual se mostra extinta.
21. «O arguido vive com uma companheira e a filha menor desta, de 12 anos.
22. «O arguido tem 4 filhos, com 24, 17, 14 e 7 anos de idade, para os menores contribuindo com €70,00 por mês para cada um, suportando o mais necessário para a sua saúde e educação.
23. «O arguido explora o estabelecimento de café pelo qual obtém entre €2000,00 a €3000,00 brutos, suportando cerca de €400,00 de despesas de funcionamento do mesmo, sendo €250,00 de renda.
24. «O arguido efetua também alguns biscates em mudanças.
25. «Obtém em termos líquidos, entre €700,00 e €1000,00 mensais.
*
(iv) Ficaram por indiciar os seguintes factos:
«Que “o arguido obteve tais produtos diretamente junto de produtores, e destinava tais produtos à venda a intermediários.”
*
(v) Os factos acima descritos, no que aqui interessa, no entender do Tribunal a quo integram a prática pelo arguido/recorrente MC__ de:
 — «1 (um) de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21º, nº 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, por referência às Tabelas I-A e I-B anexas a tal diploma,
— «1 (um) crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 2º, nº 1, al. ax), 3º, nº 1, al. e) e 86º, n.º 1, alínea d), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro».
*
“(…) PROVA
«A dos autos, nomeadamente:
«1) Auto de notícia, a fls. 4-6;
«2) Relatório de diligências externas, a fls. 17-21, 66-84, 169-176, 187-192, 318-322, 399-402, 405-408, 464-486, 498-502, 553-561, 621-623, 627-628, 632-633, 718-732, 735-736, 891-902, 1036-1042, 1051-1067;
«3) Audição de interceções telefónicas, a fls. 140-143, 196, 266-267, 273-274, 278, 331-335, 343, 409, 413, 416, 421, 503, 509, 513, 565-566, 573, 583, 635, 642, 645, 647, 649, 651-652, 737, 741, 748, 750, 752, 754, 793-817, 831, 836, 847, 850, 910-911, 915, 929-930, 977, 986, 1120, 1122, 1126, 1129-1130, 1133, 1140;
«4) Auto de Apreensão, a fls. 458;
«5) Teste rápido, a fls. 490;
«6) Auto de notícia, a fls. 1043-1045;
«7) Relatório de Vigilância, a fls. 1287-1293;
«8) Relatório de Vigilância, a fls. 1294-1323;
«9) Relatório de Vigilância, a fls. 1324-1330;
«10) Relatório de Vigilância, a fls. 1345-1357;
«11) Relatório de Vigilância, a fls. 1358-1363;
«12) Relatório de Vigilância, a fls. 1364-1369;
«13) Auto de notícia por detenção, a fls. 1424-1427;
«14) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1433-1436;
«15) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1437-1438;
«16) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1439-1440;
«17) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1451-1453;
«18) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1454-1455;
«19) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1456-1457;
«20) Teste Rápido, a fls. 1460;
«21) Reportagem Fotográfica, a fls. 1465-1473;
«22) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1474;
«23) Relatório de Vigilância, a fls. 1528-1530;
«24) Auto de Apreensão, a fls. 1531-1534;
«25) Bilhetes, a fls. 1535-1538;
«26) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1541-1557;
«27) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1558-1559;
«28) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1564-1565;
«29) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1566-1567;
«30) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1568-1570;
«31) Auto de notícia por detenção, constante de fls. 1586-1590;
«32) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1593-1598;
«33) Teste Rápido, a fls. 1601;
«34) Auto e Exame e Avaliação, a fls. 1605-1606;
«35) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1607-1608;
«36) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1609-1610;
«37) Fotografias, a fls. 1612-1614;
«38) Auto de notícia por detenção, a fls. 1615-1617;
«39) Auto de busca e apreensão, a fls. 1620-1626;
«40) Inquirição de Tatiana Lucy Lopes, a fls. 1629-1630;
«41) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1631-1632;
«42) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1633-1634;
«43) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1635-1636;
«44) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1637-1638;
«45) Auto de busca e apreensão, a fls. 1643-1645;
«46) Auto de busca e apreensão, a fls. 1664-1671;
«47) Teste Rápido, a fls. 1673;
«48) Auto de notícia por detenção, a fls. 1680-1682;
«49) Inquirição de PF_, a fls. 3222-3223;
«50) Inquirição de JC___, a fls. 3224;
«51) Inquirição de R___, a fls. 3226;
«52) Auto de Apreensão, a fls. 3235-3236;
«53) Teste Rápido, a fls. 3238;
«54) Inquirição de JS___, a fls. 3239-3240;
«55) Relatório de visionamento, a fls. 3242-3244;
«56) Auto de Apreensão, a fls. 3245-3246;
«57) Auto de Busca e Apreensão, a fls. 3247-3249;
«58) Teste Rápido, a fls. 3251;
«59) Saco de plástico, a fls. 3252;
«60) Auto de exame e avaliação, a fls. 3253-3254;
«61) Fotografias, a fls. 3255-3259;
«62) Auto de Busca e Apreensão, a fls. 3260-3261;
«63) Inquirição de JS__, a fls. 3262-3263;
«Auto de notícia por detenção, a fls. 3270-3273.
*
(vi) “(…)Na verdade se, não podemos deixar de concordar com a respetiva Defesa, como assim igualmente decidimos em 4-2-2022, quando o arguido foi já detido e interrogado por factos da mesma natureza, que o mesmo detinha quantidades de produtos estupefacientes que não se podem considerar de monta, que destinava aos consumidores que o procuravam no seu estabelecimento e na zona próxima do mesmo, não podemos também, neste momento do iter processual e da continuidade da conduta do arguido, que se mostra indiciado estar interligado aos demais que o abasteciam/abastecem, que a sua conduta não revela agora aquela redução da ilicitude que, inicialmente, consideramos, já que resulta manifesto que o arguido faz desta atividade quiçá a sua principal fonte de rendimento, ainda que o estabelecimento comercial lhe providencie pelo sustento da família, a venda de produtos estupefacientes, que vem mantendo mesmo após ser detido, interrogado e sujeito a interrogatório judicial em 4-2-2022, é de onde o arguido consegue uma elevação do seu nível de vida e também, cremos, um pecúlio que vai guardando.
«Assim, não poderá deixar de se indiciar o arguido pela prática do crime de tráfico de estupefacientes na sua matriz (art.º 21º), inexistindo, apesar da ligação do arguido aos arguidos fornecedores, as agravantes indicadas com referência ao art.º 24º, nem, reiteramos, aquela redução da ilicitude que o indiciava, já não hoje, pela prática do crime de menor gravidade (art.º 25º).
«(…) O arguido foi detido em flagrante delito, como se vem dizendo, havendo que concatenar ainda tal ato/auto com os meios de prova e as condutas do arguido antes e após 4-2-2022.
*
«Importa apurar do concreto estatuto coativo a aplicar ao arguido. O perigo de continuação da atividade criminosa é por demais evidente, já que o arguido é, nestes autos, a sua personificação, se nos é permitida esta expressão, pois, apesar de detido, interrogado e sujeito a medida de coação de apresentações periódicas, manteve a sua conduta criminosa nos seus exatos termos, certamente, logo após se apresentar na esquadra de polícia, seguindo calmamente para o seu estabelecimento comercial prosseguindo a mesma conduta.
«Cremos que o arguido enfrentará pena de prisão efetiva, apesar de não ter ainda sofrido condenação por crime da mesma natureza, mas olhando às condenações que já averba no seu CRC, pelo que o perigo de fuga é de ponderar, embora, concedemos, não seja o mais forte de todos, já que aqui mantém toda a sua família e esteio do sustento da mesma.
«Interessa que o prosseguimento do inquérito tenha lugar sem intervenção do arguido sobre testemunhas ou coarguidos que pretendam vir a prestar esclarecimentos adicionais, bastando a leitura da inquirição da testemunha a fls. 3262-3263, onde é verbalizado o receio do arguido, tido como pessoa violenta, com espelho no seu CRC, para se consubstanciar o perigo para aquisição, conservação e veracidade da prova.
«É evidente o perigo para a ordem e a tranquilidade públicas que dimana da prática deste tipo de crime, do qual se origina outra, grave, criminalidade, como aquela contra o património para que os consumidores que não conseguem suportar o seu vício consigam pagar os seus consumos.
«Concluindo, como promovido, apenas uma medida de coação privativa da liberdade satisfará, em concreto, os aludidos perigos.
«Não concedemos à aplicabilidade da OPHVE onde, como habitualmente, é também praticado este tipo de criminalidade, como nestes autos veio sucedendo com alguns dos arguidos, ainda que não, por ora, exista notícia relativamente a este arguido, pelo que não será a mesma aplicável neste caso.
«Neste momento da decisão importa atentar no disposto no artº 203º, nº 2 do C.P.P.:
«2 - Sem prejuízo do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 193.º, o juiz pode impor a prisão preventiva, desde que ao crime caiba pena de prisão de máximo superior a 3 anos:
«a) Nos casos previstos no número anterior; ou
«b) Quando houver fortes indícios de que, após a aplicação de medida de coação, o arguido cometeu crime doloso da mesma natureza, punível com pena de prisão de máximo superior a 3 anos.
«Este preceito, visto o comportamento do arguido MC__, impõe e permite que ao mesmo seja aplicada a prisão preventiva, já que, mesmo na hipótese, à qual não se concede, de o mesmo, em sede de audiência de discussão e julgamento vir a ser condenado pelo crime de tráfico de menor gravidade, a que não subsumimos neste ato, mas se o tivéssemos decidido, ainda assim, estaria legitimada a aplicação ao arguido da prisão preventiva.
«Nesta conformidade, o arguido aguardará os ulteriores termos processuais na situação de prisão preventiva.
«Tudo nos termos dos artigos 191º a 194, 196º, 202º, nº 1, als. a), b), c) e e), 203º, nº 2, al. b) e 204º, als. a), b) e c), todos do C.P.P.. (…)»
(Cf. certidão de fls. 1 e fls. 23-35 dos presentes autos (vol. 1.º) — Referência Citius: 138394173]
***
2.2. DA QUESTÃO DE DIREITO
2.2.1. Como é consabido é nas conclusões da motivação que se delimita, se fixa o objeto do recurso, o qual pode restringir-se a questões específicas, revestidas de alguma autonomia decisória (cf. arts. 403.º n.ºs 1 e 2, e 412.º, ambos do Código do Processo Penal), sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso.
2.2.2. O objeto do presente recurso delimitados pelas respetivas conclusões acima indicadas prende-se com as seguintes questões:
Estará a busca realizada ao estabelecimento comercial em causa ferida de nulidade?
Estaremos perante uma situação de flagrante delito?
Deve ou não substituir-se a medida de coação de prisão preventiva aplicada ao arguido/recorrente por obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica (OPHVE)?
Ponderar se a medida de coação detentiva mantida ao recorrente foi ou não excessiva, desadequada e desnecessária?
Terão sido violados os princípios da adequação, necessidade, proporcionalidade e subsidiariedade?
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Dos factos fortemente indiciados acima descritos ([7]), cujo teor aqui damos por integralmente reproduzido, no que ora releva, colhe-se com meridiana clareza que a busca realizada no dia 23-jun.-2022, pelo OPC ao estabelecimento comercial aberto ao público denominado “Equador”, sito na Av. G nº …, Amadora, explorado pelo arguido/recorrente MC__, teve lugar em divisão do mesmo que se encontra aberta ao público.
A referida máquina de café (no interior da qual se encontravam os produtos estupefacientes que vieram a ser apreendidos no âmbito dos presentes autos), encontrava-se na mesma divisão do referido estabelecimento comercial aberta ao público e destinava-se a “Tirar Cafés”.
Porque assim é, tal máquina de café e o seu interior não se encontravam em qualquer divisão do referido estabelecimento não afeta à exploração comercial.
Ora, como é sabido, as áreas abertas ao público podem ser objeto de busca e, porventura, de apreensão de algo interessante à investigação.
A busca realizada em estabelecimento comercial aberto ao público ainda que efetivada sem mandado judicial não acarreta a ilicitude da apreensão dos produtos estupefacientes detidos pelo arguido/recorrente, uma vez que a diligência não implicou a lesão à garantia de inviolabilidade domiciliar ou de outro direito fundamental.
Face ao disposto nos n.ºs 1 e 2 e al. c) e do n.º 3 do art.º 177.º do Código de Processo Penal, mesmo que nos encontrássemos na presença de uma residência, o que summo rigore não nos parece ser a situação dos autos, isto é, num espaço cujo critério o legislador foi mais que cauteloso para a realização de busca, a busca realizada teria necessariamente ser considerada legal pela singela — mas decisiva razão — de que no caso em apreço ocorreu uma situação de um flagrante delito na venda de estupefacientes e desse modo legitima-se a ação policial da busca.
In casu a PSP em atos de vigilância visualizou um indivíduo a deslocar-se ao local (estabelecimento comercial aberto ao público denominado “Equador” sito na Av. G n.º …, Amadora, para comprar produto estupefaciente, o que até pelo mesmo se mostra confirmado em sede de inquirição, pelo que desde já se adianta que, se nos afigura justificada, legal e legitimada a ação da PSP no caso em apreço.
Tratando-se de uma situação de flagrante delito e sendo os crimes puníveis com pena de prisão, os agentes da PSP, bem andaram quando procederam à detenção do arguido/recorrente MC__, nos termos aqui em causa, na medida em que a alínea a) do n.º 1 do art.º 255.º do Código de Processo Penal habilita para tanto qualquer entidade policial [cf. alínea c) do art.º 1.º do Código de Processo Penal].
Os crimes em causa são crimes públicos (cf. art.º 48.º do Código de Processo Penal) como tal não dependem de queixa ou acusação particular, o que significa que não se verificam as circunstâncias condicionantes ou impeditivas da detenção em flagrantes delito (cf. n.ºs 3 e 4, respetivamente do art.º 255.º do Código de Processo Penal).
Na verdade, colhe-se fls. 636 e ss. dos presentes autos (vol. 2.º) e fls. 3222 e ss. dos autos principais, que o Órgão de Polícia Criminal (OPC) vem verificando a existência de movimentação de clientela ao estabelecimento comercial do arguido MC__ denominado “Equador” sito na Av. G n.º …, Amadora, não para consumo de restauração de bebidas que ali comercializa, mas para aquisição de produtos estupefacientes, conforme relatos de testemunhas documentados nos presentes autos [cf. fls. 637-638; 639-640 dos presentes autos (vol. 2.º) — (fls. 3224-3225; 3226-3227 dos autos principais); vide ainda com interesse para o caso dos autos, o Relatório de vigilância de fls. 107-112 dos autos (vol. 1.º); auto de audição de interceções telefónicas de fls. 196, 202, 213, 216, 226, 303; 316, 331, 338, 339 e 345, todas dos presentes autos (vol. 1.º)].
No dia 23-jun.-2022, o OPC presenciou a entrada e saída de cidadão consumidor que logo abordou e inquiriu na qualidade de testemunha, constatando que o arguido/recorrente MC__ a este havia acabado de vender produtos estupefacientes, imediatamente avançando com a abordagem deste arguido e do seu estabelecimento comercial e veículo, realizando busca, da qual resultaram as apreensões documentadas e a detenção do referido arguido em flagrante delito [cf. auto de apreensão de fls. 648-649 dos presentes autos (vol. 2.º) — (fls. 3235-3236 dos autos principais].
