Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | VAZ GOMES | ||
Descritores: | DOMICÍLIO CARTÃO DE CIDADÃO CITAÇÃO DOCUMENTO AUTÊNTICO EXECUÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/18/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Parcial: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I- O cartão de cidadão é título bastante para provar a identidade do cidadão, é esse o valor probatório do cartão de cidadão; sendo esse o valor probatório do cartão do cidadão não se vê que os elementos visíveis dele ou os ocultos no circuito integrado, no caso particular a morada, que o cidadão livremente (sem que seja confirmada ou verificada por qualquer entidade pública), indica ao preencher o formulário com vista à sua emissão, possa ter um valor probatório diferente, ou seja o cartão em causa e o seu elemento oculto em circuito integrado, não constituem prova legal plena da residência efectiva do executado, para efeitos do artº 347 do CCiv que só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela é objecto. A morada do bilhete de identidade é a residência para efeitos de contacto com os serviços do Estado, mas não impede o requerente do bilhete de identidade de indicar outros endereços para fins profissionais ou convencionais. II- A lei 7/07 não diz que a morada ou endereço indicado coincide com o conceito de domicílio voluntário geral de residência habitual, ocasional, ou o lugar onde se encontre efectivamente tal como vem definido no art.º 82 do Cciv, ou sequer com algum dos conceitos de domicílio legal dos art.ºs 85 a 88. Criou o legislador, digamos, um conceito novo de domicílio legal que não consta do Código Civil, para efeitos de “comunicação com o Estado e serviços de Administração Pública” que se baseia numa presunção de residência. Acontece que esse conceito de domicílio legal para efeitos de comunicação com o Estado e Serviços de Administração Pública e que é a morada do cartão de cidadão não coincide com o conceito de residência para efeitos de citação por via postal (art.º 236) ou de residência efectiva do n.º 1 do art.º 240, relativo à citação com hora certa. III- Não transparecendo da Lei 7/07 que tenha havido revogação expressa do disposto no art.º 240 do C.P.C., não resultando daquela Lei sequer uma revogação implícita deste preceito legal, não é possível uma interpretação extensiva daquele art.º 13 da Lei 7/07 por forma a considerar que, independentemente do domicílio convencionado do art.º 237-A, da residência habitual, ocasional, circunstancial ou efectiva do cidadão a citar, a citação do Réu ou do Executado em processo judicial se tenha por efectivada, independentemente de saber se o mesmo reside noutro local, no domicílio livremente escolhido pelo mesmo aquando do preenchimento do formulário com vista à obtenção do cidadão entretanto obtido. Deste modo, inexiste uma presunção legal de domicílio legal para efeitos de citação decorrente daquele art.º 13 da Lei 7/07 que o Autor ou Exequente tenha de ilidir, nos termos do art.º 344/1 do CCiv. IV- A informação que o Agente de Execução dá ao Tribunal em complemento da certidão de citação relativamente à sua actuação para a citação com hora certa do Executado deve considerar-se complemento da certidão de citação e por conseguinte também certificada, ou seja quer a certidão quer a informação ao juiz de factos por ele Agente de Execução praticados com base na sua própria percepção constituem documento autêntico nos termos e para os efeitos do art.º 371, cuja validade só pode ser ilidida com base na sua falsidade que até pode ser oficiosamente conhecida se for evidente em face dos sinais exteriores do documento (art.ºs 371, 372/2 e 3 do Cciv). V- Não sendo evidente a falsidade, essa prova, quer a da falsidade do exarado, quer da inexactidão do exarado cabe à Executada. (Sumário do Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | Acordam os juízes na 2.