Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
9225/2003-9
Relator: SILVEIRA VENTURA
Descritores: PATROCÍNIO JUDICIÁRIO
DEFENSOR OFICIOSO
HONORÁRIOS
DESPESAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/15/2004
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REVOGAR O DESPACHO
Sumário:
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na 9.a Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

A Dr.°AR, defensora oficiosa do arguido JM no Proc.° n.° ... da 8ª Vara Criminal do Circulo de Lisboa, interpôs o presente recurso do despacho da Sr.a Juíza, que indeferiu o requerimento do pagamento de despesas efectuadas no desempenho do patrocínio judiciário, referindo em suma na sua motivação:

O tribunal " a quo" a fls. 659 preteriu despesas efectivamente realizadas pela defensora oficiosa no desempenho do seu patrocínio judiciário tais como fotocópias, telecópias e telecomunicações, e não considerou as sete deslocações a tribunal pela recorrente.

Apenas considerou duas deslocações e as despesas de franquias postais 4,46 Euros, pelo que a ora reclamante não se conforma.

Pois o reembolso das despesas tem corno causa as despesas realizadas e corno supra se demonstrou para um patrocínio cuidado da causa há necessidade de desempenhar não só horas de trabalho como utilizar instrumentos dele dependente, tais como telefone, fax, fotocopiadora, despesas postais consumíveis, electricidade, papel tinteiros toda uma panóplia de consumíveis e afins que não podem ser contabilizados apenas num processo em concreto, mas que a ele podem ser imputados como uma quota parte de custos, não descurando a viatura própria, pelo que a título de reembolso de despesas deve a defensora oficiosa receber a quantia global de 71, 66 Euros ;referente às despesas de deslocação, 62,70 Euros; franquias postais, 4,46 Euros; fotocópias e telecópias; 2,50 Euros; e telecomunicações 2,00 Euros .

Os honorários a atribuir ao advogados nomeados para patrocinar causa em tribunal devem ser fixados nos termos dos artigos 48.° e 49.° da L. 30-E/2000 de 20/12 e da Tabela anexa à Portaria n.° 150/2002 de 19/2.

Num processo crime com a forma comum, cuja competência é de um Tribunal Colectivo, e o crime de que a arguida é acusada é punível com pena de prisão superior a 8 anos, os honorários, os honorários a atribuir ao defensor oficioso, que é advogado, são de 319,23 Euros, isto é 16 UR.

E não se trata de uma intervenção ocasional em acto isolado do processo, como anteriormente se demonstrou.

No presente processo e através do despacho em causa, só foram atribuídos à defensora oficiosa, a título de honorários a quantia de 99,75 Euros, isto é 5UR.

Não se cumpriu deste modo o disposto nos artigos 48.° e 49.° da citada Lei, e da tabela anexa à Portaria 150/02 de 19/2, pois não foram fixados os honorários pela participação processual da ora recorrente no processo em causa.

Assim o despacho recorrido deve ser modificado , devendo ser atribuído á defensora oficiosa, os honorários de 319,23 Euros, correspondente a 16 UR, e a título de reembolso das despesas, deverão ser atribuídas 71,66 Euros.


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Na 1.a instância O Exm.° Procurador da República na sua contra-motivação referiu em suma:

Face aos elementos de que dispunha nos autos , bem se compreende a opção feita pela Mm.a Juíza na fixação do montante a pagar.

Na verdade, das actas que se reportam às três sessões de audiência ocorridas neste processo -- fls. 543, 586 e 606 -- , apenas na última delas consta — a final- o nome da Exm.° defensora como tendo chegado atrasada e em altura em que havia sido já solicitado a outro causídico que assegurasse a defesa da arguida.

Recorde-se que neste dia apenas se procedeu à leitura do acórdão, tendo a recorrente estado presente por escassos cinco minutos.

Na sessão anterior, em que decorreu a totalidade da produção da prova com audição de arguido e testemunhas, havia sido igualmente nomeado num outro defensor ,dada a ausência da recorrente.

Acresce que uma parte dos requerimentos que de facto elaborou não estão, sequer, directamente relacionados com a defesa dos estritos interesses do arguido, mas com a sua própria situação enquanto respectiva defensora, mudança de domicílio, nota de honorários e despesas, etc..
Convirá não esquecer, para além de mais, que a elaboração de requerimentos, o estudo de um processo e a realização de quaisquer outras diligências integram, justamente, a função do defensor, pela qual é remunerado de acordo com o esforço despendido.

"In casu" e perante os actos concretamente praticados, dificilmente se poderia qualificar a intervenção da recorrente como de algo mais do que meramente ocasional.

Assim, deve ser mantido o despacho recorrido, negando-se provimento ao recurso .
X

Nesta Relação o Exm.° Procurador Geral- Adjunto, emitiu o seu parecer no sentido de se negar provimento ao recurso referindo em suma:

Na fixação do montante a pagar aos defensores oficiosamente nomeados, terá o tribunal de se socorrer dos elementos de que dispunha no processo, constituindo um ónus do defensor, para efeitos de reembolso de despesas pelos serviços prestados, nos termos do art.° 44.0, n.° 1 4 da Lei 30-E/2000 de 20/12, apresentar nota de despesas realizadas, de harmonia com o preceituado na Portaria 150/02, de 20/12 (6.° n.° 1 e 2).

Nesta conformidade, subscrevemos a posição expressa pelo MP em contra-alegações de recurso (resposta à motivação),.

Assim, deve ser negado provimento ao recurso.
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Notificada nos termos do art.° 417.° n.° 2 do CPP, veio a recorrente reiterar todo o exposto na sua motivação.
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Foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

Com interesse para a decisão consta do despacho recorrido:

« Fols. 628 A: como resulta das actas de fls. 543 e 606, a ilustre requerente não esteva presente na data inicialmente designada para a 2.° sessão do julgamento, nem nesta ou na leitura da decisão.

Apenas resulta dos autos a entrega de 2 requerimentos, comunicando a mudança de escritório e requerendo o pagamento de honorários.

Corno tal, as despesas a reembolsar, o que se determina, são as correspondentes aos documentos de fls. 618, no valor de 4,46 Euros, a que acrescem as de deslocação, considerando a distância de 60 Km.

Fixa-se a título de honorários e considerando a natureza e volume de trabalho desenvolvido, a quantia correspondente a 5 UR ( ponto 6 da tabela anexa à portaria 150/02 de 19/2.

Proceda-se ao pagamento.»
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Neste recurso trata-se de saber se os honorários mandados pagar pelo despacho recorrido, e inferiores aos requeridos pela recorrente estão de acordo com o legalmente estipulado.

O n.° 1 do art.° 48.° da Lei n.° 30-E/2000 de 20/12, preceitua que os advogados têm direito a receber honorários pelos serviços prestados assim corno a ser reembolsados das despesas realizadas que devidamente comprovem.

O art.° 49.° da mesma Lei preceitua que os honorários dos advogados, no âmbito do apoio judiciário, constam da tabela proposta pela AO e pela CS e aprovada pelo Ministério da Justiça, que a publicou mediante Portaria n.° 150/2002 de 19/2.

Ora o defensor nomeado para um acto mantém-se para os actos subsequentes do processo, salvo se este prosseguir em comarca diversa.

Consta dos autos que a recorrente das três sessões da audiência -- fls. 543, 586 e 606 -- apenas da última consta que esteve presente, e chegou depois de Ter a audiência começado com outro defensor nomeado "ad hoc". Nessa sessão apenas se procedeu à leitura da decisão tendo a defesa do arguido durante a parte restante do julgamento sido assegurada por outro defensor nomeado.

Estipula o art.° 3.° da Portaria acima citada, que em caso de intervenção ocasional em acto ou diligência isolada num processo, os honorários a atribuir individualmente pelo tribunal ao interveniente ocasional são deduzidos aos honorários devidos ao interveniente principal em função do tipo de processo.

Ora sendo a requerente a interveniente principal—por ter sido indicada pela AO—e mantendo-se o seu patrocínio nos actos subsequentes do processo, devem ser deduzidos, nos horários que lhe forem atribuídos, os honorários pagas aos outro advogados que em sua falta asseguraram a defesa do arguido.

Não pode a recorrente, em face do exposto, vir reclamar honorários e despesas efectuadas com o patrocínio que não assegurou.

Na nota 5 da Tabela anexa à Portaria 150/02 de 19/2, lê-se:
Em caso de substituição do patrono no decurso do processo, os honorários serão individualmente pagos a todos os intervenientes em função da repartição de honorários que tenha sido definida, sempre com o limite dos honorários que seriam devidos ao nomeado por aplicação da tabela.

Trata-se de processo Comum com intervenção do tribunal colectivo, relativo a crime punível com pena superior a 8 anos (Tabela anexa, 3. 1. 1. 1. 1., cujos honorários são 16,00 UR.)

Haverá a deduzir por cada uma intervenção ocasional em acto do processo -- n.° 6 da tabela referida – 5UR.

Devem ser acrescentados aos honorários da recorrente , nos termos do art.° 48.° da Lei 30-E/2000 as despesas realizadas e devidamente comprovadas.

Face ao exposto, acordam os Juízes da 9.a Secção do Tribunal da Relação, em revogar o despacho recorrido que deverá ser substituído por outro que proceda ao cálculo dos honorários a pagar à recorrente de modo como o acima referido.

Sem custas.

Lisboa, 15 de Janeiro 2004

Silveira Ventura

Margarida Vieira de Almeida

Cid Geraldes