Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
342/2003-7
Relator: PROENÇA FOUTO
Descritores: MARCAS
REGISTO NACIONAL DE PESSOAS COLECTIVAS
CONFUSÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/06/2003
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA.
Sumário: A falta de comunicação da sociedade titular de marca ao RNPC não a impede de obter a tutela do seu direito de exclusividade, por via de acção de anulação de denominações ou firmas confundíveis com registo anterior.
Marca notória é aquela que é geralmente conhecida e reconhecida por todos aqueles que estão mais em contacto com o produto por ela assinalado. Marca de prestígio é aquela que goza de elevado grau de notoriedade no conjunto da população do país.
A denominação social “Nails R Us”, relativa a empresa que se dedica a actividades na área de estética, beleza e saúde é susceptível de confusão com a marca “Toys R Us”, destinada a assinalar produtos de cosmética.
Decisão Texto Integral: 1. A intentou acção declarativa com processo ordinário contra Nails R Us, Instituto de Beleza e Saúde, Lda., pedindo a anulação da sua denominação social e o cancelamento da respectiva matrícula e inscrições na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa e no Registo Nacional de Pessoas Colectivas bem como os registos lavrados em quaisquer outros serviços e se condene a abster-se de, na sua actividade comercial, utilizar a expressão “NAILS R US” ou outra qualquer que inclua a expressão “R US” ou que com esta se confunda, como sinal distintivo, quer como denominação social, quer como logótipo, insígnia ou marca, por existir confundibilidade entre as marcas da Autora e a denominação social da Ré e incorrer em concorrência desleal com violação do disposto nos artigos 5º, nº3 e 207º, do Código de Propriedade Industrial.
Em defesa a Ré alega que não há risco de confusão entre a sua denominação social e as marcas da Autora e se inverificam situações de concorrência desleal.
O M.mo Juiz proferiu saneador-sentença em que julgou a acção improcedente, absolvendo a Ré dos pedidos.
Inconformada a Autora apelou desta decisão assim concluindo a sua alegação:
1.ª A douta sentença recorrida é nula, por força do disposto no nº 2 do artigo 660º e no nº 4 do artigo 668º, ambos do CPC, por falta de pronúncia sobre a invocada concorrência desleal praticada pela Recorrida;
2.ª O direito de o titular de uma marca anterior pedir a anulação de uma denominação social posterior que com aquela se confunde não está condicionado à prévia comunicação da marca ao RNPC.
3.ª O nº 6 do artigo 33º do RNPC apenas faz depender da prévia prova do direito no RNPC o direito de o seu titular impugnar, em sede administrativa, a decisão que admita uma denominação social que com ela conflitue.
4.ª Os produtos e serviços assinalados pelas marcas da Recorrente, em especial os “cosméticos e preparações para limpeza” e os serviços de comercialização de “produtos auxiliares da saúde e da beleza” para crianças, são semelhantes ao objecto social da Recorrida.
5.ª O sinal da Recorrente “TOYS “ß” US” é, nos seus aspectos gráfico, fonético e conceptual, semelhante à expressão “NAILS R US” da denominação social da Recorrida, que constitui a sua parte característica, com ela se confundindo.
6.ª A adopção, pela Recorrida, da denominação contendo a parte característica “NAILS R US” gera confusão junto dos consumidores, induzindo-os em erro sobre a titularidade dos sinais distintivos em confronto.
7.ª O público consumidor, perante a semelhança dos sinais, corre o risco de associar as marcas da Recorrente à organização empresarial da Recorrida, julgando existir entre ambas laços de natureza económica, jurídica ou organizativa.
8.ª A marca “TOYS “ß” US” da Recorrente é uma marca notória na área da comercialização de brinquedos.
9.ª A notoriedade da marca da Recorrente agrava o risco de confusão com o sinal da Recorrida.
10.ª A marca da Recorrente é, ainda, uma marca de grande prestígio.
