Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | TIBÉRIO SILVA | ||
Descritores: | EMBARGOS DE TERCEIRO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/27/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
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Sumário: | I- Os embargos de terceiro não se limitam, depois da reforma do Processo Civil de 1995, a um meio possessório, sendo-o também de defesa da propriedade, por exemplo, no caso de este direito ser atingido pela realização de uma penhora. II- Logrando o embargante provar a aquisição originária do direito de propriedade, por usucapião, não lhe pode ser oposto o registo posterior de uma penhora, sendo de concluir que esta ofende tal direito de propriedade. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I A, CRL, deduziu embargos de terceiro por apenso à Execução nº 868/1997 que o Estado Português (Secretaria de Estado do Tesouro) move a C e M alega a Embargante que: Então com outra denominação (C, S.C.A.R.L.), adquiriu, por escritura pública, datada de 14 de Novembro de 1977, os prédios que dela constam aos executados dos prédios comprados pela Embargante faz parte aquele que se descreveu na Conservatória do Registo Predial de L, inscrito na matriz sob o art. 34º e sobre o qual recaiu a penhora inscrita sob o nº F2, que é a dos autos. Desde a data da escritura referida, vem gozando de todas as utilidades do prédio em causa, usando o armazém aí existente, a princípio como aviário e depois como adega, cultivando o terreno e fazendo seus os produtos, à vista de toda a gente, sem qualquer contestação, oposição ou interrupção, na convicção de não lesar interesses alheios, como quem exerce poderes sobre a coisa que lhe pertence e nessa convicção, estando ainda convicta de que o prédio lhe foi transmitido pelo executado na dita escritura. Tais factos foram praticados durante mais de 15 ou 20 anos. Assim, se de outro título carecesse, o embargante adquiriu o citado prédio por usucapião. Termina pedindo que, a final, seja ordenado o cancelamento da penhora ofensiva do seu direito de propriedade sobre o imóvel em causa. Contestou o Ministério Público, em representação do Estado Português, defendendo-se por excepção e impugnação. Em sede de excepção, arguiu a caducidade dos embargos. Por impugnação, alegou, em síntese, que: À data da penhora, o prédio encontrava-se inscrito na matriz em nome da Executada e não estava descrito na Conservatória do Registo Predial de L. Nenhum dos imóveis a que se reporta a escritura pública junta pelo embargante corresponde ao artigo matricial do bem penhorado. Segundo o princípio registral da prioridade do registo, a penhora, registada depois de efectuada pelo Executado a venda do prédio, mas antes do registo desta venda, subsiste para todos os efeitos. Não se tendo o Embargante socorrido da protecção do registo, como devia, não pode agora vir alegar a invalidade da penhora. Termina, dizendo que devem os embargos improceder. A embargante respondeu, concluindo como na petição. No despacho saneador, relegou-se o conhecimento da excepção de caducidade para a sentença final. Prosseguiram os autos os seus termos e teve lugar a audiência de discussão e julgamento. Foi proferida sentença, na qual se julgou improcedente a excepção de caducidade, bem como se julgaram improcedentes os embargos. Inconformada com esta decisão, e após um requerimento – sem êxito – de aclaração e reforma de sentença, recorreu a Embargante, concluindo as suas alegações pela seguinte forma: «1 - O presente recurso é admissível face ao disposto no art° 678° n° 6 do C.P.C., pois o Meritíssimo Juiz de 1ª instância, baseou, essencialmente, a sua decisão na interpretação que fez do acórdão uniformizador da jurisprudência 3/99 do S.T.J. de 18 de Maio de 1999, publicado no DR, 1ª série, de 10 de Julho do mesmo ano mas fez de forma errada, esta interpretação e, em consequência, proferiu a decisão recorrida, contra a jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça. 2 - Isto, não obstante a formulação de uma regra interpretativa sob o n° 4 do art° 5° do C.R.P., que veio a perfilhar a orientação seguida pelo referido acórdão, pois face ao que se expôs na conclusão anterior, que o Meritíssimo Juiz reconheceu no despacho que admitiu o recurso, como se diz no ponto 1 das presentes alegações, continua em colação a jurisprudência firmada pelo referido acórdão, bem como as bases que a sustentam. 3 - Na doutrina e na jurisprudência existiram três conceitos de terceiro: a) o conceito de terceiro em sentido restrito perfilhado por Manuel de Andrade; b) o conceito de terceiro em sentido amplo perfilhado por Carlos Ferreira Almeida e outros autores e por outra corrente da jurisprudência dos nossos tribunais superiores e que veio a. ser perfilhada pelo acórdão uniformizador de jurisprudência do S.T.J. 15/97 de 20/5; c) o conceito de terceiro em sentido restrito mitigado, defendido por Henrique Mesquita e Antunes Varela. Tudo conforme se salienta nos pontos 2.1, 2.2 e 2.3 destas alegações. 4 - O acórdão de uniformização de jurisprudência 3/99 fixou a seguinte noção de terceiros: " Terceiros, para efeitos do disposto no art° 5° do Código do Registo Predial são os adquirentes de boa fé, de um mesmo transmitente comum, de direitos, incompatíveis, sobre a mesma coisa, isto conforme se deixou referido no ponto 3 destas alegações. 5 - Conforme refere Isabel Pereira Mendes na 12ª edição do Código do Registo Predial Anotado, a aplicação deste conceito ficou esclarecida por outro acórdão do S.T.J. de 7 de Julho de 1999, publicado na Col. de Jur. Ano VII, 1999, pág. 164. Segundo ele o citado acórdão de uniformização de Jurisprudência exclui os casos em que os direitos em conflito com o direito não inscrito derivam de uma diligência judicial, seja ela arresto, penhora, ou hipoteca judicial. Mas não arreda a venda executiva, pois nela o executado é substituído pelo Juiz, enquanto órgão do Estado, gerando-se uma aquisição derivada, em que o executado é o transmitente. Tudo isto melhor explicado no ponto 3 destas alegações. 6 - Não existe, nos presentes autos, conforme pode ver-se na certidão do registo predial junto ao processo executivo, qualquer registo de aquisição, ao contrário do que pode inferir-se na fundamentação de facto da sentença recorrida, sendo que a inscrição a favor de M, é apenas na matriz. Esta inexactidão que constava na alínea A dos factos assentes, foi rectificada em audiência de julgamento, face à reclamação da embargante. 7 – Diz-nos o acórdão uniformizador de jurisprudência 3/99 a pág. 4.356, do referido DR, 1ª coluna, in fine: " Emerge dos autos a situação fáctica, já acima arrolada e que se resume no seguinte: Os recorrentes compraram uma fracção autónoma e não a registaram. O recorrido, credor do vendedor da fracção, obteve penhora desta e registou-a" A situação fáctica é em tudo idêntica à do presente recurso com uma diferença, a recorrente não registou a aquisição do prédio objecto da penhora mas, esta omissão em nada afecta a embargante. Dai que a decisão do Meritíssimo Juiz recorrido devia ser idêntica à proferida no citado acórdão, julgando procedente os embargos de terceiro. 8 - Conforme resulta do art° 7° do C.R.P., o registo predial constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito nos precisos termos em que o registo o define. Isto na sequência do fim do registo predial tal como é definido pelo art° 1°. Como não existe nas respectivas tábuas qualquer publicitação do direito do transmitente, nenhuma expectativa se cria a quem com ele pretende negociar e muito menos a qualquer credor. Conclusão do que expusemos sob o n° 5 destas alegações. 9 - Recordem-se as considerações que o douto acórdão 3/99 a fls. 4.360 do DR. citado, 2ª coluna sobre a posse - aquele que pretenda o domínio de uma coisa tem de assegurar-se que o transmitente tem a posse e o registo a seu favor. Salientamos o disposto no art° 1.268° n° 1 do C.Civil. Cf. ponto 6 destas alegações. 10 - Resulta dos autos que a recorrente comprou o imóvel penhorado a C em 14/1/77. Nos pontos 11 a 17 da fundamentação da sentença recorrida, bem como das respostas dadas aos quesitos formulados, resulta toda uma factualidade que conduz à aquisição originária do direito de propriedade, sobre o prédio objecto de registo de penhora, mesmo até à data da penhora, por usucapião. Esta forma de aquisição foi alegada, também, pela embargante, no art° 7° da petição de embargos. 11 - A posse da apelante é causal porque é conteúdo de um direito substantivo - Oliveira Ascensão, Direitos Reais, edição de 1971, pág. 290. E, a pág. 415, refere o mesmo autor, após tecer várias considerações: "Nada pode porém contra a usucapião última ratio na solução de conflitos entre adquirentes de direitos reais, que o titular verdadeiro pode aqui invocar nos termos gerais". Descurou, pois, a douta sentença recorrida do instituto da usucapião. Conforme salienta o mesmo autor a pág. 414 ponto III, " os efeitos da posse são invocáveis quer pelo possuidor formal quer pelo possuidor causal. Não se compreendia que ao verdadeiro titular fossem recusados os meios que ao possuidor formal são facultados". Esta conclusão é resultado do que melhor expôs nos pontos 7, 8 e parte do ponto 9, destas alegações. 12- Há incompatibilidade entre a penhora inscrita na Conservatória do Registo Predial e a aquisição da exequente, pois esta pode ser despojada do seu direito na sequência natural da venda forçada no processo de execução. Uma coisa é a penhora inscrita e outra é o direito do exequente à execução do património do devedor, conforme se deixou dito no ponto 9 destas alegações. 13- Segundo entendemos, o raciocínio do Juiz recorrido está feito ao contrário, que nos parece neste sentido: porque a exequente não é terceiro em relação à embargante, titular não inscrita não pode opor-lhe o registo da penhora. Quando devia ser feita neste sentido: justamente porque o exequente não é terceiro em relação à embargante titular não inscrita, é que não pode opor-lhe o registo da penhora, conforme se deixou dito no mesmo ponto 9, destas alegações. 14 - Violou a douta decisão recorrida o douto acórdão unificador de jurisprudência do S.T.J. 3/99 de 18 de Maio de 1999, publicado a pág. 150 e seguintes do DR, lª Série de Julho do mesmo ano, bem como o preceituado no art° 5° do Código do Registo Predial e 1296° do Código Civil, entre outros. Termina, dizendo que deve substituir-se a sentença recorrida por outra que julgue procedentes os embargos de terceiro com as consequências legais, nomeadamente com a determinação de cancelamento da inscrição de penhora. Contra-alegou o Ministério Público, concluindo que: 1. São terceiros os que tenham adquirido, por via negocial e a título oneroso, e também de boa fé, direitos incompatíveis advindos do mesmo transmitente. Porém, não são considerados terceiros os credores exequentes, sujeitos activos dos actos que consistam em mera diligência judicial, como, por exemplo, penhora arresto ou hipoteca judicial. 2. Não sendo o Exequente terceiro em relação à Embargante e não sendo os direitos do Exequente e da Embargante incompatíveis, procede-se à aplicação pura e simples das regras do registo. 3. Assim, o Exequente beneficiário de um direito real de garantia que fez inscrever no registo o referido direito, em momento anterior ao registo da compra do bem pela Embargante, não tendo conhecimento da real titularidade do bem penhorado, tem a protecção das regras gerais do registo, designadamente o disposto nos arts. 6°, 7º e 9°, nº 1 do CRP pelo que não pode a Embargante opor o direito de propriedade ao Exequente , prevalecendo o direito deste. 4. O registo da penhora goza da prioridade que lhe advém do disposto no art° 6°, nº 1, do C. Registo Predial. 5. Prioridade significa prevalência ( prior tempore, potior jure), segundo a ordem de ingresso de cada facto no registo: os direitos em primeiro lugar inscritos prevalecem sobre os que, por ordem da data do respectivo registo, se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens. 6. O princípio da prioridade não admite excepções nas suas duas vertentes, consoante o grau de compatibilidade entre os direitos constantes do registo: ou se dá uma exclusão, se os direitos são totalmente incompatíveis (caso da venda sucessiva do prédio pelo mesmo proprietário); ou se dá uma graduação. 7. Segundo o princípio registral da prioridade do registo, a penhora registada depois de efectuada pelo executado a venda do seu objecto, mas antes do registo desta venda, subsiste para todos os efeitos, já que tal venda é ineficaz em relação ao exequente e demais credores reclamantes - art° 819° do C.P.C. 8. A penhora gera assim, a indisponibilidade dos bens penhorados relativamente ao processo executivo, criando um vínculo de carácter processual que limita o direito de propriedade sobre os bens, a fim de que possam ser satisfeitos os direitos do exequente (cfr. Castro Mendes, Teoria Geral do Direito Civil, II, 1985, 306 e Ac. do STJ, de 25 de Novembro de 1975). 9. S e a anterior adquirente ora Apelante, não registou o seu direito não pode invocar perante o Exequente o facto de ter adquirido a posse por usucapião, sob pena de total ineficácia das regras do registo predial. 10. A douta sentença recorrida, não violou o acórdão uniformizador de jurisprudência do STJ 3/99 de 18 de Maio de 1999, bem como o preceituado no art° 5° do CRP e 1296° do C. Civil, não merecendo qualquer censura ou reparo, devendo ser mantida.» Termina, dizendo que deve ser negado procedimento ao recurso interposto pela Embargante e mantida a decisão recorrida. * O objecto dos recursos é definido pelas conclusões de quem recorre (arts. 684º, nº3 e 690º, nº1 do CPC). In casu, importará saber se o registo da penhora prevalece sobre a aquisição e posse subsequente da Embargante, ou se devia a sentença ter atendido à usucapião, considerando o direito daí advindo prevalecente sobre o aludido registo.II Na sentença, deram-se por provados os seguintes factos: «1- Encontra-se penhorado nos autos de execução apensos , por termo datado de 16/12/98 o imóvel melhor descrito a fls.24, inscrito na matriz em nome da executada M. 2- O exequente obteve registo da penhora em 27/9/2000. 3- A embargante, então denominada C, adquiriu por contrato de compra e venda celebrado com o executado, através de escritura pública lavrada no dia 14/11/1977 no 1º Cartório Notarial do Porto o imóvel ora penhorado, entre outros, a que foram entretanto atribuídos novos artigos matriciais. 4- A embargante tomou conhecimento na Segunda quinzena de Março de 2002, através do técnico agrário que o prédio em questão encontrava-se em venda em execução. 5- Em face do que solicitou indagação ao seu advogado que no dia 20/3/2002 constatou na conservatória a existência da referida penhora. 6- Nunca foi contactada pelo depositário nomeado . 7- Este prédio faz parte da unidade agrícola há muitos anos denominada Quinta …... 8- Nele se encontrando edificado um armazém que teve a função de aviário e hoje é adega. 9- Todos os prédios adquiridos pela escritura referida, incluindo o penhorado foram transformados pela embargante. 10- Ali não existindo já nenhum terreno denominado por campo do Aviário. 11- Desde a data da celebração da escritura que a embargante vem usando o armazém nele edificado, primeiro como aviário e depois como adega. 12- Cultivando o terreno, e fazendo seus os produtos. 13- À vista de toda a gente. 14- Sem oposição. 15- Ininterruptamente. 16- Na convicção de exercer direito próprio e de não lesar direito alheio. 17- Foi a embargante que procedeu à construção do aviário. III O Mmº Juiz, face aos factos provados, concluiu que, à data da penhora, realizada 16/12/1998, a Embargante era possuidora do imóvel em causa há mais de 20 anos, tendo em conta a factualidade assente, e o disposto nos art°s 1251º, 1260º, 1261º e 1262º do C.Civil. Na verdade, a prova é clara quanto à posse da Embargante, desde 1977, altura em que adquiriu o prédio, através de contrato de compra e venda. Provou-se que a Embargante, desde a data da celebração da escritura, vem usando o armazém nele edificado, primeiro como aviário (por ela construído) e depois como adega; cultivando o terreno, e fazendo seus os produtos; à vista de toda a gente; sem oposição; ininterruptamente; na convicção de exercer direito próprio e de não lesar direito alheio. Nos termos do art. 1263º, al. a) do C. Civil, a posse adquire-se pela prática reiterada, com publicidade, dos actos materiais correspondentes ao exercício do direito. Patenteiam os factos provados o corpus e o animus possidendi. Estamos perante posse titulada; de boa fé; pacífica; pública (arts. 1259º a 1262º do C. Civil) e contínua. Nos termos do art. 1287º do C. Civil, a posse do direito de propriedade, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito daquele direito – é o chamada usucapião. Invocada a usucapião, os seus efeitos retrotaem-se à data do início da posse (art. 1288º do C. Civil). Está suficientemente preenchido o tempo que a lei exige para a usucapião (art. 1296º do C.Civil). Está-lo-ia mesmo que a posse fosse de má fé (o que não é o caso). E diga-se que esse tempo se cumpre sem que a Embargante tenha necessidade de recorrer à acessão na posse ( art. 1256º). Entendeu o Mmº Juiz, na resposta ao pedido de aclaração e reforma da sentença, que a Embargante invocou factos integradores da posse e do direito de propriedade adquirido por contrato de compra e venda, como decorre da sua petição, apesar de no capítulo da fundamentação jurídica, se quedar pela protecção do seu direito de propriedade, não incluindo a invocação da usucapião. Daí – explica – não ter a sentença considerado a questão da usucapião. Salvo o devido respeito, a Embargante invocou, na petição inicial, tanto a aquisição derivada como a originária, resultante da usucapião. Depois de alegar os factos respeitantes ao corpus e animus da sua posse, e o lapso de tempo decorrido desde o início dessa posse, a Embargante concluiu, no art. 22º, que se de outro título carecesse, adquiriu o citado prédio por usucapião. No art. 32º, refere que a penhora ofende o seu direito de propriedade e daí que lhe seja lícito lançar mão do presente meio processual – art. 351º, nº1 do Código de Processo Civil. De acordo com o estabelecido no art. 351º do CPC (considerando a redacção vigente à data da dedução dos embargos), se qualquer acto, judicialmente ordenado, de apreensão ou entrega de bens ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa, pode o lesado fazê-lo valer, deduzindo embargos de terceiro. Os embargos de terceiro não se limitam, depois da reforma de 1995, a um meio possessório, sendo um adequado meio de defesa da propriedade, num caso como o presente ( vide, por exemplo, Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos sobre o Novo Processo Civil”, 2ª ed., Lex, Lisboa, 1997, pág. 187). Isso mesmo se retira do Relatório do DL nº 329-A/95 de 12/12, no qual, a dado passo, se refere: «Relativamente ao regime proposto para os embargos de terceiro, salienta-se a possibilidade de, através deles, o embargante poder efectivar qualquer direito incompatível com o acto de agressão patrimonial cometido, que não apenas a posse. Permite-se, deste modo, que os direitos «substanciais» atingidos ilegalmente pela penhora ou outro acto de apreensão judicial de bens possam ser invocados, desde logo, pelo lesado no próprio processo em que a diligência ofensiva teve lugar, em vez de o orientar necessariamente para a propositura de acção de reivindicação, por esta via se obstando, no caso de a oposição do embargante se revelar fundada, à própria venda dos bens e prevenindo a possível necessidade de ulterior anulação desta, no caso de procedência de reivindicação.». Na conclusão expressa no art. 32º da petição inicial não pode deixar de se incluir a aquisição originária, por via da usucapião, invocada noutros artigos, nos quais se explanou a atinente factualidade, que foi contemplada na base instrutória e resultou provada. No art. 5º, nº1 do C. Reg. Predial, estatui-se que os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo. Mas no nº2, al. a), surge como excepção do disposto no número anterior, a aquisição fundada na usucapião, dos direitos referidos na alínea a) do nº 1 do art. 2º (entre eles, o direito de propriedade). Longa tem sido a tormenta à volta do conceito de terceiros para efeitos de registo, como, aliás, estes autos retratam. Tendo o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 15/97, de 20/05/97, publicado no DR, 1º série-A, de 04/07/1997, considerado que Terceiros, para efeitos de registo predial, são todos os que, tendo obtido registo de um direito sobre determinado prédio, veriam esse direito arredado por qualquer facto jurídico anterior não registado ou registado posteriormente, veio o Acórdão de uniformização de jurisprudência, nº3/99, de 18/05/99, publicado no DR, 1ª Série-A, de 10/07/1999, alterar este entendimento, considerando que Terceiros, para efeitos do disposto no artigo 5º do Código do Registo Predial, são os adquirentes, de boa fé, de um mesmo transmitente comum, de direitos incompatíveis sobre a mesma coisa. O DL nº 533/99, de 11/12, alterou o artigo 5º do C. Reg. Predial, introduzindo-lhe um nº 4, tomando partido pela definição de Manuel Andrade (consagrada no aludido Ac. nº 3/99), sobre o conceito de terceiros para efeitos de registo, pondo-se, assim, cobro – explica-se no preâmbulo daquele DL – a divergências jurisprudenciais geradoras de insegurança sobre a titularidade dos bens.
No Ac. do STJ, de 18/05/99, Col. de Jur./STJ, 1999, II, 164, exarou-se, além do mais, o seguinte: * Lisboa,27/05/04 (Tibério Silva) (Silveira Ramos) (Graça Amaral) |