Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | TERESA PARDAL | ||
Descritores: | NULIDADE DE SENTENÇA RECURSO RECLAMAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 06/19/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | Sendo admissível recurso da sentença, mas não pretendendo a parte interpor recurso, é admissível a invocação de nulidade da sentença perante o tribunal que a proferiu. (sumário da Relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
RELATÓRIO. F… intentou acção declarativa com processo ordinário contra J… e contra P…, alegando, em síntese, que em 20/09/2002 celebrou com a sociedade B…, Lda um contrato em que o autor se comprometeu a entregar-lhe a quantia total de 187 043,00 euros e a referida sociedade se comprometeu a usar esta quantia para adquirir um lote de terreno, onde construiria, à sua custa, um edifício, que seria vendido, sendo os proventos desta venda partilhados entre o autor e a B…. Mais alegou que cumpriu a prestação a que se obrigou, entregando a quantia de 187 043,00 euros à B…, mas esta não cumpriu a sua parte no contrato, pois cedeu a sua posição contratual de compradora no contrato promessa de aquisição do terreno a outra sociedade que o veio a adquirir, não tendo sido devolvida a quantia prestada pelo autor, da qual se apropriaram os ora réus, sócios maioritários da B…, que foram sempre enganando o autor, garantindo-lhe sempre o primeiro réu que a aquisição do terreno por outra sociedade não prejudicaria o acordo que este celebrara com a B… e aprovando sempre o segundo réu este procedimento, assim cometendo ambos o crime de burla agravada e lhe causando prejuízos, que computa em 290 749,00 euros. Concluiu, pedindo a condenação dos réus a pagar-lhe a referida quantia de 290 749,00 euros acrescida de juros contados desde a citação. O réu P… contestou arguindo a sua ilegitimidade, pois nunca interveio no contrato celebrado entre o autor e a B…, nunca tendo sido gerente desta sociedade; por impugnação, alegou que desconhece o contrato invocado pelo autor, nunca tendo tido qualquer contacto com o autor ou recebido qualquer quantia prestada por este, desconhecendo por completo todas as negociações e conversas alegadas na petição inicial, bem como os invocados prejuízos. Concluiu pedindo a procedência da excepção de ilegitimidade, ou, se assim não se entender, a improcedência da acção e, em qualquer caso, a condenação do autor, como litigante de má fé, em multa e indemnização ao contestante, designadamente na despesa de 15 000,00 euros com os honorários o seu mandatário. O réu J… contestou alegando que não é parte no contrato celebrado entre o autor e a B…, tendo agido sempre em representação desta sociedade, nunca tendo usado em seu proveito a quantia entregue pelo autor, a qual foi depositada numa conta da B…, que veio a ceder a sua posição de adquirente do terreno a outra sociedade com o conhecimento e aceitação do autor, em virtude de ter decorrido muito tempo até o vendedor estar em condições de vender, altura em que a B… estava com problemas financeiros e não queria expor o terreno aos credores, mas acordando com a sociedade adquirente a partilha dos proventos com a futura venda do imóvel e tencionando entregar ao autor a sua parte nesses proventos, não havendo qualquer intenção de o prejudicar e sendo certo que, caso existam prejuízos do autor a ressarcir, os mesmos não seriam da responsabilidade do contestante, mas sim da B…. Concluiu pedindo a improcedência da acção e a absolvição do pedido. O autor replicou, opondo-se à excepção de ilegitimidade passiva e ao pedido de condenação por litigância de má fé. Após os articulados foi proferido despacho saneador, que julgou procedente a excepção de ilegitimidade passiva, declarou ambos os réus partes ilegítimas e absolveu-os da instância, não se pronunciando sobre o pedido de litigância de má fé. * Inconformado, o autor interpôs recurso deste despacho e alegou, formulando as seguintes conclusões: 1. Nos termos do disposto no artº 26º do C.P.C., a legitimidade passiva manifesta-se pelo seu interesse directo em contradizer a demanda, tal como vem configurada pelo autor, evitando o prejuízo que da sua procedência advenha. 2. Nos presentes autos, o autor imputa aos réus uma responsabilidade criminal e civil extracontratual pelos prejuízos que reclama a final, pedindo a condenação destes no seu pagamento. 3. É manifesto que os réus têm interesse directo em contradizer a causa, sob pena de serem condenados ao pagamento de uma quantia avultada. 4. Foram alegados factos que permitem, se e quando provados, obter uma condenação dos réus. 5. A decisão recorrida não tomou em consideração todos os factos alegados na p.i., fazendo, consequentemente, uma avaliação errada da causa de pedir invocada pelo autor. 6. Do mesmo modo, a decisão recorrida não fez uma avaliação correcta dos pedidos formulados e suas consequências para os réus. 7. Ainda que se apurasse que a p.i. era deficiente, ou, até, inepta – o que jamais se concede – sempre deveria o Tribunal sobre tal questão pronunciar-se, o que não o fez. 8. A decisão recorrida violou o disposto no artº 26º do C.P.C., pelo que deverá ser revogada, reconhecendo-se a legitimidade dos réus e ordenando o prosseguimento dos autos. * O recorrido J… contra-alegou, formulando as seguintes conclusões: 1.º O Senhor Juiz a quo, no saneador-sentença recorrido, ao absolver os réus da instância, julgando-os partes ilegítimas, não violou qualquer disposição legal, material ou adjectiva, razão pela qual deve ser negado provimento à apelação, confirmando-se a decisão apelada. 2.º Caso assim não se entenda, deve considerar-se ampliado o objecto do recurso por iniciativa do recorrido, nos termos do artigo 864º-A, nº2, do Código de Processo Civil, arguindo-se a nulidade da sentença, em virtude de falta de conhecimento oficioso da excepção de incompetência do tribunal (Juízo) Cível de Cascais (atenta a violação do disposto no artigo 71º do Código de Processo Penal, que estabelece o princípio da adesão) – artigos 98º e 100º da LOFTJ, 66º, 101º, 102º, 288º, nº1, alínea a), 494º, alínea a), 510º, nº1, 663º, nº3 e 668º, nº1, alínea d), do Código de Processo Civil, que, assim, foram violados – determinando-se a absolvição dos réus recorridos da instância. * O recorrido P… não contra-alegou, mas requereu a rectificação da decisão por omissão de pronúncia, em virtude de não se ter pronunciado sobre o pedido de litigância de má fé. * Foi proferido despacho que não conheceu da nulidade de omissão de pronúncia, por entender que mesma só pode ser arguida perante o tribunal superior e admitiu o recurso como apelação com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo. * As questões a decidir são: I) Questão prévia da arguição de nulidade pelo apelado João Borges. II) (I)legitimidade dos réus, ora apelados. III) Ampliação do objecto recurso do apelado J… e excepção de incompetência do Tribunal. * FACTOS. Os factos a atender são os que constam no relatório deste acórdão. * ENQUADRAMENTO JURÍDICO. I) Questão prévia de arguição de nulidade pelo apelado P…. Na sua contestação, o réu P… pediu a condenação do autor em multa e indemnização, por litigância de má fé. A sentença não se pronunciou sobre este pedido, estando assim ferida de nulidade de omissão de pronúncia, prevista no artigo 668º nº1 d) do CPC (redacção aplicável, anterior à redacção da Lei 41/2013 de 26/6). Perante a reclamação do réu a invocar a omissão de pronúncia, o Tribunal da 1ª instância, já depois de decorrido o prazo de interposição de recurso, entendeu que, admitindo a sentença recurso ordinário, a apontada nulidade só poderia ser invocada em sede de recurso e não perante o tribunal que proferiu a sentença. Estabelece o nº4 do referido artigo 668º que “as nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do nº1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades”. Ora, a interpretação correcta do artigo 668º nº4 do CPC é a de que, não sendo admissível recurso, a nulidade tem sempre de ser arguida perante o tribunal que proferiu a sentença e, sendo admissível recurso, a nulidade poderá ser arguida no próprio recurso; mas, mesmo que seja admissível recurso, se as partes não quiserem recorrer, poderão sempre arguir a nulidade perante o tribunal recorrido. Neste sentido se pronuncia Lebre de Freitas no CPC anotado, volume 2º, 2ª edição, em anotação ao artigo 668º, tendo em conta uma situação de desistência de recurso (artigo 681º do CPC). No presente caso, o réu P… arguiu a nulidade dentro do prazo de dez dias previsto no artigo 153º do CPC e, embora não tenha renunciado expressamente ao recurso, não interpôs recurso da sentença e era manifesto que não pretendia recorrer, uma vez que obteve ganho total na sentença proferida. Deste modo, caberia à 1ª instância conhecer da invocada nulidade de omissão de pronúncia. Esta solução é a que se impõe também numa perspectiva sistemática, pois, mandando o artigo 670º nºs 1 e 5 do CPC que o juiz de 1ª instância conheça das nulidades arguidas no recurso, não se compreenderia que tal apreciação não fosse feita nos casos em que o recurso é admissível, mas as partes não o interpõem, invocando a nulidade autonomamente, em sede de reclamação. Deverá, assim, ser anulada a sentença e ser proferida nova decisão que se pronuncie sobre o pedido de condenação por litigância de má fé. * Face ao supra decidido, ficam prejudicadas as restantes questões levantadas no recurso do autor e no pedido de ampliação do objecto do recurso do apelado J…. * * * DECISÃO. Pelo exposto, acorda-se em julgar nula a sentença por omissão de pronúncia e determina-se a devolução dos autos à primeira instância, a fim de ser proferida nova sentença em que haja pronúncia sobre o pedido de condenação por litigância de má fé formulado pelo réu P…. * Sem custas. * 2014-06-19
-------------------- Maria Teresa Pardal
-------------------- Carlos Marinho
----------------------- Anabela Calafate |