Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | TOMÉ GOMES | ||
Descritores: | PROPRIEDADE HORIZONTAL CONDOMÍNIO DELIBERAÇÃO DA ASSEMBLEIA GERAL ABUSO DE DIREITO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/21/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | 1. Só ocorre o vício de omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 668º do CPC, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões suscitadas pelas partes ou que sejam de conhecimento oficioso, mas já não quando o juiz não tome em consideração alguns dos argumentos que as partes tenham aduzido no âmbito das questões suscitadas; neste caso, estamos, quan-do muito, perante fundamentação insuficiente ou medíocre a relevar em sede de apreciação de mérito; 2. A deliberação da assembleia de condóminos sobre alteração do regula-mento do condomínio está sujeita à regra geral da maioria dos votos represen-tativos do capital investido, estabelecida no nº 3 do artigo 1432º do CC, salvo nos casos especiais em que a lei estabelece voto por unanimidade ou maioria qualificada ou quando o regulamento do condomínio assim o exige. 3. Porém, quando o regulamento do condomínio conste do título constitutivo da propriedade horizontal, a sua alteração está sujeita ao voto por unanimi-dade, nos termos do nº 1 do artigo 1419º do CC. 4. Quando a lei ou o regulamento do condomínio não exijam votação por unanimidade para deliberação sobre determinado assunto, basta que a convo-catória indique esse assunto na ordem de trabalhos, nos termos do nº 2 do artigo 1432º do CC, não se exigindo a informação sobre as propostas a apre-sentar. 5. Face à disposição específica constante do nº 2 do artigo 1432º do CC, não há que recorrer à aplicação analógica ou subsidiária do disposto no nº 8 do artigo 377º do Código das Sociedades Comerciais. 6. As coisas comuns de prédio em regime de propriedade horizontal, para além da sua destinação principal, têm com frequência uma destinação secundária ou acessória, como sucede com as paredes mestras ou as fachadas dos edifícios, que servem também para afixar tabuletas ou anúncios publicitários. 7. É facultado a qualquer condómino, salvo disposição em contrário do título constitutivo, o uso de parte comum para tal fim, desde que isso não obste à funcionalidade da destinação principal da coisa, não afecte o arranjo estético do prédio, nem prive os demais condóminos de usar de igual direito. 8. Dentro desses limites, o uso da coisa comum pelos consortes pode ser disciplinado pela assembleia de condóminos, nomeadamente por via regula-mentar, ao abrigo do disposto no artigo 1429º-A do CC, sem que tal implique a criação de um direito especial de uso exclusivo da parte comum. 9. A autorização da assembleia de condóminos para que um condómino use as partes comuns, dentro dos limites da lei e do regulamento, na afixação de publicidade da actividade que exerce no prédio, não constitui por si só abuso de direito, mesmo que se trate de actividade concorrente com outro condómino. 10. O impedimento de voto de um condómino em deliberação sobre interesse próprio conflituante com o interesse geral do condomínio só releva se o voto daquele for essencial para a formação da maioria necessária, nos termos do artigo 176º ex vi do artigo 157º do CC. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa : I – Relatório 1. Orto…. - - Medicina Dentária, Ldª, instaurou procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais contra as sociedades M…, Ldª, que se passará a designar por Clínica M…, F…, S.A., e Ag…, S.A., alegando, em resumo, que : - a requerente e requeridas são condóminas do prédio urbano, constituído em propriedade horizontal, sito na Avenida…, …, Lote…, freguesia de….; - nessa qualidade, conjuntamente com a empresa administradora do condomínio, foram as únicas presentes numa assembleia de condóminos realizada em 17/3/2008, na qual foram votadas deliberações nulas cuja execução acarreta avultados prejuízos para a requerente. Conclui pedindo a suspensão da execução das deliberações que aprovaram: a) - a alteração da alínea g) do artigo 12º do Regulamento do Condomínio; b) - o pedido de instalação de sinalética da Clínica M… na cobertura e/ou fachadas laterais do edifício; c) - o orçamento anual de despesas do condomínio para o ano 2008. 2. Foi entretanto ordenada também a citação da sociedade administradora do condomínio P…, Ldª, na qualidade de representante dos condóminos. 3. As requeridas Clínica M… e F…., bem como a interveniente P…, deduziram oposição, arguindo, em primeira linha, a preterição de litisconsórcio necessário passivo, por não terem sido demandados individualmente todos os condóminos, mesmo os que não estiveram presentes ou não votaram as deliberações em causa, sustentando a PSC que foi citada como administradora do condomínio e não como representante dos condóminos; no mais, sustentam a validade formal e substancial das deliberações objecto da presente providência. Por sua vez, a Ag… veio aderir à posição da requerente, nada opondo ao requerido. 4. Realizada a audiência final, no decurso da qual se considerou inútil a produção de prova testemunhal, foi proferida decisão a julgar totalmente improcedente a providência requerida. 5. Inconformada com tal decisão, a requerente apelou dela, formulando as seguintes conclusões: 1ª – O tribunal “a quo” não se pronunciou acerca das questões invocadas pela recorrente no que respeita à adopção de deliberações contrárias à lei; 2ª – O tribunal “a quo” limitou-se a uma apreciação formal das deliberações adoptadas na assembleia geral em apreço, não abordando, em concreto e do ponto de vista substantivo, nem a questão da preterição de formalidade essencial, nem a violação do artigo 1406º e 1419º do CC, nem o abuso de direito e o abuso de posição dominante, o que consubstancia causa de nulidade da decisão recorrida, nos termos dos artigos 660º, nº 2, e 668º, nº 1, alínea d), do CPC; 3ª – A aplicação do direito por parte do tribunal “a quo” resume -se à matéria do “quorum” deliberativo, o que não foi invocado pela requerente, mas omite-se a análise substancial das deliberações em causa e que constitui o objecto do presente procedimento; 4ª – A deliberação contida no ponto cinco da ordem de trabalhos, referente à “análise e aprovação do pedido de instalação de sinalética da Clínica M…, na cobertura e/ ou fachadas laterais do edifício, viola claramente os artigos 1406º e 1419º do CC, porquanto as fachadas dos prédios constituídos em regime de propriedade horizontal não visam servir de instrumento publicitário, o que apenas seria possível, se o título constitutivo o permitisse, ou se os condóminos o autorizassem; 5ª – Assim, a referida deliberação foi adoptada “contra legem”, em nítido desrespeito pelos referidos preceitos legais, sendo que merecia ter sido apreciada, julgada ilegal e declarada a sua suspensão; 6ª – Além disso, a referida deliberação foi aprovada abusivamente, nos termos do artigo 334º do CC; 7ª – Com efeito, a ora recorrente alegou abuso de direito de direito na tomada da deliberação, por força de abuso de posição dominante, tendo o mesmo sido inteiramente esquecido na decisão recorrida; 8ª – O exercício inadmissível do direito de voto prejudica não só a fruição da parte comum, como também da fracção própria da ora recorrente, na medida em que, estando em causa actividades concorrentes, se pretende com a descrita actuação estrangular a actividade desta; 9ª – Neste caso em particular, o abuso de direito reside no facto de o direito de voto ser exercido, patologicamente, em violação da sua afectação própria; 10ª – A deliberação abusiva é contrária à lei e anulável, uma vez demonstrado o seu manifesto e flagrante teor perverso; 11ª – Outro aspecto que não foi abordado na decisão recorrida sob o ponto de vista substancial foi a preterição de formalidade essencial na convocatória, no que ao ponto quatro da ordem de trabalhos diz respeito; 12ª – Tal convocatória é inválida por não conter, como deveria, o sentido da alteração regulamentar nem a respectiva proposta de alteração; 13ª – Aquela menção é fundamental no sentido de informar precisa e integralmente os termos da alteração que se pretende introduzir; 14ª – Essa exigência decorre do nº 2 do artigo 1432º do CC e, ainda que assim não seja entendido, do próprio nº 8 do artigo 377º do CSC, pelo que a deliberação tomada é nula; 15ª - Devem ser apreciadas as questões referentes às deliberações contrárias à lei do ponto de vista substancial, sobre o que não consta, na decisão recorrida, um único fundamento que sustente a conformidade legal dessas deliberações; 16ª – Aplicando-se, no caso presente, o direito aos factos, conclui-se que estamos perante deliberações inválidas, por violação de lei, sendo ainda possível a análise do segundo requisito referente ao dano apreciável que a própria decisão recorrida admite. Conclui a apelante que deve ser declarada nula a decisão recorrida e decretar-se a suspensão da execução das deliberações referentes à alteração da alínea g) do artigo 12º do Regulamento do Condomínio e à análise e aprovação do pedido de instalação de sinalética da Clínica M…, na cobertura e/ou fachadas laterais do edifício. 6. As recorridas F… e Clínica M… apresentaram contra-alegações, concluindo ambas pelo acerto da decisão recorrida. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II – Delimitação do objecto do recurso Em face do teor das conclusões da recorrente com base nas quais se delimita o objecto do recurso, as questões a apreciar consistem em: A - saber se ocorre nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia sobre às questões suscitadas pela requerente; B - ajuizar sobre : a) - a alegada preterição de formalidade essencial na convocação da assembleia de condóminos na parte respeitante ao ponto 4 da ordem de trabalhos; b) - a pretensa invalidade substancial da deliberação tomada sobre a matéria constante do ponto 5 da ordem de trabalhos, por violação dos artigos 1406º e 1419º do CC e por abuso de direito. A recorrente não suscita pois no âmbito do presente recurso a apreciação da invalidade relativa à deliberação da assembleia de condóminos tomada sobre o ponto 3 da ordem de trabalhos e que invocara no requerimento inicial. Não está também aqui em causa a questão de preterição de litisconsórcio necessário passivo suscitado, em sede de oposição, pelas requeridas F… e Clínica M… e pela interveniente P…, o que ficou negativa e definitivamente decidido pela 1ª instância. III – Fundamentação 1. Da nulidade por omissão de pronúncia 1.1. Enquadramento A recorrente arguiu a nulidade da decisão recorrida com fundamento em omissão de pronúncia quanto às suscitadas questões: a) – de preterição de formalidade essencial na convocação da assembleia de condóminos de 17/3/2008, na parte respeitante ao ponto 4 da ordem de trabalhos; b) - de invalidade substancial da deliberação tomada por aquela assembleia sobre a matéria do ponto 5 da mencionada ordem de trabalhos, fundada na violação dos artigos 1406º e 1419º do CC, bem como no abuso de direito. Sustenta a apelante que a decisão impugnada se limitou a uma apreciação meramente formal das questões a resolver, sem abordar em concreto e especificadamente os respectivos fundamentos. Ora, segundo o preceituado no nº 2 do artigo 660º do CPC, o juiz deve, em sede de sentença, resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, bem como as que sejam de conhecimento oficioso, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. No quadro dessa apreciação, e nos termos do disposto no artigo 664º do mesmo Código, o tribunal só pode servir-se dos factos articulados pelas partes e ainda dos factos instrumentais ou essenciais que tenham vindo ao processo nos termos do artigo 264º, mas não está sujeito à alegação das partes no que respeita à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito. Por sua vez, no que aqui releva, o artigo 668º, nº 1, alínea d), do CPC, sancionando a violação do preceituado no referido artigo 660º, nº 2, considera nula a sentença quando o juiz deixe de se pronunciar sobre as questões que devesse apreciar. Este regime é aplicável não só às sentenças, mas também aos próprios despachos por força do nº 3 do artigo 666º do CPC, sendo que a decisão final do procedimento cautelar da suspensão de deliberações sociais equivale a sentença na extensão dada pelo nº 2 do artigo 156º do mesmo Código. Para efeitos de configuração da nulidade em foco, considera-se como questões a apreciar as pretensões deduzidas e as excepções suscitadas ou as que sejam de conhecimento oficioso, umas e outras integradas pelos efeitos pretendidos e respectivos fundamentos. Já não se integram no conceito de questão, para tais fins, as situações em que o juiz porventura deixe de apreciar algum ou alguns dos argumentos ou linhas de raciocínio que as partes tenham aduzido no âmbito das questões suscitadas. Neste caso, o que ocorrerá, quando muito, será o vício de fundamentação medíocre ou insuficiente, qualificado como erro de julgamento, que se traduz portanto numa questão de mérito. 1.2. Quanto à pretensa omissão de pronúncia sobre a questão da preterição de formalidade essencial da convocação da assembleia de condóminos No caso vertente, constata-se que a sentença recorrida apreciou de forma detalhada a questão relativa à preterição da formalidade essencial da convocação da assembleia de condóminos invocada pela requerente, concluindo pela sua improcedência. Se essa apreciação se mostra insuficiente para a apelante, trata-se já de uma questão de fundo que em nada afecta a validade formal da sentença e que cumpre conhecer em sede de mérito do presente recurso. Assim, improcedem, neste particular, as razões da recorrente. 1.3. Da pretensa omissão de pronúncia relativa às alegadas invalidade substancial das deliberações em causa No que respeita ao conhecimento das questões de invalidade substancial da deliberação aqui em causa, a sentença recorrida limitou-se, na verdade, a uma mera conclusão no sentido da sua improcedência, considerando, de forma abreviada e assertiva, que “o objecto destas deliberações não é física ou legalmente impossível, nem contrário à lei, nem indeterminável, nem as deliberações são contrárias à ordem pública, nem ofensivas aos bons costumes (art, 280º do CC, a contrario sensu)”, sem discutir minimamente os fundamentos alegados pela requerente. De qualquer modo, foi emitido um juízo de demérito sobre as referidas questões, não se podendo afirmar que haja omissão de pronúncia, nos termos e para os efeitos da alínea d) do nº 1 do citado artigo 668º. Quando muito, poder-se-ia questionar se tal escassez de fundamentação constitui um vício de falta de especificação dos fundamentos de direito a que se refere a alínea b) do nº 1 do artigo 668º, importando também nulidade da sentença. Sucede que a caracterização do sobredito vício de falta de fundamentação de direito só releva quando, não obstante a indicação do universo factual, a sentença omite qualquer enquadramento jurídico ainda que implícito, de forma a deixar, no limite, ininteligíveis os fundamentos da decisão em termos de não permitir identificar nela qualquer juízo de mérito positivo ou negativo. Trata-se, por conseguinte, de um vício formal ou de error in procedendo, que afecta a validade da sentença enquanto acto processual. Não é, no entanto, o que se passa no presente caso. Com efeito, o tribunal recorrido, embora omitindo qualquer consideração sobre às disposições legais e enquadramento jurídico que a requerente invocara, perspectivou os factos provados na órbita do disposto no artigo 280º do CC e apenas nessa base legal concluiu pelo demérito da providência cautelar. Nessa medida, é pois perceptível o juízo decisório de mérito da sentença recorrida, em termos de permitir ajuizar sobre o seu acerto ou desacerto, o que será feito em sede de apreciação do mérito do recurso. Consequentemente, julga-se também aqui improcedente a arguição de nulidade da decisão recorrida. 2. Das questões de mérito 2.1. Factualidade dada como assente em 1ª instância O tribunal recorrido deu como indiciariamente provada, por documentos e por confissão, a seguinte factualidade: 2.1.1. A Requerente é uma sociedade comercial que se dedica à prestação de serviços de medicina dentária e ortopedia dentofacial, produção e comercialização de sistemas informáticos e audiovisuais de apoio clínico, importação de artigos necessários às actividades e locação de meios e espaços inerentes à realização das referidas actividades; 2.1.2. A Requerente é dona da fracção autónoma designada pelas letras “OG”, correspondente ao terceiro andar C, destinado a escritório, situado no piso três do prédio urbano, constituído em regime de propriedade horizontal, sito em Lisboa, na Avenida…, …., …, freguesia de…, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o número…, da referida freguesia, e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ….sob o artigo….; 2.1.3. A Requerente desenvolve a sua actividade na referida fracção; 2.1.4. A Requerente, na qualidade de condómina do supra identificado prédio, foi convocada, mediante carta datada de 5 de Março de 2008, para a assembleia geral anual; 2.1.5. Essa assembleia teve lugar no dia 17 de Março de 2008, pelas 10 horas, nos escritórios da empresa encarregue da administração do condomínio, a P…., Lda. sitos na…., n.