Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1617/11.3TJLSB.L1-6
Relator: TERESA PARDAL
Descritores: ADMINISTRADOR DO CONDOMÍNIO
OBRAS URGENTES
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/22/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: - A conduta do administrador do condomínio que adjudica a uma empreiteira obras que não estavam incluídas no orçamento aprovado pela deliberação da assembleia de condóminos é vinculativa para estes se forem obras urgentes, cuja necessidade foi constatada no decurso das obras orçamentadas, nos termos do artigo 1162º do CC.
- A rejeição de um depoimento como testemunhal e a sua admissão como depoimento de parte constitui uma decisão que integra o artigo 644º nº2 d) do CPC, devendo ser impugnada como apelação autónoma e não como decisão interlocutória a que se refere o nº3 do mesmo artigo.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial: Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa:



I-RELATÓRIO.



G…, Lda intentou contra Condomínio… acção declarativa com processo sumário, alegando, em síntese, que acordou com o réu realizar-lhe trabalhos de recuperação e manutenção do edifício e, já durante a execução da obra, verificou-se a necessidade de trabalhos a mais no valor de 11 015,33 euros incluindo IVA, conforme orçamento que o réu aceitou, adjudicando os referidos trabalhos a mais, que vieram a ser efectuados pelo autor, nos termos da factura que emitiu e que devia ter sido paga em 13/12/2010, mas que o réu não pagou.   

Concluiu pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de 11 015,33 euros, acrescida de juros legais já vencidos no montante de 1 637,29 euros e de juros vincendos até integral pagamento.

O réu contestou alegando que a autora lhe executou trabalhos nas fachadas e cobertura que foram integralmente pagos, não tendo sido encomendados ou autorizados quaisquer trabalhos a mais, que vão impugnados, os quais, se foram realizados, foram por conta e risco da autora, já que o réu só teve conhecimento da pretensão da autora e da respectiva factura numa reunião em Fevereiro de 2011, em que o gerente da autora não conseguiu apresentar qualquer documento com a autorização ou aprovação das obras em causa, dizendo que havia tratado de tudo telefonicamente com uma familiar do falecido gerente da sociedade administradora de condomínio, não tendo porém o réu aceitado a situação e sendo certo que não é devido o preço reclamado pela autora, nos termos do artigo 1214º do CC.

Concluiu pedindo a improcedência da acção.   

A autora respondeu alegando que é impossível que o réu desconheça que as obras em causa foram efectuadas e que a familiar do gerente da administração do condomínio com quem foram tratados os trabalhos era o braço direito da administração, que assim tinha conhecimento da situação, não sendo aplicável o artigo 1214º, que pressupõe uma alteração das obras feita por iniciativa do empreiteiro, para além de que, mesmo que não tivesse havido adjudicação, sempre seriam aplicáveis os artigos 1211º e 883º do CC, cabendo ao Tribunal fixar o preço das obras. 
Saneados os autos, procedeu-se a julgamento, no decurso do qual foi proferido despacho que decidiu que FT…, condómina do 3º andar esquerdo do condomínio réu e oferecida por este como testemunha, estava impedida de depor nessa qualidade por força do artigo 496º do CPC, devendo fazê-lo na qualidade de parte, o que aconteceu.    

Findo o julgamento, foi proferida sentença que julgou procedente a acção e condenou o réu a pagar à autora a quantia de 11.015,33 euros acrescida de juros de mora desde a citação.

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Inconformado, o réu interpôs recurso e alegou, formulando as seguintes conclusões:

1. A Douta sentença recorrida julgou incorrectamente pontos de facto e não aplicou correctamente as normas de Direito.
2. As respostas à matéria de facto dada como provada estão mal fundamentadas, remetendo-se nestas para os documentos de fls. 16, 17 e 18, para se dar como provado coisa diferente do que nestes consta.
3. Diz-se que se acolhe o depoimento de todas as testemunhas, mas depois não se acolhe de facto os depoimentos destas, tendo se desvalorizado, em absoluto, o depoimento das testemunhas do R., tendo tal acontecido quanto à matéria de facto dada como provada nos pontos 2° a 8°, e tendo, do mesmo modo, dado, erradamente, como não provados, os factos 11°, 12°,13°, 15°, 16°, 18°, 19°, 21°, 22° e 23° de “factos não provados", em que se deu resposta diferente daquilo, como resultou da prova gravada produzida.
4. Com efeito, não pode o ora Recorrente aceitar a posição do Tribunal a quo no que respeita à matéria de facto dada como provada, sobrevalorizando-se, aí, o depoimento da testemunha IF… que, não só revelou não ter credibilidade, como se verificou, ao longo de todo o seu depoimento, que está em litígio com a firma representante do R. e, até, tem um interesse directo na causa, bem como, também, demonstrou uma grande falta de isenção, assim se concluindo que este depoimento não pode ser valorizado.
5. Na verdade, aquele depoimento poderá revelar, inclusive, aquilo que a doutrina apelida de “mentira maliciosa", dolosa, já que pessoa sabe que está a mentir, fá-lo deliberadamente, com o propósito de enganar e prejudicar terceiros ou, pelo menos, com a consciência de que os poderá prejudicar, pelo que deveria o Tribunal a quo ter desconsiderado tudo o que esta declarou e, desse modo, não se sendo dando como provado todos os factos que a A. e ora Recorrida alegou e, assim, improcedendo a pretensão desta.
6. De igual modo, atenta a demais prova produzida pela A., não conseguiu esta provar que todos os reclamados trabalhos a mais, e que constam de treze itens do orçamento em apreço, foram realizados, limitando-se as testemunhas a responder a alguns meros exemplos de trabalhos a mais, sem que fossem interrogadas em relação a cada um dos vários itens que compõem o dito orçamento.
7. A testemunha AF…, limitou-se a depor quanto aos trabalhos que correspondem às alíneas b], d] e i] do 2° facto da matéria dada como provada, fazendo referências genéricas quanto a essas obras e com a preocupação de realçar que se tratavam de trabalhos “a mais" que tinham a ver com a obra principal, como referiu quanto à necessidade de “substituição de barrotes" para que se efectuasse a impermeabilização de muros - que têm a ver com a obra contratada (inicial] - embora falasse, também, de infiltrações e desentupimentos em que intervieram de emergência, nada mais dizendo ou atestando quantos aos demais (dez) trabalhos que reclama a A..
8. Por sua vez, a testemunha ML…, questionada pela A. quanto a, e só, alguns exemplos de trabalhos a mais, declarou, basicamente, e sempre com a mesma preocupação de relacionar os reclamados trabalhos com a obra principal, que tinha havido intervenção relativamente aos identificados nas alíneas a], b], d] e i] do facto 2° da matéria de facto dada como provada.
9. Assim, nada foi dito, aflorado e, muito menos confirmado, pelas testemunhas da A., nem estas foram, sequer, interrogadas, quantos aos demais reclamados trabalhos, não tendo sido produzida qualquer outro tipo de prova que permitisse inferir e, por essa via, dar como provado, que todos os trabalhos a mais e que estão relacionados em treze alíneas no orçamento junto aos autos tenham, e todos eles, sido realizados.
10. Não tendo sido prestado um único testemunho que tenha declarado que os trabalhos que constam do dito “orçamento do email de 30/11/10" foram, e todos, realizados!
11. Os únicos documentos juntos pela A., e que respeitam ao referido orçamento e à factura, foram expressamente impugnados pela R., e ora Recorrente na sua contestação, quer no que respeita ao teor do mesmo, quer negando ter conhecimento prévio destes, não tendo sido feita prova contrária em juízo.
12. O Tribunal a quo desconsiderou toda a prova produzida pelo R., e ora Recorrente, tendo, não só optado por não valorar os documentos juntos por este com a sua contestação - carta dos mandatários da A. dirigida aos condóminos e a resposta da R. a estes - e que provam ou, no mínimo, indiciariam que alguns dos reclamados trabalhos não foram, garantidamente, efectuados, bem como de que não foi o R. interpelado quanto ao ora reclamado, como, ainda, não foi tida em conta a prova testemunhal apresentada em como alguns desses trabalhos não foram, nem podiam ter sido executados, bem como que alguns deles são duplicações da mesma intervenção e, até, dos anteriormente executados e pagos relativos à designada empreitada inicial.
13. De facto, a testemunha do R., AC…, declarou que, no âmbito da vistoria por si efectuada ao prédio, constatou que algumas das reclamadas obras não foram, sequer, realizadas, como é o caso das relativas à reparação e impermeabilização de caleiras por baixo do telhado e dos muretes de cobertura.
14. Esta testemunha, empreiteiro de construção civil e que trabalha há cerca de quinze anos com a representante do ora Recorrente, conhecendo bem o prédio em causa por aí ter vindo a realizar diversas obras, também declarou ter verificado, nessa vistoria, que alguns dos reclamados trabalhos a mais estavam em duplicação, como é o caso da dita “reparação e impermeabilização de caleiras por baixo do telhado" com a referida “reparação e impermeabilização dos muretes da fachada de tardoz“ .
15. Pelo que, o Tribunal a quo não poderia dar como provado, como deu, que todos aqueles trabalhos foram realizados quando, reafirme-se, não o foram, nada tendo sido dito e, muito menos, confirmado pelas testemunhas apresentadas pela A. quanto a esses supra identificados trabalhos a mais - correspondentes às alíneas c], e], f], g] h], j]m] e n] do 2° facto da matéria de facto provada - nem foi prestada mais qualquer tipo de prova para esse efeito, incumbindo à ora Recorrida o ónus de produzir essa prova, nos termos do disposto no artigo 342° do CPC, o que não conseguiu fazer, não tendo, sequer e como seria expectável, questionado as suas testemunhas sobre cada um dos 13(treze] “trabalhos a mais reclamados".
16. Não cabendo, como é o caso, ao R., e ora Recorrente fazer prova em contrario desses factos, que não se enquadram no âmbito do regime previsto no artigo 344° do Código Civil, sempre teria o pedido da Autora que improceder, por não provado.
17. Assim, o douto Tribunal a quo nunca poderia ter dado como provado que todos os reclamados trabalhos foram realizados, por ausência notória de produção de prova, quer testemunhal, quer documental, sendo que os documentos juntos aos autos nada infirmam e, muito menos, comprovam quanto ao que aqui se discute, posto o que, mesmo que se admitisse, o que, à cautela e por mero dever de patrocínio se pondera, sem conceder, que tais testemunhos teriam sido isentos, credíveis, completos e elucidativos, só poderiam, no limite, dar como provados os trabalhos que foram objecto de prova testemunhal, os quais, como acima referido, cingiram-se às alíneas a], b], e i] do 2° facto da matéria de facto dada como provada e, desde que avaliados e ponderados os trabalhos e acordado o preço dos mesmos o que, conforme contra-prova produzida, não foi o caso, tendo, ainda e sempre, que ser conformada a sua efectiva realização e tida em conta os que, a terem sido executados estão, como supra expresso, em duplicado.
18. A douta sentença recorrida defende que ocorreu uma modificação à obra inicialmente acordada, sendo os reclamados trabalhos alterações não previstas inicialmente, mas não necessários, afastando, desse modo, a figura de “alterações" à obra, para subsumir os trabalhos em causa a uma “obra nova", que “não só não são necessárias para a realizar, como não podem considerar-se parte dela" para, aí concluir que se rege quanto a estas o artigo 1217° do C. C., contrariando a prova produzida por todas as testemunhas da A., quando declararam que os trabalhos efectuados eram necessários para a boa conclusão da empreitada inicial.
19. Não tendo feito qualquer distinção entre trabalhos com relação à obra originária e aqueles que não têm qualquer conexão com aquela, como é o caso dos “desentupimentos de caixas e de prumadas de esgoto", que são obras, essas sim, novas, que surgem pela sua urgência, e as ditas “pinturas de interiores" ou, ainda, “a substituição de barrotes podres no telhado", que surgiriam como uma alteração necessária, aplicou, incorrectamente, o Tribunal a quo um só regime jurídico a todos os trabalhos, independentemente da relação que estes tivessem ou não, com a obra originária.
