Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
361/13.1TVLSB-A.L1-2
Relator: FARINHA ALVES
Descritores: ACIDENTE
MENOR
ESTABELECIMENTO DE ENSINO
DEVER DE VIGILÂNCIA
CULPA
IMPUTABILIDADE
RESPONSABILIDADE CIVIL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/06/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIAL PROCEDÊNCIA
Sumário: I - Estando em causa uma criança de dez anos, inserida numa turma de alunos dessa mesma idade, tendo em consideração as dinâmicas de grupo numa tal situação, e o apelo exercido nessa idade por um corrimão que pode ser escorregado, julga-se que era exigível à Escola que tivesse adoptado uma qualquer medida que obstasse a essa utilização. Como acabou por tomar após o acidente.
Concluindo-se, assim, que a 1.ª Requerida não cumpriu adequadamente o seu dever de vigilância e de protecção que para ela decorrida do contrato de ensino, respondendo pela ocorrência do acidente e pelos danos dele resultantes para o “B”.
II - Por seu turno o “B”, mesmo tendo apenas dez anos, não podia ignorar que era perigoso escorregar pelo corrimão da escada, sobretudo daquela forma tão inusitada, de cabeça para baixo, e àquela altura do solo. Reafirmando-se que os seus colegas, da mesma idade, tentaram demovê-lo do seu propósito.
Assim, a culpa do “B” na verificação do acidente, que seria total em caso de maioridade, e muito próxima disso, nos últimos anos que a antecedem, apenas pode ser reduzida em função da sua menor idade, e da menor maturidade que lhe corresponde, que tem como contrapartida, o dever de vigilância a cargo da Escola. Havendo que fixar a medida dessa culpa de modo a que, como acima foi referido, a Escola não responda de forma exclusiva, por danos a que o lesado também deu causa.
III - Parecendo seguro que esta imputação de culpa ao menor não viola qualquer regra ou princípio constitucional, designadamente o direito das crianças à protecção da sociedade e do Estado.
IV - A culpa do menor há-de ser apreciada em abstracto, aplicando o critério enunciado no art. 487.º, n.º 2 do C. Civil, adaptado à idade da criança, ou seja, considerando o comportamento previsível numa “boa criança de dez anos” naquelas circunstâncias.
Assim, e na falta de melhores elementos, haverá que ponderar que o “B”, em desenvolvimento progressivo da sua maturidade, se presume imputável desde os sete anos de idade, mostrando-se decorridos, à data do acidente, três anos sobre o início dessa imputabilidade presumida. E ainda que a lei também presume um elevado grau de imputabilidade a partir da idade de dezasseis anos, quando atribui imputabilidade criminal, bem mais exigente do que a civil, para além de que, a partir desta idade pode ser atingido o pleno exercício de direitos através da emancipação, obtida por efeito do casamento. Podendo ainda presumir-se que, entre esses dois limites, o desenvolvimento da maturidade se faz progressivamente, verificando-se, em cada momento, um grau de maturidade proporcional à parcela já decorrida do período total que, nos termos referidos, a lei presume necessário para o completo amadurecimento.
V - Assim sendo, pensando apenas em termos de presunções não ilididas, julga-se ser de fixar em 30% a culpa do “B” na produção do acidente de que foi vítima. E que deve ser limitada, nessa mesma medida a indemnização pelos danos resultantes do acidente, nos termos do art. 570.º do C. Civil.
(FA)
Decisão Texto Parcial:Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

“A” e outro, por si e em representação de seu filho menor “B”, requereram contra a Associação (proprietária da Escola) e contra a Seguradora, a presente providência cautelar de arbitramento de reparação provisória, pedindo que as requeridas passem a pagar ao requerente “B”, mas ao cuidado da requerente mãe, até que, após a sua maioridade, seja suprida a sua incapacidade jurídica, uma pensão mensal no valor de 2.750,00€, a partir de Março de 2013 e por conta da indemnização que lhe venha a ser atribuída, sujeita a actualização anual já em Janeiro de 2014 de acordo com o IPC do INE.

Alegaram, para tanto, em síntese:

Os dois primeiros requerentes são os pais do 3° requerente, tendo este ficado à guarda da mãe nos termos da regulação do poder paternal na sequência do divórcio entre o 1° e 2° requerentes;
Em Junho de 2005, o 3° requerente, então com dez anos de idade, sofreu um acidente na Escola, que frequentava como aluno.
Nesse dia, quando o “B” saiu da sala de aula, situada no 3° piso, veio a cair no vão da escada até ao solo, percorrendo, em queda livre, mais de dez metros, tendo sofrido lesões que lhe determinaram uma incapacidade superior a 95%.
Desde essa altura, o “B” necessita de acompanhamento especializado permanente e da guarda e cuidado de terceira pessoa, estando totalmente dependente.
Carecendo de dar continuidade a actividades terapêuticas, de receber cuidados médicos renovados ditados por sintomatologia de convulsões, e de passar a frequentar um estabelecimento especializado, cujos custos não são comportáveis para os requerentes.
Nos termos do art. 18 (vigilância e responsabilidade civil) do seu próprio Regulamento Interno, “A Escola é obrigada a vigiar os alunos durante as aulas, intervalos, horas livres, durante a participação noutras actividades escolares, bem como 15 minutos antes do começo das aulas e 10 minutos depois de acabarem”.
O acidente só ocorreu porque a primeira requerida, proprietária da Escola e titular do respectivo alvará, a cuja vigilância e cuidado se encontrava o “B”, não tomou as medidas de protecção adequadas a impedi-lo, o que estava, legal e contratualmente, vinculada a fazer. E apenas tomou essas medias – colocou protecções nas guardas das escadas e dos patamares, e localizou no piso térreo as aulas daqueles mais novos - depois do acidente.
A guarda das escadas não tinha a altura de 1,20 metros, estabelecida no DL n.º 414/98 de 31 de Dezembro – regulamento de segurança contra incêndios em edifícios escolares, e só depois do acidente foram adoptados meios de segurança compensatórios.
Presumindo-se a culpa da 1.ª requerida, nos termos do art. 799.º e 800.º do C. Civil.
A requerida Seguradora responde por força do contrato de seguro.

Citadas, as requeridas opuseram, em síntese:
I – A requerida Seguradora:
O contrato de seguro apenas garante a responsabilidade civil extra-contratual.
A queda deveu-se ao requerente “B” que, ao sair da sala de aulas, situada no 2.º piso, saltou para cima do corrimão que encima a guarda das escadas, com a cara virada no sentido descendente, colocando um perna de cada um dos lados da guarda, deixando-se escorregar nessa posição, acabando por se desequilibrar e cair.
A guarda das escadas respeitava as medidas regulamentares em vigor.
E nunca ali aconteceu outro acidente com as mesmas características.
Impugna, por os desconhecer, parte dos danos.

II – A requerida Associação:
O requerente “B” já atingiu a maioridade, pelo que cessou a sua representação pelos pais, primeiro e segundo requerentes, que devem ser declarados parte ilegítima.
Descreve o acidente em termos idênticos aos referidos na oposição da requerida Seguradora, concluindo que o mesmo é exclusivamente imputável ao ora requerente “B” e que, atenta a forma inopinada, desobediente e insubordinada como o mesmo se comportou, era impossível evitar a sua ocorrência.
As instalações da escola cumpriam todos os requisitos legais aplicáveis e o acidente não se deu por qualquer erro ou deficiência construtiva.
E estando a escola em funcionamento desde o ano de 1962, nunca ali havia ocorrido qualquer acidente, quer com a utilização das escadas, quer do respectivo corrimão.

No início da audiência, as partes acordaram em dar como indiciariamente provada boa parte da matéria alegada, quer no requerimento inicial, quer nas oposições. Acordaram ainda na selecção da matéria de facto a submeter a prova.
Foram produzidas as provas requeridas, incluindo uma inspecção judicial ao local do acidente, tendo sido proferida a decisão de facto que consta de fls. 481 a 490.
Foi proferida decisão onde se julgou improcedente a providência requerida.

Inconformados, os requerentes apelaram do assim decidido tendo apresentado alegações, rematadas por conclusões impugnando a decisão de facto e de direito.
(…).
Sendo o objecto dos recursos delimitado pelas conclusões, enquanto fundadas nas respectivas alegações, e ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal, está em causa na presente apelação saber:
I - Em sede de matéria de facto:
(…………….)

II – Em sede de matéria de direito está em causa saber se:

- Estão verificados os pressupostos da obrigação de indemnizar por parte da 1.ª requerida, quer com fundamento em responsabilidade extracontratual, por a altura da guarda das escadas ser inferior à, então, estabelecida nas disposições legais e regulamentares aplicáveis, sem que tivessem sido adoptadas medidas compensatórias, que apenas foram implementadas depois de o acidente ter ocorrido; Quer com fundamento no contrato de ensino, por incumprimento do dever de protecção e guarda que do mesmo resulta para a primeira requerida.
- O contrato de seguro também garante a responsabilidade contratual da 1.ª requerida.
- Seria materialmente inconstitucional, por violação do art. 69.º da CRP, configurar, no caso, a imputabilidade do 3.º requerente, com apenas dez anos à data dos factos.
- Está demonstrada a impossibilidade de os requerentes fazerem face às necessidades do 3.º requerente resultantes do acidente.

Vejamos:
(…..)
A matéria de facto a considerar é, pois, a fixada na decisão recorrida com as alterações acabadas de introduzir. Atenta a sua extensão, julga-se não haver interesse na sua transcrição integral neste momento, optando-se por transcrever, em relação a cada uma das questões a resolver, a que se considera relevante para a respectiva apreciação.

