Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
125/14.5TTCSC.L1-4
Relator: JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO
Descritores: GRAVAÇÃO DA PROVA
PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/31/2015
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: RECLAMAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – Inexiste norma legal que, em regra, obrigue os tribunais a fornecerem às partes os suportes físicos e informáticos necessários à cópia da gravação a que se procedeu da Audiência de Discussão e Julgamento, limitando-se o artigo 155.º do NCPC a determinar que «A gravação deve ser disponibilizada às partes, no prazo de dois dias a contar do respetivo ato», ou seja, que o acesso a tal registo deve ser facultado dentro daquele prazo.
II – O prazo de interposição de recurso não se suspende com a formulação do pedido eletrónico de fornecimento de cópia daquele registo-áudio e só se reinicia no dia da efetiva entrega do CD, pois inexiste regra jurídica que, fora das situações excecionais do justo impedimento (artigo 140.º do NCPC) ou do n.º 6 do artigo 157.º do mesmo diploma legal, dê cobertura mínima a uma tal tese.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:I – RELATÓRIO:


AA, NIF (…) e residente na Rua (…), n.º (…),(…)Quinta da Bicuda, Cascais, veio, em 6/2/2014, através do preenchimento do formulário respetivo, propor ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento com processo especial contra a Ré AA, NIF (…) e com sede na Travessa (…), n.º (…),(…)Lisboa.
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Os atos prosseguiram a sua tramitação normal, tendo vindo a ser proferida, e a fls. 570 a 606 e com data de 17/12/2014, sentença que, em síntese, decidiu o seguinte:
«Por todo o exposto julga-se improcedente a ação:
- Reconhecendo-se como lícito e regular o despedimento e
- Absolvendo-se a empregadora dos pedidos formulados.
Valor: € 84.188 (oitenta e quatro mil euros, cento e oitenta e oito euros) – art.º 98.º-P, n.º 2, do CPT[1].
Custas pela Autora – art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e 1.º, n.º 2, al. a), do CPT.
Notifique e registe.»
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A Autora e o seu ilustre mandatário foram notificados do teor de tal sentença por cartas remetidas no dia 29/12/2014 (cf. fls. 607 e 609).
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A Autora veio, a fls. 612 a 614 e no dia 9/01/2015 formular o presente requerimento:
«AA; Autora melhor identificada nos autos, notificada da douta sentença vem requere a V. Excelência se digne mandar disponibilizar a prova gravada em sede de audiência de julgamento a fim de poder instruir oi competente recurso».  
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Foi lavrado, com data de 26/1/2015, o seguinte «Termo de gravação de CD e entrega» (fls. 619):
«Em 26/01/2015, ao Sr. Dr. FN, com a Cédula profissional n.º (…) e Cartão Cidadão (…) fiz a entrega de um CD, apresentado pelo mesmo contendo as gravações da(s) audiência(s) realizadas nos autos supra indicados.
Em conforme recebeu o CD, com as referidas gravações, vai comigo assinar.
O Mandatário (assinatura)
O/A Escrivão Adjunto (assinatura) MMM»
 
A Autora veio, em 15/02/2013 e a fls. 620 e seguintes, interpor recurso de Apelação de tal sentença condenatória, tendo feito acompanhar o mesmo das correspondentes alegações, onde se constata que a trabalhadora veio impugnar de facto e de direito tal decisão judicial.    
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A Ré veio, a fls. 675 e seguintes e na sequência da notificação judicial feita para esse efeito, apresentar as alegações de recurso de fls. 675 e seguintes onde, com relevo para a matéria da presente Reclamação, formulou as seguintes conclusões iniciais:

«1.ª - Os presentes autos assumem a natureza de processo urgente, pelo que vigora a regra legal da continuidade dos prazos, não se suspendendo nas férias judiciais.
2.ª - Nos presentes autos, o prazo de interposição do recurso de apelação é de vinte dias, ao qual podem acrescer dez dias no caso de haver lugar à reapreciação da prova gravada.
3.ª - A notificação à Recorrente, na pessoa do seu mandatário, da decisão recorrida foi elaborada, por transmissão eletrónica de dados, em 29 de Dezembro de 2014, razão por que se presume feita em 2 de Janeiro de 2015.
4.ª - O prazo para a Recorrente interpor recurso de apelação, que tivesse por objeto a reapreciação da prova gravada, terminou em 2 de Fevereiro de 2015.
5.ª - A Recorrente interpôs o presente recurso de apelação apenas no dia 15 de Fevereiro de 2015, às 20:35:26 horas, i.e., decorridos mais de nove dias úteis após o termo do prazo e sem que, para o efeito, haja alegado ou oferecido prova de justo impedimento para o fazer em tempo.
6.ª- O prazo para interposição de recurso de apelação é perentório, motivo pelo qual o seu decurso extingue o direito de praticar o ato.
7.ª - A interposição extemporânea do recurso de apelação pela Recorrente não é processualmente admissível, não devendo, por isso, o Tribunal ad quem conhecer do respetivo objeto. (…)».
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A Autora, apesar de notificada (fls. 475 – notificação entre os mandatários das partes) de tais contra-alegações, nada veio dizer dentro do prazo legal de 10 dias.
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O tribunal recorrido proferiu então, com data de 24/3/2015, o seguinte despacho (fls. 709):
«Ref.ª 18808115:
A decisão é recorrível e a recorrente tem legitimidade.
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A recorrente, notificada da sentença final proferida, veio interpor recurso, que é de apelação.

A recorrida, sem contra-alegações, sustenta a sua intempestividade.

Apreciando e decidindo dir-se-á que o recurso deu entrada em juízo a 15 de Fevereiro de 2011.

A sentença foi notificada aos mandatários (fls. 607-610) e às partes a 29.12.2014.

Sendo os autos de natureza urgente (art.º 26.º, n.º 1 al. a), do CPT) e considerando a data das notificações, o prazo de recurso terminava 2 de fevereiro de 2015 - art.º 26.º, n.º 1 al. a) e 80.º, ambos do CPT e 144.º do CPC.

Por conseguinte a apresentação do recurso a 15.02.2015 é intempestiva (ainda que com a multa a que alude o art.º 145.º, n.º 5 do CPC).

Pelo exposto, sendo o requerimento de interposição de recurso intempestivo, não se admite o recurso – art.º 82.º, n.º 1 e 2 do CPT.
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Notifique.»
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A Autora, notificada de tal despacho e inconformado com o mesmo, veio, em 1/4/2015 e a fls. 712 e seguintes, reclamar, nos termos dos artigos 82.º, n.º 2 do CPT e artigo 652.º, número 3, do Novo Código de Processo Civil, de tal despacho de não admissão do recurso de Apelação por ela anteriormente interposto, tendo, para o efeito alegado e formulado, a final, as seguintes conclusões:
(…)
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A Ré não respondeu a tal reclamação dentro do prazo legalmente previsto para esse efeito, apesar de notificada para o efeito.
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A juíza do processo proferiu ainda o despacho de fls. 728 e datado de 7/5/2015, com o seguinte teor:
«Antes de mais, informe a secção o que tiver por conveniente quanto ao (atraso entre o) pedido de disponibilização da gravação e a sua disponibilização».
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A secção abriu de novo conclusão, em 11/5/2015, com a seguinte informação: «(…) de que os cd’s de gravação das diligências foram entregues no dia 19/01/2015 e 26/01/2015, respetivamente, conforme dos termos de fls. 618 a 619, dias esses em que os mesmos foram solicitados na secção com a apresentação dos cd’s para as gravações, sendo que, os requerimentos foram apresentados em 09/01/2015 e em 15/01/2015».     
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Foi então prolatado o despacho de fls. 729, com data de 11/5/2015 e com o seguinte teor:

«Mantém-se o despacho reclamado – art.º 82.º, n.º 4 do Código de Processo do Trabalho.
Remeta a presente reclamação ao Tribunal da Relação de Lisboa, para melhor e superior apreciação pelo Exmo. Juiz Desembargador Relator.
Notifique, incluindo a recorrida».  
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Tendo a dita Reclamação, conjuntamente com os autos principais, onde aquela se mostra integrada, subido a este tribunal da 2.ª instância, foi dado vista ao Ministério Público, que emitiu parecer com referência ao objeto do recurso de Apelação e no sentido da procedência deste último (fls. 734 e 735).
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As partes na da disserem dentro do prazo legal de 10 dias acerca de tal parecer e na sequência da notificação que para esse efeito lhes foi enviada.
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Cumpre decidir.

II – OS FACTOS:

Os factos a considerar encontram-se descritos no Relatório da presente Decisão Singular, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na parte que releva.  

III – OS FACTOS E O DIREITO:

A Autora vem reclamar do despacho judicial que não admitiu o recurso de Apelação interposto pela mesma, por ter considerado que tal recurso foi apresentado fora de prazo. 
 
A – REGIME ADJECTIVO E SUBSTANTIVO APLICÁVEIS:

Importa, antes de mais, definir o regime processual aplicável aos presentes autos de reclamação, atendendo à circunstância de os autos emergentes do contrato de trabalho de que depende tal reclamação, terem sido instaurados em 26/2/2014, ou seja, depois da entrada em vigor das alterações introduzidas no Código do Processo do Trabalho pelo Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13/10, que segundo o seu artigo 6.º, só se aplicam às acções que se iniciem após a sua entrada em vigor, tendo tal acontecido, de acordo com o artigo 9.º do mesmo diploma legal, somente em 1/01/2010.

Esta ação, para efeitos de aplicação supletiva do regime adjetivo comum, foi instaurada depois da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, que ocorreu no dia 1/9/2013.

Será, portanto e essencialmente, com os regimes legais decorrentes da atual redação do Código do Processo do Trabalho e do Novo Código de Processo Civil como pano de fundo adjetivo, que iremos apreciar as diversas questões suscitadas neste recurso de Apelação.

Também se irá considerar, em termos de custas devidas no processo, o Regulamento das Custas Processuais – aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26/02, retificado pela Declaração de Retificação n.º 22/2008, de 24 de Abril e alterado pelas Lei n.º 43/2008, de 27-08, Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28-08, Lei n.º 64-A/2008, de 31-12, Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de Abril com início de vigência a 13 de Maio de 2011, Lei n.º 7/2012, de 13 Fevereiro, retificada pela Declaração de Retificação n.º 16/2012, de 26 de Março, Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, com início de vigência a 1 de Janeiro de 2013 e Decreto-Lei n.º 126/2013, de 30 de Agosto, com início de vigência a 1 de Setembro de 2013 –, que entrou em vigor no dia 20 de Abril de 2009 e se aplica a processos instaurados após essa data.  

B – OBJECTO DA RECLAMAÇÃO:

A única questão que, ao abrigo dos artigos 80.º do Código do Processo do Trabalho e 643.º do Novo Código de Processo Civil, se suscita no âmbito da presente reclamação é a seguinte: deveria ou não o tribunal que proferiu o despacho reclamado ter admitido a Apelação interposta pela Autora e, nessa sequência, determinado a tramitação subsequente da mesma, com a sua subida oportuna ao Tribunal da Relação de Lisboa, por aquela ter sido apresentada ainda dentro do prazo legal?

C – REGIME LEGAL APLICÁVEL:

Importa chamar à colação, para uma correta compreensão da problemática que se suscita no âmbito desta Reclamação, as normas constantes dos artigos 79.º-A, número 1 e 80.º do CPT e 155.º e 640.º do NCPC:

Artigo 79.º-A:
Recurso de apelação
1 - Da decisão do tribunal de 1.ª instância que ponha termo ao processo cabe recurso de apelação.
2 – (…)

Artigo 80.º:
Prazo de interposição
1 - O prazo de interposição do recurso de apelação ou de revista é de 20 dias.
2 - Nos casos previstos nos n.ºs 2 e 4 do artigo 79.º-A e nos casos previstos nos n.ºs 2 e 4 do artigo 721.º do Código de Processo Civil, o prazo para a interposição de recurso reduz-se para 10 dias.
3 - Se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada, aos prazos referidos na parte final dos números anteriores acrescem 10 dias.

Artigo 155.º:
Gravação da audiência final e documentação dos demais atos presididos pelo juiz.
1 - A audiência final de ações, incidentes e procedimentos cautelares é sempre gravada, devendo apenas ser assinalados na ata o início e o termo de cada depoimento, informação, esclarecimento, requerimento e respetiva resposta, despacho, decisão e alegações orais.
2 - A gravação é efetuada em sistema sonoro, sem prejuízo de outros meios audiovisuais ou de outros processos técnicos semelhantes de que o tribunal possa dispor.
3 - A gravação deve ser disponibilizada às partes, no prazo de dois dias a contar do respetivo ato.
4 - A falta ou deficiência da gravação deve ser invocada, no prazo de 10 dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada.
5 - A secretaria procede à transcrição de requerimentos e respetivas respostas, despachos e decisões que o juiz, oficiosamente ou a requerimento, determine, por despacho irrecorrível.
6 - A transcrição é feita no prazo de cinco dias a contar do respetivo ato; o prazo para arguir qualquer desconformidade da transcrição é de cinco dias a contar da notificação da sua incorporação nos autos.
7 - A realização e o conteúdo dos demais atos processuais presididos pelo juiz são documentados em ata, na qual são recolhidas as declarações, requerimentos, promoções e atos decisórios orais que tiverem ocorrido.
8 - A redação da ata incumbe ao funcionário judicial, sob a direção do juiz.
9 - Em caso de alegada desconformidade entre o teor do que foi ditado e o ocorrido, são feitas consignar as declarações relativas à discrepância, com indicação das retificações a efetuar, após o que o juiz profere, ouvidas as partes presentes, decisão definitiva, sustentando ou modificando a redação inicial.

Artigo 640.º:
Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º. 

Será com tal regime legal de cariz adjetivo como pano de fundo que iremos apreciar esta Reclamação.
    
D – SITUAÇÃO DOS AUTOS:

Resulta do Relatório acima transcrito que o Tribunal do Trabalho de Cascais, no quadro desta ação de impugnação judicial da regularidade e licitude de despedimento, proposta ao abrigo dos artigos 98.º-B e seguintes do Código do Processo de Trabalho, prolatou sentença final no dia 17/12/2014, vindo esta última a ser notificada às partes por comunicação postal datada de 29/12/2094 (cf. fls. 697 a 610), que, segundo a regra geral, se deverá presumir feita no 3 dia seguinte e útil, convindo recordar que nos movemos no seio de um processo de natureza urgente (artigo 26.º, n.º1, alínea a) do C.P.T.), cuja contagem dos prazos judiciais é efetuada nos termos do artigo 138.º do NCPC. 

Logo, sendo o dia 29/12/2014 uma segunda-feira e o dia 1/1/2015 feriado, transferiu-se tal notificação para o dia imediatamente a seguir (sexta-feira, dia 2/1/2015) e o prazo de 20 dias + 10 dias (artigo 80.º, n.º 1 e 3 do CPT) iniciou-se no dia 3/1/2015 e terminou no dia 2/2/2015, dado o dia anterior, correspondente ao 30.º dia, ser domingo, havendo ainda que lhe aditar os 3 dias úteis do artigo 139.º, o que o faz prolongar, contra o pagamento da multa referenciada nos n.ºs 5 a 8 dessa disposição legal, até ao dia 5/2/2015 (quinta-feira).

Ora, a ser assim, como nos parece evidente, tendo a Autora somente interposto o recurso de Apelação no dia 15/2/2015 (cf. fls. 620 a 668), é manifesto que tal impugnação judicial foi deduzida muito para além do prazo de 30 dias + 3 dias úteis acima contabilizado.

A reclamante pretende justificar a interposição do seu recurso de Apelação apenas no dia 15/2/2015, com base na dilação temporal que terá decorrido entre a data em que apresentou nos autos o requerimento de fls. 612 a 614, datado de 9/1/2015 e aquela em que lhe terá sido entregue o CD com o registo-áudio da prova produzida em Audiência Final e que ocorreu em 26/1/2015 e a fls. 619.

Pretende a Autora imputar tal dilação à secretaria do Tribunal do Trabalho de Cascais, ou seja, de que a gravação pedida só lhe chegou às mãos 17 dias depois de a ter solicitado, por demora ou atraso na concretização desse registo para CD[2], mas a juíza do processo tratou de descartar ou despistar tal acusação, tendo inquirido diretamente a secção no que respeita à forma como tinha sido dado cumprimento ao referido pedido de entrega da gravação da prova produzida em julgamento.

Ora, conforme ressalta da informação prestada pela secretaria, a fls. 729 e em 11/5/2015, a cópia de tal prova esteve dependente da disponibilização pela Autora do CD necessário à realização daquela, o que só veio a acontecer no dia 26/1/2015, isto é, no próprio dia em que foi feita a sua entrega ao ilustre mandatário da recorrente, conforme “Termo de Gravação de CD e Entrega” constante de fls. 619.

Tal informação é não somente confirmada pela circunstância do pedido de fornecimento de uma cópia de tal registo-áudio ter sido formulado por via eletrónica (CITIUS) e nada se referir aí quanto ao envio ou futura entrega de um CD virgem para esse efeito, como pelo próprio “Termo de Gravação de CD e Entrega” de fls. 619, que contém a seguinte expressão «…fiz a entrega de um CD, apresentado pelo mesmo…».

Impõe-se referir que, em regra[3], nada no regime legal que deixámos acima transcrito obriga os tribunais a fornecerem às partes os suportes físicos e informáticos necessários à aludida cópia da gravação a que se procedeu da Audiência de Discussão e Julgamento, limitando-se o artigo 155.º do NCPC a determinar que «A gravação deve ser disponibilizada às partes, no prazo de dois dias a contar do respetivo ato», ou seja, que o acesso a tal registo deve ser facultado dentro daquele prazo (que nem sequer está em causa nos autos, pois o pedido informático só chegou aos autos 7 dias após a notificação da Autora e do seu ilustre mandatário judicial) mas não que tal deve ocorrer igualmente com o CD ou CD’s exigidos por essa operação (importa dizer que não descortinamos nos autos a verificação de uma qualquer situação grave e excecional que reclamasse a atuação imperativa e oficiosa do tribunal recorrido).

Não valerá igualmente a pena defender que o prazo de interposição de recurso se suspendeu com a formulação do mencionado pedido eletrónico de fornecimento de cópia daquele registo-áudio e que o mesmo só se terá reiniciado no dia da efetiva entrega do CD, pois inexiste regra jurídica que, fora das situações excecionais do justo impedimento (artigo 140.º do NCPC) ou do n.º 6 do artigo 157.º do mesmo diploma legal, dê cobertura mínima a uma tal tese, que, aliás, a vigorar, permitiria o alargamento artificial e conveniente do prazo de recurso, dado não poder ser quantificado o tempo que mediaria entre a manifestação de vontade da parte em obter o registo e o efetivo fornecimento dos meios materiais para tal efeito (na exclusiva dependência da parte interessada, sem prejuízo dos casos extremos de abuso de direito ou de uma eventual intervenção do juiz, quando a demora fosse considerada excessiva, ao abrigo dos seus podres de gestão processual).

Também não ressalta dos autos uma qualquer situação de justo impedimento invocada pela Autora e que tivesse sido, desde logo, comprovada no momento de tal invocação, nem um cenário público que, pela sua natureza de facto notório, devesse ser conhecido oficiosamente pelo tribunal (como foi o caso do bloqueio do CITIUS, que, não somente já tinha ficado muito para trás, à data dos factos, como não teria, ainda assim e a existir, qualquer reflexo na situação em análise) – cf. artigo 140.º do NCPC.

As questões de índole constitucional invocadas pela Apelante e Reclamante também não possuem a mínima sustentação jurídica, não só porque a interpretação jurídica do regime legal aplicável, que é defendida pela mesma, não é de acolher, pelas razões anteriormente avançadas, como não se vislumbra de que maneira é que a circunstância de a parte não ter sido diligente, através do célere fornecimento do CD ou CD’s necessários à cópia da gravação da prova produzida em Audiência de Discussão e Julgamento, de maneira a obter prontamente esse registo, pode suporta uma qualquer violação do direito à tutela jurisdicional efetiva (o demandado deixou decorrer 17 dias entre um e outro momento, por sua livre e exclusiva vontade e responsabilidade) sedo certo, finalmente, que, após ela entrar na posse do CD, lhe restava ainda um prazo de 7 dias + 3 dias úteis (10 dias, no total) para apresentar as suas alegações de recurso. 
      
Logo, pelos fundamentos expostos, tem esta Reclamação de ser julgada improcedente, confirmando-se, nessa medida, o despacho de rejeição do recurso de Apelação da Autora que foi objeto da mesma.                                                                                                           
IV – DECISÃO:

Em conclusão e pelos fundamentos expostos, nos termos dos artigos 82.º do Código do Processo do Trabalho e 643.º do Novo Código de Processo Civil, decide-se indeferir a presente Reclamação, deduzida pela Autora AA, confirmando-se o reclamado despacho de não recebimento do recurso de Apelação pela mesma interposto, ainda que por fundamentos diversos.                                                   
     
Custas a cargo da Reclamante – artigo 527.º, número 1 do Novo Código de Processo Civil.
Notifique e registe.

D.N.   

Lisboa, 31 de julho de 2015

José Eduardo Sapateiro


[1] «Ponderando o valor de indemnização com base em 30 dias de retribuição, mas “salários de tramitação”» - Nota de rodapé da parte decisória da sentença da 1.ª instância.
[2] Convindo recordar o que, nesta matéria, estatui o número 6 do artigo 157.º do NCPC: «Os erros e omissões dos atos praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes». 
[3] Dizemos «em regra», dado admitirmos situações de urgência ou de carência económica extrema, que justificam, excecionalmente, uma intervenção oficiosa do tribunal nessa matéria.
  

Decisão Texto Integral: