Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ANA LUCINDA CABRAL | ||
Descritores: | SOCIEDADE COMERCIAL REGISTO COMERCIAL REGISTO INFORMÁTICO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/02/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I - O registo de constituição on line de uma sociedade através do sítio da internet www.portaldaempresa.pt, porque depende do prévio tratamento dos dados e apreciação do pedido de constituição da sociedade, diligências da competência do conservador e dos oficiais de registo, sendo um registo por transcrição depende sempre da avaliação dos elementos que definem a situação jurídica das entidades sujeitas a registo constantes dos documentos apresentados. II – Assim sendo a data relevante do registo da sua constituição não é a da submissão on line do pedido de registo mas sim a da anotação no competente organismo da apresentação do pedido por via informática. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa
I. Relatório “G” – SGPS, SA”, pessoa colectiva nº (…), com sede na Rua da (…) Carnaxide, veio interpor o presente recurso de impugnação do despacho 16.07.2010 do Vice-Presidente do Instituto dos Registos e do Notariado, que julgou improcedente o recurso hierárquico interposto pela impugnante da recusa de rectificação do registo de constituição da sociedade. Alega em síntese que a constituição online da sociedade foi pedida através do portal da empresa no dia 31.12.2009 pelas 16.15 horas, tendo o pedido sido considerado validamente submetido e emitido o respectivo comprovativo electrónico, que foi remetido nesse mesmo dia pelas 16.29 horas por e-mail para a requerente, que por sua vez efectuou o pagamento dos emolumentos ainda nesse dia. E que foi notificada no dia 1.01.2010 que o pedido de registo de constituição da sociedade, entregue via internet em 1.01.2010 às 6horas,foi recebido, tendo-lhe sido atribuído o número de apresentação da CRC de Lisboa Ap.13/20100101. O registo carece de rectificação, alega, no que à data aposta da Insc. 1, Ap 13 respeita, de que deve passar a constar a data de 31.12.2009 ou, em alternativa, ser averbada tal rectificação. O RNPC reconheceu que o pedido foi apresentado em 31.12.2009 e que por meras razões técnicas, exclusivamente imputáveis ao RNPC, foi registada a apresentação com a data de 1.01.2010. Tal facto porém, não pode prejudicar a impugnante (e prejudica, por para si ser fundamental considerar-se constituída ainda no ano de 2009). O Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, concordando com o parecer emitido pelo RNPC que fundamentou a decisão do recurso hierárquico. Foi proferida decisão a julgar improcedente o recurso de impugnação interposto pela “G” – SGPS, SA” do despacho 16.07.2010 do Vice-Presidente do Instituto dos Registos e do Notariado. A Autora, “G” – SGPS, SA”, interpôs recurso, concluindo. A) A sociedade então denominada “X”-SGPS, SA ao completar, escrupulosamente, todos os passos que a lei lhe exige para o registo online de constituição de sociedade, numa data e hora determinada, tem a legítima expectativa do reconhecimento de que tal conduta foi praticada nessa data e hora, ou seja, a constituição da sociedade foi validade apresentada a registo em 31.12.2009, tanto mais que tal procedimento é registado por um mecanismo automático. B) Ou seja, pelo facto de essa conduta ter sido praticada através de um procedimento telemático, não pode o interessado ver diminuída ou colocada em risco a eficácia temporal de tais condutas. C) Muito menos cabe que tal entidade faça recair sobre o interessado o ónus de interrupção de funcionamento do sistema por razões técnicas da exclusiva responsabilidade de tal entidade que deveria ter providenciado pela existênciaa de um servidor alternativo que obviasse à interrupção de tal serviço. D) O recurso a meios informáticos e telemáticos pretende, com maior eficácia, reproduzir o procedimento físico tradicional, não podendo ser transformado num novo foco de problemas para os particulares, decorrentes do não funcionamento dos meios técnicos do Estado. E) No campo da contratação pública, onde não subsiste qualquer dúvida que a ideia força que decorre do artigo 18.° do DL 143-A/2008, de 25 de Julho é que os particulares apenas se responsabilizam (e podem ser responsabilizados), pelos seus próprios problemas técnicos; os problemas técnicos da plataforma utilizada pelas entidades adjudicantes (e os próprios problemas técnicos da rede pública) são imputáveis às entidades públicas. Face ao exposto, desde já se requer muito respeitosamente a junção aos autos do parecer junto nos termos do artigo 525° do CPC bem como a revogação da douta sentença como é de Justiça. Nos termos das disposições conjugadas dos artºs 685-A,º nºs 1 e 3, do CPC, na redacção do Dec-Lei nº 303/207, de 24/VIII, são as conclusões do recurso que delimitam o objecto do mesmo e, consequentemente, os poderes de cognição deste tribunal. Assim, a questão a resolver consiste em saber se o registo carece de rectificação no que à data aposta na Insc. 1, Ap 13 respeita, devendo passar a constar a data de 31.12.2009 ou, em alternativa, ser averbada tal rectificação. II. Fundamentação de facto O tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos. 1 – Em 31.12.2009 pelas 16.15horas, foi pedida a constituição on line, através do sítio da internet www.portaldaempresa.pt, da sociedade “G” – SGPS, SA”; 2 – No dia 31.12.2009 foi emitido e enviado à requerente do registo o comprovativo do pedido de registo de constituição da sociedade NIPC (…), bem como o valor (€ 5.200,02) dos emolumentos devidos, com indicação do meio e prazo de pagamento; 3 – No dia 31.12.2009 pelas 16.32 horas, foi efectuado o pagamento daquele montante; 4– No dia 1.01.2010, pelas 6.36 horas pelo “rnpc.empresaonline.backoffice” foi enviado à requerente do registo, Dra. E J, um e-mail sobre o “assunto: recepção do pedido de registo de constituição da sociedade”, com o seguinte teor: “O seu pedido de registo de constituição da sociedade G-SGPS, SA entregue via internet em 01.01.2010 às 6 horas, foi recebido, tendo-lhe sido atribuído o seguinte número de Apresentação da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa: Ap.13/20100101” – Cfr. fls. 38 dos autos, cujo teor integral se dá aqui por reproduzido; 5 – E no dia 5.01.2010 pelas 6.39 horas pm, o e-mail cuja impressão consta de fls. 40 dos autos e cujo teor integral aqui se dá também por reproduzido, sobre o “Assunto: Confirmação da conclusão do processamento do pedido com certidão para 1 ano”; 6 – Em 14.01.2010 pela Directora do Registo Nacional de Pessoas Colectivas foi emitida a seguinte declaração: “Declara-se para os devidos efeitos que o pedido de registo on-line de constituição da entidade G- SGPS SA, com o nº de identificação de pessoa colectiva (…), foi efectuado em 31 de Dezembro de 2009 e que por razões técnicas apenas em 01 de Janeiro de 2010, foi atribuída a apresentação - Ap.13/20100101” – na conservatória do registo comercial de Lisboa.”; 7 – A “G”- SGPS SA” requereu à Conservatória do Registo Comercial de Lisboa a rectificação no registo de constituição da sociedade da Inscrição 1, Ap. 13, corrigindo-se a data que dela consta para 31.12.2009 ou, em alternativa, o averbamento dessa rectificação; 8 – Indeferido o pedido por despacho de 24.02.2010, a “G”- SGPS SA” interpôs recurso hierárquico para o Presidente do Instituto dos Registos e do Notariado – cfr. fls. 26 a 33 dos autos; 9 – Tendo no IRN sido emitido o parecer cuja cópia consta de fls. 14 a 24 dos autos, cujo teor integral aqui se dá por reproduzido, e do qual foi elaborado o seguinte Sumário: I – O Decreto Lei nº 125/2006 de 29 de Junho veio estabelecer um meio de criação de empresas através da Internet, introduzindo no ordenamento jurídico português uma via inovadora para a constituição de sociedades comerciais e civis sob a forma comercial. II – A portaria nº 657-C/2006, de 29 de Junho veio regulamentar o referido diploma legal, no que respeita à designação, funcionamento e funções do sítio, bem como a utilização dos meios de autenticação electrónica e de assinatura electrónica, na indicação dos dados e na entrega dos documentos. III – No âmbito dos pedidos de registo (no qual se pode incluir a empresa on-line) pela via da Internet, à apresentação no diário não basta, portanto, a formulação do pedido de registo, é ainda necessária a confirmação do pagamento das importâncias devidas pela efectivação do mesmo implicando a transferência de ficheiros, determinando necessariamente uma dilação temporal, por mínima que seja, entre a conclusão do pedido e a respectiva apresentação no Diário. IV – Pelo exposto, entendemos que, no caso em apreço, o pedido de registo só pode ser apresentado no Diário no momento em que é comunicado electronicamente à aplicação informática a confirmação do pagamento das importâncias devidas, pelo que se indefere o pedido de rectificação”; 10 – Sobre o que foi proferido pelo Vice-Presidente do IRN, após parecer concordante do Coordenador (“a rectificação solicitada a ser deferida atentaria contra um princípio basilar de registo – princípio da prioridade”) despacho de indeferimento do recurso. III – Fundamentação de direito. A questão enquadra-se no regime de criação de empresas on line. Como se refere no preâmbulo do DL nº 125/2006, de 29 de Junho este diploma “estabelece um meio de criação de empresas através da Internet, introduzindo no nosso ordenamento jurídico uma via inovadora para a constituição de sociedades comerciais e civis sob forma comercial. Visa-se, com esta iniciativa, continuar a simplificar procedimentos de acordo com o Programa SIMPLEX, contribuir para o desenvolvimento do Plano Tecnológico e reduzir significativamente os custos de contexto, melhorando as condições para investir e criar riqueza e emprego em Portugal.” Dispõe o art. 3.º que: “1 - O procedimento de constituição de sociedades ao abrigo do regime a que se refere o artigo 1.º é da competência do Registo Nacional de Pessoas Colectivas (RNPC), independentemente da localização da sede da sociedade a constituir, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 2 - O RNPC pode distribuir por outras conservatórias do registo comercial a tramitação dos procedimentos de constituição on-line de sociedades, nos termos fixados por despacho do director-geral dos Registos e do Notariado. ….” Sobre a validação do pedido estatui o artigo 10.º: 1 - O pedido de constituição de sociedade apresentado nos termos do presente decreto-lei só é considerado validamente submetido após a emissão de um comprovativo electrónico, através do sítio na Internet, que indique a data e a hora em que o pedido foi concluído. 2 - A não conclusão do procedimento de constituição de sociedade por facto imputável ao interessado determina a caducidade do direito ao uso da firma afecta à sociedade a constituir nos termos da primeira parte da alínea a) do n.º 1 do artigo 6.º” O artigo 11.º, sob a epígrafe prazo de apreciação do pedido comanda que, emitido o comprovativo electrónico referido no n.º 1 do artigo anterior, o serviço competente aprecia o pedido de constituição de sociedade (nº1). Se os interessados tiverem optado por pacto ou acto constitutivo de modelo aprovado pelo director-geral dos Registos e do Notariado e não tiver ocorrido a entrega dos documentos referidos nas alíneas b) e c) do n.º 4 do artigo 6.º, o serviço competente, após confirmação do pagamento efectuado pelos interessados, procede imediatamente às diligências subsequentes previstas no artigo 12.º (nº2). Nas restantes situações, o serviço competente procede a todas as diligências subsequentes previstas no artigo 12.º no prazo de dois dias úteis a contar da confirmação do pagamento efectuado pelos interessados (nº 3). O artigo 12 º especifica, nomeadamente que: 1 - O tratamento dos dados indicados e dos documentos entregues pelos interessados bem como a apreciação do pedido de constituição da sociedade são efectuados pelos serviços competentes. 2 - O serviço competente deve proceder aos seguintes actos: a) Registo do pacto ou acto constitutivo da sociedade, que deve ser imediatamente comunicado aos interessados por via electrónica; b) Inscrição do facto no ficheiro central de pessoas colectivas e codificação da actividade económica (CAE) ou, se for esse o caso, comunicação do registo para aqueles efeitos. …. 6 - A realização dos actos previstos nos nºs 2 e 3 é da competência do conservador e dos oficiais de registo. Por seu turno, a Portaria nº 657-C/2006, de 29 de Junho veio dar execução a este acto legislativo nos termos previstos nos seus artigos 1º, 17º e 23º al. a). O art. 4.º desta Portaria regula do seguinte modo: “1—Os pedidos de constituição online de sociedades efectuados através do sítio são anotados pela ordem da respectiva recepção. 2—Caso a tramitação do procedimento de constituição online de sociedades seja distribuído por outras conservatórias, nos termos do n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 125/2006, de 29 de Junho, os pedidos são anotados pela respectiva ordem de recepção na conservatória do registo comercial para onde o pedido foi distribuído. 3—Nos casos de pedidos de registo recebidos após as 16 horas e em que a respectiva anotação não possa ser efectuada automaticamente por via informática, os pedidos são anotados no dia seguinte, imediatamente antes da primeira apresentação pessoal ou por telecópia, caso exista.” A conservatória promove oficiosamente a publicação do registo na Internet e comunica o acto ao RNPC para efeitos de inscrição no Ficheiro Central de Pessoas Colectivas. A questão a resolver consiste em saber se o registo de constituição da sociedade se deve ter por efectuado em 31.12.2009 pelas 16.15 horas, data em que foi pedida a constituição online, através do sítio da internet www.portaldaempresa.pt, da sociedade “G” – SGPS, SA”, ou, ao invés, em 01.01.2010 às 6 horas, quando foi recebido e lhe foi atribuído o seguinte número de Apresentação da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa: Ap.13/20100101” De toda a legislação enunciada, que estabelece um procedimento específico, se retira, em nosso entendimento, que é necessário o tratamento dos dados e a apreciação do pedido de constituição da sociedade, diligências estas da competência do conservador e dos oficiais de registo. Os pedidos de registo recebidos após as 16 horas e em que a respectiva anotação não possa ser efectuada automaticamente por via informática, os pedidos são anotados no dia seguinte, imediatamente antes da primeira apresentação pessoal ou por telecópia, caso exista.” Quando no despacho de 14.01.2010 da Directora do Registo Nacional de Pessoas Colectivas se declara que ….. “o pedido de registo on-line de constituição da entidade GPPC- SGPS SA, com o nº de identificação de pessoa colectiva 509 255 809, foi efectuado em 31 de Dezembro de 2009 e que por razões técnicas apenas em 01 de Janeiro de 2010, foi atribuída a apresentação - Ap.13/20100101” – na conservatória do registo comercial de Lisboa.”, significa precisamente que a respectiva anotação não pôde ser efectuada automaticamente por via informática e o pedido foi anotado no dia seguinte, tudo conforme o legalmente previsto e não, como pretende a recorrente, por “interrupção de funcionamento do sistema por razões técnicas da exclusiva responsabilidade de tal entidade que deveria ter providenciado pela existência de um servidor alternativo que obviasse à interrupção de tal serviço”. Não podemos deixar de assinalar aqui que o registo comercial se destina a dar publicidade à situação jurídica dos Comerciantes Individuais, das Sociedades Comerciais, das Sociedades Civis sob forma comercial, dos Estabelecimentos Individuais de Responsabilidade Limitada, das Cooperativas, das Empresas Públicas, dos Agrupamentos Complementares de Empresas, dos Agrupamentos Europeus de Interesse Económico, das representações permanentes de entidades estrangeiras e/ou nacionais e das pessoas colectivas de utilidade pública (fundações e associações) tendo em vista a segurança do comércio jurídico. Com efeito, rege o art. 53º-A do Código do Registo Comercial. “1 - Os registos são efectuados por transcrição ou depósito. 2 - O registo por transcrição consiste na extração dos elementos que definem a situação jurídica das entidades sujeitas a registo constantes dos documentos apresentados. 3 - Sem prejuízo dos regimes especiais de depósito da prestação de contas, o registo por depósito consiste no mero arquivamento dos documentos que titulam factos sujeitos a registo.” O registo em causa é por natureza um registo por transcrição (art. 53º- A, nº 1 “a contrario”). Logo implicará, sempre, uma avaliação dos elementos que definem a situação jurídica das entidades sujeitas a registo constantes dos documentos apresentados. Pelo exposto, delibera-se julgar improcedente a Apelação e confirmar a decisão recorrida. Custas pela recorrente. Lisboa, 2 de Maio de 2013 Ana Lucinda Mendes Cabral Maria de Deus Correia Maria Teresa Pardal |