II - O Direito

Como se viu, nesta sede está em causa saber se:

- Estão verificados os pressupostos da obrigação de indemnizar por parte da 1.ª requerida, quer com fundamento em responsabilidade extracontratual, por a altura da guarda das escadas ser inferior à, então, estabelecida nas disposições legais e regulamentares aplicáveis, sem que tivessem sido adoptadas medidas compensatórias, que apenas foram implementadas depois de o acidente ter ocorrido; Quer com fundamento no contrato de ensino, por incumprimento do dever de protecção e guarda que do mesmo resulta para a primeira requerida quer com fundamento.
- O contrato de seguro também garante a responsabilidade contratual da 1.ª requerida.
- Seria materialmente inconstitucional, por violação do art. 69.º da CRP, configurar, no caso, a imputabilidade do 3.º requerente, com apenas dez anos à data dos factos.
- Está demonstrada a impossibilidade de os requerentes fazerem face às necessidades do 3.º requerente resultantes do acidente.
Ou seja, está em causa saber se a 1.ª requerida responde, e em que medida, pelo acidente sofrido pelo requerente “B” e, em contraponto, saber se não pode ser imputada ao próprio “B” culpa na verificação do acidente.
A concluir-se pela existência de responsabilidade da 1.ª requerida, importará, depois, saber se a mesma está coberta pelo contrato de seguro.
E se está verificado o pressuposto da providência cautelar requerida, traduzido numa situação de necessidade de os requerentes disporem de uma quantia mensal para fazerem face às despesas do requerente “B”, resultantes do acidente.

Vejamos:

A – A responsabilidade pela verificação do acidente

Está aqui em causa saber se o acidente dos autos deve ser imputado, e em que medida, à requerida Associação e/ou ao próprio “B”.

Com interesse para a apreciação desta questão, está indiciariamente assente a seguinte matéria de facto, tal como está identificada na decisão recorrida:

1. A Escola é um estabelecimento de ensino particular, integrado no designado regime de ensino particular e cooperativo, assim registado junto da então Direcção Regional de Educação de Lisboa e Vale do Tejo, que é um Serviço do Ministério da Educação;
2. A referida Escola é formalmente titulada, gerida e mantida pela Associação, aqui 1ª Requerida, que é formalmente sua proprietária e também titular do seu alvará;
3. A 1ª Requerida, a Associação, com sede no próprio estabelecimento de ensino, define-se estatutariamente como uma instituição privada, sem fins lucrativos, cujo objecto é o de "manter uma Escola de formação geral e um jardim-de-infância com escola pré-primária", a referida Escola;
4. É esta Associação que era e é dada como a proprietária da Escola pela Direcção Regional de Educação de Lisboa e Vale do Tejo;
8. O 3° Requerente era aluno da Escola e frequentava a dita 5ª Classe, equivalente ao 5° ano do ensino básico, no ano lectivo 2004/2005, tendo-lhe sido atribuído o número de aluno ...;
9. De acordo com o calendário e horário lectivos seguidos então na 1ª Requerida, o período de aulas decorria – apenas com as interrupções correspondentes a férias e feriados – entre o início de Setembro do primeiro ano civil e o final de Junho do ano civil seguinte;
10. Diariamente, as aulas desenvolviam-se em 10 tempos, com a duração de 45 minutos cada;
11. No dia 28 de Junho de 2005, no 4° Tempo, o 3° Requerente teve aula leccionada na sala A24, situada no último piso do bloco em frente à piscina, denominado 2° piso;
71. Após sair da sala de aulas, situada no denominado 2° piso do edifício referido, sendo que existia um piso com o n.º 0 e um piso com o n° 1, o 3° Requerente, no primeiro lanço de escadas, aí existente veio a cair completamente desamparado pelo vão interior dessas escadas, sem que nada tivesse impedido retido ou atenuado tal percurso o qual culminou com o embate no solo do piso 0;
73. O Requerente “B” percorreu, em queda livre, cerca de seis a sete metros, desde o primeiro lance de escadas do referido 2° piso até ao solo do piso térreo;
74. O referido edifício, à data do acidente, tinha ao longo de todas as escadas um corrimão de madeira e protecção metálica com cerca de 95 cm, sendo a espessura do corrimão de 3,5cm e tendo a protecção metálica elementos horizontais conforme fotografia de fls. 222, existindo patamares em cada piso, bem como um lance de 9 degraus, e um outro de 3 degraus, nos dois últimos pisos;
75. Inexistindo qualquer protecção adicional a partir do corrimão da escada, nem tinha qualquer meio de retenção, nem a zona de impacto no solo tinha qualquer revestimento ou condições de amortecimento de qualquer queda;
88. O Requerente “B” estava a ter aula na Sala A24 situada no segundo piso do Edifício, denominado Edifício A, e logo que soou o toque da campainha correu para a porta da sala de aula e saiu, seguindo-se-lhe mais dois colegas;
89. Sendo que nesse momento não estava mais nenhum aluno no patamar da sala A24, nem nas escadas;
90. Todos os restantes alunos da Sala A24 estavam ainda dentro da mesma com a professora;
91. Mal chegou ao patamar, o Requerente “B” dirigiu-se para as escadas e de imediato saltou para cima do corrimão que encima a guarda das escadas, com a cara virada para o sentido descendente e as costas viradas para a sala de aula, colocando cada uma das pernas de cada um dos lados da guarda;
92. Os colegas que estavam junto dele pediram-lhe que descesse daquele local, ao que o “B” não acedeu mantendo a mesma postura e posição;
93. Ao mesmo tempo que impulsionou o corpo e começou a escorregar pelo corrimão;
94. E foi quando assim escorregava, encavalitado no corrimão, que o Requerente “B” se desequilibrou e tombou para o lado do vão das escadas, caindo até ao Rés-do-Chão;
100. Antes de sair da sala A24 e no decorrer da aula do 4° tempo (que antecedeu o acidente), o Requerente encontrava-se a ter mau comportamento, lançando giz na direcção dos colegas que se encontravam na sala, tendo sido advertido e admoestado pela professora “C”;
101. Chegado o final da aula, assinalado com o toque típico dos estabelecimentos de ensino, os alunos deveriam aguardar pela autorização do respectivo professor para abandonar a sala;
102. Antes que tivesse sido autorizada a saída da sala pela professora, logo que soou o toque de final do 4° tempo, o Requerente “B” abriu a porta da sala e, conjuntamente com outros dois colegas (“D” e “E”) saíram de imediato da sala de aula.
72. O 3° Requerente nasceu no dia .../1995 – cf. cartão do cidadão de fls. 247;
86. O requerente era uma criança irrequieta, muito viva e saudável, antes do acidente supra descrito;
95. O Edifício actual da Escola foi construído no ano de 1961, especificamente para ser utilizado como escola;
96. Desde a data em que iniciou a actividade nas instalações em causa, no início da década de 60, até à actualidade o único acidente com as características do caso sub judice foi o do “B”;
85. A 1ª requerida no verão de 2005, após o acidente, colocou protecções - redes - nas guardas ou corrimão das escadas e dos patamares e no início do ano lectivo seguinte, mudou a turma frequentada pelo 3° requerente de piso e sala;
97. No intervalo de 20 minutos, na escola em causa os alunos deviam sair das respectivas salas de aula, as quais eram, após a saída de todos, fechadas pelos professores;
98. Após, os edifícios eram encerrados pelos vigilantes;
87. A Escola rege-se, e regia-se á data dos factos em causa, além do mais, pelo regulamento interno nos termos constantes do documento de fls. 201 a 214 cujo teor se dá por integralmente reproduzido, prevendo-se nomeadamente no seu ponto 18.1 sob a epígrafe "vigilância" que «A Escola é obrigada a vigiar os alunos durante as aulas, intervalos, horas livres, durante a participação noutras actividades escolares, bem como 15 minutos antes do começo das aulas e 10 minutos depois de acabarem.»;

Na questão da responsabilidade da 1.ª requerida, Associação, fundada no incumprimento das normas legais e regulamentares definidoras das características mínimas que deveria ter a guarda de escadas onde aconteceu o acidente, ou na colocação de alunos de menor idade em pisos superiores, acompanha-se o seguinte passo da decisão recorrida:

«Pretendem os requerentes afirmar que a queda do 3° requerente se deveu (….) à ausência de cumprimento das regras relativas a existência de protecção nas guardas das escadas ou dos patamares ou colocando os alunos mais novos nos pisos térreos, ou ainda altura desadequada ou desrespeito da altura mínima exigida para a escola. Com efeito, os requerentes invocam a violação do regulamento relativo a espaços de recreio — DL n.º 397/97, no que diz respeito á superfície de embate, o qual em nosso entender não é aplicável, por não se tratar de qualquer espaço de recreio, mas sim de aulas. Invocam ainda o despacho conjunto 268/97, quanto ao entendimento de o espaço destinado às crianças dever desenvolver-se em piso térreo, quanto tal apenas se prevê no ensino pré-escolar e não no 2° ciclo, como era o caso. Quanto à especificação do LNEC, não constitui a mesma qualquer norma que possa caracterizar por si só que a sua eventual violação possa constituir ilícito. Quanto à Portaria n° 2532, de 29/12 e DL n° 414/98, que aprovou o regulamento de segurança contra incêndios, apenas se aplica a estabelecimentos escolares que sejam construídos já no âmbito de aplicação temporal desse mesmo regulamento, ou que sofram significativas ampliações e remodelações.
Donde, considerando que a construção do actual edifício da Escola data da década de 60, não existe qualquer norma regulamentar violada no âmbito dos elementos construtivos aplicáveis ao edifício em causa, pois aplicar-se-á o Regulamento Geral das Edificações Urbanas aprovado pelo Decreto n.º 38382, de 7/8/1951. Com efeito, a violação por parte da requerida de uma qualquer norma relativa à segurança exigida para os seus elementos construtivos poderia integra-se no âmbito da violação ilícita do direito de outrem, dado a disposição, por norma, destinar-se a proteger interesses alheios.
Todavia a ausência de uma qualquer violação das normas de construção determina sim a falta da prova indiciária exigida quanto à ilicitude do facto, um dos pressupostos essenciais para se poder considerar a existência de responsabilidade civil dita aquiliana, pois a eventual culpa in vigilando apenas se pode considerar em termos contratuais…».

Os apelantes insistem em que essas disposições, mesmo não sendo directamente aplicáveis, devem ser consideradas como elementos que dão expressão, ou densificam o conteúdo obrigacional mínimo do dever de guarda e de protecção que integra o contrato de ensino. Mas aqui estamos perante pressupostos de responsabilidade contratual, e não de responsabilidade fundada na violação de normas legais destinadas a proteger interesses alheios, que constitui a segunda variante da ilicitude prevista no art. 483.º, n.º 1 do CPC.
De resto, e como também parece resultar dos autos, o que está fundamentalmente em causa na presente situação não é a altura da guarda de escadas, mas antes a inexistência de uma solução que impedisse a sua utilização como escorrega, ou de vigilância que obstasse a essa utilização.
Acompanha-se, pois, a decisão recorrida na parte em que concluiu que a responsabilidade da 1.ª requerida não pode ser fundada no disposto nos art. 483.º e seguintes do CPC, incluindo o art. 491.º que, de facto, apenas é aplicável a terceiros lesados por actos de menores sujeitos a vigilância. A situação em que o lesado é o próprio menor sujeito a vigilância, apenas encontra enquadramento em sede de responsabilidade contratual, onde beneficia da presunção de culpa estabelecida no art. 799.º do C. Civil, bem menos favorável do que a estabelecida no referido art. 491.º.
De facto, ao abrigo do disposto no art. 799.º, o credor lesado tem de provar o incumprimento do dever de vigilância e a existência de nexo de causalidade entre esse incumprimento e os danos verificados, incumbindo, depois, ao devedor provar que esse incumprimento não procede de culpa sua. Já no âmbito do art. 491.º é o próprio incumprimento que se presume, incumbindo ao responsável pelo dever de vigilância ilidir essa presunção, ou demonstrar a inexistência de nexo de causalidade entre o incumprimento e os danos.

A decisão recorrida afastou, de seguida, a existência de responsabilidade contratual da 1.º requerida pelo acidente dos autos, nos seguintes termos que, por comodidade, se reproduzem:

«Aqui chegados e ainda que se conclua pela existência de um contrato de ensino nos termos sobreditos e tendo ainda por base o previsto no regulamento interno da Escola, nomeadamente no seu ponto 18.1 sob a epígrafe "vigilância" que «A Escola é obrigada a vigiar os alunos durante as aulas, intervalos, horas livres, durante a participação noutras actividades escolares, bem como 15 minutos antes do começo das aulas e 10 minutos depois de acabarem.», importa aferir a forma como ocorreu o acidente em causa e em que termos a requerida afastou ou não a presunção de culpa.
Ora, em nosso entender as lesões sofridas pelo 3° requerente são in casu devidas à sua própria actuação, a qual se manifestou inclusive contra as regras impostas pela Escola.
Senão vejamos.
Em termos factuais resultou sumariamente demonstrado, no tocante à forma como ocorreu o acidente, que o Requerente “B” estava a ter aula na Sala A24 situada no segundo piso do Edifício, denominado Edifício A, e logo que soou o toque da campainha o Requerente “B” correu para a porta da sala de aula e saiu, seguindo-se-lhe mais dois colegas. Sendo que nesse momento não estava mais nenhum aluno no patamar da sala A24, nem nas escadas. Todos os restantes alunos da Sala A24 estavam ainda dentro da mesma com a professora.
Acresce que no intervalo de 20 minutos, como era o caso, os alunos deviam sair das respectivas salas de aula, as quais eram, após a saída de todos, fechadas pelos professores, após, os edifícios eram encerrados pelos vigilantes.
Demonstrou-se que em algumas vezes o 3° requerente desrespeitou as ordens dos professores e auxiliares, mas sem que tenha existido qualquer registo disciplinar contra o mesmo e antes de sair da sala A24 e no decorrer da aula do 4° tempo (que antecedeu o acidente), o Requerente, encontrava-se a ter mau comportamento, lançando giz na direcção dos colegas que se encontravam na sala, tendo sido advertido e admoestado pela professora, “C” . Chegado o final da aula, assinalado com o toque típico dos estabelecimentos de ensino, os alunos deveriam aguardar pela autorização do respectivo professor para abandonar a sala. Porém, antes que tivesse sido autorizada a saída da sala pela professora, logo que soou o toque de final do 4° tempo, o Requerente “B” abriu a porta da sala e, conjuntamente com outros dois colegas (“D” e “E”) saíram de imediato da sala de aula.
Mal chegou ao patamar, o Requerente “B” dirigiu-se para as escadas e de imediato saltou para cima do corrimão que encima a guarda das escadas, com a cara virada para o sentido descendente e as costas viradas para a sala de aula, colocando cada uma das pernas de cada um dos lados da guarda. Os colegas que estavam junto dele pediram-lhe que descesse daquele local, ao que o “B” não acedeu mantendo a mesma postura e posição. Ao mesmo tempo que impulsionou o corpo e começou a escorregar pelo corrimão e foi quando assim escorregava, encavalitado no corrimão, que o Requerente “B” se desequilibrou e tombou para o lado do vão das escadas, caindo até ao Rés do Chão.
O Requerente “B” percorreu, em queda livre, cerca de seis a sete metros, desde o primeiro lance de escadas do referido 2° piso até ao solo do piso térreo. O referido edifício, à data do acidente, tinha ao longo de todas as escadas um corrimão de madeira e protecção metálica vertical entre o corrimão e os degraus, com cerca de 95 cm, sendo a espessura do corrimão de 3,5cm, existindo patamares em cada piso, bem como um lance de 9 degraus, e um outro de 3 degraus, nos dois últimos pisos. Inexistindo qualquer protecção adicional a partir do corrimão da escada, nem tinha qualquer meio de retenção, nem a zona de impacto no solo tinha qualquer revestimento ou condições de amortecimento de qualquer queda.
Em resultado da queda e após embate no solo, o Requerente “B” (o 3° Requerente) perdeu a consciência, tendo ficado inanimado, no chão do piso térreo do edifício.
Como refere Raimundo Queirós in ob. Cit. pág. 322, ainda que reportado à eventual concorrência de culpas que «se o aluno menor tem capacidade para compreender o alcance dos seus actos, nomeadamente para entender o carácter negligente da sua conduta, não parece razoável que o centro de ensino responda de forma exclusiva.
Por todo o exposto e provando perfunctoriamente as requeridas a actuação do 3° requerente em desobediência às regras impostas, as quais visam essencialmente prevenir quaisquer danos como os ocorridos, entendemos que provaram as mesmas a culpa do mesmo, que numa atitude temerária galgou o corrimão, desobedecendo esta regra bem como a relativa à saída da sala de aula apenas com a autorização da professora, não podendo a requerida ter tido qualquer atitude que impedissem em concreto a actuação do menor.
Assim, excluímos também a existência de qualquer responsabilidade contratual que determinasse a obrigação de indemnizar, faltando o pressuposto essencial exigido nesta providência»

Com todo o respeito, não se acompanha o assim decidido, ao menos inteiramente.
Desde logo, e para além da eliminação, em sede de matéria de facto, da referência ao desrespeito, por parte do “B” de ordens de professores e auxiliares, julga-se que não releva para a apreciação do caso o comportamento que o mesmo teve na aula que precedeu o acidente, nem sequer o facto de ter saído da sala antes de a professora ter autorizado essa saída e a correr. Não se vendo que possa ser estabelecido nexo de causalidade entre essa saída da sala e a decisão do “B” de se fazer escorregar no corrimão da escada.
Depois, reconhecendo-se que o ora requerente “B” contribuiu culposamente para a verificação do acidente, sendo censurável o seu comportamento no caso, isso não basta para anular as exigências do dever de vigilância que, para a requerida Escola resultava do contrato de ensino.
No fundo é o ensinamento que se colhe do excerto da obra transcrito na decisão recorrida quando refere que: «se o aluno menor tem capacidade para compreender o alcance dos seus actos, nomeadamente para entender o carácter negligente da sua conduta, não parece razoável que o centro de ensino responda de forma exclusiva». Ou seja, a existência de responsabilidade/culpa do menor, sujeito ao dever de vigilância, na produção do acidente de que foi vítima, não exclui, por si só, a existência de responsabilidade da pessoa obrigada à vigilância. Apenas dará lugar a uma limitação desta responsabilidade, de resto nos termos gerais do art. 570.º do Código Civil.
E, no caso, estando em causa uma criança de dez anos, inserida numa turma de alunos dessa mesma idade, tendo em consideração as dinâmicas de grupo numa tal situação, e o apelo exercido nessa idade por um corrimão que pode ser escorregado, julga-se que era exigível à Escola que tivesse adoptado uma qualquer medida que obstasse a essa utilização.
É certo que o edifício da escola foi construído especificamente para esse fim no ano de 1961, que o mesmo não viola qualquer regra construtiva e que, estando em utilização desde o ano de 1962, nunca antes ali tinha acontecido um acidente com as características deste. Mas era à Escola que incumbia garantir condições de segurança às crianças que a frequentavam, não podendo, nessa perspectiva, deixar de considerar a possibilidade de as guardas de escada, tendo condições para esse fim, virem a ser utilizadas como escorrega, por crianças de dez anos. Não sendo necessário ocorrer um acidente para se perceber a existência dessa possibilidade.
Que, em alternativa, menos eficaz e muito mais dispendiosa, exigia a efectiva vigilância das crianças na sua movimentação na zona das referidas escadas, de modo a impedir comportamentos como o do “B”. E não havia ninguém a vigiar, facto que, não constando do elenco da matéria de facto indiciariamente provada, resulta, ainda assim, da posição assumida pela 1.ª requerida, e resultou claro da prova produzida.
E também resultou indiciariamente da prova produzida que o corrimão da escada era utilizado, ao menos no seu lanço inferior, como escorrega e que o próprio “B” já teria sido impedido por seguranças/vigilantes de fazer essa utilização, uma ou duas vezes. O que também deveria ter alertado os responsáveis pela vigilância em relação a esse risco. Posto que, como referiu a testemunha “F”, nestas idades as crianças fazem coisas de que não estamos à espera. Ou, como declarou a testemunha “G”, directora de turma do “B”, “Naturalmente são crianças, pode-nos escapar alguma situação, …, mas eles sabem que há regras muito apertadas e que têm de as cumprir”. E, mais adiante: “ … e depois são crianças e nós temos de ir contando com alguma situação, algum percalço que possa acontecer.”
Ou seja, apresentando o corrimão, que encima a guarda da escada, condições para ser utilizado por escorrega, e estando em causa crianças de dez anos, julga-se que o dever de vigilância que obrigava a Escola não pode ser considerado cumprido através da simples informação de que essa utilização era proibida, informação que, de resto, não se sabe se foi prestada. Era exigível à Escola que tomasse em consideração a possibilidade dessa utilização vir a acontecer.
Como acabou por tomar após o acidente. E se o “B” era mais irrequieto do que o comum dos seus colegas, mais se justificaria a sua vigilância.
Concluindo-se, assim, que a 1.ª Requerida não cumpriu adequadamente o seu dever de vigilância e de protecção que para ela decorrida do contrato de ensino.
Nos termos do art. 799.º do C. Civil, esse incumprimento presume-se culposo.
E esse incumprimento contribuiu para a verificação do acidente. Que não teria acontecido se o corrimão não fosse apto a ser utilizado como escorrega, ou se estivesse um vigilante no local.
Respondendo, assim, esta requerida pela ocorrência do acidente e pelos danos dele resultantes para o “B”.

