Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ISABEL SALGADO | ||
Descritores: | CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA LICENÇA DE UTILIZAÇÃO MORA RESOLUÇÃO DO CONTRATO PERDA DE INTERESSE | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/19/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I -Uma coisa é a data provável para a realização da escritura em 30/1/07, outra, diversa, é o conteúdo da vontade negocial quanto ao prazo de 60 dias que não deve ser entendido como o espaço temporal subsequente( 30/3/07), mas, outrossim, os 60 dias após a data de entrada do requerimento de licença de utilização, tendo em conta a previsão daquele período para obter junto da CM o referido documento indispensável para a celebração de escritura de contrato de compra e venda de imóvel para habitação, pelo que é de concluir que o contrato-promessa ajuizado e as circunstâncias factuais apuradas, não sustentam a vontade negocial de estabelecimento de prazo fixo e essencial para a celebração do contrato definitivo de compra e venda do imóvel; II- A simples mora não permite ao credor desencadear automaticamente a resolução do contrato e reclamar o valor prestado a título de sinal. III- Os factos apurados não consubstanciam objectivamente a perda de interesse no negócio por parte da promitente compradora que motive a resolução do contrato-promessa, tratando-se de uma empresa que se dedica à compra e venda de imóveis, cujo retardamento na conclusão mantém a expectativa e interesse do negócio, qual seja a obtenção de lucro com a revenda. (Sumário da Relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes desta 7 ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa. I – RELATÓRIO V, S A intentou acção declarativa de condenação com processo comum, seguindo a forma ordinária, contra C, SA, pedindo que seja reconhecida a resolução do contrato promessa de compra e venda de imóvel, melhor identificado nos autos, por incumprimento definitivo da Ré, na qualidade de promitente vendedora por não celebrar a escritura no prazo acordado, e, em consequência, condenada a pagar à Autora o dobro do sinal recebido, no montante de Euros 50.000,00, acrescendo juros de mora vencidos e vincendos, ou, se assim se não entender, tê-lo por resolvido, dada a falta de interesse da Autora na aquisição, e condenada a Ré a pagar igual quantia, bem como juros de mora devidos desde a citação. Para tanto alegou sinteticamente, que a fracção prometida vender pela Ré à Autora deveria, atento os termos de contrato, ser escriturada até 30 de Janeiro de 2007, ou, no máximo, em caso de impossibilidade legal, nos sessenta dias seguintes, o que não se verificou por exclusiva culpa da promitente vendedora que actuou sem a diligência necessária para obter o licenciamento e demais requisitos para a realização da obra. A Ré contestou; por excepção, invocou a incompetência do tribunal de Oeiras por ter a sua sede em Lisboa, e impugnou a versão da factualidade apresentada pela Autora, alegando que não ficou estabelecido prazo essencial no contrato promessa, sendo incorrecta a interpretação que a Autora faz do estipulado na cláusula 3ª, acrescendo que a demora na concessão da licença de utilização excedeu a sua capacidade, sendo antes da responsabilidade das entidades camarárias e devida à exigência adicional de elementos que lhe foram solicitados face à derrocada parcial do prédio contíguo, cuja fachada era classificada, pugnando por inexistência de mora ou incumprimento definitivo, e desse modo, pela sua absolvição do pedido. Houve réplica para resposta à excepção que foi julgada procedente pelo tribunal de Oeiras e remetidos os autos ao tribunal de Lisboa. Prosseguiram os autos a habitual tramitação, elaborando-se despacho saneador e de condensação e realizou-se a audiência de discussão e julgamento no final da qual o tribunal fixou a matéria de facto provada e não provada. Finalmente, foi proferida sentença que julgou totalmente improcedente a acção e absolveu a Ré do pedido. A Autora requereu a aclaração da sentença não deferida, procedendo-se apenas à rectificação de um erro material. A Autora inconformada com a sentença interpôs recurso adequadamente recebido como de apelação e efeito meramente devolutivo. Nas suas alegações a apelante remata com as seguintes conclusões: a) A Ré não cumpriu a obrigação que assumiu no contrato promessa de entregar até 30 de Janeiro de 2007, na Câmara Municipal o requerimento de emissão de licença de utilização, entrega que constitui o dies a quo para contagem dos prazos para outorga da escritura de compra e venda; b) Tal incumprimento é objectivo e, sendo condicionante das restantes obrigações contratadas, corresponde a incumprimento definitivo por parte da Ré relativamente ao contrato de 23 de Dezembro de 2004; c) Ainda que não se tenha tal omissão como incumprimento definitivo, a matéria apurada nos autos revela a existência de perda objectiva de interesse por parte da A. na pretensão a que a Ré se obrigou, conduzindo ao incumprimento respectivo, com as legais consequências; d) Julgando improcedente a acção, a decisão recorrida fez errada interpretação e aplicação do disposto nos artºs 432º, 804º, 805º e 808º do CC, pelo que deverá ser revogada, julgando-se a acção totalmente procedente. Termina, requerendo que deve proceder a apelação com a consequente condenação da Ré no pedido formulado. Em resposta às alegações a Ré manteve os fundamentos da sua defesa e sustenta a manutenção do julgado. Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir. II -FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO O Tribunal a quo deu como assente a seguinte factualidade com relevância para a decisão: 1. Em 23 de Dezembro de 2004, a A., na qualidade de “promitente compradora” e a R., na qualidade de “promitente vendedora” declararam por escrito que denominaram de contrato-promessa nos termos do qual: “(…)Considerando que:A) A promitente vendedora é legítima proprietária do prédio urbano sito na Rua e Rua freguesia inscrito na Conservatória do Registo Predial de e inscrito na matriz predial da freguesia sob o artigo adiante também designado por TERRENO; empreendimento imobiliário denominado F - Condomínio, de acordo com os projectos de arquitectura nºs e , aprovados pela Câmara Municipal em 26/08/2003 e 19/08/2003, respectivamente; C) O edifício a construir no TERRENO, que fará parte integrante do F - Condomínio, será constituído por seis blocos, identificados com as letras de A a F, compostos por nove pisos, sendo nos Blocos A,C,D, E e F, seis pisos acima do solo e três abaixo do solo e no Bloco B cinco pisos acima do solo e quatro abaixo do solo, a constituir em fracções autónomas no regime da propriedade horizontal logo que se encontrem reunidos todos os requisitos legais; D) A promitente compradora pretende adquirir uma fracção autónoma constituinte do Bloco A da F - Condomínio. É livre, esclarecidamente e de boa fé celebrado o presente Contrato Promessa de compra e venda, que se regerá nos termos constantes dos Considerandos anteriores e das Cláusulas seguintes: Cláusula Primeira (Objecto) Pelo presente contrato a promitente vendedora promete vender à promitente compradora, e esta promete comprar, livre de ónus ou quaisquer encargos, a fracção autónoma designada pela letra "AH", do Bloco A, localizada no 2° piso, 4° a contar do solo, com a tipologia T3, com dois lugares de estacionamento automóvel identificados com os nºs 172 e 173, localizados ao nível do piso -4 (quatro) que faz parte integrante da F - Condomínio, adiante também designado por Apartamento, descrito e identificado na planta junta ao presente contrato, como Anexo I, a qual, após rubricada por ambos os outorgantes, fica a fazer parte integrante deste contrato para todos os efeitos legais. As características do apartamento a construir, bem como os respectivos acabamentos e equipamentos respeitam o projecto de arquitectura aprovado pela Câmara Municipal e as características patentes na data de assinatura do presente contrato quer na versão provisória da Ficha Técnica de Habitação (F.T.H.) disponibilizada para análise, como no mapa de acabamentos que se junta ao presente contrato como Anexo II, bem como a lista de alterações constante do Anexo III os quais, após rubricados pelos outorgantes, deste faz parte integrante para todos os efeitos legais. A Promitente Compradora toma conhecimento de que a versão provisória da Ficha Técnica de Habitação (F.T.H.), poderá sofrer alterações, sendo substituída pela versão definitiva. Ambas as ora Contratantes declaram e aceitam, no âmbito do presente contrato que quaisquer alterações aos Anexos I, II e III, sejam efectuadas, desde que as mesmas resultem de imperativos de natureza técnica ou legal e que respeitem as regras da boa arte, bem como mantenham as áreas úteis e orientações solares previstas, para além da qualidade dos acabamentos constantes respectivamente nos Anexos I, II, III. Cláusula Segunda (Preço e Condições de Pagamento) 1. O preço total da compra e venda ora prometida é de € 514.000 (quinhentos e catorze mil euros) e será pago pela promitente compradora à promitente vendedora da seguinte forma: € 25.000(vinte cinco mil euros), nesta data, a título de sinal e princípio de pagamento; € 51.400(cinquenta e um mil e quatrocentos euros), a título de reforço de sinal, logo após a data da emissão pela Câmara Municipal da Licença de Construção; € 26.400 (vinte seis mil e quatrocentos euros), a título de reforço de sinal, no prazo de três meses a contar da data da emissão da licença de construção melhor identificada na anterior alínea b) da presente c1ausula; € 51.400 (cinquenta e um mil e quatrocentos euros), a título de reforço de sinal, seis meses a contar da data identificada na anterior alínea c) da presente c1ausula; € 51.400 (cinquenta e um mil e quatrocentos euros) a título de reforço de sinal, dezoito meses a contar da data identificada na anterior alínea d) da presente clausula; O remanescente do preço, no montante de € 308.400 (trezentos e oito mil e quatrocentos euros), será pago pela Promitente compradora, à promitente vendedora no acto de outorga da correspondente escritura pública de compra e venda. À entrega de qualquer valor será dada a respectiva quitação após a boa e efectiva cobrança. Cláusula terceira (Escritura Pública) A escritura pública de compra e venda ora prometida será outorgada em dia, hora e Cartório Notarial a designar pela promitente vendedora, por carta registada com aviso de recepção enviada com uma antecedência mínima de 10 (dez) dias em relação à data a agendar, prevendo-se que tal ocorra até ao dia 30 de Janeiro de 2007 ou, não sendo legalmente possível, até ao termo do prazo de 60 (sessenta) dias a contar da data de entrada na Câmara Municipal do requerimento para a emissão da respectiva licença de utilização. Para os efeitos previstos no número anterior, a promitente vendedora diligenciará no sentido de apresentar aquele requerimento na Câmara Municipal de até ao dia 30 de Janeiro de 2007. 3. Com vista à outorga da escritura pública de compra e venda o promitente compradora obriga-se a entregar à promitente vendedora toda a documentação necessária à instrução do respectivo processo, no prazo de 8 (oito) dias após tal lhe ter sido solicitado. A promitente compradora tem conhecimento de que a promitente vendedora não pode garantir, até à data da outorga da escritura pública da compra e venda, a obtenção das ligações definitivas ao ramal público de água e à rede de abastecimento eléctrico e gás, não se obrigando a promitente vendedora a mais do que garantir o fornecimento de electricidade e água através dos ramais de obra instalados e a realizar todos os esforços ao seu alcance para a respectiva obtenção no menor espaço de tempo possível. Cláusula quarta (Despesas) São da responsabilidade da promitente compradora todas as despesas decorrentes do presente contrato, designadamente Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (I.M.T), emolumentos notariais decorrentes da escritura pública e emolumentos resultantes dos actos de registo provisórios ou definitivos. São igualmente da responsabilidade da promitente compradora todos os encargos fiscais, contribuição, taxas ou impostos, nomeadamente Imposto Municipal sobre Imóveis (I.M.I), tarifa de conservação de esgotos e despesas de condomínio, incluindo-se nestas ultimas aquelas que resultam da conservação de espaços e logradouros, a partir da data da realização da escritura pública de compra e venda ou, da efectiva ocupação do Apartamento, apenas na proporção da área detida, se esta se verificar antes da outorga da respectiva escritura pública. Cláusula quinta (Tradição da coisa) O recebimento das chaves, por parte da promitente compradora, e a consequente posse da fracção cuja promessa de compra e venda é objecto do presente contrato significa, sem admissão de prova em contrário, que a mesma não sofre de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada, nem carece das qualidades asseguradas pela promitente vendedora nos Anexos I e II, sem prejuízo das eventuais alterações de que os mesmos sejam objecto nos termos do número três da anterior cláusula Primeira. 2. Não se incluem na presunção do número anterior os eventuais defeitos de construção que não sejam visíveis. 3. A promitente vendedora, na qualidade de construtora, é responsável pelos materiais e equipamentos utilizados, nos termos das garantias prestadas pelos fornecedores dos mesmos. 4. A entrega da fracção objecto do presente contrato não ocorrerá antes que se mostre paga a totalidade do preço de venda identificado na anterior cláusula segunda, devendo este ocorrer, salvo acordo em contrário, na data da outorga da escritura pública de compra e venda. 5. O Apartamento será entregue à promitente compradora livre e devoluto de pessoas e bens. Cláusula sexta (Registos provisórios) 1. As partes acordam nesta data, que logo que seja legalmente possível, e caso assim o entendam, se proceda aos registos provisórios de aquisição e de hipoteca, sendo apenas os primeiros da responsabilidade da promitente vendedora. 2. Se por algum motivo imputável à promitente compradora, esta decidir rescindir o presente contrato promessa, obriga-se de imediato a revogar os registos provisórios que eventualmente tenham sido efectuados. Sem prejuízo no estabelecido no número anterior, os registos provisórios serão renovados as vezes necessárias até à data da celebração da Escritura Pública de Compra e Venda. Cláusula sétima (Incumprimento) 1. Decorridos os prazos previstos na anterior Cláusula Terceira sem que seja outorgada a escritura pública da compra e venda ora prometida, por causa exclusivamente imputável à promitente vendedora, esta constitui-se em mora, obrigando-se a pagar à promitente vendedora juros contados sobre as quantias recebidas no montante equivalente à taxa Euribor de 3 meses (ou outra que a venha substituir), acrescido de 1.5 pontos percentuais, a partir do dia seguinte ao limite daquele ultimo prazo e até à data da outorga da escritura pública de compra e venda. 2. Da mesma forma, caso a escritura pública de compra e venda não seja outorgada dentro dos prazos estabelecidos na anterior cláusula terceira por motivo exclusivamente imputável à promitente compradora, esta constitui-se em mora, obrigando-se a pagar à promitente vendedora juros contados sobre o remanescente do preço não pago no montante equivalente à taxa Euribor de 3 meses (ou outra que a venha substituir), acrescido de 1.5 pontos percentuais, a partir do dia seguinte ao limite daquele ultimo prazo e até à data da outorga da escritura pública de compra e venda. Caso a promitente compradora, seja por que motivo for, não efectue o pagamento de qualquer uma das prestações do preço nos termos estipulados na cláusula segunda deste contrato, considera-se em mora, aceitando a promitente vendedora a prestação em causa no prazo máximo de 90 (noventa) dias contado desde a respectiva data de pagamento, acrescida de juros de mora, calculados à taxa Euribor de 3 meses (ou outra que a venha substituir) acrescida de 1.5 pontos percentuais. O eventual indeferimento do requerimento da licença de utilização, referido na Cláusula Terceira do presente contrato, apenas será considerado causa de incumprimento do presente contrato, imputável à promitente vendedora, após indeferimento de um segundo requerimento para o mesmo fim, que deverá dar entrada na Câmara Municipal no prazo de dez dias a contar da data da recepção da notificação daquele indeferimento, ou de decisão que o confirme em caso de recurso. Cláusula oitava (Execução Específica) O estipulado na Cláusula anterior não afasta a possibilidade de o Outorgante não faltoso requerer, em alternativa e a seu crédito, a execução específica, nos termos do artigo 8300 do Código Civil. Cláusula Nona (Modificações) O presente contrato-promessa, conjuntamente com os seus anexos, traduz e, constitui o integral acordo entre as partes, só podendo ser modificado por documento escrito e assinado por ambas. Cláusula décima (Formalidades) Os outorgantes do presente contrato, por mútuo acordo, prescindem da apresentação da licença de construção, uma vez que a mesma já foi aprovada pela Câmara Municipal de aguardando-se a sua emissão. Cláusula décima primeira (Notificações) Todas as comunicações e notificações contratuais deverão ser feitas para as moradas constantes no presente contrato na identificação das partes, a menos que outras venham a ser indicadas por carta registada com aviso de recepção, considerando-se efectuadas no terceiro dia útil após o registo postal. (…)” (al. A) dos Factos Assentes); 2. Em 18.10.2006, a R. foi, por notificação judicial avulsa requerida pela A., notificada que: “(…) 1. Por contrato de 23 de Dezembro de 2004, a requerida prometeu vender à requerente, e esta prometeu comprar-lhe a fracção autónoma designada pela letra "AH" do Bloco A, localizada no 2° piso, 4° a contar do solo, com a tipologia T3, com dois lugares de estacionamento automóvel identificados com os nºs 172 e 173, localizados ao nível do piso - 4 que faria parte integrante do empreendimento imobiliário denominado F - Condomínio, que a requerida se prestou a construir. 2. Foi fixado o preço de € 514.000,00 a pagar pela requerente da seguinte forma: a) € 25.000,00, na data da outorga do contrato, que foram pagos; b) € 51.400,00, a título de reforço de sinal, logo após a data da emissão pela Câmara Municipal de da licença de construção; c) € 26.400,00, a título de reforço de sinal, no prazo de três meses a contar da data da emissão da licença de construção; d) € 51.400,00, a título de reforço de sinal, seis meses a contar da data identificada na anterior alínea c) da presente cláusula; e) € 51.400,00, a título de reforço de sinal, dezoito meses a contar da data identificada na anterior alínea d) da presente cláusula; f) O remanescente do preço, no montante de € 308.400,00, no acto da outorga da correspondente escritura pública de compra e venda. 3. Convencionaram as partes que a escritura de compra e venda seria outorgada em dia, hora e Cartório Notarial a designar pela promitente vendedora, por carta registada com aviso de recepção enviada com uma antecedência mínima de 10 (dez) dias em relação à data a agendar, prevendo-se que tal ocorresse até ao dia 30 de Janeiro de 2007 ou, não sendo legalmente possível, até ao termo do prazo de 60 (sessenta) dias a contar da data de entrada na Câmara Municipal de do requerimento para a emissão da respectiva licença de utilização. 4. Sucede, porém, que à data de hoje não se mostram sequer aprovados todos os projectos necessários à execução do prédio de que faria parte a fracção prometida vender, não estando, sequer, emitida a licença de construção. 5. É, pois, impossível à requerida cumprir aquilo a que se obrigou, seja a outorga da escritura de compra e venda, seja só mesmo a obtenção da licença de utilização (que pressupõe que o prédio esteja construído). 6. Não pode, obviamente, o prédio em causa ser construído, e por forma a ser requerida e obtida a licença de utilização, no prazo de pouco mais de 4 meses que é o que decorre entre hoje e o dia 30 de Janeiro de 2007. 7. Tal impossibilidade é exclusivamente imputável à requerida que não obteve até agora o licenciamento necessário à construção e não iniciou os trabalhos de construção. 8. Tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, é este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação - art° 801° n.º 1 do CC. 9. Tendo a obrigação por fonte um contrato bilateral, o credor, independentemente do direito à indemnização, pode resolver o contrato - art° 801° nº 2 do CC. 10. Tratando-se de contrato promessa, e havendo sinal prestado, na hipótese do respectivo incumprimento pode aquele que o prestou exigir a respectiva restituição em dobro - art° 442° n.º 2 do CC. 11. Em sequência do exposto, a requerente pretende levar ao conhecimento da requerida que: a) Considera resolvido o contrato identificado neste requerimento, devido à respectiva impossibilidade de cumprimento àquela imputável; b) Pretende que a mesma lhe devolva em dobro a quantia entregue a titulo de sinal, ou sejam € 50.000, ao, acrescida de juros de mora legais a partir da data da presente notificação. (...)” (al. B) dos Factos Assentes) 3. A R. foi notificada pela Câmara Municipal nos termos da qual: “(…) Processo n.º Local: Rua Assunto: pedido de construção – aprovação do projecto de arquitectura. NOTIFICAÇÃO Informa-se V. Exa. que, nos termos do artigo 20° do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 177/01, de 4 de Junho, foi o processo acima identificado APROVADO por despacho proferido em 19/0B/03 pela Sra. Vereadora de acordo com a informação de síntese e despachos, cujas fotocópias se anexam, Conforme o disposto nos nºs 4 e 6 do mesmo artigo, deverá V. Exa., solicitar a aprovação, em simultâneo, dos projectos de especialidades identificados na informação acima citada, no prazo de 6 meses a contar da data da recepção desta notificação, sob pena de caducidade da deliberação que aprovou o projecto de arquitectura e arquivamento oficioso do processo. Mais se informa que o duplicado do projecto de arquitectura ser-Ihe-á entregue, com o comprovativo do levantamento da licença de construção, no Centro de Informação e Atendimento do Urbanismo, em qualquer dia útil, das 08:00h às 20:00h. Juntam-se em anexo os documentos do processo acima referido, constantes as fls. 186 e 109. (…)” (al. C) dos Factos Assentes); 4. No dia 15.09.2003, a R. foi notificada pela Câmara Municipal nos termos da qual: “(…) Processo n.º Local: Rua Assunto: pedido de construção – aprovação do projecto de arquitectura. NOTIFICAÇÃO Informa-se V. Exa. que, nos termos do artigo 20° do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 177/01, de 4 de Junho, foi o processo acima identificado APROVADO por despacho proferido em 19/08/2003 pela Sra. Vereadora , de acordo com a informação de síntese e despachos, cujas fotocópias se anexam. Conforme o disposto nos nºs 4 e 6 do mesmo artigo, deverá V. Exa. solicitar a aprovação, em simultâneo, dos projectos de especialidades identificados na informação acima citada, no prazo de 6 meses a contar da data da recepção desta notificação, sob pena de caducidade da deliberação que aprovou o projecto de arquitectura e arquivamento oficioso do processo. Mais se informa que o duplicado do projecto de arquitectura ser-Ihe-á entregue, com o comprovativo do levantamento da licença de construção, no Centro de Informação e Atendimento do Urbanismo, em qualquer dia útil, das 08:00h às 20:00h. Juntam-se em anexo os documentos do processo acima referido, constantes as fls. 186 e 191. Com os melhores cumprimentos, (…)” (al. D) dos Factos Assentes); 5. Em 22.03.2004, foi a R. notificada pela Câmara Municipal nos termos da qual: “(…) Proc. n.º Local: Rua data: 2004/03/22 Assunto: Obra de construção. NOTIFICAÇÃO Para os devidos efeitos, notifica-se V. Ex.ª, dando conhecimento do teor da e despacho, cuja fotocópia se junta (fls. 194 a 196). Com os melhores cumprimentos O Chefe de divisão (…), cujo teor é o seguinte:
DIRECÇÃO MUNICIPAL DE GESTÃO URBANÍSTICA DEPARTAMENTO DE GESTÃO URBANÍSTICA II DIVISÃO DA ZONA ORIENTAL
Pelo exposto e em conformidade, a decisão que recair sobre o presente processo, deverá aguardar ulteriores desenvolvimentos, nomeada mete a formalização, por parte do requerente, do destaque de parcelas aflorado nos processos n.ºs. (…)”
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6. Em 22/03/2004, a Ré foi notificada pela Câmara Municipal, nos termos da qual: “CÂMARA MUNICIPAL DIRECÇÃO MUNICIPAL DE GESTÃO URBANÍSTICA DEPARTAMENTO DE GESTÃO URBANÍSTICA II DIVISÃO DA ZONA ORIENTAL Exmº. Srº C, Lda. Processo n.º Notificação N.º /Eq.2 Local: Rua Data: 14-2-05 Assunto: construção nova. NOTIFICAÇÃO Para os devidos efeitos, notifica-se V. Ex.ª, dando conhecimento da informação e despacho conferido ao presente processo, da qual se junta cópia. (...), cujo teor é o seguinte:
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7. Em 21 de Abril de 2005, a Ré foi notificada pela Câmara Municipal de os termos da qual: “(...) Local: R. Data: 21-04-2005 Notificação. Assunto: Deferimento do(s) processo(s) Const / Alt - Demolição - - NOTIFICAÇÃO Para os devidos efeitos, notifica-se V. Exª. de que, nos termos do artigo 23° do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 177/01, de 4 de Junho, conjugado com o artigo 66° do Código do Procedimento Administrativo, o(s) processo(s) acima identificado(s) fo(i)(ram) DEFERIDO(S) por despacho(s) proferido(s) em 15.04.2005 pela Sra. Vereadora, de acordo com a informação e despachos, cujas fotocópias se anexam. De acordo com o artigo 76° do primeiro diploma, deverá ser requerida a emissão do(s) alvará(s) de Licenciamento de obras de edificação no prazo de 1 ano a contar do terceiro dia sobre a data do registo desta notificação, devendo apresentar os elementos definidos no n.º 3 da Portaria 1105/01, de 18 de Setembro, e indicados nas fotocópias das informações anexas. Findo o prazo supra referido, sem que tenha dado entrada nestes Serviços os elementos referidos, o processo em causa seguirá para o arquivo. Juntam-se em anexo os documentos do processo acima referido, constantes as fls. 160/161. (…)” (al. G) dos Factos Assentes); 8. Em 4 de Janeiro de 2006, a Ré foi notificada pela Câmara Municipal de nos termos da qual “(...) Proc. nº. : Notificação nº ____/EQ.2 Local: Rua,. Data: 2006/01/04 Assunto: Desmoronamento parcial de fachada de imóvel NOTIFICAÇÃO Para os devidos efeitos, notifica-se V. Exª, dando conhecimento do teor da informação e despacho, cuja fotocópia se junta.
“CÂMARA MUNICIPAL DIRECÇÃO MUNICIPAL DE GESTÃO URBANÍSTICA DEPARTAMENTO DE GESTÃO URBANÍSTICA II DIVISÃO DA ZONA ORIENTAL
(…)” (al. H) dos Factos Assentes); 9. Em Janeiro de 2006, a Ré foi notificada pela Câmara Municipal de, nos termos da qual: “(...) Processo N° - Notificação N° Local: Data: 11-01-2006 Assunto: Pedido de Início de trabalhos de escavação - Deferimento do pedido NOTIFICAÇÃO Para os devidos efeitos, notifica-se V. Ex.ª, ao abrigo do disposto no artigo 66° do Código do Procedimento Administrativo, que o pedido apresentado, acima identificado, foi DEFERIDO por despacho proferido em 07-01-2006, pelo(a) Sra. Vereadora, nos termos da informação e despachos, cuja(s) fotocópia(s) se anexa(m). Extinto o procedimento nos termos do artigo 106° do Código do Procedimento Administrativo, o processo em causa seguirá para o arquivo. Juntam-se em anexo o(s) documento(s) do processo acima referido, constante(s) as fls. 106 / 110 e 264”, nos termos dos quais: “(...) Folha n.º Proc. N° Infor. n.º Data infor.: 06-12-2005 Freguesia, CÂMARA MUNICIPAL DE DMGU, DZDR
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10. A licença de construção não foi ainda emitida pela Câmara Municipal (al. J) dos Factos Assentes); 11. Em 25 de Setembro de 2006, não se mostravam aprovados os projectos necessários à execução da construção do prédio de que faria parte a fracção prometida vender, não estando sequer, emitida a licença de construção (resp. ao ques. 1º da Base Instrutória); 12. A Autora no âmbito da sua actividade tem outros investimentos em curso (resp. ao ques. 2º da Base Instrutória); 13. Não sendo previsível a data em que seria celebrado o acordo referido na alínea 2.1 do contrato referido em A) dos Factos Assentes (rdsp. Ao ques. 3º da Base Instrutória); 14. Após de 21 de Abril de 2005, a Ré deu entrada do pedido de alvará de licenciamento de obras, da licença especial de ruído para obra e do pedido de ocupação da via pública (resp. ao ques. 4º) da Base Instrutória); 15. Já com os trabalhos em andamento, verificou-se, no local, um aluimento de parte da fachada do prédio sito na Rua (resp. ao ques. 5º da Base Instrutória); 16. A A. dedica-se à compra, venda, revenda, construção, reconstrução e administração de imóveis, estudo, execução, gestão, coordenação, fiscalização de empreitadas de construção civil e obras públicas e de instalações especiais, bem como a importação, exportação, comercialização e fornecimento de equipamentos conexos (doc. de fls. 238 a 240). III – ENQUADRAMENTO JURÍDICO 1.Objecto do recurso Em face das concisas conclusões da apelante, o que se aplaude, colocam-se para debate as seguintes questões para apreciação deste Tribunal: · O prazo estipulado no contrato - promessa deverá ser interpretado na economia e vontade contratual dos outorgantes como um prazo essencial para a celebração do contrato prometido? · A não se entender verificado tal pressuposto a apelante repousa em razões objectivas a advinda falta de interesse na celebração do negócio definitivo? · Configura-se a situação factual em mora ou incumprimento imputável à apelada? Breve enquadramento legal do regime do contrato-promessa de compra e venda. Na discussão jurídica da causa, o julgador de 1ªinstância fez apelo à regras gerais do regime legal do contrato-promessa e demais enquadramento doutrinário e jurisprudencial, pelo que, maugrado, a repetição inevitável nesta peça, optaremos por uma esquemática análise do regime legal do contrato-promessa de compra e venda de imóvel e do seu incumprimento, existindo entrega de sinal. Estatui o artº442, nº1 do CCivil que se, quem constituir o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o incumprimento for de quem recebeu o sinal, a outra parte tem a faculdade de lhe exigir o dobro do que prestou. Em qualquer dos casos, o contraente não faltoso pode, em alternativa, requerer a execução específica, nos termos do artº 830 do C.Civil. Na ausência de estipulação em contrário, não há lugar pelo não cumprimento do contrato-promessa a qualquer outra indemnização nos casos de perda do sinal, ou, de pagamento do dobro deste – artº 442, nº 4, do Civil. A par do regime legal específico do contrato-promessa a que acima se fez referência, aplica-se, em tanto quanto for pertinente, o regime geral do cumprimento e ou do incumprimento das obrigações. O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado, ou seja, quando realiza pontualmente, com diligência e boa - fé, comportamento devido - artº762 do CCivil e considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, não realize no tempo devido a prestação ainda possível a que está vinculado-artº804,nº 2 do CCivil. O incumprimento definitivo da obrigação pressupõe sempre uma situação de mora de cumprimento de uma das partes e consuma-se por via da perda do interesse do credor na prestação, verificada em termos objectivos, ou pela omissão de cumprimento pelo devedor em prazo razoável que lhe tenha sido fixado e comunicado pelo credor –artº 801 e 808º do CCivil. Temos assim, que o incumprimento definitivo do contrato promessa tem na sua origem um incumprimento transitório – ou mora – traduzido na não realização da prestação, que ainda será possível, no prazo a que o contraente se vinculou. A obrigação só se considera não cumprida se o credor perder o interesse na prestação como consequência da mora; se, existindo mora, o devedor não cumprir no prazo, razoável, que o credor lhe fixar, mediante interpelação; se o devedor fizer uma declaração, clara, inequívoca e peremptória que não cumprirá o contrato. Importa, na verdade, ter presente nesta temática a qualificação do prazo contratualmente fixado convocando a lição do Prof. Vaz Serra: 5 In RLJ 110, 326-327. “A estipulação de um prazo para a execução de um contrato não tem sempre o mesmo significado. Pode querer dizer que, decorrido o prazo, a finalidade da obrigação não pode já ser obtida com prestação ulterior, caducando por isso o contrato; mas pode também ser apenas uma determinação do termo que não obste à possibilidade de uma prestação ulterior, que satisfará ainda a finalidade da obrigação, caso em que o termo do prazo não importa a caducidade do contrato, mas tão somente a atribuição ao credor do direito de resolve-lo. Na primeira hipótese estamos perante um negócio fixo absoluto. No segundo estamos perante um negócio fixo, usual, relativo ou simples.” O estado de mora, mesmo havendo constituição de sinal, não traduz a falta definitiva, mas apenas o retardamento da prestação debitória, logo não confere ao credor o direito à resolução do contrato. Ao contrário, de acordo com a lição do Prof. Antunes Varela, após a entrada em vigor do D.-L. 379/86, de 11 de Novembro, no caso de ter sido constituído sinal, a simples mora acciona o direito à resolução do contrato-promessa , in Das Obrigações em geral, Vol. I – 8ª edição -, pág. 350 e 351 e in Código Civil Anotado, Pires de Lima e Antunes Varela, Volume I – 4ª edição ,pag.423. Quanto à caracterização do prazo estabelecido para cumprimento do contrato prometido. Regista-se que constitui orientação maioritária Registamos, porém, de acordo com a indagação que efectuamos, que , designadamente o Cons.Pinto Monteiro não segue este caminho, entendendo que a entrega de sinal permite o funcionamento do artº442, mesmo em caso de simples mora,Cfr.AcSTJ de 8/3/05 in CJ, I, pag.121. do Supremo Tribunal de Justiça Também no mesmo sentido, exemplificadamente, o Acstj de 24/10/06 in www.dgsi.pt. e largamente espelhada na doutrina, Cfr Manuel Januário da Costa Gomes, in Em Temas de Contrato-Promessa, pág. 15, Calvão da Silva, in Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, pág. 303 e ss., e Sinal e Contrato-Promessa – 11ª edição, pág. 118 e ss., inserindo inúmeras citações de jurisprudência no mesmo sentido. que não sendo convencionado um prazo essencial ou absoluto no c.p.c.v, o estar para além dele não atribui automaticamente o direito de resolução promitente credor. Com destaque nosso, lê-se, por exemplo no Ac.STJ de 14/11/06 Disponível in www.htp.dgsi.pt: “ Se o prazo fixado num contrato-promessa para a celebração da escritura de compra e venda não for essencial, necessário ou absoluto, uma vez ultrapassado não se segue daí, de forma automática, a atribuição do direito de resolução do contrato-promessa ao contraente não faltoso. Isto porque, face ao disposto no art. 410.º, n.º 1, do CC, são aqui aplicáveis as normas de carácter geral respeitantes ao incumprimento das obrigações constantes dos arts. 790.º e ss., incluindo o art. 808.º, do CC.Fora casos especiais como o da pura e simples recusa do cumprimento, destruição da coisa, alienação a terceiro ou fixação de prazo essencial, a aplicação das sanções previstas no art. 442.º do CC pressupõe o incumprimento definitivo do contrato-promessa e não a simples mora. Com efeito, as indemnizações aí previstas têm natureza compensatória, o que pressupõe a resolução ou extinção do contrato-promessa; já a simples mora apenas constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados (art. 804.º, n.º 1, do CC), com indemnização a fixar nos termos gerais.” Passemos de imediato aos autos. É uma evidência que o Direito se destina a aplicar a situações de facto, cujos contornos precisos permitirão chegar à solução jurídica adequada. No caso em apreço, do minucioso detalhe da matéria de facto provada e compilada pelo Tribunal a quo no ponto II, teremos que destacar os factos relevantes para a respectiva qualificação jurídica alcançada na sentença e da qual a Apelante diverge. Nessa tarefa (questão de natureza eminentemente jurídica) seleccionámos : - As partes celebraram um contrato promessa de compra e venda de fracção de imóvel a construir, no dia 23 de Dezembro de 2004, tendo a promitente compradora entregue no acto à promitente vendedora, a título de sinal, a quantia de Euros25.000,00, e mais convencionando, no que importa ao dissídio, que: Cláusula terceira (Escritura Pública) “A escritura pública de compra e venda ora prometida será outorgada em dia, hora e Cartório Notarial a designar pela promitente vendedora, por carta registada com aviso de recepção enviada com uma antecedência mínima de 10 (dez) dias em relação à data a agendar, prevendo-se que tal ocorra até ao dia 30 de Janeiro de 2007 ou, não sendo legalmente possível, até ao termo do prazo de 60 (sessenta) dias a contar da data de entrada na Câmara Municipal do requerimento para a emissão da respectiva licença de utilização. Para os efeitos previstos no número anterior, a promitente vendedora diligenciará no sentido de apresentar aquele requerimento na Câmara Municipal até ao dia 30 de Janeiro de 2007”. - O processo de licenciamento da construção e documentação afim indispensável para a respectiva legalização e realização do contrato prometido não estava concluído no dia 30/1/2007, ou, nos 60 dias subsequentes. - Em 21/4/2005, a Ré é notificada pela CM que os processos iniciais de licenciamento tinham sido deferidos. -A Ré deu, entretanto, entrada do pedido alvará e licenças para obras. -Em 4/1/2006, a CM deu instruções à Ré perante o aluimento da fachada do prédio contíguo à obra, para a reconstruir dado o seu interesse arquitectónico. - No decurso do processo, por determinação da CM, iniciado como loteamento transitou para a figura de destaque. - A Ré continuou em contacto com a CM no sentido de corresponder aos pedidos e solicitações que lhe foram feitas e em 11 de Janeiro de 2006 foi notificada do deferimento o início dos trabalhos de escavação. - Em 18 de Outubro de 2006, a Autora requereu a notificação judicial avulsa da Ré, considerando resolvido o contrato promessa por incumprimento desta última e solicitando a devolução do valor do sinal pago em dobro e juros de mora. - A licença de construção ainda não foi emitida pela CM. - A Autora dedica-se à compra, venda, reconstrução e administração de imóveis, estudo, execução, gestão e fiscalização de empreitadas. - A Autora tem outros projectos em curso. O principal problema que nos é colocado, é, afinal de contas a interpretação da cláusula 3ª do c.p.c.v, sobre o que divergem as partes. Que dizer face à factualidade provada e respigada na síntese supra? Bom. Não logrando surpreender as motivações subjectivas contemporâneas ou posteriores à celebração da promessa de venda de cada um dos outorgantes, parece-nos claro, não obstante, que face à estipulação temporal convencionada, as partes não tiveram em vista estabelecer um prazo certo, necessário, e portanto, essencial, para a celebração do contrato prometido. Além do mais, antecipando, parece-nos facilitada a apreciação, pois, que os factos assentes apontam para uma inequívoca impossibilidade temporária do cumprimento do contrato definitivo por parte da Ré, decorrente de razões não dominadas pela sua vontade ou que lhe sejam imputáveis por falta de apropriada diligência em situação paralela. Donde, penda a caracterização do prazo estipulado para um ou outro lado, sempre estaria afastada a culpa da Ré de até ao momento, por o projecto não estar concluído, como flui abundantemente do percurso administrativo e a alteração de circunstâncias com que se lhe depararam, originando sucessivos pedidos de novos e elementos que a Câmara Municipal foi alterando e exigindo . Voltando à interpretação da cláusula 3ª do c.p.c.v. Determinante para a conclusão a que acima aportámos, cremos estar o facto de ambas as partes estarem no momento da celebração do c.p.c.p.v. bem cientes de que se tratava de uma obra específica, demorada por natureza, em zona de prédios antigos e alguns com valor arquitectónico, e consequentemente, sujeita ao périplo demorado e aos habituais e morosos licenciamentos em tais situações pelas respectivas autoridades camarárias. Observe-se, ainda, que a ora apelante prossegue como actividade, designadamente, a de construtora de imóveis e fiscalização de empreitadas, sendo versada assim no quotidiano dos projectos e licenças de construção. Acresce que, é patente dos factos, que estando as obras da construção visada a iniciarem-se, o aluimento da fachada do prédio classificado, e, a exigência para a Ré feita pela CM da sua reconstrução, com projecto, licença, etc, traduzem circunstancialismo imprevisto, mas causador de demora significativa, que de modo algum é susceptível de imputar culposamente à apelada. Com efeito, o 1ºparágrafo da clª3ª é expressivo quanto a esta “álea temporal” que as partes previram à partida, ao dizerem “...prevendo-se até 30/1/2007 .. ”, definindo-se o significado de uma data ou prazo meramente indicativo ou programático. Acentua-se este sentido com a utilização da adversativa “ou”, que por si, exclui a interpretação veiculada pela apelante, segundo a qual a escritura não se realizando em 30/1/07, teria de realizar-se” nos 60 dias subsequentes”. Uma coisa é a data provável para a realização da escritura em 30/1/07, outra, diversa, é o conteúdo da vontade negocial quanto ao prazo de 60 dias que não deve ser entendido como o espaço temporal subsequente( 30/3/07), mas, outrossim, os 60 dias após a data de entrada do requerimento de licença de utilização, tendo em conta a previsão daquele período para obter junto da CM o referido documento indispensável para a celebração de escritura de contrato de compra e venda de imóvel para habitação. Não podemos, pois, salvo o devido respeito, acompanhar a tese da apelante, por a mesma não ter o mínimo de correspondência no texto da cláusula e, o apuramento dos demais factos igualmente a afastar. Dito de outro modo, a formulação de tal declaração negocial relativa ao tempo de cumprimento do contrato prometido não se revela elemento determinante para a celebração do contrato prometido, prevendo ambas as partes ab initio, a inutilidade de estabelecer um prazo certo para o efeito e não assumindo negocialmente o prazo/data rigoroso para a feitura da escritura. Cf.Michele Giorgianni in L’inademplimento, 3ª, 1975, pag, 171 e 172 referido e traduzido pela Prof.Ana Prata « pode na verdade ocorrere que a este propósito sejam adoptadas expressões elásticas, como o mais depressa possível. Ou semelhantes ; ou que a indicação do termo, embora tendo relação com o calend´rio não assuma, ma intenção das partes, um significado rigoroso, antes servindo como mero ponto d ereferência do período de tempo no qual se pretende que a obrigação deva ser cumprida. » E, quanto à diligência da Ré? As partes estabeleceram no último parágrafo da clª 3ª que à Ré competia diligenciar junto da CM a obtenção de tal licença, mas ainda que não existisse tal convenção, sempre seria de lhe exigir a colaboração/ facere próprio da sua prestação no contrato. Ora, a Ré percorreu todos os passos adequados e foi sempre resoluta na resposta às solicitações sucessivas da CM, incluindo a alteração do processo de loteamento para o de destaque, cuja tramitação, é dado comum, revela-se morosa e exigente nos seus pressupostos. Pelo que, por mera hipótese académica, se entenda verificada mora, não sendo ela factor bastante para desencadear a resolução do contrato promessa, havendo sinal percebido, a notificação judicial avulsa enviada pela Autora à Ré dando por resolvido o contrato-promessa, foi precipitada e inconsequente. Por último, a alegada perda de interesse da Autora na prestação. Sabemos que, o interesse do credor deve ser apreciado objectivamente, sem abstrair, contudo, do quadro contratual concreto, Cf.Prof.Baptista Machado in Pressupostos da Resolução por incumprimento in Obra Dispersa, I, pag.187. designadamente, atendendo a qualquer declaração ou facto concludente de que possa inferir-se as especiais finalidades a que o credor destinava a prestação, e ainda, as circunstâncias do momento da celebração da promessa e as ocorridas posteriormente. Neste contexto, dado o objecto social da apelante, não pode ser subestimado pelo declaratário normal, “Por outras palavras: parte-se do princípio de que o declaratário teve conhecimento das circunstâncias que na verdade, conheceu, e ainda de todas aquelas que uma pessoa razoável, posta na situação, teria conhecido::::” in Teoria Geral da Relação Jurídica , II, 1964, PAG.309/310. que a aquisição da fracção se destinava certamente à revenda, sendo, portanto, normal a necessidade de investimento numa sociedade comercial com tal actividade, pese embora, outros projectos (afortunadamente) possa ter. Como empresa deste ramo, não se provou que o sinal prestado a impedisse sequer de realizar outro negócio, sendo certo que, destinando-o à obtenção de lucro com a venda, não será em princípio prejudicada, pois, o preço será o vigente no mercado ao tempo, tendencialmente superior ao valar do capital investido em 2006. Em suma, a Autora mantém interesse creditório em adquirir a fracção, para a revender, finalidade última do negócio, não se verificando pela demora na conclusão do negócio definitivo o desaparecimento da utilidade do contrato para aquela, continuando apto a produzir o efeito desejado, a obtenção de lucro. De resto, não olvidando a actual crise no sector imobiliário, não é justo imputar, exclusivamente à Ré as suas decorrências na finalização da obra, ou a sua previsão ao tempo da celebração do c.p.c.v, frisando que no momento da notificação judicial avulsa(2006), não era presente o cenário actual do sector. Não podemos, por isso, acompanhar a linha de rumo defendida pela recorrente em qualquer uma das suas vertentes, crendo acertada a sentença proferida. Resumindo para concluir: a) O teor do contrato-promessa ajuizado e as circunstâncias factuais apuradas não sustentam a vontade negocial de estabelecimento de prazo fixo e essencial para a celebração do contrato definitiva de compra e venda da fracção do imóvel; b) Donde é infundado o alegado incumprimento definitivo da apelada e injustificada a declaração resolutória da promitente-compradora. c) A simples mora não permite ao credor desencadear automaticamente a resolução do contrato e reclamar o valor prestado a título de sinal. d) Os factos apurados não consubstanciam objectivamente a perda de interesse no negócio por parte da promitente compradora que motive a resolução do contrato-promessa. IV – DECISÃO Pelo exposto, julga este Tribunal da Relação a apelação improcedente, mantendo-se a sentença nos seus precisos termos. As custas ficam a cargo da apelante. Lisboa, 19 de Maio de 2009 Isabel Salgado Conceição Saavedra Cristina Coelho |