In casu colhe-se da globalidade dos elementos para estes autos carreados, nomeadamente de fls. 637-638; 639-640 dos presentes autos (vol. 2.º) — (fls. 3224-3225; 3226-3227 dos autos principais); e auto de apreensão de fls. 648-649 dos presentes autos (vol. 2.º) — (fls. 3235-3236 dos autos principais); relatório de visionamento relativo a 23-jun.-2022, de fls. 655-656 e ss., dos presentes autos (vol. 2.º) — (fls. 3242-3243 e ss. dos autos principais), que o OPC presenciou a entrada e a saída de consumidores de produtos estupefacientes do referido estabelecimento comercial do arguido, maxime JS___  em 23-jun.-2022, que logo abordou à saída do aludido estabelecimento, na detenção de produtos estupefacientes (heroína e cocaína) que asseverou que adquiriu ao ora arguido/recorrente MC__, referindo até o local onde o mesmo arrecadava os produtos estupefacientes, debaixo da grade da máquina de café, sítio igualmente referenciado por João da Silva.
Neste seguimento e no imediato, foram acionados os meios policiais para abordagem, busca, apreensão e detenção no estabelecimento comercial em causa e do arguido, com o resultado documentado nos presentes autos (cf. Auto de apreensão relativo a 23-jun.-2022, de fls. 658-659 dos presentes autos (vol. 2.º) — (fls. 3239-3240 dos autos principais). Auto de busca no estabelecimento denominado “Equador” sito na Av. G n.º … , Amadora, e apreensão realizada em 23-jun.-2022 documentada a fls. 660-662 dos presentes autos (vol. 2.º); bem como o evidenciado a fls. 662-663 dos presentes autos (vol. 2.º): produtos estupefacientes e quantia monetária apreendidos; auto de exame e avaliação da arma branca fls. 666-667 dos presentes autos (vol. 2.º); fotogramas da máquina de café de fls. 668-669 e (722) dos presentes autos (vol. 2.º), onde nestes nas imagens 4 e 5 é visível o recipiente ocultado atrás de uma caixa elétrica da referida máquina de café, de forma a dificultar a localização do produto estupefaciente; fls. 671 dos autos: imagem geral do material apreendido; fls. 672 dos presentes autos (vol. 2.º): imagem dos produtos suspeitos de serem estupefacientes (heroína e cocaína) de fls. 673-674 (vol. 2.º) Auto de busca e apreensão realizada no dia 23-jun.-2022 ao veículo automóvel de matrícula 96-EN-20); Auto de inquirição da testemunha João Silva de fls. 675-676 dos presentes autos (vol. 2.º); auto de notícia por detenção do arguido/recorrente MC__ de fls. 683-686 dos presentes autos (vol. 2.º).
Por sua vez, porque tal releva, a fls. 689 dos presentes autos (vol. 2.º) mostra-se incorporado despacho do Senhor procurador da República titular do respetivo inquérito-crime, com a data de 24-jun.-2022, em que valida a detenção e a constituição de arguido do referido MC__, ora recorrente, bem como as apreensões levadas a efeito pelo OPC e documentadas nos presentes autos. 
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Neste particular, cumpre desde já ter presente que, com o devido respeito por opinião em contrário, o intervalo temporal de cerca de uma hora, referido pelo arguido/recorrente MC__ para afastar a existência de flagrante delito não tem esse valor, para tal bastando ter presente o n.º 2 do art.º 256.º do Código de Processo Penal, sendo certo que este Tribunal considera que a materialidade fática fortemente indiciada e acima descrita integra a  existência de flagrante delito nos termos do n.º 1 deste mesmo normativo.
Na realidade, se bem vemos, in casu, mantendo-se o arguido/recorrente MC__ como explorador do referido estabelecimento comercial e sendo a pessoa que naquela data estava no local a atender os clientes do referido estabelecimento, nomeadamente a “tirar cafés”, dúvidas não existem de que o referido arguido/recorrente era a pessoa que no dia 23-jun.-2022, se mantinha no domínio do interior do balcão do seu estabelecimento, já que acabara de vender produto estupefaciente a JS___  e pouco depois logo foi abordado pelo OPC.
Ora, como é certo e sabido, o crime de tráfico de estupefacientes aqui em causa basta-se com a mera detenção pelo arguido/recorrente dos referidos produtos estupefacientes, sendo a sua pessoa que se encontrava no referido estabelecimento a atender os clientes do mesmo, seja a nível da restauração e bebidas, seja a nível de venda de produtos estupefacientes.
 Porque assim é, como bem apontado está na decisão impugnada, no que aqui interessa, no caso em apreço inexiste qualquer nulidade na realização da busca ao estabelecimento comercial em causa em situação de flagrante delito.
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Noutra linha de ideias cumpre aqui ter presente o disposto no n.º 1 do art.º 51.º da Lei n.º 15/93, de 22-jan.:
«Para efeitos do disposto no Código de Processo Penal, e em conformidade com o n.º 2 do artigo 1.º do mesmo Código, consideram-se equiparadas a casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada as condutas que integrem os crimes previstos nos artigos 21.º a 24.º e 28.º deste diploma.»
Constatamos assim que, o referido art.º 51.º do Decreto-Lei n.º 15/93, equipara à criminalidade violenta às condutas que integram os crimes previstos nos arts. 21.º, 24.º e 28.º daquele Diploma legal.
Deste modo, as buscas feitas no domínio dos ilícitos acima referidos, podem ser feitas pelos Órgãos de Polícia Criminal sem precedência de autorização judicial ([8]).
No que a este aspeto concerne face à operacionalidade do referido art.º 51.º do Decreto-Lei n.º 15/93, ocorre, no que aqui interessa, um regime especial de buscas contido na alínea a) do n.º 5 do art.º 174.º e 251.º, ambos do Código de Processo Penal. 
Ora no caso de o arguido ser detido em flagrante por crime de tráfico de estupefacientes, da previsão no n.º 1, do art.º 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, com referência às Tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma legal, como acontece no caso em apreço, não carece de validade judicial a busca levada no ato pelos agentes da PSP que efetuaram a detenção ([9]). Sendo certo que, quanto a este tipo legal de crime de tráfico de estupefacientes da previsão do n.º 1 do referido art.º 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, ex vi do art.º do 51.º do mesmo diploma legal, aplica-se o regime especial de buscas contido no n.º 1 do art.º 251.º do Código de Processo Penal que prescinde da autorização ou ordem prévia para execução da mesma.
Na verdade, o art.º 251.º do Código de Processo Penal admite, como medida cautelar, que, em caso de urgência, os órgãos de polícia criminal procedam à revista de suspeitos e a buscas nos lugares onde eles se encontrem, salvo tratando-se de busca domiciliária, sempre que tiverem fundada razão para crer que neles se ocultam objetos relacionados com o crime, suscetíveis de prova e que, de outra forma, poderiam perder-se.
A urgência da medida e alguma preocupação com a salvaguarda de eficácia da investigação justificam a atribuição de competência ao OPC para a sua prática. Com efeito, o referido art.º 251.º admite como medida cautelar que, em caso de urgência, o OPC proceda à revista de suspeitos e a buscas nos lugares onde eles se encontrem, salvo tratando-se de busca domiciliária, sempre que tiverem fundada razão para crer que neles se ocultam objetos relacionados com o crime, suscetíveis de prova e que, de outra forma, poderiam perder-se. A urgência da medida e a utilidade para o processo justificam a atribuição de competência às polícias para a sua prática.
São medidas urgentes, que importa adotar em face das circunstâncias do caso, com vista a evitar, nomeadamente, a perda das provas presumidamente albergadas pelo objeto da busca. E cuja execução eficaz é incompatível, por isso mesmo, com qualquer dilação, nomeadamente a condição de imposição de prévia autorização judicial.
O aludido art.º 251.º do Código de Processo Penal é uma disposição processual de natureza cautelar e de segurança de natureza policial, voltada para situações de emergência em que a suspeita de existência de prova de um crime não se compadece com demoras sob pena da sua evaporação, a sua aplicação tem de bastar-se com tal suspeita, seja ela anterior ou concomitante à intervenção da autoridade judiciária, desde que suportada em fundamento razoável.
In casu, esse fundamento surgiu face aos meios de obtenção e prova provenientes da audição de interceções telefónicas, vigilâncias, e após a interceção das testemunhas já acima referenciadas e do arguido, ora recorrente.
Por sua vez, como é consabido, um estabelecimento comercial aberto ao público, não goza de proteção constitucional do domicílio, por isso é válida a busca que nele levou a acabo a PSP nas circunstâncias indiciadas nos autos e documentadas a fls. 660-662 dos presentes autos (vol. 2.º), apesar de não ter sido autorizada por um juiz como bem entende o Tribunal Constitucional v. g., no Ac. n.º 7/87, de 09-jan.-1987 (Mário de Brito) ([10]), no art.º 174.º não se abrange a entrada no domicílio dos cidadãos (as buscas domiciliárias são reguladas no art.º 177.º do Código de Processo Penal), daí que não se possa falar de violação do n.º 2 do art.º 34.º da Constituição da República Portuguesa, não se vendo que in casu  estejamos perante uma intromissão abusiva na vida privada ou em que se mostrem minimamente beliscados os chamados  bens de personalidade.
Estes procedimentos cautelares, não podem prescindir do imediatismo da decisão e da ação, sob pena de a investigação criminal ser relegada para o rol das inutilidades.
Com efeito, que resultados seriam de esperar se o arguido/recorrente MC__ tivesse recebido ordem para continuar na exploração do referido estabelecimento para, mais tarde, a diligência ser efetuada com ordem de um juiz? Que os produtos estupefacientes lá ficassem à espera, esquecidos, para ser finalmente encontrados?...
In casu, com o devido respeito por opinião em contrário, a diligência tinha de ser, como foi, efetuada de imediato, o que a lei permite e o bom senso sempre exigiria ([11]).
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É sabido que, o art.º 174.º do Código de Processo Penal regulamenta os pressupostos gerais das buscas, as quais devem ser autorizadas ou ordenadas pela autoridade judiciária competente, ressalvando-se desta exigência os casos:
— De terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, quando haja fundados indícios da prática iminente de crime que ponha em grave risco a vida ou a integridade de qualquer pessoa;
— Em que os visados consintam, desde que o consentimento do visado fique, por qualquer forma, documentado;
— Aquando de detenção em flagrante por crime a que corresponda pena de prisão.
Por seu turno, como vimos, no art.º 51.º do Decreto-Lei n.º. 15/93, de 22-jan., consideram-se equiparados a casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada as condutas que integrem os crimes, entre outros previstos naquele diploma, de tráfico de estupefacientes, designadamente no seu art.º 21.º.
A busca no âmbito geral (não abrangendo v. g., a busca domiciliária ou efetuadas em escritório de advogado ou em consultório médico) tem a ver com os lugares e a existência nesses lugares (reservados e não acessíveis ao público) de objetos respeitantes ao crime ou que o possam comprovar. Aqui a recolha efetua-se em local não acessível.
Ora, por razões que se prendem com relevantes interesses do foro investigatório e de eficácia do processo penal e por solicitações da própria comunidade houve que prevenir situações de exceção fora do sistema geral de autorização ou ordem pela autoridade judiciária previstas no n.º 3 do art.º 174.º do Código de Processo Penal.
Daí que, no que aqui releva se estatua na alínea c) do n.º 5 do referido normativo que tal situação de exceção abrange “Os casos de detenção em flagrante delito por crime a que corresponda pena de prisão”.
No que se refere à busca realizada num estabelecimento comercial a mesma pela sua própria natureza apresenta-se como não domiciliária e em geral [cf. alínea c) do n.º 5 do art.º 174.º do Código de Processo Penal].
No caso em apreço, como flui do que acima dito fica, para além das vendas de produtos estupefacientes ao que tudo indica realizadas pelo arguido/recorrente MC__, confirmadas pelas testemunhas referenciadas nos autos e nessa qualidade ouvidas, foram estas detidas com produtos estupefacientes imediatamente antes adquiridos ao arguido/recorrente — que vão ao pormenor de informar o OPC do local onde o arguido/recorrente retira tais produtos estupefacientes — “do interior da Máquina de Café” — para venda direta aos consumidores no referido estabelecimento “Equador”, sabendo a entidade Policial que ali se passava uma situação de venda e detenção de heroína e cocaína por parte do arguido/recorrente nas circunstâncias indiciadas nos autos.
Face a tais circunstâncias indiciadas não restava aos agentes da PSP outra coisa que não fosse o cumprimento de seu dever imposto pela alínea a) do n.º 1 do art.º 255.º do Código de Processo Penal. O flagrante delito exige que as entidades policiais quando se cure de crime punível com pena de prisão uma reação pronta e faculta, a qualquer órgão de polícia criminal, no que aqui interessa a realização de busca independentemente de despacho de autoridade judiciária competente. Não predominam a propósito as disposições do n.º 3 do art.º 126.º e 177.º do Código de Processo Penal.
 Na verdade, como flui do que já acima deixámos exposto, o interesse público da recolha imediata de prova do crime surpreendido impõe-se ao interesse particular da reserva da intimidade privada ou do domicílio, mesmo quando isso está em causa, situação que não ocorre no caso vertente. Sendo certo que o flagrante delito também se pode verificar no domicílio do agente apesar daquela reserva ([12]).
Perante tudo o que dito fica, sem necessidade de mais considerandos por despiciendos, este Tribunal da Relação de Lisboa declara que inexiste qualquer nulidade na realização da busca ao estabelecimento comercial em causa em situação de flagrante delito, bem como das apreensões em causa nos precisos termos em que o foram, já oportunamente validadas por despacho do Senhor magistrado do Ministério Público (datado de 24-jun.-2022), titular do respetivo Inquérito-Crime, que integra fls. 689 dos presentes autos (vol. 2.º) — fls. 3276 dos autos principais, não se mostrando minimamente beliscados os preceitos constitucionais e legais referidos pelo arguido/recorrente [n.º 2 do art.º 18.º, n.º 1 do art.º 26.º, n.º 8 do art.º 32.º e art.º 34.º da Constituição da República Portuguesa, bem como o n.º 3 do art.º 126.º, e a alínea c) do n.º 5 do, 174.º, n.º 5, estes ambos do Código de Processo Penal].
Porque assim é, naufraga este segmento recursório do arguido/recorrente MC__.
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O arguido/recorrente MC__ igualmente desenvolve esforço argumentativo no sentido de pôr em crise os fundamentos do despacho que impugna datado de 24-jun.-2022, no segmento em que decretou a sua prisão preventiva, em ordem a demonstrar a violação dos preceitos legais que indica nas respetivas conclusões acima transcritas.
Pugna o aludido recorrente no sentido da revogação da decisão impugnada substituindo-se, no limite, a prisão preventiva por medida de coação detentiva de Obrigação de permanência na habitação com recurso a vigilância eletrónica.
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Como emerge das ocorrências processuais relevantes acima fixadas nos pontos (2.1.1. a 2.1.3.), por despacho judicial de 24-jun.-2022, em sede de primeiro interrogatório judicial de arguido detido foi aplicada ao ora arguido/recorrente MC__ a medida de coação de prisão preventiva, por estar fortemente indiciada:
— 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art.º 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-jan., por referência às Tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma legal; e
— 1 (um) crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 2.º, n.º 1, al. ax), 3.º, n.º 1, al. e) e 86º, n.º 1, alínea d), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23-fev..
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Considera o arguido/recorrente, subsidiariamente, na sua motivação recursória e respetivas Conclusões que:
— Lhe deverá ser aplicada a medida de coação de termo de identidade e residência ao arguido MC__, cumulada com proibição de frequentar as imediações do estabelecimento comercial que gere ou, em derradeira hipótese, à proibição de frequentar a cidade da Amadora (Concelho do local que é concretamente indicado como espaço de venda); ou assim se não entendendo.
