Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | RAMALHO PINTO | ||
Descritores: | IMPUGNAÇÃO MATÉRIA DE FACTO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/18/2005 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
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Sumário: | I- O Tribunal da Relação, em regra e no âmbito dos recursos de contra-ordenação, apenas conhece de direito. II- Constituem excepções a esta regra as que constam do art. 410º, nº 2 do CPP, ou sejam: a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; e o erro notório na apreciação da prova». III- Tais vícios da matéria de facto têm de resultar do texto da decisão recorrida e sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos não sendo admissível, designadamente, o recurso a declarações ou depoimentos exarados no processo, e não podendo basear-se em documentos juntos ao processo. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: O IDICT/IGT, Delegação do Barreiro, na sequência de auto de notícia levantado aos vinte e dois dias de Janeiro de 2003, aplicou a “J.F. Pereira, Ldª” a coima única de € 8.000,00, por ter considerado que esta cometeu, para além de outras, infracção ao disposto no art. 5º, nº3 do D.L 155/95, de 1 de Julho, a que corresponde, em abstracto, a coima de € 2.493,99 a € 13.467,54, sendo que, por tal infracção, a autoridade administrativa aplicou a coima de € 4.000,00. A arguida impugnou judicialmente tal decisão da autoridade administrativa, dela interpondo recurso para o Tribunal do Trabalho do Barreiro, que, para além de julgar extinto, por prescrição, o procedimento contra-ordenacional relativamente às restantes, confirmou aquela decisão no que à infracção supra-referida diz respeito. Com tal juízo se não conformou a arguida, interpondo recurso para esta Instância, cuja motivação concluiu assim: 41º -Existiram erros na apreciação da prova, por parte do tribunal esse que conduziu à injusta condenação da arguida. 42º -O recurso pode ter como fundamentos, erro notório na apreciação da prova, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum. 43º - Foi considerado pelo tribunal recorrido como facto provado "que à data da inspecção encontravam-se no exercício da sua actividade, cuja totalidade dos trabalhos lhe haviam sido adjudicados, por orçamento, à empresa arguida ..." 44º- No entanto, é de salientar que em nenhuma parte do processo se consegue fazer a prova de foi a arguida a única empreiteira que efectuou os trabalhos de remodelação e ampliação de um pavilhão de pintura. 45º- O nº 3 do artigo 5º do Decreto-Lei no 155/95 de 1/7 deve-se apenas aplicar nos casos em que o dono da obra não necessita de nomear um coordenador em matéria de segurança. 46º -Ora nos presentes autos não há nenhum elemento que permita concluir com clareza porque é que a arguida foi acusada de não ter nomeado um director de obra. 47º -Conforme se pode verificar pelo contrato de empreitada junto aos autos, jamais é referido que a totalidade dos trabalhos necessários à execução do pavilhão de pintura serão efectuados pela arguida. 48º - Ora se à arguida não foram adjudicados todos os trabalhos, não lhe compete a ela nomear um responsável em matéria de segurança. 49º -Carece pois de fundamento, a aplicação da coima de 4.000 euros pois, como já foi referido, à arguida não lhe compete a ela nomear um responsável em matéria de segurança e saúde. 50º Apesar de não haver indícios suficientes da prática da infracção por parte da arguida, o tribunal não hesitou em condená-Ia. 51º - Nem sequer vislumbrou a possibilidade de aplicar ao presente caso o principio in dubio pro reo, que consiste designadamente na absolvição dos arguidos em caso de dúvida. 52º -Sem prescindir, sempre se dirá que, de acordo com a legislação actualmente em vigor, Lei nº 99/2003 de 27/8, mais favorável à arguida, a dimensão das empresas determina-se apenas com base no volume de negócios, 53º -Ora, na ausência da entrega do mapa com os quadros do pessoal, deverá fazer-se uma interpretação por analogia, no sentido serem outros documentos oficiais da empresa que possuam a informação do volume de negócios, para a determinar a sua dimensão. 54º -Pelos elementos contabilísticos que a arguida entregou nas finanças, referente ao exercício de 2002 (Cft. doc. no 3 junto com recurso de impugnação judicial), poderá verificar-se que no Relatório e Contas consta que o volume de negócios em 2002 ascendeu a 59.659,85 € que o volume de negócios no ano de 2001 ascendeu a 94.039,35 €. 55º- Assim resulta perfeitamente claro que o volume de negócios da arguida no ano de 2001 foi de 94.039,35 €. (Cft. doc. nº 3 junto com recurso de impugnação judicial). 56º Logo, a ser aplicada à arguida alguma coima, esta deverá sê-lo com base no acima referido volume de negócios, 57º - Nos termos da al. a) do nº 4 do artigo 620º do Código do Trabalho aprovado pela Lei no 99/2003 de 27/8, os limites das coimas correspondentes às infracções muito graves, têm os seguintes valores "Se praticadas por empresas com volume de negócios inferior a € 500.000,00, de 20 UC 40 UC em caso de negligência... " 58º -Resulta na prática que o valor da coima a aplicar à arguida pode variar entre 1.780,00 € e 3.560,00 €. 59º -Atendendo a todas as circunstâncias, o tribunal recorrido aplicou uma coima que excede o máximo legal. 60º - Como circunstância atenuante, é importante referir que, nunca anteriormente foi aplicada à arguida, qualquer coima relativamente a contra –ordenações laborais. 61º Por último é de referir que a arguida não tirou qualquer benefício da prática da presente contra-ordenação. 62º - Pelo que estando em causa uma coima que pode variar entre 1.780,00 € e 3.560,00 €, não lhe pode ser aplicada uma coima de 4.000,00 €, por exceder o máximo legal. 63º - O mínimo legal já satisfazia as exigências quanto à prevenção geral e especial que o caso exige. Respondeu o MºP, concluindo no sentido da infundada argumentação da recorrente, com a consequente manutenção do julgado. Foram colhidos os vistos legais. x Vem assente a seguinte factualidade: 1-No dia 22 de Fevereiro de 2002, pelas 11 horas e 30 minutos, foi efectuada pelo Sr. Inspector autuante uma visita inspectiva na Rua da Indústria - Sete Portais -2830-237 Barreiro (situada nas instalações industriais da empresa Fabrequipa); 2-Tratava-se de uma obra, aquando da visita de inspecção, de remodelação e ampliação de um pavilhão de pintura; 3- Na referida construção era dona da obra a empresa “Fabrequipa-Sociedade Industrial de Equipamento Rodoviário, Lda”; 4- A empresa arguida era empreiteira na referida construção; 5-À data da inspecção no local identificado no ponto 1, encontravam-se no exercício da sua actividade, cuja totalidade dos trabalhos lhe haviam sido adjudicados, por orçamento, à empresa arguida, quatro trabalhadores: ... 6- A arguida não nomeou nenhum Director de Obra para fiscalizar e controlar a implementação da segurança colectiva e individual adequada; 7- A empresa arguida não comunicou aos serviços do IDICT, no prazo de vinte e quatro horas, a ocorrência do acidente de trabalho com o seu empregado Carlos Ferreira, só tendo aqueles serviços conhecimento do mesmo passados oito dias após a sua ocorrência e por terem sido informados pela PSP-Divisão do Barreiro; 8-A escada de acesso ao telhado, na obra, não obedecia a qualquer sistema de segurança ; 9- O andaime instalado junto à parede frontal do pavilhão não possuía sistema de acesso conveniente, encontrando-se os trabalhadores a exercer a sua actividade a cerca de oito metros de altura, sendo obrigados a “trepar” pelas estrutura do andaime para aceder ao seu local de trabalho; 10- O mesmo andaime não possuía guarda corpos e as tábuas de pé, que deviam perfazer a largura de 72 cm, eram constituídas apenas por uma prancha com 30 cm de largura, situação que, agravada pela falta dos guarda-corpos, constituía uma situação de risco grave e iminente; 11-Existía o risco iminente de queda em altura para os trabalhadores em obra; 12- Tais irregularidades constituíam risco grave para a vida e saúde dos trabalhadores, uma vez que os trabalhos eram efectuados a grandes alturas; 13- A arguida iniciou a sua actividade em Setembro de 1987, nunca tendo, à data da prática dos factos, entregue qualquer Mapa do Quadro de Pessoal, tendo ao seu serviço, à data da visita inspectiva seis trabalhadores; 14- No ano de 2002, a arguida teve ao seu serviço três trabalhadores; 15- Em 2002, o volume de negócios da arguida foi de € 59.659,85. x Cumpre apreciar e decidir. Lembrando que esta Instância conhece apenas de direito, por via de regra, e que o “thema decidendum” se nos apresenta delimitado pelas conclusões da respectiva motivação, avancemos para a abordagem e tratamento das questões que se perfilham: - se a arguida cometeu a contra-ordenação pela qual foi condenada. - se se mostra legal e adequado o montante da coima. x a) -se se verifica a contra-ordenação imputada à arguida: A decisão de 1ª instância considerou extinto, por prescrição, o procedimento contra-ordenacional relativamente às restantes infracções pela qual a arguida foi condenada pelo IDICT, decisão essa que não foi objecto de recurso. Assim sendo, o objecto do presente recurso limita-se a apurar se a arguida cometeu a identificada infracção ao disposto no artº 5º, nº 3, do D.L. nº 155/95, de 1 de Julho. Que dispõe: “Para a execução da obra, quando não for necessária a nomeação de coordenador em matéria de segurança e saúde, nos termos do número anterior, o empregador deve designar um director de obra”. A recorrente entende, em primeiro lugar, que houve erro notório na apreciação da prova e que não violou tal disposição legal, dado que no processo não foi feita a prova de que foi ela a única empreiteira que efectuou os trabalhos de remodelação e ampliação do pavilhão em causa. Sem razão, todavia. O Tribunal da Relação, em regra e no âmbito dos recursos de contra-ordenação, apenas conhece de direito por força do disposto no art. 75º-1 do DL nº 433/82 de 27/10. Como se decidiu no Ac. desta Relação de 19/5/2004, disponível em www.dgsi.pt, “constituem excepções a esta regra as que constam do art. 410º, nº 22-3 do CPP, aplicável ex-vi dos arts. 41º-1 e 74º-4 do DL nº 433/82 de 27/10 (actualizado pelo DL nº 244/95 de 14/9). Ora nos termos do art. 410º-2 do CPP «Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; b) A contradição insanável da fundamentação; c) Erro notório na apreciação da prova». Têm tais vícios da matéria de facto, deste modo, de resultar do texto da decisão recorrida e sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos (v. Ac. do STJ de 31/1/90, BMJ-393º, pag. 333; Ac. do STJ de 20/6/90, Col. STJ, 1990, T. 3, pag. 22; Ac. do STJ de 11/6/92, BMJ-418º, pag. 478; Ac. do STJ de 8/1/97, BMJ-463º, pag. 189; Ac. do STJ de 5/3/97, BMJ-465º, pag. 407; Ac. do STJ de 9/4/97, BMJ-466º, pag. 392; Ac. do STJ de 17/12/97, BMJ-472º, pag. 407; Ac. do STJ de 27/1/98, BMJ-473º, pag. 148; Ac. do STJ de 10/2/98, BMJ-474º, pag. 351; e Ac. do STJ de 9/12/98, BMJ-482º, pag. 68)- não sendo admissível, designadamente, o recurso a declarações ou depoimento exarados no processo (v. Ac. do STJ de 19/12/90, BMJ-402º, pag. 232) e não podendo basear-se em documentos juntos ao processo (v. Ac. Rel. de Coimbra de 5/2/97, BMJ-464º, pag. 627). Os vícios da matéria de facto em referência não podem, designadamente, ser confundidos com uma divergência entre a convicção alcançada pelo recorrente sobre a prova produzida em audiência e aquela convicção que, nos termos do art. 127º do CPP e com respeito, designadamente, pelo disposto no art. 125º do CPP, o Tribunal a quo alcançou sobre os factos. Como se escreveu no Ac. do STJ de 9/12/98, acima citado, «quando o recorrente pretende contrapor a convicção que ele próprio alcançou sobre os factos à convicção que o tribunal colectivo ou de júri teve sobre os mesmos factos, livremente apreciada segundo as regras da experiência, e invocar como vício a alínea a) do nº 2 do art. 410º do CPP, está a confundir insuficiência da matéria de facto com insuficiência da prova para decidir, sendo a sua convicção irrelevante». O vício consubstanciado na insuficiência da matéria de facto provada, previsto no art. 410-2-a) do CPP diz respeito a insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito. Ensina ainda a propósito o Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, ed. Verbo, 2000, III Vol., pag. 339 e 340, que «É necessário que a matéria de facto dada como provada não permita uma decisão de direito, necessitando de ser completada. Antes de mais, é necessário que a insuficiência exista internamente, dentro da própria sentença ou acórdão. Para se verificar este fundamento, é necessário que a matéria de facto se apresente como insuficiente para a decisão que deveria ter sido proferida por se verificar lacuna no apuramento da matéria de facto necessária para uma decisão de direito. A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada não tem nada a ver com a eventual insuficiência da prova para a decisão de facto proferida". No sentido de tal vício só poder ser considerado como evidente quando os factos provados forem insuficientes para justificar a decisão de direito, veja-se o Ac. do STJ de 9/4/97, BMJ-466º, pag. 392; Ac. do STJ de 3/11/99, BMJ-491º, pag. 173 e o Ac. do STJ de 17/2/2000, BMJ-494º, pag. 227». No que ao erro notório na apreciação da prova concerne, o Prof. Germano Marques da Silva, obra citada, pag. 340, 341 e notas, esclarece que «é o erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido a comum dos observadores, ou seja, quando o homem de formação média facilmente dele se dá conta». Já quanto à contradição insanável da fundamentação, ou entre a fundamentação e a decisão, o mesmo insigne Professor, a pags. 341 e 342 da mesma obra, ensina que «a contradição na fundamentação distingue-se ante de mais da falta de fundamentação…» e respeita «antes de mais à matéria de facto, mas pode respeitar também à contradição na própria matéria de facto (fundamento da decisão de direito)», podendo existir contradição insanável «não só entre os factos dados como provados mas também entre os dados como provados e os não provados, como entre a fundamentação probatória da matéria de facto”. No caso concreto, a recorrente não invoca qualquer dos fundamentos previstos no nº 2 do art. 410º do CPP ou a ocorrência de nulidade, nos termos do nº 3 do mesmo artigo, verificando-se que apenas pretende fazer vingar convicção diversa da obtida pela Mmª Juíza a quo sobre os mesmos factos e em face dos mesmos elementos probatórios. Daí que não se possa falar do invocado “erro notório na apreciação da prova”. Por outro lado, e como a mesma arguida salienta no ponto 45º das suas conclusões, o nº 3 do artº 5º do D.L. nº 155/95 deve-se apenas aplicar nos casos em que o dono da obra não necessita de nomear um coordenador em matéria de segurança. Dos autos não resulta essa necessidade. Por outro lado, e contrariamente ao defendido pela recorrente, ficou provado que esta era a única empreiteira da obra em questão. Com efeito, no ponto 5º da matéria dada como provada pela 1ª instância refere-se, expressamente que “à data da inspecção no local identificado no ponto 1, encontravam-se no exercício da sua actividade, cuja totalidade dos trabalhos lhe haviam sido adjudicados, por orçamento, à empresa arguida, quatro trabalhadores…”. Isto foi o que ficou provado, sem margem para qualquer tipo de dúvidas, quanto à exclusividade da arguida no que tocava à execução da obra. Ou seja, o que a recorrente pretende é a alteração da matéria de facto, de forma a se concluir pela não prática da infracção. Só que, como se disse e nos termos do nº 1 do artº 75º do Dec-Lei 433/82, de 27/10, a Relação apenas conhece da matéria de direito, pelo que, e mesmo que fosse o caso, não poderia alterar a matéria de facto dada como provada pela 1ª instância. E por tal factualidade, dada como provada, integrar o ilícito contra-ordenacional pelo qual a arguida foi condenada, improcedem, nesta parte, as conclusões do recurso. b) -o montante da coima: Pretende a arguida ver reduzido o montante da coima, dado que será de aplicar o disposto no artº 620º, nº 4, al. a), do Código do Trabalho, por ser o regime mais favorável, sendo que entende que logrou provar que o seu volume de negócios foi, em 2001, de € 94.039,35. Assim, a medida abstracta da coima é de 20 UC’s a 40 UC’s, sendo este limite máximo inferior à coima concreta aplicada. Sem razão, mais uma vez. Ao tempo da prática da infracção, vigorava a Lei nº 116/99, de 4/8 (RGCOL). Como se refere na sentença, a infracção deve ser imputada à arguida a título de negligência, já que nada ficou provado que permita concluir por uma actuação dolosa. A arguida iniciou a sua actividade em Setembro de 1987, nunca tendo, à data da prática dos factos, entregue qualquer Mapa do Quadro de Pessoal, tendo ao seu serviço, à data da visita inspectiva seis trabalhadores -ponto 13º dos factos provados. Em 2002, o volume de negócios da arguida foi de € 59.659,85 - ponto 15º. Nos termos do artº 9º, al. b), do RGCOL, deve ser considerada pequena empresa aquela que “a que empregar menos de 5 trabalhadores e tiver um volume de negócios igual ou superior a € 498.797,90 e inferior a € 2.493.989,49 ou empregar até 49 trabalhadores e tiver um volume de negócios inferior a € 2.493.989,49”. Por sua vez, no nº 2 desse artº 9º estabelece-se que para “efeitos do número anterior, o número de trabalhadores é reportado ao mês de Outubro do ano civil anterior, constante do quadro de pessoal, e o volume de negócios é o verificado no ano civil anterior”. Daí a correcta qualificação, a que chegou o IDICT e a Mª Juíza, da arguida, para efeitos da determinação da medida da coima- artº 7º, como “pequena empresa”. Assim, a infracção é, na qualidade de contra-ordenação muito grave, punida com coima de € 2.493,99 a € 13.467,54, conforme estipulado na al. b) do º 4 desse artº 7º daquele último diploma, conjugado com a al. b) do artº 9º e com o artº 10º. Entretanto entrou em vigor, em 1 de Dezembro de 2003, e com excepção de algumas normas (cfr. artº 3º da Lei nº 99/2003, de 27/8), o Código do Trabalho, o qual, entre outros diplomas, revogou expressamente a Lei nº 116/99, de 4/8. Nos termos do artº 615º do Cod. Trabalho, as “contra-ordenações laborais são reguladas pelo disposto neste Código, e subsidiariamente, pelo regime geral das contra-ordenações”. Regime esse que continua a ser o do DL nº 433/82, de 27/10, o qual, no seu artº 3º, na redacção introduzida pelo DL nº 244/95, de 14/9, dispõe: Aplicação no tempo 1. A punição da contra-ordenação é determinada pela lei vigente no momento da prática do facto ou do preenchimento dos pressupostos de que depende. 2. Se a lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido, salvo se este já tiver sido condenado por decisão definitiva ou transitada em julgado e já executada. E há que optar, em caso de regime de sucessão das leis penais, pela aplicação em bloco, tese sustentada no Ac. do STJ de 15/2/89 (BMJ 387, 163), quando defende que "(...) não se pode escolher de cada uma das leis os preceitos isolados que forem mais favoráveis ao agente, mas há que aplicar uma só lei, prescrevendo um conjunto normativo (bloco) definidor do regime do instituto ou infracção. Assim, não é licito construir regimes particulares pela conjugação de elementos retirados de uma e outra lei, com o perigo da quebra de coerência e a obtenção de um resultado aberrante, ainda que concretamente vantajoso para o agente”. Mantendo-se em vigor o citado DL 155/95, temos que, quanto à medida da coima, vale, no âmbito de aplicação da medida abstracta da mesma, o disposto no artº 620º, o qual, no seu nº 1, faz depender, no caso de se tratar de uma empresa, os limites das coimas do volume de negócios da mesma e do grau de culpa. Reportando-se o volume de negócios ao ano civil anterior ao da prática da infracção- nº 5. Pretende a recorrente que lhe devem ser aplicados os limites estabelecidos na al. a) do nº 4 desse artº 620º- 20 a 40 UC’s, por, no seu entender, ter ficado provado que teve, em 2001, um volume de negócios de € 94.039,35. A este respeito, a sentença deu unicamente como provado que a arguida teve, em 2002, um volume de negócios de € 59.659,85, nada dando como provado relativamente a 2001. Sem embargo da regra, supra-referida, de que a Relação apenas conhece de direito, dir-se-á que não estranha tal atitude da 1ª instância, dado que o único documento que a arguida apresentou (juntamente com a impugnação judicial) foi o relatório e contas do exercício de 2002, onde se faz uma breve referência, e entre parêntesis, ao volume de negócios do ano anterior, o que era manifestamente insuficiente em ordem a fazer a correspondente prova. Assim sendo, não tendo a empresa indicado o volume de negócios (através do mapa do quadro de pessoal ou por outra via fidedigna- cfr. João Soares Ribeiro, Contra-Ordenações Laborais, 2ª edição, pags. 238-239) vale o disposto no nº 8 do citado artº 620º do Cod. do Trabalho que dispõe que sempre que “o empregador não indique o volume de negócios aplicam-se os limites previstos para as empresas com volume de negócios igual ou superior a 10.000.000 de euros”. Limites esses, em caso de negligência, de 90 a 300 UC’s. Como tal, verifica-se que da aplicação do Código do Trabalho não resulta uma situação jurídica mais favorável à arguida. E dizendo-nos o art.º 18.º, n.º1, do DL. n.º 433/82, que “a determinação da coima faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da contra-ordenação”, parece-nos manifestamente adequada a medida concreta da coima aplicada (que até se apresenta bastante abaixo do meio da moldura abstractamente aplicável), tendo em vista, como bem se refere na sentença “os interesses tutelados pela norma violada, a gravidade da infracção, a culpa e o comportamento da arguida nos autos”. Não esquecendo que estamos perante uma infracção com particular gravidade, que contende com interesses de ordem pública, ligados à observância das necessárias regras de segurança. Pelo que improcedem, na sua totalidade, as conclusões do recurso. x Decisão: Nesta conformidade, acorda-se em negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença impugnada. Custas pela recorrente, com 5 (cinco) UC’s de taxa de justiça. Lisboa 18/05/05 Ramalho Pinto Duro Mateus Cardoso Sarmento Botelho |