Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ISABEL TAPADINHAS | ||
Descritores: | TRABALHO TEMPORÁRIO TRABALHADOR SUBSTITUIÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/09/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | ALTERADA | ||
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Sumário: | I- No caso de substituição de trabalhador ausente ou que se encontre impedido de prestar serviço, o contrato de utilização de trabalho temporário cessa com o regresso de trabalhador substituído ou com a certeza de que ele já não irá regressar ao seu posto de trabalho. II- Na vigência do Decreto-Lei nº 358/89, de 17 de Outubro, se o trabalhador temporário se encontrar ao serviço do utilizador decorridos 10 dias após a cessação do contrato de utilização de trabalho temporário, sem que tenha ocorrido a celebração de contrato que o legitime, considera-se que o contrato passa a ser prestado ao utilizador, com base em contrato de trabalho sem termo celebrado entre este e o trabalhador. (sumário elaborado pela Relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório A... instaurou, em 13 de Novembro de 2006, acção declarativa com processo comum contra B... e C... pedindo que seja: a) declarada a cessação do contrato de utilização de trabalho temporário celebrado entre as rés, com efeitos reportados a meados de Abril de 2003; b) declarado que a autora se encontra vinculada por contrato de trabalho sem prazo, celebrado com a 2ª ré, desde meados de Abril de 2003; c) reconhecida a antiguidade da autora ao serviço da 2ª ré, com efeitos reportados a 1 de Outubro de 2000; d) declarado improcedente, por ausência de pressupostos legais, o despedimento da autora, formalmente comunicado pela 1ª ré e confirmado pela 2ª ré, com efeitos reportados a 18 de Fevereiro de 2006; e) condenada a 2ª ré a reintegrar a autora no seu posto de trabalho, com efeitos reportados à data do despedimento, sem prejuízo da antiguidade e categoria; f) ou, em alternativa à reintegração, condenada a pagar à autora, a indemnização a que se reporta o art. 439º, nº4 do Código do Trabalho, a ser graduada no seu limite máximo resultante da ilicitude do seu comportamento, correspondente a € 4.727,13; g) a 2ª ré condenada no pagamento à autora da quantia de € 581,80, de retribuições já vencidas e as que se vierem a vencer até final; h) a 2ª ré condenada no pagamento à autora do montante de € 1.746,32, sendo de reduzir a tais montantes, as quantias já eventualmente pagas à autora. Para fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese o seguinte: - foi admitida ao serviço da 1ª ré, em 1 de Novembro de 2000, mediante a celebração de um contrato de trabalho temporário de duração incerta, com fundamento numa invocada substituição temporária do trabalhador D..., que se encontrava de baixa; - em 18 de Fevereiro de 2006, a 1ª ré fez cessar o referido contrato, alegando que se tornava desnecessária a sua continuidade, mas já desde 22 de Dezembro de 2005, que a autora era impedida pelas rés de ocupar o seu posto de trabalho; - contudo, já há muito que tal contrato não tinha fundamento válido a sustentar a sua vigência, pois o trabalhador cuja ausência por baixa médica havia justificado a contratação da autora, já havia regressado ao exercício das suas funções na estrutura da 2ª ré, desde Abril de 2003; - entende pois a autora que o contrato de utilização de trabalho temporário celebrado pelas rés, cessou em meados de Abril de 2003, altura em que se verificou a extinção da causa que o havia justificado; - contudo, mesmo após o regresso de tal trabalhador, a autora recebeu ordens e instruções da 2ª ré, integrando-se na respectiva estrutura organizativa e funcional. - por isso entende que, desde Abril de 2003, se deve considerar que passou a existir um contrato de trabalho sem termo, celebrado entre a autora e a 2ª ré; - logo, a comunicação expedida pela 1ª ré e as atitudes de rejeição do desempenho da autora levadas a cabo pela 2ª ré, configuram um despedimento ilícito, com as legais consequências; - tem também direito a receber da 2ª ré, o pagamento de alguns créditos laborais, relativos a salários, subsídio de férias, férias e subsídio de Natal, no valor total de € 7.055,92; - admite que a tal montante devem ser deduzidos alguns créditos salariais que entretanto lhe foram pagos mas que não consegue quantificar. Realizada a audiência de partes e não tendo havido conciliação foi ordenada a notificação das rés para contestarem, o que elas fez concluindo pela improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido. Para tal, a ré B..., além de identificar os montantes dos créditos laborais que a autora confessou ter recebido e que lhe foram pagos por ela contestante, alegou que o contrato celebrado com a autora cessou na sequência da comunicação da ré C..., feita em 17.12.2005. A ré C.., por seu turno, alegou que: - apesar do seu trabalhador D... ter retomado o exercício das suas funções correspondentes à sua categoria profissional de “Operador de Posto de Portagem”, não regressou ao posto de trabalho de que era titular, já que, por razões de saúde, não podia exercer tais funções em horário de turnos rotativos mas, apenas em horário fixo; - assim, sendo necessário substituir esse trabalhador, no âmbito do seu posto de trabalho, por se encontrar impedido de prestar serviço nesse mesmo âmbito, não se afigurou necessário celebrar entre as rés um novo contrato de utilização de trabalho temporário, uma vez que o fundamento do contrato que tinha sido celebrado se continuava a verificar; - em 17.11.2005, o posto de trabalho titulado pelo trabalhador D... foi extinto, no âmbito do processo de certificação das barreiras de portagem, logo, deixou de haver justificação para o recurso ao trabalho temporário prestado pela autora; - a causa justificativa da celebração do contrato de utilização de trabalho temporário, não pode deixar de se reportar ao posto de trabalho do trabalhador e nunca se verificou o regresso deste trabalhador ao seu posto de trabalho; - deste modo, não se verificou qualquer situação susceptível de gerar a nulidade da estipulação do termo, pelo que, inexistiu o invocado despedimento ilícito; - na eventualidade de se vir a reconhecer qualquer vínculo laboral com a autora, a antiguidade da trabalhadora apenas pode ser considerada a partir de 29.04.2003. Instruída e julgada a causa foi proferida sentença, cuja parte dispositiva se transcreve: Nesta conformidade e decidindo, julga-se a acção parcialmente procedente e, consequentemente condena-se a ré B... no pagamento à autora da quantia de € 426,18, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, absolvendo-se a ré do demais peticionado e absolvendo-se a ré C... de todo o pedido contra si formulado. Custas a suportar pela autora e pela ré B..., na proporção do respectivo decaimento. Inconformada com a sentença, da mesma interpôs a autora, recurso de apelação, tendo sintetizado a sua alegação nas seguintes conclusões: (…) Não foram produzidas contra-alegações. O Ex.º Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer a fls.213, no sentido de ser confirmada a sentença recorrida. Colhidos os vistos cumpre apreciar e decidir. Como se sabe, os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes e decididas pelos tribunais inferiores, salvo se importar conhecê-las oficiosamente – tantum devolutum quantum appelatum (Alberto dos Reis “Código do Processo Civil Anotado” vol. V, pág. 310 e Ac. do STJ de 12.12.95, CJ/STJ Ano III, T. III, pág. 156). Tratando-se de recurso a interpor para a Relação este pode ter por fundamento só razões de facto ou só razões de direito, ou simultaneamente razões de facto e de direito, e assim as conclusões incidirão apenas sobre a matéria de facto ou de direito ou sobre ambas (Amâncio Ferreira, “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 3a ed., pág. 148). No caso em apreço, não existem questões que importe conhecer oficiosamente. As questões colocadas no recurso delimitado pelas respec-tivas conclusões (com trânsito em julgado das questões nela não contidas) – arts. 684.º, nº 3 e 690.º, nº 1 do Cód. Proc. Civil – restringem-se, essencialmente, a duas: 1.ª – existência entre a autora e a 2.ª ré de um contrato de trabalho por tempo indeterminado; 2.ª – improcedência do despedimento da autora. Fundamentação de facto A 1ª instância deu como provada a seguinte matéria de facto não objecto de impugnação e que, aqui, se acolhe: 1- A autora foi admitida ao serviço da 1.ª ré, em 1 de Novembro de 2000, mediante a celebração de um contrato de trabalho temporário, de duração incerta; 2- Como fundamento do contrato foi invocada a substituição temporária do trabalhador D..., que se encontrava de baixa; 3- O contrato manteve a sua vigência até 18 de Fevereiro de 2006, altura em que a 1ª ré o fez cessar, através de comunicação de 20 de Dezembro de 2005, “em virtude de ser desnecessária a continuidade da sua prestação de trabalho em função do motivo que justificou a sua contratação”; 4- Em 22 de Dezembro de 2005, a 1ª ré enviou para a autora a comunicação que a dispensava de comparecer ao trabalho até ao termo do denominado contrato de trabalho temporário; 5- À data da cessação do contrato, a autora auferia a retribuição mensal de € 581,80; 6- A ré C..., é uma sociedade concessionária de obras e serviços públicos, integrando-se nessa concessão e exploração de auto-estradas, através do sistema de portagem; 7- A categoria profissional de “Operador de Posto de Portagem” (vulgarmente designado por Operador ou Portageiro, encontra-se caracterizada na respectiva Convenção Colectiva de Trabalho (Acordo Colectivo de Trabalho, publicado no BTE, 1ª série, nº21, de 8.06.2002, posteriormente revisto e anteriormente Acordo de Empresa); 8- A ré B..., anteriormente com a firma E... e, antes, designada F..., é, desde 1990, titular do alvará (...), para o exercício da actividade de prestação de serviços de trabalho temporário; 9- As rés celebraram, entre si, por escrito, em 1.11.2000, e com produção de efeitos nessa data, a ré C... na qualidade de utilizador e a ré B... na qualidade de empresa de trabalho temporário, um contrato de utilização de trabalho temporário (CUTT), a termo incerto, ao abrigo do qual foi celebrado o contrato de trabalho temporário (CTT), mencionado no ponto 1- CUTT, aquele tendo por objecto, a cedência temporária, pela ré B... à ré C..., de um trabalhador da ré B..., para o exercício, em horário, de três turnos rotativos, das funções correspondentes à categoria profissional de “Operador de Posto de Portagem”, visando-se o exercício dessas funções na barreira de portagem de “Deco-Coina Nó”, no regime de trabalho temporário e em virtude da necessidade de substituição do trabalhador da C..., D..., por este se encontrar de baixa; 10- Em 19.04.2003, aquele trabalhador da ré C..., D..., retomou o exercício das funções correspondentes à sua categoria profissional de “Operador de Posto de Portagem”; 11- Todavia, não regressou ao posto de trabalho de que era titular, já que, por razões de saúde, não podia então exercer tais funções em horário de turnos rotativos mas, apenas, em horário fixo; 12- Sendo necessário substituir esse trabalhador, no âmbito do seu posto de trabalho, por se encontrar impedido de prestar serviço, nesse mesmo âmbito, por razões de saúde, não se afigurou necessária a celebração, entre as rés de um novo CUTT, tendo entendido que o fundamento enunciado no contrato que tinha sido celebrado (substituição daquele trabalhador, por motivos de saúde do mesmo, no posto de trabalho de que era titular), continuava a verificar-se; 13- O trabalhador substituído, D..., tem, desde então, exercidas as funções correspondentes à sua categoria profissional, em horário fixo, por motivos de saúde; 14- Toda esta situação é do conhecimento da autora; 15- Em 17.12.2005, a ré C... constatou, no âmbito do processo de certificação das barreiras de portagem, a desnecessidade daquele posto de trabalho, pelo que este foi extinto, considerando que o seu titular ainda se encontrava a exercer funções laborais em regime de horário fixo, por motivos de saúde; 16- A ré B... soube pela ré C... que o trabalhador D... regressou à C... em 2003, mas que não ocupou o seu posto de trabalho, por motivos de saúde; 17- A autora recebeu, em Março de 2006, da ré B..., as seguintes verbas: - € 2,98, de abono para falhas, referente ainda ao mês de Fevereiro de 2006, - € 274,96, de subsídio de férias, - € 248,24, de subsídio de Natal, - € 16,58, de subsídio de refeição, referente ao mês de Fevereiro de 2006, - € 15,04 de subsídio de turno, referente ao mês de Fevereiro de 2006, - € 618,66, de férias não gozadas, - € 53,70, referente ao salário de Fevereiro de 2006; 17- À autora foram pagos pela ré B..., no mês de Fevereiro de 2006, os créditos salariais relativos à segunda quinzena de Janeiro e à primeira quinzena de Fevereiro de 2006, discriminados da forma seguinte: - € 581,80, de vencimento, - € 31,29, de abono de falhas, - € 174,09, de subsídio de refeição, - € 162,90, de subsídio de turno; 18- A autora recebeu ainda da ré B..., a quantia de € 3.546,39, a título de compensação de caducidade do contrato de trabalho que vigorou entre ambas, no período compreendido entre 1.11.2000 e 18.02.2006; 19- A autora gozou 6 dias úteis de férias relativas às férias vencidas em 1.01.2005, nos períodos compreendidos entre 20.05.2005 e 23.05.2005, inclusive, e 27.11.2005 a 28.11.2005; 20- A ré B... fez cessar o contrato de trabalho temporário da autora, na subsequência da comunicação da ré C..., de 17.12.2005, de que tinha extinguido o posto de trabalho de D.... Fundamentação de direito Quanto á 1.ª questão: Sustenta a autora, aqui apelante, que o contrato de trabalho temporário de duração incerta, celebrado com a 1.ª ré com fundamento na substituição temporária do trabalhador D..., que se encontrava de baixa, deixou de ter fundamento válido, a partir de meados Abril de 2003, altura em que aquele trabalhador regressou ao exercício das suas funções, pois, a partir daquela data, o contrato de utilização de trabalho temporário celebrado pelas rés cessou por extinção da causa que o havia justificado mas, como após o regresso do referido trabalhador continuou ao serviço da 2.ª ré, passou a existir, a partir daquela data, entre ela e a 2.ª ré, um contrato de trabalho sem termo. Vejamos, então, se razão lhe assiste. Ao caso aplica-se o regime jurídico do trabalho temporário previsto no Decreto-Lei nº 358/89, de 17 de Outubro (diploma a que pertencem os preceitos adiante citados, sem menção da origem), alterado pelas Leis nºs 39/96, de 31 de Agosto, 146/99, de 1 de Setembro, e 99/2003, de 27 de Agosto, e que, entretanto, foi revogado pela Lei nº 19/2007, de 22 de Maio. O preâmbulo do Decreto-lei nº 358/89, de 17 de Outubro justifica o recurso à celebração do contrato de trabalho temporário como “um instrumento de gestão empresarial para a satisfação de necessidades de mão-de-obra pontuais, imprevistas ou de curta duração”. Embora o trabalhador temporário continue a pertencer ao quadro da empresa de trabalho temporário, a qual mantém a titularidade exclusiva do poder disciplinar, o poder de direcção e de conformação da prestação laboral cabe à empresa cessionária e o trabalho prestado desenvolve-se sob a direcção desta e demais condições nela existentes – art. 20.º. A retribuição é a devida no quadro aplicável à empresa utilizadora mas é paga pela empresa de trabalho temporário – arts. 21.º, 24.º e 6.º. O trabalho temporário caracteriza-se, pois, pela articulação entre um contrato de trabalho temporário celebrado entre uma empresa de trabalho temporário e um trabalhador, pelo qual este se obriga, mediante retribuição daquela, a prestar temporariamente a sua actividade a utilizadores - arts 2.º, alínea d), e 18.º a 25.º - e um contrato de utilização de trabalho temporário, contrato de prestação de serviços estabelecido entre um utilizador e uma empresa de trabalho temporário, pelo qual esta se obriga, mediante remuneração, a colocar à disposição daquela um ou mais trabalhadores temporários – arts. 2.º, alínea e), e 9.º a 16.º. A lei prevê, taxativamente, nas alíneas do nº 1 do art. 9.º, os casos em que é permitida a celebração do contrato de utilização de trabalho temporário entre eles figurando a substituição do trabalhador ausente ou que se encontre impedido de prestar serviço – alínea a). Aquele contrato de utilização é obrigatoriamente reduzido a escrito e, além da identificação das partes, das características genéricas do posto de trabalho a preencher, local e horário de trabalho, montante da retribuição mínima devida pelo utilizador, de acordo com a lei ou instrumento de regulamentação colectiva aplicável ao utilizador, a trabalhador do quadro próprio que ocupasse o mesmo posto de trabalho, montante da retribuição devida pelo utilizador à empresa de trabalho temporário, início e duração, certa ou incerta, do contrato e data da celebração - alíneas a) e c) a g) do nº 1 do art. 11.º -, deve conter a indicação dos motivos de recurso ao trabalho temporário por parte do utilizador - alínea b) do nº 1 do art. 11.º -, sob pena de se considerar “que o trabalho é prestado ao utilizador com base em contrato de trabalho sem termo, celebrado entre este e o trabalhador” - art. 11.º, nº 4. Quanto à duração do contrato de utilização, sendo caso de substituição de trabalhadores ausentes ou que se encontrem impedidos de prestar serviço, “a duração do contrato não pode exceder a cessação da causa justificativa” – art. 9.º, nº 1, alínea a), e nº 3. E no caso de o trabalhador temporário se encontrar ao serviço ao serviço do utilizador decorridos 10 dias após a cessação do contrato de utilização de trabalho temporário sem que tenha ocorrido a celebração de contrato que o legitime, considera-se que o contrato passa a ser prestado ao utilizador, com base em contrato de trabalho sem termo celebrado entre este e o trabalhador. Relativamente ao contrato de trabalho temporário, os seus requisitos materiais reconduzem-se às condições legitimadoras da celebração de contrato de utilização, tratando-se de um contrato formal, obrigatoriamente reduzido a escrito - art. 18.º, nºs 1 e 2 -, devendo conter a identificação das partes, a indicação dos motivos que justificam a celebração do contrato, “com menção concreta dos factos e circunstâncias que integram esses motivos”, categoria profissional ou descrição genérica das funções a exercer, local e período normal de trabalho, remuneração, início da vigência do contrato e termo do contrato e data da celebração – art. 19.º, nº 1, alíneas a) a h)- e a inobservância da forma escrita ou a omissão dos motivos que justificam a celebração do contrato de trabalho temporário importa a conversão do contrato de trabalho num contrato sem termo, nos termos do estipulado no n.º 3 do art. 42.º do Regime Jurídico de Cessação do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei nº 69-A/89, de 27 de Fevereiro (RJCCIT) – art. 19.º, nº 2. De notar que a cessação do contrato de trabalho temporário “regula-se pelo regime geral aplicável aos contratos de trabalho a termo” – art. 23.º. Vem justamente a propósito sublinhar que a duração do contrato de trabalho temporário se acha indexada à duração do contrato de utilização — artigo 19.º, n.º 1, alínea g). Quer isto dizer que o prazo máximo de vigência do contrato se afasta do regime do contrato a termo para ser, reflexamente, fixado pelo contrato de utilização (Maria Regina Gomes Redinha “A Relação Laboral Fragmentada. Estudo sobre o Trabalho Temporário”, Boletim da Faculdade de Direito, Studia Iuridica 12, Universidade de Coimbra, Coimbra Editora, 1995, págs. 231 e 232). No caso em apreço ficou provado que: - as rés celebraram, entre si, por escrito, em 1.11.2000, e com produção de efeitos nessa data, a ré 2.ªré na qualidade de utilizador e a 1.ª ré na qualidade de empresa de trabalho temporário, um contrato de utilização de trabalho temporário, a termo incerto tendo por objecto, a cedência temporária, pela 1.ª à 2.ª ré, de um trabalhador daquela, para o exercício, em horário, de três turnos rotativos, das funções correspondentes à categoria profissional de “Operador de Posto de Portagem”, visando-se o exercício dessas funções na barreira de portagem de “Deco-Coina Nó”, em virtude da necessidade de substituição do trabalhador da C..., D..., por este se encontrar de baixa; - ao abrigo desse contrato de utilização de trabalho temporário foi celebrado entre a autora e a 1.ª ré um contrato de trabalho temporário a termo incerto, invocando-se como fundamento do contrato a substituição temporária do trabalhador D..., que se encontrava de baixa; - em 19.04.2003, aquele trabalhador da 2.ª ré retomou o exercício das funções correspondentes à sua categoria profissional de “Operador de Posto de Portagem” mas não regressou ao posto de trabalho de que era titular, já que, por razões de saúde, não podia então exercer tais funções em horário de turnos rotativos mas, apenas, em horário fixo; - o referido trabalhador tem, desde então, exercido as funções correspondentes à sua categoria profissional, em horário fixo; - em 17.12.2005, a 2ª ré constatou, no âmbito do processo de certificação das barreiras de portagem, a desnecessidade daquele posto de trabalho, pelo que este foi extinto, considerando que o seu titular ainda se encontrava a exercer funções laborais em regime de horário fixo, por motivos de saúde; - o contrato de trabalho temporário manteve a sua vigência até 18 de Fevereiro de 2006, altura em que a 1ª ré o fez cessar, através de comunicação de 20 de Dezembro de 2005, “em virtude de ser desnecessária a continuidade da sua prestação de trabalho em função do motivo que justificou a sua contratação”; - a 1.ª ré fez cessar o contrato de trabalho temporário da autora, na sequência da comunicação da 2.ª ré, de 17.12.2005, de que tinha extinguido o posto de trabalho de D...; - em 22 de Dezembro de 2005, a 1ª ré enviou para a autora a comunicação que a dispensava de comparecer ao trabalho até ao termo do denominado contrato de trabalho temporário. Entendeu-se na decisão sindicada que a justificação que levou à contratação da autora, contempla o facto de o trabalhador substituído não poder regressar ao seu posto de trabalho, por razões de saúde, embora tenha cessado a situação de baixa e que tal causa justificativa se manteve, até à data da cessação do contrato da autora. Não é este o nosso entendimento. Como já vimos, a duração do contrato de utilização, no caso de substituição de trabalhadores ausentes ou que se encontrem impedidos de prestar serviço não pode exceder a cessação da causa justificativa – art. 9.º, n.º 1, alínea a), e nº 3. Portanto, nestes casos, o contrato cessa com o regresso de trabalhador substituído tal como acontece com o contrato de trabalho a termo incerto celebrado em semelhante hipótese – arts. 48.º e 49.º do RJCCIT ex vi art. 23.º. Se este regressa, não se coloca qualquer dúvida: o contrato caduca com o assinalado regresso. Mas que acontece se o trabalhador substituído falecer, se reformar ou se o respectivo contrato cessar por qualquer outra forma? Neste plano de consideração, entende-se que pelo próprio fundamento daquela específica contratação, a lei presume a transitoriedade da ausência. Contudo, facilmente se compreende também que essa ausência se possa tornar definitiva, nomeadamente quando ela é motivada pela doença do trabalhador. Aqui, como ali, deixa de subsistir o requisito da transitoriedade, que fundamentou quer a celebração do contrato de utilização de trabalho temporário quer a aposição do termo contratual do trabalhador substituto. A ratio do preceito, isto é, o fim visado pelo legislador e as soluções que ele pretendeu alcançar com a norma produzida, impõem a necessária equiparação entre o regresso e o não regresso definitivo. É, de resto, o que agora decorre da parte final do nº 1 do art. 145.º do Cód. Trab., que prescreve a caducidade do contrato a termo, tanto na situação de regresso do trabalhador substituído, como no caso de cessação do contrato deste, excepto se o trabalhador substituto se mantiver ao serviço durante quinze dias após aquelas ocorrências. Aliás, a certeza da verificação do facto resolutivo que é própria do termo impõe interpretação da vontade das partes que faça equivaler à verificação do facto a certeza da sua não verificação. Isto é, o verdadeiro motivo para a aposição de termo ao contrato de trabalho é a verificação de uma necessidade temporária e esta tanto termina pela sua satisfação — regresso do trabalhador substituído — como pelo desaparecimento da característica da temporaneidade (Romano Martinez e outros, “Código do Trabalho Anotado”, 4.ª edição, Almedina, Coimbra, 2005, pág 304). Tudo para concluir que a duração do contrato de utilização, no caso de substituição de trabalhadores ausentes ou que se encontrem impedidos de prestar serviço não pode exceder o regresso do trabalhador substituído ou a certeza de que ele já não irá regressar. Na hipótese sub judice, quando o trabalhador D..., retomou o exercício das funções correspondentes à sua categoria profissional de “Operador de Posto de Portagem” não regressou ao posto de trabalho de que era titular, já que, por razões de saúde, não podia então exercer tais funções em horário de turnos rotativos mas, apenas, em horário fixo e desde, então, que vem exercendo aquelas funções, em horário fixo. Surge, assim, como lógica a conclusão de que o contrato de utilização de trabalho temporário cessou em 14 de Abril de 2003 com o regresso do trabalhador substituído aliado ao facto de este não poder por razões de saúde retomar o seu posto de trabalho. Apesar de não ter ocorrido a celebração de contrato que legitimasse, a continuação da autora ao serviço da 2.ª ré, a autora só cessou as suas funções na sequência da comunicação de 2.ª ré de 17.12.2005, à 1.ª de que tinha extinguido o posto de trabalho do trabalhador substituído. Face ao exposto, deve considerar-se que, a partir de 24 de Abril de 2003, a autora ficou ligada à 2.ª ré por um contrato de trabalho sem termo – art. 10.º -, com antiguidade reportada a 24 de Abril de 2003 e não à data em que a autora foi admitida ao serviço pela 1.ª ré, ou seja, 1 de Outubro de 2000, como a autora pretende. Efectivamente, as relações jurídicas que se estabeleceram através do contrato de utilização de trabalho temporário celebrado entre as rés e do contrato de trabalho temporário celebrado entre a autora e a ré são distintas, não só entre si, como também da relação jurídica que se estabeleceu através do contrato de trabalho sem termo nascido, por força da lei, entre a autora e a 2.ª ré, nos termos do art. 10.º que dispõe que, recorde-se, dispõe que: “No caso de o trabalhador temporário continuar ao serviço do utilizador decorridos 10 dias após a cessação do contrato de utilização sem que tenha ocorrido a celebração de contrato que o legitime, considera-se que o trabalho passa a ser prestado ao utilizador com base em contrato de trabalho sem termo, celebrado entre este e o trabalhador”. Procedem, assim, em parte, quanto a esta questão, as conclusões do recurso. Quanto à 2.ª questão: Tornado assente que a partir de 24 de Abril de 2003, passou a haver um contrato de trabalho sem termo entre a autora e a 2.ª, estabelecido que a 1.ª ré enviou à autora carta datada de 20 de Dezembro de 2005 transmitido à autora que o contrato entre ambas reduzido a escrito cessava a sua vigência em 18 de Fevereiro de 2006, “em virtude de ser desnecessária a continuidade da sua prestação de trabalho em função do motivo que justificou a sua contratação”, carta aquela que teve o efeito de afastar a autora da prestação do trabalho que vinha efectuando à 2.ª ré e sabendo-se que mesmo antes de 18 de Fevereiro de 2006 a autora deixou de prestar a sua actividade profissional à 2.ª ré, resta saber se esta ré deve ser sido condenada a reintegrar o autora, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade e a pagar-lhe as retribuições vencidas e vincendas que são consequência de um despedimento ilícito. Importa, pois, antes de mais, verificar se ocorreu um despedimento. O Decreto-Lei nº 358/89 não contém um regime especial para a cessação do contrato de trabalho sem termo que se venha a estabelecer entre o trabalhador temporário e o utilizador. O despedimento define-se como “ruptura da relação de trabalho por acto de qualquer dos seus sujeitos. É estruturalmente um acto unilateral do tipo do negócio jurídico, de carácter receptício (deve ser obrigatoriamente levado ao conhecimento da outra parte), tendente à extinção ex nunc (isto é, para futuro) do contrato de trabalho” (Lobo Xavier, “Curso de Direito do Trabalho”, pág. 478. No dizer de Pedro Romano Martinez (“Direito do Trabalho”, Almedina, pág. 845), trata-se de uma forma de cessação unilateral do contrato em que a iniciativa cabe ao empregador e pressupõe uma declaração de vontade deste comunicando ao trabalhador a cessação do mesmo, declaração essa que, por ser uma declaração de vontade receptícia e com efeitos constitutivos, só produz efeitos depois de chegar ao poder do trabalhador ou depois de ser dele conhecida e não é susceptível de ser unilateralmente revogada pelo empregador, depois de ter sido recebida pelo trabalhador ou de ser dele conhecida - arts. 224.º, nº 1 e 230.º, nº 1, do Cód. Civil. O nosso ordenamento jurídico laboral não faz depender a validade da declaração de despedimento da observância de forma especial, o que significa que a mesma pode ser emitida de forma expressa ou de forma tácita - arts. 217.º e 219.º do Cód. Civil). Nos termos do nº 1 do referido art. 217.º, a declaração negocial é expressa quando é feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação de vontade e é tácita quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam. Ora, no caso dos autos, não ficou provado que a autora tivesse deixado de prestar a sua actividade profissional à 2.ª ré, interrompendo ou cessando o contrato de trabalho sem termo que se estabeleceu por força da lei, por virtude de qualquer declaração de vontade emitida por aquela ré, assim como também não ficou provado que a mesma ré tivesse praticado qualquer acto equivalente a uma manifestação de vontade de despedir a autora - despedimento de facto. Efectivamente, a matéria de facto dada como provada não contém qualquer declaração expressa de despedimento da autora por parte da 2.ª ré. Em parte alguma dos factos provados se refere que esta ré tivesse dito expressamente à autora que estava despedida, seja por palavras, seja por escrito ou por qualquer outro meio directo de manifestação vontade, sendo certo que ela nem sequer alegou que tal tivesse acontecido. O que a autora alegou e pretende é que, a declaração de despedimento se deduza da comunicação expedida pela 1ª ré em que esta lhe transmitiu que o contrato cessava em 18 de Fevereiro de 2005 comunicação aquela confirmada pela 2.ª. Da referida confirmação não dão os autos qualquer conta e os factos provados não permitem a leitura que a autora deles pretende retirar. Ao contrário do que refere a autora, a relação jurídica de trabalho que se estabeleceu entre a autora e a 2.ª através do referido contrato de trabalho sem termo, não cessou por ter cessado o contrato de utilização celebrado entre as rés, nem por ter cessado o contrato de trabalho temporário celebrado entre a 1.ª ré e a autora, pois, como já se disse, as relações jurídicas que se estabeleceram através desses contratos são distintas, não só entre si, como também da relação jurídica que se estabeleceu através do contrato de trabalho sem termo nascido, por força da lei, entre a autora e a 2.ª ré. Aliás, nem sequer se pode dizer que o contrato de trabalho sem termo existente entre a autora e a 2.ª ré já tivesse cessado por qualquer das causas de cessação do contrato de trabalho previstas na lei – art. 384.º do Cód. Trab.. Impõe-se, por isso, concluir que não se provou o despedimento ilícito da autora, retirando daí as necessárias consequências, não, podendo, consequentemente, nesta parte, a pretensão da autora deixar de improceder. Decisão Pelo exposto, acorda-se em conceder parcial provimento à apelação, alterando a sentença recorrida, cujo dispositivo passa a ter a seguinte redacção: Nesta conformidade e decidindo, julga-se a acção parcial-mente procedente e, consequentemente: a) declara-se a cessação do contrato de utilização de trabalho temporário celebrado entre as rés, com efeitos reportados 14 de Abril de 2003; b) declara-se que a autora se encontra vinculada a ré C... por contrato de trabalho sem prazo, desde 24 de Abril de 2003, com antiguidade reportada a esta data; c) condena-se a ré B... no pagamento à autora da quantia de € 426,18, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, absolvendo-se as rés do demais peticionado. Custas da apelação na proporção do decaimento. Lisboa, 9 de Abril de 2008 Isabel Tapadinhas Natalino Bolas Leopoldo Soares |