«Lhe deverá ser aplicada a medida de coação de termo de identidade e residência cumulada com a obrigação de permanência na habitação com recurso a vigilância eletrónica, a qual é a seu ver proporcional e adequada às exigências cautelares que se fazem sentir, obstando à prática de atos da mesma natureza. [cf. fls. 14-14 verso dos presentes autos — alíneas B) e C) (vol. 1.º— (fls. 3492-3492 verso dos autos principais)]
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Indo direito ao assunto, desde já adiantamos que, salvo o devido respeito por opinião em contrário, não tem o arguido/recorrente MC__ razão.
Vejamos sucintamente o porquê desta afirmação.
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Hodiernamente há quem opine que a prisão preventiva não deveria existir, posição que de modo algum podemos qualificar de descabelada.
Com efeito, não parece razoável que um cidadão ou um cidadão protegido pelo princípio constitucional de presunção de inocência entre na prisão, quando ainda não foi destruída tal presunção pelo trânsito em julgado de uma sentença penal condenatória. O que acontece é que a necessidade estatal de adequada perseguição do cometimento de crimes também provém das funções e mandatos constitucionais de proteção da segurança do conjunto dos cidadãos. Surge assim um conflito entre o direito à liberdade e à presunção de inocência do presumível autor de um tipo legal de crime e o direito do conjunto dos cidadãos de se proteger de tal crime e a obter a reparação dos danos causados à coletividade.
O mal necessário que segundo alguns significa a prisão preventiva situa-se no ponto de equilíbrio, entre a tensão entre ambos deveres estatais de, por um lado, garantir o direito à liberdade individual e por outro, proteger o conjunto dos cidadãos contra factos tipificados na lei como crime.
Neste campo o Estado ao que nos parece deveria ser neutral face a este ponto, não privilegiando um dever sobre o outro. Contudo, é usual privilegiar a proteção de si mesmo contra o indivíduo.
Ora, num Estado de direito democrático como é a República Portuguesa (cf. o n.º 1 do art.º 2.º, da Constituição da República Portuguesa) respeitador da dignidade da pessoa humana antagonicamente a qualquer Estado totalitário, summo rigore deveria primar a liberdade individual sobre o resto dos fatores. Assim, facilmente se enxerga que é na prisão preventiva mais do que em nenhuma outra instituição jurídica, em certa medida mais até do que na própria pena, donde se reflete a ideologia política que subjaz a um determinado ordenamento jurídico.
A prisão preventiva supõe uma grave intromissão no âmbito da liberdade dos cidadãos, por isso só poderá decretar-se ou manter-se quando se verifiquem determinados pressupostos previstos na lei.
Tal intromissão produz-se quando ainda não recaiu uma sentença penal condenatória, transitada em julgado, face a um julgamento pelo Tribunal rodeado com todas as garantias de defesa. Por isso podemos falar na existência de uma grave contradição que supõe o facto de que uma pessoa esteja na prisão sem ter sido julgada e condenada por sentença transitada em julgado.
Verificamos assim que o instituto da prisão preventiva está situado entre por uma banda, o dever estatal de perseguir eficazmente o crime e o dever, igualmente estatal, de assegurar o âmbito de liberdade do cidadão por outro.
Tal tensão dialética entre os princípios de liberdade pessoal e de asseguramento do fim útil do processo, o Estado deve lograr uma síntese entre ambos objetivos, isto é, assegurar a ordem ([13]) com a prevenção penal e defender a esfera de liberdade do cidadão.
Trata-se em suma de respeitar o direito à liberdade de cada cidadão não fechando os olhos à realidade da existência de delinquentes que tratam de iludir a ação da justiça.
Se é fundamental o direito à liberdade pessoal, não é menos o direito à segurança, quer se refira esta ao cidadão ou à sociedade. Não é possível fechar os olhos à realidade quotidiana da existência de delinquentes que tratam de iludir a ação da justiça, subtraindo-se à ação procedimental do Estado buscando a impunidade mediante a ocultação e a fuga, onde se impõe a necessidade de um verdadeiro combate ao tráfico de estupefacientes.
À margem de opiniões doutrinárias pontuais, do tipo das que acima se mencionaram e de algumas outras que pedem a abolição da medida, o certo é que enquanto não se imprima uma maior celeridade à instrução ([14]) das causas penais, que permitam um julgamento do arguido num curto espaço de tempo com todas as garantias de defesa, é visível o prejuízo que em certas ocasiões vai sofrer o processo como consequência das condutas que este pode realizar, pelo que acompanhamos o setor maioritário da doutrina que considera neste momento a prisão preventiva  como um mal necessário e insubstituível.
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A presunção de inocência do arguido e a sua incidência no âmbito da aplicação das medidas de coação maxime uma medida cautelar pessoal que envolve um encarceramento, impõe que os perigos que justificam a aplicação destas medidas não possam ser encarados em abstrato e exige indícios concretos recolhidos no processo, na medida em que o arguido deve ser tratado no processo como se fora inocente, daí que as medidas coativas privativas da liberdade assumam caráter excecional.
A aludida presunção de inocência do arguido não é todavia incompatível com a indiciação do arguido/recorrente MC__ pelos crimes de Tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art.º 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-jan., por referência às Tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma legal; e Detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 2.º, n.º 1, al. ax), 3.º, n.º 1, al. e) e 86º, n.º 1, alínea d), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23-fev. acima referidos, nem com a aplicação da medida de coação da prisão preventiva, posto que verificados se mostrem os respetivos pressupostos legais.
A nossa lei adjetiva penal reafirma a natureza excecional e o caráter subsidiário da prisão preventiva (cf. n.º 2 do art.º 193.º, e n.º 1 do art.º 202.º, ambos do Código de Processo Penal), impondo o reexame regular ex officio dos respetivos pressupostos (cf. art.º 213.º do Código de Processo Penal).
Cumpre ainda desde já ter presente que as medidas de coação não são imutáveis, já que pelas contínuas variações do seu condicionalismo estão sujeitas à condição rebus sic stantibus ([15]).
No caso da prisão preventiva é a própria lei que no art.º 213.º do Código de Processo Penal determina que o juiz proceda oficiosamente, pelo menos de três em três meses, ao reexame da subsistência dos seus pressupostos.
O art.º 212.º do referido corpo de leis regula os casos de revogação ou substituição da medida de coação por outra menos gravosa e o art.º 203.º do Código de Processo Penal prevê a imposição da medida mais gravosa que a anterior.
Contudo, em ambos os casos, a lei pressupõe que algo mudou entre a primeira e segunda decisão, ou entre segunda e terceira decisão. Afigura-se-nos que em caso algum pode o juiz, sem alteração dos dados, “repensar” o despacho anterior ou, simplesmente, revogar a anterior decisão. É que também aqui proferido o despacho, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto ao seu objeto (cf. n.ºs 1 e 3 do art.º 613.º, do Código de Processo Civil).
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Impõe-se apreciar nesta sede se a decisão de aplicação da medida de coação de prisão preventiva ao arguido/recorrente MC__ violou ou não as normas que estabelecem os pressupostos de aplicação desta medida.
Na escolha da medida de coação concreta que vai aplicar, o(a) Juiz(a) terá de ter em atenção critérios que decorrem dos princípios da tipicidade (n.º 1 do art.º 191.º do Código de Processo Penal), da necessidade (n.º 1 do art.º 193.º Código de Processo Penal), da adequação (n.º 1 do art.º 193.º do Código de Processo Penal), da proporcionalidade (n.º 1 do art.º 193.º do Código de Processo Penal) e da subsidiariedade da prisão preventiva (n.º 1 do art.º 193.º Código de Processo Penal).
É consabido que as medidas de coação são “meios processuais” que limitam ou restringem a liberdade pessoal do arguido [n.º 1 do art.º 192.º, alínea b) do n.º 1 do art.º 58.º, art.º 60.º e alínea d), do n.º 6 do art.º 61.º, todos do Código de Processo Penal - sempre tendo em atenção o disposto nos n.ºs 2 e 3 do art.º 18.º da Constituição da República] - com o fim de acautelar a eficácia do procedimento penal, tendo em vista a boa administração da justiça, a descoberta da verdade e o próprio restabelecimento da paz jurídica abalada pela prática do crime ([16]).
Logo, como flui do que acima dito ficou, estão em causa, por uma banda, a proteção de direitos fundamentais das pessoas (v. g. o direito à liberdade e à segurança – n.º 1 do art.º 27.º da Constituição da República) e, por outra, a eficácia da investigação criminal, sendo necessário, em cada caso concreto, fazer uma ponderação dos interesses em conflito para determinar a respetiva prevalência e grau ou medida da sua restrição.
Ressalvado o termo de identidade e residência, as demais medidas de coação previstas no Código de Processo Penal só podem ser aplicadas desde que, em concreto, se verifique qualquer dos requisitos indicados no art.º 204.º do mesmo Código.
Nesta área relativa às medidas de coação (arts. 196.º a 202.º todos do Código de Processo Penal) - sempre sujeitas às disposições gerais contidas no Título I do Livro IV do Código de Processo Penal - o princípio da legalidade ou da tipicidade (explicitado no art.º 191.º do Código de Processo Penal) tal como os princípios da necessidade, da adequação, da proporcionalidade, da subsidiariedade e da precariedade, “mais não são do que corolários do princípio da presunção de inocência até ao trânsito da sentença condenatória” ([17]).
Pois, como precisamente divisa Maria João Antunes ([18]) a natureza processual das exigências cautelares  não permite que, à luz da alínea c) do n.º 1 do art.º 204.º do Código Processo Penal, seja afirmada a possibilidade de aplicação de uma qualquer medida de coação sempre que nesse sentido apontar uma ideia de prevenção geral de intimidação ou de prevenção especial, sendo dado a estas expressões o conteúdo que encontramos em matéria de fins das penas.
De acordo com a atual redação do n.º 1 do art.º 193.º do Código de Processo Penal ([19]), «As medidas de coação e de garantia patrimonial a aplicar em concreto devem ser necessárias e adequadas às exigências cautelares que o caso requer e proporcionais à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas”.
O princípio da adequação das medidas de coação exprime a exigência de que exista uma consonância entre os interesses cautelares a tutelar no caso concreto e a medida imposta ou a aplicar nesse caso ([20]).
Exprime, em suma, a relação que deve existir entre o ou os perigos da previsão do art.º 204.º do Código de Processo Penal que no caso se verificarem e a medida que deve ser aplicada ou mantida. A medida de coação deve ser capaz de responder a esse perigo.
O princípio da proporcionalidade, por sua vez, traduz a exigência «intimamente relacionada com a precedente, de que, em cada estado ou grau do procedimento, exista uma relação de proporcionalidade entre a medida aplicada ou a aplicar e a importância do facto imputado e a sanção que se julga que pode vir a ser imposta» ([21]).
Este princípio, com o sentido de proibição de excesso, obsta a desproporcionalidade entre, por um lado, o sacrifício que a medida de coação acarreta e, por outro lado, a gravidade do crime e a natureza e medida da pena que previsivelmente, com base nele, virá a ser aplicada.
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É sabido que ex vi do disposto no n.º 2 do art.º 28.º, da Constituição da República Portuguesa ([22]) a prisão preventiva tem natureza excecional, não sendo de decretar nem de manter sempre que possa ser aplicada caução ou outra medida mais favorável prevista na lei.
Verificamos assim que por imperativo constitucional, a prisão preventiva tem natureza excecional [que já resultava da sua inclusão na alínea b) do n.º 3 do art.º 27.º da nossa Lei Fundamental], e caráter subsidiário.
Trata-se, como refere a doutrina, de um “mal”, embora necessário ([23]). O seu significado aprende-se na medida em que se tenha em mente que com tal excecionalidade se nega o caráter de regra à prisão preventiva, o que tem como consequência impedir a vigência de qualquer presunção de verificação dos respetivos pressupostos, de forma a exigir, em concreto, a comprovação da respetiva verificação ([24]).
Por seu turno, a subsidiariedade da prisão preventiva, nos termos da segunda parte do citado n.º 2 do art.º 28.º, conduz a incluir entre os pressupostos de que depende a aplicação da prisão preventiva, o de se revelarem inadequados ou insuficientes para os fins cautelares tidos em vista, as restantes medidas de coação (cf. n.º 2 do art.º 193.º, e n.º 1 do art.º 202.º, ambos do Código de Processo Penal).
É consabido que o princípio da presunção de inocência foi proclamado em França na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, estando consagrado no art.º 11.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e no art.º 6.º da Convenção Europeia.
O n.º 2 do art.º 32.º da nossa Constituição da República dispõe:
“Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa”.
A sua incidência no âmbito da aplicação das medidas de coação impõe que os perigos que justificam a aplicação destas medidas não possam ser encarados em abstrato e exige indícios concretos recolhidos no processo, na medida em que o arguido deve ser tratado no processo como se fosse inocente, daí que as medidas privativas da liberdade assumam caráter excecional.
A aludida presunção de inocência do arguido, como flui do que acima dito fica, não é todavia incompatível com a indiciação do arguido/recorrente pelos tipos legais de crime acima referidos, nem com a aplicação e manutenção da medida de coação da prisão preventiva, posto que verificados se mostrem os respetivos pressupostos legais.
A nossa lei adjetiva penal reafirma a natureza excecional e o caráter subsidiário da prisão preventiva (cf. n.º 2 do art.º 193.º, e n.º 1 do 202.º, ambos do Código de Processo Penal), impondo o reexame regular ex officio dos respetivos pressupostos (cf. art.º 213.º do Código de Processo Penal).
Cumpre ainda reafirmar nesta sede que as medidas de coação não são imutáveis, já que pelas contínuas variações do seu condicionalismo estão sujeitas à condição rebus sic stantibus.
No caso da prisão preventiva é a própria lei que no art.º 213.º do Código de Processo Penal determina que o juiz proceda oficiosamente, pelo menos de três em três meses, ao reexame da subsistência dos seus pressupostos.
O art.º 212.º do referido corpo de leis regula os casos de revogação ou substituição da medida de coação por outra menos gravosa e o art.º 203.º do Código de Processo Penal prevê a imposição da medida mais gravosa que a anterior.
Contudo, em ambos os casos, a lei pressupõe que algo mudou entre a primeira e segunda decisão.
Na verdade, tal como já acima deixámos dito, afigura-se-nos que em caso algum pode o juiz, sem alteração dos dados, “repensar” o despacho anterior ou, simplesmente, revogar a anterior decisão. É que também aqui proferido o despacho, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto ao seu objeto.
Na realidade, para que uma medida de coação possa ser substituída por outra têm de ocorrer factos posteriores que assim o justifiquem, o que equivale a dizer que as medidas de coação se acham subordinadas à acima referida condição rebus sic standibus.
In casu, a nosso ver, o despacho em crise satisfaz a exigência de fundamentação, contida no n.º 1 do art.º 205.º, da Constituição da República Portuguesa, e no n.º 4 do art.º 97.º, do Código de Processo Penal.
Ora, como flui do que acima dito fica, o despacho judicial que aplica a medida de coação detentiva de prisão preventiva não é definitivo, mas a decisão deve permanecer imutável enquanto tudo se mantenha igual, isto é, sempre que posteriormente não se verifiquem circunstâncias, quer de facto quer de direito, que justifiquem a revogação ou a alteração da medida de coação.
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Feito este breve bosquejo e a esta luz vejamos o caso dos autos.
Existirão fortes indícios de que o arguido/recorrente MC__ terá perpetrado os crimes de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art.º 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-jan., por referência às Tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma legal; e de detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 2.º, n.º 1, al. ax), 3.º, n.º 1, al. e) e 86º, n.º 1, alínea d), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23-fev.?
De todos os elementos para estes autos carreados ([25]) consideramos fortemente indiciados os seguintes factos:
1. «Desde data não concretamente apurada, mas pelo menos desde abril de 2021, que os arguidos JV, FS e o seu filho MS se dedicam à compra no estrangeiro de produto estupefaciente a terceiros, deslocando-se para o efeito ao estrangeiro, nomeadamente Holanda, onde adquirirem produto estupefaciente, o qual transportam para Portugal, para posteriormente venderem na zona de Lisboa e Amadora.
2. «Nomeadamente entregam algumas quantidades de heroína e cocaína ao arguido MC__, o qual, servindo-se do estabelecimento que explora (denominado “Equador”), vende produto estupefaciente a consumidores.
3. «No dia 10 de setembro de 2021 (fls. 321 a fls. 322, Vol. II), o arguido MC__ saiu do interior do seu estabelecimento de restauração denominado “Equador” sito nº da Av. G, Amadora, e deslocou-se para junto de uns Ecopontos onde contacta com um cidadão toxicodependente a fim de lhe fornecer produto estupefaciente.
4. «No dia 06 de outubro de 2021 (fls. 481 a fls. 486, Vol. II), o arguido MC__, no interior do estabelecimento Comercial denominado “Equador” sito no n.º da Av. G, Amadora, e deslocou-se para junto de uns Ecopontos onde contacta com um cidadão toxicodependente a fim de lhe fornecer produto estupefaciente.
5. «No dia 06 de outubro de 2021 (fls. 481 a fls. 486, Vol. II), o arguido MC__, no interior do seu estabelecimento comercial denominado “Equador” sito no n.º da Av. G n.º …, Amadora, sendo que ao seu interior desloca-se um cidadão toxicodependente a fim de adquirir produto estupefaciente, tendo sido intercetado após sair do estabelecimento na posse de 02 (duas) embalagens de Heroína com peso de 0.62 gramas.
6. «Nesse mesmo dia o arguido MC__, junto do seu estabelecimento denominado “Equador”, foi contactado por um toxicodependente e logo de seguida entram ambos para o estabelecimento, pelo que volvidos 2 (dois) minutos o toxicodependente abandona o local, com estupefaciente que o arguido MC__ lhe havia vendido.
7. «No dia 02-01-2022 sito na Av. G n.º …, Amadora, explorado pelo arguido MC__. (auto de busca e apreensão a fls. 1664 e ss):
«- 01 (uma) balança de precisão localizada na parte superior de uma vitrina frigorífica vertical.
«- Uma bolsa de cor preta da marca THE WITE COMPANY, contendo no seu interior 2.800,00 Euros em numerário localizado por baixo da máquina de cerveja a pressão.
«- Uma bolsa de cor preta da marca Comfort Itens contendo no seu interior 215 Euros em numerário, localizada em cima do barril de cerveja.
«- Um copo plástico com 19 euros em numerário, localizado ao lado da caixa registadora.
«- 20 (vinte) embalagens de Cocaína, em doses individuais.
«- 31 (trinta e uma) embalagens de Heroína, em doses individuais.
8. «No dia 06-10-2021 PF_ deslocou-se ao estabelecimento comercial, denominado “Equador” sito na Av. G n.º … – Amadora e entrou em contacto com o arguido MC__.
9. «PF_ solicitou ao arguido duas doses de heroína, ao que o arguido entregou as duas doses de heroína a PF_, após este ter [entregado] a quantia de €10,00.
10. «No dia 23-06-2022 JS___ deslocou-se ao estabelecimento comercial, denominado “Equador” sito na Av. G n.º … – Amadora e entrou em contacto com o arguido MC__.
11. «JS___ solicitou ao arguido €20 de heroína e cocaína, ao que o arguido entregou a JS___ duas doses de heroína, com o peso total de 0,83 gramas e um dose de cocaína, com o peso total de 0,11 gramas.
12. «No dia 23-06-2022, cerca das 10:20, no interior do Estabelecimento comercial, denominado “Equador” sito na Av. G n.º … – Amadora, e entrou em contacto com o arguido MC__:
«- Duas embalagens [multivitamínicas], acondicionadas no interior da máquina de café, no interior das quais o arguido detinha:
«a) 23 embalagens individualizadas de cocaína, com o peso total de 6,45 gramas;
«b) 77 embalagens individualizadas de heroína, com o peso total de 28,94 gramas.
«- A quantia de €1161,70, fracionados em 21 notas de €20,00, 57 notas de €10,00, 19 de €5,00, 10 moedas de €2,00, 23 moedas de €1,00, 5 moedas de €0,50, 82 moedas de €0,10 e 15 moedas de €0,05.
«Mais detinha o arguido MC__ uma faca, com lâmina de 6,5 cm, a qual, quando retraída, fica oculta dentro do cabo, sendo que a mesma lâmina se estende e retrai a partir de uma abertura lateral do cabo, vulgarmente designada como faca de ponta e mola.
«Na sua posse o arguido MC__ detinha a quantia de €15,00
13. «No dia 23-06-2022, cerca das 11:30, no interior do veículo de matrícula 96-EN-20, utilizado pelo arguido, este detinha a quantia de €1650,00 fracionados em 31 notas de €5,00, 1 nota de €100,00 e duas notas de 100 Francos.
14. «O arguido obteve tais produtos diretamente junto de produtores, e destinava tais produtos à venda a intermediários, que posteriormente os venderiam a consumidores, logrando desse modo adquirir avultadas quantias monetárias.
15. «O arguido conhecia as características estupefacientes dos produtos que transacionava, guardava e que detinha, nas circunstâncias supra descritas, tendo-o feito de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que a respetiva detenção, cedência e venda a terceiros os fazia incorrer em crime.
16. «Com a conduta descrita, atuaram os arguidos de forma livre, voluntária e consciente, previamente concertados e atuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas, conhecedores das características e natureza dos produtos, visando obter com a venda dos mesmos avultadas quantias monetárias, bem sabendo que a detenção ou a venda de tais produtos nas circunstâncias relatadas é proibida por lei e criminalmente punida.
17. «Não obstante, detinham aquelas substâncias estupefacientes, destinando-as à venda a indivíduos consumidores daqueles tipos de produtos.
18. «O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que não poderia deter ou transportar a faca, com tais características, e que não tinham licença para o seu uso e porte.
19. «Agiram de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
20. «O arguido MC__ foi já condenado pela prática em 2006 de um crime de roubo, por acórdão de 19-10-2007, transitado em julgado em 19-11-2007, na pena de 6 anos de prisão, a qual se mostra extinta; pela prática em 14-10-2006 de um crime de roubo, por acórdão de 7-7-2008, transitado em julgado em 12-11-2009, na pena de 4 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 4 anos, mediante regime de prova, a qual se mostra extinta; pela prática em 24-8-2013 de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, por sentença de 4-9-2013, transitada em julgado em 9-10-2013, nas penas de 60 dias de multa e de 3 meses de proibição de conduzir veículos motorizados, as quais se mostram extintas e pela prática em 1-8-2016 de um crime de ofensa à integridade física qualificada e de dois crimes de detenção de arma proibida, por acórdão de 13-3-2018, transitado em julgado em 24-4-2018, na pena única de 2 anos e 9 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, mediante sujeição a deveres, a qual se mostra extinta.
21. «O arguido vive com uma companheira e a filha menor desta, de 12 anos.
22. «O arguido tem 4 filhos, com 24, 17, 14 e 7 anos de idade, para os menores contribui com €70,00 por mês para cada um, suportando o mais necessário para a sua saúde e educação.
23. «O arguido explora o estabelecimento de café pelo qual obtém entre €2000,00 a €3000,00 brutos, suportando cerca de €400,00 de despesas de funcionamento do mesmo, sendo €250,00 de renda.
24. «O arguido efetua também alguns biscates em mudanças.
25. «Obtém em termos líquidos, entre €700,00 e €1000,00 mensais.»
***
ELEMENTOS PROBATÓRIOS:
«1) Auto de notícia, a fls. 4-6;
«2) Relatório de diligências externas, a fls. 17-21, 66-84, 169-176, 187-192, 318-322, 399-402, 405-408, 464-486, 498-502, 553-561, 621-623, 627-628, 632-633, 718-732, 735-736, 891-902, 1036-1042, 1051-1067;
«3) Audição de interceções telefónicas, a fls. 140-143, 196, 266-267, 273-274, 278, 331-335, 343, 409, 413, 416, 421, 503, 509, 513, 565-566, 573, 583, 635, 642, 645, 647, 649, 651-652, 737, 741, 748, 750, 752, 754, 793-817, 831, 836, 847, 850, 910-911, 915, 929-930, 977, 986, 1120, 1122, 1126, 1129-1130, 1133, 1140;
«4) Auto de Apreensão, a fls. 458;
«5) Teste rápido, a fls. 490;
«6) Auto de notícia, a fls. 1043-1045;
«7) Relatório de Vigilância, a fls. 1287-1293;
«8) Relatório de Vigilância, a fls. 1294-1323;
«9) Relatório de Vigilância, a fls. 1324-1330;
«10) Relatório de Vigilância, a fls. 1345-1357;
«11) Relatório de Vigilância, a fls. 1358-1363;
«12) Relatório de Vigilância, a fls. 1364-1369;
«13) Auto de notícia por detenção, a fls. 1424-1427;
«14) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1433-1436;
«15) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1437-1438;
«16) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1439-1440;
«17) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1451-1453;
«18) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1454-1455;
«19) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1456-1457;
«20) Teste Rápido, a fls. 1460;
«21) Reportagem Fotográfica, a fls. 1465-1473;
«22) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1474;
«23) Relatório de Vigilância, a fls. 1528-1530;
«24) Auto de Apreensão, a fls. 1531-1534;
«25) Bilhetes, a fls. 1535-1538;
«26) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1541-1557;
«27) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1558-1559;
«28) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1564-1565;
«29) Auto de Exame e Avaliação, a fls. 1566-1567;
«30) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1568-1570;
«31) Auto de notícia por detenção, constante de fls. 1586-1590;
«32) Auto de Busca e Apreensão, constante de fls. 1593-1598;
«33) Teste Rápido, a fls. 1601;
«34) Auto e Exame e Avaliação, a fls. 1605-1606;
«35) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1607-1608;
«36) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1609-1610;
«37) Fotografias, a fls. 1612-1614;
«38) Auto de notícia por detenção, a fls. 1615-1617;
«39) Auto de busca e apreensão, a fls. 1620-1626;
«40) Inquirição de Tatiana Lucy Lopes, a fls. 1629-1630;
«41) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1631-1632;
«42) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1633-1634;
«43) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1635-1636;
«44) Auto de Exame e avaliação, a fls. 1637-1638;
«45) Auto de busca e apreensão, a fls. 1643-1645;
«46) Auto de busca e apreensão, a fls. 1664-1671;
«47) Teste Rápido, a fls. 1673;
«48) Auto de notícia por detenção, a fls. 1680-1682;
«49) Inquirição de PF_, a fls. 3222-3223;
«50) Inquirição de JC___, a fls. 3224;
«51) Inquirição de R___, a fls. 3226;
«52) Auto de Apreensão, a fls. 3235-3236;
«53) Teste Rápido, a fls. 3238;
«54) Inquirição de JS___ , a fls. 3239-3240;
«55) Relatório de visionamento, a fls. 3242-3244;
«56) Auto de Apreensão, a fls. 3245-3246;
«57) Auto de Busca e Apreensão, a fls. 3247-3249;
«58) Teste Rápido, a fls. 3251;
«59) Saco de plástico, a fls. 3252;
«60) Auto de exame e avaliação, a fls. 3253-3254;
«61) Fotografias, a fls. 3255-3259;
«62) Auto de Busca e Apreensão, a fls. 3260-3261;
«63) Inquirição de JS__ , a fls. 3262-3263;
«64) Auto de notícia por detenção, a fls. 3270-3273.»
***
Tal materialidade fática fortemente indiciada — verificados em concreto os elementos constitutivos do “tipo” — integra, no que aqui releva, a prática pelo arguido/recorrente MC__:
— 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art.º 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-jan., por referência às Tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma legal; e
— 1 (um) crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 2.º, n.º 1, al. ax), 3.º, n.º 1, al. e) e 86º, n.º 1, alínea d), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23-fev..
Tal tipo legal de crime de tráfico de estupefacientes, da previsão do referido n.º 1 do art.º 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, é punível com uma pena de prisão de 4 a 12 anos, e integra a definição legal de “criminalidade altamente organizada” [cf. art.º 1.º, alínea m): “(…)tráfico de estupefacientes” do Código de Processo Penal], logo, cai na previsão  da alínea c) do n.º 1 do art 202.º do Código de Processo Penal: «(…) corresponda a criminalidade altamente organizada”.
Por sua vez o tipo legal de crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 2.º, n.º 1, al. ax), 3.º, n.º 1, al. e) e 86º, n.º 1, alínea d), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23-fev., é punido com pena de prisão até 4 anos ou com pena de multa até 480 dias.
*
Desde já se adianta que a decisão impugnada justifica e explana de forma adequada e suficiente, os fundamentos de facto e de Direito que determinaram a aplicação ao arguido/recorrente MC__ a medida de coação de prisão preventiva.
*
Considerou o Tribunal a quo, na decisão impugnada verificados os perigos de continuação de atividade criminosa; de fuga, para aquisição, conservação e veracidade da prova e de perturbação da ordem e tranquilidade públicas.
Na verdade, de toda a prova indiciária para estes autos carreada e acima apontada, inteiramente aponta de forma clara no sentido de que o ora arguido/recorrente MC__ terá perpetrado:
— 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes Tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art.º 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-jan., por referência às Tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma legal; e
— 1 (um) crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 2.º, n.º 1, alínea ax), 3.º, n.º 1, alínea e) e 86º, n.º 1, alínea d), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23-fev..
*
Existirá concreto perigo de fuga?
Como é consabido, o perigo de fuga decorre de uma prognose baseada em indícios, que possibilitem supor que o arguido poderá facilmente pôr-se em fuga.
Tais indícios, na sua verdadeira essência ancoram-se na capacidade de mobilidade do arguido.
Na verdade, o circunstancialismo de vida do arguido, o tipo de vida que leva, o desenraizamento, a inexistência de laços efetivos duradouros, quer a nível familiar, quer laboral, os contactos ou habitações de que dispõe, maxime no estrangeiro, tudo aliado ao peso das penas, que sobre ele pode recair, podem permitir antever o perigo de fuga aos contactos com a justiça.
Contudo, desde já adiantamos que, com o devido respeito por opinião em contrário, perante o nosso direito adjetivo penal positivado, como regra geral se nos afigura errado deduzir o perigo de fuga da gravidade do crime e da capacidade financeira do arguido.
Ora, como também é consabido a lei não presume o perigo de fuga, exige que esse perigo seja concreto, o que significa que não basta a mera probabilidade de fuga deduzida de abstratas e genéricas presunções, v.g. da gravidade do crime, mas que se deve fundamentar sobre elementos de facto que indiciem concretamente o perigo ([26]).
Por sua vez, cumpre aqui ter presente que, summo rigore, não foge quem quer, mas sim quem quer e pode.
In casu, pesando a globalidade de toda a prova indiciária para estes autos carreada, maxime tendo presente os factos concretamente apontados nos pontos 21 a 25 dos factos indiciados acima descritos nas ocorrências processuais relevantes, que aqui se recordam:
“21. «O arguido vive com uma companheira e a filha menor desta, de 12 anos.
“22. «O arguido tem 4 filhos, com 24, 17, 14 e 7 anos de idade, contribui para os menores com €70,00 por mês para cada um, suportando o mais necessário para a sua saúde e educação.
“23. «O arguido explora o estabelecimento de café pelo qual obtém entre €2000,00 a €3000,00 brutos, suportando cerca de €400,00 de despesas de funcionamento do mesmo, sendo €250,00 de renda.
“24. «O arguido efetua também alguns biscates em mudanças.
“25. «Obtém em termos líquidos, entre €700,00 e €1000,00 mensais.
Podemos concluir com a necessária segurança o seguinte:
(i) Não ocorre qualquer incerteza no que respeita ao modo de vida e paradeiro do arguido/recorrente;
(ii) Não foi encontrado na posse do arguido/recorrente no momento da detenção qualquer bilhete de viagem para um país estrangeiro marcado para dias depois;
(iii) O arguido/recorrente vive com uma companheira e a filha menor desta, de 12 anos.
(iv) O arguido/recorrente tem ligações familiares no nosso país, 4 filhos de de 24, 17, 14 e 7 anos de idade, contribui para os menores com €70,00 por mês para cada um e vive com uma companheira.
 (v) O arguido explora o estabelecimento de café pelo qual obtém entre €2000,00 a €3000,00 brutos, suportando cerca de €400,00 de despesas de funcionamento do mesmo, sendo €250,00 de renda.
Ora, face aos factos concretos evidenciados nos presentes autos, com o devido respeito por opinião em contrário, para afirmar o perigo de fuga não basta ser o arguido/recorrente cidadão estrangeiro (cidadão natural de São Tomé e Príncipe). Tal consubstancia uma afirmação abstrata que não tem agasalho na previsão da alínea a) do n.º 1 do art.º 204.º do Código de Processo Penal.
Na verdade, se bem vemos, com tal critério, na sua verdadeira essência, que aqui não aceitamos por não ter gasalho na Constituição e na lei, a nacionalidade opera como agravação da situação processual do arguido/recorrente o que fere de morte o art.º 15.º da Constituição da República Portuguesa e o art.º 14.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos. Por isso mesmo, a todas as luzes não pode ser aceite — e efetivamente aqui não é — como critério válido.
Na realidade, com o devido respeito por opinião diversa, afigura-se-nos não basta ser estrangeiro e ter ligação a outros países, bem como enfrentar a forte possibilidade de vir a ser condenado em prisão efetiva de prisão para ter como demonstrada a existência de concreto perigo de fuga.
Com efeito, cumpre aqui ter presente que, não é qualquer país estrangeiro que releva, face aos mecanismos como MDE e extradição. Por isso mesmo, como é de todos sabido, tornam menos eficaz ou tentadora a fuga.
Ora, como flui do que acima dito fica, para podermos afirmar o perigo de fuga, necessário se tornava que na decisão em crise se concretizasse essa intencionalidade por parte do arguido/recorrente, alicerçada em indícios objetivos para poderem suportar essa afirmação. Situação que diga-se em abono da verdade histórica não ocorre no caso em apreço.
Na verdade, de todos os elementos de prova indiciária para estes autos carreada, podemos afirmar com a necessária segurança que:
(i) Relativamente à pessoa do arguido/recorrente, ancorando-nos nos dados concretos dos presentes autos, maxime os relativos à sua personalidade refletida nos factos indiciados, as circunstâncias conhecidas da sua vida, cotejando essa imagem com as regras de experiência comum, afigura-se-nos que no caso em apreço, não se extrai dos factos concretos evidenciados nos presentes autos concreto perigo de fuga.
(ii) Assim, sem prejuízo da consideração conjugada com a gravidade dos factos e correspondente moldura penal abstrata e com a real situação pessoal, familiar, social e económica do arguido/recorrente, tudo isto não indicia uma preparação para concretização de intento de fuga.
(iii) Não é suficiente para este aspeto que ora nos ocupa de operacionalidade ou não do perigo de fuga, ter o arguido/recorrente antecedentes criminais ([27]), o juízo concreto sobre a existência de fuga pode e deve ancora-se em factos ou afirmações que permitam, a um observador objetivo, concluir que há sério risco ou mesmo o propósito do arguido/recorrente se ausentar, situação que por tudo que acima dito fica, temos por não verificada no caso em apreço.
Face ao exposto, com o devido respeito por opinião em contrário, consideramos que no caso em apreço não se mostra verificada a existência de concreto perigo de e fuga
***
A materialidade fáctica indiciada reveste gravidade, quer pelo meio como o arguido/recorrente atuou (venda de porta aberta em estabelecimento comercial de produtos estupefacientes) quer pelo tipo de produtos estupefacientes em causa: heroína e cocaína.
Neste particular, cumpre aqui ter presente que nem a anterior audição em 1.º Interrogatório Judicial de arguido detido, por factos de igual natureza em 04-fev.-2022 por crime de tráfico de estupefacientes e lhe aplicou medidas de coação não detentivas, o desaconselharam da prática de novos factos da mesma natureza (agora tráfico da previsão do art.º21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-jan.).
Assim sendo, como na realidade é, não enxergamos como a situação de colocar o arguido/recorrente em casa de habitação sujeita à medida de coação de OPHVE mudaria a pessoa do arguido/recorrente para pessoa fiel ao Direito, e maxime afastaria o concreto perigo de continuação criminosa. E muito menos cabe aplicar à situação dos autos a por si almejada cumulação de termo de identidade e residência com proibição de frequentar as imediações do estabelecimento comercial que gere ou de frequentar a cidade de Amadora, pois tal se mostra inadequado a debelar os perigos tidos por verificados na decisão em crise, maxime o concreto perigo de continuação de atividade criminosa
Na verdade, o arguido/recorrente apresenta-se in casu, movido pelo dinheiro fácil, e ao que tudo aponta, sem qualquer impermeabilidade aos comandos legais e com total indiferença à vida humana e aos efeitos nefastos que o consumo de produtos estupefacientes tem nas comunidades.
Com o devido respeito por opinião em contrário, antagonicamente ao aduzido pelo arguido/recorrente na sua motivação recursória, afigura-se-nos que face a toda a prova indiciária para estes autos carreada, maxime a que acima apontada ficou, a medida de coação detentiva de OPHVE, no caso em apreço não acautela nem obsta, categoricamente, os perigos de fuga de continuação de atividade criminosa, nem de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo (em razão da natureza e circunstâncias dos crimes objeto destes autos e da personalidade do arguido este pode efetivamente perturbar o inquérito ([28]), a instrução ou o julgamento do processo prejudicando a aquisição, conservação ou veracidade da prova) por isso mostra-se inadequada.
Na verdade, não lobrigamos como seria adequada e suficiente a medida de coação de OPHVE pois o arguido/recorrente com os meios de que dispõe (atenta a quantidade de produtos estupefacientes movimentados pelo recorrente e elevados proveitos a eles associados), poderia na tranquilidade do seu lar prosseguir a sua lucrativa atividade, bastando para tal v.g., mudar a “sede”do “estabelecimento comercial”.
Constatamos assim desde já que a única medida de coação suficiente e adequada para acautelar os concretos perigos de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo, e de continuação da atividade criminosa é a prisão preventiva, (cf. art.º28.º da Constituição da República Portuguesa e n.º 2 do art.º 193.º do Código de Processo Penal), a qual in casu cumpre manter porquanto a mesma se revela necessária, adequada e proporcional.
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Como vimos, considera o arguido/recorrente MC__ que a medida de coação de prisão preventiva que lhe foi aplicada é excessiva, desnecessária e desproporcional, devendo ser substituída por termo de identidade e residência cumulado com proibição de frequentar as imediações do estabelecimento comercial que gere ou pela proibição de frequentar a cidade da Amadora; ou no limite por OPHVE com recurso a vigilância eletrónica.
Com o devido respeito por opinião em contrário, reafirmamos aqui que não tem razão o arguido/recorrente.
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No que concerne aos concretos perigos tidos por verificados pelo Tribunal a quo, a saber:
(i) Perigo de fuga;
(ii) De perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo (na modalidade de perigo para a aquisição, conservação e veracidade da prova)
(iii) Perigo de Continuação de atividade criminosa;
(iv) Perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade pública.
A Senhora juíza de instrução criminal deixou expresso na decisão impugnada o que acima se mostra transcrito e que por maçador e nos alcandorar ao reino do sofrível não vamos aqui repetir.
No caso em apreço, a materialidade fática fortemente indiciada acima transcrita assenta, essencialmente, nos elementos probatórios acima indicados.
Na verdade, face aos elementos de prova indiciária para estes autos carreados, que já apontámos supra, e ao que já acima deixámos expresso, consideramos no caso em apreço unicamente verificados os concretos perigos de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e de continuação de atividade criminosa.
Face à verificação, dos concretos perigos mencionados e previstos nas alíneas a) b) e c) do n.º 1, do art.º 204.º do Código de Processo Penal ([29]), desde já adiantamos que se nos afigura que os mesmos só serão afastados de forma aceitável para a ordem jurídica e para a comunidade com a aplicação ao arguido / recorrente MC__ da medida de coação de prisão preventiva, a única que consideramos necessária, adequada e proporcional, para afastar os referidos perigos realmente existentes.
Na verdade, in casu emergem dos elementos de prova indiciária para estes autos carreados já supra discriminados, a existência dos factos fortemente indiciados acima descritos e que integram a prática, em autoria material, pelo arguido/recorrente dos referidos crimes de tráfico de estupefacientes e de detenção de arma proibida.
*
A factualidade indiciada é grave face a enorme danosidade que provoca, tanto para os consumidores de heroína e cocaína, bem como para a sociedade em geral tendo em conta a criminalidade geralmente contra o património, que com a mesma está conexa.
Tendo presente o supra referido bem como as circunstâncias em que se indicia que terão ocorrido os factos, a personalidade do arguido/recorrente manifestada nesses mesmos factos fortemente indiciados e o que flui da globalidade das suas declarações em 1.º interrogatório judicial de arguido detido realizado em 24-jun.-2022 [o arguido não prestou declarações relativamente aos factos indiciados, apenas relatando a sua condição socioeconómica ([30])]. O seu modo de vida (ao que tudo indica o arguido/recorrente faz do tráfico de estupefacientes uma forma de vida), bem como, a sua situação socioprofissional, consideramos que, no caso em apreço existe um concreto perigo de continuação da atividade criminosa.
Na verdade, se bem vemos a indiciada atuação do arguido/recorrente MC__ demonstra que in casu não está em causa um momento impensado da sua vida antes representa uma energia criminosa persistente e uma total insensibilidade a quaisquer contra motivações éticas ou sociais, sendo de concluir que a personalidade revelada pelo referido arguido/recorrente nos factos fortemente indiciados é propensa à prática de crimes desta natureza e parece não denotar a alegada inserção social que o mesmo alega.
A personalidade revelada pelo arguido/recorrente nos factos fortemente indiciados não se reconduz a um ato isolado, tudo apontando para que a atividade de tráfico de estupefacientes decorrerá já durante um período de tempo considerável para a prática do crime (desde pelo menos, 10-set.-2021), o que sustenta a verificação em concreto do intenso perigo de continuação da atividade criminosa.
Como emerge dos factos fortemente indiciados acima descritos, o tráfico objeto dos autos principais assume já algum relevo e, como é consabido, este potencia elevados lucros, dispondo o arguido/recorrente de uma capacidade logística adequada [atente-se na quantidade de produtos estupefacientes apreendidos (heroína e cocaína) e a quantia monetária apreendida (€1161,70), bem como a arma branca em causa que lhe foram aprendidos em flagrante delito].
Na verdade, se bem vemos, ao que tudo indica, é o lucro fácil que motiva o arguido/recorrente e o aguilhoa, não conhecendo limites no ordenamento penal, ou na vida alheia.
In casu, com o devido respeito por opinião em contrário, esses lucros e a relevância desta atividade parecem-nos claros, não só nos produtos estupefacientes que lhe foram apreendidos (23 embalagens individualizadas de cocaína com o peso de 6,45 gramas e 77 embalagens individualizadas de heroína, com o peso total de 28,94 gramas), como ainda nos objetos e quantia monetária que o arguido/recorrente tinha consigo.
Nesta linha de pensamento, facilmente se vislumbra dos factos fortemente indiciados nestes autos e acima descritos, sem necessidade de qualquer elucubração metafísica que, a permanência do arguido/recorrente MC__ sujeito à medida de coação de OPHVE, não é solução adequada a afastar o perigo de continuação da atividade criminosa.
*
No que tange a esta temática cumpre ter presente o disposto no citado n.º 1, do art.º 202.º, do Código de Processo Penal, o qual, no que ao caso concerne, dispõe:
«1. Se considerar inadequadas ou insuficientes, no caso, as medidas referidas nos artigos anteriores, o juiz pode impor ao arguido a prisão preventiva quando:
«a) Houver fortes indícios da prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo de superior a cinco anos; (…)
«c) Houver fortes indícios de prática de crime doloso que corresponda a criminalidade (…) altamente organizada».

Por outro lado, estabelece o art.º 204.º do mesmo corpo de leis as condições gerais para aplicação de qualquer medida de coação, no que aqui releva:
«(…)
«a) Fuga ou perigo de fuga;
 b) Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo;
«c) Perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a atividade criminosa (…)».
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Será inadequada a medida coativa de prisão preventiva?
Aduz o arguido/recorrente na sua verdadeira essência que a medida de coação que lhe foi aplicada é desajustada, face a sua concreta situação social, pessoal e familiar, a qual, a seu ver, não foi devidamente apreciada pelo Tribunal a quo.
É certo que na sequência do disposto no nº 2 do art.º 18.º, e n.ºs 2 e 3 do art.º 27.º, ambos da Constituição da República Portuguesa, a liberdade surge como princípio basilar do Estado de Direito Democrático, apresentando-se a prisão preventiva como a medida mais gravosa para o arguido/recorrente. Neste sentido, o regime jurídico de tal medida encontra-se desenhado sobre os princípios da legalidade, da adequação e da proporcionalidade, e como tal, a sua aplicação só poderá ter lugar quando se encontrarem preenchidos determinados parâmetros, como sejam, algum ou todos os pressupostos específicos do n.º 1, do art.º 202.º, acrescido de qualquer uma das circunstâncias gerais indicadas no art.º 204.º do Código de Processo Penal e ainda, a insuficiência e inadequação ao caso das outras medidas de coação menos gravosas previstas na lei, bem como, a proporcionalidade da medida a aplicar.
Ora, in casu os elementos de prova constantes dos autos permitem verificar a existência de fortes indícios da prática, pelo arguido/recorrente MC__ de:
— 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art.º 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-jan., por referência às Tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma legal; e
— 1 (um) crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 2.º, n.º 1, al. ax), 3.º, n.º 1, al. e) e 86º, n.º 1, alínea d), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23-fev..
Na verdade, se bem vemos, de toda a prova indiciária para estes autos carreada (cf. o que acima esmiuçadamente apontado ficou) emerge que o arguido/recorrente, ao que tudo indiciariamente indica terá perpetrado os referidos tipos legais de crime.
A Senhora juíza do Tribunal a quo expressou no despacho impugnado que se verificam relativamente ao arguido/recorrente os acima apontados perigos, indicando os pontos dos quais extraiu tal conclusão.
Quanto a nós, pelas razões acima deixámos expressas temos por concretamente verificados, os perigos de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e de continuação da atividade criminosa.
*
Relativamente à alegada existência de “de perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas”, diremos em apertada síntese:
Antes de mais quanto a este aspeto cumpre ter presente a lição da história e do direito comparado.
Na verdade, a reforma penal nacional-socialista de 1935 acrescentou dois motivos que não se ajustavam aos fins da prisão preventiva: perigosidade permanente e repercussão na opinião pública.
Face a este “direito” positivado, existia motivo de detenção quando em consequência da gravidade de uma facto tipificado na lei como crime e da repercussão provocada por ele não era tolerável deixar em liberdade o arguido.
Dito isto, entrando no cerne da problemática diremos:
Se bem vemos, o perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas decorre da prognose baseada numa certa compreensão dos fenómenos de massa. Face à natureza do crime indiciado e às circunstâncias em que indiciariamente foi praticado, bem como à personalidade criminógena do arguido, antecipa-se aqui uma atitude emocional de perturbação popular, suscetível de gerar um efeito negativo no meio envolvente, como sejam a revolta ou a intimação, inclusivamente sobre o arguido, o que pode atentar contra a paz social.