ª secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa I – RELATÓRIO APELANTE/EXECUTADO: “A” (Representado em juízo pelo ilustre advogado …, com escritório em Lisboa, como dos autos consta). * APELADO/EXEQUENTE: BANCO “B” (Portugal), S.A. (Representado em juízo, entre outros, pelo ilustre advogada…, com escritório em Lisboa, conforme instrumento de procuração de fls.149 dos autos) * Com os sinais dos autos. I.1. Inconformado com a decisão de 13/11/2012 que, conhecendo do incidente de nulidade de citação por si suscitado em 5/3/2012, e, em consequência, o julgou improcedente, dela apelou o executado em cujas alegações conclui: (…). I.2. O Ministério Público secunda a decisão em suma sustentando que o executado produziu prova suficiente para que se coloque em dúvida que na data da sua citação para a acção executiva, a sua morada fosse efectivamente a indicada pelo exequente no requerimento inicial e que este tinha a obrigação de saber que a residência poderia não ser na morada que indicou mas sim na Rua de ..., 59, fracção E, A..., Cascais, uma vez que as partes haviam celebrado a 7/11/08 (clª do documento complementar) e a 20/3/2010 2 contratos de mútuo com hipoteca nos quais o recorrente havia indicado a referida Morada da Rua de ..., sendo que o agente de execução nas pesquisas electrónicas prévia e subsequentes que efectuou às bases de dados tinha obtido a morada da Rua de ... 59 quer a da Segurança Social quer a dose Serviços de Identificação Civil, sendo que mais tarde a Secretaria efectuou também pesquisa a esta base e deparou-se com esta nova morada. I.3. Em contra-alegações a exequente conclui: A) Desde logo se diz que, a sentença do Tribunal a quo não padece de omissão de pronúncia!! B) Logo no Acórdão da Relação de Coimbra, de 28 de setembro de 2011, processo n.º 480/09.9JALRA.C1, se expõe que “o que importa é que o tribunal decida a questão colocada e não que tenha que apreciar todos os fundamentos ou razões que foram invocados para suporte dessa pretensão”. C) A nulidade da sentença, por falta de fundamentação, só ocorre quando tal falta for total. D) E só há nulidade, por omissão de pronúncia, quando o tribunal não conheça de questões que devesse apreciar, e não também quando omita o tratamento de razões ou argumentos esgrimidos pelas partes. E) No caso em apreço, a questão sobre a qual o Tribunal de 1.ª Instância tinha de se pronunciar era a validade ou não da citação do Executado. F) Assim, concluindo o Tribunal a quo pela validade da citação, não cometeu o Tribunal omissão de pronúncia (vide ainda o Acórdão da Relação de Lisboa, de 20 de dezembro de 2010, processo n.º 1650/10.2TBOER-A.L1-1). G) Considera-se o Executado validamente citado porque é do conhecimento do administrador do prédio e, inclusivamente do próprio Exequente e do Agente de Execução que efetivamente o Executado tem residência na Rua ..., tendo este sido considerado citado e notificado de todas as diligências processuais nesta mesma morada. H) Porquanto, foram cumpridos todos os requisitos legais!!! I) O Agente de Execução apurou que efetivamente o Executado reside no local onde foi citado. J) Nos termos do art. 240.º, n.º1, do C.P.C. apurando que o citando reside no local indicado, não podendo, todavia, proceder à citação por não o encontrar, deixará nota com indicação de hora certa para a diligência na pessoa encontrada que estiver em condições de a transmitir ao citando. K) Nos termos do n.º2, no dia e hora designados, o solicitador ou o funcionário fará a citação na pessoa do citando, se o encontrar; não o encontrando, a citação é feita na pessoa capaz que esteja em melhores condições de a transmitir ao citando, incumbindo-a o solicitador ou o funcionário de transmitir o ato ao destinatário e sendo a certidão assinada por quem recebeu a citação; pode, neste caso, a citação ser feita nos termos do n.º 6 do art. 239.º. L) Nos termos do n.º 3, não sendo possível obter a colaboração de terceiros a citação é feita mediante afixação, no local mais adequado e na presença de duas testemunhas, da nota de citação, com indicação dos elementos referidos no art. 235.º, declarando-se que o duplicado e os documentos anexos ficam à disposição do citando na secretaria judicial. M) Nos termos do n.º 5 considera-se pessoal a citação efetuada nos termos dos n.ºs 2 e 3 deste artigo. N) Assim, no presente caso, frustrando-se a citação postal, procedeu-se à citação pessoal. O) Caso esta também se tivesse frustrado, aí é que era necessário efetuar-se diligências para obtenção de novas moradas (artigo 244.º do C.P.C.). P) Assim, vemos que, o Agente de Execução envia a citação postal para a morada indicada pelo Exequente no requerimento executivo, frustrando-se esta procede nessa mesma morada à citação por contacto pessoal. Q) Apenas no caso de não ser possível proceder à citação nestes termos, segundo o disposto no artigo 244.º, proceder-se-á a pesquisas junto das bases de dados a fim de apurar outra morada ou a fim de proceder à citação edital nos casos em que não se apura nova morada. R) Além de que, o Agente de Execução apurou que o Executado reside no ... também nunca houve qualquer comunicação do Executado ao Exequente onde fizesse menção à sua alteração de morada. S) Mais, a morada onde o Executado foi validamente citado é a morada também constante nas bases de dados das Finanças, logo é uma morada a que o Executado tem de ter alguma ligação. T) Salvo o devido respeito, entende o Exequente que o Executado “joga” com as moradas, a seu belo prazer, consoante o seu interesse, onde melhor lhe convém. U) Mais, sendo o imóvel sito na Rua ... da propriedade do Executado, também muito se surpreende o Exequente, que aquele desde 17 de setembro de 2010 (data do envio da carta de cobrança) até fevereiro de 2012, não se tenha deslocado ao imóvel e verificado a caixa de correio!!!!!!!!! V) Mais, a nota de citação tem assim a natureza de documento autêntico, tal como o tem uma escritura pública exarada por um notário, apesar de hoje as respetivas funções (do notário e do agente de execução), antes reservadas a um oficial público, serem exercidas por quem não tem essa qualidade, mas a quem a lei cometeu a mesma função e investiu nos mesmos poderes. W) Não foi arguida a falsidade do documento, pelo que, nos termos do art. 371.º do Código Civil a nota de citação faz prova plena dos factos atestados pelo Agente de Execução. X) Certo é que o Recorrente não indicou nem apresentou qualquer prova – vide Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 12-06-2012, processo n.º 209/11.1TBVRM-A.G1. Nesta conformidade e invocando o sempre mui douto suprimento de Vossas Excelências, deverá ser julgado improcedente o presente recurso, mantendo-se integralmente a sentença recorrida. I.4. Elaborado projecto de acórdão que aos Exmºs Juízes-Adjuntos foi enviado, via electrónica, tendo tido vistos nos autos nada sugeriram; nada obsta ao conhecimento do mérito. Questões a resolver: a) Saber se o despacho recorrido padece de nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e por omissão de pronúncia nos termos das alíneas b) e d) do art.º 668 do C.P.C.; b) Saber se o despacho recorrido incorre em erro na indagação da norma aplicável que é a do art.º 13/1 da Lei 7/07 de 5/2, segundo a qual a morada que releva é a indicada nos serviços de Identificação Civil pelos cidadãos e não a que consta do domicílio fiscal, presumindo-se assim o recorrente domiciliado na morada constante naquele serviço, que, sendo diferente da indicada no requerimento executivo, cabe ao Exequente ilidi-la, nos termos do art.º 344/1 do CCiv, o que não fez; saber se o art.º 240/1 do C.P:C. faz apelo a um requisito de certeza por parte do agente de execução relativamente a uma dada residência ou local de trabalho da pessoa a citar, impendendo sobre o Tribunal Recorrido o dever de oficiosamente aquiescer sobre a impossibilidade de tal certeza acerca da residência do Executado por parte do Agente de Execução, declarando o acto de citação com hora certa nulo nos termos dos art.ºs 194/a e 202 do CPC, pois por facto que ao executado não é imputável não teve conhecimento da tramitação da execução. II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Para além do despacho recorrido está ainda certificado nos autos:
III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO III.1. Conforme resulta do disposto nos art.ºs 660, n.º 2, 664, 684, n.º 3, 685-A, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539. III.2. Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto tal como enunciadas em I. III.3. Saber se o despacho recorrido padece de nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e por omissão de pronúncia nos termos das alíneas b) e d) do art.º 668 do C.P.C.; III.3.1. O art.º 668/1/b fere de nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto. “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou a mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.”[2] III.3.1.1E este entendimento tem vindo a ser sufragado pela jurisprudência do STJ, uniformemente: Acórdãos de 24/05/2003 in BMJ 327/663, de 05/01/1984 in BMJ 333/398, de 14/01/1993, in BMJ 423/519, entre outros; III.3.1.2. É certo que a decisão recorrida é bastante sucinta no tocante à motivação de facto e de direito o que faz com que a sujeite ao risco da de ser revogada como dizia o saudoso processualista, mas não produz nulidade por, ainda assim haver motivação. III.3.2. Ocorre a nulidade da sentença da alínea d) do n.º 1 do art.º 668 do CPC, na modalidade de omissão de pronúncia, quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar. III.3.3.O art.º 660, n.º 2 do CPC estatui que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. O art.º 668, n.º 1, alínea d) do CPC fulmina de nulidade processual a sentença que deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, e as questões são muito justamente aquelas que acima referimos. III.3.4. Grosso modo, o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a entender que questões para efeitos daquele preceito são os pontos fáctico jurídicos que estruturam ora a causa de pedir ora o pedido ora as excepções. III.3.5. Ainda que sem indicação de preceitos, normas disposições legais, o despacho recorrido pronuncia-se sobre a questão suscitada da nulidade da citação do executado, ainda que não exaurindo todos os argumentos esgrimidos sem que essa falta constitua nulidade como tem vindo a ser entendido pelo Supremo Tribunal de Justiça. III.4. Saber se o despacho recorrido incorre em erro na indagação da norma aplicável que é a do art.º 13/1 da Lei 7/07 de 5/2, segundo a qual a morada que releva é a indicada nos serviços de Identificação Civil pelos cidadãos e não a que consta do domicílio fiscal, presumindo-se assim o recorrente domiciliado na morada constante naquele serviço, que, sendo diferente da indicada no requerimento executivo, cabe ao Exequente ilidi-la, nos termos do art.º 344/1 do CCiv, o que não fez; saber se o art.º 240/1 do C.P.C. faz apelo a um requisito de certeza por parte do agente de execução relativamente a uma dada residência ou local de trabalho da pessoa a citar, impendendo sobre o Tribunal Recorrido o dever de oficiosamente aquiescer sobre a impossibilidade de tal certeza acerca da residência do Executado por parte do Agente de Execução, declarando o acto de citação com hora certa nulo nos termos dos art.ºs 194/a e 202 do CPC, pois por facto que ao executado não é imputável não teve conhecimento da tramitação da execução. II.4.1. A citação é o acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e se chama ao processo para se defender (art.º 228/1); a citação é pessoal quando é feita mediante transmissão electrónica de dados nos termos do art.º 138-A, mediante a entrega de carta registada com aviso de recepção, seu depósito nos termos do n.º 5 do art.º 237-A, certificação de recusa de recebimento nos termos do n.º 3 do art.º 237-A ou contacto pessoal do solicitador de execução ou do funcionário judicial com o citando ou ainda mediante mandatário judicial nos termos do art.º 245 e 246 (art.º 233, n.ºs 1 2, 3), equiparando-se a esta a citação feita em pessoa diversa do citando, com encargo de transmitir presumindo-se que o citando dela teve conhecimento (n.º 4); para além da citação pessoal existe a modalidade de citação edital que tem lugar quando o citando se encontre ausente em parte incerta nos termos do art.º 244 e 248 ou quando sejam incertas as pessoas a citar ao abrigo do art.º 251 (n.º6 do art.º 253) III.4.2. No caso concreto os títulos executivos são escrituras de mútuo com hipoteca sobre determinados imóveis pertença do executado, celebradas entre o exequente e o executado em que o executado se obriga a reembolsar o exequente das respectivas quantias mutuadas. Nos termos do art.º 812-F/2/c (redacção do DL 226/08 de 20/11), com redacção muito parecida à do 812/7/c a citação é previamente efectuada sem necessidade de despacho liminar quando a execução se funde em título extrajudicial de empréstimo contraído para aquisição de habitação própria hipotecada com garantia, que é precisamente o caso dos autos e foi efectuado pelo senhor solicitador de execução. Terá sido tentada a citação postal em vão, para a morada da Rua ..., Bloco C, R/C Esq., ...; que era essa a morada indicada na escritura de mútuo com hipoteca de 22/6/07 e que se encontra a fls. 66 e ss deste apenso e acompanhou a execução, não há dúvida; também não há dúvida de que essa é a informação constante da Direcção-Geral dos Impostos como resulta da certidão de fls. 177. Foi aí que o solicitador de Execução realizou a citação com hora certa, nos termos dos art.ºs 239 e 240, que no caso concreto foi com afixação da nota da citação nos termos do art.º 240/3 que por força do n.º 5 é considerada citação pessoal. Sustenta o recorrente que o seu domicílio não é aí, antes na Rua ... ..., Cascais, pois foi essa a morada que o senhor solicitador de execução pesquisou em 22/11/2010 pelas 16:23 nos Serviços de Identificação Civil e posteriormente em 2/3/2012, já após a adjudicação do bens imóveis penhorados e vendidos por abertura de propostas em carta fechada no dia 3/2/2012 e mesmo já em 29/10/2012 pela Secretaria do Tribunal, deles resultando que é essa a morada do executado desde 11/4/2008, e que o que ocorre é que não houve actualização de morada como o impõe o art.º 19/6 da LGT e 13 da Lei 7/07 de 5/2. III.4.2. Dispõe o art.º 4 da Lei 7/07: Artigo 4.o Eficácia O cartão de cidadão constitui título bastante para provar a identidade do titular perante quaisquer autoridades e entidades públicas ou privadas, sendo válido em todo o território nacional, sem prejuízo da eficácia extraterritorial reconhecida por normas comunitárias, por convenções internacionais e por normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais de que Portugal seja parte, quando tal se encontre estabelecido nos respectivos tratados constitutivos. O art.º 8.º Artigo 8.o Informação contida no circuito integrado 1—O cartão de cidadão incorpora um circuito integrado onde são inseridos, em condições que garantam elevados níveis de segurança, os seguintes elementos de identificação do titular: a) Os referidos no n.o 1 do artigo anterior, com excepção da alínea i); b) Morada; c)(…); d) (…) e) (…) f) (…) O art.º 13 por seu turno: Artigo 13.o Morada 1—A morada é o endereço postal físico, livremente indicado pelo cidadão, correspondente ao local de residência onde pode ser regularmente contactado. 2—Para comunicação com os serviços do Estado e da Administração Pública, nomeadamente com os serviços de identificação civil, os serviços fiscais, os serviços de saúde e os serviços da segurança social, o cidadão tem-se por domiciliado, para todos os efeitos legais, no local referido no número anterior, sem prejuízo de poder designar outros endereços, físicos ou electrónicos, para fins profissionais ou convencionais nos termos previstos na lei. 3—O titular do cartão de cidadão deve comunicar novo endereço postal e promover, junto de serviços de recepção, a actualização da morada no cartão de cidadão logo que deixe de ser possível o seu contacto regular no local anteriormente indicado. 4—Carece de autorização do titular, a efectivar mediante inserção prévia do código pessoal (PIN), o acesso à informação sobre a morada arquivada no circuito integrado do cartão de cidadão, sem prejuízo do acesso directo das autoridades judiciárias e das entidades policiais para conferência da identidade do cidadão no exercício das competências previstas na lei. O art.º 19/1 da L.G.T. (Lei Geral Tributária), estatui que o domicílio fiscal do sujeito passivo é, salvo, disposição em contrário para as pessoas singulares o local da residência habitual; o n.º 6 dispõe que a “administração tributária poderá rectificar oficiosamente o domicílio fiscal dos sujeitos passivos se tal decorrer dos elementos ao seu dispor.” Ainda o art.º 82 do CCiv: n.º1: “A pessoa tem domicílio no lugar da sua residência habitual; se residir alternadamente em diversos lugares, tem-se por domiciliada em qualquer deles.”; n.º 2: “Na falta de residência habitual, considera-se domiciliada no lugar da sua residência ocasional ou, se esta não puder ser determinada, no lugar onde se encontrar.” E o art.º 84: ´”É permitido estipular domicílio particular, para determinados negócios, contanto que a estipulação seja reduzida a escrito.” III.4.3. Já se vê da Lei 7/07 que o cartão de cidadão é título bastante para provar a identidade do cidadão, é esse o valor probatório do cartão de cidadão; sendo esse o valor probatório do cartão do cidadão não se vê que os elementos visíveis dele ou os ocultos no circuito integrado, no caso particular a morada, que o cidadão livremente (sem que seja confirmada ou verificada por qualquer entidade pública), indica ao preencher o formulário com vista à sua emissão, possa ter um valor probatório diferente, ou seja o cartão em causa e o seu elemento oculto em circuito integrado, não constituem prova legal plena da residência efectiva do executado, para efeitos do artº 347 do CCiv que só possa ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeira o facto que dela é objecto. A morada do bilhete de identidade é a residência para efeitos de contacto com os serviços do Estado, mas não impede o requerente do bilhete de identidade de indicar outros endereços para fins profissionais ou convencionais. A lei não diz que a morada ou endereço indicado coincide com o conceito de domicílio voluntário geral de residência habitual, ocasional, ou o lugar onde se encontre efectivamente tal como vem definido no art.º 82 do Cciv, ou sequer com algum dos conceitos de domicílio legal dos art.ºs 85 a 88. Criou o legislador, digamos, um conceito novo de domicílio legal que não consta do Código Civil, para efeitos de “comunicação com o Estado e serviços de Administração Pública” que se baseia numa presunção de residência. Acontece que esse conceito de domicílio legal para efeitos de comunicação com o Estado e Serviços de Administração Pública e que é a morada do cartão de cidadão não coincide com o conceito de residência para efeitos de citação por via postal (art.º 236) ou de residência efectiva do n.º 1 do art.º 240, relativo à citação com hora certa. Não transparecendo da Lei 7/07 que tenha havido revogação expressa do disposto no art.º 240, não resultando daquela Lei sequer uma revogação implícita deste preceito legal, pelo que não é possível uma interpretação extensiva daquele art.º 13 da Lei 7/07 por forma a considerar que independentemente do domicílio convencionado do art.º 237-A, da residência habitual, ocasional, circunstancial ou efectiva do cidadão a citar, a citação do Réu ou do Executado em processo judicial se tenha por efectivada, independentemente de saber se o mesmo reside noutro local, no domicílio livremente escolhido pelo mesmo aquando do preenchimento do formulário com vista à obtenção do cidadão entretanto obtido. Deste modo, inexiste uma presunção legal de domicílio legal para efeitos de citação decorrente daquele art.º 13 da Lei 7/07 que o Autor ou Exequente tenha de ilidir, nos termos do art.º 344/1 do CCiv. III.4.4. O Exequente, no seu requerimento executivo indicou o Executado como morando na Rua ..., Bloco C correspondente àquela que veio indicada na escritura de 2007; na escritura de 7/11/08 e que está a fls. 108 e ss, que é uma escritura de venda de “D” ao Executado da fracção autónoma de prédio urbano sito na A..., ..., ..., destinado à habitação (muito posterior à data do requerimento do Executado junto dos Serviços de Identificação Civil onde consta a morada de A... Cascais com outra Rua) e também com intervenção do Banco ora Exequente que lhe mutua 400.000 Euros para efeitos dessa aquisição com garantia de hipoteca, o Executado aparece como residente na Rua ..., Bloco C, r/c esquerdo, ..., e como a morada é elemento oculto do cartão de cidadão essa indicação só pode ter resultado da declaração do próprio Executado. Na cláusula 19.ª do documento complementar a esse contrato consta que “todos os avisos e comunicações entre as partes serão efectuados por meio de carta endereçada para o seguinte endereço, presumindo-se a sua recepção no terceiro dia posterior à data do envio “Rua de ..., n.º 59, fracção E, A..., Cascais”. Por último no mútuo com hipoteca de 30/3/2010 mediante o qual a Exequente concede ao Executado um empréstimo de 20 mil euros com hipoteca consta o Executado como residente na Rua ..., 59B, ..., freguesia e concelho de Cascais (cl.ª 2.ª) constando na clª 17.ª do documento complementar: ““todos os avisos e comunicações entre as partes serão efectuados por meio de carta endereçada para o seguinte endereço, presumindo-se a sua recepção no terceiro dia posterior à data do envio “Rua de ..., n.º 59, fracção E, A..., Cascais”. As cláusulas 19.ª e 17.ª destes documentos complementares coincidem no endereço, mas esse endereço não coincide absolutamente com o endereço indicado na clª 2.ª desta última escritura: Rua ..., 59B, ..., freguesia e concelho de Cascais. Contratualmente, nestes dois últimos empréstimos, a Exequente estava obrigada a comunicar-se com o Executado para a referida Rua de ..., n.º 59, A... Cascais, que não coincide, como se disse com a morada indicada na cláusula 2.ª, pois numa refere-se o n.º 59 e noutra o 59B, numa refere-se fracção E e noutra refere-se ..., que não são a mesma coisa. Poderia o senhor solicitador de Execução ter feito essa diligência no sentido de averiguar se o Executado morava efectivamente neste último endereço, o que tudo indica não fez. Acontece que aos 9/2/2011 o senhor solicitador informa o Juiz de Direito do seguinte: ““C”, agente de execução designado no presente processo vem muito respeitosamente informar V.Ex.ª do seguinte: 1 Deslocou-se o A.E. à morada constante dos autos, sita na Rua ... bloco C. R/c Esq., ..., a fim de proceder à citação do executado. 2. No local não se encontrava ninguém; 3- DE acordo com informação obtida junto do administrador do prédio, residente no r/c Dt.º, o executado reside no local. 4. Foi deixado aviso de hora certa. 5. Quando se deslocou novamente ao local, ninguém compareceu. 6. Face ao exposto, foi a citação efectuada mediante a afixação no local, ao abrigo do disposto no art.º 240/3 do C:P:C. 7- Vai o A.E. proceder a citação no âmbito do art.º 241 do C.P:C.”- cfr. fls. 155. Embora não constantes da certidão de fls. 156/159 tal informação deve considerar-se complemento da certidão de citação e por conseguinte também certificada, ou seja quer a certidão quer a informação ao juiz de factos por ele Agente de Execução praticados com base na sua própria percepção constituem documento autêntico nos termos e para os efeitos do art.º 371, cuja validade só pode ser ilidida com base na sua falsidade que até pode ser oficiosamente conhecida se for evidente em face dos sinais exteriores do documento (art.ºs 371, 372/2 e 3 do Cciv). Ora, o Executado, no seu requerimento de incidente de nulidade de citação diz expressamente no seu ponto 6 do requerimento que “O Administrador do prédio sito na Rua ..., Bloco C, ..., não reside no r/c D.tº do referido prédio , nem tão-pouco reside o Executado naquela morada desde Março de 2008, sendo tal facto do conhecimento de todos os condóminos do prédio e, inclusivamente da própria Exequente e do Agente de Execução, sendo, por isso, manifestamente falso ou inexacto, o que consta do ofício do Agente de Execução de 12.02.2011, com a referência 2071603 que se impugna.” Tratando-se de documento autêntico a informação exarada pelo Agente de Execução apenas pelo incidente de falsidade poderia ter lugar nos termos dos art.ºs 551-A e 546 a 550 e 302 e ss poderia ter lugar, em que as partes podem requerer a produção de prova. A posição do Executado é dúbia, por um lado diz que a informação é falsa e por outro que é pelo menos inexacta e até protesta juntar as actas das assembleia do condomínio do prédio em Janeiro de 2011 para provar que a proprietária do r/c Dt.º não era nem é a administradora do prédio. Não se demonstra que tenha sido feita essa prova. E essa prova, quer a da falsidade do exarado, quer da inexactidão do exarado cabe à Executada. Há que distinguir a falta de citação do art.º 195 da nulidade de citação do art.º 198. Há falta de citação quando o acto não é praticado na direcção do seu destinatário, ou por ter sido completamente omitido, ou por ter havido erro de identidade do réu, ou quando este já faleceu ou sendo uma pessoa colectiva está já extinta, a que se equipara a grande probabilidade de o Réu não saber da propositura da acção, por via da utilização do meio de citação edital por não estarem reunidos os respectivos requisitos e a situação de certeza de que, sem culpa sua, o Réu não chegou a ter conhecimento da citação quase pessoal, por esta não lhe ter sido comunicada por quem a recebeu (art.º 195/1/e)[3]. Do alegado e resultante dos autos, não pode concluir-se que a situação seja de nulidade por falta de citação. Há nulidade da citação quando o acto se realiza com falta de alguma formalidade prescrita na lei (art.º 198/1), por formalidade devendo entender-se qualquer elemento de conteúdo ou de forma exigido pelo art.º 235 (que não vem invocado nos autos) ou específico da modalidade de citação utilizada. No caso de citação com hora certa com afixação da nota de citação (art.º 240/3, a nota do art.º 239/2, as indicações do art.º 240/1 (solicitador apura que o citando reside efectivamente no local indicado, não podendo, todavia, proceder á sua citação por não o encontrar), o envio da carta registada nos termos do art.º 241). Ora, relativamente ao apuramento de que o executado reside efectivamente no local, tal como certificado pelo solicitador de execução através de informação que diz ter obtido do administrador do prédio, ainda que o não identifique, só pode ser atacado pela via do incidente de falsidade que o Executado não invocou de forma expressa e, talvez por isso, não tenha seguido a tramitação específica. Mesmo assim, tratando-se de um incidente de instância a invocação de inexactidão da informação lavrada pelo Solicitado de Execução, sujeita o Executado à prova dela mesma. É que, como se disse, a presunção do domicílio legal do art.º 13 /1 da Lei 7/07 não parece ser de aplicação aos autos. Ainda que fosse, não se trata de uma presunção da residência efectiva, antes se trata de uma presunção de uma morada para efeitos de comunicação com os serviços do Estado que no caso cede perante a certificação feita pelo senhor Solicitador de Execução de que o Executado reside noutro local certificação que incumbia ao Executado afastar. IV- DECISÃO Tudo visto acordam os juízes em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida. Regime da Responsabilidade por Custas: As custas são da responsabilidade do Executado recorrente que decai e porque decai (art.ºs 446, n.sº 1 e 2) Lisboa, 18 de Abril de 2013 João Miguel Mourão Vaz Gomes Jorge Manuel Leitão Leal Ondina Carmo Alves ---------------------------------------------------------------------------------------- [1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pelo DL 303/2007 de 24/08, entrado em vigor a 1/1/08, atenta a circunstância de o requerimento de incidente de nulidade de citação para a execução(esta entrada em 15/10/2010) a correr termos no 3.º Juízo Cível do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Cascais sob o n.º 7618/10.1TBCSC, ter dado entrada, em 5/03/2012 e o disposto no art.º 11 e 12 do mencionado diploma; ao Código referido pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem. [2] Alberto dos Reis, Código do Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra editora, reimpressão, 1981, pág..140. [3] José Lebre de Freitas, “A Acção Declarativa Comum, à Luz do Código Revisto”, Coimbra Editora, 2000, pág. 67 | ||
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Decisão Texto Integral: |