Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | URBANO DIAS | ||
Descritores: | SOCIEDADE ANÓNIMA ASSEMBLEIA GERAL | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/08/2003 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | CONFIRMADA. | ||
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Sumário: | A lei é omissa quanto ao que deve acontecer no final de mandato do presidente da mesa da assembleia geral de uma sociedade anónima, mas a situação é semelhante à dos administradores e, neste caso, a lei prescreve que, findo o mandato, eles permanecem em funções até nova designação (art. 391º, nº 3, do CSC). É legítima a aplicação da analogia ao caso presente, pelo que o presidente da mesa da assembleia geral de uma sociedade anónima mantém-se em funções mesmo que já tenha terminado o prazo do seu mandato e até à designação de um novo. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1 – Relatório Maria ... intentou, no tribunal de comércio de Lisboa, acção ordinária contra S ... S. A., pedindo que fosse decretada a anulação das deliberações sociais tomadas na assembleia geral da R. de 29 de Outubro de 2001 que teve o seu início após o accionista Caetano ... ter abandonado os trabalhos da assembleia que estava em curso e em que participou este accionista juntamente com o ex-presidente (no seu entender) da mesa da Miguel ... A R., regularmente citada, não contestou, razão pela qual foram julgados confessados os factos articulados pela A. No saneador, o tribunal foi julgado competente, as partes legítimas e o processo isento de nulidades. Foi proferida sentença, julgando improcedente a acção. Com esta decisão não se conformou a A. que apelou para este Tribunal, pedindo a sua revogação, tendo concluído da seguinte forma: A norma constante do nº 4 do art. 391º do CSC é excepcional, já que consagra para a cessação de funções dos administradores das sociedades anónimas uma disciplina oposta para a que vigora para o comum das relações do mesmo tipo que é a da cessação do mandato findo o prazo para o qual foi conferido; Aquela norma, porque excepcional, não se aplica analogicamente a cessação de funções do presidente da assembleia geral; O regime a seguir no caso de ter terminado o mandato do presidente da assembleia sem que tenha havido nova eleição, é o previsto no nº 3 do art. 374º do C.S.C.; A expressão «falta de pessoas eleitas nos termos do disposto no número anterior» constante do nº 3 do art. 374º do C.S.C., abrange necessariamente a situação em que não se procedeu à eleição de novo presidente da assembleia após a cessação do mandato conferido ao anterior titular do cargo; Cessando o mandato do presidente da assembleia o mesmo deixa automaticamente de poder exercer tais funções que passarão a ser exercidas, consoante os casos, pelas pessoas referidas nos números 3 ou 4 do art. 374º do C.S.C.; A reunião que decorreu em paralelo com a assembleia presidida pela apelante em que estiveram presentes Miguel ..., anterior presidente da mesa, e o accionista Caetano ..., não é válida, sendo consequentemente nulas todas as deliberações aí tomadas, por se tratar de assembleia não convocada nos termos do disposto na al. a) do nº1 conjugada com o nº 2, ambos do art. 56º do CSC; Ainda que o alegado presidente da assembleia entendesse que as suas funções se mantinham, tal facto não legitima a realização da assembleia em lugar diferente daquele em que se encontrava a decorrer, concedendo quando muito aos accionistas o direito de votar conta as deliberações que viessem a ser aprovadas e posteriormente impugnar essas deliberações com aquele fundamento; Mesmo que se entenda que o presidente da mesa se mantém em funções após o termo do mandato e que é legítima a condução por parte deste da assembleia geral dos autos, era seu dever advertir os presentes que aquela assembleia se iria realizar em local diferente daquele em que estava a decorrer, para que os mesmos ajuizassem da legitimidade de tal posição; Deve assim, em qualquer caso, a referida assembleia considerar-se como não convocada, por se tratar de situação equivalente à reunião em local e hora diversos do constante do aviso convocatório, e, consequentemente, serem declaradas nulas as deliberações aí tomadas – al. a) do nº 1 do art. 56º do C.S.C.; A decisão recorrida violou o disposto nos arts. 374º, nº 2, 3 e 4, 391º, nº 4, ambos do C.S.C. e art. 11º do C. Civil e ainda o art. 56º, nº 1, al. a) do C.S.C., pelo que deve ser revogada e substituída por outra que declare nulas as deliberações tomadas na assembleia geral da sociedade apelada de 29 de Outubro de 2001, presidida por Miguel ... e em que esteve presente o accionista Caetano ... A apelada não contra-alegou. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. 2 – Os factos provados são os seguintes: 1 – S ., S.A., encontra-se matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o nº 024384; 2 - Tem por objecto social a aquisição e a exploração de imóveis próprios, rústicos ou urbanos e tem o capital social de 200.000.000$00, dividido em 200.000 acções de 1.000$00 cada um; 3 - A A. é accionista da R., sendo titular exclusiva de 21 000 acções e contitular de 113.398 acções, das quais detém todos os direitos sociais, incluindo os direitos de voto; 4 - No dia 27 de Setembro de 2001 realizou-se nas instalações situadas na Av. António José de Almeida uma assembleia geral de accionistas da R., presidida por Miguel ...; 5 - Encontravam-se presentes a A. e os accionistas Martinho ... e Caetano ..., por si e em representação de Carlos ... , Mónica ..., Duarte ... e António ... e um vogal do Conselho de Administração Nuno ... 6 - Os accionistas referidos são titulares das seguintes acções: Caetano ... - 9 083 acções; Carlos ... - 9 804 acções; Mónica ... - 9 083 acções; Duarte ... - 9 083 acções; António ... - 8 684 acções; Martinho ... - 300 acções. 7 - Na lista de presenças entregue à A. apenas lhe foi reconhecida a titularidade de 21. 700 acções; 8 - A contitularidade e o exercício do direito de voto relativamente às restantes 111.3 398 acções achava-se certificada através de comunicação enviada à sociedade pela instituição bancária onde as referidas acções se encontravam depositadas, recebida em data anterior à assembleia geral; 9 - Tal contitularidade e a titularidade do direito de voto atribuído à A. eram do conhecimento do presidente da mesa, que em anteriores assembleias expressamente o havia declarado, e do accionista Caetano ...; 10 - O direito de voto exclusivo da A. relativo às 113.398 acções deriva de protocolos assinados em 1985 entre si e os accionistas da sociedade, Caetano ..., Carlos ..., Mónica ..., Duarte ... e António ...; 11 - Nos termos do referido protocolo, celebrado em virtude da transferência por parte da A. de acções da requerida para os referidos accionistas, foi acordado que todos os poderes inerentes às acções objecto de transferência seriam exercidos na sua plenitude pela A., designadamente o exercício do direito de voto; 12 - Apesar dos protestos da A. o presidente da Mesa, apoiado pelo accionista Caetano ..., manteve a decisão de apenas reconhecer à A. a titularidade e consequente direito de voto relativamente a 21 000 acções; 13 - Em consequência, o accionista Caetano ... foi erigido em accionista maioritário presente, representando, em nome próprio e dos seus representados, 45 017 acções; 14 - Foram assim tomadas várias deliberações aprovadas apenas com o voto favorável do accionista Caetano ..., entre as quais a não aprovação das contas dos exercícios de 1998, 1999 e 2000, a não designação dos membros dos órgãos sociais para o triénio 2001/2003, um voto de desconfiança à administração e a instauração de acção de responsabilidade civil contra os membros do conselho de administração; 15 - Aquando da discussão do último ponto da ordem de trabalhos, isto é, a designação dos membros dos órgãos sociais para o triénio 2001/ 2003 , o accionista Caetano ... propôs suspender a referida assembleia para continuar no dia 29/10/01, pelas 10.30 horas no mesmo local constante da convocatória, proposta que veio a ser aprovada com o voto do accionista proponente; 16 - No dia 29/10/01, pelas 10.30 h, na Av. António José de Almeida, nº X, em Lisboa, reuniu-se a assembleia geral de accionistas da sociedade, encontrando-se presentes a A. e os accionistas Caetano ... e Martinho ...; 17 - Encontravam-se também presentes Nuno ..., vogal do Conselho de Administração, Miguel ..., Presidente da Mesa, Manuel ..., presidente do conselho fiscal e Pedro ..., vogal do conselho fiscal, todos eleitos para o triénio 1998/2000; 18 - Encontrava-se também presente o Notário do 4º Cartório Notarial de Lisboa, cuja presença havia sido requisitada pela A.; 19 - No início da assembleia a A. ditou para a acta uma declaração justificando o nº de acções que representava e o motivo pelo qual lhe competia exercer a presidência da mesa, já que exercia o direito de voto de pelo menos 109.032 acções, sendo 21.700 acções depositadas em seu nome no Banco, S.A., conforme declaração que apresentou, 22.467 depositadas no Banco S. em seu nome e em nome de Helena ..., conforme declaração do banco em posse da sociedade e tendo a representação comum dessas acções sido conferida à A, conforme declaração entregue à R. e 65.165 acções divididas em cinco grupos de 13.033 acções, depositadas no Banco Santander em nome da A., de Helena Maria Lobo Guedes e, em relação a cada um dos grupos, em nome de António, Duarte, Caetano, Carlos Manuel e Mónica, conforme declaração do banco em posse da R.; 20 - Declarando ainda que a representação comum e o exercício do direito de voto dessas 65.165 acções foi conferido à A. nos termos de acordo escrito e protocolos assinados entre os titulares e entregues à 1ª R.; 21 - Invocando tais factos e ainda o termo do mandato dos anteriores membros dos órgãos sociais em 31 de Dezembro de 2000, declarou ainda a A. que lhe cabia a ela a presidência da mesa; 22 - Pelo que decidiu assumir a presidência da mesa, na qualidade de accionista com maior número de votos, designou como secretário o Dr. Martinho ..., decidiu que a acta da assembleia fosse certificada por notário, admitiu a presença na sala apenas dos accionistas identificados na lista de presenças, dos membros da administração cessante, do notário e do Dr. Nuno ..., que processaria a acta em computador e determinou a saída da sala das pessoas não referidas; 23 - Seguidamente Miguel ..., declarou manter a qualidade de presidente da mesa, invocando que a assembleia se tinha iniciado em 11 de Setembro de 2001 , saiu da sala, acompanhado pelo Dr. Manuel ... e Pedro ... bem como pelo accionista Caetano ...; 24 - Após a saída daquelas pessoas realizou-se uma assembleia de sócios sob a presidência da A.; 25 - Tendo sido elaborada a lista de presenças e discutido o único ponto da ordem de trabalhos - eleição dos membros dos órgãos sociais para o triénio 2001/2003; 26 - A proposta apresentada foi aprovada por unanimidade, tendo sido eleitos: Mesa da Assembleia Geral: Presidente: Martinho ..., Secretário: Ricardo ..., Bruno ..., Conselho de Administração Presidente: Manuel ..., Vogais: Antero ... Áurea ... Conselho Fiscal Efectivo: Leopoldo ... e Associados, representada por Leopoldo ... Suplente: José ... Vogais: Adrião ..., Rui ... 27 - Após a aprovação da proposta foram encerrados os trabalhos pelas 12.17 horas, tendo sido imediatamente lavrada a respectiva acta, assinada pela presidente da mesa, pelo secretário e pelo notário; 28 - Os membros da administração eleitos assumiram imediatamente funções, tendo recebido as chaves das instalações da sociedade e do cofre; 29 - Encontrando-se inscrita a eleição dos órgãos sociais para o triénio de 2001/2003 na respectiva matrícula da R.; 30 - O accionista Caetano ..., Miguel ... e Pedro ..., após a saída da sala onde decorria a assembleia geral, reuniram-se noutra sala das instalações da requerida, tendo solicitado o respectivo livro de actas; 31 - Da reunião referida em 30) foi lavrada uma acta que se encontra junta aos autos a fls. 35 e ss.; 32 - Nela foi deliberado por unanimidade nomear para fazer parte do conselho fiscal: Pedro ..., como presidente, Carlos ...; Manuel ... e Associados, SROC; Rosalba ..., como suplente; 33 - Na dita reunião foi nomeada a Mesa da Assembleia Geral e não foi nomeado qualquer Conselho de Administração, tendo o Presidente da Mesa declarado que se mantinha em funções o anterior Conselho de Administração até nova designação; 34 - Encontra-se inscrita na matrícula da requerida a nomeação do conselho fiscal a que se refere o facto nº 32. 3 – Quid iuris? Face às conclusões da apelante, somos confrontados com as seguintes questões: - quando cessa funções o presidente da mesa de uma assembleia geral de uma sociedade anónima? - as deliberações tomadas em 29/10/01 pela assembleia geral da apelada são nulas nos termos do art. 56º do C.S.C.? Vejamos. In casu, o Presidente da Mesa da Assembleia Geral, Miguel ..., foi eleito, tal como os membros do Conselho de Administração, para o triénio 1998/2000. No dia 27 de Setembro de 2001, realizou-se, nas instalações da apelada, uma assembleia geral, tendo presidido à mesma Miguel .... Até então não se tinha procedido a eleições de novos corpos sociais. A A., ora apelante esteve presente e nenhum problema levantou a respeito da presidência da mesa da assembleia geral. Aquando da designação dos novos órgãos sociais para o triénio 2001/2003, o accionista Caetano ... propôs a suspensão da assembleia e a sua continuação para o dia 29/10/01, no mesmo local, o que foi aprovado. Neste dia 29/10/01, a quando da realização da continuação da assembleia, é que a ora apelante levantou o problema da legitimidade do presidente, defendendo que o mesmo tinha cessado funções em 31 de Dezembro de 2000. Para tal fundamentou-se no disposto nos nºs 2, 3 e 4 do art. 374º do C.S.C.. Será que a razão lhe assiste? O nº 2 prescreve o seguinte: “O contrato de sociedade pode determinar que o presidente, o vice-presidente e os secretários da mesa da assembleia geral sejam eleitos por esta, por um período não superior a quatro anos, de entre os accionistas ou outras pessoas”. E o nº 3 textua: “No silêncio do contrato, na falta de pessoas eleitas nos termos do número anterior ou no caso de não comparência destas, servirá de presidente da mesa da assembleia geral o presidente do conselho fiscal ou do conselho geral e de secretário um accionista presente, escolhido por aquele”. Finalmente, o nº 4 diz o seguinte: “Na falta ou não comparência do presidente do conselho fiscal ou do conselho geral, presidirá à mesa da assembleia geral um accionista, por ordem do número de acções de que sejam titulares, em igualdade do número de acções, atender-se-á, sucessivamente, à maior antiguidade como accionista e à idade”. No caso presente poderemos falar em falta de membros da mesa? Salvo o sempre devido respeito por opinião em contrário, entendemos que o preceito supra citado não se aplica ao caso presente. Com efeito, o presidente da assembleia da mesa da assembleia geral foi eleito por um período de três anos. Tal prazo foi ultrapassado sem que fossem feitas novas eleições. Ora, o que parece lógico é que, enquanto não se realizarem novas eleições, o presidente mantém-se em funções. É que, como se diz – e bem – na sentença impugnada, o presidente da assembleia tem funções permanentes que ultrapassam em muito a assembleia propriamente dita. Daqui a legítima conclusão que o regime aplicável é o que consta do nº 4 do art. 391º do C.S.C., relativamente aos administradores, segundo o qual estes se mantêm em funções até nova designação, findo o período de tempo de eleição. Esta é, aliás, a regra do nosso direito em relação a todos os cargos derivados de eleição: os eleitos mantêm-se em funções até à tomada de posse dos novos eleitos. A própria apelante acabou por aderir a esta tese na medida em que não colocou entraves no início da assembleia realizada em 27 de Setembro de 2001 – só no início da continuação da mesma, em 29 de Outubro seguinte, é que se lembrou de suscitar tal questão. Mas se no início da assembleia, Miguel ... presidiu à mesma, qual a razão de não presidir à continuação da mesma? Não faria sentido tal alteração: só com nova eleição, ele deixará aquele cargo, a não ser que seja novamente eleito. Não assiste razão à apelante neste ponto concreto na justa medida em que não tem aplicação aqui o preceituado no art. 374º, nºs 3 e 4 do C.S.C.. Este preceito refere-se, como é salientado na sentença recorrida, aos casos em que o contrato de sociedade prevê a eleição do presidente pelos sócios, mas esta ainda não tenha ocorrido ou aos casos em que o presidente tenha renunciado ou tenha sido demitido. No caso de o presidente já ter sido eleito, ele mantém-se em funções, mesmo depois de ultrapassado o prazo de eleição, até que novas eleições determinem um novo presidente: é o que a lei estabelece para o caso dos administradores – estes mantêm-se em funções até nova designação, tal como estipula o nº 4 do art. 391º do C.S.C.. Compreende-se que assim seja: os administradores são designados por um período fixado pelo contrato de sociedade não excedente a quatro anos civis – é o que estabelece o nº 3 do art. 391º do C.S.C. Por sua vez, o nº 2 do art. 374º do mesmo diploma preceitua que o contrato de sociedade pode determinar que o presidente seja eleito por esta por período não superior a quatro anos, de entre os accionistas ou outras pessoas. É evidente a analogia das duas situações, razão pela qual, de acordo com o preceituado no art. 10º do C. Civil, entendemos ser aplicável aos presidentes da mesa da assembleia geral o regime relativo aos administradores. As normas excepcionais são aquelas que consagram, para certos casos, soluções contrárias às dos princípios gerais de direito admitidos em determinado sistema (cfr. Rodrigues Bastos, in Das Leis, sua Interpretação e Aplicação, Segundo o Código Civil de 1966 – 2ª edição -, pág. 45). Como já tivemos oportunidade de dizer, a regra da manutenção dos eleitos nos seus cargos até à posse dos novos é a regra no nosso direito. Daí que, ao contrário do que defende a apelante, o art. 391º, nº 4 do C.S.C. não tem carácter excepcional, razão pela qual é perfeitamente lícita a analogia. Na verdade, para que se possa recorrer à analogia é necessário que se falte uma precisa disposição na lei, que portanto a questão não se encontre já regulada por uma norma de direito e, ainda, que haja igualdade jurídica, na essência, entre o caso a regular e o caso regulado (cfr. Francesco Ferraro, in Interpretação e Aplicação das Leis, traduzido por Manuel de Andrade – 3ª edição -, in Colecção Studivm, pág. 160). A lei não precisa o que deve acontecer no final de mandato do presidente da mesa da assembleia geral ( é omissa a tal respeito ), mas a situação é semelhante à dos administradores e, neste caso, a lei prescreve que, findo o mandato eles permanecem em funções até nova designação, ut nº 3 do art. 391º do C.S.C.. É perfeitamente legítima a aplicação da analogia ao caso presente e, sendo assim, o presidente da mesa da assembleia geral de uma sociedade anónima mantém em funções mesmo que já tenha terminado o prazo do seu mandato e até à designação de um novo. In casu, foi perfeitamente legítima a atitude de Miguel ... ao manter-se firma na presidência da mesa da assembleia de 29 de Outubro de 2001, facto que já tinha acontecido em 27 de Setembro de 2201, malgrado ter já então o mandato terminado. A resposta à pergunta formulada é a seguinte: o presidente da mesa da assembleia geral só cessa funções quando tiver sido eleito outro. A 2ª questão que se coloca consiste em saber se a assembleia do dia 29 de Outubro presidida por Miguel ..., e que teve lugar nas instalações da apelada, produziu deliberações nulas por violação do art. 56º,nº 1, al. a) e 2 do C.S.C.. De acordo com o 1º preceito referido, são nulas as deliberações dos sócios tomadas em assembleia geral não convocada, salvo se todos o sócios tiverem estado presentes ou representados. Nenhuma objecção foi feita à assembleia que teve lugar no dia 27 de Setembro de 2001. Já foi referido que, nesta última assembleia, aquando da discussão do último ponto da ordem de trabalhos, ou seja, da designação dos membros para o triénio 2001/2003, o accionista Caetano ... propôs suspender a mesma para continuar no dia 29/10/01, pelas 10.30 horas, no mesmo local constante da convocatória, proposta que veio a ser aprovada. Se a 1ª assembleia tinha sido bem convocada – e isso ninguém põe em dúvida -, não vemos razão para dizer que a continuação daquela tenha infringido o art. 56º, nº 1, al. a) do C.S.C.. Estando presentes os accionistas que fizeram quorom, estes deliberaram, sob proposta de um deles, o adiamento para outro dia a realizar no mesmo local e a hora determinada. Também não se pode dizer que tenha sido violado o nº 2 do preceito supra referido, na medida em que este estipula que “não se consideram convocadas as assembleias cujo aviso convocatório seja assinado por quem não tenha essa competência, aquelas de cujo aviso convocatório não constem o dia, hora e local da reunião e as que reúnam em dia, hora e local diversos dos constantes do aviso”. Perante a iniciativa da apelante de tomar a presidência da mesa da assembleia geral, sem qualquer legitimidade para isso, é que Miguel ..., invocando a qualidade de presidente da mesa da assembleia, decidiu sair da sala, acompanhado de Dr. Manuel ... e Pedro ... bem como do accionista Caetano ..., tendo-se reunido noutra sala das instalações da requerida, ora apelada, tendo solicitado o livro de actas e tendo lavrado a respectiva acta ( cfr. fls. 35 e ss. ). O que se pode censurar é a conduta da apelante que, apesar de até então se ter conformado com as regras praticadas na assembleia de 27 de Setembro de 2001, já não teve o mesmo comportamento em relação à continuação da mesma realizada a 29 de Outubro de 2001. De resto, não vemos que tenha havido violação das normas invocadas pela apelante nas suas conclusões. A continuação da assembleia foi previamente anunciada perante os sócios presentes no dia 27 de Setembro de 2001. Foi também anunciada a hora e o local em que a mesma continuaria. Tudo isto foi respeitado pelo então presidente da mesa da assembleia, Miguel ... Nada aconselhava a apelante a intitular-se presidente da mesa da assembleia e reunir-se com alguns accionistas. Esta atitude em nada invalida aquela assembleia presidida por quem de direito e cujas deliberações foram tomadas por quem tinha competência para tal. Forçoso é concluir, ao contrário do que é defendido pela apelante, que a assembleia não é nula por não ofender nenhum dos preceitos contidos nas alíneas a) e b) do nº 1 do art. 56º do C.S.C.. Como salienta Pinto Furtado, a equiparação à falta de convocação, estabelecida nos casos ali previstos tem irrecusável natureza excepcional e não é portanto extensível a outras hipóteses, não previstas, com fundamento em paridade ou maioria de razão. E continua: “Basta constituir ela uma imposição de nulidade, ainda que sob a forma de invalidade mista, para não poder deixar de ter também, como o quadro legal das nulidades de deliberações dos sócios, o carácter de numerus clausus” (in Deliberações dos Sócios, pág. 308). A resposta à pergunta supra formulada comporta a seguinte resposta: não se verificou, no caso, qualquer nulidade prevista no art. 56º do C.S.C.. Improcede na totalidade a tese da apelante. 4 – Decisão Em conformidade com o exposto e sem necessidade de qualquer outra consideração, decide-se, na improcedência da apelação, confirmar a douta sentença proferida pelo Mº juiz do tribunal de comércio de Lisboa. Custas pela apelante. Lisboa, aos 8 de Maio de 2003 (Urbano Dias) (Sousa Grandão) (Arlindo Rocha) |