Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | SOUSA PINTO | ||
Descritores: | ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS ACÇÃO DE ANULAÇÃO DE DELIBERAÇÃO SOCIAL VALOR DA ACÇÃO CADUCIDADE DA ACÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 09/20/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDÊNCIA | ||
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Sumário: | I – Numa acção em que é pedida a anulação de todas as deliberações tomadas na Assembleia de Condóminos, onde, entre outras, estão em causa questões inerentes à validade da sua convocatória, terá de se entender, para efeitos de atribuição do valor à acção, estarmos face a situação que visa a salvaguarda de valores imateriais, correspondendo-lhe, por isso, o valor de 30.000,01€. II- O pressuposto do início da contagem do prazo de caducidade da acção de anulação de deliberações sociais é a de que a mesma tenha sido tomada mediante convocatória regular e válida do impugnante. III- Não existindo convocatória para a assembleia nem posterior comunicação da deliberação, o prazo de caducidade só começa a correr a partir do conhecimento da deliberação por parte do sócio ausente. (Sumário do Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam neste tribunal da Relação de Lisboa, I – RELATÓRIO “A” e “B”, intentaram acção sob a forma de processo ordinário, contra Condomínio do Centro Comercial ““C”” e os seus condóminos, “D” e outros, tendo formulado o seguinte pedido: «a) Declarar-se nulas, ou anuláveis, sem quaisquer efeitos, as declarações e deliberações tomadas na Assembleia Extraordinária de Condóminos, realizada no dia 04-09-2006, respeitante ao Condomínio do Centro Comercial denominado ““C””; b) Condenarem-se os Réus nas respectivas custas.» Citados os RR vieram estes apresentar contestação, tendo sido arguida a caducidade da acção de anulação das deliberações do condomínio impugnadas, alegando que a acção terá sido intentada em data posterior aos 60 dias previstos no art.º 1433.º, n.º 4, do Código Civil. Os AA responderam a tal excepção, pugnando pela sua inverificação. Foi proferido saneador-sentença, onde se apreciou questão inerente ao valor da acção, considerando-se inadequado o valor que os AA tinham apresentado (5.500,00€) fixando-se antes a mesma em 523,74€, dado ter-se entendido ser esse o valor correspondente ao montante que foi deliberado na assembleia de condóminos como sendo devida pelos AA. Decidiu-se ainda julgar a acção improcedente, assim se absolvendo os RR do pedido, por virtude de se ter considerado verificada a invocada excepção de caducidade da acção. Inconformados com tal saneador-sentença vieram os AA recorrer do mesmo, tendo apresentado as suas alegações, nas quais verteram as seguintes conclusões: «1- Os apelantes nos presentes autos impugnaram uma deliberação na sua totalidade. 2- O valor constante na deliberação impugnada é de 39.865,59€. 3- Como os apelantes impugnaram a totalidade da deliberação, o valor a atribuir à presente acção é de 39.865,59€. 4- Se for entendido não manter o valor de 5.500,00€, indicado na petição inicial, deve ser fixado à presente acção o valor de 39.865,59€. 5- O valor de 523,74€ não pode ser fixado à acção por corresponder apenas a uma parte do valor constante na deliberação impugnada. 6- A caducidade do direito de acção para arguir a revogação de uma deliberação operar, nos termos do art.º 1433.º, do Código Civil, tanto para os Condóminos presentes, como os Condóminos ausentes, no prazo de 60 dias a contar da data da deliberação, pressupõe, inevitavelmente, que em ambos os casos se trate de Condóminos devidamente convocados e notificados da respectiva acta. 7- O prazo de 60 dias para os apelantes proporem a presente acção conta -se a partir de 02 de Setembro de 2011, data em que tiveram conhecimento da deliberação e não a partir de 04 de Setembro de 2006, data da tomada de deliberação. 8- Aos apelantes não está vedado o direito de proporem a presente acção, pelo facto de não terem exigido, previamente, a Assembleia Extraordinária de Condóminos para a revogação da deliberação, nem pelo facto de não terem sujeitado a sua revogação a um Centro de Arbitragem. 9- No caso dos Apelantes, ao interpretar-se o art.º 1433.º, do Código Civil, como impondo o início do prazo de 60 dias a partir da data da deliberação, está-se a violar os artgs. 18.º, n.º 2 e 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa. 10- Por isso, a presente acção foi atempadamente proposta pelos apelantes, não se verificando a caducidade do respectivo direito. 11- Houve, assim, por parte da sentença proferida pelo Tribunal “a quo” errada aplicação da Lei adjectiva, nomeadamente, o art.º 310.º, n.º 1, do Código de Processo Civil e da Lei substantiva, designadamente os artgs. 1432.º e 1433.º, do Código Civil e da Lei Constitucional, artgs. 18.º, n.º 2 e 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa. 12- Por isso, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e proferir-se decisão que mande os presentes autos seguir os seus ulteriores termos para conhecimento do pedido, formulado pelos apelantes, para assim se fazer Justiça.» Foram apresentadas contra-alegações, com as seguintes conclusões: «1. Não existem dúvidas, tal como decorre do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Janeiro de 2005, que “o valor processual da causa fixa-se definitivamente, por acordo das Partes ou por intervenção do juiz, com a prolação ou do saneador, ou, maxime, da sentença (artigo 308.º, n.º 3, e 315.º, n.º 3 do CPC) e é esse valor que releva, imodificavelmente, para efeito de recurso, mesmo que se revele contrário aos critérios legais, ou a condenação sentenciada lhe seja superior” (Acórdão do STJ de 13.1.2005; Proc. 04B3696.dgsi.Net e Ver. N.º 3696/04.2ª: Sumários, Jan/2005). 2. Tendo o juiz procedido à alteração do valor da acção, nos termos do n.º 1 do artigo 315.º do CPC, deverá ser esse o valor da causa a considerar para efeitos de admissibilidade de recurso. 3. E tendo o tribunal “a quo” fixado o valor da acção em 523,74€ (quinhentos e vinte e três euros e setenta e quatro cêntimos), compreende-se a razão para os AA. não terem justificado a admissibilidade do recurso face aos critérios fixados no n.º 1 do artigo 678.º do CPC. 4. A admissibilidade do recurso sempre haveria de ser justificada nos termos dos números 2 ou 3 do artigo 678.º do CPC, o que, de facto, não aconteceu. Ora “faltando tal indicação o recurso não deve ser admitido” (Acórdão STJ de 15.6.2005; Proc. 04S3167,dgsi.Net). 5. Mas ainda que se admita o recurso, considerando que o tribunal “a quo” fixou, oficiosamente, o valor da causa num montante “inferior à alçada do tribunal de que se recorre” (cfr. n.º 1 do artigo 678.º do CPC) “sempre se diria que, nos termos do artigo 678.º, n.º 2 alínea b), seria apenas admissível um recurso da “decisão respeitante ao valor da causa.” 6. O objecto do recurso sempre seria limitado à decisão respeitante ao valor da causa, a qual alterou o valor da acção de 5.500€ (cinco mil e quinhentos euros) para 523,74€ (quinhentos e vinte e três euros e setenta e quatro cêntimos) e não às demais questões decididas no tribunal “a quo”. 7. Porém, os AA. apresentam um recurso com um objecto claramente distinto uma vez que, além de apelarem do valor fixado pelo tribunal “a quo”, apelam também da correcta decisão do tribunal “a quo” relativa à tempestividade para a impugnação da deliberação da reunião da Assembleia de Condóminos realizada no dia 04 de Setembro de 2006, o que só seria admitido no âmbito do n.º 1 do artigo 678.º do CPC; 8. Além disso, em sede de recurso procedem à alteração do valor da causa indicado na petição inicial. Tal possibilidade dever ser, igualmente, afastada, porquanto o valor da causa é fixado no despacho saneador, sendo que, mesmo em caso de recurso nunca se poderá reservar à Parte o direito de alterar o valor inicialmente indicado. 9. Cabendo às Partes, primeiramente, o poder quanto à indicação do valor da causa, e, entendendo os AA. que o valor desta acção corresponde ao montante de 39.865,59€, sempre o deveria ter indicado na petição inicial e não apenas em sede de recurso. 10. Ainda que, nos termos do artigo 678.º, n.º 2 alínea b) do CPC, seja sempre admissível recurso, independentemente, ao valor da causa e da sucumbência, das decisões respeitantes ao valor da causa ou dos incidentes, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre, tal faculdade não deve ser confundida com a possibilidade de, em sede de recurso nos termos deste artigo, ser alterado o valor inicialmente indicado na petição inicial. 11. No que respeita ao prazo para impugnação das deliberações refira-se que, em defesa da segurança jurídica, o artigo 1433.º número 4 do Código Civil fixa o prazo para propor a anulação das deliberações contado a partir da data das deliberações e não a partir da tomada de conhecimento das mesmas. 12. Assim, e decorridos 5 (cinco) anos sobre a data das deliberações, a acção de anulação apresentada é, francamente, extemporânea, tendo o direito de anulação previsto no artigo 1433.º número 4 caducado. 13. Mas, e ainda que por hipótese, o prazo fixado legalmente estabelecesse como critério para o início da contagem a “comunicação”, indique-se, desde já, que todas as Actas de Condomínio foram remetidas à Sr.ª “E” que indicava ser Procuradora daquela Loja, pelo que, o prazo consignado no artigo 1433.º do Código Civil sempre se deveria contar desde essa data. 14. Refira-se ainda que, apesar das diversas insistências, nunca os AA. contactaram a Administração no sentido de indicar qual a nova morada para envio da documentação.» II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO O objecto dos recursos acha-se delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 660º, nº 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 685.º-A, nº 1, todos do Código de Processo Civil. São duas as questões que os apelantes suscitam nas suas alegações: a) Valor a atribuir à acção b) Verificação ou não da excepção da caducidade do direito a intentar a acção de anulação ou de nulidade das deliberações da assembleia de condóminos III – FUNDAMENTOS 1. De facto A factualidade a considerar é a que resulta da decisão recorrida: 1 – O Autor é dono e legítimo proprietário da fracção autónoma designada com as letras "AL", que corresponde à Loja ... no Centro Comercial denominado “C”, instalado no prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na R. ..., n.ºs ... e ...-A, ..., ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., da freguesia de ..., e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número …/..., da referida freguesia. 2 – No dia 4 de Setembro de 2006 (por manifesto erro de escrita na decisão recorrida consta a data de 06-09-2006) realizou-se uma assembleia de condóminos, que foi lavrada através da Acta número 23 junta a fls. 23 e ss, onde foram tomadas as deliberações aí referidas. 3 – Os Autores não estiveram presentes na assembleia. 4 – Não se realizou qualquer assembleia extraordinária com vista à revogação das deliberações referidas em 2). 5 – A petição inicial do Autor na presente acção foi apresentada através de correio registado no dia 15 de Setembro de 2011. 6 – Foi elaborada acta da assembleia de condóminos, constante de fls. 23 a 25 dos autos, aqui dada por reproduzida. 2. De direito Apreciemos então as questões que importa conhecer. a) Valor a atribuir à acção A decisão recorrida entendeu que o valor dado à acção pelos AA - 5.500,00€ - não poderia ser aceite pois que na sua óptica aqueles visavam fundamentalmente a anulação das deliberações da assembleia de condóminos realizada no dia 04-09-2006, que teriam aprovado os valores em dívida pelos condóminos à referida data, sendo que a dívida dos AA. ali aprovada era de 523,74€, devendo por isso ser esse o valor da acção. Vejamos. A toda a causa deve ser atribuído um valor, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido (art. 305.º, n.º 1, do CPC). A lei estabelece critérios gerais e especiais a que deve obedecer a fixação do valor da acção. No caso presente, na acção, os AA. pedem a anulação das deliberações tomadas na Assembleia Extraordinária de Condóminos realizada em 04-09-2006, a qual, como resulta da leitura da respectiva acta, deliberou sobre diversas questões que constavam da ordem de trabalhos (discussão e apreciação da situação financeira do condomínio – ponto 1; Discussão e aprovação de cobrança extraordinária – ponto 2; Outros assuntos de interesse para o condomínio – ponto 3). Aí foram apresentados os montantes em dívida por parte de diversos condóminos, num total de 39.865,59€ (apresentando-se o valor de 523,74€, quanto aos AA), tendo-se determinado que quem não efectuasse o pagamento de tais dívidas ficaria sujeito a cobrança contenciosa. Mas tal assembleia não se quedou por tal deliberação. Apreciou uma proposta do Administrador no sentido de se criar uma receita extraordinária a qual não veio a ser aprovada em tal reunião, antes se tendo deliberado realizar uma nova assembleia extraordinária com proprietários e lojistas visando apreciar tal matéria. A assembleia terá terminado, de acordo com a respectiva acta, com informações sobre uma questão de reclamos luminosos. Ora, do que se deixa exposto, resulta para nós que o valor desta acção, em que se pede a anulação das deliberações (todas) tomadas na citada Assembleia de Condóminos, não se pode cingir ao valor da alegada dívida dos AA ao condomínio. Com efeito, estão em causa, não só tal valor como também a de todos os demais eventuais devedores (dívida que ascenderia a 39.865,39€) e ainda questões de estratégia de cobrança de receitas extraordinárias para fazer face às dívidas e que não têm (pelo menos nesta fase) uma expressão pecuniária. Acresce que pondo os AA em causa questões inerentes à validade da sua convocatória e ao funcionamento da própria assembleia, está em causa tudo o que nela se terá decidido, mais, está em causa a própria assembleia. Na nossa óptica, a ser assim, como se entende que é, a situação terá de ser qualificada para efeitos de atribuição do valor à acção como visando a salvaguarda de interesses imateriais. Na verdade, as acções sobre interesses imateriais compreendem as acções cujo objecto não tem expressão pecuniária, as acções cujo benefício não pode traduzir-se em dinheiro (ALBERTO DOS REIS, «Código de Processo Civil Anotado, I, 3.ª edição, pág. 414»). Encontramos na nossa jurisprudência uma situação algo idêntica, reportada a uma acção em que se pedia a anulação de deliberações sociais: «Estando em causa a anulação de deliberações sociais, tomadas em assembleia geral de uma sociedade, com fundamento na falta de qualidade de sócio de um dos presentes nessa assembleia geral, o valor da respectiva acção deve ser fixado de acordo com o disposto no artigo 312.º do Código de Processo Civil, pois estamos perante uma acção que visa sobre interesses imateriais.» (Ac. da Relação do Porto de 04-10-2001, Proc.º 0130793, em que foi Relator o Desembargador, Dr. Camilo Camilo, disponível em www.dgsi.pt ). A ser assim, consideramos que o valor que deve ser atribuído a esta acção, tendo presente o que dissemos e o que resulta da conjugação dos artgs.305.º, 312.º e 319.º do Código de Processo Civil, é de 30.000,01€. b) Verificação ou não da excepção da caducidade do direito a intentar a acção de anulação ou de nulidade das deliberações da assembleia de condóminos Na decisão recorrida assumiu-se o entendimento de que a caducidade do direito a intentar a acção de anulação ou declaração de nulidade de deliberações das assembleias de condóminos, teria como início de prazo a data em que a deliberação em causa fosse tomada (prazo de 20 dias, no caso de ter sido realizada assembleia extraordinária, ou 60 dias, nas situações em que a mesma não tenha ocorrido), independentemente do condómino/A. ter estado ou não na referida assembleia. Fez-se efectivamente uma interpretação literal do disposto no art.º 1433.º, n.º 4 do Código Civil, alicerçada em jurisprudência que se citou [Acds. do STJ de 17-03-2005 (proc.º 05B018 – Relator: Juiz Conselheiro Ferreira Girão), da Rel. de Lisboa de 25-11-2008 (procº 283872008-1 – Relatora; Juíza Desembargadora Rosário Barbosa) e da Relação do Porto de 12-10-2009 (procº 5944/05.0TBVFR.P1 – Relator: Juiz Desembargador Pinto Ferreira)]. Considerou-se, «grosso modo», ser indiferente a presença ou a ausência do condómino na assembleia, para a contagem do referido prazo de caducidade, entendendo-se que a alteração legislativa introduzida pelo DL 267/94, de 25/10, pretendeu efectivamente, por um lado, responsabilizar os condóminos (levando a que os mesmos tenham que estar atentos às diversas vicissitudes que possam decorrer das assembleias de condóminos e às deliberações aí tomadas) e, por outro, levá-los a usarem os meios alternativos de resolução de litígios (requerendo a realização de assembleia extraordinária ou recorrendo aos centros de arbitragem), para tentarem alterar as decisões de que discordem e lhes possam ser desfavoráveis, evitando-se que recorram aos tribunais para tal desiderato. Na nossa óptica porém, tal entendimento não pode ser aplicado com a amplitude com que foi feito, existindo uma limitação, seu necessário pressuposto, que tem de ser considerada. Reportamo-nos ao facto de ter que existir a prévia convocatória válida para a assembleia. Com efeito, para que se possa dizer que o condómino tem de ser responsável e responsabilizado pelas suas omissões ou negligência, tem de previamente ter-se assegurado que o mesmo soube ou que, pelo menos, foram feitas as diligências exigidas por lei para lhe dar a conhecer a existência duma assembleia de condóminos. Não se verificando tal circunstancialismo, o prazo de caducidade não poderá iniciar-se na data em que foi assumida a deliberação que se pretende pôr em causa. É este o entendimento que também foi perfilhado no acórdão da Relação do Porto de 10-10-2006 (proc.º 0621942 – Relator: Juiz Desembargador Henrique Araújo). Diz-se em tal aresto: «(…) Indispensável – como parece óbvio – é que os condóminos tenham sido convocados para a assembleia nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 1432º, como melhor se verá infra. Impõe-se, pois, ao condómino ausente, mas devidamente convocado, que se informe a tempo e horas da deliberação tomada na assembleia para que, querendo, possa pedir a sua anulação no prazo estabelecido nesse preceito. Como refere Rui Vieira Miller, “A Propriedade Horizontal no Direito Civil”, 3ª edição, pág. 272, os condóminos faltosos terão de “cuidar diligentemente de se informar sobre se teve ou não lugar a assembleia e se novo dia foi efectivamente designado”. (…).» A questão coloca-se no entanto quando tal convocatória não ocorre ou não obedece à tramitação legal. Nessas situações, de que o citado acórdão fala como sendo a que aí se verifica, e que nós neste nosso processo ignoramos se se terá ou não verificado – posto que se trata de matéria controvertida (os AA. referem que não foram convocados para a referida assembleia e os RR referem que a convocatória foi validamente realizada) – entendemos que não se poderá considerar cegamente que o prazo de caducidade para intentar a acção de anulação tem o seu início na data da deliberação. Recuperando nova passagem do indicado acórdão de 10-10-2006: «(…). Nestas circunstâncias ocorre perguntar. Será que se aplica, mesmo assim, o dito prazo de 60 dias? Certamente que não. O pressuposto do início da contagem do prazo de caducidade é, como já se disse, que a deliberação tenha sido tomada mediante convocatória regular e válida do condómino impugnante. A convocação da assembleia necessita de obedecer aos requisitos explicitamente discriminados no n.º 1 do art. 1432º e deve, além disso, ser dirigida a todos os condóminos. De contrário a reunião será irregular e as suas deliberações susceptíveis de impugnação, nos termos do art. 1433º - Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, Vol. III, págs. 380/381. A falta de envio da convocatória a todos os condóminos é causa de anulação das deliberações que a assembleia vier a tomar – v. Giuseppe Branca, “Comentário del Códice Civile, págs. 548 e 549, citado por Moitinho de Almeida, “Anulação e Suspensão de Deliberações Sociais”, 2ª edição, pág. 81. Acresce que à Autora também não lhe foram comunicadas as deliberações da assembleia. Não existindo convocatória para a assembleia nem posterior comunicação da deliberação, nos termos do art. 1432º, n.º 6, o prazo de caducidade previsto no art. 1433º, n.º 4, do CC (no caso, 60 dias) só começa a correr a partir do conhecimento da deliberação por parte do condómino ausente. É o que resulta da aplicação, por analogia (art. 10º do CC), do disposto no art. 396º, n.º 3, do CPC, segundo o qual o prazo para requerer a suspensão de deliberação social só começa a contar a partir da data em que o requerente, não regularmente convocado para a assembleia, teve conhecimento da deliberação. (…).» Como referimos, é este o entendimento que consideramos mais adequado à harmonia do sistema, pois que as finalidades supra elencadas, resultantes da alteração legislativa introduzida pelo DL 267/94, de 25/10 (designadamente a que pretende responsabilizar os condóminos menos atentos ou negligentes) só têm verdadeiro sentido se existe a prévia certeza de que foram validamente convocados para a assembleia, não se vendo qualquer incompatibilidade entre o disposto nos artgs. 1432.º e 1433.º do Código Civil. No caso em apreço, como já foi referido, os AA. alegaram não terem sido convocados para a assembleia em causa, sendo que os RR impugnaram tais factos. Tal situação impossibilitaria que se proferisse o saneador-sentença, como se fez, antes se impondo que fosse elaborada base instrutória para, em sede de julgamento, se aquilatar qual a situação verificada e, depois, se decidir em conformidade, o que será determinado. Desta forma, entende-se assistir razão aos Apelantes. IV – DECISÃO Assim, por todo o exposto, acorda-se em julgar a apelação procedente e, nessa conformidade: a) Fixar à acção o valor de 30.00,01€, devendo na 1.ª instância proceder-se de harmonia com o disposto no art.º 319.º do Código de Processo Civil; b) Anular o saneador-senteça, determinando-se a elaboração de base instrutória e o consequente prosseguimento da acção. Custas por Apelantes e Apelados, na proporção de 40% para aqueles e de 60% para estes. Lisboa, 20 de Setembro de 2012 José Maria Sousa Pinto Jorge Vilaça Nunes João Vaz Gomes |