Para obviar a isso, impõem-se medidas de coação como contra medidas jurídicas em conformidade com as razões de índole social.
Como é bom de ver face a tamanha subjetividade suscetível de fácil manipulação, é um mecanismo que se revela a todas as luzes perigoso. Contudo, na redação operada art.º 1.º da Lei n.º 48/2007 - Diário da República n.º 166/2007, Série I de 29-ago.-2007, em vigor a partir de 15-set.-2007, aditou-se que o perigo de perturbação tem de ser “grave”.
Porque assim é, há agora uma maior exigência na aplicação deste normativo.
Este perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas reporta-se a comportamento futuro imediato do arguido, resultante da sua postura ou atividade e não do crime por ele indiciariamente perpetrado e à reação que pode gerar na comunidade ([31]).
Com o devido respeito por opinião em contrário, afigura-se-nos que, o perigo de perturbação da ordem e tranquilidade públicas só poderá ser invocado em situações em que a libertação do arguido ponha em causa, com alto grau de probabilidade, e gravemente a ordem e tranquilidade públicas, entendidas em termos gerais, pese embora a nível local, situação que não se nos afigura operante no caso em apreço.
Como é bom de ver, para a materialização deste perigo não se mostra suficiente uma alegado “alarme social” que não se traduz em perigo concreto derivado da conduta ou da personalidade do arguido.
Na verdade, o conceito de “alarme social” por uma banda, não é um equivalente do perigo de perturbação da ordem e tranquilidade pública, e, por outra, apresenta-se com contorno impreciso e facilmente manipulável. Por isso mesmo, mostra-se desarmónico com o direito adjetivo penal de um Estado de Direito Democrático ([32]).
O perigo de perturbação da ordem e tranquilidade públicas exige a verificação das circunstâncias particulares que em concreto tornem previsível a alteração da ordem e tranquilidade públicas. Porque assim é, não basta a convicção de que certo tipo legal de crime pode em abstrato causar emoção ou perturbação da tranquilidade pública ([33])
In casu, com o devido respeito por opinião em contrário, face à globalidade dos elementos indiciários para estes autos carreados e acima apontados nas ocorrências processuais relevantes, não vislumbramos a existência de fundado risco de grave, concreta e previsível alteração da ordem e tranquilidade públicas. Assim, temos por não verificado este perigo, da previsão da alínea da c), do n.º 1 do art.º 204.º do Código de Processo Penal
*
Dispõe o art.º 193.º do Código de Processo Penal que, “As medidas de coação e de garantia patrimonial a aplicar em concreto devem ser necessárias e adequadas às exigências cautelares que o caso requer e proporcionais à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas.”
Expressa Germano Marques da Silva ([34]), que “(...) o juiz quando considere necessário aplicar ao arguido medida de coação deve aplicar-lhe, de entre as legalmente admissíveis, a que julgue idónea para salvaguardar as exigências cautelares que o caso requerer, sempre que a medida escolhida seja proporcional à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas”.
Ora, os princípios da legalidade, proporcionalidade e adequação, impõem que se equacionem, na opção pela medida de coação prevista na lei, a gravidade do crime e as sanções que previsivelmente virão a ser aplicadas, de modo a encontrar-se uma situação de estabilidade entre a medida selecionada e essas duas variáveis. Por outra banda, cabe adaptar o mais possível a medida selecionada com as exigências cautelares que aquele caso concreto requer, harmonizando-se estas como o conjunto de requisitos gerais expressos no art.º 204.º do Código de Processo Penal.
*
Como flui do que acima dito ficou, a lei impõe que os perigos acima apontados têm que se verificar em concreto, relevando aqui de modo especial o perigo de continuação da atividade criminosa.
Daqui decorre que o perigo de continuação da atividade criminosa, em ordem à aplicação das medidas de coação legalmente previstas, nomeadamente a prisão preventiva, terá de ser aferido a partir de elementos factuais que o revelem ou o indiciem e não de mera presunção, a significar que o perigo de continuação da atividade criminosa terá de ser apreciado caso a caso, pelo que parecem não caber aqui juízos de mera possibilidade, no sentido de que só o risco real de continuação da atividade criminosa pode justificar a aplicação das medidas de coação, maxime da prisão preventiva.
Contudo, não podemos ignorar que a natureza do crime de tráfico de estupefacientes faz presumir a efetiva verificação de perigo de continuação da atividade criminosa, na medida em que, de uma maneira geral, são os consumidores (toxicodependentes) que tomam a iniciativa de procurar tais produtos onde saibam que os há ou onde os informem do local em que se efetua a venda através do movimento “toma lá dá cá” (dinheiro por droga).
O perigo de continuação da atividade criminosa, não se confunde, necessariamente, com a consumação de novos atos criminosos. Devendo antes ser aferido em função de um juízo de prognose a partir dos factos indiciados e personalidade do arguido/recorrente por eles revelada - “em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido”, nos termos da citada alínea c) do n.º 1 do art.º 204.º do Código de Processo Penal, o que aconteceu no caso vertente.
In casu, no que concerne à pessoa do arguido/recorrente MC__, pelas razões que já acima apontámos e pelas fundamentos plasmados na decisão impugnada secundamos o entendimento do Tribunal a quo de que, em concreto, no momento da aplicação da medida se mostram verificados os acima apontados perigos (com exceção do perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas), pelas razões que deixamos expostas supra e de modo especial verifica-se a existência do concreto perigo de continuação da atividade criminosa.
De facto, estes invocados perigos cautelares encontram-se suficientemente fundamentados no despacho em causa.
Com efeito, resulta dos elementos de prova indiciária acima aludidos, que ao que tudo indica o arguido/recorrente terá vindo reiteradamente a dedicar-se ao tráfico de estupefacientes.
Por sua vez cabe ter presente, os efeitos diretos deste tráfico nos consumidores e indiretos em termos de criminalidade associada como forma de obtenção de meios para compra de estupefacientes.
É significativo o perigo da continuação da atividade criminosa decorrente da sua liberdade de movimentos e da amplitude dos contactos de que já dispõe parecendo assim obrigatório parar definitivamente a sua atividade ligada ao tráfico de estupefacientes.
Na verdade, se bem vemos, a quantidade de heroína e cocaína apreendida ao arguido/recorrente MC__ e a que presumivelmente terá desenvolvido na atividade de tráfico de estupefacientes desde pelo menos 10-set.-2021, revela desde logo a sua inserção numa atividade já organizada.
Assim, tem agasalho na lei a decisão recorrida quando pesa a globalidade do circunstancialismo que aponta na decisão impugnada e conclui pela verificação dos acima apontados perigos, com exclusão dos perigos de fuga e do perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas, que pelas razões supra apontadas temos por não concretamente verificados.
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Por sua vez, cumpre aqui ter presente que o crime de tráfico é um crime pluriofensivo: o normativo incriminador do tráfico de estupefacientes tutela uma multiplicidade de bens jurídicos, designadamente de caráter pessoal – a vida, a integridade física e a liberdade dos virtuais consumidores – visando ainda a proteção da vida em sociedade, o bem-estar desta, e a saúde da comunidade (na medida em que o tráfico dificulta a inserção social dos consumidores e possui comprovados efeitos criminógenos), embora todos eles se possam reconduzir a um bem geral – a saúde pública, pressupondo apenas a perigosidade da ação para tais bens, não se exigindo a verificação concreta desse perigo ([35]).
Na verdade, não pode olvidar-se que o tráfico de estupefacientes é, atualmente, uma das atividades mais destacadas do crime organizado ao nível internacional, afirmando-se como o segundo maior negócio do mundo, a seguir ao das armas.
Na imputação deste crime tem-se em vista a proteção de diversos bens jurídicos (a vida, a integridade física, a liberdade de determinação dos consumidores de estupefacientes, entre outros) que podem, no entanto, como referimos, ser englobados no dever geral de proteção de saúde pública.
Tal faz com que o crime de tráfico seja, um crime de perigo comum e abstrato, porquanto a norma protege uma multiplicidade de bens jurídicos, não se exigindo o dano nem o perigo concreto e bastando-se a incriminação com a mera perigosidade da ação.
Ora, os crimes exauridos, entre os quais se acha o de tráfico de estupefacientes, caracterizam-se por se consumarem através de um só ato de execução, ainda que sem se chegar à realização completa e integral do tipo. A conduta incriminatória esgota-se, assim, nos primeiros atos de execução, independentemente de os mesmos corresponderem a uma execução completa; cada atuação do agente no crime exaurido traduz-se na comissão integral do tipo ([36]).
O STJ vem decidindo quanto ao tipo legal de crime de tráfico de estupefacientes que “Pode verificar-se o crime consumado de tráfico de droga ainda que o agente não tenha tido contacto físico direto com a droga” ([37]).
Por sua vez, nesta sede cumpre ter presente que o combate ao tráfico de estupefacientes constitui uma prioridade da política criminal nacional, europeia e internacional.
A ONU (Organização das Nações Unidas) estima que o mercado mundial de drogas ilícitas movimenta cerca de US$320 biliões. No plano internacional são relevantes a Convenção Única das Nações Unidas de 1961 sobre os Estupefacientes, a Convenção das Nações Unidas sobre as Substâncias Psicotrópicas de 1971, a Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas de 1988.
As três Convenções sobre drogas visam limitar o consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas exclusivamente a fins médicos e científicos, devendo os países signatários adotar as medidas legislativas necessárias para controlar a posse e o consumo pessoal e para combater o tráfico de droga internacional.
No espaço europeu são de realçar a Decisão-Quadro 2004/757/JAI do Conselho, de 25-out.-2004, que adota regras quanto aos elementos constitutivos das infrações penais e às sanções aplicáveis no domínio do tráfico ilícito de droga e a Decisão 2005/387/ JAI do Conselho, de 10-mai.-2005, relativa ao intercâmbio de informações, avaliação de riscos e controlo de novas substâncias psicoativas.
É consabido que o comércio de drogas proporciona fáceis, rápidos e avultados lucros. Daqui se infere existir perigo de continuação da atividade criminosa, sendo que, in casu, atenta a natureza e quantidade de heroína e cocaína apreendidas (sendo certo que, da prova indiciária para estes autos carreada emerge no que tange ao ora arguido/recorrente que há indícios de que o mesmo terá desenvolvido atividade de tráfico de estupefacientes desde pelo menos 10-set.-2021).
Reafirma-se, assim, que no caso em apreço existe concreto perigo de continuação da atividade criminosa.
O ilícito criminal imputado ao arguido/recorrente MC__, relativamente ao crime de tráfico de estupefacientes, da previsão do art.º 1.º nº. 1 da Lei n.º 15/93, de 22-jan., com referência às tabelas I-A e I-B, anexas ao mesmo diploma legal, é suscetível de justificar a aplicação da prisão preventiva, por um lado, em virtude de ser punível com uma pena abstrata de prisão de limite máximo superior a 5 anos (concretamente 12 anos) e, por outro lado, pela circunstância de integrar o elenco das condutas que, ope legis [cf. alínea m) do art.º 1.º do Código de Processo Penal] fazem parte o conceito de criminalidade altamente organizada, para o efeito das disposições do Código de Processo Penal.
Por sua vez, o crime de detenção de arma proibida, em causa, da previsão das disposições conjugadas dos arts. 3.º, n.º 4, alínea a) e 86.º, n.º 1, alínea c), ambos da Lei das Armas e suas Munições, aprovada pela Lei n.º 5/2006, de 23-fev., é punido com pena de é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos ou com pena de multa até 600 dias.
É também sabido que a prisão preventiva tem natureza excecional e que não deve ser decretada sempre que possa ser aplicada outra medida mais favorável prevista na lei, designadamente a obrigação de permanência na habitação.
Contudo, a preservação da liberdade tem que ser articulada com a segurança e a repressão do crime.
Ora, como já acima aludimos, sobretudo o crime fortemente indiciado nos autos de tráfico de estupefacientes da previsão do referido art.º 21.º, n.º 1 da Lei n.º 15/93, assume extrema gravidade, o que desde logo é patente na moldura penal aplicável (prisão de 4 a 12 anos).
Perante a gravidade deste crime de tráfico de estupefacientes, aqui em questão, a sua repressão bem como a do crime de detenção de arma proibida e a segurança dos cidadãos colocam em destaque o recurso à prisão preventiva, cuja aplicação a nosso ver se impõe nestes autos.
Atenta a qualidade e quantidade dos produtos estupefacientes que lhe foram apreendidos (heroína e cocaína) e aquela que resulta da atividade de tráfico de estupefacientes desenvolvida desde pelo menos 10-set.-2021 no lapso temporal que antecedeu a sua detenção no âmbito dos presentes autos; a circunstância de ser da experiência comum que o traficante não o é uma vez na vida e para nunca mais. Existe, assim, perigo de continuação da atividade criminosa porquanto o mesmo se infere num juízo de prognose a partir dos factos indiciados e da personalidade do arguido/recorrente por eles revelada.
Na verdade, in casu, atenta a pena abstratamente aplicável e, sobretudo, face à natureza do crime de tráfico de estupefacientes aqui em causa e às circunstâncias concretas, a prisão preventiva apresenta-se como o único meio processual adequado, proporcional e necessário para prevenir o perigo de continuação da atividade criminosa, que não tem alternativa no campo das outras medidas de coação, designadamente, na invocada pelo arguido/recorrente de OPHVE.
Assim, qualquer medida de coação que não a prisão preventiva apresenta-se como insuficiente.
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A medida de coação de obrigação de permanência na habitação, ainda que com controlo eletrónico (OPHVE), não se nos afigura adequada a prevenir o perigo de continuação da atividade criminosa, uma vez que nessa situação facilmente o arguido, mantendo-se em casa, poderia continuar a desenvolver a atividade ilícita em questão de tráfico de estupefacientes.
Assim sendo, as exigências cautelares verificadas impõem que se tivesse decretado a medida de coação de prisão preventiva ao arguido/recorrente que lhe foi imposta na decisão impugnada.
Sendo que a mesma face aos critérios estabelecidos pelo n.º 1 do art. 193.º do Código de Processo Penal não se mostra desproporcional.
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Não obstante o arguido/recorrente afirmar “ter trabalho” e estar socialmente inserido, tal não a impediu de indiciariamente perpetrar os crimes em questão.
O perigo de continuação da atividade criminosa decorre de um juízo de prognose de perigosidade social do arguido, efetuado a partir de circunstâncias anteriores ou contemporâneas à conduta que se encontra indiciada e sempre relacionada com esta.
Outrossim a obtenção de dinheiro fácil parece ser a motivação do arguido / recorrente para indiciariamente perpetrar os crimes de tráfico de estupefacientes e de detenção de arma proibida, fazendo do tráfico de estupefacientes a sua principal forma de vida.
No caso em apreço parece que não estamos perante uma mero vendedor / “dealer” de ato ocasional, mas sim de pessoa faz do tráfico de estupefacientes uma forma de vida; a ilicitude não assume menor dimensão porquanto tudo indica encontrar-nos perante situação em que o arguido/recorrente estará integrado no conjunto ou na organização de rede de tráfico não se tratando de uma intervenção isolada e não contextual.
In casu dos elementos para estes autos carreados não se nos afigura que o arguido/recorrente funcione como simples prestador avulso de um serviço, desligado da organização, dos donos do negócio e que não participe minimamente dos proventos da atividade.
Decidiu o Tribunal a quo, que a medida de coação de obrigação de permanência na habitação é desadequada para fazer face aos concretos perigos que indica.
Em face do acima exposto, consideramos verificados, em concreto, os já acima apontados perigos de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução e de continuação da atividade criminosa e que o Tribunal a quo respeitou os princípios da legalidade, adequação e proporcionalidade, no âmbito de um judicioso sentido da realidade espelhada na prova indiciária para os autos carreada, na gravidade que assume e em harmonia com as próprias exigências e sancionamento do caso em si.
Assim sendo, afigura-se-nos que a prisão preventiva do arguido/recorrente é, no caso presente, neste momento, não só proporcional e adequada, como ainda necessária, considerando as finalidades que presidem à sua aplicação.
Tal conclusão e, em concreto, a de que só a aplicação da prisão preventiva do arguido, permite in casu acautelar os acima apontados perigos não é abalada pelas circunstâncias da vida pessoal do arguido/recorrente (o circunstancialismo em que o arguido/recorrente terá perpetrado os factos aqui em causa, apesar de familiar inserido, não a inibiu de levar por diante o que aqui indiciariamente se lhe imputa e que, ao que tudo indica, já vem fazendo de forma reiterada), que embora sejam de atentar, não afastam ainda assim, a verificação das condições para manutenção de tal medida coativa, verificando-se que no caso em apreço, não é possível acautelar os referidos perigos, com recurso a outras medidas menos gravosas previstas na lei.
Como apontado ficou, não se ignora que o Homem tem a liberdade na massa do sangue e que a prisão preventiva tem caráter subsidiário (cf. n.º 2, do art.º 193.º, do Código de Processo Penal) e excecional (cf. n.º 2, do art.º 28.º, da Constituição da República), só devendo ser mantida se for de todo imprescindível, considerando-se nesse quadro legal, o invocado circunstancialismo familiar, pessoal e social do arguido, associado à sua situação de detenção.
Contudo, tais factos não permitem, a nosso ver, alterar, neste momento, só por si, os critérios de determinação da medida de coação a aplicar ao arguido/recorrente.
Na verdade, o legislador estabeleceu no art.º 204.º do Código de Processo Penal, os critérios de aplicação de medidas de coação, associados aos objetivos essenciais de garantir o exercício da ação penal e as finalidades de todo o sistema criminal, protetor de bens jurídicos essenciais.
Por outro lado, a natureza excecional e subsidiária da prisão preventiva, leva a que tal medida apenas pode ser aplicada, desde que as finalidades processuais visadas com a imposição de uma medida de coação, não possam, nesse caso concreto, ser acauteladas por outra medida, menos limitadora, para o arguido (cf. art.º 193.º e n.º 1, do art.º 202.º, ambos do Código de Processo Penal).
Deste modo, se as finalidades processuais, apontadas com a imposição de uma medida de coação, puderem ser protegidas por uma outra medida menos gravosa, é esta que deve ser aplicada, ainda que a prisão preventiva seja proporcional à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas.
In casu, por tudo o que exposto fica, entendemos que as necessidades cautelares do processo apenas podem ser salvaguardadas com a sujeição do arguido/recorrente à medida de prisão preventiva, revelando-se as demais medidas como inadequadas ou insuficientes.
Com efeito, a medida de “proibição de o arguido frequentar as imediações do estabelecimento comercial ou em derradeira hipótese, de frequentar a cidade de Amadora” é de rejeitar liminarmente por se mostrar inadequada a acautelar os concretos perigos acima apontados (cf. arts 191.º, 192.º e 193.º, todos do Código de Processo Penal)
Por sua vez, nem mesmo a medida de permanência em habitação, ainda que com vigilância eletrónica se mostra no caso em apreço adequada e eficaz. Com efeito, afigura-se-nos que a mesma seria porventura suscetível de, em tese geral, poder eventualmente eliminar a existência do perigo de fuga, o qual pelas razões acima apontadas temos aqui por inoperante. Mas já quanto ao concreto perigo de continuação de atividade criminosa, mostrando-se a OPHVE ineficaz
Na verdade, é de todos sabido que a obrigação de permanência na habitação, obvia a que a pessoa se ausente do local onde é posta em contenção com sujeição a vigilância eletrónica, mas não impede de todo a existência de contactos com terceiros, os quais poderiam contribuir para o apontado perigo de continuação de atividade criminosa.
In casu, de veras, se bem vemos, a medida do art.º 201.º, do Código de Processo Penal não se adequa bem à esconjuração do perigo de continuação da atividade criminosa em caso de crime de tráfico de estupefacientes, uma vez que este tipo de crime pode cometer-se — e muitas vezes se comete — no domicílio, não tem a virtualidade de impedir os contactos e transações com os fornecedores e clientes de droga, bastando para tanto pensar na facilidade de comunicações eletrónicas modernas (v.g. telemóvel, SMS, Internet, etc.).
Assim, consagra-se no n.º 2 do art.º 193.º, e no n.º 1 do art.º 202.º, do Código de Processo Penal o princípio de que só será de aplicar a prisão preventiva se todas as outras medidas se mostrarem inadequadas ou insuficientes.
Esta natureza excecional e de última ratio da prisão preventiva não são desrespeitadas nos presentes autos, já que se não vislumbra nenhum outro modo de acautelar o apontado perigo de continuação da atividade criminosa do arguido/recorrente.
Mesmo a “prisão domiciliária” não seria meio eficaz de o colmatar, pois não evitaria que o arguido/recorrente continuasse sujeito a fortes solicitações para o tráfico a que ao que tudo indica se virá dedicando pelo menos, in casu, desde 10-set.-2021 a esta parte (recorda-se o tráfico potência elevados lucros, dispondo o arguido/recorrente uma capacidade logística adequada).
Na verdade a possibilidade de dinheiro fácil adicionada à ausência de meios alternativos geradores de suficiente rendimento, determina sério risco do arguido/recorrente prosseguir na atividade de tráfico face à amplitude dos contactos de que já dispõe.
Há que acautelar o perigo de repetição de ocorrências da natureza das aqui já delineadas, perigo que é real, atente-se que este tipo de atividade não é, facilmente abandonado em definitivo, de forma voluntária, pois que são atrativos os lucros e o inerente nível de vida, que proporcionam.
Daí que, salvo o devido respeito por opinião em contrário, não possa o arguido/recorrente asseverar que com a medida de coação de OPHV evitava que praticasse crimes.
Na verdade, a manutenção do arguido/recorrente em liberdade, com qualquer outra medida de coação que não a prisão preventiva, mormente a OPHVE, não têm qualquer virtualidade de, eficazmente, afastar, evitar, atenuar, sequer, de forma significativa, muito menos suficiente, o concreto perigo de continuação da atividade criminosa.
Isto porque a atividade desenvolvida ligada ao tráfico de estupefacientes pode perfeitamente continuar a partir da residência, com a proibição de contactos — com o recurso a outros colaboradores para a execução do necessário trabalho no terreno — atente-se na vulgarização do correio eletrónico, que a par do telefone, podem ser utilizados, com sucesso para aquela finalidade, sem conhecimento da entidade vigilante, pois que os meios técnicos de controlo não são adequados a possibilitar uma qualquer fiscalização prática, no terreno, em tempo real.
Na verdade não pode ignorar-se, que nos crimes de tráfico de produtos estupefacientes, o “negócio” pode ser efetuado, mantido, mesmo sem contacto direto com os consumidores, isto é, pode fazer-se o “negócio” à distância.
In casu bastava que o arguido/recorrente combinasse com terceiros a entrega em “sua casa”, que também arranjaria quem lha trouxesse a casa para ele vender, ou quem a levasse ao local combinado. Pelo que aplicar a medida de permanência na habitação mediante vigilância eletrónica, não surtiria qualquer efeito útil, em termos de impedir a continuação da atividade.
Perante tal situação e tendo em conta o tipo de crime de tráfico de estupefacientes aqui em causa, manifestamente, se torna insuficiente e inadequada qualquer outra medida de coação que não seja a prisão preventiva.
Como, tal, justifica-se que tenha sido decretada a medida de coação, de prisão preventiva, única adequada a afastar o perigo, mais que certo, de continuação da atividade criminosa, dada a motivação subjacente aos factos, o modo de operar, a experiência do mercado e o contexto, já enunciados, como o arguido/recorrente ao que tudo indica, vinha desenvolvendo a sua atividade ilícita, pelo menos desde 10-set.-2021, não se vislumbrando qualquer remota possibilidade de aplicação da medida de coação de: “proibição de o arguido frequentar as imediações do estabelecimento comercial ou em derradeira hipótese, de frequentar a cidade de Amadora”; ou de OPHVE, nos termos do n.º 3 do art.º 193.º Código Penal, nem mesmo se conceder preferência à obrigação de permanência na habitação, pois que no caso concreto, esta medida se revela, por ora, insuficiente para satisfazer as exigências cautelares, como já acima deixamos expresso.
No caso em apreço, existem os acima apontados perigos de que aqui realçamos o concreto perigo de continuação da atividade criminosa. É que as condições de vida do arguido/recorrente seriam as mesmas, que existiam quando da prática dos factos ora imputados, e ainda que se aplicasse a “prisão domiciliária” com vigilância eletrónica, apenas mudaria o modus operandi (ou modo de gestão da atividade ilícita, porque não é necessário sair de casa para manter essa atividade) e os indícios confirmam a relevância jurídico-processual, e a necessidade de aplicação da medida de coação gravosa.
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Da mesma forma se não mostra minimamente beliscada qualquer disposição ou princípio de matriz constitucional, designadamente o n.º 3 do art.º 27.º, n.º 2 do art.º 28.º, n.º 1 do art.º 29.º, e n.º 2 do 32.º, da Constituição da República Portuguesa ou os princípios da igualdade (art.º 13.º da Constituição da República), legalidade, adequação ou proporcionalidade, nem os artigos invocados pelo arguido/recorrente: “arts. 193.º, n.º 1 a 3, 196.º, 198.º, 201.º, 202.º e 204.º, todos do CPP”.
Não se mostra beliscada a norma contida n.º 2 do art.º 28.º da Constituição da República, que prevê que a prisão preventiva tem natureza excecional, não podendo ser decretada nem mantida, sempre que possa ser aplicada outra medida mais favorável prevista na lei, sendo que in casu, como, cremos ter ficado demonstrado no despacho recorrido, com clareza, de forma direta, imediata e sintética, sem hesitações, julgamento acabado que aqui se confirma, verifica-se a sua absoluta necessidade perante as circunstâncias do caso concreto.
Por outro lado, o facto de o n.º 2 art.º 32.º da Constituição da República consagrar que o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação e que deve ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa, em nada é contraditado, afrontado, violado, com o facto de, desde logo, anteriormente, em termos sistemáticos, a Constituição da República prever, no seu art.º 28.º, a possibilidade de aplicação da prisão preventiva.
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No caso em apreço, a Senhora Juíza no despacho recorrido que o arguido/recorrente pretende pôr em crise, declarou na parte que se mostra operante existirem os já anteriormente apontados perigos.
Flui do que já acima dito fica e da simples leitura da decisão impugnada que, salvo o devido respeito por opinião em contrário, quanto a este quid não assiste razão ao arguido/recorrente.
Com efeito, é consabido que, de harmonia com o disposto no citado n.º 1 do art. 202.º, do Código de Processo Penal, e sem prejuízo da legalidade, adequação e proporcionalidade da sua aplicação, a prisão preventiva pode ser aplicada e mantida sempre que houver fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos ([38]), sendo tais requisitos condição sine qua non da sua imposição ao arguido.
Para a aplicação de uma medida de coação torna-se necessário a imputação à pessoa que dela for objeto, de indícios (ou fortes indícios, nos casos dos arts. 200.º, 201.º, e 202.º do Código de Processo Penal) da prática de dado crime, ou seja, como afirma Germano Marques da Silva ([39]) “não pode ser aplicada uma medida de coação ou de garantia patrimonial se não se indiciarem os pressupostos de que depende a aplicação ao sujeito de uma pena ou medida de segurança criminais”.
Relativamente às medidas de coação de proibição de permanência, de ausência e de contactos, de obrigação de permanência na habitação e prisão preventiva (arts. 200.º, 201.º e 202.º, todos do Código de Processo Penal) a lei exige fortes indícios da prática de crime.
Como refere Germano Marques da Silva ([40]) “Embora não seja ainda de exigir a comprovação categórica sem qualquer dúvida razoável, é pelo menos necessário que face aos elementos de prova disponíveis seja possível formar a convicção sobre a maior probabilidade de condenação do que de absolvição”.
Por fortes indícios deve entender-se todos aqueles que apresentem uma base de sustentação segura, alicerçados que deverão estar em factos de relevo, com idoneidade bastante para permitir concluir, com toda a probabilidade, pela condenação do arguido, na sequência de um juízo de prognose sobre esse evento futuro.
Consequentemente, como dispõe o n.º 2 do art. 192.º, do Código de Processo Penal, ainda que existam indícios (ou fortes indícios) da prática de crime, nenhuma medida de coação ou de garantia patrimonial é aplicada quando houver fundados motivos para crer na existência de causas de isenção da responsabilidade ou de extinção do procedimento criminal.
Para a aplicação das medidas de coação, com exceção do termo de identidade e residência, não basta a existência de indícios da prática do crime e os requisitos específicos definidos na lei para cada uma de tais medidas, importa ainda que se verifiquem os requisitos ou condições gerais referidos nas várias alíneas do art.º 204.º, do Código de Processo Penal. Estes requisitos enumerados nas alíneas a), b) e c) são taxativos, bastando, consequentemente, a existência de algum deles para que a medida possa ser aplicada.
Nos termos das alíneas b) e c) do n.º 1, do art. 204.º do Código de Processo Penal os acima apontados perigos justificam a aplicação ao arguido/recorrente de uma medida de coação (à exceção do termo de identidade e residência).
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Pelo que já acima deixámos apontado, no que tange ao arguido/recorrente existem elementos probatórios que apontam no sentido da inexistência de qualquer erro na apreciação dos indícios que efetivamente fluem dos autos.
Por outro lado, verificam-se in casu, todos os pressupostos legais para que ao arguido/recorrente fosse aplicada a medida de prisão preventiva, não tendo o despacho recorrido violado qualquer norma legal, antes tendo respeitado os pressupostos dos arts. 191.º a 193.º, alíneas a) e c) do n.º 1 do 202.º, ([41]), alíneas b) e c), do n.º 1 do art. 204.º, todos do Código de Processo Penal.
Como vimos, através do presente recurso almeja o recorrente, no limite que lhe seja aplicada em substituição da medida de prisão preventiva pela medida de coação de OPHVE.
In casu o Tribunal a quo teve em consideração por imperativo legal o disposto no referido art. 193.º, no seu n.º 1, do Código de Processo Penal, ou seja as sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas ao arguido/recorrente.
Ora, os números 1 e 2, do art. 193.º, do Código de Processo Penal, contemplando os princípios da adequação e da proporcionalidade ou subsidiariedade da medida aplicada, corolário do princípio da presunção de inocência, consagrado no n.º 2 do art. 32.º da Constituição da República Portuguesa, conferiu à prisão preventiva um cunho de ultima ratio, apenas permitindo a sua utilização nas situações em que, pressupondo a existência, em concreto, de fortes indícios da prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a 5 anos, seja a única capaz de conter os perigos em concreto também verificados (cf. art. 204.º do Código de Processo Penal).
No caso sub judice os perigos concretamente verificados, já acima apontados, maxime o de continuação de atividade criminosa não se coadunam com a aplicação de medida menos gravosa, nomeadamente com a de permanência na habitação com recurso a meios de vigilância eletrónica, na medida em que a força e grandeza das citadas exigências cautelares conduz à inaptidão da respetiva contenção por outra medida que não a medida detentiva em causa.
Na verdade, para além do que já acima deixámos expresso, se bem vemos, a obrigação de permanência na habitação com recurso a meios de vigilância eletrónica, não obstante ser o derradeiro reduto antes da prisão preventiva, podendo em certa medida acautelar minimamente a fuga (que pelas razões acima apontadas temos por inoperante no caso em apreço), num país com pouco mais de 200 km de largura, não obvia certamente à continuação de contactos, nem ao perigo de continuação de atividade criminosa, como já acima deixámos expresso.
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Cabe nesta sede reafirmar ainda que, a Constituição da República Portuguesa consagra, nos primeiros artigos do catálogo dos direitos, liberdades e garantias pessoais, o direito à liberdade e à segurança (cf. art. 27.º).
O direito à liberdade abarca o de não ser detido ou preso pelas autoridades públicas, salvo nos casos e termos previsto nos n.ºs 2 e 3, do mesmo preceito.
Contudo, o reconhecimento, constitucionalmente afirmado, do caráter excecional da prisão preventiva (n.º 2 do art.º 28.º), envolve a consideração, além do mais, de que todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença que o condene (n.º 2 do art.º 32.º).
Todavia essa presunção, como vimos, não é incompatível com a indiciação do arguido pelo crime de tráfico de estupefacientes e de detenção de arma proibida supra referidos, nem com a aplicação da prisão preventiva, na medida em que verificados se mostrem os pertinentes pressupostos legais, os quais in casu se revelam preenchidos.
Diga-se neste particular que a medida de coação no caso em apreço em nada interfere no princípio da presunção da inocência revelando-se tão-só como meio processual de limitação da liberdade pessoal do arguido/recorrente visando acautelar a eficácia do procedimento quanto ao seu desenvolvimento e eventual decisão condenatória ([42]).
Assim sendo, a gravidade dos factos fortemente indiciados, o seu modo de execução, a existência dos acima apontados perigos, principalmente o perigo concreto de continuação de atividade criminosa, preenche os requisitos de legalidade, adequação, proporcionalidade exigíveis, afigurando-nos que, nesta fase, a prisão preventiva constitui a única medida de coação adequada ao abrigo dos arts. 191.º, 192.º, 193.º, 194.º, 196.º, 202.º, n.º 1, alíneas a), e c), e 204.º, n.º 1 alíneas, b) c), todos do Código de Processo Penal, que cumpre manter.
Verificamos, assim, que o despacho recorrido respeitou de forma integral os princípios constitucionais e adjetivos da prisão preventiva, além de se fundamentar nos fortes indícios da prática dos referidos tipos legais de crime (fumus comissi delicti e pericula libertatis).
É pois de manter a decisão recorrida que decretou a prisão preventiva do arguido/recorrente MC__, já que existe uma alta probabilidade deste ter perpetrado os aludido crimes, fortemente indiciados e esta ser a única medida eficaz à satisfação das exigências cautelares, mostrando-se proporcional à gravidade do crime em causa que a nossa lei adjetiva penal considera integrante de criminalidade altamente organizada e à sanção que previsivelmente virá a ser aplicada ao recorrente.
Em conclusão, os fundamentos invocados pelo arguido/recorrente com vista à revogação da medida de coação que lhe foi aplicada e sua substituição por “proibição de o arguido frequentar as imediações do estabelecimento comercial ou em derradeira hipótese, de frequentar a cidade de Amadora” ou OPHVE não colhem, uma vez que verificados estão os acima apontados perigos, de que aqui destacamos o concreto perigo de continuação de atividade criminosa por parte do arguido/recorrente. Não podem, pois, ser acolhidos os fundamentos invocados pelo arguido/recorrente, na medida em que existem circunstâncias que justificaram a aplicação da prisão preventiva, nem está demonstrada uma atenuação das exigências cautelares.
Não se mostra violado qualquer dos preceitos legais citados pelo arguido/recorrente.
Por isso, bem andou a Senhora juíza de instrução criminal ao decretar a prisão preventiva do arguido/recorrente MC__, contendo fundamentação suficiente, formal e substancialmente correta e acertada.
Não se mostrando violado qualquer dos preceitos constitucionais e legais citados pelo arguido/recorrente nem quaisquer outros ao caso aplicável, o presente recurso naufraga in totum.
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Em consequência do decaimento, o arguido/recorrente será responsabilizado pelas custas do recurso (cf. n.º 1 art.º 513.º, do Código de Processo Penal).
De acordo com o disposto no n.º 9 do art.º 8.º e tabela III do Regulamento das Custas Processuais, a taxa de justiça a fixar, a final, varia entre três e seis UC.
Tendo em conta a complexidade do processo, julga-se adequado fixar essa taxa individual em 4 UC.
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3. DISPOSITIVO
Perante tudo o que dito fica, acordam os juízes que compõem a 3.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
- Em declarar que inexiste qualquer nulidade na realização da busca ao estabelecimento comercial em causa em situação de flagrante delito.
- Em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido MC__, confirmando-se por razões em parte diversas, as decisões recorridas datadas de 24-jun.-2022, e, consequentemente, a medida de coação de prisão preventiva que lhe foi aplicada.
- Em condenar o recorrente pelo seu decaimento no pagamento da taxa de justiça de 4 UC e nos encargos a que deu causa [n.º 1 do art.º 513.º, e n.º 1 do art.º 514.º, ambos do Código de Processo Penal e n.º 9, do art.º 8.º, do Regulamento das Custas Processuais, sem prejuízo do disposto alínea j) do n.º 1 do art.º 4.º, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III anexa a este último diploma].
- Em determinar que se comunique de imediato ao Tribunal a quo a presente decisão.
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Lisboa, 26-out.-2022
Rui Gonçalves
Maria Elisa Marques
Adelina Barradas de Oliveira
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([1]) Motivação recursória subscrita pelo Senhor Advogado Dr. Luís Afonso (cf. fls. 3-14 verso dos presentes autos).
([2]) Cf. certidão junta a fls. 1 e fls. 2, ambas destes autos — Referência Citius: 139034129.
([3]) Resposta subscrita pela Senhora procuradora da República Dr.ª Cláudia S. Ferreira (cf. fls. 749-752 dos presentes autos).
([4]) Cf. fls. 754 dos autos (vol. 2.º) — Referência Citius: 139079597.
([5]) Dr. José Manuel Freitas (cf. fls. 761 — Referência Citius: 18875762).
([6]) Que aqui se corrige ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 e n.º 2 do art.º 380.º, do Código de Processo Penal e do art.º 249.º do Código Civil.
([7]) Cf. ponto 2.1.3. (iii)  factos 1 a 25 (inclusive).
([8]) Cf. neste sentido o sentenciado no Ac. do STJ de 25-jan.-1996 (Sousa Guedes), proc. nº 48505 – 3.ª Secção; e Ac. do STJ de 27-jan.-1998 (Sousa Guedes), proc. n.º 1045/97 – 3.ª Secção.
([9]) Vide neste mesmo sentido o decidido no Ac. do TRP de 16-mai.-2001, CJ XXVI, 2, 235.
([10]) DR, I.ª Série de 09-fev.-1987. Igualmente disponível em: <http://www.tribunalconstitucional. pt/tc/acordaos/19870007.html>. Acedido em 07-out.-2022.
([11]) Cf. neste mesmo sentido, o sentenciado no  Ac. do STJ de 07-abr.-2005 (Pereira Madeira), proc. n.º 767/05 - 5.ª Secção, disponível em:<http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4d168c8e6a75031 980256fe7005ebeaf?OpenDocument>. Acedido em: 07-out.-2022.
([12]) Cf. neste mesmo sentido o sentenciado no Ac. do STJ de 23-abr.-1994,  CJ XVII, 2, 22.
([13]) “A lei é ordem; e uma boa lei é uma boa ordem" (cf. Aristóteles, Política).
([14]) Entendida esta latissimo sensu abrangendo o Inquérito sobre a esfera de atuação do Ministério Público.
([15]) Cf., por todos, o saudoso GONÇALVES, Manuel Lopes Maia, Código de Processo Penal, 17.ª ed., Coimbra, Almedina, 2009, p. 511 nota 2.
([16]) Cf. neste sentido, ANTUNES, Maria João, «O segredo de justiça e o direito de defesa do arguido sujeito a medida de coação», in Liber Discipulorum para Jorge Figueiredo Dias, Coimbra Editora, 2003, p. 1249.
([17]) Vide ANTUNES, Maria João, op. cit. p. 1252.
([18]) Ob. cit. p. 1253.
([19]) Introduzida pelo art.º 1.º da Lei n.º 48/2007, de 29-ago. (DR n.º 166/2007, Série I de 29-ago.-2007), em vigor a partir de 15-set.-2007.
([20]) Cf. AMODIO, Ennio, e DOMINIONI, Oreste, Commentario del Nuovo Codice di Procedura Penale, Volume terzo, parte seconda, Giuffrè, Milano, 1990, p. 42.
([21]) Cf. AMODIO, Ennio e DOMINIONI, Oreste, ob. cit. p. 42.
([22]) Sucessivamente alterado pela revisão operada em 1989 mediante a substituição da referência à “medida de liberdade provisória” pela referência a “qualquer outra medida mais favorável”, e na pela revisão de 1997, mediante a introdução do inciso “tem natureza excecional, não sendo decretada nem mantida” e a troca de “substituída” por “aplicada”.
([23]) Cf. FERREIRA Manuel Cavaleiro de, Manuel in Curso de Processo Penal, I, Lisboa, 1986, pp. 238, 242, 246, 249, e 250.
([24]) Cf. SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal, II, Ed. Verbo, 3.ª ed., 2002, Lisboa/São Paulo, pp. 263 e ss.. 
([25]).Nomeadamente: fls. 637-638; 639-640 dos presentes autos (vol. 2.º) — (fls. 3224-3225; 3226-3227 dos autos principais); e auto de apreensão de fls. 648-649 dos presentes autos (vol. 2.º) — (fls. 3235-3236 dos autos principais); relatório de visionamento relativo a 23-jun.-2022, de fls. 655-656 e ss., dos presentes autos (vol. 2.º) — (fls. 3242-3243 e ss. dos autos principais), que o OPC presenciou a entrada e a saída de consumidores de produtos estupefacientes do referido estabelecimento comercial do arguido, maxime JS___  em 23-jun.-2022, que logo abordou à saída do aludido estabelecimento, na detenção de produtos estupefacientes (heroína e cocaína) que asseverou que adquiriu ao ora arguido/recorrente MC__, referindo até o local onde o mesmo arrecadava os produtos estupefacientes, debaixo da grade da máquina de café, sítio igualmente referenciado por João da Silva. Neste seguimento e no imediato, foram acionados os meios policiais para abordagem, busca, apreensão e detenção no estabelecimento comercial em causa e do arguido, com o resultado documentado nos presentes autos (cf. Auto de apreensão relativo a 23-jun.-2022, de fls. 658-659 dos presentes autos (vol. 2.º) — (fls. 3239-3240 dos autos principais). Auto de busca no estabelecimento denominado “Equador” sito na Av. G n.º …, Amadora, e apreensão realizada em 23-jun.-2022 documentada a fls. 660-662 dos presentes autos (vol. 2.º); bem como o evidenciado a fls. 662-663 dos presentes autos (vol. 2.º): produtos estupefacientes e quantia monetária apreendidos; auto de exame e avaliação da arma branca fls. 666-667 dos presentes autos (vol. 2.º); fotogramas da máquina de café de fls. 668-669 e (722) dos presentes autos (vol. 2.º), onde nestes nas imagens 4 e 5 é visível o recipiente ocultado atrás de uma caixa elétrica da referida máquina de café, de forma a dificultar a localização do produto estupefaciente; fls. 671 dos autos: imagem geral do material apreendido; fls. 672 dos presentes autos (vol. 2.º): imagem dos produtos suspeitos de serem estupefacientes (heroína e cocaína) de fls. 673-674 (vol. 2.º) Auto de busca e apreensão realizada no dia 23-jun.-2022 ao veículo automóvel de matrícula 96-EN-20); Auto de inquirição da testemunha João Silva de fls. 675-676 dos presentes autos (vol. 2.º); auto de notícia por detenção do arguido/recorrente MC__ de fls. 683-686 dos presentes autos (vol. 2.º). Por sua vez, a fls. 689 dos presentes autos (vol. 2.º) mostra-se incorporado despacho do Senhor procurador da República titular do respetivo inquérito-crime, com a data de 24-jun.-2022, em que valida a detenção e a constituição de arguido do referido MC__, ora recorrente, bem como as apreensões levadas a efeito pelo OPC e documentadas nos presentes autos.
([26]) Cf. neste preciso sentido SILVA, Germano Marques, Curso de Processo Penal, vol. II., Lisboa. Verbo – Babel, 5.ª ed., p. 356.  Ancorando-se no comentário de CHIAVARIO, Mario, Commento al Nuovo Codice de Procedura Penale, III, Turim, 1989, p. 52
([27]) Por roubos; condução de veículo em estado de embriaguez; ofensa à integridade física qualificada, crimes de detenção de arma proibida (cf. fls. 29 dos presentes autos). E, depois de detido foi ouvido em 1.º interrogatório judicial de arguido em 04-fev.-2022, onde estava indiciado por crime de tráfico de estupefacientes então tido por de “menor gravidade”, da previsão do art.º 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22-jan. (cf. fls. 30 dos presentes autos).
([28]) Na verdade, face à globalidade da prova indiciária para estes autos carreada (cf. no que ora releva, o Auto de inquirição da testemunha João Silva de fls. 675-676 dos presentes autos (vol. 2.º) e da testemunha JS___  - fls. 3239-3240 dos autos principais) permanecendo o arguido/recorrente em ampla liberdade nada impede que o arguido possa perturbar o inquérito, a instrução ou julgamento, maxime atemorizando ou subornando testemunhas alegados consumidores de produtos estupefacientes por este vendidos diretamente no estabelecimento comercial em causa.
([29]) Alterado pelo artigo 11.º da Lei n.º 94/2021 - DR n.º 245/2021, Série I de 21-dez.-2021, em vigor a partir de 21-mar.-2022.
([30]) Cf. Auto de interrogatório judicial de arguido detido, maxime fls. 21 dos presentes autos (fls. 3284 dos autos principais)
([31]) Assim: SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal, Vol. II, 5.ª ed., Lisboa, Editorial Verbo - Babel, 2011, pp. 359-360.
([32]) Cf. neste sentido o sentenciado no Ac. do TRL de 16-nov.-2005 (Carlos Almeida) proc. 8382/2005 -3.ª
([33]) Vide sobre este concreto ponto o estudo do saudoso Professor Augusto Silva Dias, “ A prisão preventiva após a revisão de 2007 do Código de Processo Penal foi superada a crise?. Estudos em honra do Professor Doutor José de Oliveira Ascensão, II Vol., 2008, Coimbra: Almedina pp. 1392-1393
([34]) Curso de Processo Penal, II vol., 3.ª ed. Verbo p. 217.
([35]) Cf. Acs. do Tribunal Constitucional n.ºs 426/91, de 06-nov.-1991, DR II Série, n.º 78, de 02-abr.-1992, e BMJ 411.º/56 e 441/94, de 07-jun.-1994, DR II Série, n.º 249, de 27-out.-1994.
([36]) Cf., neste sentido, o Ac. do STJ de 03-out.-2007 (Santos Monteiro), proc. 2271/07. 
([37]) Cf. neste sentido o Ac. do STJ de 08-mar.-1990, in CJ, XV-I-35. 
([38]) Cf. a alínea a), do n.º 1 do referido art.º 202.º do Código de Processo Penal. 
([39]) SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal, Editorial Verbo, vol. II, 3.ª ed. 2002, p. 261.
([40]) In ob. cit. vol. II, 3.ª ed., p. 262.
([41]) Cf. alínea m) do art.º 1.º do Código de Processo Penal, que integra o crime de tráfico de estupefacientes na criminalidade altamente organizada
([42]) SILVA, Germano Marques da, in ob. cit. vol. cit. p. 205.