º…, …, em…; 2.1.6. A ordem de trabalhos constante da convocatória era a seguinte: “1. Análise e aprovação das Contas referentes ao exercício de 2007. 2. Eleição da Administração para o ano de 2008; 3. Análise e aprovação Orçamento anual de Despesas de Condomínio, para o ano de 2008; 4. Alteração da Alínea g) do artigo 12.º do Regulamento do Condomínio; 5. Análise e aprovação do pedido de instalação de sinalética da Clínica M…, na cobertura e ou fachadas laterais do edifício; 6. Análise e aprovação do pedido do “Business Café”, para instalação de esplanada junto das lojas do edifício; 7. Análise de outros assuntos de interesse geral do Condomínio que a Assembleia entenda discutir” 2.1.7. O ponto quatro da ordem de trabalhos, constante da convocatória para a assembleia geral, previa apenas a discussão e deliberação da alteração da alínea g) do artigo 12.º do Regulamento do Condomínio, não referindo o sentido da alteração que em concreto se pretendia implementar, e omitindo a respectiva proposta de alteração a introduzir no referido artigo do Regulamento do Condomínio; 2.1.8. Na assembleia, foi proposta pelo representante da Clínica M…. a seguinte redacção para a al. g) do art. 12º do Regulamento do Condomínio: “é defeso aos Condóminos, seus inquilinos, visitantes ou serventuários: g) Colocar tabuletas ou “placards” profissionais ou comerciais, identificadoras dos proprietários das fracções, fora do painel existente para o efeito no piso 0 ou nas portas das respectivas fracções, salvo prévia deliberação da Assembleia Geral.” 2.1.9. Uma vez colocado à votação, foi este ponto da ordem de trabalhos aprovado com os votos favoráveis das Requeridas Clínica M…e F… e com os votos contra da Requerente e da Ag….; 2.1.10. Subsequentemente, foi submetido à apreciação dos condóminos a “análise e aprovação do pedido de instalação de sinalética da Clínica M…, na cobertura e/ou fachadas do edifício”, conforme inscrito no ponto cinco da ordem de trabalhos; 2.1.11. Na sequência e à semelhança da deliberação contida no ponto quatro, também esta foi aprovada com os votos favoráveis da Clínica M… e da F… e com os votos contra da Requerente e da Ag…; 2.1.12. Relativamente ao ponto três, a rubrica “segurança” apresentava um valor inferior ao ano anterior em € 4.998,00; 2.1.13. Tal redução deve-se ao facto de a Clínica M… ter apresentado uma proposta para a prestação desse serviço que contempla um posto 24 horas, todos os dias do ano (TDA), um das 8h00 às 20h00 de segunda a sábado, e um das 19h00 às 22h00 todos os dias úteis (TDU), sendo o posto de 24 horas assegurado por um vigilante e os restantes por recepcionistas da Clínica M…; 2.1.14. Esta proposta foi apresentada a votação e aprovada por Maioria com o voto contra da Requerente; 2.1.15. A Clínica M… desenvolve uma actividade idêntica e concorrente da actividade prosseguida pela Requerente; 2.1.16. Na assembleia de 17 de Março estiveram presentes a Requerida F…com uma permilagem de 842,882 %o, a Requerida Ag… com uma permilagem de 35,621 %o, a Requerida M…com uma permilagem de 35,621 %o, a Requerente com uma permilagem de 14,831 %o, e a P…; 2.1.17. O Regulamento do Condomínio dos autos não está integrado na escritura pública de constituição da propriedade horizontal. Os factos acima descritos não foram objecto de impugnação no âmbito deste recurso, nem se vislumbram razões para proceder a qualquer alteração oficiosa dos mesmos, pelo que se têm por adquiridos para os autos. 2.2. Apreciação das questões solvendas 2.2.1. Quanto à preterição de formalidade essencial na convocação para a assembleia de condóminos na parte relativa ao ponto 4 da ordem de trabalhos Sustenta a Requerente que fora omitida uma formalidade essencial na convocação para a assembleia de condóminos realizada em 17/3/2008, relativamente ao ponto quatro da ordem de trabalhos, que versava sobre a alteração da alínea g) do artigo 12º do Regulamento do Condomínio, porquanto não foi feita menção, na respectiva convocatória, sobre os termos da pretendida alteração, exigência essa que decorreria do disposto no nº 2 do artigo 1432º do CC e, subsidiariamente, do nº 8 do artigo 377º do CSC. Vejamos se assim é. Neste particular, o nº 2 do artigo 1432º do CC estabelece os termos em que deve ser feita a convocatória da assembleia de condóminos, exigindo que nela se indique o dia, hora, local e ordem de trabalhos da reunião e informe sobre os assuntos cujas deliberações só podem ser aprovadas por unanimidade dos votos. Daí decorre claramente que para a generalidade dos casos basta a mera indicação do assunto a deliberar e que só nos casos específicos que requeiram deliberação por unanimidade é que se impõe informação mais detalhada para que os convocados possam reflectir sobre tais assuntos. Sucede que, nos termos do nº 3 do artigo 1432º do CC, salvo disposição especial, as deliberações da assembleia de condóminos são tomadas por maioria dos votos representativos do capital investido. Ora, estamos perante a alteração de uma disposição do regulamento do condomínio que versa sobre o uso de uma parte comum, mais precisamente sobre a afixação de publicidade em partes comuns do prédio. Segundo o artigo 1429º-A, nº 2, do CC, a feitura do regulamento do condomínio, e consequentemente a sua alteração compete, em primeira linha, à assembleia de condóminos, a qual delibera por maioria dos votos representativos do capital investido, conforme a sobredita regra estabelecida no citado artigo 1432º, nº 3. Só quando estiver em causa a alteração de norma regulamentar constante do próprio título constitutivo da propriedade horizontal, conforme permite a alínea b) do nº 2 do artigo 1418º do CC, é que se exige o acordo de todos os condóminos, por força do preceituado no nº 1 do artigo 1419º do mesmo diploma. Como resulta do facto descrito sob ponto 2.1.17 da factualidade assente, o Regulamento do Condomínio sobre que incide a alteração em referência não consta do título constitutivo, pelo que a alteração em foco não está sujeita à regra da unanimidade, como também não se inscreve em quaisquer outras hipóteses especialmente sujeitas a essa regra, seja por força da lei, seja decorrente do regulamento do condomínio, o qual estabelece, no seu artigo 18º, nº 1, a regra da maioria do capital investido. Nem tão pouco procede a invocação da aplicação analógica do disposto no nº 8 do artigo 377º do CSC, uma vez que não estamos sequer perante lacuna da lei a preencher nos termos do artigo 10º do CC. Acresce que as razões subjacentes à exigência feita naquele normativo para a convocatória das assembleias gerais das sociedades anónimas não são transponíveis para o âmbito das relações do condomínio. De resto, uma solução que exigisse a prévia apresentação das propostas a aprovar em assembleia de condóminos seria bastante redutora e pouco funcional, na medida em obstaria a que pudessem ser aprovadas propostas surgidas no seio da própria assembleia sobre um assunto indicado na ordem de trabalhos. Assim sendo, a indicação da alteração da alínea g) do artigo 12º do Regulamento do Condomínio feita no ponto quatro da ordem de trabalhos da convocatória em apreço obedeceu aos requisitos legais, pelo que bem decidiu a 1ª instância ao considerar não verificada a invocada preterição de formalidade essencial. 2.2.2. Quanto à invalidade substancial da deliberação tomada sobre a matéria constante do ponto 5 da ordem de trabalhos O que aqui está em causa é a deliberação que aprovou o pedido de instalação de sinalética da Clínica M…, na cobertura e/ou fachadas do edifício”, conforme fora indicado no ponto cinco da ordem de trabalhos. Sustenta a Requerente que a deliberação em destaque viola o disposto nos artigos 1406º e 1419º do CC, na medida em que as fachadas dos prédios constituídos em propriedade horizontal não visam servir de instrumento publicitário, o que apenas seria possível, se o título constitutivo o permitisse ou se os condóminos o autorizassem. De acordo com o disposto na segunda parte do nº 1 do artigo 1420º do CC, cada condómino é comproprietário das partes comuns do edifício. E, nos termos do nº 1 do artigo 1406º do mesmo diploma, na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquela que a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito. Ora, as coisas comuns, para além da sua destinação principal, têm com frequência uma destinação secundária ou acessória, como sucede com as paredes mestras ou as fachadas dos edifícios, que servem também para afixar tabuletas ou anúncios publicitários[1]. E tem sido reconhecida a faculdade de um condómino usar as partes comuns para tal fim, desde que isso não obste à funcionalidade da destinação principal da coisa, não afecte o arranjo estético do edifício, nem prive os demais condóminos de usar de igual direito. Dentro desses limites, o uso da coisa comum pelos vários consortes pode ser disciplinado pela assembleia de condóminos e, nomeadamente, por via regulamentar, como se extrai do disposto no artigo 1429º-A do CC. É nesse âmbito que se inscreve a disposição contida na alínea g) do artigo 12º do Regulamento do Condomínio em referência, cuja alteração aprovada vem permitir uma gestão desse uso em função de cada caso, o que não se mostra contrário ao título constitutivo da propriedade horizontal, nem tão pouco tem a virtualidade de gerar qualquer direito real de uso exclusivo da parte comum, dada a sua base negocial. Ora, a sinalética que a condómina Clínica M… pretendia apor na cobertura e/ou nas fachadas laterais do prédio prende-se com a mera divulgação da actividade que ali exerce, não afecta a funcionalidade ou estética do edifício e não prive os demais condóminos, nomeadamente a requerente de poderem aproveitar da mesma faculdade. É certo que poderão ocorrer alguns episódios de concorrência, na medida em que a requerente ali exerce o mesmo tipo de actividade. Mas essa mera eventualidade não é por si só obstativa de que a Clínica M… possa beneficiar de tal faculdade, nem significa que por isso a requerente fique impedida de idêntica oportunidade. Termos em que improcedem as razões da apelante. 2.2.3. Do abuso de direito Argumenta ainda a apelante que a faculdade concedida à requerida Clínica M… constitui abuso de direito, por via do abuso de posição dominante, nos termos do artigo 334º do CC. Sucede que dos factos indiciados não se extraiem elementos para concluir nesse sentido, nem se pode inferir tal consequência do mero facto da requerente e requerida Clínica M… exercerem actividades concorrentes no mesmo prédio. O que está em causa é apenas a deliberação sobre a autorização dada à Clínica M.. para afixar a sua sinalética na cobertura e/ou fachadas laterais do prédio, sem que isso implique qualquer impedimento para a requerente solicitar autorização em circunstâncias similares. A haver uma deliberação que recusasse à ora requerente tal faculdade é que então se poderia questionar a legalidade de uma tal decisão discriminatória ou abusiva entre condóminos. Por ora, tal situação não se encontra minimamente perspectivada. Nessa medida, os poderes exercidos pela assembleia de condóminos, no quadro da deliberação em apreço, estão contidos dentro da sua esfera de competência de administração dos bens comuns e não se mostra que se desviem dos fins para que foram instituídos, nem que ofendam os princípio da boa fé ou da igualdade de tratamento entre os condóminos, nomeadamente á luz do disposto no artigo 334º do CC. A este propósito, poder-se-ia ainda questionar se haveria impedimento de voto relevante por parte da Clínica M…, nos termos do artigo 176º aplicável por via do disposto no artigo 157º do CC, na medida em que aquela condómina era portadora de interesse susceptível de conflituar com o interesse geral do condomínio. Só que o voto da referida condómina, correspondente a 35,621%º do capital investido, não se mostrou essencial à formação da maioria necessária, já que o voto da requerida F…, equivalente a 842,882%º, assegurava por si tal maioria, o que torna irrelevante a votação da Clínica M…, nos termos do nº 2 do artigo 176º do CC. Improcedem pois também aqui as razões da apelante. 2.2.4. Conclusão final Considerando que a providência cautelar de suspensão de deliberações da assembleia de condóminos tem como pressuposto essencial a invalidade de deliberação contrária à lei ou a regulamento aprovado, nos termos conjugados do artigo 1433º, nº 1 e 5, do CC e do artigo 396º, nº 1, aplicável por via do artigo 398º do CPC, não se indiciando essa violação, como se não indicia, a providência requerida terá de improceder, tal como foi decidido em 1ª instância. IV – Decisão Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em negar provimento à apelação, mantendo a decisão recorrida, ainda que com fundamentação em parte mais desenvolvida. Custas a cargo da requerente. Lisboa, 21 de Outubro de 2008 Manuel Tomé Soares Gomes Maria do Rosário Oliveira Morgado Rosa Maria Ribeiro Coelho _______________________________________________________ [1] Vide Sandra Passinhas, A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, 2ª Edição, Almedina, pag. 151. |