Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | PAULA SÁ FERNANDES | ||
Descritores: | CONVENÇÃO COLECTIVA DE TRABALHO CADUCIDADE | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 12/15/2005 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | ANULADO O JULGAMENTO | ||
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Sumário: | Quando haja um conflito hierárquico entre fontes de direito de trabalho aplicam-se as normas que estabeleçam “tratamento mais favorável para o trabalhador”, sejam elas quais forem, só assim não sucedendo quando a norma superior tenha intenção de aplicação efectiva, afastando a inferior. A comparação entre regimes - para se apurar o mais favorável – deve obedecer aos seguintes parâmetros: comparar conjuntos incindíveis de normas em função dos resultados; dar primazia às posições das pessoas e obedecer a parâmetros objectivos. Os regimes em confronto relativos ao pagamento do trabalho suplementar e nocturno são, por um lado, o que consta das cls. 102ª, 105ª, 106ª 107ª e 108ª, do AE/81 celebrado entre a Ana, EP e vários Sindicatos, publicado no BTE nº 40 de 29.10.92 e, por outro, a lei geral, nomeadamente o disposto no art. 7º do DL 421783 de 2.12 e art. 29º e 34º do DL 408/71 de 27.09. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa .1.(A), .2.(B), .3.(C), .4.(D), .5.(F), .6.(G), .7.(H), 8.(I), .9.(J), .10.(L), .11.(M), .12.(N), .13.(O), .14.(P), .15.(Q), .16(R), .17.(S), .18(T) e, posteriormente, por terem deduzido incidente de intervenção espontânea:.19.(U),.20. (V), vieram intentar a presente acção especial de anulação e interpretação de cláusulas de acordo de empresa contra: .1. NAVEGAÇÃO AÉREA DE PORTUGAL, E.P., .2. SITAVA-SINDICATO DOS TRABALHADORES DA AVIAÇÃO E AEROPORTOS; .3.SINCTA-SINDICATO DOS CONTROLADORES DE TRÁFEGO AÉREO, .4. SQAC – SINDICATO DOS QUADROS DA AVIAÇÃO COMERCIAL; .5. SINDOPA, actualmente denominado de SINDAVE-SINDICATO DEMOCRÁTICO DOS TRABALHADORES DOS AEROPORTOS E AVIAÇÃO, .6. SINTICA – SINDICATO DOS TÉCNICOS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÕES AERONÁUTICAS, .7. SITECSA – SINDICATO DOS TÉCNICOS DA SEGURANÇA AÉREA, com os seguintes fundamentos: Os autores foram funcionários da ANA até à sua cisão e posterior transformação e são actualmente funcionários da 1ª ré (navegação Aérea EP.) que, no que lhes diz respeito, assumiu todos os direitos e deveres. Todos exercem as funções correspondentes à categoria de Técnico de Informação e Comunicações Aeronáuticas (TICA) e o seu local de trabalho é no centro de controle de tráfego aéreo do Aeroporto de Lisboa. Em 1981, foi celebrado um Acordo de Empresa entre a ANA, EP e o Sitava, publicado no BTE, 1ª série, n.º 21, de 8.06.81, aplicável a todos os trabalhadores. Em 29 de Julho de 1983, foi celebrado um novo Acordo de Empresa entre a Ana, EP, o Sitava e o Sincta, publicado no BTE 1ª série, nº42, de 15.11.83 e que substitui o AE de 1981, por ser “globalmente mais favorável”. Em 13 de Abril de 1988, é celebrado um Acordo de Empresa entre a Ana,EP., o Sincta e o Sitava, publicado no BTE, 1ª série, nº 20, de 29.05.98, aplicável apenas à classe profissional de controlador de tráfego aéreo e que derroga a aplicação do AE de 1983; Em 1991, é celebrado um AE entre a Ana,EP e o Sincta, o Sitava, o Sitecsa, o Sqac, o Sindopa e o Sintica, publicado no BTE 1ª série, n.º 40, de 29.10.92, que substitui na totalidade o AE de 1983, por ser “globalmente mais favorável”. Em 24 de Fevereiro de 1993, é acordado uma alteração parcial do AE de 1991, publicado no BTE nº13, de 8.04.95, assinado pela ANA,EP, Sitava, Sincta, Sqac, Sitecsa, Sintica e Sindopa. O AE de 1991, com as alterações de 1993 mantém-se em vigor. Pretendem a anulação das seguintes cláusulas do Acordo de Empresa de 1991: 102º cálculo do valor hora; 104º remuneração do trabalho nocturno; 108º subsídio de turno; 105ª remuneração por trabalho extraordinário; 106ª remuneração do trabalho prestado em dia de descanso semanal, complementar ou feriado. A 1ª ré é uma empresa que tem serviços onde se trabalha por turnos contínuos rotativos, durante 24 horas por dia e 365 dias seguidos. Um dos serviços da ré que trabalha 24 horas por dia, 365 dias por ano é o Centro de Controle de Tráfego Aéreo do Aeroporto onde os autores trabalham. De 1991 até Agosto de 1993, os autores trabalhavam durante 3 dias e estavam 3 dias sem trabalhar (1 dia de folga, 1 dia de descanso semanal obrigatório e 1 dia de descanso semanal complementar). Nessa altura havia 6 grupos de trabalhadores para preencherem os turnos, porque quando estavam 3 grupos a trabalhar, os outros 3 grupos folgavam. A partir de Agosto de 1993, e até à presente data, o serviço dos autores relativamente aos turnos foi alterado, sendo que passaram a trabalhar 3 dias seguidos e a ter dois dias de descanso semanal. Esta alteração de 1993, foi originada pela aposentação de vários Ticas e pela introdução de novas tecnologias no serviço dos autores . Cada um dos autores trabalha em média 36 horas por semana e em média prestava 55 horas de trabalho nocturno de 1991 a 1993 e 66 horas de trabalho nocturno, a partir de 1994. Os autores como contrapartida do trabalho prestado recebiam em 1991, além da remuneração mínima mensal: . diuturnidades, . subsídio de turno; . remuneração operacional; . subsídio de disponibilidade; . subsídio de polivalência; . subsídio de refeição. Sempre que efectuassem trabalho fora do horário da sua escala, ainda recebiam: . remuneração por trabalho extraordinário; .remuneração por trabalho prestado em dia de descanso semanal, complementar ou feriado; . remuneração do trabalho prestado em dia de descanso semanal ou complementar que coincida com feriado. Houve alterações na composição da retribuição global, de modo que, desde 1 de Janeiro de 1995, até à presente data, fazem parte da retribuição mensal dos autores as seguintes remunerações: . remuneração mínima mensal: . diuturnidades, . subsídio de turno; . remuneração operacional; . subsídio de refeição. Sempre que efectuassem trabalho fora do horário da sua escala, ainda recebiam: . remuneração por trabalho extraordinário; .remuneração por trabalho prestado em dia de descanso semanal, complementar ou feriado; . remuneração do trabalho prestado em dia de descanso semanal ou complementar que coincida com feriado. Os autores recebem subsídio de turno, previsto nas cláusulas 108 e 62 do AE. Na cláusula 108/3 está expressamente determinado que o subsídio de turno absorve a remuneração por trabalho nocturno. Na interpretação que tem sido feita pela R.NAV, o subsídio de turno absorve a remuneração por trabalho normal nocturno e o trabalho por turnos. Ora, o subsídio de turno dos autores é de 21% da remuneração mensal mínima e a remuneração por trabalho nocturno é superior em 25% à remuneração a que dá direito o trabalho equivalente, pelo que o subsídio de turno previsto no AE nem sequer remunera o trabalho nocturno, conforme previsto na lei, recebendo assim menos do que está previsto na lei, dado o elevado número de horas de trabalho nocturno que os AA prestam. Quanto à cláusula 105ª do AE: Também aqui a remuneração do trabalho suplementar é inferior à que resulta da aplicação da lei, dado que a retribuição mínima mensal dos autores só inclui os valores previstos no Anexo I do AE e na lei a retribuição mensal legal, inclui além da remuneração mínima mensal, todas as prestações regulares e periódicas, incluindo assim as diuturnidades, a remuneração operacional, o subsídio de turno e o subsídio de refeição. Além disso, no AE a 1ª hora é remunerada com um acréscimo de 25% e na lei com um acréscimo de 50%; quanto às horas subsequentes, na lei têm um acréscimo de 75%, enquanto no AE, o acréscimo é de 50%. Quanto à cláusula 106ª do AE que dispõe sobre o pagamento do trabalho prestado no período de descanso semanal, complementar ou feriado: Também aqui a introdução do conceito de remuneração mínima mensal na fórmula da retribuição reduz significativamente a remuneração dos AA., uma vez que a remuneração mínima mensal representa menos de 50% da remuneração mensal que inclui retribuição base, as diuturnidades, o subsídio de turno, a remuneração operacional e o subsídio de refeição. Em consequência quando os autores prestam trabalho suplementar em dia de descanso ou em feriado recebem pouco mais do que quando trabalham em horário normal de trabalho, recebendo até menos na 1ª hora. Em consequência do conceito de retribuição utilizados no AE e das percentagens previstas no mesmo, o 1º e o 2º AA receberam entre 1991 e 2001 cada um menos 7.286.117$00, o 3º A. menos 8.993.204$00, o 4º A. menos 1.285.581$00 e a 5ª A. menos 7.321.273$00. Pedem, consequentemente, que o Tribunal declare a anulabilidade das cláusulas 102ª, 104ª, 105ª e 106º e parte do nº3 da cláusula 108ª quando estabelece que “absorvem a remuneração por trabalho normal nocturno” com a manutenção da retribuição do subsídio de turno, cláusulas estas constantes do Acordo de Empresa de 1991, publicado no BTE, 1ª série, n.º 40, de 29.10.92, celebrado entre a ANA-Aeroportos e Navegação Aérea, E.O. e o Sitava e Outros, mais atribuindo à declaração de anulabilidade eficácia retroactiva à data de entrada em vigor do Acordo de Empresa e interpretando que ao trabalho nocturno, ao trabalho extraordinário e ao trabalho suplementar prestado em dia de descanso semanal complementar ou feriado, se aplica o estabelecido na lei sobre as respectivas retribuições, tudo com as devidas consequências legais. Devidamente citados os réus apenas a ré NAV apresentou contestação, defendendo-se por excepção e impugnação: Por excepção alegou que: A acção de anulação e interpretação de cláusulas de convenções colectivas de trabalho prevista nos artigos 183º a 186º do CPT apenas pode versar sobre cláusulas de convenções colectivas em vigor, o que bem se compreende, uma vez que, incorporando tais cláusulas comandos jurídicos e abstractos, a modificação desses comandos ou a determinação do seu real alcance através do Tribunal, só deverá ocorrer relativamente a cláusulas de convenções colectivas que estejam em vigor. Reforça este entendimento a própria letra do nº2 do art.º 183 do CPT, ao estatuir que “com a petição é junta cópia do Boletim do Trabalho e Emprego onde esteja publicada a convenção colectiva”. Ora, o acordo de empresa celebrado entre a ANA,EP e o Sitava e Outros, publicado no BTE, 1ª SÉRIE, Nº 40, DE 29.10.92, com as alterações publicadas no BTE – 1ª série a, N.º 13, DE 8.04.95, caducou em 8 de Agosto de 2002, data em que foi publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, nº29, 1ª série, de 8 de Agosto de 2002, o novo acordo de empresa que o veio substituir integralmente. Na cláusula 106º do AE de 2002, está reconhecida a sua natureza globalmente mais favorável relativamente ao acordo publicado no BTE, 1ª série, nº40, de 29.10.92. O novo acordo diferencia-se marcadamente do anterior, tendo um número muito inferior de cláusulas e de regulamentos anexos, para além de alterações significativas nos diversos regimes regulados, tendo todas as cláusulas cuja anulabilidade é suscitada pelos AA, no actual AE, redacções substancialmente diferentes no novo Acordo. Aliás, o mesmo nunca se lhe aplicou, face ao que dispõe o art.º 9º do DL n.º 519-C1/79, dado que quando ocorreu a cisão já tinha decorrido o prazo de vigência estabelecido no mesmo – 20 meses após a sua entrada em vigor (nº2 da cláusula 3ª do AE). Mesmo que assim não se entenda, sempre haveria que considerar o mesmo caducado no dia 8 de Agosto de 2002, quando entrou em vigor o actual AE. Invocou ainda a ilegitimidade passiva uma vez que nos termos do art.º 184/1 do CPT, se refere que todos os outorgantes são citados para no prazo de 20 dias apresentarem a sua alegação por escrito. No caso, falta a intervenção da ANA, que outorgou o referido AE. Não estando presente, há preterição de litisconsórcio necessário passivo, pelo que requer a sua intervenção provocada. Impugna ainda parte da matéria alegada pelos autores e as conclusões jurídicas apresentadas. Conclui pela improcedência da acção por não se verificar nas cláusulas do AE em causa violação de normas legais imperativas ou tratamento menos favorável do que o estabelecido por lei, ou ainda qualquer outro fundamento que importe a sua anulação total ou parcial ou interpretação diversa daquela em que tem assentado a sua aplicação. Foi posteriormente proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu as rés dos pedidos. Os autores, inconformados, interpuseram recurso de Apelação, tendo para o efeito formulado as a seguir transcritas Conclusões « 1 - A Matéria de Facto da douta sentença não teve em consideração todos os factos dados como provados; 2 – Devem igualmente ser dados como provados os factos acima identificados na lª parte deste Recurso; 3 - Aliás, na douta sentença, e em sede de decisão de direito faz-se remissão para factos que não foram na sentença dados como provados, como sejam os valores constantes dos Quadros e as próprias normas do Acordo de Empresa; 4 - Sendo este um processo especial de anulação de cláusulas de Acordo de Empresa, as cláusulas que se pretendem anular têm de fazer parte da matéria de facto e estando em causa valores pecuniários, têm também os mesmos ser dados como provados. 5 - O art.º 12 do DL n.º 421/83 é inconstitucional desde a sua entrada em vigor, por violar o art.º116 n.º 6 da CRP (introduzido pela Lei Constitucional 1/82 no art.º 115 n.º 5), por violar o art.59, n.º 3 e 18º n.º1 da CRP, por violar o art.º 59, n.º 2 alínea b) da CRP conjugado com o princípio do primado da lei; 6 - A norma contida na primeira parte do n.º 2 art.º 19 do DL n.º 409/71 foi revogada pelo DL n.º 260/76; 7 - Sendo inconstitucional o art.º 12, do DL n.º 421/83, tem aplicação aos AA. e à R. NAV todo o regime jurídico legal contido neste diploma; NOUTRA PERSPECTIVA, MAS SEM CONCEDER: 8 - Se a aplicação do DL está dependente da publicação de uma Portaria, que vai regulamentar nas empresas públicas o trabalho suplementar, então também não pode um Acordo de Empresa vir a regular tal matéria; 9 - Por igualdade de razão, não é possível defender a não aplicação da lei geral, porque não há uma portaria, e vir a defender simultaneamente que um Acordo de Empresa tenha aplicação; 10 - Se as relações laborais entre os AA. e a R. NAV, por força do art.º 12, do DL n.º421/83, têm de ser regulamentadas por Portaria não pode um Acordo de Empresa vir a regular tais matérias; 11 - Nestas circunstâncias estamos perante um vazio legal, mas não perante uma situação juridicamente insolúvel; 12 - Na verdade, os AA. prestaram efectivamente trabalho suplementar, pelo que haverá uma lacuna na, lei, que tem de ser decidida por força dos art.ºs 9, n 1 do C. Civil e 2, n.º 2 do CPC; 13 - A interpretação do art.º 12, do DL n.º 421/83, perpetrada pelo Tribunal "a quo”, não tem qualquer base legal; 14 - O art.º 12, em apreciação, é uma norma de autorização para praticar acto com força legislativa, e tem a sua validade até 31 de Março de 1983; 15 - Não tendo sido publicada a portaria até 31 de Março de 1983, caducou a autorização para definir por portaria a adaptação do regime do trabalho suplementar às empresas públicas e extinguiu-se esta norma que é manifestamente provisória; 16 - Além disso, o legislador não quis afastar a aplicação do DL 421/83 às empresas públicas, mas sim pretendeu estatuir por portaria um regime provisório que caducaria ao fim de 1 ano; 17 - Esse regime provisório seria inclusive aplicado simultaneamente com o DL 421/83, em tudo o que não o contrariasse; 18 -Deve interpretar-se que o art.º 12, em causa estabelece unicamente uma vacatio legis, de aplicação do DL n.º 421/83 às empresas públicas, pelo prazo de 1 ano; 19 - Não se vislumbra em parte nenhuma da norma em interpretação que o legislador tenha querido derrogar para sempre a aplicação do DL n.º 421/83 às empresas públicas, antes pelo contrário, era sua intenção aplicá-lo, daí que tenha dado um prazo para a criação da portaria e um prazo para a sua de vigência; 20 - O Direito é um todo, sendo certo que as empresas públicas e o sector empresarial do Estado em geral, não merecem qualquer protecção diferente, nem os trabalhadores podem ser tratados de forma diferente de todos os outros trabalhadores; 21- A interpretação correcta do art.º12, nomeadamente tendo em consideração o pensamento legislativo subjacente, permite concluir que desde 1 de Abril de 194 que o DL 421783 é aplicável às empresas públicas; EM QUALQUER CIRCUNSTÂNCIA: 22 - O conceito de retribuição previsto no AE, para remuneração do trabalho suplementar, viola o disposto no art.º 82, n.º 2 da LCT e é mais prejudicial para os AA.; 23 - Na douta Sentença entendeu-se que a lei geral permite interpretar restritivamente o conceito de retribuição para o trabalho suplementar, mas não se nomeou na sentença a norma jurídica legal que permite tal entendimento, pelo que nessa parte a sentença é nula, por falta de fundamentação de direito (violou-se assim o art.º 668, n.º 1 alínea b) do CPC). 24 - A R. NAV quando os AA. prestam trabalho extraordinário (para além do período normal de trabalho), remunera-os com o valor/hora da retribuição mínima mensal e o acréscimo de 25% na lá hora e 50% na 2á hora e subsequentes, também é calculado sobre essa retribuição (cláusula 105° do AE); 25 - A lei geral além de entender que o conceito de retribuição para aferir o valor/hora do trabalho extraordinário engloba todas as prestações mensais regulares e periódicas recebidas pelos AA., confere ainda o direito de os AA. receberem acréscimos de 50% e 75% (arte 7º n.º 1 do DL n.º421/83); 26 - Os AA. quando prestam trabalho extraordinário recebem menos salário do que quando prestam trabalho em período normal; 27 - A R. NAV quando os AA. prestam trabalho suplementar prestado em dia de descanso semanal obrigatório ou complementar, remunera-os com o valor/hora da remuneração mínima mensal e o acréscimo de 100% e de 125% é calculado sobre esse mesmo valor/hora (cláusula 106° do AE); 28 - A lei geral remunera este trabalho suplementar com o valor/hora da retribuição global e prevê um acréscimo de 100% dessa retribuição (art.º 7, n. 2 do DL n.º 421/83); 29 - Com a aplicação do AE os AA. recebem menos salário, quando prestam trabalho suplementar, do que receberiam se se aplicar a lei geral; 30 - Os AA. estão manifestamente a ser prejudicados, sendo que o art.º 105° do AE é mais desfavorável para os AA. do que o art.º 7, n.º1 do DL n.º 421/83 e o art.º 106º do AE é mais desfavorável do que a aplicação do art. 7.ºn.º 2 do mesmo diploma legal; 31 - O valor da remuneração horária previsto na cláusula 102 do AE, é manifestamente ilegal e viola o estatuído no art.º7, n.º 3 do DL 421/83, que remete para o art.º 29, do DL n.º 874/76; 32 - Deve ser conhecida e declarada a anulação ou nulidade das cláusulas 102ª, 105ª e 106ª do AE, por violarem o art.º 7 n.ºs 1, 2 e 3 do DL n.º421/83, e serem manifestamente mais prejudiciais aos AA., pelo que violam a norma imperativa contida no art.º 6, n.º 1 alínea c) do DL n.º519/C1/79, de 29 /12, força essa que lhe é conferida pelo art.º 59, .º 3 da CRP. Termos pelos quais, nos melhores de Direito e sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve a douta Sentença ser revogada na parte relativa à remuneração do trabalho suplementar e, consequentemente ser substituída por acórdão que declare anuladas as cláusulas 102ª, 105ª e 106ª do Acordo de Empresa, publicado no B.T.E. 1ª Série, n.º 40, de 29.10.92, por serem mais desfavoráveis para os Autores. » A ré NAV. pugnou pela manutenção do decidido, mas interpôs recurso subordinado, tendo para o efeito proferido nas suas alegações as seguintes Conclusões « 1. A acção de anulação e interpretação de cláusulas de convenções colectivas de trabalho, prevista nos artigos 183° a 186° do Código de Processo de Trabalho apenas pode versar sobre cláusulas de convenções colectivas em vigor. 2. Ora, contrariamente ao sustentado na decisão em crise, entende a NAV que o Acordo de Empresa objecto de apreciação na presente acção, caducou em 8 de Agosto de 2002, data em que foi publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, n°29, 1ª Série, de 8 de Agosto de 2002, o novo Acordo de Empresa que o veio substituir integralmente. 3. A circunstância de existir um "vazio" jurídico relativamente à vigência de uma convenção colectiva na NAV não prejudicou os direitos e regalias dos trabalhadores transferidos e que tiveram a sua origem no AE da ANA. É este, claramente, o alcance do art.°19, n.° 4, do Decreto Lei n.° 404/98, de 18 de Dezembro. 4. Ou seja, mantém-se os direitos e regalias dos trabalhadores nos termos previstos no AE, não por via da validade deste instrumento de regulamentação colectiva, mas pela sua incorporação no estatuto colectivo laboral através daquele dispositivo legal. 5. Tendo caducado o AE, a pretensão dos autores de anulação e interpretação das suas cláusulas, ao pressupor a vigência deste instrumento de regulamentação colectiva, não poderá proceder. 6. A não verificação do pressuposto vigência da convenção, decorrente da sua caducidade, configura uma excepção dilatória inominada que obsta ao conhecimento do mérito pelo tribunal e dá lugar à absolvição da instância, nos termos das disposições conjugadas dos art.º 493.°, n.° 2, e 288.°, n.° 1, al. e), do Código de Processo Civil, ex vi do que estabelece o art.º 1, n.° 2, al. a), e n.° 3, do Código de Processo do Trabalho, excepção esta que desde já invoca para os legais efeitos, comandos jurídicos estes violados pela Douta Sentença em crise ao decidir como decidiu. Termos em que, Com o douto suprimento de V. EXAS., deverá revogar-se a douta sentença recorrida na parte em que julgou improcedente a excepção da caducidade da convenção colectiva, com a consequente absolvição, da NAV, da instância.» Nas contra-alegações os autores pugnaram pela manutenção do decidido no que respeita à excepção de caducidade. O Exmº Procurador-geral- adjunto deu parecer no sentido da confirmação do decidido na sentença recorrida. Colhidos os vistos legais CUMPRE APRECIAR E DECIDIR I - As questões suscitadas nas conclusões dos recursos delimitam o seu objecto, ao abrigo dos art.ºs 684, n.º3 e 690, n.º 1 do CPC, são: No recurso principal, os autores/recorrentes além de impugnarem a matéria de facto, põem em causa a legalidade das cláusulas do AE relativas ao pagamento do trabalho suplementar. No recurso subordinado a ré suscitou a caducidade do AE em causa. II – Fundamentos de facto Foram considerados provados os seguintes factos: 1. A ré NAV resultou da cisão da ANA-Aeroportos e Navegação Aérea,E.P., operada pelo DL 404/98, de 18.12. 2 . Os autores foram funcionários da ANA,S.A.até à cisão e são actualmente funcionários da 1ª ré . 3. Todos os autores exercem as funções correspondentes à categoria de técnico de informação e comunicações aeronáuticas (TICA) e o seu local de trabalho é no Centro de Controlo de Tráfego Aéreo do Aeroporto de Lisboa. 4.Em 1981, foi celebrado um acordo de empresa entre a Ana,E.P. e o SITAVA, publicado no BTE 1ª série, nº21, de 8.06.81. 5.Nesta data apenas o SITAVA representava os trabalhadores da ANA. 6. Em 29 de Julho de 1983, é celebrado um novo Acordo de Empresa entre a ANA,EP, o SITAVA e o SINCTA, publicado no BTE, 1ª série, n.º 42, de 15.11.1983. 7. Em 13 de Abril de 1988, é celebrado um Acordo de Empresa entre a ANA,E.P., o SINCTA e o SITAVA, publicado no BTE 1ª série, n.º 20, de 29.5.89, aplicável apenas à classe profissional de controlador de tráfego aéreo. 8. Em 1991, é celebrado um Acordo de Empresa entre a ANA,EP e o SINCTA, o SITAVA, o SITECSA, o SQAC, o SINDOPA e o SINTICA, publicado no BTE, 1ª série, n.º 40, de 29.10.92. 9. Em 24 de Fevereiro de 1993, é acordada uma alteração parcial ao AE de 1991, publicada no BTE, 1ª série, n.º 13 de 8.4.95, assinado pela ANA,EP e o SITAVA, SINCTA, SQAC, SITECSA, SINTICA e SINDOPA. 10. A ré detém a concessão e a exploração do espaço aéreo em Portugal, tendo parte dos seus serviços principais no Aeroporto de Lisboa. 11.O Aeroporto de Lisboa é um aeroporto internacional, aberto todo o dia e pelo espaço aéreo português circulam aviões durante as 24 horas do dia. 12.Em consequência, a ré NAV é uma empresa que tem serviços onde se trabalha por turnos contínuos rotativos, durante 24 horas por dia e 365 dias por ano. 13. Um dos serviços da ré que trabalha 24 horas por dia e 365 dias por ano é o Centro de Controlo de Tráfego Aéreo do Aeroporto, onde todos os autores exercem as suas funções nos Serviços de Dados de Voo. 14. Todos os autores trabalham em regime de 3 turnos rotativos contínuos, assegurando um serviço que está a laborar 24 horas por dia e 365 dias por ano. 15.De 1991 até Agosto de 1993, os turnos de trabalho dos AA eram organizados conforme consta da página 2914 e 2915 do BTE onde se encontra publicado o AE de 1991. 16. Todos os autores trabalhavam durante 3 dias e estavam 3 dias sem trabalhar (1 dia de folga, 1 dia de descanso semanal obrigatório e um dia de descanso semanal complementar). 17.Nesta altura havia 6 grupos de trabalhadores para preencherem os turnos, porque quando estavam três turnos a trabalhar os outros 3 grupos folgavam. 18. Cada grupo de trabalhadores era composto por 6 trabalhadores. 19. Até Agosto de 1993, no Centro de Controlo de Tráfego Aéreo, havia um número mínimo de 36 TICAS (Técnicos de Informação e Comunicações Aeronáuticas). 20. Desde Agosto de 1993 até à presente data, o serviço dos autores no que respeita aos turnos foi alterado, sendo que passaram a trabalhar 3 dias seguidos e a ter dois dias de descanso semanal e está organizado como consta do quadro junto a fls. 164. 21. O trabalho prestado no Serviço de Dados de Voo que era realizado em 1991 por 36 trabalhadores é actualmente prestado por um número mínimo de 20 TICAS. 22. Cada um dos autores tem o seu próprio mapa de escalas e trabalha consecutiva e continuadamente no turno da tarde (14-22 horas), no turno da manhã (7-14 horas) e no turno da noite (22-07 horas), tendo então direito a dois dias de descanso, sendo o primeiro o complementar e o segundo o obrigatório. 23.Pela prestação do trabalho, os autores recebem a título de contrapartida uma remuneração pecuniária, consubstanciada em várias rubricas. 24.Sempre que os autores efectuaram trabalho fora da sua escala, recebiam: .remuneração por trabalho extraordinário; .remuneração por trabalho prestado em dia de descanso semanal, complementar ou feriado; .remuneração do trabalho prestado em dia de descanso semanal ou complementar que coincida com feriado. 25.Em Julho de 1993 a remuneração operacional dos autores aumentou na sua percentagem e foi suprimido o subsídio de polivalência.. 26.Desde 1 de Janeiro de 1995 foram pagas aos autores, primeiramente pela ANA e depois de 19.01.99, pela NAV, quantias pecuniárias a título de “remuneração mínima mensal”, “diuturnidades”, “subsídio de turno”, “remuneração operacional” e “subsídio de refeição”. 27.Quando autores trabalhavam para além do que está previsto na escala de turnos, continuam ainda a receber as seguintes prestações: .remuneração por trabalho extraordinário; . remuneração prestado em dia de descanso semanal, complementar ou feriado. .remuneração do trabalho prestado em dia de descanso semanal ou complementar que coincida com o feriado 28. A ré NAV paga aos autores , a título de subsídio de turno, 21% sobre a remuneração mínima mensal prevista para a sua categoria. III - Impugnação da matéria de facto Os autores recorrentes restringiram o seu recurso à decisão proferida sobre a matéria de facto e sobre o trabalho suplementar, dele excluindo a matéria relativa ao subsídio de turno/trabalho nocturno. No que respeita à impugnação da matéria de facto, pretendem os recorrentes a sua ampliação, nos seguintes termos : - que a matéria de facto inclua as próprias cláusulas do AE e a sua interpretação. - que além do Acordo de Empresa, regulamentam as relações entre a ré NAV e os autores o Regulamento Autónomo dos Técnicos de Informação e Comunicações Aeronáuticas (RATICA), previsto na cl. 4º n° 2, § II, do A.E. e publicado como anexo no mesmo B.T.E.; - que o Acordo de Empresa de 1991, com as alterações de 1993, mantém-se actualmente em vigor e aplica-se às relações laborais entre os autores e a ré NAV.; - que cada um dos autores trabalha em média 144 horas por mês, e presta em média 66 horas de trabalho nocturno, sendo este o prestado entre as 20 horas de um dia e as 7 horas do dia seguinte, tudo como consta do Mapa junto aos autos a folhas 164; - que a remuneração base dos autores é denominada no Acordo de Empresa de remuneração mínima mensal ou remuneração mensal mínima; que em 1991, além da remuneração mínima mensal, estava previsto no Acordo de Empresa os autores receberem: diuturnidades; . subsídio de turno; . remuneração operacional; . subsídio de disponibilidade; . subsídio de polivalência; subsídio de refeição"; - que entre Janeiro de 1991 e Dezembro de 2001 os autores 1 ° a 5° prestaram o trabalho, e foram remunerados pela ré NAV, conforme se encontra discriminado nos Quadros n°s 2 a 5 da petição inicial, a folhas 165 a 253 dos autos, que aqui se dão por inteiramente reproduzidas; - que todas as remunerações previstas nos Quadros n° 2, folhas 165 a 183, são ou eram recebidas de forma regular e periódica e compreendem o conceito de remuneração previsto no art.°82, da LCT; - que a cláusula 105° do A.E. de 1991, dispõe que: "A primeira hora de trabalho extraordinário será remunerada com um aumento correspondente a 25% do valor/hora da remuneração mensal mínima e as horas subsequentes com um aumento correspondente a 50%"; - que o cálculo do valor hora , previsto na cl. 102° do A.E., tem a seguinte redacção: "O valor da remuneração horária é calculado pela seguinte fórmula: RH = RMx 12 52xN em que RM é o valor da remuneração mínima mensal e N o período de trabalho semanal". Analisemos então as pretensões dos recorrentes. A inclusão entre a matéria de facto provada do teor das cláusulas do Acordo de Empresa cuja anulação é visada, é incorrecta pois constitui a matéria direito que cumpre apreciar no âmbito deste recurso, sendo que resulta do artº183 do CPT a obrigatoriedade da junção do AE em questão, o que sucedeu no caso, encontrando-se o mesmo junto, como documento n.º1 anexo à petição inicial. De igual modo, as afirmações, de que além do Acordo de Empresa regulamentam as relações entre a ré NAV e os autores (..) , o Acordo de Empresa de 1991, com as alterações de 1993, mantém-se actualmente em vigor e aplica-se às relações laborais entre os autores e a ré NAV, são conclusivas, não consubstanciando qualquer facto material, pois constituem a mera apreciação e análise sobre a aplicabilidade e vigência dos instrumentos em causa, matéria esta que envolve uma valoração de direito sobre estas questões que implica a interpretação e aplicação das normas jurídicas inerentes. Por seu turno, a alegação de que cada um dos autores trabalha em média 144 horas por mês, e presta em média 66 horas de trabalho nocturno, sendo este o prestado entre as 20 horas de um dia e as 7 horas do dia seguinte, tudo como consta do Mapa, junto aos autos a folhas 164, e que entre Janeiro de 1991 e Dezembro de 2001, os autores 1º a 5° prestaram o trabalho, e foram remunerados pela ré NA V, conforme se encontra discriminado nos Quadros n °s 2 a 5 da petição inicial, a folhas 165 a 253 dos autos, são factos que foram impugnados pela recorrida no articulado de oposição, não podendo por isso serem considerados na matéria de facto assente, ainda que se admita que os mesmos possam ser importantes para ao conhecimento da acção. Mas, encerram também conclusões de direito ou juízos de valor, as alegações de que a remuneração base dos autores é denominada no Acordo de Empresa de remuneração mínima mensal ou remuneração mensal mínima , e que todas as remunerações previstas nos Quadros n° 2, folhas 165 a 183, são ou eram recebidas de forma regular e periódica e como tal compreendem o conceito de remuneração, previsto no art.º 82, da LCT. Na matéria de facto apenas devem constar os factos materiais não podendo nela fazerem-se incluir quaisquer conclusões ou juízos de valor, pelo que se nos afigura incorrecta a requerida ampliação da matéria de facto. Improcede assim este fundamento da apelação. IV – Fundamentos de direito Caducidade do AE (recurso subordinado) Por se tratar de uma questão prévia, começamos por apreciar a excepção da caducidade relativa ao AE em causa, suscitada pela ré no seu recurso subordinado. A questão que se coloca no âmbito deste recurso é apenas a relativa à excepção de caducidade do AE em causa . Pretende a ré NAV que tal excepção seja julgada procedente e declarada a caducidade do AE, invocando para o efeito duas razões. 1. Porque decorreu o prazo de vigência do AE; 2. Porque, desde 8 de Agosto de 2002, passou a vigorar um novo Acordo de Empresa, que veio substituir integralmente o de 1991, posto em causa nesta acção. Vejamos então cada um dos fundamentos da recorrente. 1. Sobre o prazo de vigência. Na sentença recorrida foi entendido que das cláusulas 2ª e 3ª do AE não decorre que o mesmo previsse qualquer prazo de vigência. A ré NAV entende, porém, que dessas cláusulas decorre que há um prazo de vigência de 20 meses contados sobre o início da sua vigência (cfr. n.º 2 da cláusula 3ª) . Esta cláusula 3ª do AE, sob a epígrafe de “ Denúncia”, dispõe no seu n.º2 , que : " - A denúncia das cláusulas sem expressão pecuniária pode ocorrer a todo o tempo e por iniciativa de qualquer das partes, passados 20 meses sobre o início da sua vigência, sendo simultânea, neste caso, a denúncia da tabela." Assim, o que está em causa neste normativo é apenas a denúncia das cláusulas do AE, mas não a sua caducidade, e ainda que as duas constituam formas de extinção das obrigações não se confundem já que a denúncia específica dos contratos de duração indeterminada caracteriza-se por ser livre e discricionária, enquanto que um Acordo Colectivo caduca sempre que sobrevenha o prazo acordado para a sua extinção. Por outro lado, a cláusula 2ª do AE, que tem como epígrafe "Vigência", não estipula nenhum prazo para o AE, prevendo somente que as tabelas salariais vigoram por 12 meses. O art.º 11, do DL n.º 519C/79, prevê como prazos de vigência das convenções colectivas o prazo que dela constar expressamente, ou que se mantêm em vigor até serem substituídas por outro instrumento de regulamentação colectiva. Assim, o Acordo de Empresa em apreciação por não ter estipulado qualquer prazo de vigência não contém, expressamente, qualquer prazo de caducidade pelo que não pode colher o argumento de que o Acordo de Empresa caducou no seu termo de vigência. 2. Sobre o novo A.E. de 8 de Agosto de 2002, que passou a vigorar na ANA, SA. Este novo Acordo, invocado pela Ré NAV, foi negociado pela ANA, SA com os sindicatos que representam os seus trabalhadores, pelo que os seus efeitos e âmbito de aplicação só se repercutem entre a ANA SA e os seus trabalhadores. Com efeito, a cisão da ANA, EP em ANA, SA e NAV, EP, ocorrida por força do DL n.º 404/98 de 18/12, o Acordo de Empresa de 1991, passou a vigorar distintamente ou autonomamente na ANA, SA e na NAV EP, ou seja, o Acordo de Empresa de 1991, elaborado no âmbito de uma empresa pública, passou a vigorar simultaneamente numa nova empresa pública criada por decreto-lei, a NAV EP e numa nova empresa privada, criada por transformação, a ANA S A, por força do art.º 19, n.º 4 do D.L. 404/98, de 18 de Dezembro, que preceitua que Acordo de Empresa de 1991 mantém-se na NAV EP e na ANA SA, "até à celebração de novos instrumentos de regulamentação colectiva". Assim, o AE de 1991 mantém-se na NAV EP até ser substituído por outro instrumento de regulamentação colectiva, o que até à presente data ainda não ocorreu. Não faz qualquer sentido invocar que o novo Acordo de Empresa, firmado entre a ANA S.A e os sindicatos que representam os seus trabalhadores, seja também aplicável na NAV EP. Na verdade, com a cisão perpetrada pelo DL n.º 404/98, cada uma das empresas criada e transformada, a NAV EP e a ANA SA, mantiveram autonomamente o Acordo de Empresa de 1991, por força do n° 4 do art.º 19, daquele diploma legal; só que com o AE de 2002 a ANA SA fez caducar, no que a si diz respeito, o AE de 1991, por ser globalmente mais favorável para os seus trabalhadores. Mas este não pode ter aplicação às relações laborais entre a ré NAV EP e os autores, não tendo feito caducar o AE de 1991, no que respeita às suas relações laborais entre a ré NAV e os autores. Face ao exposto, carecem de fundamento as razões invocadas pela ré NAV relativas à procedência da caducidade do AE em questão, Improcedendo deste modo o recurso subordinado por si interposto. Analisaremos agora as questões de fundo suscitadas no recurso de Apelação relativas à anulação das cláusulas do AE de 91, no que respeita ao pagamento do trabalho suplementar. a) Sobre a aplicação do DL n.º 421/83 de 2 de Dezembro de 1983. Na sentença recorrida foi decidido que o regime legal sobre o trabalho suplementar previsto no DL n.º 421/83, não tem aplicação às empresas públicas, isto porque, de acordo com o seu art.º12, o legislador quis "que a sua aplicação ficasse dependente de publicação de portaria que estabelecesse as necessárias adaptações, face às características das empresas em causa", fundamentando-se na jurisprudência do STJ, designadamente, no acórdão do STJ de 31.3.2004 (Internet. www.dgsi.pt). Na sequência, decidiu que, sendo a ré NAV uma empresa concessionária de um serviço público, o pedido formulado porque alicerçado na aplicação do citado decreto-lei teria de improceder. Defende aquele acórdão que o DL n.º 421/83, não é aplicável às empresas concessionárias de serviços públicos, visto que, nos termos do art.º 12 do mesmo diploma, a sua extensão a tais entidades ficou dependente de publicação de Portaria que estabeleceria as necessárias adaptações, mas como aquela não foi publicada, verifica-se um ilegalidade de norma por omissão. Os recorrentes invocam diversas razões para fundamentarem um entendimento diverso, nomeadamente a inconstitucionalidade do aludido art.º 12 do mesmo DL, a qual que nos parece ser de acolher pelas razões invocadas que passamos a analisar: Com efeito, não pode uma Portaria vir definir o regime jurídico laboral dos autores, no que diz respeito à remuneração do trabalho suplementar, sob pena de violação o princípio constitucional do primado da lei e o princípio constitucional da primariedade ou precedência da lei sobre a actividade regulamentar, ou seja, a lei considerada imperativa ou com força constitucional prevalece sempre sobre qualquer regulamento que a minimize, derrogue, interprete deficientemente, etc. Todas as normas respeitantes ao salário "gozam de garantias especiais”, nos termos do art.º 59, n.º3 da CRP, e a garantia dos salários decorre da lei geral, pelo que as leis sobre salários têm sempre aplicação, salvo se for estabelecido regime mais favorável para o trabalhador, pelos meios constitucionalmente admitidos. Em consequência, não se pode defender que o DL n.º 421/83, não tem aplicação e que existe um vazio legal, porque tal seria uma violação da garantia constitucional das normas relativas ao salário. Todavia, é, de facto, estranho que o legislador nunca tenha publicado tal Portaria, passados que foram 20 anos sobre a publicação da lei, provavelmente houve razões para nunca tenha sido publicada, designadamente a de se ter admitido que tal norma era inconstitucional. A Lei Constitucional n.º1/82, de 30 de Setembro, aditou o n.º5 do 115° da Constituição, que proibiu “ a criação de actos legislativos através da Lei”, a corresponde actualmente ao n.º 6 do art.º 112, da Constituição. 0 DL n.º 421/83, foi publicado em 2 de Dezembro, ou seja pouco mais de 1 ano após a revisão constitucional de 1982. 0 seu art.º 12, n.º1, concede autorização para se criar por Portaria um regime jurídico para as empresas públicas. Afigura-se assim que esta "deslegalização" de matérias jurídicas, com a criação de regimes especiais ou regulamentos através de actos que não assumem a forma de lei é inconstitucional, porque violadora do citado n.º6 art.º112, da CRP. Com decidiu o Tribunal Constitucional, no Acórdão de 29/10/1985, publicado no Diário da República em 31/12/1985 (em www.dgsi.pt), "Até à revisão constitucional de 1982 poderia entender-se que o Parlamento ou o Executivo legislador, pudessem deslegalízar certas matérias que não devessem assumir, necessariamente, a forma de lei, por meio de regulamentos "praeter" ou até "contra legem". O art.º 115º, n.5 da Constituição, aditado pela Lei Constitucional n.º 1/82 de 30 de Setembro, eliminou, porém, a legitimidade de tais Regulamentos.” Neste acórdão foi declarada a inconstitucionalidade de um artigo, vertido num Decreto-lei, que permitia a vários ministérios, por Portaria, suspenderem por três meses a execução da própria lei. Nos presentes autos está em causa a suspensão da lei até à publicação de uma portaria, que por sua vez criará um regime jurídico diferente do previsto na própria lei, o que configura uma situação idêntica à tratada no citado acórdão do Tribunal Constitucional . Mas, sobre esta matéria veja-se, ainda, o acórdão do Tribunal Constitucional de 15/11/1995, publicado no Diário da República em 26/12/1995, que declarou a inconstitucionalidade da Portaria n.º 820/79, de 15 Setembro, que definia o regime jurídico dos trabalhadores das instituições de previdência social. No caso deste acórdão, por a Portaria ser anterior a 1982, a inconstitucionalidade foi decretada apenas a partir da data da publicação do próprio acórdão. Assim sendo, torna-se compreensível que regime jurídico em causa "dependente de portaria" nunca tenha sido publicado já que a norma prévia 8 art. 12 do DL 421/83) é inconstitucional. Mas, acresce que, a norma do n.º 2 do art. º 1 do DL 409/71, para a qual remete o art.º 12 do DL n.º 421/83, já foi considerada como revogada. Na verdade, com a entrada em vigor do DL n.º 260/76, de 8/4, que define ou consagra o Estatuto das Empresas Públicas (actualmente revogado pelo DL 558/99, de 17/12), tem de se considerar que foi revogado o n.º2 do art.º 1, da LDT. Este é o entendimento de Liberal Fernandes que refere : "Assim, dado o princípio da lex posteriori derogat legís priori e o facto de o regime do contrato individual de trabalho não poder ser modelado por via unilateral ou administrativa, mas apenas através de um acto legislativo, deve o disposto no n.º 2 do art.º 2, da LDT considerar-se revogado na parte em que permite que o decreto regulamentar fixe a disciplina do trabalho” . In Comentário às leis de Duração do Trabalho e do Trabalho suplementar, Coimbra editora, 1995, pág. 28. Ainda Liberal Fernandes : "... quando o DL que cria a empresa pública define expressamente os limites das modificações a introduzir relativamente ao regime do contrato individual do trabalho, então, desde que não estejam em causa as liberdades, garantias e direitos económicos dos trabalhadores (art.º 18, n.º 2, da CRP), já o estatuto do pessoal poderá consagrar as especificidades do regime laboral aplicável à empresa. Porém, quando isso aconteça, é ainda o acto legislativo a estabelecer as linhas fundamentais em que assenta a disciplina adoptada." O Decreto-lei que criou a ANA-Aeroportos e Navegação Aérea, E.P e o Decreto Lei que criou a R. NAV, não consagraram nenhuma especificidade para os seus trabalhadores, sendo certo que esses decretos lei seriam as únicas fontes jurídicas que poderiam proceder à adaptação do regime laboral dos seus trabalhadores, pelo que não pode tal regime ser alterado por via regulamentar. O art.º 12, do DL n.º 421/83, é assim inconstitucional, por violação do m.º6 do art.º 112, e dos artigos 59º n.º 3 e 1.º n.º1 da Constituição.Afigura-se-nos assim concluir que o DL n.º 421/83 é efectivamente aplicável às relações laborais entre os autores e a ré NAV. b) Nulidade das cláusulas relativas ao conceito de remuneração e pagamento do trabalho suplementar. Sobre o conceito de retribuição atendível para cálculo do valor/hora do trabalho suplementar, os recorrentes defendem que o cálculo do valor/hora, previsto na cláusula 102ª do AE, e utilizado nas cláusulas que estipulam a remuneração por trabalho suplementar, cláusula 105ª, a remuneração do trabalho prestado em dia de descanso semanal, complementar ou/e feriado, cláusulas 106ª e 107ª, deve ser efectuado tendo por base o conceito de retribuição definido pelo art.º 82, da LCT, que inclui, além da remuneração mínima mensal, todas as prestações regulares e periódicas por eles recebidas, no caso concreto, as diuturnidades, a remuneração operacional, o subsídio de turno e o subsídio de refeição. Para tanto alegam que a introdução do conceito de remuneração mínima mensal, na fórmula da retribuição prevista no AE, reduz significativamente a remuneração devida por trabalho suplementar, prestado em dia de descanso semanal, complementar ou feriado (respectivamente, as citadas cláusulas 104ª, 105ª , 106ª e 107ª do AE. Pois que se recebem mensalmente, de forma regular e periódica, uma retribuição certa que inclui outras prestações para além da remuneração mínima mensal, o valor/hora do seu trabalho tem que ser valorizado sobre a totalidade dessa retribuição, porque será esse o valor exacto que é pago mensalmente pelo trabalho que prestam, cuja aplicação às diversas prestações referidas importa um tratamento menos favorável do que o estabelecido na lei. E em defesa deste entendimento, invocaram o disposto no art.º 29.° do Decreto Lei n.° 874/76, de 28 de Dezembro, que prevê o cálculo do valor da retribuição horária para os efeitos previstos naquele diploma (regime jurídico das férias, feriados e faltas), que é também o aplicável à remuneração de trabalho suplementar, por remissão do n.° 3, do art.º 7, do Decreto Lei n.° 421/83, de 2 de Dezembro. Vejamos Dispõe a clª 102 do AE, que, o valor da remuneração horária é calculado pela seguinte formula RH= RMx12/52 x N, em que RM é o valor da remuneração mínima mensal e N o período normal de trabalho semanal. No presente recurso os recorrentes insistem no entendimento de que o cálculo da retribuição devida por trabalho suplementar deve assentar no valor da retribuição global, pelo que o conceito de retribuição previsto no AE, para remuneração do trabalho suplementar, viola o disposto no art. 82°, n° 2, da LCT, que é mais desfavorável os recorrentes. Será assim ? Na verdade, nos termos do art.º 82.° da LCT, em especial o seu n.° 2, integra no conceito de retribuição o conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade empregadora está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da actividade por ele desempenhada. Na lei surgem inúmeras modalidades de retribuição, por ela directa ou indirectamente tratadas, que implicam a destrinça no conceito de retribuição global, englobando o conjunto de vantagens do trabalhador e a cargo do empregador, por via da existência duma situação jurídica laboral - de diversos tipos de retribuição, bastante variáveis. Esta variedade pode resultar do contrato celebrado, da lei e dos instrumentos de regulamentação colectiva aplicáveis, ou ainda dos usos da empresa e de orientações específicas da própria entidade empregadora no sentido de criar outras categorias de compensações enquadráveis no conceito amplo de retribuição. Assim, por exemplo, pode acontecer que um certo subsidio, embora pertencente à estrutura retributiva de harmonia com o art.º 82.°, não tenha que ser incluído no cálculo do subsidio de férias ou de Natal; ou deva ser pago apenas em períodos de serviço efectivo. Com efeito, a retribuição em sentido estrutural não é mais do que a descrição das compensações e das prestações que encontrem título na relação de trabalho. Como refere o Prof. Monteiro Fernandes, a remuneração de base é a que está vocacionada para servir de alicerce ao cálculo de todos os complementos, "(...) é sobre a retribuição-base, assim caracterizada, e não a partir do montante global do salário, que se calculam os acréscimos retributivos inerentes à prestação de trabalho extraordinário e trabalho nocturno, bem como nos dias de descanso semanal e feriados obrigatórios". In Direito do Trabalho, 11ª edição pág.449. O conceito - remuneração de base traduz o valor mínimo, com carácter certo (definido em função do tempo), constitui naturalmente a remuneração fixada na tabela das convenções colectivas, na base de um horário normal, para uma certa categoria profissional, a que acrescem e se contrapõem, em regra, todas as outras prestações complementares ou acessórias. Assim, afigura-se-nos que o conceito de retribuição mínima mensal utilizado na clausula 102º, não viola o disposto no art.º. 82 da LCT, pois que este também o inclui, sendo certo que o conceito de retribuição base também é, expressamente, utilizado na lei de carácter imperativo como é o caso, por exemplo, do art.º 13 DL n.º 64 A /89, quando estipula que numa situação de despedimento ilícito a indemnização por antiguidade a que o trabalhador tem direito é calculada com base na retribuição base. Outro questão é a de saber se no cálculo do trabalho suplementar conforme a clª 105 ao remeter para a clª 102, que estatui para ao cálculo do valor/hora a retribuição mínima mensal, pressupõe m regime menos favorável para os trabalhadores do que o previsto na lei geral, pois como alegam as recorrentes, face ao disposto no n.º3 do art. 7º, do DL n.º 421/83, de 2 de Dezembro, que remete para o art.º 29.° do Decreto Lei n.° 874/76, de 28 de Dezembro, aí se prevê para o cálculo do valor da retribuição horária o valor da retribuição global. Assim, não assentando o cálculo do valor/hora no mesmo conceito de retribuição, poderá neste caso verificar-se um conflito de normas, no sentido em que as fontes hierarquicamente diferentes, vocacionadas para regular a mesma questão, colidem nas soluções que prevêem para a majoração da remuneração por trabalho suplementar prestado. Sobre a prevalência na aplicação das normas, estatui expressamente o n° 1 do artigo 13° da LCT: "l. As fontes de direito superiores prevalecem sempre sobre as fontes inferiores, salvo na parte em que estas, sem oposição daquelas,estabelecem tratamento mais favorável para o trabalhador.". Trata-se do princípio do tratamento mais favorável do trabalhador ou do favor laboratoris, numa das suas acepções e que rege também as relações entre o contrato individual de trabalho e as fontes juslaborais, nos termos do artigo 14°, n° 2, da LCT, e do artigo 14°, n° 1, do decreto-lei n° 519-C1/79, de 29 de Dezembro (LRCT). A fixação formal dos termos da comparação tendente a determinar o regime mais favorável para o trabalhador segue duas teses tradicionais: Segundo a teoria do cúmulo, nos conflitos hierárquicos deve prevalecer a norma mais favorável para o trabalhador: a comparação assim pressuposta deverá ser feita regra a regra, isoladamente, para que o regime aplicável às situações laborais seja equivalente a um somatório (isto é, a um cúmulo) de normas retiradas de diversas fontes e que, em comum, têm apenas o serem mais favoráveis para os trabalhadores. Esta teoria é geralmente acusada de violar a unidade da disciplina da situação jurídica laboral estabelecida por cada uma das fontes conflituantes. Já a teoria da conglobação preconiza que a regra do tratamento mais favorável deveria ser aplicada comparando as fontes em presença, na sua globalidade: prevalece a que, no conjunto, se revele mais útil para os trabalhadores. Contra a conglobação jogam as dificuldades de comparação a que pode conduzir - como cotejar dispositivos inteiramente diversos - e que a via por ela encetada pode provocar retrocessos em certos aspectos favoráveis, já conquistados para os trabalhadores. Numa posição intermédia surge a tese da conexão interna, ou conglobação limitada, segundo a qual a comparação deve ser feita não entre normas singulares nem entre as fontes na sua globalidade, mas entre grupos de normas incindíveis, que se encontrem entre si numa particular conexão interna: uma regra do tratamento mais favorável, a ter um conteúdo útil e uma presença actuante, deve efectivamente computar vantagens concretas e não meras conveniências abstractas, sendo que estas vantagens devem ser claramente apreciadas, ponto por ponto, não se devendo separar o incindível, sob pena de se perder uma base realista para qualquer apreciação. 0 direito português consagrou a regra ou princípio geral, aplicável a todas as fontes juslaborais, do tratamento mais favorável do trabalhador ou do favor laboratoris. Trata-se de uma regra - quer seguindo a referida posição tradicional, de «tipo estatutário», na resolução dos concursos hierárquicos de fontes, quer encarada como efectiva norma de conflitos - que cede quando uma fonte superior tenha uma assumida pretensão de aplicação absoluta. E assim, quando haja um conflito hierárquico entre fontes do direito de trabalho, aplicam-se as normas que estabeleçam o «tratamento mais favorável para o trabalhador», sejam elas quais forem, só assim não sucedendo quando a norma superior tenha uma intenção de aplicação efectiva, afastando a inferior, cfr., Manual de Direito do Trabalho António Menezes Cordeiro, Almedina/ 97, pág. 204 e segts. Na mesma obra, sobre os critérios da comparação entre normas, escreveu Menezes Cordeiro, p. 210-211: « .... II. Em primeiro lugar, há que atentar no preciso ponto em que vai operar a comparação que faculta o juízo de favorabilidade. Qualquer cotejo a realizar em Direito - e, para mais, com relevo em soluções materiais - há-de ser uma comparação de resultados. Contrapor normas releva de um positivismo ingénuo, que toma a proposição pela decisão aplicativa, os conceitos pela causa e a formulação pela substância: no fundo, emerge aqui, de novo, um nível linguístico de solução juslaboral, que se desliga das soluções efectivas e das realidades que, ao Direito, compete enquadrar e resolver. Em Direito, um «resultado» implica, com frequência, uma série de normas, teleologicamente interligadas, às quais se deve ainda, muitas vezes, juntar princípios. Comparar fontes no seu conjunto não é consequente, uma vez que elas podem somar problemáticas muito diversas, ao sabor de acasos que nada tenham de dogmático. Mas separar normas incíndíveis é puro irrealismo: equivale a abdicar de, na comparação, apurar resultados materiais. Optou-se, por isso pela tese da conexão interna – ou, se se quiser, pela teoria da conglobação limitada; adianta-se agora que a tónica do cotejo assente nos resultados possibilitados pela regras conectadas. III. Falar numa comparação de normas - e sabe-se agora que a correspondente operação deve operar entre grupos de normas em conexão interna, tendo em conta os resultados - para apurar qual o conjunto normativo mais favorável ao trabalhador diz ainda pouco sobre os critérios que devem mostrar tal operação. Um pouco na linha apurada pela jurisprudência alemã - e hoje pacífica - devem alinhar-se os seguintes parâmetros: - o cotejo é feito à luz dos interesses dos trabalhadores singulares; estando em causa situações jurídicas laborais - portanto, situações de pessoas, destinatárias últimas do Direito - é a nível destas que se concretizam - e logo tornam ponderáveis - os valores em jogo; - cotejo obedece a parâmetros objectivos - e logo iguais para todos os trabalhadores em circunstâncias laborais idênticas; de outra forma, pôr-se-iam em causa vectores primordiais como a igualdade, a segurança ou a própria generalidade das normas; ainda por esta ordem de ideias, relevam as vantagens profundas, em termos de valores do sistema, e não as aparências ou as qualificações legais. IV. Em conclusão, julga-se que a saída para os conflitos hierárquicos de normas juslaborais - a procurar, depois, perante coordenadas histórica e juspositivamente determinadas - deve obedecer às seguintes coordenadas: comparar conjuntos incindíveis de normas em função dos resultados; dar a primazia às posições das pessoas; obedecer a parâmetros objectivos.» No caso presente, é geralmente entendido que os valores retributivos fixados no artigo 7° do decreto-lei n° 421/83, de 2 de Dezembro, que prevê a remuneração por trabalho suplementar prestado, constituem mínimos de direito necessário, sendo por isso possível ampliá-los por via convencional. É assim pertinente a questão de saber se, de acordo com os critérios de comparação acima enunciado, o regime estabelecido pelo AE em causa que regula a retribuição do trabalho suplementar prestado por qualquer trabalhador estabelece ou não tratamento menos favorável do que o estabelecido por lei. Alegam os autores neste âmbito que quanto à cláusula 105ª do AE, a remuneração do trabalho suplementar é inferior à que resulta da aplicação da lei, dado que a retribuição mínima mensal dos autores só inclui os valores previstos no Anexo I do AE e na lei a retribuição mensal legal, inclui além da remuneração mínima mensal, todas as prestações regulares e periódicas, incluindo assim as diuturnidades, a remuneração operacional, o subsídio de turno e o subsídio de refeição. Além disso, no AE a 1ª hora é remunerada com um acréscimo de 25% e na lei com um acréscimo de 50%; quanto às horas subsequentes, na lei têm um acréscimo de 75%, enquanto no AE, o acréscimo é de 50%. Quanto à cláusula 106ª do AE, que dispõe sobre o pagamento do trabalho prestado no período de descanso semanal, complementar ou feriado: também aqui a introdução do conceito de remuneração mínima mensal na fórmula da retribuição reduz significativamente a remuneração dos autores, uma vez que a remuneração mínima mensal representa menos de 50% da remuneração mensal que inclui retribuição base, as diuturnidades, o subsídio de turno, a remuneração operacional e o subsídio de refeição. Em consequência quando os autores prestam trabalho suplementar em dia de descanso ou em feriado recebem pouco mais do que quando trabalham em horário normal de trabalho, recebendo até menos na 1ª hora. Em consequência do conceito de retribuição utilizados no AE e das percentagens previstas no mesmo, o 1º e o 2º autores receberam entre 1991 e 2001 cada um menos 7.286.117$00, o 3º A. menos 8.993.204$00, o 4º autor menos 1.285.581$00 e a 5ª A. menos 7.321.273$00. Por sua vez, a ré alega que da conjugação dos regimes de retribuição do trabalho suplementar e nocturno estabelecido pelo AE em questão e pela lei geral, resulta a comparação, que demonstrou em quadros, donde ressaltava que em média, o trabalho suplementar ( não considerando as majorações atribuídas ao trabalho nocturno) é remunerada no regime estabelecido pelo AE com um acréscimo de 258% e no regime estabelecido pela lei gral com um acréscimo de 188%. E conclui ainda que em media, o trabalho suplementar e nocturno é remunerado no regime estabelecido pelo AE com um acréscimo de 323% e no regime estabelecido pela lei geral com um acréscimo de 211% e as horas subsequentes com um aumento correspondente a 50%. Mesmo em concreto, de acordo com os elementos alegados pelos autores (mas não admitidos pela Recorrida nos termos especificados na alegação/contestação oferecida), isto é, considerando o trabalho suplementar que aqueles alegam ter prestado no período de 1991 a 2001, verifica-se que o regime retributivo previsto no AE em causa para o trabalho, prestado , fora do horário normal (que inclui, como se referiu, o trabalho suplementar e nocturno), é mais favorável do que o que resultaria da aplicação do estabelecido pela lei geral. Assim, exemplificativamente, cada um dos cinco primeiros autores teria alegadamente recebido (de acordo com o AE) e receberia (por aplicação da lei geral), a este título, as quantias cujos totais de trabalho suplementar é e era normalmente prestado, por virtude da própria estrutura de organização dos turnos - três dias de trabalho/ dois dias de descanso, contrariamente à matriz comum de 5 dias de trabalho/dois dias de descanso, por trabalhador em gozo de dia de descanso semanal ou complementar, coincidente ou não com feriado. Alega ainda, que a comparação em referência - que efectuada, repete-se, de acordo com os elementos alegados pelos autores (mas não admitidos pela recorrida nos termos especificados na alegação/contestação oferecida), isto é, considerando o trabalho suplementar que aqueles alegam ter prestado no período de 1991 a 2001 - não entra em linha de conta com a vantagem patrimonial em que se traduziu o subsídio de disponibilidade, aplicável aos autores, cujo regime foi instituído pelo AE em questão (Cláusula 30ª). Temos assim que os regimes em confronto relativos ao pagamento do trabalho suplementar são, por um lado, o que consta das clªs 102ª, 105ª 106ª, 107º, 108ª, que devem ser consideradas, de um modo incindível, no confronto em análise pois que reguladas no capitulo VIII do AE, sob a epígrafe “ Retribuição” regulam a remuneração decorrente da prestação de trabalho suplementar. Por outro lado, a lei geral, que prevê quanto à remuneração do trabalho suplementar o estatuído no decreto-lei n.° 421/83, de 2 de Dezembro, designadamente no seu art.º. 7, e relativamente ao pagamento do trabalho nocturno, nos artigos 29º a 34º do DL n.º 409/71, de 27 de Setembro Mas, o que este tribunal não tem ainda são os elementos de facto necessários para saber qual daquele dois regimes é de facto e em concreto o mais favorável aos trabalhadores. Importa pois apurar os factos necessários para o efeito, ou seja, os factos que nos dêem os valores dos vencimentos dos autores, os seus horários de trabalho, o número médio de trabalho suplementar efectuado, o quantitativo do pagamento efectuado a esse título e a forma de cálculo que cada uma das partes utiliza para fundamentar as respectivas posições acima referidas. Assim, deverá ser realizada a audiência de julgamento para apuramento de tais factos, de acordo com o alegado nos respectivos articulados neste âmbito, ao abrigo do n.º4 do art. 712 do CPC. Pelo exposto, procedem os fundamentos do recurso quanto à anulação da sentença recorrida por deficiência da matéria de facto apurada. V - Decisão Face ao exposto, julga-se o recurso principal parcialmente procedente e em consequência anula-se a sentença recorrida, devendo ser efectuado julgamento para o apuramento da matéria de facto acima indicada, ao abrigo do n.º4 do art. 712 do CPC. Julga-se improcedente o recurso subordinado. Custas do recurso principal pela parte vencida no final. Custas do recurso subordinado pelo recorrente. Lisboa, 15 de Dezembro de 2005 Paula Sá Fernandes José Feteira Filomena Carvalho |