Mas, nos termos já sugeridos, a verificação do acidente também se deve, em boa medida, ao comportamento temerário do “B”, tal como o mesmo resulta da matéria de facto indiciariamente provada. A quem era exigível outro comportamento, apesar de ter apenas dez anos de idade.
De facto, não estando limitado na sua capacidades de entendimento e determinação, salvo em função da idade, o “B” não ignorava que, ao fazer do corrimão escorrega, estava a assumir um comportamento não consentido pela Escola e que envolvia riscos. Já em momento anterior tinha sido impedido, por um vigilante, de fazer essa utilização do corrimão, desconhecendo-se qual o lanço do corrimão em que isso sucedeu; e, na ocasião dos autos, foi instado pelos colegas que o acompanhavam, que tinham a mesma idade e, supostamente, a mesma capacidade de discernimento, a não prosseguir e a descer do corrimão.
Para além dos alertas já recebidos, o “B”, mesmo tendo apenas dez anos, não podia ignorar que era perigoso escorregar pelo corrimão da escada, sobretudo daquela forma tão inusitada, de cabeça para baixo, e àquela altura do solo. Reafirmando-se que os seus colegas, da mesma idade, tentaram demovê-lo do seu propósito.
Assim, a culpa do “B” na verificação do acidente, que seria total em caso de maioridade, e muito próxima disso, nos últimos anos que a antecedem, apenas pode ser reduzida em função da sua menor idade, e da menor maturidade que lhe corresponde, que tem como contrapartida, o dever de vigilância a cargo da Escola. Havendo que fixar a medida dessa culpa de modo a que, como acima foi referido, a Escola não responda de forma exclusiva, por danos que a que o lesado também deu causa.
Parecendo seguro que esta imputação de culpa ao menor não viola qualquer regra ou princípio constitucional, designadamente o direito das crianças à protecção da sociedade e do Estado. Pois que, no caso, está apenas em causa definir a responsabilidade da Escola pelo acidente sofrido pelo “B” e isso não contende com o conteúdo do direito constitucional das crianças à protecção da sociedade e do Estado. Direito que não vincula particularmente a Escola, para além dos limites que já resultam do contrato celebrado e das normas legais que lhe são aplicáveis, e que não interfere com a definição da responsabilidade fundada no incumprimento do contrato de ensino.
Em causa está, sempre e apenas, a aplicação das regras de responsabilidade civil, em particular o preceituado no art. 570.º deste Código, onde se estabelece que, quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.
Não é fácil fazer essa avaliação, sobretudo dada a escassez de informação relevante para esse efeito. A culpa do menor há-de ser apreciada em abstracto, aplicando o critério enunciado no art. 487.º, n.º 2 do C. Civil, adaptado à idade da criança, ou seja, considerando o comportamento previsível numa “boa criança de dez anos” naquelas circunstâncias.
Assim, e na falta de melhores elementos, haverá que ponderar que o “B”, em desenvolvimento progressivo das sua maturidade, se presume imputável desde os sete anos de idade, mostrando-se decorridos, à data do acidente, três anos sobre o início dessa imputabilidade presumida. E ainda que a lei também presume um elevado grau de imputabilidade a partir da idade de dezasseis anos, quando atribui imputabilidade criminal, bem mais exigente do que a civil, para além de que, a partir desta idade pode ser atingido o pleno exercício de direitos através da emancipação, obtida por efeito do casamento. Podendo ainda presumir-se que, entre esses dois limites, o desenvolvimento da maturidade se faz progressivamente, verificando-se, em cada momento, um grau de maturidade proporcional à parcela já decorrida do período total que, nos termos referidos, a lei presume necessário para o completo amadurecimento.
Assim sendo, pensando apenas em termos de presunções não ilididas, julga-se ser de fixar em 30% a culpa do “B” na produção do acidente de que foi vítima. E que deve ser limitada, nessa mesma medida a indemnização pelos danos resultantes do acidente, nos termos do art. 570.º do C. Civil.

B - A responsabilidade da Seguradora
(……………)
C - A impossibilidade de os requerentes fazerem face às necessidades do 3.º requerente resultantes do acidente.
Está agora em causa saber se deve ser julgada indiciariamente verificada uma situação de necessidade em consequência dos danos sofridos, justificativa da atribuição de uma reparação provisória, nos termos do art. 403.º o CPC em vigor à data da decisão, ou do art. 388.º do CPC agora em vigor, em particular do n.º 2 de qualquer dos preceitos. E, na afirmativa, fixar essa prestação.

Com interesse para a apreciação desta questão estão indiciariamente assentes os seguintes factos:

- A Escola frequentada pelo Requerente “B” não dispõe de soluções adequadas ao seu acompanhamento, de forma a assegurar as actividades e a ajuda que a sua situação requer e que são imprescindíveis à manutenção dos ganhos obtidos com a reabilitação, inexistindo qualquer oferta pública de actividades necessárias ao seu desenvolvimento e ocupação."
- O 3° Requerente vive com a Requerente Mãe (a 1a Requerente), e com a sua irmã “H”, nascida em .../1993, estudante universitária que frequenta o curso de Direito na Universidade Católica,, vivendo os mesmos naquela que era já a casa de morada de família à data do acidente supra descrito;
- A 1 a Requerente é Secretária de Direcção, auferindo cerca de 1.669€ líquidos mensais;
- A irmã do 3º Requerente é economicamente dependente da Requerente Mãe.
- A Requerente Mãe apenas conta com o auxílio dos seus pais para fazer face às despesas mensais.
- O Requerente “B” não tem quaisquer rendimentos nem património.
- A 1ª Requerente suporta todos os gastos fixos com o 3º Requerente, designadamente terapeuta que diariamente o acompanha, actividades, transportes, fraldas, medicamentos, equipamentos e dieta especial.
- O encargo mensal com a terapeuta do “B” é de, pelo menos, €1.000,00.
- A frequência, em regime diurno, de estabelecimento especializado, do tipo da «Quinta Essência», incluindo transporte, tem um custo mensal de cerca € 1840,00.

Ora bem, nos termos dos factos assim indiciariamente provados mostra-se justificada a necessidade, fundada no acidente dos autos, de o requerente “B” passar a frequentar um estabelecimento especializado, do tipo da «Quinta Essência», com o custo mensal incluindo transporte, de cerca € 1840,00.
Para além de que continuará a necessitar de apoio permanente, nos períodos em que não vai estar aos cuidados do estabelecimento, incluindo durante a noite, continuando a justificar-se um acompanhamento minimamente especializado, e sempre difícil, de terceira pessoa, que a mãe do “B” não pode assegurar sozinha. Não só porque as suas capacidades são, naturalmente, limitadas. Mas também porque lhe deve ser reconhecido o direito a vida própria, para além de trabalhar e de cuidar do filho.
Considera-se, assim suficientemente justificada a despesa invocada pelos requerentes, correspondente a metade do custo com o auxílio de terceira pessoa, ajustando-a ao montante indiciariamente provado desse custo. Ou seja, mostra-se justificado, a esse título, o custo mensal de € 500,00.
E, atentas todas as limitações que o “B” apresenta, designadamente em termos de mobilidade e de necessidade de cuidados médicos, também se mostra justificado o acréscimo de € 100,00 com a assistência médica e medicamentosa, que vem invocado pelos requerentes.
Considerando-se, assim, suficientemente justificado, em relação às despesas invocadas pelos requerentes nos presentes, o montante mensal de € 2.440,00. Que, não esgota as despesas acrescidas do “B” directamente imputáveis ao acidente dos autos e às lesões nele sofridas.
Da matéria de facto indiciariamente provada acima transcrita também resulta que os requerentes não têm capacidade financeira para fazer face ao acréscimo de despesas originado pelo acidente. Os rendimentos conhecidos são claramente insuficientes, estando indiciariamente provado que agregado familiar do requerente “B”, integrado, para além do próprio, pela mãe e pela irmã, apenas dispõe do rendimento do trabalho da mãe, no montante de cerca de 1.669,00 € líquidos mensais. Que é manifestamente insuficiente para fazer face às despesas acrescidas do “B”.
Mostrando-se, assim, justificada a fixação provisória de uma prestação destinada a fazer face a esse acréscimo de despesas resultante do acidente, que o rendimento do agregado familiar do requerente “B” não comporta.
Nos termos acima concluídos em relação à responsabilidade pela verificação do acidente, esse acréscimo de despesas deve ser imputado na proporção de 70%, equivalente a € 1708,00, à requerida Associação. Desconsiderando-se os restantes 30%, imputáveis, nos termos do art. 570.º do C. Civil, ao próprio lesado.
A requerida Seguradora acompanha a responsabilidade da sua segurada, respondendo as duas solidariamente pelo pagamento da prestação. Que, nos termos do art. 386.º, n.º 1 do CPC aplicável, ex vi art. 389.º do mesmo Código, é devida desde o primeiro dia do mês subsequente à data da dedução do pedido.
Os montantes que forem satisfeitos serão imputados na indemnização que vier a ser arbitrada na acção principal, ficando sujeitos a restituição nos termos do art. 390.º do CPC, caso a presente providência venha a caducar.

Nos termos expostos, procedem parcialmente as conclusões do recurso.

Termos em que acordam em julgar parcialmente procedente a apelação, revogando a decisão recorrida, e em julgar parcialmente procedente a providência de arbitramento de reparação provisória do dano, condenando-se as requeridas a satisfazerem, solidariamente, ao requerente “B”, a esse título, a quantia mensal de € 1708,00, desde o primeiro dia do mês subsequente à data da dedução do pedido.
Custas, em ambas as instâncias, por requerentes e requeridas, na proporção do respectivo decaimento, a atender na acção principal, e sem prejuízo do apoio judiciário de que os requerentes beneficiam – art. 539.º do CPC.

Lisboa, 06-02-2014

Farinha Alves
Tibério Silva
Ezagüy Martins
Decisão Texto Integral: