Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
187/21.9YHLSB.L2-PICRS
Relator: ALEXANDRE AU-YONG OLIVEIRA
Descritores: PROPRIEDADE INTELECTUAL
DIREITO DE AUTOR
FOTOGRAFIA
RESPONSABILIDADE CIVIL
INTERVENÇÃO ACESSÓRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/05/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: (da responsabilidade do Relator)
1. O Recorrente deduz a sua pretensão indemnizatória contra a Ré/Recorrida, em suma, porque entende que esta usou sem autorização e de forma ilícita, no âmbito da inauguração do hotel Pestana CR7 Lisboa, uma fotografia da sua autoria.
2. Como criador da obra fotográfica controversa, ao abrigo do disposto no artigo 67.º, n.º 1, do Código de Direito de Autor e Direitos Conexos o Autor/Recorrente tem o direito exclusivo de fruir e utilizar a obra, no todo ou em parte, no que se compreendem, nomeadamente, as faculdades de a divulgar, publicar e explorar economicamente por qualquer forma, direta ou indiretamente, nos limites da lei e nas formas de utilização expressamente previstas nos artigos 67.º e 68.º do mesmo código. Assim sendo, em regra, qualquer utilização da fotografia não pode ocorrer sem a prévia autorização do Recorrente.
3. Contudo, tendo-se apurado no caso concreto que a “[a] elaboração e projeção/difusão do vídeo da inauguração do Hotel Pestana CR7, no qual está reproduzida a fotografia em causa nestes autos, foi efetuada pela Chamada OCUBO CRIATIVO – Atividades Artísticas e Literárias, Lda., contratada pela Ré para realização do evento de inauguração” e que “[a] Ré não teve qualquer tipo de intervenção na elaboração do vídeo – nomeadamente, na seleção de imagens ou fotografias –, nem na sua projeção”, não se verificam quanto à Recorrida, os respetivos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, desde logo, um facto ilícito que lhe possa ser imputada.
4. Já quanto a uma eventual responsabilidade da Chamada, tal como constatou a sentença recorrida, verifica-se que se encontra a intervir nos presentes autos apenas enquanto interveniente acessória e, por isso, não pode haver condenação desta.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa

Índice
I. Relatório. 2
Questões: 4
II. Fundamentação. 6
Factos provados. 7
Factos não provados. 8
IV. Do mérito do recurso. 8
Questão 1. 8
Questão 2. 11
Questão 3: 16
Questão 4. 17
Questão 5. 18
Questão 6. 20
Questão 7. 21
Questão 8. 22
Questão 9. 23
V. Decisão. 26
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I. Relatório
Recorrente/Autor: (…), titular do passaporte n.º (…) emitido pelo departamento de estado dos Estados Unidos da América, com residência em (…)
Recorrida/Ré: PESTANA CR7 – LISBOA HOTEL INVESTIMENTOS TURÍSTICOS, S.A., pessoa coletiva n.º 513969632, com sede na Rua da Prata, n.º 24 a 28, 1100-419 Santa Maria Maior, Lisboa.
Interveniente acessória provocada passiva: OCUBO Criativo – Atividades Artísticas e Literárias, Lda, pessoa coletiva n.º 506810720, com sede na Quinta da Boa Esperança, n.º 22, 2635-000 Sintra.
1. A Autora intentou ação declarativa de condenação em processo comum contra a Ré, tendo formulando os seguintes pedidos:
a) Ser a Ré condenada a pagar uma indemnização ao Autor, no montante de € 5.000,00 a título de lucros cessantes pela perda e diminuição da eficácia distintiva da fotografia e, consequentemente, perda de lucro por parte do Autor;
b) Ser a Ré condenada a proceder ao pagamento ao Autor de uma indemnização no montante de € 20.000,00 correspondente ao preço equitativo que a aludida fotografia iria ser vendida ou cedida a sua autorização para a respetiva divulgação pela Ré;
c) Ser a Ré condenada a proceder ao pagamento ao Autor de uma indemnização correspondente à remuneração/lucro auferido pela Ré pela presença de várias pessoas no dia da inauguração do Hotel, bem como a pernoita de vários clientes no Hotel, e a utilização do restaurante do Hotel, durante a semana da inauguração;
d) Ser a Ré condenada no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória ao A., nos termos do artigo 829.º-A do Código Civil, que deverá ser fixada em € 1.000,00 por cada dia que a fotografia que o Autor detém os respetivos direitos de autor, está a ser utilizada no vídeo de inauguração do Hotel da Ré, que, actualmente, tal vídeo ainda se encontra online;
e) Às quantias acima referidas deverá acrescer o montante de juros, calculados à taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento;
2. Para tanto alegou, em síntese, ter a Ré usado sem autorização e de forma ilícita no âmbito da inauguração do hotel Pestana CR7 Lisboa uma fotografia da sua autoria.
3. Devidamente citada, a Ré contestou, alegando que não violou qualquer direito de autor relativamente à fotografia em causa nos presentes autos, tendo solicitado à sociedade OCUBO CRIATIVO – Atividades Artísticas e Literárias, Lda. a elaboração do vídeo para a inauguração do hotel Pestana CR7 Lisboa, não tendo qualquer intervenção na elaboração do vídeo, nas fotografias nele usadas, nem na sua montagem ou projeção. Concluiu pedindo a intervenção acessória da sociedade OCUBO CRIATIVO – Atividades Artísticas e Literárias, Lda.
4. Pelo tribunal a quo foi admitida a intervenção acessória da sociedade OCUBO CRIATIVO – Atividades Artísticas e Literárias, Lda. Devidamente citada, veio a Chamada defender-se por impugnação, alegando não ter violado qualquer direito de autor e por exceção, alegando que o direito de indemnização do Autor já se encontra prescrito, invocando ainda a exceção de falta de personalidade judiciária do Autor.
5. Num primeiro momento, o tribunal a quo proferiu sentença em 07-03-2022, julgando procedente a exceção de prescrição invocada pela Ré e a Chamada e, em consequência, absolveu estas do pedido. Esta sentença foi revogada por acórdão de 26-09-2022, proferido pelo TRL, tendo-se ordenado a baixa do processo para o prosseguimento dos autos para os fins previstos no artigo 596.º do Código de Processo Civil.
6. Após dar cumprimento ao ordenado pelo TRL, em sentença datada de 08-11-2023, o tribunal a quo julgou improcedentes as exceções invocadas e mais julgou improcedente a ação e, em consequência, decidiu absolver a Ré Pestana CR7 – Lisboa Hotel Investimentos Turísticos, S.A. e a Chamada Ocubo Criativo – Atividades Artísticas Literárias, Lda. dos pedidos formulados pelo Autor (…)
7. De tal sentença apelou agora o Recorrente, onde termina com o seguinte pedido “deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser revogada a sentença recorrida, devendo a mesma ser substituída por outra que julgue o pedido de condenação da R. ao pagamento de uma quantia nunca inferior a € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) relativo aos danos causados pela atuação da R., acrescida dos montantes/remunerações que a R. auferiu pela utilização ilícita da aludida fotografia, nomeadamente, pela presença de várias pessoas no dia da inauguração do Hotel, bem como a pernoita de vários clientes durante a semana da inauguração do Hotel, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”.
8. Nas alegações de recurso, com um total de 101 conclusões, foram suscitadas as seguintes
Questões:
i) A sentença recorrida é nula por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (artigo 615.º, n.º 1, al. b) e 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil)?
ii) Em sede de impugnação da matéria de facto:
- Deve ser alterado o facto provado 9 e 10, de forma a constar dos facto provados que “a elaboração e projeção/ difusão do vídeo da inauguração do Hotel Pestana CR7, no qual está reproduzida a fotografia da autoria do Recorrente foi da efetiva responsabilidade da Recorrida e que, pelos danos causados ao Recorrente pela utilização indevida e sem consentimento da fotografia da sua autoria, a Ré Recorrida é responsável.”?
- Devem ser aditados os seguintes 7 pontos na matéria de facto provada?
- “Facto provado 1; Facto provado 2; Facto provado 3; Facto provado 4;
- No dia da inauguração do Hotel Pestana CR7 Lisboa, a R. divulgou a fotografia do A. acima reproduzida, em manifesta violação do direito de autor do A., pois, em momento algum, a R. solicitou respetiva a autorização ou consentimento para o efeito;
- A R. é uma empresa que se dedica a investimentos turísticos, associada à imagem do jogador de futebol (…), pelo que a exposição, reprodução e lançamento no comércio, da fotografia atrás reproduzida, violou flagrantemente o direito de autor do A.;
- A utilização da fotografia por parte da R., provocou uma perda e diminuição da eficácia distintiva da fotografia, pois, diminuiu o impacto comercial que o A. pretendia obter através da mesma;
- O A. perdeu o lucro que desejava com a divulgação da campanha “Fans of the Worl Cup” para o ano de 2018, bem como para outras companhas acordadas contratualmente com o modelo da fotografia, e, ainda, assistiu a uma perda da eficácia distintiva da fotografia;
- A R. violou os direitos de autor do A., porquanto, procedeu à utilização, exposição e reprodução da imagem em apreço, sem solicitar ao A. a respetiva autorização para o efeito;
- Apenas o A. detinha o direito exclusivo de fruir e utilizar a sua obra artística;
- Facto provado 5; Facto provado 6; Facto provado 7; Facto provado 8;
- A fotografia do A. somente se encontrava disponível para aquisições onerosas na internet, nomeadamente no seu site oficial do, com a indicação de proteção de direito autorais e de imagem, não sendo, por isso, de download ou utilização livre, o que deve ser aditado matéria de facto provada.
- Factos não provados: Facto A; Facto C; Facto D; Facto E; Facto F”.
- O facto não provado B, com o teor “[o] Autor despendeu com a aquisição da camisola original da seleção portuguesa, as sessões fotográficas e a caracterização do modelo cerca de 8.000$00 (USD)”, deve ser julgado provado?
iii) Com base em responsabilidade civil extracontratual (artigo 483.º do Código Civil), a decisão deverá ser em sentido oposto da sentença recorrida, sendo certo que a Ré Pestana CR7 Lisboa Hotel Investimentos Turísticos, S.A., é a efetiva responsável pelo ressarcimento dos danos provocados ao A. através da utilização sem consentimento de uma obra artística da sua autoria e uso exclusivo, pois foi esta quem ordenou a realização do vídeo onde consta a imagem sub judice e instruiu a Chamada para o efeito?
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9. A Recorrida apresentou Resposta ao recurso de apelação. Em sede de impugnação da matéria de facto, a Recorrida, ao abrigo do disposto no artigo 636.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, requer “a titulo subsidiário, e para a hipótese, que não se espera nem se aceita, e apenas se admite por elementar cautela de patrocínio, de procedência de alguma das questões suscitadas pelo Recorrente, vem a Recorrida impugnar alguns pontos da decisão sobre a matéria de facto que carecem de correção”, em concreto, o facto provado n.º 7, o facto provado n.º 8 e facto não provado C) e, por último o facto provado n.º 4 e o facto não provado D). Em sequência das alterações da matéria de facto requeridas subsidiariamente, entende a Recorrida que se verifica a exceção de prescrição por si invocada. Em sede do mérito da ação, pugna pela não verificação dos requisitos da responsabilidade civil extracontratual, devendo ser mantido o decidido.
10. A Chamada também respondeu pugnando, a título principal, pela manutenção do decidido. A título subsidiário e ao abrigo do disposto no artigo 636.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, requer, ainda, a “ampliação da matéria de facto”, devendo dar-se como não provado o facto n.º 7 e dar-se como provado o facto não provado E).
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11. Em sede do presente recurso de apelação, foi cumprido o disposto nos artigos 657.º, n.º 2 e 659.º, do Código de Processo Civil.
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II. Fundamentação
12. A decisão recorrida fixou a factualidade nos exatos termos que se passa a expor.
Factos provados
1. O Autor dedica-se à atividade do ramo da publicidade.
2. Em 29 de Março de 2014, o Autor tirou uma fotografia ao modelo (…), no âmbito de uma campanha designada “Fans of the World Cup”, tendo sido celebrado entre ambos um escrito particular denominado “Autorização de Divulgação de Imagem”, no qual o modelo se comprometia a autorizar o Autor a utilizar e divulgar a sua imagem.
3. A referida campanha designada por “Fans of the World Cup” foi certificada em 16 de Abril de 2014, constando o Autor como o criador da fotografia abaixo identificada, a qual está publicada na página de internet www.(...).com.

4. Foi exibido um vídeo, no dia da inauguração do Hotel Pestana CR7 Lisboa, o qual ocorreu a 2 de Outubro de 2016, pertencente à Ré, do qual consta a seguinte fotografia, sem autorização e conhecimento do Autor.

5. O modelo (…) instaurou contra a aqui Ré os respetivos autos de processo comum, que corre os seus termos com o n.º de processo 1997/19.2T8CSC, no Juízo Local Cível de Cascais – Juiz 2, na qual peticionou a indemnização pela violação do seu direito de imagem.
6. O Autor pretendia utilizar a fotografia para diversas finalidades, designadamente, para a Copa do Mundo de 2018, conforme havia sido estipulado com o respetivo modelo.
7. Caso tivesse sido solicitada autorização para uso da fotografia acima mencionada ao Autor na inauguração do Hotel Pestana CR7 Lisboa, a mesma não teria uma remuneração inferior a € 20.000,00.
8. O Autor teve conhecimento da utilização da fotografia acima mencionada em data não concretamente apurada mas situada no Verão de 2018.
9. A elaboração e projeção/difusão do vídeo da inauguração do Hotel Pestana CR7, no qual está reproduzida a fotografia em causa nestes autos, foi efetuada pela Chamada OCUBO CRIATIVO – Atividades Artísticas e Literárias, Lda., contratada pela Ré para realização do evento de inauguração.
10. A Ré não teve qualquer tipo de intervenção na elaboração do vídeo – nomeadamente, na seleção de imagens ou fotografias –, nem na sua projeção.
11. A duração total do vídeo exibido na inauguração do Hotel Pestana CR7 Lisboa é de 108 segundos, sendo que a aparição da imagem aqui em causa dura 3 segundos dividida em 3 momentos de 1 segundo.
12. O Autor propôs a ação no dia 17.05.2021, tendo a Ré sido citada a 1 de Junho de 2021.
Factos não provados
A) O Autor ficou impedido de vender ou ceder os direitos de autor da fotografia por força do uso da mesma na inauguração do Hotel Pestana CR7 Lisboa.
B) O Autor despendeu com a aquisição da camisola original da seleção portuguesa, as sessões fotográficas e a caracterização do modelo cerca de 8.000$00 (USD).
C) Logo no dia do evento de inauguração ou pouco depois disso, mas necessariamente durante o ano de 2017, o Autor teve conhecimento da utilização da fotografia em causa.
D) As áreas de aparição da imagem variam em e 0,5% e 1,98% da imagem total do vídeo.
E) A fotografia acima mencionada foi usada pela Chamada porque se encontrava disponível na internet, em vários e diversos sites de utilização livre, sem que nela estivesse aposta qualquer informação do seu autor, de quem a tirou, do nome do fotógrafo, ou que estava sujeita a direitos de autor.
F) A Chamada tem o cuidado de identificar os autores das fotografias que usa, comprando, se necessário, os seus direitos.
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III. Do mérito do recurso
Questão 1
A sentença recorrida é nula por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (artigo 615.º, n.º 1, al. b) e 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil)?
Conclusões do Recorrente (Conclusões 3 a 9)
13. A obrigação de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, constante do artigo 615.º n.º 1, alínea b) do CPC é o reflexo do dever de fundamentação das decisões imposto pelo artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa (nos termos do qual “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”), e o ínsito no comando vertido no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e também regulamentado pelo próprio artigo 154.º do CPC.
14. Embora o julgador aprecie livremente as provas produzidas segundo a sua prudente convicção não está desonerado de fundamentar as razões pelas quais se convenceu da veracidade de determinados factos, ou da desconsideração de outra factualidade, de modo a permitir o controlo, quer pelas partes quer pelos tribunais superiores, do acerto da respetiva fundamentação, bem como, possibilitando às partes a arguição de eventuais nulidades resultantes da eventual oposição entre os fundamentos e a decisão ou de omissão da especificação desses fundamentos.
15. Na decisão sob censura, na parte da fundamentação de direito, o Tribunal a quo limita-se a fazer um breve enquadramento da causa nos termos do artigo 483.º do Código Civil (doravante apenas CC), não procedendo, todavia, à análise da verificação, no concreto caso, dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual.
16. O julgador exime a Recorrida de qualquer responsabilidade justificando somente que a mesma apenas delegou a elaboração do vídeo na Chamada Ocubo Criativo – Atividades Artísticas Literárias, Lda., não procedendo a uma mais competente fundamentação jurídica.
17. A utilização da imagem propriedade do Recorrente no vídeo transmitido pela Recorrida no dia da inauguração do seu hotel constituiu, de forma ostensiva, um facto ilícito, por ter sido furtivamente retirada de um site – www.(...).com – em que se apresentam obras fotográficas, devidamente registadas nos EUA.
18. O Tribunal não esclareceu nem fundamentou qual a razão de direito da utilização da imagem do Recorrente no referido vídeo não constituir o alegado facto ilícito, sendo certo que, estamos perante a utilização não autorizada da imagem de uma pessoa, para efeitos comerciais, associada a uma inquestionável violação de um direito de autor.
19. A decisão sob censura padece de vício, por verificação da nulidade por falta de especificação dos fundamentos de direito que a justificam, nos termos dos artigos 615.º e 607.º, n.º 3 do CPC, pelo que, deverá a sentença ser declarada nulo, sendo revogada e substituída por outra onde tal vício seja expurgado.
Apreciação deste tribunal
20. Conforme resulta do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil “É nula a sentença quando: b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”.
21. Resulta de jurisprudência uniforme que esta nulidade apenas se verifica quando a sentença padece de absoluta falta de fundamentação e não de fundamentação alegadamente insuficiente.[1] Noutras palavras, a nulidade ocorre quando “falte em absoluto a indicação dos fundamentos da decisão e já não quando a fundamentação seja meramente deficiente, incompleta, aligeirada ou não exaustiva” (cf. Ac. STJ 16-03-2023, processo n.º 1377/18.7T8LSB.L1.S1).
22. Analisando a sentença recorrida é de se concluir que a referida nulidade não se verifica.
23. Com efeito, resultam claras as razões segundo as quais o tribunal a quo entendeu não se verificarem os pressupostos da responsabilidade civil no caso concreto, desde logo, um facto ilícito imputável à Recorrida.
24. Conforme se pode ler no primeiro parágrafo a p. 16 da sentença recorrida “dos factos considerados como provados, não se verifica uma actuação ilícita por parte da Ré, uma vez que a mesma apenas delegou a elaboração do vídeo na Chamada, não tendo qualquer intervenção na elaboração do vídeo, selecção das fotografias ou exibição do vídeo, não lhe sendo exigível qualquer tipo de supervisão quanto às fotografias usadas pela Chamada.”.
25. A sentença recorrida analisa, ainda, a apurada conduta da Recorrida à luz do disposto no artigo 500.º, n.º 1, do Código Civil, ou seja, à luz da relação comitente/comissário, para concluir pela sua não verificação uma vez que “da factualidade considerada como provada não resulta que a Chamada est[e]ve a actuar sob a direcção da Ré, inexistindo qualquer relação de dependência ou subordinação, uma vez que a Ré apenas solicitou a elaboração do vídeo tendo por base o tema do desporto, ficando a cargo da Chamada a elaboração do mesmo conforme melhor entendeu e com o uso das imagens sem qualquer interferência por parte da Ré.”.
26. Resulta, pois, da sentença recorrida, que o facto ilícito em causa – a utilização de uma obra protegida por direito de autor sem autorização – não terá sido praticado pela Recorrida mas antes pela Chamada.
27. Por isso se compreende que a sentença recorrida, aventando uma eventual responsabilidade da Chamada, refira, na mesma p. 16, que “tal responsabilidade apenas poderia ser assacada à Chamada nos termos da responsabilidade civil extracontratual. Porém, verifica-se que a Chamada se encontra a intervir nos presentes autos enquanto interveniente acessório, nos termos do despacho de 17.09.2021”.
28. Nestes termos, resulta manifesto que a sentença recorrida, em sede de fundamentação de direito expôs as razões pelas quais entendia não verificados os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual da Recorrida, inexistindo, pois, a alegada nulidade.
29. Neste ponto, portanto, o recurso terá de improceder.
Questão 2
Devem ser alterados os factos provados 9 e 10, de forma a constar que “a elaboração e projeção/ difusão do vídeo da inauguração do Hotel Pestana CR7, no qual está reproduzida a fotografia da autoria do Recorrente foi da efetiva responsabilidade da Recorrida e que, pelos danos causados ao Recorrente pela utilização indevida e sem consentimento da fotografia da sua autoria, a Ré Recorrida é responsável”?
30. Resulta claro das alegações de recurso que entende o Recorrente que “[a] Ré Pestana CR7 – Lisboa Hotel Investimentos Turísticos, S.A., é a efetiva responsável pelo ressarcimento dos danos provocados ao A. através da utilização sem consentimento de uma obra artística da sua autoria e uso exclusivo, pois foi esta quem ordenou a realização do vídeo onde consta a imagem sub judice e instruiu a Chamada para o efeito.” (Conclusão n.º 32).
31. Neste contexto, nas Conclusões 11 e ss. do recurso, entende o Recorrente que devem ser alterados os factos provados n.ºs 9 e 10, cujo teor, é, recorde-se:
9) A elaboração e projeção/difusão do vídeo da inauguração do Hotel Pestana CR7, no qual está reproduzida a fotografia em causa nestes autos, foi efetuada pela Chamada OCUBO CRIATIVO – Atividades Artísticas e Literárias, Lda., contratada pela Ré para realização do evento de inauguração.
10) A Ré não teve qualquer tipo de intervenção na elaboração do vídeo – nomeadamente, na seleção de imagens ou fotografias –, nem na sua projeção.
32. Mais resulta, com suficiente clareza, que o Recorrente pretende que em vez de tal factualidade passe a considerar-se provado que a elaboração e projeção/ difusão do vídeo da inauguração do Hotel Pestana CR7, no qual está reproduzida a fotografia da autoria do Recorrente foi da efetiva responsabilidade da Recorrida e que, pelos danos causados ao Recorrente pela utilização indevida e sem consentimento da fotografia da sua autoria, a Ré Recorrida é responsável.” (Conclusão n.º 22).
33. Neste âmbito, alega o Recorrente de essencial, o seguinte (Conclusões n.ºs 13-21):
“13. Pese embora a efetiva elaboração do vídeo transmitido na inauguração do Hotel Pestana CR7, no qual se encontra reproduzida, de forma absolutamente ilegítima, a fotografia da autoria do ora Recorrente, tenha sido levada a cabo pela chamada OCUBO CRIATIVO – Atividades Artísticas e Literárias, Lda., a aqui Recorrida, enquanto adquirente do serviço prestada pela chamada, tinha o dever de exercer controlo prévio no que ao conteúdo do vídeo diz respeito.
14. Aquando do seu depoimento, a testemunha (…) confessou que a Recorrida Pestana CR7 – Lisboa Hotel Investimentos Turísticos, S.A. não se limitou a adjudicar a elaboração do respetivo vídeo à OCUBO, sem qualquer tipo de instruções e indicações, porquanto, afirmou que a respetiva empresa recebeu um briefing da Recorrida e que, fundamentalmente, houve sim controlo prévio por parte da Recorrida do conteúdo do vídeo em referência.
15. A testemunha (…) depôs sobre a efetiva intervenção da Ré Recorrida na elaboração do vídeo através do mencionado briefing e, quando questionada sobre o controlo de imagens selecionadas, a referida testemunha limitou-se responder que não se recordava.
16. Sendo dúbio o conhecimento direto dos factos pertinentes para a decisão da causa e boa administração da justiça por parte destas duas testemunhas, e, até mesmo, contraditórios com a matéria dada como assente pelo Tribunal a quo, este tribunal nunca poderia dar como provados estes factos.
17. Não se afigura minimamente verossímil que apenas com os depoimentos das testemunhas em referência, sem qualquer outra prova para corroborar os factos 9 e 10, o Tribunal a quo, erradamente, tenha dado como provado tais factos.
18. A Recorrida é uma empresa que lida frequentemente com questões ligadas à publicidade e que exerce a sua atividade de forma profissional, tendo algum prestígio no mercado, por outro lado encontrava-se assessorada por um Administrador da área e empresa O CUBO especialista em criação de conteúdo digital, marketing e publicidade, a qual realizou projetou/divulgou o vídeo que divulgou a imagem autoria do Recorrente mandatada pela primeira.
19. Na presente instância estamos perante um problema de direitos autorais, por conseguinte, de forma bastante evidente, o Tribunal a quo, ignorou que a Recorrida tinha um dever acrescido de verificar se a imagem se encontrava protegida, podendo fazê-lo através de plataformas próprias.
20. À luz do homem médio diligente, apenas se poderá concluir que uma pessoa colocada na posição da Recorrida, esta deveria saber que, representando a imagem a figura de uma pessoa, não podiam utilizá-la, sem solicitar o consentimento e/ou autorização do visado, ou seja, de quem estava representado e, principalmente, do autor dessa fotografia.
21. A Recorrida, sendo profissional na atividade de publicidade, bem sabia da necessidade de obter autorização ou consentimento do titular dos direitos de autor subjacente a fotografia em discussão, ou seja, o Recorrente.”.
34. Ou seja, em primeiro lugar, o Recorrente insurge-se contra a prova dos factos n.º 9 e 10, alegando que os depoimentos das testemunhas (…) e (...) deveriam considerar-se insuficientes para o efeito. Para tanto, a p. 8 e ss. da motivação do recurso, destaca várias passagens dos depoimentos em causa.
35. Por sua vez, respondeu a Recorrida alegando, em suma, que “carece de qualquer motivo ou fundamento a pretendida alteração dos pontos 9. e 10. dos Factos Provados, sendo manifesto e obvio que não foi a Recorrida quem criou, elaborou nem quem projetou o vídeo em causa”.
36. No que toca à motivação desta factualidade na sentença recorrida ficou consignado que “[o]s factos referidos em 9 e 10, os mesmos são considerados como provados por força das declarações do legal representante da chamada, em conjugação com as testemunhas (…) e (…), que confirmaram que foi a Chamada a única responsável pela elaboração do vídeo exibido na inauguração do hotel Pestana CR7 Lisboa, não tendo existido qualquer intervenção por parte da Ré.”. Mais consignou a sentença recorrida, de forma introdutória e genérica que “[n]o que diz respeito às declarações de parte, desde já se refere que a prova dos factos favoráveis ao depoente e cuja prova lhe incumbe não se pode basear apenas na simples declaração dos mesmos, é necessária a corroboração de algum outro elemento de prova, com os demais dados e circunstâncias, sob pena de se desvirtuarem as regras elementares sobre o ónus probatório e das acções serem decididas apenas com as declarações das próprias partes.”.
37. Ou seja, diferentemente do que ora alega o Recorrente a factualidade em causa não foi fixada apenas com base nos depoimentos das testemunhas (…) e (…), mas também com base nas declarações do representante legal da Chamada, (…)
38. O presente tribunal após ouvir as gravações das declarações da representante legal da Chamada e os depoimentos das referidas testemunhas, concorda com a Recorrida no sentido de que nada a apontar à sentença recorrida quanto a estes pontos da matéria de facto provada.
39. Tal como salientado pela Recorrida, à questão sobre se “a sociedade enfim o hotel Pestana CR 7 interveio de alguma forma na feitura deste vídeo? Isto é foram eles que escolheram as fotografias, foram eles que escolheram o conceito…?”, a resposta do (…), representante da Chamada foi claramente negativa “Não, foram um desenvolvimento do atelier, atelier OCubo” (cf. gravação a partir de 00:10:38).
40. Mais resulta das mesmas declarações que à questão sobre se “bom, mas portanto, a Pestana CR7 não lhe encomendou nenhum trabalho específico. Nem lhe disse faz favor de utilizar esta imagem deste senhor aqui aos berros com a camisa portuguesa?”, a resposta de (…) foi “correto, deu-nos liberdade artística para criar o projeto”, mais esclarecendo, logo depois, que “a única coisa como eu disse que houve foi a nível de guião quais eram as coisas que queríamos, quais eram as mensagens vá, que queríamos mostrar, mas não houve nenhuma indicação específica.” (cf. gravação a partir de 00:12:03). Resulta, em suma, destas declarações que, a Recorrida Pestana CR 7 não fez o vídeo, não projetou o vídeo e que não é dona do vídeo.
41. Por sua vez, quanto ao depoimento da testemunha (…), administrador do grupo da Pestana entre 2013 e 2017, em resposta a questão sobre qual a intervenção que a Recorrida tinha tido em relação ao vídeo em discussão, respondeu, de essencial “a (…) trabalhava comigo, chamou, chamou o OCubo e deu-lhes o briefing bastante claro, mas muito conceptual a dizer-lhes claramente, nós vamos fazer esta inauguração daqui a X dias, já não me recordo com que antecedência foi, precisamos fazer um espetáculo impressivo de luz, precisamos da vossa ajuda, este é o briefing. (…) Obviamente o OCubo respondeu que obviamente tinha muito interesse em fazer isto connosco, éramos parceiros, era um projeto engraçado e intelectualmente estimulante, até porque nós não tínhamos interesse nenhum em interferir na peça artística, nós tínhamos interesse em fazer uma coisa bonita para os convidados e confiamos neles. Se nós soubéssemos fazer, fazíamos nós. Nós, nós não fizemos porque não sabíamos fazer. Chamámo-los para eles fazerem e portanto para eles apresentarem, fazerem uma proposta com base nesse briefing, proposta essa que nós limitamos que nós limitamos sem ferir aquilo que é a propriedade intelectual do OCubo, porque o OCubo é que sabe fazer isto, eles estavam-nos a apresentar do meu ponto de vista uma obra, eu acho que quem foi ao festival Lumina, eles apresentam uma obra final chave na mão. Mas a nós e em particular a mim, eu visionei 2, 3 vezes antes a peça final, a mim o coube-me acima de tudo garantir que não há, aquelas coisas que nos assustam em organizações um bocadinho institucionais e com muito compliance, que não há nus, que não há violações de direitos humanos, que não há este tipo de coisa um bocadinho mais ligadas às áreas de compliance puro e duro, tudo o resto para nós desde que por um lado isto estivesse salvaguardado, compliance básico, e por outro lado não fossem violados ou pelo contrário que fossem acelerados os valores institucionais do Grupo Pestana (…) Até porque vamos ver, a inauguração era uma coisa muito importante para nós e isto era um apontamento de decoração de uma fachada, apenas isto que fique claro. Portanto, quer dizer dêmos a atenção devida, mas por um lado sem ferir a propriedade intelectual do OCubo e por outro com a importância que isto tem dentro de uma inauguração que durou muitas horas.” (cf. gravação a partir de 00:05:28).
42. Ainda quanto a passagens do depoimento de (…), há que concordar com a Recorrida quando lamenta que “o Recorrente transcrev[a] a seguinte passagem do depoimento da testemunha (…): “00:17:25.8 (…) OCUBO utilizou uma imagem que não devia ter utilizado, culpa nossa que não pusemos no perímetro de limitação, mais uma vez porque nós não pusemos limitações”, dando a entender que o mesmo se estava a referir à fotografia cuja autoria é reclamada pelo Recorrente quando, como resulta claramente do depoimento prestado, se estava a referir a um “incidente” que terá ocorrido no vídeo onde surge uma bola da marca “Adidas”, sendo que o (…) tem uma relação de exclusividade com a marca “Nike”” (veja-se a gravação a partir do momento temporal indicado).
43. Quanto ao depoimento da testemunha, trabalhadora do Grupo Pestana entre 2009 e 2022, (…), e à questão sobre se o “Grupo Pestana interveio ativamente sobre os conteúdos desse vídeo, sobre o que é que ele ia passar, sobre as fotografias, sobre os filmes…?”, a mesma respondeu “[n]ão, não de todo, o que se faz, o que se faz nestas coisas ou pelo menos, enfim, o que nós fazíamos nestas coisas, o que se faz, é passar um briefing genérico de, enfim, aquilo que nós dizemos em linguagem de marketing ou de comunicação, um mood words ou seja, uma atividade, enfim, um, o espírito da coisa, ou seja, o espírito da coisa que claramente era, uma coisa rápida, muito rápida, que criasse ali um momento de animação, e a ideia, o espírito, o espírito da coisa, de facto, foi passar o espírito do desporto, que era, que é, enfim, faz parte desta marca, o Pestana CR7 veicula valores de bem-estar, de desporto, de camaradagem, de multiculturalidade, de, enfim, por aí fora, e foi, e foi esse o briefing que foi passado, e o que se passa, são ideias genéricas, e as ideias genéricas eram de velocidade, de alegria, de, enfim, de bem-estar, de, enfim, internacionalidade, multiculturalidade, enfim, por aí fora. (cf. gravação a partir de 00:07:43).
44. É certo que esta última testemunha, perguntada “se controlaram, todas as imagens que estavam ali, estavam devidamente licenciadas e podiam ser utilizadas?”  respondeu que “não me recordo, isso estaria nos termos do contrato, não me recordo de todo.” (cf. gravação a partir de 00:20:40). Não menos certo, como salienta a Recorrida, é que a mesma testemunha confirmou que o vídeo tinha sido integralmente elaborado e projetado pela Chamada OCUBO (cf. gravação a partir de 00:10:05)
45. Resulta, portanto, deste conjunto de meios de prova e de forma essencialmente coerente, que a Recorrida Pestana CR7 não teve qualquer intervenção na elaboração do vídeo em discussão, tendo se limitado a “encomendar” a realização do evento de inauguração à Chamada OCUBO que incluía o dito vídeo, a ser realizado de acordo com um briefing com indicações meramente genéricas sobre o espírito que deveria transparecer do mesmo. Mais resultou, em especial, do depoimento de (…), que o controlo do conteúdo do vídeo por parte da Recorrida, foi apenas e tão-só quanto a aspetos relacionados com compliance básico (em especial, que não contivesse nus ou violações de direitos humanos).
46. Os factos provados n.º 9 e 10 estão, portanto, em total harmonia com os meios de prova descritos.
47. Acresce que a factualidade em causa, para além de harmoniosa com a prova efetivamente produzida, está em acordo com as regras da experiência comum. Com efeito, a Recorrida, como salientado na resposta, “tal como o próprio Autor alegou no art.º 6.º da p.i., e resulta evidente da própria denominação social da Recorrida, esta dedica-se à atividade de “investimentos turísticos” e não tem nenhuma relação com o ramo da publicidade nem se dedica a nenhuma atividade relacionada com a publicidade.”. Desconhece-se, aliás, e não é indicado pelo Recorrente, qualquer meio de prova que sustente a alegação de que “a Recorrida é profissional na atividade de publicidade”.
48. Ora, dedicando-se a Recorrida a investimentos turísticos, como hotéis, não resulta das regras da experiência comum (e da prova produzida e já salientada) que se possa esperar desta que controle a elaboração do vídeo, para além do controlo descrito pela testemunha (…) no âmbito do que designou de compliance. Parece-nos, pois, perfeitamente natural, conforme descreveu (…), que ao OCUBO tenha sido dada, pela Recorrida, larga “liberdade artística” para a feitura do vídeo.
49. Nestes pontos, portanto, o recurso deve improceder.
Questão 3:
Deve ser aditado aos factos provados que “[n]o dia da inauguração do Hotel Pestana CR7 Lisboa, a R. divulgou a fotografia do A. acima reproduzida, em manifesta violação do direito de autor do A., pois, em momento algum, a R. solicitou respetiva a autorização ou consentimento para o efeito”?
50. Para sustentar este ponto, o Recorrente, nas alegações do recurso (p. 15 e ss.), destaca certas passagens das suas declarações prestadas em audiência de julgamento e do depoimento da testemunha (…).
51. Antes do mais, há que concordar, pelo menos em parte, com a Recorrida quando esta afirma que “as alegações do Recorrente são particularmente confusas no que respeita às pretendidas alterações à decisão sobre a matéria de facto” (v. p. 12 da respetiva resposta).
52. Por seu turno, a Chamada alega que “[n]ão se entende qual o propósito deste aditamento quando se encontra dado como provado, no facto provado 3: A referida campanha designada por “Fans of the World Cup” foi certificada em 16 de Abril de 2014, constando o Autor como o criador da fotografia abaixo identificada, a qual está publicada na página de internet www.(...).com” (p. 11 da respetiva resposta).
53. Efetivamente, resulta do facto provado n.º 4, que “[f]oi exibido um vídeo, no dia da inauguração do Hotel Pestana CR7 Lisboa, o qual ocorreu a 2 de Outubro de 2016, pertencente à Ré, do qual consta a seguinte fotografia, sem autorização e conhecimento do Autor”.
54. Resulta, pois, da matéria de facto já provada, que a utilização da fotografia foi feita sem qualquer autorização do Autor.
55. Já quanto à questão de saber se a Recorrida ou Chamada podem, nos presentes autos, ser civilmente responsabilizados por tal utilização, tal depende de outros factos, designadamente os factos provados n.ºs 9 e 10, sobre os quais o tribunal não viu razões para alterar (v. resposta à Questão 2), e do seu tratamento devido em sede de Direito.
56. Nestes termos, o recurso neste ponto deve ser julgado improcedente.
Questão 4
Deve ser aditado aos factos provados que “[a] R. é uma empresa que se dedica a investimentos turísticos, associada à imagem do jogador de futebol (…), pelo que a exposição, reprodução e lançamento no comércio, da fotografia atrás reproduzida, violou flagrantemente o direito de autor do A.
57. Conforme salienta a Recorrida a p. 11 da resposta “[p]ara além de se realçar que, afinal, o Recorrente reconhece e confessa que a R. é uma empresa que se dedica a investimentos turísticos (e não à atividade de publicidade), é totalmente incompreensível a ligação feita entre o jogador (…) e o suposto direito de autor do Recorrente, nem donde decorrem as elucubrações e as conclusões que o Recorrente faz a este propósito.”.
58. Por seu turno, salienta aqui a Chamada que “[e]m lado nenhum ficou provado que, pelo facto da R. Pestana ser uma empresa ligado ao jogador (…) houve um dano acrescido por parte do Recorrente… Este tenta incessantemente tirar de alguma forma “lucro” do facto do Recorrente Pestana estar associado a este jogador, mas a verdade é que nada disso ficou provado… Nem este demonstra de alguma forma esse nexo nas suas alegações.” (p. 13 da respetiva resposta).
59. Da nossa parte, entendemos que, em bom rigor, dos factos provados apenas devem constar os factos essenciais, ou seja, aqueles que identificam o direito que constitui a causa de pedir (factos essenciais nucleares) e aqueles que, não desempenhando tal função, se revelam, ainda, imprescindíveis para a procedência da ação (factos essenciais complementares). Já os factos instrumentais, servindo como indícios ou prova indireta de factos essenciais, nem sequer terão de ser objeto de um juízo probatório específico na 1.ª instância, bastando que sejam revelados na motivação da decisão da matéria de facto (neste sentido, vide, António Santos Abrantes Geraldes, Luís Filipe Pires de Sousa e Paulo Pimenta, “Código de Processo Civil Anotado”, Volume I, Almedina, 3.ª ed., 2023, p. 30 e António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2014, 2.ª ed., p. 237).
60. É manifesto que o Recorrente traz à colação a relação da Recorrida com o conhecido jogador de futebol, (…), para indiciar o que denomina, de forma manifestação conclusiva, como flagrante violação, por parte da Ré, do seu direito de autor sobre a fotografia descrita no facto provado 3.
61. Ou seja, tal relação entre a Recorrida e o famoso jogador de futebol é apenas e tão só instrumental para a prova do facto essencial já analisado aquando da resposta à questão 2 “a elaboração e projeção/ difusão do vídeo da inauguração do Hotel Pestana CR7, no qual está reproduzida a fotografia da autoria do Recorrente foi da efetiva responsabilidade da Recorrida e que, pelos danos causados ao Recorrente pela utilização indevida e sem consentimento da fotografia da sua autoria, a Ré Recorrida é responsável.”.
62. Contudo, pelas razões já supra consignadas em 42, não se vislumbra como é que o facto instrumental em causa, possa servir de suporte suficiente para a prova do dito facto essencial.
63. Não se veem, pois, razões para alterar a matéria de facto nos termos requeridos.
Questão 5
Deve ser aditado aos factos provados que “[o] A. perdeu o lucro que desejava com a divulgação da campanha “Fans of the World Cup” para o ano de 2018, bem como para outras companhas acordadas contratualmente com o modelo da fotografia, e, ainda, assistiu a uma perda da eficácia distintiva da fotografia”?
64. Alega o Recorrente que “perdeu o lucro que desejava com a divulgação da campanha “Fans of the Worl Cup” para o ano de 2018, bem como para outras companhas acordadas contratualmente com o modelo da fotografia, e, ainda, assistiu a uma perda da eficácia distintiva da fotografia” (p. 18 e ss. das alegações de recurso).
65. Para sustentar este ponto, o Recorrente destaca certas passagens das suas declarações prestadas em audiência de julgamento.
66. A Recorrida, por sua vez, alega aqui que “é desde logo manifesto que, da prova produzida, não resultou de forma nenhuma provada toda essa matéria. Na verdade, só o próprio Recorrente abordou a mesma e, mesmo assim, sem explicar nem demonstrar de forma nenhuma essa suposta “perda de eficácia distintiva” (p. 14 da resposta).
67. Neste âmbito, após indicar os meios de prova que sustentam a sua perspetiva, destaca a Recorrida que:
“antes da exibição do vídeo da inauguração do hotel da Recorrida, a fotografia em causa já havia sido abundantemente difundida através campanhas publicitárias da MEO e da Luzlisboa, centradas nessa mesma fotografia. Ora, contrariamente ao que sucedera nessa campanhas, no vídeo em apreço a fotografia surge no meio de  centenas de outras fotografias que o compunham, foi projetado durante tão somente 108 segundos na fachada do hotel, sendo que, nesses 108 segundos, a mencionada fotografia apenas apareceu por 3 vezes durante 1 segundo de cada vez e, repete-se, sempre no meio de centenas de outras do mesmo tipo. Atente-se a propósito ao documento junto pela Chamada OCubo com a sua contestação, a fls. 91, sobre o qual falaremos mais adiante, que mostra bem do que estamos a tratar.
Para além disso, essa fotografia apenas podia ser visualizada por alguns dos 250 convidados para o evento privado que ocorreu, sendo certo que qualquer um deles, mesmo que estivesse totalmente concentrado na projeção do vídeo, garantidamente não reconheceu e nem sequer reparou na fotografia.” (p. 27 da respetiva resposta).
68. Mais acrescenta a Chamada que “[p]retende o Recorrente convencer o Tribunal que, pelo facto da fotografia em causa nos autos ter sido usada numa festa privada, somente aberta aos convidados, como ficou claro dos depoimentos da testemunhas (…), que esta perdeu o seu efeito distintivo?” (p. 14 e ss. da respetiva resposta).
69. Da nossa parte, neste ponto, mesmo tomando em conta o tipo de evento em causa – inauguração de um Hotel -, e o tipo de uso da fotografia em discussão – exposição durante 1 segundo de cada vez, no meio de outras fotografias do mesmo tipo, num total de 3 segundos –, factualidade esta vertida para o facto provado n.º 11, cremos que assiste parcialmente razão ao Recorrente.
70. Efetivamente, decorre das regras da experiência comum que a eficácia distintiva, em especial, o poder de atração de uma imagem, neste caso, de uma fotografia, vai diminuindo com o respetivo uso, quer seja autorizado ou não.
71. Compreende-se, por isso, o declarado pelo Autor em sede de julgamento, no sentido da desvalorização do valor comercial da fotografia, desde logo, quando a utilização da fotografia não é inédita e tenha sido, inclusive, “roubada” (cf. gravação de declarações a partir de 00:52:45).
72. Nestes termos, consideramos que o uso da fotografia em causa efetivamente implicou uma diminuição do respetivo valor comercial (em medida obviamente indeterminada). Já quanto a uma perda (total) da sua capacidade distintiva, julga-se que tal é manifestamente exagerado perante o único uso da fotografia já descrito no facto provado n.º 11.
73. Por último, quanto à alegada perda de lucro que o Autor desejava com a divulgação da campanha “Fans of the World Cup” para o ano de 2018, bem como para outras companhas acordadas contratualmente com o modelo da fotografia, tal factualidade não resulta efetivamente sustentada em meios de prova produzidos em sede de audiência. Aliás, nas passagens citadas nas alegações de recurso (p. 18-19), nada é referido sobre a campanha “Fans of the World Cup” ou outras campanhas.
74. Assim sendo, deve ser apenas aditado à matéria de facto, o seguinte facto provado A utilização da fotografia descrita em 11, provocou uma diminuição da eficácia distintiva da fotografia e do seu respetivo valor comercial”.
Questão 6
Deve ser aditado aos factos provados que “[a] R. violou os direitos de autor do A., porquanto, procedeu à utilização, exposição e reprodução da imagem em apreço, sem solicitar ao A. a respetiva autorização para o efeito” e ainda “[a]penas o A. detinha o direito exclusivo de fruir e utilizar a sua obra artística”?
75. Neste ponto, alega a Recorrida que tratam-se aqui de meras conclusões de direito, que jamais poderão fazer parte do elenco de quaisquer factos provados ou não provados (cf. p. 28 da resposta).
76. Também a Chamada alega quanto à primeira parte da questão “que o Recorrente pretende aditar é uma conclusão de direito, pelo que não [tem] lógica fazer parte dos factos provados”. Já quanto à segunda parte da questão alega que “[o] Recorrente não alegou rigorosamente nada sobre este facto que pretende aditar, não se sabendo de onde pretende o mesmo retirar a sua prova.” (p. 19 da respetiva resposta).
77. No que toca à violação de direitos de autor, concordamos com a Defesa no sentido de que a “factualidade”, trata de matéria de direito.
78. Também a questão sobre o conteúdo do direito de autor e respetivos direitos de exclusivo, trata de matéria de Direito.
79. Já quanto à alegada utilização, exposição e reprodução da imagem controversa, por parte da Ré, remetemos para o já consignado na resposta à Questão 2.
80. Nestes termos, o recurso deverá aqui improceder.
Questão 7
Deve ser aditado aos factos provados que “[a] fotografia do A. somente se encontrava disponível para aquisições onerosas na internet, nomeadamente no seu site oficial, com a indicação de proteção de direito autorais e de imagem, não sendo, por isso, de download ou utilização livre”?
81. Para sustentar este ponto, o Recorrente destaca certas passagens das suas declarações prestadas em audiência de julgamento (p. 19 e ss. das alegações de recurso).
82. Nesta sede, alegou a Recorrida que “[t]ambém este facto, que nem sequer foi alegado, não resultou demonstrado fosse de que forma fosse, pelo que carece de qualquer fundamento a pretendida inclusão deste facto como Facto Provado.” (p. 30 da resposta).
83. Por sua vez, a Chamada salienta que “já se encontra provado que a imagem em causa foi certificada em 16 de Abril de 2014, constando o Autor como o criador da fotografia abaixo identificada, a qual está publicada na página de internet www.(...).com (facto provado 3).” (p. 21 da respetiva resposta).
84. Da nossa parte, reiteramos aqui o que já deixamos consignado supra em 54, ou seja, que dos factos provados apenas devem constar, em bom rigor, os factos essenciais.
85. Nem se vislumbra sequer como é que a factualidade ora em causa acrescenta algo de essencial ao já consignado no facto provado n.º 3, que é do seguinte teor “[a] referida campanha designada por “Fans of the World Cup” foi certificada em 16 de Abril de 2014, constando o Autor como o criador da fotografia abaixo identificada, a qual está publicada na página de internet www.(...).com.”.
86. Por outro lado, resultou não provado que “[a] fotografia acima mencionada foi usada pela Chamada porque se encontrava disponível na internet, em vários e diversos sites de utilização livre, sem que nela estivesse aposta qualquer informação do seu autor, de quem a tirou, do nome do fotógrafo, ou que estava sujeita a direitos de autor.”. Ou seja, o tribunal a quo pronunciou-se sobre este facto essencial, não em termos da procedência da ação, mas sim em sede de exceção perentória alegada pela Defesa.
87. Não se vê, pois, qualquer alteração da matéria de facto que deva aqui ser feita.
Questão 8
O facto não provado B, com o teor “[o] Autor despendeu com a aquisição da camisola original da seleção portuguesa, as sessões fotográficas e a caracterização do modelo cerca de 8.000$00 (USD)”, deve ser julgado provado?
88. Para sustentar este ponto, o Recorrente destaca certas passagens das suas declarações prestadas em audiência de julgamento (p. 25 e ss. das alegações de recurso).
89. Nesta sede salienta a Recorrida que “[p]ara além dessas declarações de parte, nenhum outro elemento de prova foi apresentado, sendo certo que nada teria impedido o Recorrente de, nomeadamente, juntar documentos comprovativas das alegadas despesas realizadas. Porém, não o fez, provavelmente porque não existem ou não servem os propósitos do Recorrente.” (p. 29 da resposta).
90. Por seu turno, salienta a Chamada que “do referido trecho [das declarações do Autor] não decorre qual o valor que o Autor pagou com o trabalho. Pelo que, não se entende como pretende dar o Recorrente como provado com base neste depoimento o facto, devendo ser desatendido o pretendido pelo Recorrente” (p. 23 da respetiva resposta).
91. Neste âmbito, consignou-se na sentença recorrida quanto a este facto B, que “apenas são mencionados pelo Autor …, sem qualquer elemento documental a comprovar as referidas declarações, não sendo as declarações das partes, por si só, idóneas a considerar aquela factualidade como provada.” (p. 9).
92. Tal como salienta o Recorrente, foi efetivamente dito pelo mesmo, em audiência que “para a produção gastou 8 mil dólares americanos porque tinha profissionais a trabalhar com ele, um maquilhador profissional, um foto-assistente profissional, o casting levou três semanas e disse que a sessão fotográfica em si durou um dia, sendo que um dia neste caso não é de oito horas, que ele foi para lá das 12 horas de trabalho…. mais o aluguer do foto estúdio…” (cf. gravação aproximadamente a partir de 00:37:45).
93. Contudo, tal como salienta a sentença recorrida tais declarações não foram corroboradas por qualquer outro meio de prova.
94. Nada temos, assim, a apontar ao juízo probatório efetuado pelo tribunal a quo. Com efeito, como é sabido, se a prova por declarações de parte deve merecer, em abstrato, a mesma credibilidade das demais provas legalmente admissíveis, sendo apreciada livremente pelo tribunal, normalmente é insuficiente para valer como prova convincente, se desacompanhada de prova corroborante que a sustente (neste sentido, Ac. TRC de 26-04-2022, processo n.º 63725/20.8YIPRT.C1).
95. Ora, tendo o Autor, segundo o que declarou, contratado diversas pessoas e alugado um estúdio para a produção em causa, é efetivamente de estranhar que mais nenhuma prova tenha sido apresentada para sustentar as despesas alegadas, nomeadamente recibos do pagamento de serviços contratados ou bens eventualmente por si adquiridos (em especial, a camisola da seleção).
96. Não se vislumbram, pois, razões para alterar a matéria de facto nos termos requeridos.
Questão 9
Com base em responsabilidade civil extracontratual (artigo 483.º do Código Civil), a decisão deverá ser em sentido oposto da sentença recorrida, sendo certo que a Ré Pestana CR7 Lisboa Hotel Investimentos Turísticos, S.A., é a efetiva responsável pelo ressarcimento dos danos provocados ao A. através da utilização sem consentimento de uma obra artística da sua autoria e uso exclusivo, pois foi esta quem ordenou a realização do vídeo onde consta a imagem sub judice e instruiu a Chamada para o efeito?
97. Conforme resulta das Conclusões de recurso, em especial, n.ºs 44 a 101, o Recorrente baseia a sua pretensão indemnizatória contra a Recorrida, no disposto nos artigos 483.º e 564.º, n.º 1, do Código Civil, em conjugação com os artigos 211.º, 195.º, 166.º, 165.º, 149.º, 1.º, n.º 2.º, n.º 2, al. h), 67.º, n.º 1, 68.º, 11.º, 12.º e 41.º, n.º 3, do Código de Direito de Autor e Direitos Conexos.
98. Neste ponto, entende o Recorrente, em suma, que “[a]o contrário do que decidiu o Tribunal a quo os pressupostos de responsabilidade civil extracontratual encontram-se preenchidos, nomeadamente a atuação ilícita por parte da Recorrida”, sendo certo que “[o] facto que causou diversos danos ao Recorrente foi a utilização, exposição e reprodução por parte da Recorrida da imagem da qual o primeiro detinha os respetivos direitos de autor, sem ter solicitado a respetiva autorização para o efeito” (Conclusões n.º 44 e 49).
99. Mais salienta o Recorrente, que como autor da obra fotográfica, ao abrigo do disposto no artigo 67.º, n.º 1, do Código de Direito de Autor e Direitos Conexos tem “o direito exclusivo de fruir e utilizar a obra, no todo ou em parte, no que se compreendem, nomeadamente, as faculdades de a divulgar, publicar e explorar economicamente por qualquer forma, direta ou indiretamente, nos limites da lei e nas formas de utilização expressamente previstas no artigo 68.º do mesmo código.” (Conclusão n.º 57), sendo certo que “[e]m momento algum poderia a Recorrida divulgar a obra aqui em causa, sem a prévia autorização do Recorrente – artigo 149.º, n.º 1 do CDADC – sendo que, dependia igualmente de autorização a comunicação da obra em qualquer lugar público, por qualquer meio que sirva para difundir sinais, sons ou imagens.” (Conclusão n.º 63).
100. Já a Recorrida salientou, nesta sede, que “é absolutamente indiscutível que foi a sociedade OCubo quem criou, elaborou e projetou/divulgou o vídeo de inauguração com a técnica de “vídeo mapping”, e que a Recorrida não teve nenhuma intervenção na elaboração do vídeo que foi integralmente realizado e projetado pela sociedade Ocubo  (facto 9. e 10. dos factos Provados), é manifesto que não pode ser atribuída à Recorrida qualquer responsabilidade civil.” (p. 51 da resposta).
101. Mais alegou a Recorrida que “tal como também reconhece a douta sentença recorrida, na presente ação apenas está em causa a eventual responsabilidade civil da Recorrida e de mais ninguém, sendo assim absolutamente irrelevante saber se a qualquer outra entidade, designadamente à Chamada Ocubo, pode ou não ser assacada qualquer tipo de responsabilidade.” (p. 50 da resposta).
102. Por sua vez, a Chamada salienta o seguinte: “[e]ntende o Recorrente que a atuação do Recorrido é claramente ilícita, na medida em que divulgou a obra da autoria do Recorrente sem o seu necessário prévio consentimento ou autorização, para fins de publicidade, violando assim o seu direito de autor, mas como se viu na análise da matéria de facto, quem realizou o vídeo foi a Chamada, como consta, aliás do facto 10 da matéria dada como provada.” (p. 24, n.º 93, da respetiva resposta).
103. Mais salienta a Chamada que esta “não pode ser condenado na presente ação: A esse propósito veja-se o Acórdão da Relação do Porto, no processo 51664/18.7YIPRT.P1, datado de 15.06.2022, disponível em www.dgsi.pt : “O incidente de intervenção acessória não muda a causa de pedir ou o pedido da acção, esta não passa a ter também por objecto a relação que justifica o chamamento e, nela, o réu que fez o chamamento não pode formular pedidos contra o interveniente acessório, nem este pode ser condenado com fundamento na relação jurídica que funda o direito de regresso.”” (p. 25, n.º 99, da respetiva resposta).
104. Nestes termos, conclui a Chamada que “não se tendo provado o facto ilícito por parte do Recorrido Pestana e não podendo o aqui Recorrido OCUBO ser condenado por força da forma como foi configurada processualmente a ação, embora não se admita que este tenha atuado ilicitamente, ou que tenha resultado minimamente provado que este tenha atuado de tal forma, deverá improceder a alegação do Recorrente.” (p. 26-27, n.º 101, da respetiva resposta).
105. Vejamos.
106. A verificação de responsabilidade civil extracontratual pela violação de direito de autor obedece aos requisitos tradicionais previstos no art. 483.º do CC, reiterados no art. 203.º do CDADC - facto, ilícito, dano e nexo de causalidade, e imputação subjetiva ou culpa.
107. Não é objeto de controvérsia que a fotografia descrita no facto provado n.º 3, constitui uma criação intelectual protegida pelo direito de autor, nos termos previstos nos artigos 1.º, n.º 1, 2.º, n.º 1, alínea h) e 167.º, n.º 1, al. a), Código de Direito de Autor e Direitos Conexos.
108. Igualmente, inexiste controvérsia sobre quem foi o criador da fotografia em causa e que “[a]ssiste ao autor, entre outros, o direito exclusivo de fazer ou autorizar, por si ou pelos seus representantes: i) … a exibição ou exposição em público [da obra] ou [q]ualquer utilização em obra diferente” (artigo 68.º, n.º 2, alíneas b) e h), do Código de Direito de Autor e Direitos Conexos).
109. Por sua vez, é incontroverso que a utilização da fotografia descrita nos factos provados 4 e 11, ocorreu sem autorização por parte do ora Autor, o que consubstancia, evidentemente, um facto ilícito.
110. A controvérsia incide, em essência, sobre se tal utilização ilícita da fotografia pode ser imputada à Recorrida.
111. Quanto à questão assim colocada, e atento os factos provados n.º 9 e 10, haverá que responder nos exatos termos em que o fez o tribunal a quo.
112. Neste âmbito, deixou-se consignado na sentença recorrida que “dos factos considerados como provados, não se verifica uma actuação ilícita por parte da Ré, uma vez que a mesma apenas delegou a elaboração do vídeo na Chamada, não tendo qualquer intervenção na elaboração do vídeo, selecção das fotografias ou exibição do vídeo, não lhe sendo exigível qualquer tipo de supervisão quanto às fotografias usadas pela Chamada.” (p. 1).
113. É forçoso concordar-se com esta asserção, desde logo, porquanto, segundo os factos provados n.ºs 9 e 10:
“9. A elaboração e projeção/difusão do vídeo da inauguração do Hotel Pestana CR7, no qual está reproduzida a fotografia em causa nestes autos, foi efetuada pela Chamada OCUBO CRIATIVO – Atividades Artísticas e Literárias, Lda., contratada pela Ré para realização do evento de inauguração.
10. A Ré não teve qualquer tipo de intervenção na elaboração do vídeo – nomeadamente, na seleção de imagens ou fotografias –, nem na sua projeção.”
114. Por outro lado, tal como constatou a sentença recorrida, “inexistindo qualquer relação de dependência ou subordinação [entre a Recorrida e a Chamada], uma vez que a Ré apenas solicitou a elaboração do vídeo tendo por base o tema do desporto, ficando a cargo da Chamada a elaboração do mesmo conforme melhor entendeu e com o uso das imagens sem qualquer interferência por parte da Ré”, inexistem elementos que sustentem a existência de uma relação de comitente/comissário, pelo que se mostra afastada a aplicação do artigo 500.º, do Código Civil.
115. Por último, quanto a uma eventual responsabilidade da Chamada, concordamos com a sentença recorrida quando constata que “tal responsabilidade apenas poderia ser assacada à Chamada nos termos da responsabilidade civil extracontratual. Porém, verifica-se que a Chamada se encontra a intervir nos presentes autos enquanto interveniente acessório”, e, por isso, “uma vez que a Chamada, nos termos acima mencionados, não influencia a relação jurídica processual desenvolvida entre o Autor e a Ré, nela não pode haver sentença de condenação desta.”.
116. Com efeito, intervindo aqui a Chamada apenas a título de intervenção acessória provocada, a sua intervenção circunscreve-se à discussão das questões que tenham repercussão numa eventual ação de regresso da Ré contra aquela (artigo 321.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil).
117. Nada há, pois, a apontar à sentença recorrida, devendo o recurso ser julgado integralmente improcedente, apesar da procedência parcial de um dos pontos de impugnação da matéria de facto (cf. resposta à Questão 5).
118. Em consequência, as questões subsidiariamente suscitadas pela Recorrida e Chamada, consideram-se prejudicadas.
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IV. Decisão
Pelo exposto, acorda-se em aditar aos factos provados fixados na sentença recorrida, sob o n.º 13, o seguinte facto: “A utilização da fotografia descrita em 11, provocou uma diminuição da eficácia distintiva da fotografia e do seu respetivo valor comercial.”.
No mais, acorda-se em julgar o presente recurso improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelo Recorrente (art. 527.º n.º1 e 2 do Código de Processo Civil).
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Lisboa, 05-06-2024
Alexandre Au-Yong Oliveira
Bernardino Tavares
José Paulo Abrantes Registo

[1] Cf. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa, em Código de Processo Civil Anotado - Volume I, Almedina, 3.ª ed., p. 793.