Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | OLINDO GERALDES | ||
Descritores: | SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÃO SOCIAL OMISSÃO DE PRONÚNCIA NULIDADE DE SENTENÇA PROCURAÇÃO ASSEMBLEIA GERAL ANULAÇÃO DE DELIBERAÇÃO SOCIAL NOMEAÇÃO DE GERENTE | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/31/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Parcial: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I. É intangível a matéria de facto da sentença, quando esta inclui os factos relevantes admitidos por acordo, provados por documentos ou confissão escrita, e não foi impugnada a decisão sobre a matéria de facto, nos termos do art. 685.º-B do Código de Processo Civil. II. A nulidade da sentença, decorrente da omissão de pronúncia, não contempla a falta de especificação dos factos provados. III. Para evitar o vício formal da sentença, constante do art. 668.º, n.º 1, alínea c) do CPC, a decisão deve corresponder ao corolário lógico dos fundamentos de facto e de direito, como num silogismo. IV. A procuração outorgada para efeitos de representação voluntária, também designada por “carta mandadeira”, que não especifica as formas de deliberação abrangidas pela representação, é válida apenas para as assembleias gerais regularmente convocadas. V. Perante a invalidade da procuração para representação de outro sócio, este falta à assembleia geral, não convocada, sendo nulas as deliberações sociais tomadas, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 56.º do Código das Sociedades Comerciais. VI. Os bons costumes refletem as regras dominantes da moral social de uma determinada época e certo meio, abrangendo o conjunto de regras éticas aceites pelas pessoas honestas, corretas e de boa fama. VII. A invalidade, por anulação, da deliberação social abusiva está dependente de um pressuposto de natureza subjetiva e de outro de natureza objetiva. VIII. O primeiro pressuposto consiste na intenção ou vontade de obter vantagens especiais, materais ou de outra natureza, ou de causar prejuízos à sociedade ou aos sócios minoritários. IX. O segundo pressuposto traduz-se na adequação ou aptidão da deliberação social para alcançar o propósito ilegítimo pretendido. X. Não são abusivas as deliberações sociais que aprovam a nomeação de gerente, ainda que da confiança do sócio minoritário, e a alteração do pacto social, sem prejuízo da participação social existente. XI. As deliberações sociais causam um dano apreciável, quando é nomeado um gerente alheio à vontade do sócio maioritário, em sociedade com apenas dois sócios, e é aprovada uma alteração estatutária que modifica as regras de obtenção da maioria para certas matérias, com prejuízo da posição do sócio maioritário. (Sumário do Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I – RELATÓRIO “A” instaurou, em 29 de junho de 2012, no 1.º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa, contra “B”, Lda., procedimento cautelar de suspensão de deliberação social, pedindo que fosse ordenada a suspensão das deliberações de nomeação de gerente de “C” e da alteração dos artigos 5.º e 9.º do contrato de sociedade, constantes da “ata n.º 2” de 12 de setembro de 2008. Para tanto, alegou em síntese, ser cabeça de casal da herança de “D” que, à data do falecimento, era sócio maioritário da Requerida; a partir daquela data, “E” é o seu único gerente; entretanto, foi registada a designação da referida gerente, por efeito da deliberação de 12 de setembro de 2008, reunião que nunca existiu, sendo a “ata n.º 2” falsa; a nomeação, sendo de pessoa que vive em comum com “E”, permitirá a continuação da delapidação do património da Requerida e a não prestação de contas, que se tem verificado. Citada, a Requerida deduziu longa oposição, concluindo pela improcedência do procedimento cautelar. Realizada a audiência final, com gravação, foi proferida, em 10 de abril de 2013, a sentença, que julgou improcedente o procedimento cautelar, não decretando a providência cautelar. Inconformada com essa sentença, recorreu o Requerente e, tendo alegado, formulou essencialmente as seguintes conclusões: (…) Contra-alegou a Requerida, no sentido da improcedência do recurso. Pronunciando-se sobre as alegadas nulidades da sentença, a Mma. Juiz concluiu que a “sentença não padece das apontadas nulidades” (fls. 1062). Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. Neste recurso, está em discussão, essencialmente, para além da nulidade da sentença, por omissão de pronúncia e oposição entre os fundamentos e a decisão, a seleção da matéria de facto provada, a invalidade das deliberações sociais e a sua suspensão, como efeito do decretamento da providência cautelar especificada. II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos: 1. A Requerida, com sede em ..., está matriculada na Conservatória do Registo Comercial de .... 2. A Requerida dedica-se à indústria de construção civil e empreitadas públicas, compra e venda de prédios rústicos e urbanos. 3. Tem o capital social de € 2 425 000,00, distribuído por dois sócios: “E”, com a quota de € 791 250,01; e “D”, com a quota de € 1 633 749,99. 4. “D” e “E” são sócios e gerentes da Requerida desde a sua constituição, registada em 24.3.1986. 5. Desde 25.8.2008, mostra-se registada a cessação de funções de gerente da Requerida de “E”, por renúncia em 5.6.2007. 6. Desde 17.10.2008, mostra-se registada a designação de “E” como gerente da Requerida, com base em deliberação de 2.9.2008. 7. “D” desenvolvia a sua atividade profissional enquanto gerente da Requerida. 8. A procuração de 9.1.2008, na qual se mostra manuscrita uma assinatura onde se lê “D”, tem como teor: “Eu, “D” (…), constitui seu procurador, o seu filho “E” (…), residente na Rua da ..., n.º 3, ..., ..., ..., a quem concede os poderes para o representar nas assembleias gerais da sociedade com a firma "“B”, Lda.", (…) durante os anos de 2008 a 2010, podendo aí deliberar o que houver por conveniente, designadamente aumentos de capital, nomeação de gerente, inclusivamente podendo este auto e aprovação de contas sociais, confissões de dívida entre outras”. 9. “D” faleceu em 2 de outubro de 2008. 10. Desde 7.10.2008, mostra-se registada a cessação de funções de gerente de “D”, por óbito. 11. Aquando da morte, “D” deixou a carta de fls. 54, na qual, além do mais, se lê: “(…) faço este ato porque não suporto mais a chantagem e ameaças do filho mais novo que é um vigarista um ladrão que me roubou durante a vida e muitos e muitos milhares de contos. Agora ameaça com finanças e outras ameaças, a cota que está em nome dele não é dele, nunca me pagou um cêntimo, e (…) obrigar-se a dar-lhe o valor da cota os valores ficam serão certamente para o meu filho mais velho e para os netos que tiverem direito, peço para a empresa não ficar parada entreguem ao meu filho mais velho ou ao meu neto “F” peço isto porque estou farto cansado porque já tenho quase 73 anos e já não tenho forças para trabalhar tanto. O filho vigarista ladrão ele é que me tirou a vida, devia de ser preso, é um gatuno toda a vida fez só tentar me destruir. Gatuno, ladrão, vigarista, chantagista. (…) 2-10-2008”. 12. Meses antes do falecimento, “D” não mantinha uma boa relação com “E”. 13. A ata n.º 9 da assembleia geral da Requerida tem, designadamente, o seguinte teor: “Aos nove de julho de dois mil e oito, pelas vinte e uma horas, reuniu em assembleia geral extraordinária na sua sede social (…), tendo comparecido os sócios “D” (…) e “E” (…). Foi indicado para presidir (…) o sócio “D”, que leu a ordem de trabalhos: Ponto único: Deliberar sobre a dação em cumprimento ao Banco ..., S.A., (…) para liquidação das responsabilidades no montante de € 519 000,00 (quinhentos e dezanove mil euros) da sociedade “G” - Importação e Exportação de Produtos Alimentares, Lda., (…) com sede na ..., (…) para com aquela resultantes dos empréstimos n.º s, 005-0596, 005-0686 e 005- 0948. Aberta a reunião (…), foi posto à discussão o ponto único da ordem de trabalhos: Deliberar sobre a dação em cumprimento ao Banco ..., S.A., para liquidação das responsabilidades da sociedade “G” - Importação e Exportação de Produtos Alimentares, Lda., perante aquela instituição de crédito dos seguintes prédios urbanos: 1) fração autónoma designada pela letra "A”, correspondente ao Primeiro Piso, Sul Poente, destinado ao comércio, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal sito na Rua .../..., ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o n.º ..., da freguesia de ... e inscrito na matriz predial urbana da mesma freguesia sob o artigo Lt.... 2) fração autónoma designada pela letra "B', correspondente ao Primeiro Piso, Sul Nascente, destinado ao comércio, do prédio urbano supra referido. 3) fração autónoma designada pela letra "F', correspondente ao Segundo Piso Esquerdo, Bloco Sul, Entrada Nascente, com terraço na fachada norte e parqueamento no Piso Um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 4) fração autónoma designada pela letra "G”, correspondente ao Segundo Piso direito, Bloco Sul, Entrada Nascente, com terraço na fachada norte e parqueamento no Piso Um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 5) fração autónoma designada pela letra "I", correspondente ao Segundo Piso Frente, Bloco Sul, Entrada Sul/Poente, com três varandas na fachada sul e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 6) fração autónoma designada pela letra "L", correspondente ao Terceiro Piso Esquerdo, Bloco Sul, Entrada Sul/Nascente, com varanda na fachada norte e duas varandas na fachada sul e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 7) fração autónoma designada pela letra "M”, correspondente ao Terceiro Piso Trás, Bloco Sul, Entrada Sul/Nascente, com varanda na fachada Norte e lugar de parqueamento no logradouro a poente destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 8) fração autónoma designada pela letra "N", correspondente ao Terceiro Piso Frente/ Bloco Sul, Entrada Sul/Nascente, com três varandas na fachada Sul e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 9) fração autónoma designada pela letra "O" correspondente ao Terceiro Piso Frente/ Bloco Sul/Entrada Sul/Poente, com três varandas na fachada Sul e parqueamento no piso um/ destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 10) fração autónoma designada pela letra "P", correspondente ao Terceiro Piso trás/ Bloco Sul, Entrada Sul/Poente, com varanda na fachada Norte e lugar de parqueamento no logradouro a poente/ destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 11) fração autónoma designada pela letra "Q", correspondente ao Terceiro Piso Direito, Bloco Sul/Entrada/Poente, com varanda na fachada Norte, duas varandas na fachada Sul e parqueamento no piso um destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 12) fração autónoma designada pela letra "Y", correspondente ao Quarto Piso Trás, Bloco Sul, Entrada Sul/Nascente, com varanda na fachada Norte e parqueamento no logradouro a poente, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 13) fração autónoma designada pela letra "Z", correspondente ao Quarto Piso Frente, Bloco Sul, Entrada Sul/Nascente, com três varandas na fachada Sul e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 14) fração autónoma designada pela letra "BA", correspondente ao Quarto Piso Frente, Bloco Sul/Entrada Sul/Poente, com três varandas na fachada Sul e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 15) fração autónoma designada pela letra "BB"(correspondente ao Quarto Piso Trás, Bloco Sul, Entrada Sul/Poente, com varanda na fachada Norte e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 16) fração autónoma designada pela letra "BC"(correspondente ao Quarto Piso Direito, Bloco Sul, Entrada Sul/Poente, com varanda na fachada Norte, com duas varandas na fachada sul, e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 17) fração autónoma designada pela letra "BI", correspondente ao Quarto Piso Esquerdo, Bloco Norte, Entrada Norte/Poente, com varanda na fachada Sul, e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 18) fração autónoma designada pela letra "BG"(correspondente ao Quarto Piso Trás, 810co Norte, Entrada Norte/Poente, com duas varandas na fachada Norte, e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 19) fração autónoma designada pela letra "BH", correspondente ao Quarto Piso Frente, Bloco Norte, Entrada Norte/Poente, com varanda na fachada Sul, e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 20) fração autónoma designada pela letra "BJ', correspondente ao Quinto Piso Esquerdo, Bloco Sul, Entrada Sul/Nascente, com duas varandas na fachada Sul, e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 21) fração autónoma designada pela letra "BK", correspondente ao Quinto Piso Trás, Bloco Sul, Entrada Sul/Nascente, com varanda na fachada Norte, e parqueamento no piso um destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 22) fração autónoma designada pela letra "BM", correspondente ao Quinto Piso Frente, Bloco Sul, Entrada Sul/Poente, com três varandas na fachada Sul, e parqueamento no piso um!, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 23) fração autónoma designada pela letra "BN", correspondente ao Quinto Piso Trás! Bloco Sul! Entrada Sul/Poente, com varanda na fachada Norte, e parqueamento no piso um! destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 24) fração autónoma designada pela letra "BO", correspondente ao Quinto Piso Direito! Bloco Sul, Entrada Sul/Poente, com varanda na fachada norte, com duas varandas na fachada Sul! e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 25) fração autónoma designada pela letra "BT", correspondente ao Quinto Piso Trás, Bloco Norte! Entrada Norte/Poente, com varanda na fachada Sul, e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 26) fração autónoma designada pela letra "BY” correspondente ao Sexto Piso Frente Bloco Sul, Entrada Sul/ Poente, com três varandas na fachada Sul, e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 27) fração autónoma designada pela letra "BV", correspondente ao Sexto Piso Esquerdo! Bloco Sul, Entrada Sul/Nascente, com varanda na fachada Norte, e duas varandas na fachada Sul, e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 28) fração autónoma designada pela letra "BW”, correspondente ao Sexto Piso Trás, Bloco Sul, Entrada Sul/Nascente, com varanda na fachada Norte, e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 29) fração autónoma designada pela letra "BX", correspondente ao Sexto Piso Frente, Bloco Sul, Entrada Sul/Nascente, com três varandas na fachada Sul, e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 30) fração autónoma designada pela letra "BZ", correspondente ao Sexto Piso Trás, Bloco Sul, Entrada Sul/Poente, com varanda na fachada Norte, e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 31) fração autónoma designada pela letra "CA", correspondente ao Sexto Piso Direito, Bloco Sul, Entrada Sul/Poente, com varanda na fachada Norte, duas varandas na fachada Sul e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 32) fração autónoma designada pela letra "CB", correspondente ao Sexto Piso Direito, Bloco Norte, Entrada Norte/Nascente, com varanda na fachada Sul, com duas varandas na fachada Norte e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 33) fração autónoma designada pela letra "CD”, correspondente ao Sexto Piso Frente, Bloco Norte, Entrada Norte/Nascente, com duas varandas na fachada Norte, e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 34) fração autónoma designada pela letra "CF”, correspondente ao Sexto Piso Trás, Bloco Norte, Entrada Norte/Poente, com varanda na fachada Sul, e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 35) fração autónoma designada pela letra "CG", correspondente ao Sexto Piso Esquerdo, Bloco Norte, Entrada Norte/Poente, com duas varandas na fachada Norte, com uma varanda na fachada Sul e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 36) fração autónoma designada pela letra "CH", correspondente ao Sétimo Piso Direito, Bloco Norte, Entrada Norte/Nascente, com varanda na fachada Sul, com duas varandas na fachada Norte e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 37) fração autónoma designada pela letra "CI", correspondente ao Sétimo Piso Trás, Bloco Norte, Entrada Norte/Nascente, com varanda na fachada Sul e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 38) fração autónoma designada pela letra "CJ", correspondente ao Sétimo Piso Frente, Bloco Norte, Entrada Norte/ Nascente, com duas varandas na fachada Norte e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 39) fração autónoma designada pela letra "CK", correspondente ao Sétimo Piso Frente, Bloco Norte, Entrada Norte/Poente, com duas varandas na fachada Norte e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 40) fracção autónoma designada pela letra "CL", correspondente ao Sétimo Piso Trás, Bloco Norte, Entrada Norte/Poente, com varanda na fachada Sul e parqueamento no piso um, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. 41) fração autónoma designada pela letra "CM", correspondente ao Sétimo Piso Esquerdo, Bloco Norte, Entrada Norte/ Poente, com duas varandas na fachada Norte, varanda na fachada sul e parqueamento no piso dois, destinado à habitação do prédio urbano supra referido. Foi dado ênfase à necessidade de efetuar a dação em cumprimento dos imóveis supra identificados, uma vez que, dada a situação económica da sociedade “G” - Importação e Exportação de Produtos Alimentares, Lda., e o facto de a mesma não ter qualquer liquidez para proceder ao pagamento total das citadas responsabilidades financeiras advenientes, dos empréstimos referenciados no ponto da ordem de trabalhos, tendo finalizado com a apresentação formal da proposta de dação em cumprimento dos identificados prédios, a que atribuem o valor de € 2 661 761,85, pela qual se procederia à liquidação do valor que a sociedade “G” - Importação e Exportação de Produtos Alimentares, Lda., tem para com o Banco ..., S.A., é de € 519 000,00 € (…). Com a dação em cumprimento do imóvel supra referido, as responsabilidades financeiras da sociedade “G” - Importação e Exportação de Produtos Alimentares, Lda., perante o Banco ficarão totalmente liquidadas. Ainda declararam que a sociedade tem justificado interesse próprio na prossecução da dação em cumprimento supra identificada, dadas as relações económicas existentes com a sociedade “G” – Importação e Exportação de Produtos Alimentares, Lda., visto esta ter um direito crédito para com a sociedade ora reunida em assembleia geral, resultante de trabalhos e serviços efetuados para esta. Como tal e assim sendo, é de toda conveniência e interesse económico da sociedade ora reunida em assembleia geral a dação em cumprimento a favor do Banco ..., S.A., através dos bens supra identificados.” 14. Da escritura de habilitação de herdeiros de 8.10.2008, a fls. 44 a 47, consta, designadamente, que o Requerente “é cabeça de casal da herança aberta por óbito de seu pai “D”, que faleceu no estado de divorciado. Que ao falecido sucederam como seus únicos herdeiros legitimários, os seus filhos: (…) “A” e “E” (…). Que o autor da herança fez testamento público em seis de fevereiro de mil novecentos e noventa e um (…), pelo qual dispôs: (…) deixa a quota disponível dos seus bens a seu filho, “E”, solteiro, maior”. 15. Foi elaborada uma ata respeitante à assembleia geral da Requerida de 12.9.2008. 16. Da ata n.º 2, de 12.9.2008, consta, designadamente: “Aos doze dias do mês de Setembro do ano de dois mil e oito, pelas vinte e uma horas, reuniu na sua sede social (…) a assembleia geral extraordinária da (…) “B”, Lda., (…) compareceu o sócio “E” (…) por si e em representação do outro sócio “D”, (…) conforme carta mandadeira de nove Janeiro de dois mil e oito (…), com a seguinte ordem de trabalhos: Ponto Um: Nomeação para gerente de “C”. Ponto Dois: Deliberar sobre a alteração dos artigos 5.° e 9.º do pacto social. (…) deu-se início aos trabalhos, passando a ser analisado pela ordem indicada, (…) Ponto Um: (…) foi proposta a nomeação de “C” (…) para o cargo de gerente da sociedade, que posta à discussão e votação foi aprovada por unanimidade. Ponto Dois: (…) em consequência da deliberação anterior, é proposta uma nova redação a dar ao artigo 5.° do pacto social, bem como proceder alteração do artigo 9.° do pacto social, que passa ter a seguinte redação: Artigo 5.°: São gerentes os sócios “D” e “E” e a não sócia “C”, os quais poderão ou não auferir retribuição por tais funções, conforme for deliberado em assembleia geral. A sociedade obriga-se sempre com a assinatura de qualquer um dos gerentes, inclusivamente na compra e venda de veículos automóveis. Em caso de impedimento ou incapacidade temporária ou definitiva de qualquer um dos gerentes, designadamente morte ou interdição, caberá aos sócios exercer plenamente a gerência. Artigo 9.º: Fica determinado que todas e quaisquer deliberações societárias, respeitantes a aumento ou redução do capital social, fusão, cisão, transformação e dissolução de sociedade, prestação de contas, auditorias externas ou internas, cessões de quotas a não sócios e nomeação de gerentes dependem de aprovação por unanimidade dos sócios presentes. Foi a proposta amplamente discutida e depois submetida a aprovação, tendo sido aprovada por unanimidade. Nada mais havendo a tratar (…) encerrada pelas vinte e duas horas, lavrando de imediato a presente ata que vai ser assinada por quem nela interveio.” 17. A ata da assembleia de 12.9.2008 mostra-se assinada apenas uma vez por “E”, por si e como representante do sócio “D”. 18. No livro de atas da sociedade não constam quaisquer atas de outras assembleias realizadas entre a ata n.º 1/2006 de 31.3.2006 e a ata n.º 13 de 29.10.2008. 19. A ata n.º 2 de 12.9.2008 não está impressa no livro de atas que contém as atas n.º 1/2006 de 31.3.2006 a n.º13 de 29.10.2008. 20. No dia 13.10.2008, o Requerente remeteu a “E”, carta registada com A/R, recebida no dia 14.10.2008. 21. “E” não convocou assembleias gerais para apresentação e aprovação das contas relativas aos anos de 2008 a 2010 e não apresentou os relatórios de gestão e documentos de prestação de contas. 22. Não se mostra registada a prestação de contas da Requerida referente aos anos de 2008 a 2011. 23. Realizou-se uma assembleia geral no dia 29.10.2008, convocada pelo Requerente. 24. Essa assembleia realizou-se na casa (vivenda) sita na Quinta da ..., onde residia “D”. 25. Nessa assembleia, o Requerente pediu e foi-lhe exibida uma cópia da procuração passada por “D” a favor de “E”. 26. Nessa assembleia ficou ainda agendada uma nova assembleia para um mês depois, que não se realizou. 27. Da ata n.º 13, de 29.10.2008, a fls. 219/220, consta que a assembleia geral reuniu pelas 9.10h e terminou pelas 12.20h. 28. Em 2008 e até 2010, o advogado do Requerente era o Dr. “H”, que faleceu em dezembro de 2010, e o mesmo recebeu alguns documentos contabilísticos da Requerida. 29. O Requerente não foi convocado, nem tomou conhecimento de quaisquer outras assembleias gerais da Requerida realizadas após 29.10.2008 e antes da assembleia de 21.6.2012. 30. O Requerente não convocou qualquer assembleia geral entre 29.10.2008 e 21.6.2012. 31. Em 20.2.2001, “D” encontrava-se registado como sócio de “G” – Sociedade de Construções, Lda. 32. Em data anterior ao falecimento de “D”, foi realizada uma escritura de dação em pagamento de 41 imóveis ao Banco ..., S.A. 33. A fls. 361 a 369 consta a escritura de “dação em cumprimento”, de 20.12.2007. 34. Em 29.10.2008 “E”, atuando por si e como representante da Requerida, vendeu à “G” Sociedade de Construções, Lda., 48 imóveis, com o valor patrimonial de € 1 940 063,56, designadamente: a) Verba n.º 45: valor patrimonial de € 290 375,33, valor de venda de € 100 000,00. b) Verba n.º 46: valor patrimonial da parte transmitida (metade) é de € 22 695,32, o valor de venda de € 23 000,00. c) Verba n.º 47: valor patrimonial da parte transmitida (metade) é de € 22 747,19,0 valor de venda de € 23 000,00. d) Verba n.º 48: valor patrimonial da parte transmitida (metade) é de € 22 809,44, o valor de venda de € 23 000,00. e) Verba n.º 24: valor patrimonial é de € 65 381,72, o valor de venda de € 70 000,00. f) Verba n.º 25: valor patrimonial é de € 51 064,24, o valor de venda de € 55 000,00. g) Verba n.º 26: valor patrimonial é de € 41 135,07, o valor de venda de € 45.000,00. h) Verba n.º 27: valor patrimonial é de € 61 550,64, o valor de venda de € 65 000,00. i) Verba n.º 32: valor patrimonial é de € 64 476,00, o valor de venda de € 65 000,00. j) Verba n.º 33: valor patrimonial é de € 62 322,21, o valor de venda de € 65 000,00. k) Verba n.º 34: valor patrimonial é de € 41 548,14, o valor de venda de € 45 000,00. 35. A venda foi celebrada, por documento particular, perante o advogado, Dr. “I”. 36. Consta da segunda folha do documento de compra e venda que os prédios são vendidos "mediante o preço global de três milhões oitocentos e trinta mil euros" e no final consta "do referido preço de três milhões novecentos e cinco mil euros". 37. Consta ainda da parte final desse documento: "(…) disseram por último os outorgantes nas invocadas qualidades: que o referido preço de três milhões, novecentos e cinco mil euros vai ser pago do seguinte modo: cinquenta mil euros, que são entregues neste ato, do qual o primeiro outorgante dá a respectiva quitação; e o remanescente, no montante de três milhões oitocentos e cinquenta e cinco mil euros, ficarão à disposição da sociedade compradora, a qual, no limite deste montante, fica responsável pela amortização dos montantes em dívida, cancelamentos dos ónus acima mencionados e demais responsabilidades e despesas de qualquer natureza, que sobre os imóveis incidem". 38. O denominado "documento particular de compra e venda" faz referência à existência de hipotecas e de uma penhora relativamente aos imóveis identificados com os n.º s. 5, 6 (penhora da Fazenda Pública pelo valor de € 7 173,98), 10, 20, 22, 23, 25, 26, 41, 42 e 43. 39. No denominado "documento de compra e venda" relativamente aos imóveis identificados com os n.º s 5, 6, 10, 20, 22, 23, 25, 26, 41 e 43, a propósito da penhora e das hipotecas sobre eles incidentes, fez-se constar que "o respetivo cancelamento se encontra assegurado, o que o requerido declara sob sua inteira responsabilidade". 40. No denominado "documento de compra e venda" não é feita qualquer referência aos montantes em dívida, com exceção da garantida pela penhora fiscal. 41. No negócio referido não intervieram credores a consentir a transmissão das dívidas. 42. As vendas de imóveis, realizadas após o falecimento de “D”, eram do conhecimento do Requerente, na data de instauração do presente procedimento cautelar. 43. Com data de 27.7.2009, a Requerida e “E” subscreveram o denominado ”Contrato de compra e venda e gestão de património”, constante de fls. 396 e ss., em que o segundo outorgou em nome próprio e como gerente da Requerida. 44. Com data de 29.10.2010, a Requerida, como segunda contraente, e “G” –Sociedade de Construções, Lda., como primeira, constam do denominado “contrato de gestão e recebimento de rendas”, a fls. 397 e ss. 45. As frações identificadas têm o seguinte valor patrimonial: - art.º 7381 de € 22 195,00; - art.º 7382 de € 22 215,00; - art.º 7383 de € 22 225,00; - art.º 7385 de € 22 975,00; - art.º 7386 de € 22 120,00; - art.º 7387 de € 22 050,00; - art.º 7388 de € 21 965,00. 46. A fls. 387, mostra-se a ata n.º 7 de 5.6.2007. 47. Realizou-se uma assembleia geral da Requerida no dia 21.6.2012, convocada pelo Requerente. 48. Na data anterior a essa assembleia, o Requerente tomou conhecimento, pelo seu mandatário, que estava registada a nomeação, como gerente, de “C”. 49. Nessa data, não foi possível imprimir a certidão da matrícula da Requerida, mas apenas ter acesso à primeira página. 50. Na assembleia de 21.6.2012, foi entregue ao Requerente um livro de atas. 51. Na assembleia geral, que se realizou em junho de 2012, “E” invocou não ser possível fechar as contas do ano de 2008, por falta de documentos. 52. A fls. 238 a 249, mostra-se a ata da assembleia geral de 21.6.2012. 53. Por Ap.85/20120618, foi registada a alteração dos artigos 5.º e 9.º do contrato de sociedade da Requerida, com a designação de “C” como gerente da Requerida, residente na Rua da ..., n.º 3, ..., ..., com base na deliberação de 12.9.2008. 54. Em 25.6.2012, foi entregue na Conservatória do Registo Comercial de ..., pelo mandatário do Requerente, um pedido de registo de designação de membro de órgão social – gerência. 55. Em 27.6.2012, o mandatário do Requerente foi notificado pela referida Conservatória de que deveria, em cinco dias, suprir a deficiência resultante da divergência entre o constante do contrato e a ata, quanto à representação do capital exigido para a nomeação de gerente. 56. Em 28.6.2012, estava pendente de registo um pedido apresentado em 25.6.2012, referente à designação de membro de órgão social. 57. A fls. 376 mostra-se a carta de 16.4.2009, remetida à Requerida. 58. Em 13.5.2009, estava pendente no Tribunal de ..., 1.º Juízo Cível, o P. n.º 2 .../09.3TBVFX, em que era Exequente, “G” – Importação e Exportação de Produtos Alimentares, Lda., e Executada, a Requerida. 59. A fls. 384/385 mostra-se o despacho de arquivamento proferido no P. n.º .../08.7GCMFR. 60. Do relatório de perícia de investigação biológica de parentesco resulta que a probabilidade de “E” e “A” serem irmãos consanguíneos é de 4,08%. 61. No procedimento cautelar de suspensão de deliberação social tomada na assembleia de 2.9.2008, que nomeou gerente “E”, instaurado pelo Requerente contra a Requerida, e que correu termos sob o n.º .../08.0TYLSB-A, no 4.º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa, foi proferida a decisão de 15.6.2009, declarando a caducidade do direito do Requerente, por não ter sido exercido no prazo fixado no art. 396.º do CPC e, por essa razão, a Requerida absolvida da instância. 62. O Requerente não intentou qualquer ação anterior à presente, questionando a validade da nomeação, como gerente, de “C”. 63. A decisão proferida no P. n.º .../12.6TYLSB, no 1.º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa, é de 16.5.2012. 64. Esta decisão foi proferida sem audição do Requerido, encontrando-se designada data para a inquirição das testemunhas indicadas por aquele. 65. O Requerente teve acesso ao teor da certidão emitida pelas Finanças referente ao património imobiliário da Requerida. *** 2.2. Descritos os factos declarados provados pela sentença recorrida (expurgados de redundâncias), importa conhecer do objeto do recurso, delimitado pelas suas conclusões, e cujas questões jurídicas emergentes foram antes identificadas. No âmbito da matéria de facto, o Apelante impugnou a omissão da especificação na sentença de factos que, no seu entender, foram confessados ou admitidos por acordo. Aparentemente, o Apelante não deixa de ter alguma razão, porquanto, no despacho que respondeu à matéria de facto, foi dada como provada a correspondente alegação (fls. 879), a qual, depois, não foi transposta para a sentença, como de resto exigiria o disposto no n.º 3 do art. 659.º do Código de Processo Civil/1961 (CPC). Todavia, para a decisão da causa, e na perspetiva do Requerente do procedimento cautelar, interessava apenas os factos relevantes, tendo em consideração, para esse efeito, a causa de pedir e o pedido. A ideia de relevância dos factos deve estar presente, designadamente no momento da decisão da matéria de facto, em particular quando, antes, não tiver havido qualquer seleção da matéria de facto. Na alegação do Apelante, porém, deparamos com matéria conclusiva, nomeadamente a descrita nos artigos 25.º e 91.º do requerimento inicial, e, como tal, não deve incluir o acervo factual da causa, como se infere do disposto no n.º 4 do art. 646.º do CPC, que determina como não escritas as respostas sobre questões de direito. Por outro lado, a matéria dos artigos 16.º, 38.º, 41.º, 47.º, 57.º a 65.º, 70.º, 71.º, 78.º, 81.º, 83.º, 84.º, 90.º, 94.º e 116.º do requerimento inicial não é, na sua maioria, relevante para a decisão da causa, mesmo considerando as várias soluções plausíveis da questão de direito, para além de outra apenas poder ser provada por documento, sendo certo ainda que não estão em causa factos principais da ação. Por sua vez, a matéria dos artigos 34.º a 37.º do requerimento inicial também não releva como factos principais da ação, não sendo suscetíveis de influenciar a decisão do pedido de suspensão das deliberações sociais. Assim, a impossibilidade legal, por um lado, e a irrelevância da matéria alegada, por outro, não justifica a sua inserção no acervo factual da sentença, ainda que, indevidamente, tivesse sido dada como provada no despacho que decidiu a matéria de facto. O Apelante refere, ainda, outra matéria alegada que, estando confessada ou provada por documento não impugnado e até por testemunhas, também foi omitida da sentença recorrida. A esse propósito, a matéria do artigo 17.º do requerimento inicial remete para o conteúdo do documento de fls. 219/220, correspondente à ata da assembleia geral de 29.10.2008 (facto n.º 27), não se justificando, em face da resposta à matéria de facto (fls. 880), qualquer alteração. Por outro lado, a ata da assembleia geral interessa por aquilo que documenta daquele ato societário, sendo irrelevante o que dela não consta. Por outro lado, a matéria dos artigos 39.º e 40.º do requerimento inicial, que obteve resposta negativa (fls. 880), respeitante aos termos de uma ação judicial, só podia resultar provado, desde que tivesse sido apresentado o documento que a tivesse comprovado, mas que o Apelante, porém, não especifica, limitando-se a referir uma eventual confissão, que, neste caso, seria ineficaz, por o facto carecer de prova documental. A matéria dos artigos 42.º e 43.º do requerimento inicial, com resposta negativa (fls. 880), corresponde à alegação de dois contratos de compra e venda de imóveis, cuja prova é feita por documento, com a consequente ineficácia da eventual confissão. Também tal documento, comprovando o negócio jurídico, não foi especificado pelo Apelante. No que se refere aos artigos 68.º e 75.º do requerimento inicial, consta da sentença recorrida a sua especificação (facto n.º 15), em conformidade com a resposta à matéria de facto (fls. 880). Embora o Apelante manifeste sua discordância, não a fundamenta em qualquer meio de prova vinculada, nem, por outro lado, impugnou, nos termos legais, a decisão sobre a matéria de facto (art. 685.º-B do CPC). Quanto aos artigos 76.º e 101.º do requerimento inicial, não foi dada qualquer resposta, por conterem apenas matéria conclusiva ou de direito (fls. 879), ao passo que, relativamente ao artigo 93.º do requerimento inicial, a sentença recorrida não deixou de enunciar o facto (n.º 53), de harmonia com a resposta à matéria de facto (fls. 881). Na verdade, a afirmação de que uma ata foi “forjada” corresponde a um juízo conclusivo sobre a desconformidade desse documento com a realidade, nomeadamente quando atesta um facto que não se verificou (art. 372.º do Código Civil (CC)). A desconformidade com a realidade há de resultar da prova de um ou mais factos que permitam surpreendê-la, sendo certo ainda que, na perspetiva ampla do Apelante, estava em causa a alegada inexistência da reunião de sócios. Nestes termos, a sentença recorrida não deixou de considerar os factos relevantes provados, nomeadamente no contexto da causa de pedir e do pedido da ação, não havendo qualquer violação da lei processual, designadamente do disposto no art. 659.º, n.º 3, do CPC. Além de não terem sido desconsiderados na sentença recorrida factos relevantes admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão escrita, não foi também impugnada a decisão sobre a matéria de facto, nomeadamente nos termos do art. 685.º-B do CPC, donde resulta, por isso, a intangibilidade da matéria de facto, nos termos em que ficou descrita na sentença recorrida. 2.3. O Apelante arguiu a nulidade da sentença recorrida, nos termos da alínea d) do n.º 1 do art. 668.º do CPC, quer por omitir factos fundamentais provados, quer por não ter apreciado a questão do dano apreciável. A referida nulidade da sentença, decorrente da omissão ou excesso de pronúncia com conexão ao dever que recai sobre o juiz consagrado no art. 660.º, n.º 2, do CPC, não contempla a falta de especificação de factos provados, por daí não emergir qualquer situação de omissão de pronúncia, nomeadamente sobre as questões decorrentes da causa de pedir e do pedido. A ausência total da especificação dos factos provados, consubstanciando a falta de fundamentação de facto da sentença, gera a sua nulidade, mas com fundamento no disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 668.º do CPC. Por outro lado, tendo sido alegada a invalidade das deliberações sociais, que não veio a proceder, com a consequente improcedência do procedimento cautelar, perdeu utilidade a pronúncia sobre a questão do dano apreciável causado pela execução das deliberações sociais. Nesse caso, o juiz não estava obrigado a pronunciar-se sobre a questão, por ter ficado prejudicada pela solução dada a outra, como está expressamente previsto na primeira parte do disposto no n.º 2 do art. 660.º do CPC. O Apelante arguiu ainda a nulidade da sentença recorrida, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art. 668.º do CPC, porquanto os fundamentos invocados na sentença, quanto a uma deliberação social abusiva, deveriam conduzir a uma solução oposta. Esta nulidade da sentença decorre da oposição entre os fundamentos e a decisão. Para evitar esse vício formal da sentença, a decisão deve corresponder ao corolário lógico dos fundamentos de facto e de direito, como num silogismo (judiciário). No caso, entendeu-se que as deliberações sociais não eram abusivas, decidindo-se pela improcedência do procedimento cautelar e não decretando a providência cautelar. Esta decisão está em inteira coerência com os fundamentos aduzidos, nomeadamente quanto à falta de verificação dos pressupostos da deliberação social abusiva. A eventualidade dos factos provados obrigar a concluir por uma deliberação social abusiva tipifica um erro de julgamento, a corrigir pelo recurso, mas não afeta a estrutura formal da sentença, que assim permanece sem vício. Nestes termos, improcede a arguição de nulidade da sentença. 2.4. Delimitada a matéria de facto provada, vejamos então se as deliberações sociais, da assembleia geral da Apelada, de 12 de setembro de 2008, são inválidas, como insiste o Apelante, em divergência com a sentença recorrida que, concluindo pela falta da ilicitude, não decretou a providência cautelar da suspensão de deliberações sociais. Para conhecer da invalidade de tais deliberações sociais, interessa analisar, designadamente, os poderes de representação voluntária, a sua ofensa aos bons costumes e o exercício abusivo do voto. Da introdução da questão jurídica principal, intui-se como adquirida a realização da referida assembleia geral, na qual foram tomadas as deliberações sociais documentadas em ata, que vêm impugnadas, por serem nulas ou anuláveis. Assim, não se questionando a materialidade das deliberações sociais, deixa de ter relevância, para a solução do caso sub judice, a alegação de falsidade da ata da assembleia geral, nomeadamente de não corresponder à realidade de ter sido lavrada de imediato, tal como consta do instrumento documental. Na verdade, decorre da matéria de facto provada que, na assembleia geral da Apelada, de 12 de setembro de 2008, esteve presente o sócio “E” e o sócio “D”, este representado por aquele, ao abrigo da procuração outorgada em 9 de janeiro de 2008, através da qual foram concedidos poderes de representação “nas assembleias gerais” da Apelada, nomeadamente “durante os anos de 2008 a 2010, podendo aí deliberar o que houver por conveniente, designadamente aumentos de capital, nomeação de gerente (…) e aprovação de contas sociais, confissões de dívida, entre outras”. Tal assembleia geral realizou-se sem convocação (como todos reconhecem) e teve, como ordem de trabalhos, a nomeação de um gerente e a alteração dos artigos 5.º e 9.º do pacto social. Como se aludiu, o sócio “D” fez-se representar na assembleia geral pelo outro sócio (minoritário), “E”, a favor de quem fora outorgada uma procuração, nomeadamente em 9 de janeiro de 2008. Com essa representação, estaria completo o capital social da sociedade na assembleia geral. A representação voluntária é admissível, designadamente nas sociedades por quotas, como prevê, expressamente, o art. 249.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC). Nesse âmbito, estabelece-se que os instrumentos de representação voluntária que não mencionem as formas de deliberação abrangidas são válidas apenas para as deliberações a tomar em assembleias gerais regularmente convocadas (n.º 2). Para além da restrição da representação voluntária, proibindo-a, no caso das deliberações por voto escrito, por se ter como desnecessária, limita-se ainda a sua possibilidade aos casos de assembleias gerais regularmente convocadas, quando não se especifique, expressamente, no documento de representação as formas de deliberação, nomeadamente as previstas no art. 54.º, n.º 1, do CSC (RAUL VENTURA, Sociedade por Quotas, Vol. II, 1989, pág. 208, PINTO FURTADO, Deliberações dos Sócios, 1993, pág. 207, e A. MENEZES CORDEIRO (Coordenador), Código das Sociedades Comerciais Anotado, 2009, pág. 660). A procuração referida nos autos, que funciona como instrumento de representação voluntária, que, tradicionalmente, é também designada por “carta mandadeira” (P. PAIS DE VASCONCELOS, A Participação Social nas Sociedades Comerciais, 2.ª edição, 2006, pág. 126), não especifica, de modo algum, as formas de deliberação abrangidas pela representação (facto n.º 8). Face a esta omissão, a procuração é válida apenas para as assembleias gerais regularmente convocadas, como estatui o n.º 2 do art. 249.º do CSC. Não foi esse, porém, o caso da assembleia geral da Apelada, realizada no dia 12 de setembro de 2008, que decorreu sem qualquer convocação. Nestas circunstâncias, a procuração emitida a 9 de janeiro de 2008 não era válida, como instrumento de representação do sócio “D”, para deliberar na assembleia geral do dia 12 de setembro de 2008, por efeito do disposto no n.º 2 do art. 249.º do CSC. Perante a invalidade da procuração para representação do sócio “D”, tem de concluir-se que este faltou à assembleia geral de 12 de setembro de 2008, sendo nulas as deliberações tomadas, por ausência de convocação, como decorre do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 56.º do CSC, que contempla, como causa de nulidade das deliberações sociais, um vício de processo ou de procedimento. Para além disso, o Apelante alega, também, vícios de conteúdo ou de substância, nomeadamente por ofensa aos bons costumes e abuso do direito, por a deliberação permitir bloquear ou “anular” os efeitos de uma decisão judicial ou de uma assembleia geral e por o mandato ter sido utilizado contra o mandante. Na verdade, são nulas as deliberações sociais cujo conteúdo, diretamente ou por atos de outros órgãos que determine ou permita, seja ofensivo, designadamente, dos bons costumes – art. 56.º, n.º 1, alínea d), do CSC. O efeito da ofensa aos bons costumes é visto, por alguns, como referência ao disposto no art. 280.º, n.º 2, do Código Civil (CC) (A. MENEZES CORDEIRO, Ibidem, pág. 222), e, por outros, ao abuso do direito, previsto no art. 334.º do CC, como no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de janeiro de 1993 (BMJ n.º 423, pág. 539). Seja como for, o efeito jurídico será sempre o mesmo, isto é, a nulidade da deliberação ofensiva dos bons costumes. Por outro lado, o conceito de bons costumes encontra-se no direito civil, podendo até considerar-se redundante a sua referência no âmbito do Código das Sociedades Comerciais. Os bons costumes, com efeito, refletem as regras dominantes da moral social de uma determinada época e certo meio, abrangendo o conjunto de regras éticas aceites pelas pessoas honestas, corretas e de boa fama (RODRIGUES BASTOS, Das Relações Jurídicas, III, 1968, pág. 188, e C. MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil, 1980, pág. 435). Com tal injunção, procura-se salvaguardar o respeito pela moral dominante num certo tempo e espaço (P. PAIS DE VASCONCELOS, Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª edição, 2007, pág. 740). No âmbito do direito comercial, fala-se até de uma “deontologia comercial”, a fazer observar “quando estejam em jogo violações grosseiras, em termos a determinar in concreto” (A. MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito das Sociedades Comerciais, I, 2004, pág. 649). Explicitado o entendimento doutrinário do conceito de bons costumes e reportando à materialidade provada, não é possível concluir que as deliberações sociais da assembleia geral da Apelada, de 12 de setembro de 2008, fossem ofensivas dos bons costumes. Quer a deliberação de nomeação de gerente, quer a alteração do pacto social não são suscetíveis de ofender os bons costumes. Com efeito, tanto a nomeação de gerente é um ato normal da vida das sociedades por quotas, como a alteração do pacto social corresponde também a uma situação corrente, justificada pela necessidade de adaptação superveniente do contrato de sociedade. Tais deliberações sociais, por si, não violam quaisquer normas da moral dominante. Por outro lado, a eventual gerência exercida contra o interesse social pode fazer incorrer o gerente nomeado em responsabilidade civil, sendo certo ainda que, continuando a participação social dos sócios a manter-se, é possível proceder a nova modificação do pacto social e, dessa forma, fazer respeitar o interesse social de acordo com a vontade maioritária. Para além disso, a própria deliberação social ilícita pode ainda também justificar a efetivação da responsabilidade civil, nos termos gerais do direito. Conclui-se, portanto, que as deliberações sociais da assembleia geral de 12 de setembro de 2008 não são ofensivas dos bons costumes. O Apelante invocou ainda a anulabilidade da deliberação social, ao abrigo do art. 58.º, n.º 1, alínea b), do CSC, em virtude do sócio “E” ter conseguido, dessa forma, vantagens especiais para si, ao colocar-se na posição de nada de importante poder ser decidido sem o seu voto, apesar da sua posição minoritária, ao mesmo tempo que, sendo o gerente da sua confiança, acaba por ser maioritário na gerência da sociedade. A questão suscitada leva-nos à figura das deliberações sociais abusivas, inspirada no direito alemão e consagrada normativamente no art. 58.º, n.º 1, alínea b), do CSC. Esta norma legal, com vertente mais subjetivista do que a plasmada no abuso do direito consagrado no art. 334.º do CC, tem uma aplicação mais restrita e específica, quando confrontada com a do abuso do direito, limitada às deliberações sociais para as quais foi determinante, para a sua aprovação, o exercício do voto abusivo por um ou mais sócios (P. PAIS DE VASCONCELOS, A Participação Social nas Sociedades Comerciais, pág. 161). A deliberação social abusiva ocorre quando se pretende obter uma vantagem especial em detrimento da sociedade ou de outros sócios ou, simplesmente, um prejuízo da sociedade ou dos sócios. A invalidade da deliberação social abusiva está dependente de dois pressupostos, um de natureza subjetiva e outro de natureza objetiva. O primeiro consiste na intenção ou vontade de obter vantagens especiais, materiais ou de outra natureza, ou de causar prejuízos à sociedade ou aos sócios minoritários. A vantagem é especial, por não ser extensível à generalidade dos sócios, em desrespeito pelo princípio da igualdade de tratamento dos sócios. O segundo pressuposto da deliberação social abusiva traduz-se na adequação ou aptidão da deliberação social para alcançar o propósito ilegítimo pretendido. Não é indispensável a existência de um nexo de causalidade imediata, bastando que as vantagens especiais se reflitam, negativa e mediatamente, na esfera jurídica da sociedade ou dos sócios minoritários. Por outro lado, é suficiente o dolo eventual, que poderá resultar tanto da prova direta como do conjunto dos factos que, objetivamente, o possa revelar, designadamente através do recurso às presunções judiciais. Na deliberação social abusiva, onde primacialmente se sindica o voto, surpreende-se a violação do dever de lealdade do sócio, a que o mesmo, por efeito do contrato de sociedade, está adstrito, quer para com a sociedade, quer também para com os demais sócios (P. PAIS DE VASCONCELOS, A Participação Social nas Sociedades Comerciais, pág. 315, COUTINHO DE ABREU, Curso de Direito Comercial, II, 2003, pág. 305, e FRANCESCO GALGANO, Tratado di Diitto Commerciale e di Diritto Pubblico dell`Economia, Volume VII, pág. 229). Pelo dever de lealdade, o sócio está obrigado a adotar um comportamento não contrário ao exigido pelo interesse social. Seguindo a doutrina contratualista, dominante sobre a institucionalista, o interesse social corresponde ao interesse comum dos sócios, levados a contribuir para o exercício de certa atividade, a fim de partilharem lucros, tendo a sociedade um interesse diferente daquele que corresponde ao do conjunto dos sócios, que os motivou à participação social (RAUL VENTURA, Sociedades por Quotas, III, 1991, págs. 150 e 151, VASCO LOBO XAVIER, Anulação de Deliberação Social e Deliberações Conexas, 1998, pág. 242 a 246, COUTINHO DE ABREU, Ibidem, págs. 286 a 303, e A. MENEZES CORDEIRO, Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedades Comerciais, págs. 521/522). A averiguação da deliberação social abusiva parte da sindicância do exercício singular do direito de voto para, subsequentemente, sem o voto abusivo, se proceder à designada “prova de resistência”, justificada pela irrelevância, para efeitos de anulabilidade, da deliberação social tomada, mesmo sem a contagem dos votos abusivos. Para justificar a anulabilidade da deliberação social, não basta o voto abusivo, é necessário também que esse voto seja determinante na aprovação da deliberação social. Desenhado o quadro legal da deliberação social abusiva, não se vislumbra nas deliberações sociais da assembleia geral da Apelada, de 12 de setembro de 2008, a obtenção de vantagens especiais, por parte do sócio “E”, em detrimento da sociedade ou de outros sócios. Na verdade, a nomeação do gerente, ainda que possa ser da confiança do referido sócio, não representa a obtenção de uma vantagem especial, não se surpreendendo qualquer violação do princípio da igualdade de tratamento dos sócios. Por outro lado, não está demonstrado também que daí possa advir prejuízo para o outro sócio ou mesmo para a sociedade. Além disso, a participação social dos dois sócios não se alterou, por efeito das deliberações sociais, tendo continuado o sócio “D” a dispor da maioria do capital social e, nessa medida, a poder influenciar, decisivamente, a vontade da sociedade. Por esta razão, mantendo o sócio “D” uma participação social maioritária, as deliberações sociais não eram idóneas para alcançar um propósito ilegítimo. Nestes termos, não se tipificando quaisquer deliberações sociais abusivas, nos termos previstos no art. 58.º, n.º 1, alínea b), do CSC, não há fundamento, por esse motivo, para concluir pela invalidade das deliberações sociais. Todavia, como se concluiu antes, as deliberações sociais aprovadas na assembleia geral de 12 de setembro de 2008 são inválidas, por serem nulas, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 56.º do CSC. Para além das deliberações sociais serem contrárias à lei, a sua execução pode causar um dano apreciável, na medida em que foi nomeado um gerente alheio à vontade do sócio maioritário, quando a sociedade tem apenas dois sócios, o qual não esteve devidamente representado na assembleia geral, podendo daí resultar prejuízos tanto para a sociedade como para os interesses do sócio maioritário, dano potenciado pelo tempo em que foram tomadas as deliberações sociais. Acresce ainda que a alteração estatutária, introduzindo modificações nas regras da obtenção da maioria para certas matérias, prejudica também a posição do sócio maioritário, que, apesar da limitação já referida do instrumento de representação, não autorizou, como resulta do respetivo conteúdo, a alteração absoluta do contrato de sociedade. Deste modo, em termos de probabilidade, encontra-se igualmente preenchido o requisito do periculum in mora (A. ABRANTES GERALDES, Temas da Reforma do Processo Civil, IV, 2003, pág. 91). Nestas condições, perante as deliberações sociais contrárias à lei e, por isso, inválidas, com a sua execução a poder causar um dano apreciável, estão reunidos os pressupostos legais que determinam a suspensão das deliberações sociais, nomeadamente nos termos do disposto no n.º 1 do art. 396.º do CPC. Assim, procedendo o recurso, é de revogar a decisão recorrida e decretar a providência cautelar especificada de suspensão das deliberações sociais da assembleia geral da Apelada de 12 de setembro de 2008. 2.5. Em conclusão, pode extrair-se de mais relevante: (…) 2.6. A Apelada, ao ficar vencida por decaimento, é responsável pelo pagamento das custas, em conformidade com a regra da causalidade consagrada no art. 446.º, n.º s 1 e 2, do CPC. III – DECISÃO Pelo exposto, decide-se: 1) Conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida e, em sua substituição, decretar a suspensão das deliberações sociais da assembleia geral da sociedade, realizada no dia 12 de setembro de 2008. 2) Condenar a Apelada (Requerida), no pagamento das custas. Lisboa, 31 de outubro de 2013 Olindo dos Santos Geraldes Lúcia Sousa Magda Geraldes | ||
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