11.ª Os autos não contêm ainda elementos suficientes para se poder decidir com segurança sobre o estatuto de marca de grande prestígio da marca da Recorrente, nos termos do disposto no artigo 191º do CPI, estatuto esse importante para a decisão da causa por potenciar o risco de confusão.
12.ª A Recorrida, com a adopção da sua denominação social contendo a parte característica “NAILS R US”, pratica concorrência desleal, tal como caracterizada no artigo 260º do CPI, na modalidade de concorrência parasitária.
Termos em que se deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta sentença recorrida. Em consequência deverão os pedidos formulados na acção ser julgados procedentes, condenando-se a Recorrida nos seus precisos termos.
Houve contra-alegações.

2.A) A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:
1 – A R. Nails R Us – Instituto de Beleza e Saúde, Lda., pessoa colectiva nº 504 964 879, com sede no Shopping Colombo, loja 515, Colégio Militar, freguesia de Benfica, em Lisboa, encontra-se matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o nº 10930 (doc. fls. 58 a 61 e 21 e 22).
2 – Tem por objecto social o exercício de actividade na área da estética, beleza e saúde, nomeadamente a aplicação e manutenção de unhas artificiais, bem como todas as actividades que lhe são próprias ou afins (doc. fls. 58 a 61 e 21 e 22).
3 – A R. poderá ainda “...comercializar, importar, exportar e produzir todo o tipo de produtos relacionados com o seu objecto social, podendo ainda, no âmbito do mesmo, ser responsável por cursos de formação.” (doc. de fls. 21 e 22).
4 – A A. é titular do registo de marca nacional nº 224.438 “TOYS “ß”, US”, pedido em 20/03/1984 e concedido por despacho datado de 19/04/1989, destinada a assinalar produtos da classe 28ª “Jogos e brinquedos” (doc. fls. 23 a 25).
5 – A A. é titular do registo de marca nacional nº 224.439 “TOYS “ß”, US”, pedido em 20/03/1984 e concedido por despacho datado de 18/04/1989, destinada a assinalar serviços da classe 42ª “Serviços prestados em armazéns de venda a retalho” (doc. fls. 26 a 28).
6 – A A. é titular do registo de marca nacional nº 224.440 “KIDS “ß”, US”, pedido em 20/03/1984 e concedido por despacho datado de 19/04/1989, destinada a assinalar produtos da classe 25ª “Artigos de Vestuário” (doc. fls. 29 a 31).
7 – A A. é titular do registo de marca nacional nº 224.441 “KIDS “ß”, US”, pedido em 20/03/1984 e concedido por despacho datado de 19/04/1989, destinada a assinalar produtos da classe 28ª “Brinquedos” (doc. fls. 32 a 34).
8 – A A. é titular do registo de marca nacional nº 270.275 “TOYS “ß”, US”, pedido em 31/12/1990 e concedido por despacho datado de 29/01/1993, destinada a assinalar produtos da classe 3ª “Cosméticos e preparações para limpeza” (doc. fls. 35 e 36).
9 – A A. é titular do registo de marca nacional nº 270.278 “TOYS “ß”, US”, pedido em 31/12/1990 e concedido por despacho datado de 29/01/1993, destinada a assinalar produtos da classe 25ª “Vestuário” (doc. fls. 37 e 38).
10 – A A. é titular do registo de marca nacional mista nº 271.117 “TOYS “ß”, US”, pedido em 25/02/1991 e concedido por despacho datado de 10/02/1993, destinada a assinalar produtos da classe 25ª “Vestuário” (doc. fls. 39 e 40).
11 – A A. é titular do registo de marca nacional nº 284.427 “PARTIES “ß”, US”, pedido em 13/07/1992 e concedido por despacho datado de 15/03/1994, destinada a assinalar produtos da classe 28ª “Brindes para festas (jogos e brinquedos)” (doc. fls. 41 e 42).
12 – A R. publicita os seus serviços mediante o uso, em posição de destaque, da expressão “Nails r’ us”.
13 – Existem cerca de 1450 lojas de venda a retalho, em 27 países, com o nome Toys “R” Us pertencentes ao grupo empresarial de que faz parte a A. ou operadas por empresas em regime de franchising.
14 – As quais efectuam vendas anuais de onze mil milhões de dólares norte-americanos.
15 – As marcas da A., incluindo a expressão “R” Us têm sido objecto de investimento e publicidade nos EUA e no estrangeiro num valor de cem milhões de dólares anuais.
16 – Em Portugal encontram-se instaladas lojas Toys “R” Us em Lisboa, Porto e Braga, respectivamente nos Centros Comerciais Colombo, Cascais Shopping, Carrefour de Telheiras e de Braga, Hipercontinente de Vila Nova de Gaia e Norteshopping, abrangendo espaços amplos.
17 – As lojas Toys “R” Us são uma cadeia de lojas de distribuição de brinquedos conhecida e cujo nome se associa a um serviço de qualidade desde que foi aberta a 1ª loja, em 1993.
18 – A marca Toys “R” Us adquiriu em Portugal reputação no sector da distribuição de brinquedos junto do público consumidor dos centros urbanos.
19 – A R. tem a sua sede e estabelecimento no Shopping Colombo, onde a A. tem igualmente uma loja.

B) O Direito
São as seguintes as questões a dilucidar:
a) Da nulidade da al. d) do nº 1 do artigo 668º do C.P.Civil;
b) Da necessidade da comunicação aos serviços do RNPC;
c) Marca prestígio / marca notória;
d) Da confundibilidade entre as marcas da Autora e a denominação social da Ré

1ª Questão – nulidade da al. d) do nº 1 do artigo 668º do C.P.Civil
Inexiste qualquer omissão na decisão recorrida na óptica de que esta concluiu pela inconfundibilidade entre as marcas da Autora e a denominação – firma da Ré, o que prejudicava o conhecimento da questão de existência da concorrência desleal que tem como pressuposto essencial a confundibilidade de tais distintivos comerciais.
É que não havendo susceptibilidade de determinar erro ou confusão é um “non sens” falar em concorrência desleal, pois esta, como refere Jorge Paul, requer uma conduta praticada em concorrência mas contrária às normas e usos honestos de determinado ramo de actividade económica (Concorrência Desleal, pags. 92 e 93) – a lei não protege a concorrência na generalidade abstraindo da susceptibilidade de erro ou confusão (assim decidiu o Ac. S.T.J. de 15.02.00, C.J. 2000, 1, pags. 99/100).
Improcede, pois, a arguida nulidade.

2ª Questão – comunicação ao R.N.P.C.
“Prima facie” neste recurso está apenas em causa a protecção da propriedade industrial e não a admissibilidade de certo sinal distintivo – no caso, as marcas da Autora.
E a falta de comunicação da sociedade titular das marcas ao RNPC não impede esta de obter a tutela do seu direito à exclusividade por via de acção de anulação de denominações sociais ou firmas confundíveis com registo posterior, assim o determina o artigo 5º, nº 3 do C.P.Industrial – hoc sensu, Carlos Olavo, Propriedade Industrial, pag. 139.
Por outro lado, se bem que o Registo Nacional de Pessoas Colectivas possa declarar a perda do direito ao uso exclusivo da firma ou denominação – artigo 6º, nº 3, por determinação do artigo 79º, ambos do Dec. Lei nº 42/89, de 3.2 –, tal declaração não prevalece sobre decisão judicial.
Como acentua o Ac. S.T.J. de 13.02.96 (BMJ nº 454, pags. 748/749) “é a própria lei que faz o cruzamento da protecção dos vários sinais distintivos, mas fá-lo na parte que agora importa considerar para decurso do caso sub-júdice, usando um conceito indeterminado de tempo... não refere a lei quando é o apontado momento oportuno (cfr. artigo 5º, nº 3, do CPI) e há que atentar no artigo 6º, nºs 1, 2 e 3 do Dec. Lei nº 42/89.
O contrário – a preclusão do direito a intentar acção de anulação do direito à exclusividade do sinal distintivo – iria levar a uma “sanção” desproporcionada e conferir pouco valor ao registo da marca, como que estabelecendo uma duplicidade do registo desta”.
Aludindo a um parecer junto pelos Prof.or Oliveira Ascensão e Dr. P. Nunes de Carvalho escreve-se que o alcance que se poderá surpreender ao mencionado prazo é o de dever o titular do direito privativo, para obter a tutela do seu direito realizar previamente essa comunicação ao Registo Nacional de Pessoas Colectivas.
Mas sempre tendo presente que o efeito impeditivo do registo de firma confundível se consolida logo com o pedido de registo da marca e não depende de nenhuma prioridade de inscrição ou notificação ao Registo Nacional de Pessoas Colectivas.
Com efeito, a exigência de comunicação ao RNPC, feita no nº 6 do artigo 2º do Dec. Lei nº 42/89, de 3.2 (e mantida, actualmente, pelo nº 6 do artigo 33º do regime aprovado pelo Dec. Lei nº 129/98, de 13.5) não foi revogada pelo artigo 5º, nº 3, do Código de Propriedade Industrial – destinam-se ambos os normativos à exclusão de firmas confundíveis com marcas anteriormente registadas (cfr. Ac. S.T.J. de 26.01.99, BMJ nº 483, 242).
Assim o fundamento da decisão, no que concerne, não pode valer.
3ª Questão – marca prestígio / marca notória
A marca notória é, segundo Pinto Coelho (RLJ ano 84º, pags. 129 e ss.) a marca que adquiriu um tal renome que se tornou geralmente conhecida por todos aqueles, produtores, comerciantes ou eventuais consumidores, que estão mais em contacto com o produto, e como tal reconhecida.
Como nota o Ac. S.T.J. de 04.02.00 (BMJ nº 496) “a notoriedade da marca agrava o risco de confusão, uma vez que uma marca notória deixa na memória do público consumidor uma lembrança persistente e tentadora”.
Escreveu Carlos Olavo (estudo publicado na C.J. 1987, 2, pags. 21 e ss.) que “(...) a marca concretiza a boa ou má reputação comercial do empresário, uma vez que é uma forma de indicação de proveniência do produto ou serviço. O poder sugestivo da marca reconduzir-se-á, pois, às regras que visam proteger a actividade de determinado empresário (...).
Sendo assim, a protecção do poder sugestivo da marca há-de ser encontrada no âmbito das normas que disciplinam a leal concorrência entre comerciantes (...)”.
O Ac. S.T.J. de 12.10.99 (BMJ nº 490, pag. 280) subscrevendo o aresto do mesmo tribunal de 27.05.99 escreve que a marca de grande prestígio “deve tratar-se de marca gozando de elevado grau de notoriedade junto do público, supernotória”.
Essa supernotoriedade deve afirmar-se com referência ao conjunto da população do país e não só dos seus consumidores (diferentemente do que ocorre com as marcas notórias).
A jurisprudência alemã exige mesmo um grau de conhecimento de 80 % de toda a população.
Goza de protecção para lá do que é considerado o âmbito de protecção concedido pelo princípio da especialidade, quer dizer, abrange mesmo produtos e serviços não semelhantes, nem afins, para protecção da sua reputação que, no espírito do público, se encontra associada a certa proveniência (cfr. Ac. S.T.J. de 30.01.01, C.J. 2001, I, pag. 89).
No concreto, atento a matéria apurada e o atrás tecido, ao arrepio da tese da apelante, a marca “TOYS ß US” é marca notória, mas não marca de grande prestígio (artigo 191º do CPI), pelo que a sua protecção se insere no disposto no artigo 190º, nº 1, do mesmo diploma legal.

4ª Questão – confundibilidade entre as marcas e a denominação social
Segundo o Ac. S.T.J. de 14.06.95 (C.J. 1995, 2, 130) o juízo sobre a distinção (de firmas, denominações ou marcas) assenta nos seguintes princípios:
– na existência de semelhanças ou dissemelhanças entre as duas expressões que constituem as firmas, denominações ou marcas;
– em apurar se, em face dessas semelhanças ou dissemelhanças uma delas deve ou não considerar-se susceptível de confusão ou erro com a outra.
E vem-se entendendo igualmente que para se saber se existe essa susceptibilidade releva mais a semelhança que pode resultar dos elementos de uma marca (firma ou denominação) do que da dissemelhança de certos pormenores, sendo por intuição sintética e não por dissecação analítica que deve proceder-se à necessária comparação.
Por último, num aspecto fundamental, a questão das marcas é diferente da questão das firmas e denominações sociais: é que enquanto aquelas podem ser – e são-no geralmente – constituídas por um sinal ou conjunto de sinais, figurativos ou emblemáticos que podem não ter significado indicativo do produto que marcam, a firma ou denominação devem dar indicações verdadeiras sobre a natureza e, eventualmente, sobre as actividades do seu titular.
Firma e marca são sinais distintivos comerciais diferentes.
A marca pode ser definida em termos gerais, como o sinal distintivo que serve para identificar o produto proposto ao consumidor (Carlos Olavo, Propriedade Industrial – Noções Fundamentais, C.J. 1987, 2, 20).
A firma é o nome ou designação que identifica o comerciante na sua actividade comercial (Brito Correia, Direito Comercial, 1989, I, pag. 236).
Tal não impede que sejam susceptíveis de confusão, quando não pertençam ao mesmo interessado (cfr. Ac. Rel. C.ª de 04.01.83, C.J. 1983, 1, 21).
No caso sub-júdice a actividade da Ré reporta-se às áreas da estética, beleza e saúde, relevando na aplicação e manutenção de unhas artificiais.
Por sua vez, as marcas da Autora, a nacional nº 270275 TOYS “ß” US assinala “cosméticos e preparações para limpeza” e a marca comunitária nº400929 TOY “ß” US destina-se à comercialização de “produtos auxiliares de saúde e da beleza”.
Há uma manifesta afinidade entre “cosméticos e preparações para limpeza” e serviços de comercialização de “produtos auxiliares de saúde e da beleza” assinalados pelas marcas e a “estética, beleza e saúde” na composição da firma – denominação.
O elemento dominante “ß US” das marcas da Autora e denominação social da Ré, é idêntico, nos seus aspectos gráfico, fonético e conceptual, confundindo-se. A anterioridade do registo das marcas não vem questionada.
No que respeita ao confronto entre os sinais distintivos, numa impressão de conjunto o elemento preponderante das marcas e da firma - denominação é a expressão “R Us”, já que o vocábulo “Nails” (unhas) tem natureza descritiva (sinal descritivo do produto sem valor distintivo) – componente que se reporta ao objecto da sociedade da Ré – tal como o elemento TOYS (brinquedos) da marca a dever excluir-se do juízo sobre a confundibilidade (cfr. Ferrer Correia, Direito Comercial, I, pag. 330).
Donde a designação de fantasia “R US” pertence ao núcleo da firma - denominação e das marcas em causa e reveste carácter distintivo individual.
Exigindo a lei (artigo 10º, nº 4, do C.S.C.) que a firma seja completamente distinta, sendo idêntico o acento tónico (o elemento forte) de quaisquer dos sinais em confronto (“R US”) e havendo proximidade ou afinidade entre as actividades das duas empresas é de concluir que viola frontalmente o princípio da exclusividade, possibilitando-se a confusão não se cifrando apenas na susceptibilidade de tomar uma instituição por outra, entre a firma - denominação com a gama das marcas da Autora compostas pelo símbolo “R US”, mas também, levando a supor no consumidor médio que pertencem ao mesmo grupo económico e, portanto, beneficiar do seu prestígio.
E gozando a marca obstativa de notoriedade (artº 190º, nº1, do C.P.I), tal reforça a sua capacidade distintiva, havendo o risco de associação – confusão em sentido lato.
E neste conspecto é fundamento de recusa do registo da firma - denomi-nação da Ré, nos termos dos artigos 5º, nº3, e 189º, nº1, als. f) e m) do CPI.
E reproduzindo a firma a parte característica das marcas em apreço, havendo uma relação de concorrência esta é ampliada no caso do conflito ocorrer entre a marca e a firma - denominação social, em virtude do carácter potencialmente mais versátil e abrangente destes sinais em comparação com os do nome e insígnia (cfr. Couto Gonçalves, Direito das Marcas, pag. 129).
E não se argumente que o elemento comum “R US” é expressão de uso corrente.
Nogueira Serens (BFDC, “Estudos em homenagem ao Prof. Eduardo Correia, pag. 90), refere que tais indicações são “as que se tiverem tornado usuais na linguagem corrente (os chamados “sinais francos”, na terminologia alemã).
E como acentua o Ac. S.T.J. de 29.10.98 (BMJ nº480, pag. 505) o vocábulo de uso corrente significa palavra que se emprega com tanta frequência e pela generalidade das pessoas que acabou por cair na rotina.
Ora é manifesto que o termo “R US” não é vocábulo que a pessoa comum use com frequência. É sim um elemento prevalente, comum entre os sinais em causa, susceptível de protecção em si mesmo e de induzir em erro ou provocar confusão nas pessoas, que podem pensar que entre Autora e Ré há relações económicas.
E se assim não o entendesse a Ré, porque razão usa na composição da firma - denominação a expressão “R US”!!! Significa tão só o reconhecimento do valor deste sinal parcial, que já está implantado no mercado – havendo inequívoco risco de associação.
E, doutra parte, há concorrência desleal.
O artigo 212º do CPI dispõe que “constitui concorrência desleal todo o acto de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade económica”.
Jorge Paul (Concorrência Desleal, pag. 35) escreve que “para poder falar-se de concorrência é essencial que sejam idênticas ou afins as actividades económicas prosseguidas pelos dois ou mais empresários”. Também neste sentido Carlos Olavo, ob. cit., pag. 154.
Ora, como vimos, as empresas em confronto dedicam-se a actividades económicas afins.
E a Ré apropriando-se do sinal prevalente das marcas da Autora e procedendo à venda de produtos concorrentes no mesmo espaço (Centro Comercial Colombo) não é honesto.
E assim, não pode manter-se tal registo da firma da Ré Nails R Us, já que a lei não dá cobertura à concorrência desleal (cfr. artigo 260º corpo e als. a) e c) do CPI).

3. Termos em que se revoga a decisão recorrida e, julgando a acção procedente, anula-se a denominação social Nails R Us – Instituto de Beleza e Saúde, Lda., bem como se ordena o cancelamento da respectiva matrícula e inscrições na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa e no Registo Nacional de Pessoas Colectivas, bem como em quaisquer outros serviços nos quais os registos estejam lavrados; e condena-se a Ré a abster-se de, na sua actividade comercial, utilizar a expressão “NAILS R US” ou outra qualquer que inclua “R US” ou que com esta se confunda, como sinal distintivo, quer como denominação social, quer como logótipo, insígnia ou marca.
Custas pela Ré.
Lisboa 6 de Maio 2003

Proença Fouto
Vasconcelos Rodrigues
Roque Nogueira