Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ADEODATO BROTAS | ||
Descritores: | PROCESSO DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO CONFIANÇA COM VISTA A FUTURA ADOPÇÃO SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 03/20/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | (art.º 663º nº 7 do CPC) 1- A parentalidade biológica, desprovida dos seus factores típicos e inerentes, como o amor, o carinho, os cuidados, a atenção, a disponibilidade, o empenho, a preocupação, o acompanhamento dos filhos, não pode ser considerada relação familiar sã e equilibrada, mas antes lesiva dos interesses da criança. 2- A criança está em perigo, quando não recebe os cuidados ou afeição adequados á sua idade e situação pessoal, quando é sujeita a comportamentos que afectam o seu equilíbrio emocional. 3- O desinteresse pelos filhos decorre do comportamento contrário estar interessado nos filhos. É a atitude de falta de cuidado e de atenção para com tudo o que lhes diga respeito. Releva, para o aferir, a interacção entre pais e filhos, a qualidade dos contactos entre eles em termos de afectividade: se a interacção é básica e passiva, traduzindo-se num mero “cumprimento de horário”, ou se é desadequada face à idade da criança, consubstancia desinteresse pela criança. 4- Protelar a efectivação da medida de confiança a instituição com vista a futura adopção, dando-se outra oportunidade aos pais que já demonstraram, bastamente, que não têm condições para os criar o filho, implicaria um arrastamento da vida de incerteza do menor, arruinando-lhe a oportunidade de crescer numa família funcional. 5- A expectativa de reversão de comportamento dos pais, deve ser afastada nos casos, como o dos autos, em que os progenitores, durante toda a vida da criança, se mostraram incapazes de cuidar dela, apesar das oportunidades que lhes foram dadas: o Superior Interesse da Criança assim obriga. 6- O Princípio do Superior Interesse da Criança funciona, pois, como critério basilar de interpretação e aplicação da medida de confiança com vista a futura adopção, constituindo mesmo o elemento principal de orientação do juiz na ponderação e decisão do caso concreto. 7- Esse Princípio permite aferir se em determinada situação concreta o “corte” definitivo das relações afectivas entre pais e criança estará a violar o direito da criança à manutenção das relações afectivas com os progenitores, ou a proteger-lhe o direito a um são e equilibrado desenvolvimento a nível da saúde, formação e educação. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os juízes desembargadores que compõem este colectivo da 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: I- RELATÓRIO 1- O Ministério Público, a 25/07/2023, instaurou processo de promoção e protecção, a favor do menor VS, nascido a 01/01/2023, filho de VBS e de MPC, promovendo a aplicação da medida de acolhimento residencial do menor. Alegou que o menor, à nascença foi sinalizado pelo Serviço de Obstetrícia por má vigilância na gravidez, tendo a criança sido acolhida no CAR “O Caminho” com a autorização da progenitora, a 21-07-2023, quer por a progenitora não assegurar os cuidados de saúde, quer devido à inconstância habitacional da progenitora e exposição às suas sucessivas relações amorosas, bem como aos consumos de estupefacientes da mãe e tio materno e às práticas de mendicidade da mãe. 2- Após remessa ao MP do processo de promoção e proteção que corria termos na CPCJ, por incumprimento reiterado, veio a ser aplicada a título cautelar e provisório, por 3 meses, por decisão judicial de 26-07-2023, medida de acolhimento provisório no Centro de Acolhimento “O Caminho”. 3- Por decisão de 08/08/2023, com anuência dos progenitores, foi prorrogada a medida de acolhimento por mais 3 meses. 4- Por decisão de 27/10/2023, foi prorrogada, por mais três meses, até 17/04/2024, a medida de acolhimento residencial Foi nomeado patrono ao menor. 5- Em debate judicial de 14/11/2023 foi obtido Acordo de Promoção e Protecção de Medida de Acolhimento Residencial, com o seguinte teor: “1 - O menor VS, nascido a 07-01-2023, mantém-se à guarda e cuidados da CAR - “O Caminho”, que será responsável por assegurar-lhe as necessidades básicas de alimentação, saúde, vestuário, higiene e afetivas. 2 - Durante a execução da medida o menor terá convívios com o avô TS e a sua companheira RC, aos fins de semana entre as 18h00 de sexta-feira e as 18h00 de domingo, sendo o transporte do menor assegurado pelo avô TS, sendo este agregado acompanhado nestes períodos pela Equipa de Integração Familiar, em vista à avaliação da dinâmica familiar e capacitação destas figuras enquanto cuidadores responsivos às necessidades de estimulação do menor. 3 - A progenitora manterá o acompanhamento na Arrisca ao nível das dependências, devendo realizar testes de despiste. 4 - Durante o acolhimento residencial o menor poderá receber visitas do avô TS e de RC, da progenitora e ainda poderá ser contactado pela avó materna e pelo progenitor, através de videochamada, 5 - A medida terá a duração de 6 meses, devendo, contudo, ser revista antecipadamente caso a EMAT entenda que estão reunidas a as condições para a reunificação familiar, sendo a sua execução da responsabilidade da EMAT, que remeterá ao processo relatório de revisão da medida em 5 meses, sem prejuízo da remessa aos autos de outras informações julgadas relevantes e oportunas.” 6- O avô materno foi cumprindo o regime de visitas ao menor, com ida deste a casa daquele, aos fins de semana e em dias festivos. 7- A 16/04/2024, por carta, o progenitor, a cumprir pena no Estabelecimento Prisional, manifestou a sua vontade de manutenção da medida de Promoção e Protecção. 8- Por despacho de 14/05/2024, foi decidido: “…a substituição da medida de promoção e proteção de acolhimento residencial pela medida de apoio junto do avô materno do menor, TS, por mais seis meses, ou seja, até 14-11-2024, sem necessidade de realização de debate judicial, atenta a periferia da mãe na vida da criança e a adesão do progenitor à substituição da medida, mantendo-se a execução respetiva nos termos até aqui definidos, e continuando a EMAT a acompanhá-la, com apresentação de relatório, sem prejuízo de outras informações relevantes e oportunas.” 9- Por informação da EMAT/ISSA, de 01/08/2024, foi dado a conhecer que o avô materno abandonou o lar onde residia com o menor, por desentendimentos com a companheira. Mais informou que o próprio avô materno comunicou que não tem condições para ficar com o neto e, por isso, declarou pretender que a criança volte para a Casa de Acolhimento. Informou, ainda, que o menor foi colocado na Casa de Acolhimento, O Caminho. 10- Por decisão de 09/09/2024, foi determinado: “…aplica-se ao menor VS, filho de VBS e de MPC, nascido a 7 de Janeiro de 2022, a medida cautelar de acolhimento residencial, e em concreto no Centro de Acolhimento Residencial “O Caminho”, onde a criança já se encontra acolhida. A medida cautelar terá o prazo máximo de 6 (seis) meses, com revisão passado um máximo de 3 (três) meses.” 11- Com data de 07/11/2024, atendendo à informação da EMAT/ISSA, foi decidido: “…se determina sejam nomeados patronos a cada um dos progenitores, e após seja dado cumprimento ao disposto no artigo 114º/1 da LPCJP, mantendo-se o menor, até lá, sem exceder os 3 meses, sujeito á medida provisória de acolhimento residencial, nos termos do disposto nos artigos 35º, n.º 1, al. f), e 37º da LPCJP, por inexistência de outra alternativa familiar ao acolhimento residencial.” 12- Foram apresentadas alegações pelo Ministério Público, pugnando pela aplicação da medida de confiança a instituição com vista a futura adopção. O progenitor pronunciou-se no sentido da manutenção da medida aplicada. 13- Teve lugar debate judicial. 14- Com data de 17/01/2025, foi proferido acórdão, com o seguinte teor decisório: “Em face do exposto, decide-se: 1. - Aplicar ao menor VS, nascido a 01-01-2023, filho de VBS e de MPC, a medida de acolhimento residencial na Casa de Acolhimento Residencial «O Caminho», com vista a futura adoção, nos termos dos artigos 35.º, n.º 1; al g), 38.º e 38º-A da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo e 1978.º do Código Civil. 2. - Nomeia-se a Dra. JPM curadora provisória da menor, enquanto esta permanecer acolhida na Casa de Acolhimento Residencial «O Caminho»; 3. -As técnicas sociais da instituição darão conta nos autos de todos os factos importantes relacionados com a execução da presente decisão, devendo o ISSA — Equipa de Adoção informar do estado de processo com a periodicidade de 3 meses (cf. artigo 42º, n.º 1, do Regime Jurídico do processo de Adoção); 4. - Determina-se ainda que o Serviço de Adoções do Instituto de Segurança Social dos Açores comunique aos autos, logo que selecionado, o casal adotante ou candidato singular, para nomeação como curadores provisórios, tudo nos termos dos artigos 62º-A n.º 2 da LPCJP e. artigo 51º n.º 3, do RJPA. 5. - Mais se decide proibir as visitas dos familiares e decretar-se ainda a inibição do exercício as responsabilidades parentais relativamente aos progenitores, comunicando-se oportunamente à Conservatória do Registo Civil para efeitos de registo — artigos 1978º-A) e 1920º-B alínea d), ambos do Cód. Civil, na redação introduzida pela Lei 31/2003 de 22-08.” 15- Inconformados, os progenitores interpuseram o presente recurso, apresentando as seguintes CONCLUSÕES: 1. A medida de confiança a instituição com vista à adoção aplicada, e a consequente proibição de visitas dos progenitores se revelar desadequada a promover o direito a um são desenvolvimento do menor, mormente no respeitante à manutenção dos laços que a prendem aos seus pais; 2. Na verdade; Não obstante se terem verificado incumprimentos por parte destes no que concerne à observância de medidas, ainda se pode e deverá conceder uma derradeira oportunidade aos progenitores, principalmente à mãe, em ordem a que o seu filho não lhe seja retirado. Com efeito; 3. Atentemos nos pontos 18 a 22 da fundamentação de facto do acórdão ora recorrido, verificamos que de fato foram efetuadas obras de melhoria na casa da progenitora, o que demonstra a tentativa da mesma em criar condições de habitação para poder acolher o filho VS, o que fez dentro das suas possibilidades económicas, estando neste momento a tratar de a equipar a mesma com eletrodomésticos (já solicitados à ação social), e encontra-se abstinente do consumo de drogas. A progenitora garantiu que assim que o menor lhe for entregue tratará de assegurar roupas, brinquedos e alimentação adequada ao menor. O pai solicitou um ano para poder organizar a sua vida de forma a ter o menor consigo, já que saiu do Estabelecimento Prisional apenas em 02/05/2024; 4. O Tribunal recorrido não andou bem aplicar ao menor VS, a medida de confiança a instituição com vista à adoção, sem conceder mais uma oportunidade aos progenitores de continuar a desenvolver, como vêm desenvolvendo as suas capacidades de assumir correcta e plenamente os seus deveres parentais, com vista a um futuro regresso do menor à vivência diária com os mesmos; 5. Daqui resultando a oposição dos requeridos ora recorrentes, à manutenção do acolhimento residencial aplicado ao menor seu filho; 6. No entender dos recorrentes não fez o tribunal correcta interpretação e aplicação do disposto nos artigos 35º, nº 1, alínea g), e 38º - A, da LPCJP e artigo 1978.º do Código Civil, que violou. Nestes termos e nos melhores de direito e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas. deve ser substituída a medida de acolhimento residencial na Casa de Acolhimento Residencial “O caminho”, com vista a futura adoção aplicada, pela medida de apoio junto dos progenitores nos termos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 35º da LPCJP, por a mesma se mostrar adequada a possibilitar ao menor VS um desenvolvimento harmonioso nos domínios físico, intelectual, no seio da família natural. 16- A Ilustre Patrona do menor veio contra-alegar, formulando as seguintes CONCLUSÕES: 1. O menor não pode deixar de se insurgir contra os fundamentos invocados nas doutas alegações, que mais não são, com o devido respeito, desprovidas de qualquer correspondência com a realidade e contrário ao superior interesse do menor. 2. Desde logo, se compulsarmos o elenco dos factos provados e os conjugarmos na sua íntegra, (e não apenas os pontos 18, 19, 20, 21 e 22, como pretendem os recorrentes) com o demais acervo probatório, facilmente chegamos á conclusão que os recorrentes não pretendem de todo ficar com o menor nem nunca se mobilizaram para criar qualquer projeto que pudesse vir a configurar um plano de vida para o menor, o que, aliás até ficou bem patente no dia da leitura do Acórdão, ao nem sequer comparecerem para conhecerem a medida que viria a ser aplicada ao menor. 3. Os Recorrentes pretendem mais uma oportunidade para continuar a desenvolver, como vêm desenvolvendo, as suas capacidades de assumir correta e plenamente os seus deveres parentais, com vista a um futuro regresso do menor à vivência diária com os mesmos, apesar de admitirem incumprimentos na observância das medidas. Esta é a pretensão dos progenitores, porém, pasma-se, e não se acredita! 4. Desde logo não se compreende qual o trabalho que vêm desenvolvendo para uma eventual reunificação familiar, como se o tempo da criança fosse o tempo dos pais ou como se o menor já não estivesse à espera dos progenitores a partir do momento em que nasceu, nada acontecendo, verdadeiramente, desde então! 5. Resulta cristalino do douto acórdão recorrido que todas as tentativas que foram sendo feitas pelas várias equipas sociais interdisciplinares junto da mãe em nada alteraram a vinculação entre o menor/progenitora, não existindo qualquer mobilização da mãe nesse sentido e muito menos do pai. 6. Os Recorrentes nunca quiseram verdadeiramente fazer parte de um plano de vida concreto para este menor, mantendo a ilusão vã de que precisam de mais tempo, continuando com o estilo de vida desestruturado, no caso do pai a viver numa carrinha, e no caso da mãe com historial de consumo de estupefacientes e a viver com um irmão consumidor de substâncias sintéticas, aliado à instabilidade das sucessivas relações amorosas da progenitora e até às práticas de mendicidade (Facto 2). 7. Já para não referir as dificuldades económicas, inexistência de suporte familiar e de condições de habitabilidade (no caso da figura paterna) e no caso da mãe a insalubridade e falta de segurança da habitação aliada à incapacidade de cuidar de uma criança de tenra idade, em tudo semelhante ao que já havia acontecido como filho mais velho que se encontra ao cuidados da avó materna. 8. Face ao exposto, e não havendo na família biológica mais ninguém disponível para em substituição dos pais assegurar os cuidados ao menor, e sendo os Recorrentes figuras completamente marginais à vida do menor, deve a sentença recorrida manter-se intocada, por ser a única forma adequada de garantir o superior interesse do menor. 9. Pelo exposto, nada há a apontar à douta sentença recorrida que, muito bem andou, ao aplicar ao menor, VS, a medida de acolhimento residencial na Casa de Acolhimento Residencial “O Caminho”, com vista a futura adoção, nos termos dos arts. 35º, nº 1, alínea g), 38 e 38º A da LPCJP. Pelo exposto, Deve ser negado provimento ao presente Recurso, mantendo-se inalterada e confirmada a decisão proferida em 1ª Instância. 17- O Ministério Público contra-alegou, apresentando as seguintes CONCLUSÕES: 1. O Ministério de Público, na salvaguarda do superior interesse das menores manifesta a integral concordância com o acórdão proferido nos presentes autos; 2. Como resulta da matéria de facto provada no douto acórdão proferido, o menor VS nasceu a 1-01-2023 e foi sinalizado à nascença pelo Hospital do Divino Espírito Santo – serviços de neonatologia, por má vigilância durante a gravidez, tendo sido acolhida na CAR «O Caminho», com a autorização da progenitora, a 21-07-2023; 3. A medida de promoção e protecção teve em atenção o facto de a mãe não assegurar os seus cuidados de saúde, a sua inconstância habitacional e exposição às suas sucessivas relações amorosas, bem como aos consumos de estupefacientes desta e tio materno, à atividade de tráfico de estupefacientes por parte do companheiro da mãe, e às práticas de mendicidade da figura materna; 4. Após o nascimento da criança esta viveu com a mãe e com o seu companheiro LPM, tendo entretanto ido viver com o avô materno, mas a 15-02-2023 já havia mudado a sua residência para casa na …, estando, a 07-03-2023, a morar com a criança na Rua da …, Fenais da Ajuda, em casa da mãe do namorado, regressando posteriormente para a … (onde viveu com o irmão e o companheiro, ambos toxicodependentes), nunca tendo reportado as alterações de residência às entidades de primeira linha de proteção da infância, que acompanhavam o menor VS, designadamente ao Núcleo de Ação Social da Ribeira Grande e à CPCJ de Ponta Delgada. 5. O irmão uterino do menor WBM foi confiado à guarda e cuidados da avó materna, no âmbito do processo principal, por aos cuidados da progenitora ser exposto a consumos de estupefacientes e álcool e aos hábitos de mendicidade da figura materna, e além disso encontrar-se entregue a si próprio, sendo visto muitas vezes à janela da sua casa a pedir comida às pessoas que passavam na rua porque «tinha fome», não assegurando a figura materna a assiduidade escolar do menino, nem a higiene habitacional, apresentando a habitação da progenitora aquando da visita da EMAT um cheiro nauseabundo, e nela albergando a progenitora um namorado, conhecido na comunidade como toxicodependente e associado ao tráfico de drogas, tendo ainda a criança sido exposta e vítima de agressões físicas na cabeça, nomeadamente na zona do olho e na zona da fonte a 03-04-2022, pelas 00h10m, data em que foi retirada à progenitora; 6. Aquando do seu primeiro acolhimento na CAR «O Caminho» o menor VS estava pouco estimulado, mas ao longo do acolhimento evoluiu muito bem em termos de desenvolvimento pessoal e social; 7. A sua progenitora desinvestiu nos contactos e visitas, não comparecendo em visitas que previamente agenda, sem apresentar justificação, encontrando-se a figura paterna privada da liberdade. 8. A avó materna do menor, residente em Leiria, revelou-se indisponível para acolher o neto, por já ter outro neto, filho de VBS, o WBM, aos seus cuidados e, se inicialmente o menor VS foi visitado com alguma regularidade pelo avô materno TS, e sua namorada RC. 9. Após estabelecimento de convívios em meio natural de vida com estes, a criança foi confiada ao avô materno a 14-05-2024, no âmbito de medida de apoio junto de familiar, aplicada pelo período de 6 meses; 10. No entanto o avô materno desinvestiu na prestação de cuidados à criança, revelando lacunas no que à alimentação e cuidados de saúde diz respeito, tendo após ruptura do relacionamento com RC abandonado o domicílio do casal, deixando a criança atrás, passando a viver com a filha VBS, admitindo não ter condições para ficar com o neto, nem a habitação da filha VBS ter condições para acolher o VS, o que determinou o regresso de VS ao acolhimento residencial na CAR «O Caminho», com a anuência de todos os intervenientes; 11. A 09-08-2024 foi novamente aplicada ao menor VS a medida de promoção e proteção de acolhimento residencial, a título cautelar e provisório, por 3 meses, medida revista e mantida por mais 3 meses a 7-11-2024. 12. Quando foi acolhido pela segunda vez a criança VS mostrava-se triste, assustadiço, apático e menos sociável e com lacunas na sua higiene, unhas sujas, assadura na zona genital e um odor corporal desagradável. 13. Entre 21-07-2023 e 14-05-2024 a figura materna manteve o quadro socioeconómico pautado por fragilidades, mantendo, a par do irmão e o companheiro (este falecido, por suicídio em fevereiro de 2024), o consumo de drogas sintéticas, estando o companheiro, em vida, associado ao tráfico de drogas sintéticas; 14. A progenitora está abstinente do consumo de drogas sintéticas desde setembro de 2024, mas admite consumos de THC, tendo retomado ao acompanhamento na ARRISCA, subsistindo com o irmão, com quem vive na …, o qual mantém consumos de drogas sintéticas, do Rendimento Social de Inserção, no valor mensal de 403,33€; 15. A casa da progenitora, apesar de ter sido melhorada com a transformação do hall em sala, continua a carecer de obras de requalificação (o chão é de cimento e entra vento no telhado), emitindo um forte odor a esgotos, carecendo o espaço destinado à cozinha de maior limpeza e organização (paredes e tachos pretos), apresentando o piso superior, onde se encontram os quartos, deficiente isolamento na porta, tendo a casa estado privada de luz elétrica durante cerca de 6 meses, fornecimento que foi reposto apenas em dezembro de 2024, por insistência da técnica do NAS; 16. Além disso carece de ser equipada com eletrodomésticos, que serão fornecidos sem custos pela ação social, sendo que a progenitora apenas dispõe de um berço para bebé, e não roupas e outros produtos, estado o berço cheio de amontoado de roupa; 17. O pai da criança, em liberdade condicional desde o dia 02-05-2024 (cujo termo se prevê a 15-06-2025), apenas visitou o filho uma vez, a 22-09-2024, comparecendo na CAR acompanhado da mãe da criança, e contactou a CAR apenas uma vez, a 14 de agosto; 18. Além disso vive numa carrinha, que estacionou num terreno de sua propriedade, onde no futuro retende construir uma habitação, subsistindo de trabalhos de pedreiro, estando neste momento vocacionado para a aquisição de ferramentas que lhe permitam desenvolver esta atividade e manifesta a intenção de ficar com o filho aos seus cuidados, para o que, segundo o próprio, necessita de um ano para criar condições para tal, as quais não reúne atualmente; 19. Apesar de receber RSI, e de lhe ser concedido banco alimentar, a progenitora despende parte deste valor em bilhetes de autocarro para a «R...», local associado ao tráfico de estupefacientes, em vez de canalizar estes recursos para visitas ao filho na CAR, nunca tendo pedido apoio financeiro para efetuar visitas mais frequentes ao filho VS; 20. Com efeito, apesar de ter agendado 5 visitas em agosto de 2024 apenas compareceu a duas (dias 7 e 11), em setembro de 2024 concretizou duas visitas (10 e 22), em outubro de 2024 agendou 3 visitas, mas só concretizou uma (dia 3), em novembro agendou 5 visitas e realizou 3 e em dezembro realizou as duas visitas agendadas, e em janeiro de 2025 não compareceu na visita que agendou; 21. Nas visitas dos pais a criança furta-se ao contacto com qualquer um dos pais, requerendo sempre a atenção das cuidadoras, e não se refere à figura materna como «mãe», a qual não interage com a criança, mediante o recurso a brinquedos ou brincadeiras. 22. A progenitora considera ter condições para o filho ser reunificado consigo, na medida em que, na sua perspetiva «fez tudo o que pediram», a saber: deixou de consumir drogas sintéticas e pôs o fornecimento de energia elétrica em casa; 23. O menor VS após o segundo acolhimento, em menos de um mês de acompanhamento na CAR evoluiu positivamente em termos emocionais e de interação; 24. Os progenitores da criança assumiram que iriam aderir a vários programas de natureza terapêutica, alteração comportamental e reforço de competências parentais, tendo ainda sido atribuída a comparticipação, através de acção social, nos custos dos transportes para poderem visitar a criança na instituição onde se encontrava; 25. No entanto, temos assistindo desde o início da intervenção no âmbito do presente processo (que dura quase há dois anos) a atitudes sucessivas de incumprimento que têm obstado a que todas as ajudas de natureza social, terapêutica, de alteração comportamental de que que beneficiaram, lograssem ter resultados positivos e permitir equacionar a reunificação familiar; 26. As atitudes de demissão dos progenitores para alterar as situações geradoras de perigo para a criança têm-se mantido. 27. A par desta atitude tem-se verificado um decréscimo gradual das visitas efectuadas por ambos à criança na instituição sendo que a justificação dada para tal (uso por parte da progenitor das verbas disponibilizadas pela acção social para aquisição de produto estupefaciente) apenas vem reforçar tudo o que vem sido dito em relação ao não investimento dos pais na mudança da situação que determinou o acolhimento institucional das menores; 28. Não se vislumbra que os progenitores alterem as atitudes de incumprimento e inviabilização da aplicação das medidas que permitiriam manter os laços familiares; 29. O tempo próprio das crianças e o seu projecto de vida futuro (no sentido de lhes assegurar-lhe um desenvolvimento integral pleno sadio no seio de uma família estável e securizante), não se compadece com a “eterna” espera de uma efectiva adesão às oportunidades que lhes foram dadas e mudança pelos progenitores nas atitudes de incumprimento e desinvestimento no projecto de vida da criança que revelam; 30. Apesar dos argumentos expendidos nas alegações entendemos que perante as sucessivas atitudes demissionárias dos pais em relação à prestação de cuidados básicos de saúde, alimentação, higiene, habitação e a incapacidade de criarem condições para cuidarem a criança as menores se encontram seriamente comprometidos os vínculos afectivos da filiação; 31. Não sendo conhecidas alternativas no seio da família alargada que reúnam condições pessoais, materiais e idoneidade para acolher as menores, acompanhamos na íntegra a decisão proferida no acórdão recorrido; 32. Assim, o projecto de vida do VS, com vista ao seu sadio e são desenvolvimento e ao seu superior interesse passa pela aplicação às mesmas da medida de acolhimento em instituição com vista a futura adoção, conforme artigo 35º, alínea g) nº1; 38º e 38º A da LPCJP e 1978º do Código Civil; Pelo que, mantendo o acórdão recorrido nos exactos moldes em que foi proferido. *** II- FUNDAMENTAÇÃO. 1- Objecto do Recurso. 1-É sabido que o objecto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (art.º 635º nº 2 do CPC) pelas conclusões (artºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 640º do CPC) pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e, ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida. Assim, em face das conclusões apresentadas pelos recorrentes, é a seguinte a questão que importa analisar e decidir: - Se há fundamento para revogar a decisão em termos de determinar a aplicação de medida de apoio junto dos progenitores. *** 2- Fundamentação de Facto. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos, não impugnados: 1. - VS nasceu a 1-01-2023, e é filho de VBS e de MPC; 2. — O menor foi sinalizado à nascença pelo Hospital do Divino Espírito Santo — serviços de neonatologia, por má vigilância durante a gravidez, tendo a criança sido acolhida na CAR «O Caminho», com a autorização da progenitora, a 21-07-2023, em virtude desta não assegurar os seus cuidados de saúde, e também devido à inconstância habitacional da progenitora e exposição às suas sucessivas relações amorosas, bem como aos consumos de estupefacientes da mãe e tio materno, à atividade de tráfico de estupefacientes por parte do companheiro da mãe, e às práticas de mendicidade da figura materna; 3. — Com efeito, a progenitora após o nascimento da criança viveu com esta e com o seu companheiro LPM, numa casa da …, tendo entretanto ido viver com o avô materno da criança, na Rua da …, mas a 15-02-2023 já havia mudado a sua residência para casa na …, estando, a 07-03-2023, a morar com a criança na Rua …, em casa da mãe do namorado, regressando posteriormente para a …(onde viveu com o irmão e o companheiro, ambos toxicodependentes); 4. — A progenitora não comunicou as alterações de residência referidas em 3), às entidades de primeira linha de proteção da infância, que acompanhavam o menor VS, designadamente ao Núcleo de Ação Social da Ribeira Grande e à CPCJ de Ponta Delgada; 5. — Face ao historial de consumos de estupefacientes a progenitora foi encaminhada pela CPCJ de Ponta Delgada para a «ARRISCA», não sendo assídua nessa entidade; 6. — A progenitora não compareceu com o menor na consulta de saúde infantil dos 6 meses, o que foi comunicado à CPCJ de Ponta Delgada pela enfermeira da … a 12-07-2023, havendo notícia de que então a figura materna andava a pedir dinheiro na freguesia para comprar leite para a criança, aparentando magreza devido ao consumo de estupefacientes; 7. — O companheiro da progenitora estava conotado com o tráfico de estupefacientes; 8. — O irmão uterino do menor WBM foi confiado à guarda e cuidados da avó materna, no âmbito do processo principal, por aos cuidados da progenitora ser exposto a consumos de estupefacientes e álcool e aos hábitos de mendicidade da figura materna, e além disso encontrar-se entregue a si próprio, sendo visto muitas vezes à janela da sua casa a pedir comida às pessoas que passavam na rua porque «tinha fome», não assegurando a figura materna a assiduidade escolar do menino, nem a higiene habitacional, apresentando a habitação da progenitora aquando da visita da EMAT um cheiro nauseabundo, e nela albergando a progenitora um namorado, conhecido na comunidade como toxicodependente e associado ao tráfico de drogas, tendo ainda a criança sido exposta e vítima de agressões físicas na cabeça, nomeadamente na zona do olho e na zona da fonte a 03-04-2022, pelas 00h10m, data em que foi retirada à progenitora; 9. — Aquando do seu primeiro acolhimento na CAR «O Caminho» o menor VS estava pouco estimulado, mas ao longo do acolhimento evoluiu muito bem em termos de desenvolvimento pessoal e social; 10. — A sua progenitora desinvestiu nos contactos e visitas, não comparecendo em visitas que previamente agenda, sem apresentar justificação, encontrando-se a figura paterna provada da liberdade; 11. — A avó materna do menor, residente em Leiria, revelou-se indisponível para acolher o neto, por já ter outro neto, filho de VBS, o WBS, aos seus cuidados; 12. — Inicialmente o menor VS foi visitado com alguma regularidade pelo avô materno TS, e sua namorada RC, e após estabelecimento de convívios em meio natural de vida com estes, a criança foi confiada ao avô materno a 14-05-2024, no âmbito de medida de apoio junto de familiar, aplicada pelo período de 6 meses; 13.- Porém, o avô materno desinvestiu na prestação de cuidados à criança, revelando lacunas no que à alimentação e cuidados de saúde diz respeito, tendo após rutura do relacionamento com RC abandonado o domicílio do casal, deixando a criança atrás, passando a viver com a filha VBS, admitindo não ter condições para ficar com o neto, nem a habitação da filha VBS ter condições para acolher o VS, o que determinou o regresso de VS ao acolhimento residencial na CAR «O Caminho», com a anuência de todos os intervenientes; 14. - A 09-08-2024 foi novamente aplicada ao menor VS a medida de promoção e proteção de acolhimento residencial, a título cautelar e provisório, por 3 meses, medida revista e mantida por mais 3 meses a 7-11-2024; 15. — Quando foi acolhido pela segunda vez a criança VS mostrava-se triste, assustadiço, apático e menos sociável e com lacunas na sua higiene, unhas sujas, assadura na zona genital e um odor corporal desagradável; 16. —Entre 21-07-2023 e 14-05-2024 a figura materna manteve o quadro socioeconómico pautado por fragilidades, mantendo, a par do irmão e o companheiro (este falecido, por suicídio em fevereiro de 2024), o consumo de drogas sintéticas, estando o companheiro, em vida, associado ao tráfico de drogas sintéticas. 17. — A progenitora está abstinente do consumo de drogas sintéticas desde setembro de 2024, admitindo consumos de THC, tendo retomado ao acompanhamento na ARRISCA, subsistindo com o irmão, com quem vive na …, o qual mantém consumos de drogas sintéticas, do Rendimento Social de Inserção, no valor mensal de 403,33€; 18. — A casa da progenitora, apesar de ter sido melhorada com a transformação do hall em sala, continua a carecer de obras de requalificação (o chão é de cimento e entra vento no telhado), emitindo um forte odor a esgotos, carecendo o espaço destinado à cozinha de maior limpeza e organização (paredes e tachos pretos), apresentando o piso superior, onde se encontram os quartos, deficiente isolamento na porta, tendo a casa estado privada de luz elétrica durante cerca de 6 meses, fornecimento que foi reposto apenas em dezembro de 2024, por insistência da técnica do NAS, mas carecendo de ser equipada com eletrodomésticos, que serão fornecidos sem custos pela ação social; 19. — Em casa a progenitora apenas dispõe de um berço para bebé, e não roupas e outros produtos, estado o berço cheio de amontoado de roupa; 20. — O pai da criança, em liberdade condicional desde o dia 02-05-2024 (cujo termo se prevê a 15-06-2025), apenas visitou o filho uma vez, a 22-09-2024, comparecendo na CAR acompanhado da mãe da criança, e contactou a CAR apenas uma vez, a 14 de agosto; 21. — Vive numa carrinha, que estacionou num terreno de sua propriedade, onde no futuro pretende construir uma habitação, subsistindo de trabalhos de pedreiro, estando neste momento vocacionado para a aquisição de ferramentas que lhe permitam desenvolver esta atividade; 22.- Pretende ficar com o filho aos seus cuidados, para o que, segundo o próprio, necessita de um ano para criar condições para tal, as quais não reúne atualmente; 23. — Apesar de receber RSI, e de lhe ser concedido banco alimentar, a progenitora despende parte deste valor em bilhetes de autocarro para a «R...», local associado ao tráfico de estupefacientes, em vez de canalizar estes recursos para visitas ao filho na CAR, nunca tendo pedido apoio financeiro para efetuar visitas mais frequentes ao filho VS; 24. — Assim, a mãe da criança agendou 5 visitas em agosto de 2024, e compareceu a duas (dias 7 e 11); em setembro de 2024 concretizou duas visitas (10 e 22); em outubro de 2024 agendou 3 visitas, mas só concretizou uma (dia 3); em novembro agendou 5 visitas e realizou 3; em dezembro realizou as duas visitas agendadas, e em janeiro de 2025 não compareceu na visita que agendou; 25. - Aquando das visitas dos pais a criança furta-se ao contacto com qualquer um dos pais, requerendo sempre a atenção das cuidadoras, e não se refere à figura materna como «mãe», a qual não interage com a criança, mediante o recurso a brinquedos ou brincadeiras; 26. — O menor VS após o segundo acolhimento, em menos de um mês de acompanhamento na CAR evoluiu positivamente em termos emocionais e de interação; 27.- A progenitora considera ter condições para o filho ser reunificado consigo, na medida em que, na sua perspetiva «fez tudo o que pediram», a saber: deixou de consumir droga sintéticas e repôs o fornecimento de energia elétrica em casa. *** 3- A Questão Enunciada: Se há fundamento para revogar a decisão em termos de determinar a aplicação de medida de apoio junto dos progenitores. Os apelantes, defendem que a medida de promoção e protecção aplicada - confiança do menor a instituição com vista a futura adopção – não promove o direito da criança a um são desenvolvimento no que respeita à manutenção de laços que o prende aos pais, devendo conceder-se uma derradeira oportunidade aos progenitores em ordem a que o filho não lhes seja retirado. Dizem que a mãe deixou o consumo de drogas e fez significativas melhorias na habitação. Será assim? Pois bem, em primeiro lugar importa ter presente a Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei 147/99, de 1/09), doravante LPCJP. De acordo com o art.º 3º da LPCJP, relativo à legitimidade da intervenção do Estado: “A intervenção para promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo tem lugar quando os pais (…) ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento (…). 2 - Considera-se que a criança ou o jovem está em perigo quando, designadamente, se encontra numa das seguintes situações: a) Está abandonada ou vive entregue a si própria; b) Sofre maus tratos físicos ou psíquicos ou é vítima de abusos sexuais; c) Não recebe os cuidados ou a afeição adequados à sua idade e situação pessoal; d) Está aos cuidados de terceiros, durante período de tempo em que se observou o estabelecimento com estes de forte relação de vinculação e em simultâneo com o não exercício pelos pais das suas funções parentais; e) (…) f) Está sujeita, de forma direta ou indireta, a comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional; (…)”. A intervenção para promoção dos direitos e protecção da criança obedece aos princípios, entre outros, de Superior Interesse da Criança e Intervenção Precoce (art.º 4º, als. a) e c) da LPCJP. Uma das medidas de intervenção com vista à promoção e protecção é a de confiança a instituição com vista à adopção (art.º 35º nº 1, al. g) da LPCJP). A medida de confiança a instituição com vista a futura adopção é aplicável quando se verifiquem algumas das situações previstas no art.º 1978º do CC (art.º 38º-A da LPCJP). Nos termos do art.º 1978º do CC: “1 - O tribunal, no âmbito de um processo de promoção e proteção, pode confiar a criança com vista a futura adoção quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação, pela verificação objetiva de qualquer das seguintes situações: a) Se a criança for filha de pais incógnitos ou falecidos; b) Se tiver havido consentimento prévio para a adopção; c) Se os pais tiverem abandonado a criança; d) Se os pais, por ação ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança; e) Se os pais da criança acolhida por um particular, por uma instituição ou por família de acolhimento tiverem revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos, durante, pelo menos, os três meses que precederam o pedido de confiança. 2 - Na verificação das situações previstas no número anterior, o tribunal deve atender prioritariamente aos direitos e interesses da criança. 3 - Considera-se que a criança se encontra em perigo quando se verificar alguma das situações assim qualificadas pela legislação relativa à proteção e à promoção dos direitos das crianças. (…)”. Antes de entrarmos na análise dos requisitos legais relativos à medida de confiança a instituição com vista a futura adopção, convém recordar que a medida prevista no art.º 38º-A da LPCJP, harmoniza-se com o art.º 20º da Convenção dos Direitos da Criança que determina que “A criança temporária ou definitivamente privada do seu ambiente familiar ou que, no seu interesse superior, não possa ser deixada em tal ambiente tem direito á protecção e assistência especiais do Estado”. Impõe-se, ainda, ter presente o Princípio do Superior Interesse da Criança, que funciona como critério basilar de interpretação e aplicação da medida de confiança com vista a futura adopção, constituindo mesmo o elemento principal de orientação do juiz na ponderação e decisão do caso concreto, aplicando ou afastando a medida. Com efeito, esse Princípio do Superior Interesse da Criança permite aferir se em determinada situação concreta o “corte” definitivo das relações afectivas entre pais e crianças estará a violar o direito da criança à manutenção das relações afectivas com os progenitores, ou a proteger-lhe o direito a um são e equilibrado desenvolvimento a nível da saúde, formação e educação. Na verdade, o pedido, ao tribunal, de confiança da criança a instituição com vista a futura adopção, – recorde-se que nos termos do art.º 36º nº 6 da CRP somente mediante decisão judicial os filhos podem ser separados dos pais – tem, por regra, subjacente uma situação de conflito entre os interesses da criança e os interesses dos pais. E, perante esse conflito, à luz daquele Princípio, os Interesses da criança têm de ser prioritariamente protegidos face aos interesses dos pais. Deste modo, quando a família biológica é disfuncional, a ponto de comprometer os vínculos afectivos da criança e os interesses/direitos desta a um desenvolvimento equilibrado, o juiz tem de dar primazia ao interesse da criança, que é considerado Superior aos dos pais biológicos. Percebe-se porquê: a parentalidade biológica, desprovida dos seus factores típicos e inerentes, como o amor, o carinho, os cuidados, a atenção, a disponibilidade, o empenho, a preocupação e o acompanhamento dos filhos, não pode ser considerada relação familiar sã e equilibrada, mas antes lesiva dos interesses da criança. Assim, a preocupação dos juízes terá de centrar-se na busca de uma solução e de um projecto de vida para criança que lhe proporcione um desenvolvimento o mais harmonioso possível e que corresponda ao seu Superior Interesse. Isto mesmo que o juiz tenha de decidir que essa solução passa por um projecto de vida fora da relação biológica, se e quando a relação parental se mostrar inexistente, seriamente prejudicial ou violadora do frágil desenvolvimento harmonioso da Criança. Para isso, impõe-se ao juiz sopesar, com rigor e objectividade – análise desprovida de subjectivismos, de vivências e da sociabilização do juiz – as circunstâncias da concreta vida da criança, com enfoque nas suas necessidades de desenvolvimento equilibrado, aferindo as suas necessidades de segurança, saúde física e psíquica, a sua alegria, bem-estar e educação. Dito isto, passemos à análise dos requisitos estabelecidos pelo art.º 1978º dos CC, relativos à medida de confiança a instituição com vista a adopção. Pois bem, no caso dos autos irrelevam as previsões das alíneas a) e b) do art.º 1978º nº 1 do CC: ser a criança filha de pais incógnitos ou falecidos, ou ter havido consentimento para a adopção. Assim, interessa a análise dos restantes requisitos. O proémio do nº 1 do art.º 1978º do CC. A lei refere, no proémio do nº 1, a inexistência ou o sério comprometimento dos vínculos afectivos próprios da filiação, mencionando/enumerando critérios objectivos dessa inexistência ou comprometimento sério dos vínculos inerentes/típicos da filiação. Trata-se de critérios objectivos porque para a sua verificação não releva a culpa dos pais na quebra ou inexistência desses vínculos (Cf. Sara Caçador, Abordagem Teórico-Prática da Intervenção do Tribunal na Aplicação da Medida de Confiança Judicial Com Vista a Futura Adopção, Tese de Mestrado, UCP 2012, edição online, pág. 15). E embora não se possa considerar pressuposto comum a todas as alíneas do art.º 1978º nº 1 do CC, porque desde logo, por natureza, está afastado das situações previstas nas alíneas a), b) e c) desse normativo, ainda assim, nas demais situações, carece de prova autónoma (cf. Pereira Coelho/Guilherme de Oliveira, Curso de Direito da Família, vol. II, Direito da Filiação, Tomo I, pág. 64). Deste modo, havendo prova da quebra dos vínculos afectivos da criança para com os pais, atendendo ao superior interesse, que prevalece sobre os restantes interesses em causa, deverá considerar-se que o pressuposto legal da inexistência ou comprometimento sério dos vínculos está verificado (...) A quebra dos vínculos afectivos não tem de ocorrer nas crianças e nos pais, pois apenas é relevante a quebra de vínculos afectivos da criança. (Cf. Sara Caçador, Abordagem Teórico-Prática… cit., pág. 16 e seg. sublinhado nosso). Se a quebra de vínculos se verificar pelo lado dos pais, mesmo que as crianças manifestem afectividade por aqueles, a solução não poderá de deixar de considerar que os pais, que não tenham vínculos afectivos pelos filhos, nunca poderão assumir correctamente as suas responsabilidades parentais, sob pena de se colocar a criança em perigo. Desse modo, apesar do sofrimento da criança, atendendo ao seu superior interesse, a única medida que a salvaguarda é a de a afastar da ligação aos pais biológicos. Na al. c) refere a lei o abandono da criança. Abandono da criança não se confunde com desinteresse dos pais, previsto na al. e). O abandono consiste numa manifestação de vontade de renúncia ao vínculo paterno-filial. Os vínculos afectivos quebram-se por vontade, expressa ou tácita, dos progenitores. Na prática traduz-se num comportamento de deixar a criança entregue a terceiro sem intenção de voltar a buscá-la. Já no desinteresse, os progenitores adoptam uma conduta ambígua em relação à criança, mantendo alguns contactos que, no entanto, não são suficientes para assegurar a qualidade e continuidade dos vínculos afectivos (Sara Caçador, Abordagem Teórico-Prática… cit., pág. 21). No desinteresse houve apego, pelo menos aparente, sem a devida qualidade que, perdurando, permite concluir pelo comprometimento dos laços de afecto que caracterizam a filiação (Dulce Rocha, apud Sara Caçador, Abordagem Teórico-Prática… cit., pág. 22, nota 28). A al. d) prevê as situações de colocação em perigo grave para a segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento da criança. Refere-se esta alínea a situações de não exercício ou de exercício deficiente das responsabilidades parentais pelos progenitores que constitua um perigo grave para a criança a nível da sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento. A criança está em perigo quando se encontra numa situação em que vê ameaçada a sua existência ou integridade física ou psíquica (Sara Caçador, Abordagem Teórico-Prática… cit., pág. 23 e seg.). Não se exige uma lesão efectiva, bastando a probabilidade eminente de lesão, para legitimar a aplicação da medida. A detecção do perigo é preventiva da lesão. A criança encontra-se em perigo se se verifica uma situação de incerteza sobre o seu bem-estar físico ou psicológico, a sua capacidade de resistência, o seu equilíbrio mental e social ou diminuída na sua autoestima. Está em perigo, quando não recebe os cuidados ou afeição adequados á sua idade e situação pessoal, quando é sujeita a comportamentos que afectam o seu equilíbrio emocional, como sucede quando é exposta a violência interparietal. A al. e): manifesto desinteresse nos filhos acolhidos em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade dos vínculos afectivos. A lei ao reduzir para três meses o período de manifesto desinteresse dos pais visou evitar o prolongamento da institucionalização da criança que sofre graves carências com a ausência dos pais. Desinteresse nos filhos traduz com comportamento contrário a estar interessado nos filhos. É a atitude de falta de cuidado e atenção para com tudo o que lhes diga respeito. Para aferir da falta de interesse importa analisar a interacção entre pais e filhos, a qualidade dos contactos entre eles em termos de afectividade. Se a interacção é básica e passiva, traduzindo-se num mero “cumprimento de horário”, ou se é desadequada face à idade da criança, consubstancia desinteresse pela criança. A falta de observação das orientações e projectos propostos pelos Técnicos é também factor demonstrativo de desinteresse porque elucidativo de falta de esforço e de empenho na reunificação familiar. Verificado o desinteresse, cumpre avaliar se comprometeu seriamente a qualidade e continuidade dos vínculos afectivos. O comprometimento desses vínculos verifica-se, por exemplo, se os progenitores deixaram de ser as pessoas de referência da criança. A manutenção da situação de acolhimento sem que os pais mostrem uma atitude e comportamento reveladores de progressos sérios para a reunião familiar é demonstrativo de desinteresse na criança. “O vínculo afectivo é uma relação de tal forma sólida que permite, a quem a olha do exterior, percepcionar que aquela criança tem aquele adulto como pessoa de referência e a quem pertence integralmente. Pessoa de referência é aquele que cuida, que dá carinho, que alimenta, que veste, que brinca, que educa, que protege, que ensina regras e dá orientações.” (Sara Caçador, Abordagem Teórico-Prática… cit., pág. 43.) O caso dos autos. No que toca ao progenitor. Apurou-se que esteve preso, em cumprimento de pena e, desde 02/05/2024 saiu em liberdade condicional e visitou o filho, apenas uma vez, em 22/09/2024 e contactou a Casa de Acolhimento em 14/08/2024. Portanto, em quatro meses de liberdade, viu o filho uma vez e perguntou, apenas uma outra vez, por ele (ponto 20 dos factos provados). Vive numa carrinha. Manifestamente não tem as mínimas condições para cuidar da criança. Verbaliza pretender cuidar da criança, mas carece de tempo, um ano, para o efeito. Tal comportamento e atitude do progenitor são reveladores, simultaneamente, de abandono da criança e de desinteresse para com o menor. Abandono, porque deixou a criança entregue à Instituição, sem qualquer intenção, séria, efectiva e consistente de voltar a ir buscá-la, não tomando, aliás, qualquer iniciativa nesse sentido. Visitou-a uma vez cerca de cinco meses depois de sair do estabelecimento prisional em liberdade condicional. E contactou, uma outra vez, com a CAR. Se tivesse preocupação e interesse, ainda que mínimos, perguntaria pelo filho, tentaria inteirar-se dos respectivo desenvolvimento, acompanhava-o. Adoptaria uma atitude proactiva em relação ao desenvolvimento e crescimento deste seu filho. Desinteresse, porque o pontual, único, contacto com o filho, não pode considerar-se suficientes para assegurar a qualidade e continuidade dos vínculos afectivos. Há uma quebra de vínculos pelo lado do pai. Não poderá deixar de considerar-se que o pai que não tem vínculos afectivos pelo filho, nunca poderá assumir correctamente as suas responsabilidades parentais, sob pena de se colocar a criança em perigo. Há um sério comprometimento dos vínculos afectivos próprios da filiação, qualificado por abandono e desinteresse para com o menor. A parentalidade biológica, desprovida dos seus factores típicos e inerentes, como o amor, o carinho, os cuidados, a atenção, a disponibilidade, o empenho, a preocupação, o acompanhamento do filho, não pode ser considerada relação familiar sã e equilibrada, mas antes lesiva dos interesses da criança. Quanto à progenitora. A demonstrada má vigilância da gravidez; a incapacidade de tomar conta do filho, a ponto de concordar em entregá-lo na CAR com sete meses de vida; o consumo de estupefacientes; a prática de mendicidade (ponto 2); a instabilidade de relacionamentos e instabilidade habitacional (3); encaminhamento para instituição de apoio à toxicodependência, sem assiduidade (5); não comparecimento na consulta de saúde infantil dos seis meses (6); vivência em ambiente de tráfico de estupefacientes (7); outro filho entregue aos cuidados da avó materna (8); falta de estímulo da criança (9); desinvestimento em contactos e visitas (10); por incapacidade da mãe, a confiança da criança ao avô materno que, algum tempo depois a abandonou (11); necessidade de aplicar nova medida de protecção ao menor (14); no segundo acolhimento a criança mostrava-se triste, apático e com falta de higiene (15); consumos de THC (17); casa sem condições de habitabilidade (18); apenas um berço e sem roupa e outros produtos para a criança (19); visitas pontuais e sem cumprimento das agendadas (24); a criança furta-se ao contacto com qualquer um dos pais, requerendo sempre a atenção das cuidadoras, e não se refere à figura materna como «mãe», a qual não interage com a criança (25). Desta factualidade decorre, desde logo, uma situação de desinteresse pelo filho. Dissemos acima que o desinteresse se traduz num comportamento contrário a estar interessado no filho. É a atitude de falta de cuidado e atenção para com tudo o que lhe diga respeito. Para aferir da falta de interesse importa analisar a interacção entre pais e filhos, a qualidade dos contactos entre eles em termos de afectividade. Verificado o desinteresse, cumpre avaliar se comprometeu seriamente a qualidade e continuidade dos vínculos afectivos. O comprometimento desses vínculos verifica-se, por exemplo, se os progenitores deixaram de ser as pessoas de referência da criança, como sucede no caso dos autos e decorre, desde logo, do ponto 25: a criança furta-se ao contacto com qualquer um dos pais, requerendo sempre a atenção das cuidadoras, e não se refere à figura materna como «mãe», a qual não interage com a criança A manutenção da situação de acolhimento sem que os pais mostrem uma atitude e comportamento reveladores de progressos sérios para a reunião familiar é demonstrativo de desinteresse na criança. Também vimos que a al. d) do nº 1 do art.º 1978º do CC, reporta-se a situações de colocação em perigo grave para a segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento da criança. Todos os pontos de facto acima sintetizados revelam que a continuação da criança com a mãe é fonte de perigo grave para a segurança, saúde, formação, educação e desenvolvimento da criança. Durante o tempo de vida da criança, a mãe demonstrou não ter capacidade de tomar conta dela, de lhe proporcionar bem estar, físico e psicológico, carinho, segurança: daí a primeira entrega à CAR, a entrega ao avô materno; a segunda entrega à CAR. A criança nunca recebeu os cuidados e afeição adequados á sua idade e situação pessoal. Enfim, verifica-se, em relação à progenitora, face ao que acima se resumiu, uma de situação de perigo do desenvolvimento harmonioso e equilibrados da criança e uma situação de manifesto desinteresse para com ela. Verifica-se, pois, um sério comprometimento dos vínculos afectivos próprios da filiação. Enfim, os pais nunca fizeram um esforço sério para criar condições para a reunião da criança. Trata-se, de família biológica disfuncional, a ponto de comprometer os vínculos afectivos da criança e os interesses/direitos desta a um desenvolvimento equilibrado. Como se referiu, a parentalidade biológica, desprovida dos seus factores típicos e inerentes, como o amor, o carinho, os cuidados, a atenção, a disponibilidade, o empenho, a preocupação, o acompanhamento dos filhos, não pode ser considerada relação familiar sã e equilibrada, mas antes lesiva dos interesses da criança. Por fim, quanto à pretensão de concessão, aos progenitores, de mais uma oportunidade, ou que se aguarde por mais um ano, para que possam demonstrar que reúnem condições necessárias para que lhes seja confiado o menor, não merece acolhimento Na verdade, o objectivo da medida decretada, nada tem a ver com a protecção dos progenitores, nem com a punição dos seus comportamentos, mas, exclusivamente, com a salvaguarda do Superior Interesse da criança. E, por isso, se se protelar a efectivação da medida dando-se outra oportunidade aos pais que já demonstraram, bastamente, que não têm condições para o criar, implicaria um arrastamento da vida de incerteza do menor, arruinando-lhe a oportunidade de crescer numa família funcional. Não se pode permitir que a criança permaneça, por tempo indeterminado, na instituição. Não se podem consentir adiamentos reiterados ao direito de viver e de se desenvolver de modo harmonioso. Tratar-se-ia, manifestamente, face ao todo o passado, de uma medida dilatória dos pais com vista a evitar a futura adopção. Aliás, é frequente em situações como a dos autos, de aplicação da medida de confiança a instituição com vista a futura adopção, que os pais manifestem vontade de manter a relação afectiva com as crianças (Cf. Paulo Guerra, Confiança Judicial com vista à adopção – Os difíceis trilhos de uma desejada nova vida, Revista do Ministério Público, nº 194, Out./Dez 2005, pág. 93). Mas, por vezes, tais manifestações correspondem a sentimentos de desespero e até de arrependimento e, outras vezes, de meras manifestações de voluntarismo egocêntrico. Não se pode confundir verdadeiro arrependimento com todo o desinteresse pela criança antes da aplicação da medida. A expectativa de reversão de comportamento, deve ser afastada nos casos, como o dos autos, em que os progenitores, durante toda a vida da criança, se mostraram incapazes de cuidar dela, apesar das oportunidades que lhes foram dadas. O recurso improcede. *** III- DECISÃO. Em face do exposto, acordam os juízes que compõem este colectivo, julgar o recurso improcedente e, por conseguinte, mantém a decisão de aplicação da medida de confiança da criança a instituição com vista a futura adopção. Custas: pelos apelantes, sem prejuízo do apoio judiciário com que litiguem. Lisboa, 20/03/2025 Adeodato Brotas João Brasão Nuno Gonçalves |