20. Para, desse modo, e mal, tudo subsumir a uma “obra nova", que teria sido objecto de um contrato de empreitada, verbalmente celebrado, entre as partes, o que não foi, sequer, provado nos autos.
21. Nunca poderia ter sido dado como provado, na sentença recorrida, que A. e R. celebraram um contrato verbal de empreitada, visto que as testemunhas da A. nada declararam quanto à aceitação, pelo R., de um preço, sequer, desses vários trabalhos e, muito menos, de todos os treze itens que estão descritos no 2° facto provado.
22. O Tribunal a quo não podia ter dar como provado, no ponto 3° da matéria de facto, que a Recorrente recebeu o documento aí indicado e, ainda menos, que o recebeu na data aí aposta de 30 de Novembro de 2010, tendo fundamentado essa sua decisão, exclusivamente, nas declarações da testemunha IF…, cuja supra demonstrada falta de credibilidade é notória, como acima explanado, a que acresce que esse documento foi expressamente impugnado pela ora Recorrente, pelo que não se podem extrair do mesmo tais referidos factos como provados.
23. Ademais, a testemunha AB…, apresentada pela Recorrente não só negou essa versão dos acontecimentos de que o referido email tinha sido entregue ou recebido, nem naquela data, nem em outra, à administração do Condomínio como, igualmente declarou que a administradora do R. só veio a dele ter conhecimento em reunião ocorrida em Fevereiro de 2011, com o gerente da A., que lhe entregou esse dito email, bem como a factura em causa.
24. Por outro lado, ainda no que àquele ponto 3° da matéria de facto provada, dado o depoimento desta testemunha do R., e a demais prova produzida nos autos, nunca poderia aí constar a palavra “enviou, por não se ter provado que a A. enviou, de facto, esse email ao R., e que este o recebeu, tanto mais que esta parte não é indicada como destinatário directo dessa missiva, mas sim terceiros, cuja identidade se desconhece, nada se tendo provado nesse sentido.
25. Devendo a sentença recorrida afirmar que o R. só veio a tomar conhecimento desse email, bem como do orçamento aí descrito, na sequência da reunião tida com o gerente da A., em Fevereiro seguinte.
26. Confirmando o aduzido pelo R. em sede da sua contestação, deveria ter sido dado como provado o ponto 13° e 15° da matéria de “factos não provados” e dado como não provado aquele 3° facto provado, e que corresponde ao articulado 13° do petitório da A..
27. Além disso, confirmando a versão dos factos demonstrada pela Recorrente, não apresentou a A. e ora Recorrida, qualquer documento de recibo, ou outro, que permitisse presumir que o email em questão, o qual, também, inexplicavelmente, não tem como destinatário directo o representante do R., mas sim terceiros, foi, de facto, remetido e, ainda, recepcionado pela representante da ora Recorrente, como não foi feita prova testemunhal nesse sentido.
28. Assim, tal documento, de per si, nada prova, a não ser que, como veio a confessar a A. no seu petitório, trata-se de um orçamento, em que a A. propunha-se efectuar as obras aí descritas o que, como declaração unilateral receptícia que é, só produziria todos os seus efeitos se chegasse ao poder do destinatário ou dele fosse conhecida (vide no disposto o artigo 224° do Código Civil), o que, como alegado, não foi o caso, não se tendo tal provado.
29. Mas, para além do acima referido, e demonstrando, uma vez mais, na opinião da Recorrente, que houve uma incompreensível desigualdade na avaliação da prova produzida em juízo, não tendo o Tribunal a quo valorado um dos documentos por si junto aos autos (a fls. 44 a 46 e que respeita à “carta de resposta da M. F… aos mandatários da A.”), nunca impugnada pela ora Recorrida, demonstrando-se, com tal documento, que nem esta, nem aqueles seus representantes, enviaram qualquer carta, email, fax, telefonema ou qualquer outro tipo de comunicação àquela firma, nunca tendo estes antes reclamado à Recorrente qualquer pagamento, como, aliás, alegou a R. no articulado 49° da sua contestação, e que deveria ter sido relacionado na matéria factual da douta sentença de que ora se recorre, e não foi caso.
30. Desse modo, ao não se pronunciar sobre aquele referido documento, nem sobre aquele testemunho de AC… nem, ainda e também, sobre as amplas, e esclarecedoras, declarações das testemunhas MF… e AB…, como o devia ter feito, padece a douta sentença recorrida de nulidade, nos termos e para os efeitos previstos na alínea d) do n° 1 do artigo 615° do CPC.
31. Tendo, desse modo, ainda, o Tribunal a quo posto em causa o elementar princípio da igualdade das partes, bem como do contraditório, previstos, respectivamente, nos artigos 4° e 3°, ambos do CPC.
32. Ao ter dado como provado os pontos 3° e 5° da matéria de facto provada, optando por transcrever, na íntegra, os articulados do petitório como, aliás, o fez com a demais matéria de facto aduzida na sentença, veio o Tribunal a quo a dar como provado tudo o aí expresso, incluindo as indefinidas expressões "No seguimento desse contacto" e "Na sequência do que", sem que se identifique ou, minimamente, se clarifique, em toda aquela douta sentença, a que se está a referir o Tribunal, desconhecendo, de todo, a ora Recorrente, a que “seguimento", ou a que “sequência" e, ainda, a que “contacto" se está a reportar o Tribunal, constituindo tais omissões uma falha importante e assaz determinante para a decisão dos autos.
33. Porquanto, nada constando dos autos, nem da matéria de facto dada como provada, desconhece a Recorrente a “que" e a “quem" estará o Tribunal a quo a referir-se, sendo incerto, indefinido e desconhecido qual será o “seguimento" que deu lugar ao referido orçamento e, também, ao email, ou como e quem “contactou" quem e, do mesmo modo, quanto à, também, muito relevante “sequência" que terá dado origem aos dito início dos trabalhos.
34. Essas indeterminações, que não são esclarecidas na douta sentença recorrida, são questões essenciais para a decisão final adoptada, tanto mais que, como é o caso dos autos, estamos perante trabalhos ditos “a mais", alterações, uns, e obra nova, outros, sendo assaz importante aferir de todas as razões, factos e, até, pormenores, que deram origem à presente reclamação, indefinição essa que, acaba por traduzir-se numa obscuridade, que leva a que a decisão proferida pelo Mmo. Juiz a quo seja, em grande parte, ininteligível.
35. Nesse sentido, não poderia o Tribunal a quo decidir, como o fez, por notória ausência de prova, e com base naquelas insuficiências e imprecisões, que revelam, uma obscuridade e, igualmente, uma ambiguidade que, ademais, contraria o princípio da segurança do direito, incorrendo, assim, a douta sentença do vício de nulidade, por falta ou insuficiência de fundamentação, bem como por ambiguidade desta, tudo nos termos do disposto nas alienas b] e c] do n° 1 do artigo 615° do C.P.C., como se conclui.
36. O Tribunal a quo, ao dar como provado, com base, quase exclusivamente, nas declarações da Testemunha IF…, o ponto 6 da matéria de facto, não tendo, igualmente, sido feita qualquer tipo de prova em juízo quanto a este facto, e tendo dado como assente que as obras em causa concluíram-se nessa data de 13 de Dezembro de 2010, o que está em clara contradição com a fundamentação de toda a sua sentença quando aí, se invoca que_estas (trabalhos a mais] “foram sendo realizados em simultâneo com os contratados", sendo que, provado foi, quanto aos trabalhos contratados e que reporta-se à referida obra inicial, que esta foi concluída, e paga, muito antes de 30 de Novembro de 2010.
37. Ao determinar-se nos pontos 3° e 6° da matéria de facto, que os reclamados trabalhos iniciaram-se em 30 de Novembro de 2010, e foram concluídos em 13 de Dezembro de 2010, prejudicada fica toda a argumentação e fundamentação aduzida pelo Tribunal o quo, e que assenta na intervenção directa e quase absoluta do Sr. F… nesse processo, quer encomendando, quer autorizando, quer vistoriando, quer visitando, quer aceitando tudo o que àqueles trabalhos dissesse respeito, o que é frontalmente contrariado com toda a prova de que o Tribunal deu como provado, neste caso, com base nas declarações prestadas por ambas as partes, e que é no sentido de que aquele representante do Condomínio, devido a doença grave, não ia ao escritório, nem trabalhava, desde, pelo menos, Setembro de 2010.
38. Ao assim fundamentar a sua douta decisão, não poderia o Tribunal a quo decidir, como decidiu, pois à data dos factos dados como provados, não estava aquele representante do R., sequer, em condições de saúde para praticar todos aqueles actos que ali lhe são atribuídos.
39. Mesmo que outra coisa se entenda, a resposta dada pelo Mmo Juiz a quo quanto aos factos 3° e 6° da matéria de facto provada, conduz a uma a não clarificação, a incerteza, quanto à data, ou ao momento temporalmente definido, em que esses trabalhos foram iniciados, realizados e concluídos, não sendo irrelevante para a decisão da causa essa indefinição, que colide com o princípio geral de direito da segurança jurídica.
40. Ademais, a decisão que o Tribunal a quo deveria ter adoptado seria a de não dar como provado, ao contrário de, como deu, que todos os reclamados trabalhos não foram encomendados, autorizados e, ainda menos, aceites, ou acordado o seu preço.
41. De facto, não provou a A. que tais trabalhos tivessem tido o consentimento e autorização do R., tendo as testemunhas AS… e ML…, confirmado que a A. nunca fez nenhuma obra sem um orçamento prévio, e que eram sempre apresentados, em obra, ao Sr. F…, orçamentos prévios, escritos, mesmo que, por vezes, fossem papeis manuscritos, e não fosse apresentado, em juízo, como não o foi, um único desses alegados documentos que tal pudesse, minimamente, comprovar.
42. O Tribunal a quo não poderia, igualmente, dar como provado que a testemunha IF… tinha, como aí expressou, poderes de representação da firma administradora do Condomínio, por não ter sido produzida qualquer prova nesse sentido, nem tal foi alegado pela A. e, muito menos, que esta, em conjunto com o gerente daquela firma, tinha poderes para autorizar e adjudicar obras quando, aí afirma, referindo-se a ambos, “mandaram executar sem reparo os trabalhos" facto que foi, aliás, frontalmente negado pela própria testemunha, quando atribuiu, só e exclusivamente, àquele gerente, esse poder e esses descritos factos.
43. Não se compreende a fundamentação do Mmo Juiz quando invoca que a testemunha IF… actuava como “representante da M.F…", nada se tendo provado nesse sentido.
44. Desse modo, a douta sentença recorrida é, também, contraditória, por ao longo de quase toda a sua fundamentação ter atribuído, exclusivamente, àquele gerente a prática de todos os actos relativos à autorização das referidas obras e, concomitantemente, a final, considerar que tais poderes foram exercidos, conjuntamente, com aquela testemunha.
45. Aliás, se assim se considerasse, como a douta sentença admitiu, prejudicada estaria o depoimento daquela como testemunha, por ser, nesse caso, como o são os gerentes da firma que administra o Condomínio, parte no processo, estando, ao abrigo do disposto no artigo 496° do CPC, aquela impedida de depor como testemunha.
46. Daí decorrendo uma relevante contradição, particularmente relevante para boa decisão em causa, nos termos e ao abrigo na alínea c] do n° 1 do artigo 615° do C.P.C..
47. O Tribunal a quo desvalorizou a muita prova produzida pelo R. e ora Recorrente comprovando que este não recebeu, nem lhe foi entregue, a factura dos autos, nem teve em consideração o depoimento da testemunha IF… quando esta confessa que, afinal, a factura em causa tinha sido emitida no final de Agosto ou princípio de Setembro, ou seja, dois a três meses antes da data da sua emissão, o que contraria frontalmente toda a fundamentação da douta sentença recorrida, e os factos aí dados como provados.
48. Na douta sentença cometeu-se mais um erro de julgamento, ao ser o R. condenado no pagamento da factura em causa, sem que tenha-se provado, sequer, que esta a recebeu e, muito menos, que foi interpelada pela A. para efectuar esse pagamento.
49. A testemunha MF… afirmou no seu depoimento que não recebeu, nem lhe foi entregue, a factura, contrariando, frontalmente, as declarações da testemunha IF….
50. Deve, assim, ser valorizada a prova testemunhal apresentada pelo Recorrente, nomeadamente o depoimento da testemunha MF…, que foi isento e credível.
51. Considerando-se, consequentemente, que devia ter sido dado como provado a matéria constante no artigo 28° e 31° da Contestação, e que corresponde ao 21° de “factos não provados”.
52. Todas as testemunhas da Recorrente declararam, de forma inequívoca e sem qualquer contradição, que a “metodologia” da administração de condomínio relativamente a obras nos prédios que representa é sempre a de comunicar aos condóminos a necessidade de obras e submeter a sua realização e preço à decisão destes, ora o fazendo através de uma deliberação em assembleia, que convoca para esse efeito, ora através de uma circular que lhes dirige, anexando os orçamentos em causa, caso a urgência da sua realização assim obrigue, cabendo, exclusivamente, aos condóminos decidir sobre a realização das mesmas, do seu preço e demais condições, o que contraria, nem justifica, o entendimento que foi acolhido na douta sentença, ora em crise.
53. Não se compreendendo como o Mmo. Juiz a quo não teve, uma vez mais, em conta toda essa prova produzida, pelo que devia ter sido dado como provado o artigo 33° da contestação, e que foi reproduzido como ponto 23° da douta sentença.
54. O Tribunal a quo desconsiderou, igualmente, as declarações da testemunha IF… que, reportando-se ao caso dos autos, acabou por afirmar que, encontrando-se o gerente da firma já doente e impossibilitado de trabalhar, iria por à consideração dos condóminos a aprovação da obra em causa e dos seus valores na reunião ordinária do condomínio, que iria ter lugar em 2011.
55. Confirmando com essas declarações as que todas as testemunhas do R. prestaram sobre esse assunto, devendo, assim, o Tribunal a quo dar como assente o ponto 23 da matéria de facto não provada e, consequentemente, dar como não provados os pontos 4, 5, 7 e 8 dos “factos provados”.
56. Na douta sentença cometeu-se, ainda, mais um erro de julgamento.
57. Com efeito, sem se ter dado como provado que o R. tenha concordado com todos ou, sequer, com um dos preços que constam do referido orçamento ou dado o seu assentimento a estes, condenou-se o R. ao pagamento dos mesmos.
58. Deve, assim, a douta sentença ser revogada, com todas as consequências legais daí resultantes.
59. Conforme já antes se alegou, a douta sentença não está fundamentada nos termos previstos na lei, pois, viola o disposto nas alíneas b), c) e d), do artigo 615° do C.P.C..
60. Isto é, o Meretíssimo Juiz “a quo” com a decisão recorrida não assegurou a defesa dos direitos do Recorrente, ao não fundamentar devidamente a sua decisão e, por outro lado, ao fundamentar a mesmas em oposição com a decisão que veio a adoptar.
61. Também se requer a Vossas Excelências a reapreciação destes supra alegados factos, tendo em conta a prova produzida em sede de audiência de julgamento, bem como os documentos juntos nos autos, considerando, desta forma, o alegado pelo Recorrente.
62. Mormente, atendendo à prova que foi dada como provada, e não o devia ter sido, bem como pela muita prova produzida pelo R. e que foi pelo Mmo. Juiz a quo completamente desvalorizada, e pelas razões acima expostas, a acção teria de ser julgada totalmente improcedente, por não provada.
63. Razões pelas quais julga o Recorrente que a decisão em apelação falece de mérito, porque violadora, entre outros, os seguintes artigos 3°, 4°, 415°, 459°, 466°, 496°, 513°, 615° n° 1, alíneas b, c] e d], todos do C.P.C., 224°, 342°, 232°, 1214°, 1215° e 1217°, todos do C.C..
64. Por outro lado, decidiu mal o Tribunal a quo, quando deferiu o requerimento de impugnação da testemunha FT… que a A. aduziu em sede de audiência de discussão e julgamento, tendo aí se determinado que, sendo aquela condómina do Condomínio Réu, não poderia depor como testemunha, tendo ouvido aquela como depoimento de parte.
65. Contrariando, desse modo, a muita doutrina e jurisprudência que defende que podem depor como testemunhas, em processo intentado contra o condomínio, os respectivos condóminos, não sendo estes considerados parte na causa.
66. Ao assim decidir, veio o Mmo. Juiz a quo impedir o R., e ora Recorrente, de interrogar aquela, como sua testemunha e, desse modo, impedido foi este de poder fazer prova, e contra-prova, quanto à matéria sobre qual a pretendia inquirir, violando-se, desse modo, os princípios da igualdade das partes e do contraditório, postulados nos artigos 4° e 415° do C.P.C..
67. Conclui-se que aquele despacho judicial que impediu a inquirição daquela testemunha deve ser revogado, por violação daqueles princípios gerais de direito, sendo este, nos termos e ao abrigo do disposto na alínea b] do n° 2 do artigo 629° do C.P.C., declarado nulo e, em consequência, sendo anulado o julgamento, e a sentença subsequente, para que se proceda à reinquirição de FT…, como testemunha.

Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, que Vªs doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser totalmente procedente e, em consequência, ser revogada a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, assim se fazendo Justiça.

Caso assim não se entenda o que por mera cautela de patrocínio se concebe, sem conceder, deverá o douto despacho que deferiu a requerida inquirição impugnação da supra referida testemunha ser revogado e, em consequência, sendo anulado o julgamento e a sentença subsequente, para que se proceda à reinquirição daquele, como testemunha, fazendo-se a habitual e necessária justiça.

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A recorrida não apresentou contra-alegações e o recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos autos e efeito suspensivo, por o apelante ter prestado caução.

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As questões a decidir são:

I) Nulidade da sentença.
II) Impugnação da matéria de facto.
III) Responsabilidade do réu pelo pagamento da quantia reclamada pela autora.
IV) Impugnação do depoimento testemunhal.
                                                                                                               
FACTOS.

A 1ª instância considerou os seguintes factos provados e não provados:

Provados.

1. No âmbito da sua actividade, a A. foi contactada pela empresa “M. F…, Lda.”, administradora do ora R., Condomínio sito na Av…., em Lisboa, para proceder à realização de vários trabalhos de recuperação e manutenção do referido prédio.

2. Já no decurso da obra, verificou-se a necessidade de realização dos seguintes trabalhos a mais no edifício:

a) Reparação e impermeabilização dos muretes de cobertura da fachada tardoz pelo exterior, no valor de € 2.555,00;
b) Substituição de barrotes podres no telhado, junto às caleiras interiores (para reparação das caleiras), no valor de € 682,50;
c) Reparação e impermeabilização de caleiras por baixo do telhado, no valor de € 417,50;
d) Reparação da rotura prumada de esgotos das cozinhas, incluindo desentupimento da mesma, no valor de € 1.950,00;
e) Reparação da cozinha do 1° Direito, no valor de € 362,50;
f) Colocação de caleiras adicionais no terraço do 1° andar, no valor de € 450,00;
g) Reparação de impermeabilização de área de terraço acima da P… (perto da manilha substituída), no valor de € 550,00;
h) Pintura das paredes do armazém da P…, devido a infiltrações (prumada das cozinhas), no valor de € 197,50;
i) Desentupimento das caixas de esgoto da P…, no valor de € 170,00;
j) Reparação e pintura de sala e quarto no 6° Esq. (infiltrações da empena lateral/caleiras), no valor de € 1.035,00;
l) Reparação e desentupimento de caixas de esgoto (pátio), no valor de € 1.160,00;
m) Reparação e pintura de quarto na habitação da porteira, no valor de € 362,50;
n) Aplicação de cumeeira em chapa na chaminé, no valor de € 202,50.

3. No seguimento desse contacto, a A. enviou, à administradora do R. um orçamento e no qual se propunha efectuar os referidos trabalhos pelo preço total de € 11.015,33, incluindo IVA, como constam do e-mail de 30/11/10.

4. Tendo o R., representado pela sua administração, concordado com o preço proposto, e adjudicado os trabalhos.

5. Na sequência do que a A. iniciou os trabalhos em causa.

6. Concluídos os mesmos em 13/12/2010, a A. emitiu a factura n° 2884, pelo montante de € 11.015,33 (onze mil e quinze euros e trinta e três cêntimos) o valor devido pelos trabalhos a mais realizados.

7. Tais trabalhos a mais foram realizados com o consentimento e autorização da administração do condomínio, ora R.

8. Contudo, o mesmo não efectuou o pagamento da mencionada factura.

9. A A. também realizou no prédio em apreço a obra correspondente à “proposta n°124/09” relativa ao “orçamento para realização de trabalhos de reparação, conservação e beneficiação do edifício sito na Av…. em Lisboa orçamento esse cujo preço global foi integralmente liquidado pela ora Ré à A..

10. O referido orçamento respeita a:

- a) “Fachadas”: a.1) “Reparação e pintura integral da fachada principal, fachada posterior e túnel de acesso à fachada posterior ao nível do r/c”; a.2) Reparação pontual da fachada principal.
- b) “Cobertura” : b.1) “Reparação pontual da cobertura”; b.2) “Reparação integral da cobertura do edifício.

Não provados.

11. A R. não encomendou à A. tais trabalhos nem os autorizou.

12. Se esta realizou algum desses trabalhos fê-lo por sua própria iniciativa.

13. Só no decurso de uma reunião tida com o gerente da A e ocorrida no início de Fevereiro de 2011 é que a Ré foi por aquele informada de que teria efectuado “trabalhos a mais” no prédio em causa e que pretendia saber quando os mesmos seriam pagos.

14. Perante tal desconhecida situação, solicitou a R. àquele que comprovasse que tais obras tinham sido não só realizadas como, ainda e principalmente, aprovadas.

15. Tendo o gerente da A. apresentado, naquela altura, uma cópia do email que juntou à sua p.i. como Doc. nº 2., bem como da factura que juntou como Doc. nº3.

16. Documentos esses (e-mail e factura) que a Ré desconhecia até àquela altura e que só então deles teve conhecimento.

17. Solicitado à A. que apresentasse qualquer autorização ou aprovação das referidas obras, foi pelo representante da A. dito que “tratou tudo telefonicamente” com a supra referida familiar daquele gerente, não tendo qualquer autorização escrita, de qualquer tipo...

18. Nem sequer um email de resposta ao que pretensamente disse ter enviado e que, conforme já se referiu, só no decurso daquela reunião, ocorrida em Fevereiro do corrente ano, se viu pela primeira vez.

19. A factura em dívida devia ter sido paga logo que os trabalhos ficaram à disposição do cliente, ou seja, a 13/12/2010.

20. Inúmeras vezes a A. insistiu para a com a administração do R. para que liquidasse factura em dívida, ainda que sem qualquer sucesso.

21. A factura também não foi recebida pela Ré.

22. Naquela reunião, foi a A. informada que a R. não podia aceitar os reclamados trabalhos, porquanto, antes de mais, tinha que confirmar se os mesmos tinham sido ou não realizados.

23. Acrescentando a R. que seria igualmente necessário apresentar tal situação aos condóminos, aproveitando, para tanto, a realização da assembleia “ordinária” de “apreciação das contas”.

24. Na referida reunião foi ainda o A. questionado e instado a apresentar qualquer documento que permitisse, de qualquer forma, aquilatar do tipo de trabalhos realizado bem como do preço apresentado, não tendo a A., até à presente data, nada entregue à R.

25. Nunca a Ré autorizou os trabalhos agora reclamados pela A..

*
*

ENQUADRAMENTO JURÍDICO.

I) Nulidade da sentença.

O recorrente arguiu a nulidade da sentença nos termos do artigo 615º nº1, alíneas b), c) e d) do CPC, alegando que a decisão da matéria de facto não está devidamente fundamentada, é contraditória, ambígua e obscura, verificando-se também omissão de pronúncia, em virtude de não terem sido atendidas as provas oferecidas pelo apelante.

Manifestamente não tem razão, pois todos os fundamentos invocados para as apontadas nulidades consistem apenas em discordâncias quanto à apreciação da prova, a apreciar em momento próprio, ou seja, em sede de impugnação da matéria de facto.

Improcede, pois a arguição de nulidade da sentença. 

*

II) Impugnação da matéria de facto.

Pretende o apelante que sejam considerados não provados os pontos 2 a 8 da matéria de facto que foram julgados provados e, ao invés, que sejam julgados provados os pontos 11, 12, 13, 15, 16, 18, 19, 21, 22 e 23, que foram considerados não provados.

É a seguinte a redacção dos referidos factos provados e não provados:

Provados:

2. Já no decurso da obra, verificou-se a necessidade de realização dos seguintes trabalhos a mais no edifício:

a) Reparação e impermeabilização dos muretes de cobertura da fachada tardoz pelo exterior, no valor de € 2.555,00;
b) Substituição de barrotes podres no telhado, junto às caleiras interiores (para reparação das caleiras), no valor de € 682,50;
c) Reparação e impermeabilização de caleiras por baixo do telhado, no valor de € 417,50;
d) Reparação da rotura prumada de esgotos das cozinhas, incluindo desentupimento da mesma, no valor de € 1.950,00;
e) Reparação da cozinha do 1.° Direito, no valor de € 362,50;
f) Colocação de caleiras adicionais no terraço do 1° andar, no valor de € 450,00;
g) Reparação de impermeabilização de área de terraço acima da P… (perto da manilha substituída), no valor de € 550,00;
h) Pintura das paredes do armazém da P…, devido a infiltrações (prumada das cozinhas), no valor de € 197,50;
i) Desentupimento das caixas de esgoto da P…, no valor de € 170,00;
j) Reparação e pintura de sala e quarto no 6.° Esq. (infiltrações da empena lateral/caleiras), no valor de € 1.035,00;
l) Reparação e desentupimento de caixas de esgoto (pátio), no valor de € 1.160,00;
m) Reparação e pintura de quarto na habitação da porteira, no valor de € 362,50;
n) Aplicação de cumeeira em chapa na chaminé, no valor de € 202,50.

3. No seguimento desse contacto, a A. enviou, à administradora do R. um orçamento e no qual se propunha efectuar os referidos trabalhos pelo preço total de € 11.015,33, incluindo IVA, como constam do e-mail de 30/11/10.

4. Tendo o R., representado pela sua administração, concordado com o preço proposto, e adjudicado os trabalhos.

5. Na sequência do que a A. iniciou os trabalhos em causa.

6. Concluídos os mesmos em 13/12/2010, a A. emitiu a factura n° 2884, pelo montante de € 11.015,33 (onze mil e quinze euros e trinta e três cêntimos) o valor devido pelos trabalhos a mais realizados.

7. Tais trabalhos a mais foram realizados com o consentimento e autorização da administração do condomínio, ora R.

8. Contudo, o mesmo não efectuou o pagamento da mencionada factura.

Não provados.

11. A R. não encomendou à A. tais trabalhos nem os autorizou.

12. Se esta realizou algum desses trabalhos fê-lo por sua própria iniciativa.

13. Só no decurso de uma reunião tida com o gerente da A e ocorrida no início de Fevereiro de 2011 é que a Ré foi por aquele informada de que teria efectuado “trabalhos a mais” no prédio em causa e que pretendia saber quando os mesmos seriam pagos.

15. Tendo o gerente da A. apresentado, naquela altura, uma cópia do email que juntou à sua p.i. como Doc. nº 2., bem como da factura que juntou como Doc. nº3.

16. Documentos esses (email e factura) que a Ré desconhecia até àquela altura e que só então deles teve conhecimento.

18. Nem sequer um email de resposta ao que pretensamente disse ter enviado e que, conforme já se referiu, só no decurso daquela reunião, ocorrida em Fevereiro do corrente ano, se viu pela primeira vez.

19. A factura em dívida devia ter sido paga logo que os trabalhos ficaram à disposição do cliente, ou seja, a 13/12/2010.

21. A factura também não foi recebida pela Ré.

22. Naquela reunião, foi a A. informada que a R. não podia aceitar os reclamados trabalhos, porquanto, antes de mais, tinha que confirmar se os mesmos tinham sido ou não realizados.

23. Acrescentando a R. que seria igualmente necessário apresentar tal situação aos condóminos, aproveitando, para tanto, a realização da assembleia “ordinária” de “apreciação das contas”.

Começando então pelo ponto 2 dos factos, verifica-se que o mesmo reproduz a lista de trabalhos constantes no documento de fls 16 e 17 (doc nº2 da PI), que é um mail da autora de 12/0/2010, dirigido à administração do condomínio, ao cuidado da testemunha IF…, aí se escrevendo “conforme combinado, envio a lista de trabalhos a mais realizados no decorrer da empreitada do edifício sito (…)”.

A referida testemunha IF… explicou a sua intervenção nos factos, como sendo sobrinha do falecido representante da sociedade administradora do condomínio e, nessa qualidade, prestando colaboração à empresa e ao seu tio, actuando perante a autora como interlocutora e representante da administração, mas sem poder de decisão, o qual cabia sempre ao seu tio, a quem dava sempre conhecimento das questões a decidir.

Nessa qualidade, explicou como o orçamento de fls 47 e seguintes se refere às obras efectuadas no prédio pela autora, sem que tivessem sido todas adjudicadas, em virtude de o condomínio ter dificuldade em pagar aquele preço, tendo restringido o âmbito das obras e pago apenas o preço do que foi adjudicado.

Na mesma qualidade, explicou esta testemunha que, tal como o seu tio, acompanhou sempre as obras, tendo tomado conhecimento de que diversos trabalhos não orçamentados se mostravam necessários, quer porque se tratava de prevenir infiltrações que, se não fossem prevenidas ou reparadas, tiravam o efeito útil das obras adjudicadas, quer porque havia condóminos que já tinham as suas fracções seriamente afectadas pelas infiltrações das partes comuns a reparar.

Mais explicou que a necessidade de todos esses trabalhos e os respectivos preços, constantes do documento de fls 16 e 17, foram comunicados ao seu tio, representante da empresa administradora do condomínio, que os aceitou e veio a adjudicá-los à autora.

Explicou ainda que depois dessa adjudicação, a autora efectuou os referidos trabalhos e emitiu a factura de fls 18 (doc nº3 da PI), respeitando os preços que havia apresentado e que foram aceites pela administração, factura essa que foi entregue à administração e nunca foi paga.

Mais declarou que, pelo menos os condóminos dos andares onde foi necessário fazer esses trabalhos, do 1º, 2º e 6º andar, tiveram conhecimento dos mesmos e deram entrada nas suas casas para a sua realização, nunca mostrando qualquer estranheza ou oposição.
Por sua vez, a testemunha AF…, engenheiro que trabalhou na obra do edifício explicou como as obras em discussão foram surgindo como necessárias, sob pena de a reparação da fachada e da cobertura não ter qualquer efeito útil, já que, se não fossem feitas, as infiltrações imediatamente voltariam a aparecer.

Esta testemunha confirmou que todos os trabalhos constantes no email estavam nessas condições e foram realizados, sendo os preços ai constantes os apresentados à administração que os aceitou, sendo os seus interlocutores a testemunha IF… e o representante da administração entretanto falecido e tendo sido este quem adjudicou os trabalhos.

As testemunhas MF… e AB…, ambas funcionárias da administração (actualmente representada por pessoa diferente, uma vez que o anterior representante já faleceu) declararam não ter conhecimento de trabalhos a mais, só tendo conhecimento desta pretensão da autora já depois do falecimento do anterior representante da administração, mas sem que tivessem acompanhado as obras e tratado de orçamentos.

A testemunha AC… foi a pessoa encarregada pela administração (já depois do falecimento do seu anterior representante e de a autora ter reclamado o pagamento da factura) de confirmar se os trabalhos em discussão foram ou não efectuados.

Esta testemunha declarou que não foi efectuado o trabalho nas caleiras por baixo do telhado, mas o seu depoimento mostrou-se confuso, pouco preciso, declarando que “as casas de banho estão na mesma”, trabalho que não está em causa, e sendo da opinião que há itens repetidos relativamente ao orçamento das obras, mas acabando por admitir que estava a fazer essa comparação pela primeira vez e não revelando ter conhecimento sobre a dimensão das obras efectuadas. 

Quanto ao depoimento de FT…, condómina ouvida como parte, também não foi esclarecedor, pois se limitou a dizer que recebeu uma carta da autora que estranhou e que, com excepção de um entupimento no 2º andar que originou infiltrações no 1º andar, não teve conhecimento das obras ora em discussão, nem da factura apresentada pela autora, sendo certo que nunca poderia ter estado muito presente num acompanhamento das obras, já que não reside no prédio.

Finalmente, os documentos nº1 e 2 juntos com a contestação e invocados pelo apelante em nada esclarecem o tribunal, apenas resultando dos mesmos que a autora, em Abril de 2011, depois de lhe ter sido recusado o pagamento da factura, escreveu cartas aos condóminos expondo a situação e ameaçando recorrer a tribunal, tendo-lhe sido enviada, em resposta, uma carta da administração do condomínio rejeitando responsabilidades.

Do conjunto desta prova, em geral, não merece censura a decisão da matéria de facto, que atendeu às testemunhas IF…, AF… e ML…, as quais revelaram ter conhecimento dos factos nos termos acima expostos, mostrando-se os restantes depoimentos sem conhecimento directo dos factos (AB…, MF… e FT…) ou pouco consistente (AC…).

Deverão, assim, manter-se os pontos de facto impugnados, devendo apenas esclarecer-se a redacção do ponto 4, no sentido de precisar e esclarecer como foi feita a aceitação e adjudicação dos trabalhos.

Passará, então o ponto 4 a ter a seguinte redacção:

Tendo o representante da sociedade administradora do condomínio réu concordado com o preço proposto e adjudicado os trabalhos”.

No restante, indefere-se a impugnação da matéria de facto.  
      
*

III) Responsabilidade do réu pelo pagamento da quantia reclamada pela autora.

Como resulta dos factos provados, à autora foi adjudicada uma obra no prédio do condomínio réu, que consistia em reparações nas fachadas e na cobertura, tendo a autora realizado as obras previstas e o réu pago o valor acordado no orçamento.

Estamos perante um contrato de empreitada previsto nos artigos 1207º e seguintes do CC, provando-se, contudo, também, que, no decurso das obras, surgiu a necessidade de realização de diversos outros trabalhos que não constavam no orçamento e, comunicado ao representante da sociedade administradora do condomínio a necessidade de realização destes trabalhos para além do orçamento, bem como o respectivo preço, foram os mesmos aprovados e adjudicados à autora pelo referido representante do condomínio, em consequência do que a autora os realizou e emitiu a respectiva factura, que não foi paga.

Não se conforma o condomínio réu com a decisão de condenação no pagamento desta factura, alegando que não teve conhecimento, não consentiu, nem adjudicou os trabalhos a mais.

Nos termos do artigo 1430º nº1 do CC, a administração do condomínio cabe à assembleia de condóminos, como órgão deliberativo e a um administrador, como órgão executivo, prevendo o artigo 1431º a obrigatoriedade de uma assembleia anual de condóminos e a possibilidade de convocação de uma assembleia extraordinária quando necessário e contendo o artigo 1436º a enumeração exemplificativa das funções do administrador.
Da conjugação destas disposições legais, retira-se que cabe à assembleia de condóminos deliberar, ou seja, decidir, sobre a realização de obras nas partes comuns do prédio e que cabe ao administrador executar as deliberações (artigo 1436º nº g)), sendo aplicável à actuação deste último as regras do contrato de mandato previstas nos artigos 1157º e seguintes do CC, por via do artigo 1156º do mesmo código, que determina a sua aplicação às modalidades do contrato de prestação de serviço (artigo 1154º) que a lei não regule especialmente.

No que diz respeito às reparações, relevam o artigo 1422º nº2 a), ao estabelecer que é vedado aos condóminos “prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício” e o artigo 1427º, que estatui que “as reparações indispensáveis e urgentes nas partes comuns do edifício podem ser levadas a efeito, na falta ou impedimento do administrador, por iniciativa de qualquer condómino”.

As obras de reparação do prédio, terão, assim, de ser ordenadas pela assembleia de condóminos e não pelo administrador, sendo certo que os condóminos estão obrigados a realizar todas as obras necessárias a preservar a segurança do edifício e de terceiros, sob pena de eventualmente poderem vir a incorrer em responsabilidade civil de harmonia com o artigo 492º do CC.

E, quanto ao administrador, embora lhe caiba a execução e não a decisão sobre a realização de obras, não deixa de lhe ser atribuída a função de tomar a iniciativa de levar a efeito as reparações indispensáveis e urgentes.

Voltando ao caso dos autos, verifica-se que as obras em questão, não previstas no orçamento aprovado pelo condomínio, foram aprovadas e adjudicadas pela empresa administradora do mesmo.

Não ficou provado que esta actuação da administração resultasse de uma deliberação de condóminos, mas também não se provou que os condóminos não tiveram conhecimento da mesma na altura, nem da respectiva factura (pontos 11 a 25 dos factos não provados); pelo contrário, das obras referidas nas alíneas e), f), g), h), i), j) e m) do ponto 2 dos factos resulta que alguns dos condóminos não só tiveram conhecimento, como forçosamente aceitaram as obras em causa, tendo parte delas sido realizada no interior das suas fracções.   
   
Por outro lado, se é certo que a necessidade de realização destas obras não aparece explicada no corpo do ponto 2 dos factos, basta ler as suas alíneas para se concluir que as mesmas se impunham, pois, se não fossem realizadas, as obras orçamentadas perderiam a sua eficácia e utilidade (por exemplo os trabalhos das alíneas b), c) e d) do ponto 2 dos factos) ou então os prejuízos já sofridos nas fracções de alguns dos condóminos constituiriam o condomínio em responsabilidade civil (por exemplo alíneas h) e j) do mesmo ponto 2).

Deste modo, a actuação da administração tem de se enquadrar no âmbito das reparações indispensáveis e urgentes a que se refere o artigo 1427º do CC e a eventual inobservância de instruções resultante de não ter havido uma deliberação de condóminos a adjudicar os trabalhos está justificada nos termos do artigo 1162º do mesmo código que estabelece que “o mandatário pode deixar de executar o mandato ou afastar-se das instruções recebidas, quando seja razoável supor que o mandante aprovaria a sua conduta, se conhecesse certas circunstâncias que não foi possível comunicar-lhe em tempo útil”.

Com efeito, os trabalhos em causa apresentavam-se como urgentes, não só pela sua própria natureza (destinando-se a evitar infiltrações e danos por estas provocados, existindo fracções em que tais danos já se verificavam), mas também pelo facto de a constatação da sua premente necessidade ter surgido no decurso das obras adjudicadas, razão pela qual a suspensão das obras e os prejuízos daí decorrentes, desaconselhavam a convocação de uma assembleia extraordinária e sendo, pelo contrário, aconselhável o aproveitamento da presença da empreiteira já contratada e que tinha conhecimento dos vícios a reparar.

Por outro lado, também terá pesado na decisão da administração o facto de que, desde logo, vários condóminos tiveram conhecimento das obras que foram realizadas nas suas fracções, o que levaria a presumir que quer estes, quer os restantes condóminos aceitariam e aproveitariam os trabalhos em benefício do prédio, obstando a certos e futuros problemas.

Tudo visto e cabendo ao tribunal apreciar se, nos termos do artigo 1162º, é razoável supor que o condomínio aprovaria a conduta do administrador se este tivesse convocado uma assembleia extraordinária, tem de se concluir que a resposta é afirmativa (cfr sobre esta matéria P. Lima e A. Varela em CC anotado, volume II, página 797). 

Acresce ainda que, apesar do aumento considerável que estes trabalhos não orçamentados trouxeram para o preço global a pagar, não é esse valor que vem impugnado, não sendo alegados factos de que se pudesse concluir que o mesmo é excessivo para os trabalhos em causa, optando o réu por assumir uma posição de não admitir o evidente, ou seja, de não admitir que as obras eram efectivamente necessárias.

Improcedem, pois as alegações do apelante, devendo manter-se a sua condenação no pagamento reclamado pela apelada.   
                                                          
IV) Impugnação do depoimento testemunhal.

Subsidiariamente, pede o apelante que, não sendo revogada a sentença recorrida, seja anulado o julgamento para se proceder à reinquirição da testemunha FT…, que foi ouvida como parte.

Contudo, desde logo, ao não admitir este depoimento como um depoimento testemunhal, a decisão da 1ª instância ora impugnada constitui um despacho que rejeitou um meio de prova, admitindo outro diferente, o que integra a previsão da alínea d) do nº2 do artigo 644º do CPC, do qual caberia recurso de apelação autónomo no prazo legal já há muito decorrido, não se tratando, assim, de uma decisão interlocutória a que se refere o nº3 do mesmo artigo.

De qualquer modo, dir-se-á que, mesmo sendo a depoente em causa condómina do condomínio réu e não parte no processo, podendo ser ouvida como testemunha, não se descortina qual o prejuízo para o réu em a mesma ter sido ouvida como parte, pois, como se retira da gravação do seu depoimento, foi dada oportunidade às partes para a inquirirem directamente tal como se fosse uma testemunha, para além de que, caso fosse ouvida nessa qualidade, haveria sempre que ter em conta, nos costumes, o seu óbvio interesse na decisão da causa, pelo que sempre se trataria de uma irregularidade que, não influindo no exame ou decisão da causa, não constituiria nulidade, nos termos do artigo 195º do CPC.

Improcedem, portanto, também nesta parte, as alegações do apelante.
                                                        
DECISÃO.

Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação e confirma-se a sentença recorrida.                                                          
Custas pelo apelante.      
                       

                             
Lisboa, 2015-10-22

                                                     
Maria Teresa Pardal
Carlos Marinho 
Anabela Calafate              
Decisão Texto Integral: