Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CARLOS CASTELO BRANCO (VICE-PRESIDENTE) | ||
Descritores: | CONFLITO DE COMPETÊNCIA COMPETÊNCIA TERRITORIAL CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 12/03/2024 | ||
Votação: | DECISÃO INDIVIDUAL | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | CONFLITO DE COMPETÊNCIA | ||
Decisão: | RESOLVIDO | ||
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Sumário: | I. Do teor do artigo 71.º do CPC, advém da primeira parte do seu nº. 1, que todas as ações ali enunciadas têm como critério legal territorial, o tribunal do domicílio do réu, como o competente. II. Nos termos da segunda parte do n.º 1 do artigo 71.º do CPC, o legislador viabiliza outros foros para a instauração da ação que tenha por objeto a exigência do cumprimento de obrigações, a indemnização pelo não cumprimento ou pelo cumprimento defeituoso e a resolução do contrato por falta de cumprimento: A ação poderá igualmente ser instaurada, segundo escolha do credor, junto do tribunal do lugar em que a obrigação deveria ser cumprida, quando o réu seja pessoa coletiva, ou ainda, no caso de se situe o domicílio do credor na área metropolitana de Lisboa ou do Porto e o réu tenha domicílio na mesma área metropolitana. III. A incompetência em razão do território deve ser conhecida oficiosamente pelo tribunal, sempre que os autos fornecerem os elementos necessários, nos casos enunciados n.º 1 do artigo 104.º do CPC, a saber: a) Nas causas a que se referem o artigo 70.º do CPC, a primeira parte do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 71.º do CPC, os artigos 78.º, 83.º e 84.º, o n.º 1 do artigo 85.º e a primeira parte do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 89.º do mesmo Código; b) Nos processos cuja decisão não seja precedida de citação do requerido; c) Nas causas que, por lei, devam correr como dependência de outro processo. IV. A teleologia do n.º 2 do artigo 105.º do CPC é clara: A decisão que se tenha pronunciado sobre a questão da incompetência relativa e que tenha transitado em julgado, mostra-se definitiva, no sentido de vincular tal decisão a definição da questão de incompetência correspondente. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | * I. O Juízo Local Cível do Funchal – Juiz “X” suscita a resolução de conflito negativo de competência entre ele próprio e o Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol para a tramitação do presente processo, iniciado como injunção e transmutado para ação especial para cumprimento de obrigação pecuniária, com fundamento em que ambos se declararam incompetentes para dele conhecer. O Juízo Local Cível do Funchal – Juiz “X” declarou-se incompetente, em razão do território, com fundamento, em síntese, em que, não sendo a ré pessoa coletiva nem se situando o seu domicílio na mesma área metropolitana onde situado o domicílio da autora, é foro do seu domicílio o juízo de competência genérica da Ponta do Sol, tribunal judicial comarca da Madeira, e não o Juízo Local Cível do Funchal, em conformidade com o disposto no artigo 71.º, n.º 1, do CPC. Por sua vez, o Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol declarou-se incompetente para a tramitação do presente processo, com fundamento, em síntese, em que, por um lado, a autora tem a sua sede no Município de Oeiras e, por outro lado, a ré é uma pessoa singular, com domicílio no município do Funchal. O Ministério Público, na 1.ª instância, pronunciou-se – cf. promoção de 28-11-2024 – no sentido de que “a competência pertence ao Tribunal da Ponta do Sol, por ser essa, ao que tudo indica, a morada da ré à data de propositura da acção (pelo menos assim foi configurada pela autora) não havendo nos autos indicação de que já residisse no Funchal nessa altura (ignorando-se, aliás, se reside no Funchal, posto que o local onde foi citada não é necessariamente o seu local de residência)”. * II. Mostra-se apurado, com pertinência para a resolução do conflito, o seguinte: 1) Em 10-01-2024, Banco Credibom, S.A., com sede em Porto Salvo, apresentou requerimento de injunção contra “A”, identificando a requerida com domicílio em (…), Ponta do Sol. 2) Foi indicada em tal requerimento a pretensão de remessa à distribuição em caso de frustração da requerida. 3) Frustrando-se a notificação da requerida, os autos foram distribuídos ao Juízo Local Cível do Funchal – Juiz “X”, onde, em 20-02-2024, foi proferido despacho – objeto de notificação expedida em 26-02-2024 - onde se lê, nomeadamente, o seguinte: “(…) Da incompetência relativa do tribunal em razão do território No âmbito da presente acção especial para cumprimento de obrigação pecuniária, veio Banco Credibom, S.A., pessoa colectiva com sede em Porto Salvo, peticionar a condenação de “A”, residente na Ponta do Sol, no pagamento de determinada quantia. (…) Dispõe o 71.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que: “A ação destinada a exigir o cumprimento de obrigações, a indemnização pelo não cumprimento ou pelo cumprimento defeituoso e a resolução do contrato por falta de cumprimento é proposta no tribunal do domicílio do réu, podendo o credor optar pelo tribunal do lugar em que a obrigação deveria ser cumprida, quando o réu seja pessoa coletiva ou quando, situando-se o domicílio do credor na área metropolitana de Lisboa ou do Porto, o réu tenha domicílio na mesma área metropolitana.” (…) Apreciando. À luz do transcrito artigo e atentos os elementos definidos pela autora, é forçoso concluir que, não sendo a ré pessoa colectiva nem se situando o seu domicílio na mesma área metropolitana onde situado o domicílio da autora, é foro do seu domicílio o juízo de competência genérica da Ponta do Sol, tribunal judicial comarca da Madeira, e não este juízo (cfr. artigo 130.º, n.º 1 da Lei de Organização do Sistema Judiciário e artigo 90.º, n.º 2, al. b) do Regime aplicável à organização e funcionamento dos tribunais judiciais). A incompetência relativa em apreço é uma excepção dilatória de conhecimento oficioso, nos termos conjugados dos artigos 102.º e 104.º, n.º 1, al. b), 576, n.ºs 1 e 2, 577.º, al. a) e 578.º a contrario sensu, do Código de Processo Civil. (…) Pelo exposto e ao abrigo dos aludidos preceitos legais, desde já declaro o juízo local cível, juiz “X”, tribunal judicial da comarca da Madeira, incompetente em razão do território para conhecer da presente acção. Em consequência e de harmonia com o artigo 576.º, n.º 2, parte final, do Código de Processo Civil, remetam-se os autos, após trânsito do presente despacho, para o juízo local de competência genérica da Ponta do Sol, tribunal judicial comarca da Madeira, por ser este o competente. Notifique. D.N. (…)”. 4) Remetidos os autos ao Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol, em 08-04-2024, aí foi proferido despacho onde se lê, nomeadamente, o seguinte: “Proceda-se a pesquisas junto das bases de dados disponíveis, nos termos do artigo 236.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. Caso se apure morada completa, deverá ter efetuada citação pessoal, por via postal, de acordo com o artigo 228.º do Código de Processo Civil. Caso não se apure nova morada, ou resultem frustradas eventuais tentativas de citação postal, proceda de acordo com o artigo 231.º do Código de Processo Civil. Notifique.”. 5) Em 13-05-2024, pelo Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol, foi proferido despacho – objeto de notificação expedida nessa data - onde se lê, nomeadamente, o seguinte: “BANCO CREDIBOM, S.A., veio apresentar requerimento de injunção contra “A”, com residência (…) Ponta do Sol, (…). Resultando frustrada a notificação da Requerida, foi o processo remetido à distribuição. Foram os auto distribuídos ao Tribunal Judicial da Comarca da Madeira – Juízo Local Cível do Funchal, o qual, em face do domicílio suprarreferido, veio a declarar-se incompetente em função do território. Contudo, distribuídos os presentes autos a este Juízo, e efetuada a citação, veio a apurar-se que a Ré tem, afinal, domicílio em (…), Funchal. Não se dá cumprimento ao disposto no artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, porquanto tal se mostra claramente desnecessário. Cumpre apreciar e decidir. (…) Compulsados os autos, por um lado, constata-se que a Autora tem a sua sede no Município de Oeiras. Por outro lado, a Ré é uma pessoa singular, com domicílio no município do Funchal. Ora, na ordem interna, um dos critérios para repartição da jurisdição pelos diferentes tribunais é o território (vide artigo 60.º, n.º 2 do Código de Processo Civil), tendo os tribunais judiciais de primeira instância competência na área das respetivas circunscrições, sendo a lei de processo a indicar os fatores que determinam em cada caso o tribunal territorialmente competente (cfr. artigo 43.º da L.O.S.J.). E nos termos do disposto no artigo 71.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, se a ação se destinar a exigir o cumprimento de obrigações, a indemnização pelo não cumprimento ou pelo cumprimento defeituoso e a resolução do contrato por falta de cumprimento, o tribunal competente é o correspondente ao do domicílio do réu, podendo o credor optar pelo tribunal do lugar em que a obrigação deveria ser cumprida, quando o réu seja pessoa coletiva ou quando, situando-se o domicílio do credor na área metropolitana de Lisboa ou do Porto, o réu tenha domicílio na mesma área metropolitana. Tal normativo legal aponta, assim, dois fatores de conexão quando está nomeadamente em causa uma ação destinada a exigir o cumprimento de uma obrigação, a saber: 1 - o domicílio do réu; 2 - o lugar em que a obrigação deveria ser cumprida, nos casos em que o réu seja pessoa coletiva ou quando, situando-se o domicílio do credor na área metropolitana de Lisboa ou do Porto, o réu tenha domicílio na mesma área metropolitana. Analisado o requerimento de injunção verifica-se que a Ré é uma pessoa singular cuja morada não integra nenhuma das mencionadas áreas metropolitanas. In casu, como vimos, o domicílio da Ré pertence ao município do Funchal. Assim, haverá que atentar nas circunscrições territoriais dos tribunais de primeira instância, previstas no Mapa III anexo ao Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março (na sua redação em vigor), concluindo-se que o município do Funchal pertence à área de competência do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, Juízos de Competência Cível do Funchal, sendo esse o tribunal territorialmente competente para conhecer a presente ação. A violação das regras de competência em razão do território gera incompetência relativa do tribunal (cfr. artigo 102.º do Código de Processo Civil), podendo ser conhecida oficiosamente (nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 104.º do mesmo Código), dando origem à remessa do processo para o tribunal territorialmente competente (artigo 105.º, n.º 3 do Código de Processo Civil). Assim, e pelo exposto, declaro a incompetência relativa em razão do território deste Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol, do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira e declaro competente para o conhecimento dos autos os Juízos Locais Cíveis do Funchal do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, determinando em consequência a remessa do processo. Custas do incidente pela Autora, com taxa de justiça que se fixa no mínimo - artigo 7.º, n.º 4, do Regulamento de Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro (na sua redação em vigor). Notifique e remeta os autos ao tribunal competente (cfr. artigos 644.º, n.º 2, al. b) a contrario e n.º 3 do Código de Processo Civil). D.N. (dando-se a respetiva baixa estatística).”. 6) Os autos foram remetidos ao Juízo Local Cível do Funchal, sendo redistribuídos ao Juiz “Y”, que, por despacho de 31-05-2024, determinou a remessa dos mesmos ao Juiz “X” “para determinar o que melhor tiver por conveniente”. 7) Em 05-06-2024, o Juízo Local Cível do Funchal – Juiz “X” proferiu despacho suscitando a resolução do conflito negativo de competência. * III. Nos termos do n.º 2 do artigo 109.º do CPC, há conflito, positivo ou negativo, de competência quando dois ou mais tribunais da mesma ordem jurisdicional se consideram competentes ou incompetentes para conhecer da mesma questão. Não há conflito enquanto forem suscetíveis de recurso as decisões proferidas sobre a competência (cfr. artigo 109.º, n.º 3, do CPC). Quando o tribunal se aperceba do conflito, deve suscitar oficiosamente a sua resolução junto do presidente do tribunal competente para decidir (cfr. artigo 111.º, n.º 1, do CPC). Entendem ambos os tribunais, não serem competentes em razão do território, para dirimir o processo iniciado como injunção e transmutado para ação especial para cumprimento de obrigação pecuniária. A aferição do pressuposto processual da competência é determinada à luz da estrutura do objeto do processo, envolvida pela causa de pedir e pelo pedido formulado na petição inicial, no momento em que a mesma é intentada (vd., entre muitos outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20-02-2019, Pº 9086/18.0T8LSB-A.L1.S1, rel. RIBEIRO CARDOSO, de 07-03-2019, Pº 13688/16.1TBPRT.P1.S1, rel. FERNANDO SAMÕES e do TRL de 01-07-1993, in C.J., t. 3, p. 144, de 26-05-1999, Pº 0023414, rel. PEREIRA RODRIGUES e de 10-04-2024, Pº 31189/22.7T8LSB-A.L1-4, rel. SÉRGIO ALMEIDA e Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 18-11-2021, Pº 1475/09.8TBPRD-N.P1, rel. ANA VIEIRA). Conforme salienta Mariana França Gouveia (A Causa de Pedir na Acção Declarativa, Almedina, 2004, pp. 507-508): “Para efeitos de competência, a causa de pedir deve ser identificada com os factos jurídicos alegados pelo autor que, analisados na lógica jurídica da petição inicial, permitam a aplicação de uma norma de competência. Isto significa que a estrutura de causalidade entre causa de pedir e pedido que o autor estabelece na petição inicial, ou no conjunto dos seus articulados, é suficiente, é o contexto, o enquadramento da relação jurídica alegada e, em consequência, da aplicação das normas de competência”. De acordo com o disposto no artigo 37.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário (abreviadamente LOSJ, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto) na ordem jurídica interna, a competência reparte-se pelos tribunais judiciais segundo a matéria, o valor, a hierarquia e o território (n.º 1). O CPC ocupa-se de cada um desses fatores de determinação da competência na ordem jurídica interna, nos artigos 64.º e ss. Em matéria de competência territorial enuncia-se no artigo 80.º, n.º 1, do CPC, a regra geral: “Em todos os casos não previstos nos artigos anteriores ou em disposições especiais é competente para a ação o tribunal do domicílio do réu”. Para além desta regra geral, a lei processual civil enuncia diversos critérios especiais de determinação da competência do tribunal em razão do território, expressas, nomeadamente, nos artigos 70.º e ss. do CPC. Em matéria de competência para o cumprimento da obrigação dispõe o artigo 71.º, n.º 1, do CPC nos seguintes termos: “A ação destinada a exigir o cumprimento de obrigações, a indemnização pelo não cumprimento ou pelo cumprimento defeituoso e a resolução do contrato por falta de cumprimento é proposta no tribunal do domicílio do réu, podendo o credor optar pelo tribunal do lugar em que a obrigação deveria ser cumprida, quando o réu seja pessoa coletiva ou quando, situando-se o domicílio do credor na área metropolitana de Lisboa ou do Porto, o réu tenha domicílio na mesma área metropolitana.”. Do teor do normativo em apreço, advém da primeira parte do seu nº. 1, que todas as ações ali enunciadas têm como critério legal territorial, o tribunal do domicílio do réu, como o competente. Nos termos da segunda parte do n.º 1 do artigo 71.º do CPC, o legislador viabiliza outros foros para a instauração da ação que tenha por objeto a exigência do cumprimento de obrigações, a indemnização pelo não cumprimento ou pelo cumprimento defeituoso e a resolução do contrato por falta de cumprimento: A ação poderá igualmente ser instaurada, segundo escolha do credor, junto do tribunal do lugar em que a obrigação deveria ser cumprida, quando o réu seja pessoa coletiva, ou ainda, no caso de se situe o domicílio do credor na área metropolitana de Lisboa ou do Porto e o réu tenha domicílio na mesma área metropolitana. Efetivamente, o artigo 71.º do CPC. tem a origem da sua atual redação na alteração legislativa ocorrida pela Lei nº 14/2006, de 26 de abril, a qual, entre outros objetivos, quis proporcionar aos cidadãos consumidores uma maior proximidade com os tribunais no âmbito dos litígios do consumo, defendendo um interesse público. Importa ainda referir que a incompetência em razão do território deve ser conhecida oficiosamente pelo tribunal, sempre que os autos fornecerem os elementos necessários, nos casos enunciados n.º 1 do artigo 104.º do CPC, a saber: a) Nas causas a que se referem o artigo 70.º do CPC, a primeira parte do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 71.º do CPC, os artigos 78.º, 83.º e 84.º, o n.º 1 do artigo 85.º e a primeira parte do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 89.º do mesmo Código; b) Nos processos cuja decisão não seja precedida de citação do requerido; c) Nas causas que, por lei, devam correr como dependência de outro processo. O juiz deve suscitar e decidir a questão da incompetência até ao despacho saneador, podendo a decisão ser incluída neste sempre que o tribunal se julgue competente; não havendo lugar a saneador, pode a questão ser suscitada até à prolação do primeiro despacho subsequente ao termo dos articulados (cfr. artigo 104.º, n.º 3, do CPC). E, de harmonia com o disposto no artigo 105.º, a instrução e julgamento da exceção de incompetência relativa processa-se nos termos seguintes: “1 - Produzidas as provas indispensáveis à apreciação da exceção deduzida, o juiz decide qual é o tribunal competente para a ação. 2 - A decisão transitada em julgado resolve definitivamente a questão da competência, mesmo que esta tenha sido oficiosamente suscitada. 3 - Se a exceção for julgada procedente, o processo é remetido para o tribunal competente. 4 - Da decisão que aprecie a competência cabe reclamação, com efeito suspensivo, para o presidente da Relação respetiva, o qual decide definitivamente a questão”. A teleologia do n.º 2 do artigo 105.º do CPC é clara: A decisão que se tenha pronunciado sobre a questão da incompetência relativa e que tenha transitado em julgado, mostra-se definitiva, no sentido de vincular tal decisão a definição da questão de incompetência correspondente. A teleologia da norma é precisamente a de obviar, de forma clara e evidente, a que diversos tribunais suscitem, indefinidamente a questão da incompetência relativa, por forma a que, tendo ocorrido tal conhecimento – e verificado o trânsito em julgado de tal decisão – a mesma se torne definitiva/vinculativa. Não ocorre o perigo de supremacia decisória, já apreciado negativamente pelo Tribunal Constitucional. Conforme se decidiu no Acórdão do TC n.º 260/1009 (Pº 120/07, rel. CARLOS PAMPLONA DE OLIVEIRA), a respeito do precedente artigo 111.º, n.º 2 do CPC anterior (correspondente à do atual artigo 105.º, n.º 2, do CPC vigente): “O que está em causa nesta norma não é, por conseguinte, a insusceptibilidade de recurso da decisão sobre a questão da competência territorial, mas sim o valor dessa decisão, uma vez transitada em julgado, pois a vinculação do tribunal declarado competente para decidir o processo deriva do trânsito em julgado da decisão sobre a competência. Dito de outro modo: a vinculação do tribunal para o qual é remetido o processo decorre da força do caso julgado, ou seja, da força obrigatória da decisão que recaiu sobre um dos pressupostos da relação processual, transitada em julgado. Na verdade, no julgamento da excepção de incompetência relativa, em razão do território, ao contrário do que se verifica no julgamento da excepção de incompetência absoluta, a procedência da excepção não conduz à extinção da instância, por absolvição do réu da instância ou por indeferimento em despacho liminar, apenas determinando a remessa do processo ao tribunal competente, nele prosseguindo os seus trâmites. Ora, como é incontroverso, as decisões sobre a relação jurídica processual transitadas em julgado ao longo do processo, ou seja, as que não foram adequada e tempestivamente impugnadas, formam caso julgado sendo vinculativas para todos os sujeitos e intervenientes processuais, incluindo os próprios tribunais, como não podia deixar de ser. Em suma, o que o nº 2 do referido artigo 111º implica é atribuir a uma decisão transitada sobre matéria processual força de caso julgado. E é deliberadamente assim, por serem regras menos relevantes no que toca à organização da competência (territorial), do que as que determinam a competência absoluta. E a verdade é que o tribunal recorrido está no mesmo plano hierárquico do tribunal onde a questão ficou julgada, sendo por isso desajustada a invocação de regras de competência hierárquica; o que de útil se retira daquela norma nada tem a ver com a hierarquia, porque o regime que dela consta tanto vale para os casos em que a decisão definitiva sobre incompetência relativa provém da 1ª instância como quando provém de um tribunal de recurso. Deste modo, a norma ínsita no n.º 2 do artigo 111.º do Código do Processo Civil, que determina que a decisão transitada em julgado resolve definitivamente a questão da competência territorial, não afronta outros interesses dotados de tutela constitucional, designadamente a organização hierárquica dos tribunais. A norma não padece, em suma, da apontada inconstitucionalidade material”. E, verificando-se casos julgados contraditórios, com duas decisões de sentido oposto, o artigo 625.º do CPC determina a prevalência da decisão transitada em julgado em primeiro lugar, princípio que é igualmente aplicável à contradição existente entre duas decisões que, dentro do mesmo processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual. Por fim, importa salientar que, nos termos do artigo 38.º, n.º 1, da LOSJ, “a competência fixa-se no momento em que a ação se propõe, sendo irrelevantes as modificações de facto que ocorram posteriormente, a não ser nos casos especialmente previstos na lei”. * IV. No caso em apreço, dúvidas não subsistem sobre a aplicação ao caso do disposto no artigo 71.º, n.º 1, do CPC, posto que se está perante ação para cumprimento de obrigação pecuniária emergente de contrato. Mas, enquanto o Juízo Local Cível do Funchal – Juiz “X” se declarou incompetente, em razão do território, com fundamento, em que, não sendo a ré pessoa coletiva nem se situando o seu domicílio na mesma área metropolitana onde situado o domicílio da autora, é foro competente o do domicílio da ré (o juízo de competência genérica da Ponta do Sol), já o Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol declarou-se incompetente para a tramitação do presente processo, com fundamento, em síntese, em que, por um lado, a autora tem a sua sede no Município de Oeiras e, por outro lado, a ré é uma pessoa singular, com domicílio no município do Funchal (sendo que este foi apurado, em decorrência do local onde foi efetuada a citação da ré). De acordo com a primeira parte do nº. 1 do art.º 71º do CPC., a regra da competência do tribunal dependerá do domicílio do réu. Considerando a data de instauração da ação, data em que se fixa a competência do Tribunal, o domicílio indicado como sendo o da ré situava-se em Ponta do Sol, pelo que, não tendo a ação conexão com o Juízo Local Cível do Funchal, não merece censura o despacho que, primeiramente proferido, conheceu da incompetência territorial do Juízo Local Cível do Funchal. As ulteriores diligências desenvolvidas para apuramento do domicílio da ré, não determinam a alteração da competência do tribunal já fixada. Tal decisão foi, inclusive, a primeiramente transitada em julgado, pelo que, na sua contraditoriedade com a decisão ulteriormente proferida pelo Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol, deverá prevalecer sobre esta última. Assim, o conflito verificado deverá resolver-se considerando competente para a tramitação da presente ação, o Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol. ** V. Pelo exposto, sem necessidade de mais considerações, decido este conflito, declarando competente para a tramitação da presente ação, o Juízo de Competência Genérica de Ponta do Sol. Sem custas. Notifique-se (cfr. artigo 113.º, n.º 3, do CPC). Baixem os autos. Lisboa, 03-12-2024, Carlos Castelo Branco. (Vice-Presidente, com poderes delegados – cfr. Despacho n.º 2577/2024, publicado no DR., 2.ª série, n.º 51, de 12-03-2024). |