Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
114/1998.L1-6
Relator: GRANJA DA FONSECA
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
LEI APLICÁVEL
JUSTA INDEMNIZAÇÃO
CLASSIFICAÇÃO DE SOLOS
CONSTRUÇÃO DE OBRAS
VALOR
OCUPAÇÃO
BENFEITORIA
ACTUALIZAÇÃO DA INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/11/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário: 1ª - No cálculo da justa indemnização, devem aplicar-se as normas em vigor à data da publicação do acto de declaração de utilidade pública.
2ª - Os expropriados devem ser indemnizados de molde a ver ressarcido o prejuízo que lhe advém da expropriação, medido pelo valor do bem expropriado, tendo em consideração todas as circunstâncias e as condições de facto existentes na data da declaração de utilidade pública (artigo 23º, n.º 1 do CE) e, designadamente, o denominado valor de mercado, ou de compra e venda do bem expropriado, mas no sentido de “valor de mercado normal ou habitual” e “não especulativo”.
3ª - Os planos de urbanização, ao procederem à classificação e qualificação do uso e destino do solo e ao definirem os parâmetros da sua ocupação, uso e transformação (cfr. artigos 72º, 73º e 88º do DL 380/99, de 22/09), constituem o critério primeiro e decisivo para a classificação e valoração dos solos expropriados.
4ª - Encontrando-se o prédio expropriado em local para que está prevista uma zona industrial, havendo nas suas imediações construções diversas com essa finalidade, a potencialidade edificativa para fins industriais configura-se bem definida e próxima, devendo ser tomada em consideração no cálculo indemnizatório, por ser um factor a que atenderiam um vendedor e um comprador de normal prudência, visto implicar um valor bem superior ao que resultaria da mera utilização florestal ou rústica.
5ª – Reunindo o terreno do prédio expropriado condições para legalmente ser classificado como “solo apto para construção”, dever-se-á considerar para efeitos do artigo 25° do CE que o valor do solo se deverá calcular em função do valor da construção nele existente ou, quando for caso disso, do valor provável daquela que nele seja possível efectuar de acordo com as leis e regulamentos em vigor, num aproveitamento economicamente normal, à data da declaração de utilidade pública, devendo ter-se em conta a localização e a qualidade ambiental.
6ª - O facto da avaliação do solo o haver considerado apto para construção não exclui automaticamente as benfeitorias nele existentes, mediante a justificação de que seriam, em caso de construção de um prédio, destruídas.
7ª - Sendo as benfeitorias aproveitáveis na construção de novos edifícios cuja utilização seria da mesma natureza da actividade desenvolvida pela expropriada, a indemnização a fixar em virtude da expropriação terá de ter em conta a perda do valor das referidas benfeitorias, por ser manifesta a perda para o expropriado da sua utilidade ou valor.
8ª - O momento a partir do qual se deve proceder à actualização da indemnização, quando a esta haja lugar, não é o da data da declaração de utilidade pública mas o da data da publicação dessa declaração.
9ª - Essa actualização deverá ser efectuada, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor (cfr. artigo 23.º n.º 1), publicados pelo INE, de forma a reflectir no valor da indemnização a desvalorização monetária verificada até à data da prolação da presente decisão, atribuindo deste modo à expropriada uma soma em dinheiro que compense a perda do poder de compra entretanto verificada.
10ª – Os índices de inflação deverão ser aplicados cada um de per se, sobre o apuramento emergente da taxa anterior, não se somando.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Nos presentes autos de expropriação litigiosa por utilidade pública, em que é expropriante o Instituto das Estradas de Portugal e expropriada R..., L. da, vieram o expropriante e expropriada interpor recurso, nos termos dos artigos 51º e 56º do Código das Expropriações aprovado pelo Decreto-Lei n.º 438/91, de 9 de Novembro, da decisão arbitral que fixou em 145.707.600$00 o valor da respectiva indemnização.
Por decisão judicial transitada em julgado foi deferido o pedido de expropriação total do prédio rústico denominado Quinta da PARDALEIRA ou BOLETREIRAS, com a área de 12.620 m2, sito na freguesia de Santa Iria da Azóia, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo ..., secção ... e descrito na ... Conservatória do Registo Predial de Loures, com a ficha n.º ...
O expropriante/recorrente alega, em síntese, que o solo deve ser classificado como apto para outros fins, em conformidade com o PDM de Loures vigente à data da declaração de utilidade pública, devendo o valor da indemnização ser calculado de acordo com os rendimentos e demais factores indicados no artigo 26º do Código das Expropriações.
Mais alega o recorrente que o valor da indemnização apurado pelos peritos inclui as benfeitorias, devendo este elemento ser deduzido, referindo ainda que o valor atribuído para efeitos de indemnização não pode ser superior a € 350/m2.
Por seu turno, a expropriada/recorrente alega, em síntese, que o solo deve classificar-se como solo apto para a construção, pelo que o valor da justa indemnização a atribuir pela expropriação é de € 1.923.404,22, correspondendo ao valor da construção.
Ordenada e efectuada a avaliação da parcela, foi elaborado o correspondente relatório (fls. 358-365, com os esclarecimentos de fls. 394), fixando o valor da indemnização em 216.324.000$00, correspondendo a 1.079.020 euros.

Proferida a decisão a que alude o artigo 64º do Código das Expropriações, aprovado pelo DL 438/91, de 9 de Novembro, foram os recursos julgados parcialmente procedentes, por provados, fixando-se, em consequência, a indemnização a atribuir à expropriada R..., L.da pela expropriação cuja propriedade foi adjudicada à expropriante em 1.100.847,49 euros, (valor total actualizado).

Expropriante e expropriada apelaram da sentença, finalizando as suas doutas alegações com as seguintes conclusões:

EXPROPRIADA:
1ª – O objecto do presente recurso prende-se com a errónea aplicação da matéria de facto dada como provada para aplicação dos cálculos que determinam a justa indemnização a receber pela Expropriada.
2ª – Em concreto, mal andou o Tribunal a quo, ao corrigir a percentagem de área de construção possível para o terreno em causa, que tem 12.620 m2, 75% considerada pelos Peritos, para 50%.
3ª – De facto, atendendo aos regulamentos camarários, a área coberta a edificar no terreno não pode ocupar mais de 6.310 m2 (50%), pelo que a área de implantação é, de facto, de 6.310 m2, sendo o índice de ocupação o de 50%.
4ª – Porém, o que o Tribunal a quo não teve em consideração é a diferença conceptual e prática entre área de implantação e área de construção, que pode implicar dois pisos, como é o caso, e que multiplica, portanto, a área útil para construir, que a própria sentença conclui ser a base para o cálculo indemnizatório.
5ª – Ora, como a sentença recorrida teve em consideração, o relatório de peritagem concluiu pela possibilidade de construção de armazéns e escritórios.
6ª – Tendo o referido relatório pericial junto aos autos, e tido em conta pelo Tribunal a quo para a sua decisão, claramente identificado a possibilidade de construção de um edifício com duas áreas distintas, ocupando a superfície do lote em 50% (o índice de ocupação), mas tendo um índice efectivo de construção, o legalmente previsto índice de utilização efectiva de 75%.
7ª – De facto, o valor a ter em consideração para cálculo de justa indemnização, como a sentença recorrida refere, mas, no final, não aplica, só pode ser o da construção possível no terreno.
8ª – Construção esta que pode incluir um piso térreo com a área de armazém, a toda a área de implantação (6.310 m2), mais uma área, num primeiro piso, de 3.155 m2, onde se podem construir escritórios.
9ª – Sendo que estes valores redundam num índice de utilização líquido de 75% da área total do terreno, respeitando, porém, e plenamente, os limites construtivos definidos pela Câmara Municipal para a área.
10ª – Estes elementos é que deviam ter sido considerados no cálculo da indemnização, pois são estes que definem o solo apto para construção, seja em piso térreo, seja num primeiro piso.
11ª – O erro na apreciação da matéria de facto esplanada e esclarecida pelos peritos, alterando o índice de utilização líquido de 75% para 50% é prejudicial  para a Expropriada, que se vê coarctada, pela sentença ora recorrida, em cerca de 392.012,20 euros, que é a diferença calculada pelos Peritos, no valor base de 1.079.019,56 euros (ao que deverão acrescer os índices de inflação e que perfazem um total, até 17 de Junho de 2009, de 1.502.859,67 euros) e a resultante dos cálculos do Tribunal a quo.
12ª – Assim sendo, houve erro na apreciação da matéria de facto e erro na aplicação de Direito, tendo o Tribunal a quo desrespeitado o disposto no Regulamento da CE n.º 2866/98 do Conselho.
EXPROPRIANTE:
1ª – O Tribunal a quo erra na atribuição do índice máximo de ocupação, pois este funciona como referência máxima para a construção dentro do lote do terreno.
2ª – A atribuição de tal índice desconsidera as condições impostas pela CML na informação relativa ao pedido de viabilidade do projecto condicionado ao cumprimento de determinados aspectos relacionados com a execução de infra – estruturas dentro da referida área.
3ª – A sentença não fundamenta a decisão relativa aos valores unitários de construção. Não é feita (nem na sentença, nem no relatório pericial) a mínima referência aos indicadores que foram levados em consideração e qual o suporte documental que corrobora, ainda que por aproximação, os valores encontrados.
4ª – A sentença não considerou, para efeitos de definição do valor unitário de construção, todos os meios probatórios constantes do processo, a saber, o relatório de arbitragem que aponta para valores substancialmente diferentes dos indicados no relatório pericial, facto que imporia uma decisão diferente no que respeita ao ponto 19 da alínea A) do ponto II da sentença.
5ª – Tendo o Tribunal a quo classificado o solo como apto para construção não poderia ter integrado no conceito de justa indemnização as benfeitorias existentes, entendimento que tem sido sustentado pela jurisprudência.
6ª – De acordo com o CE a actualização do valor da indemnização é feita em conformidade com os índices de preço no consumidor, com exclusão da habitação, publicados pelo INE, desde a data da publicação da DUP, índices que a sentença não aplica, inquinando, assim, a decisão final.
7ª – Os índices a aplicar e publicados pelo INE são os que ora se indicam: 1997 – 2,2; 1998 – 2,7; 1999 – 2,3; 2000 – 2,8; 2001 – 4,4; 2002 – 3,5; 2003 – 3,3; 2004 – 2,3; 2005 – 2,2; 2006 – 3,1; 2007 – 2,4; 2008 – 2,6.
8ª – O tribunal a quo não atendeu ao valor sobre o qual existiu acordo e que respeita ao valor indicado pela expropriante no recurso interposto do acórdão arbitral – 231.937,22 euros e que, desde essa data, deveria ter sido atribuído.
9ª – Tal como impõe o artigo 52º, n.º 3 do CE que determina que se houver recurso da decisão arbitral, o juiz atribui imediatamente aos interessados o montante sobre o qual se verifique acordo.
10ª – Não tendo sido cumprida a sobredita disposição legal, a EP não pode ser responsabilizada por tal omissão, porque totalmente alheia a tal procedimento.
11ª – O valor global das indemnizações é actualizado até à data da interposição do recurso da decisão arbitral, quanto à parcela em que haja acordo, sendo que, e daí em diante, a actualização incidirá sobre a diferença do valor fixado na decisão final e o valor passível de atribuição.
12ª – A sentença incorre em erro de direito quando, aliás, em contradição com a própria jurisprudência que invoca, aplica os índices ano a ano, capitalizando o aumento resultante da aplicação de cada um deles.
13ª – O critério de utilização apenas terá de permitir, como resultado da regra contida no artigo 62º, n.º 2 da CRP, a anulação da depreciação do valor do bem expropriado inerente ao decurso do tempo.
14ª – Isto porque, a evolução do índice de preços no consumidor possibilita a efectiva actualização da indemnização emergente da expropriação, porque reflecte de modo exacto as alterações do valor dos bens no mercado.
15ª – A actualização visa preservar o valor do capital que deveria ter sido recebido em determinado momento e não compensar uma eventual perda de rendimento que esse capital poderia proporcionar, pelo que,
16ª – Não poderá ser adoptada a capitalização sucessiva dos aumentos anuais.
17ª – Assim, o valor da indemnização deve ser actualizado, ano a ano, sem capitalização, desde a data da publicação da DUP até à data da interposição do recurso da decisão arbitral e, a partir daí, até à data da decisão final, sobre a diferença entre o valor fixado na decisão final e o valor relativamente ao qual as partes estavam de acordo e portanto passível de ser atribuído pelo Juiz a partir desse momento.

Expropriante e Expropriada contra – alegaram.
Cumpre decidir:
2. Com interesse para a decisão da causa, consideraram-se provados na 1ª instância os seguintes factos:
1 - Por despacho de 25/02/1997 do Secretário de Estado das Obras Públicas, publicado no DR II série, n.º 68, de 21/03/1997, foi declarada a utilidade pública e atribuído o carácter urgente da expropriação de vinte parcelas identificadas no mapa anexo, por serem indispensáveis à execução da obra variante à EN 10 – lanço Estação de Mercadorias/Santa Iria de Azóia.
2 - Do mapa acima referido consta a parcela 8, da Freguesia de Santa Iria de Azóia, com uma área de 3.683 m2.
3 - A referida parcela encontra-se inserida no prédio rústico denominado “Quinta da PARDALEIRA” ou “BOLETREIRAS”, descrito na ... Conservatória do Registo Predial de Loures, sob a ficha n.º ... da freguesia de Santa Iria de Azóia e inscrito na respectiva matriz cadastral sob o artigo ..., Secção ..., com a área total de 12.620 m2.
4 - Pela ap...., foi registada a aquisição da mesma a favor de “R...”.
5 - Em 15/05/1997, foi realizada vistoria “ad perpetuam rei memoriam” à parcela mencionada no ponto 2 (fls. 25-29).
6 - A entidade expropriante tomou posse administrativa da parcela referida no ponto 2 por auto datado de 19/05/1997 (fls. 49).
7 - Foi proferida decisão arbitral em 10/07/1997 (fls. 50-58).
8 - Em 31/12/1997, a expropriante depositou na CGD a quantia de 66.435 600$00 (fls. 62), relativa à parcela identificada no ponto 2.
9 - Por despacho de fls. 65 foi adjudicada à expropriante a propriedade da parcela expropriada.
10 - Por decisão judicial de fls. 52, transitada em julgado, foi determinada a expropriação total do prédio.
11 - Em 20/10/2003, a expropriante depositou na CGD a quantia de € 395.407,06 (fls. 121 dos autos apensos).
12 - Por despacho de fls. 107 foi adjudicada à expropriante a propriedade do prédio identificado em 3.
13 - O referido prédio confrontava a Norte com a S..., L.da, a Sul com a Estrada Nacional n.º 10, a Nascente com um caminho público e a Poente com a SMP.
14 - O referido prédio era um terreno rústico, com a área de 12.620 m2, constituído por terra de cultura arvense, horta e algumas árvores de fruto.
15 - Nesse prédio foi colocada uma rede metálica com portão, foi edificado um armazém com 120 m2 e foram construídos muretes de alvenaria com 330 m de extensão.
16 - O solo do terreno expropriado é apto para construção.
17 - Segundo o Plano Director Municipal de Loures, o solo do terreno expropriado insere-se em “zona industrial a manter e beneficiar”.
18 - No âmbito do processo n.º ... foi proferido um despacho de parecer positivo sobre um pedido de viabilidade de construção, que refere:
“a) - a área coberta do lote não poderá exceder os 50% da sua área total;
b) - o volume total de construção não deverá exceder os 5 m3/m2 do lote (…);
d) - Os afastamentos mínimos aos limites do lote serão os seguintes: frente – 5,00 m lateral e tardoz – 7,00 m, salvaguardando o acesso a todos os lados da unidade industrial;
e) - Dispor de espaços exteriores devidamente arborizados e ajardinados, respeitando planta de arranjos de espaços exterior a apreciar pelos Serviços”.
19 - À data da Declaração de Utilidade Pública, os armazéns e escritórios da zona tinham o valor unitário de transacção situado no intervalo entre 80.000$00 e 120.000$00 por m2.
20 - O prédio referido em 3) tem viabilidade de construção de escritórios e de armazéns.
3.É pelas conclusões das alegações do recurso que se afere e delimita o objecto e o âmbito do mesmo, (artigos 690º, n.º 1 e 684º, n.º 3 CPC), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso (artigo 660º, n.º 2 CPC).
Segundo a expropriante, a sentença teria feito uma errada interpretação do direito no que se refere à aplicação do índice de ocupação e julgou incorrectamente o valor unitário da construção.
Por outro lado, a sentença padeceria ainda de erro na aplicação dos índices para efeitos de actualização e respectivo cálculo, já que, para além de cumular o valor actualizado, também não considerou o montante que a expropriante reconheceu - € 231.937,22 – aquando da interposição do recurso da decisão arbitral em 16/09/2005.
Finalmente, os valores invocados para contemplar o valor das benfeitorias na justa indemnização estariam em manifesta discordância com a sentença proferida.

Por sua vez, a expropriada discorda da sentença na parte em que considera que o índice de construção é de 50% e não de 75%.
Assim sendo, a questão nuclear a resolver é a de saber se o valor da indemnização devida pela expropriação da parcela de terreno supra identificada foi correctamente determinado, importando, concretamente, apurar o seguinte:
a) – Se o índice de ocupação deve corresponder a 50% como determinou a sentença, a 75% como pretende a expropriada ou deverá ser inferior ao fixado na sentença como defende a recorrente.
b) – Se, tendo sido classificado o solo como apto para construção, não poderia a sentença ter integrado no conceito de justa indemnização as benfeitorias existentes.
c) – Se a actualização do valor de indemnização foi feita em conformidade com os índices de preço nos consumidores, com exclusão da habitação, publicados pelo INE.
d) – Se a sentença devia ter atendido, e não atendeu, ao valor sobre o qual existiu acordo e que respeita ao valor indicado pela expropriante no recurso interposto do acórdão arbitral.
4. LEI APLICÁVEL
No cálculo da justa indemnização, devem aplicar-se as normas em vigor à data da publicação do acto de declaração de utilidade pública.
Dado que a utilidade pública da expropriação do prédio em causa foi declarada pelo despacho de 25/02/1997 do Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, publicado no DR II série, n.º 68, de 21/03/1997, o cálculo da indemnização devida deverá ser efectuado de acordo com as leis e regulamentos em vigor à data dessa declaração no Diário da República, designadamente o Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 438/91, de 9 de Novembro e o PDM de Loures.
PRINCÍPIO DA JUSTA INDEMNIZAÇÃO:
A expropriação por utilidade pública é, doutrinariamente, entendida como a “relação jurídica pela qual o Estado, considerando a conveniência de utilizar determinados bens imóveis em fim específico de utilidade pública, extingue os direitos subjectivos constituídos sobre eles e determina a sua transferência definitiva para o património da pessoa a cujo cargo esteja a prossecução desse fim, cabendo a esta pagar ao titular dos direitos extintos uma indemnização compensatória[1]”.
Este entendimento, para além de ter obtido consagração constitucional (artigo 62º CRP), veio também a obter consagração no artigo 1º do DL 438/91, de 9 de Novembro, que aprovou o Código das Expropriações de 1991, aplicável ao caso, nos termos do qual “os bens imóveis e direitos a eles inerentes podem ser expropriados por causa de utilidade pública, compreendida nas atribuições da entidade expropriante, mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização”.
Havendo expropriação por utilidade pública (...) é sempre devida indemnização adequada ao proprietário e aos titulares dos outros direitos reais afectados (artigo 1310º CC).
A expropriação por utilidade pública de quaisquer bens ou direitos confere ao expropriado o direito a receber o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização (artigo 22º, n.º 1 CE).
Conforme tem sido repetidamente afirmado, sobretudo pela jurisprudência do Tribunal Constitucional, o direito à justa indemnização traduz-se num direito fundamental de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias, pelo que as suas restrições deverão limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos[2].
Este conceito de justa indemnização envolve as ideias de proibição de indemnização simbólica, de igualdade dos cidadãos perante os encargos e do interesse público da expropriação.
O princípio da igualdade na sua dimensão interna implica o estabelecimento pela lei ordinária de critérios uniformes de cálculo de indemnização.
Na sua dimensão externa, o princípio da igualdade implica que a lei ordinária estabeleça critérios de cálculo da indemnização em termos de não ocorrer tratamento desigual entre os cidadãos expropriados e não expropriados[3].
O legislador constitucional, embora tenha deixado ao legislador ordinário a definição dos critérios que permitam realizar o conceito de justa indemnização, impôs-lhe como limite os princípios materiais da Constituição, designadamente os princípios da igualdade e da proporcionalidade.
Assim, não se podendo, nesta matéria, concretizar o princípio da justa indemnização constitucionalmente imposto através da fixação de um critério abstracto e rígido que não permita a consideração das particulares circunstâncias de cada bem expropriado, o legislador ordinário indica-nos vários critérios e fixa algumas referências, nomeadamente, nos artigos 25º e 26º do CE, para se obter tal desiderato, ou seja a justa indemnização.
Daí que tais critérios não possam ter como objectivo limitar a indemnização na expropriação mas essencialmente uniformizar o critério da sua avaliação, dentro de parâmetros relativamente elásticos, deduzidos da experiência do valor imobiliário.
Na verdade, o desiderato de justiça postulado pelo reconhecimento de um direito fundamental dos expropriados ao recebimento de uma justa indemnização pela perda do bem de que são privados por razões de utilidade pública, alcança-se, mais seguramente, quando se possa, pelo menos, ter em consideração, como elemento de ponderação, o valor do mercado do bem expropriado.
Daí decorre que os expropriados devam ser indemnizados de molde a ver ressarcido o prejuízo que lhe advém da expropriação, medido pelo valor do bem expropriado, tendo em consideração todas as circunstâncias e as condições de facto existentes na data da declaração de utilidade pública (artigo 23º, n.º 1 do CE) e, designadamente, o denominado valor de mercado, venda ou de compra e venda do bem expropriado, mas no sentido de “valor de mercado normal ou habitual” e “não especulativo”[4].
Este critério do valor de mercado não tem, todavia, uma aplicação estrita ou rigorosa, funcionando sobretudo como padrão geral ou ponto de referência do cálculo do montante da indemnização e estando, por isso, sujeito a correcções ditadas por exigências de justiça, quer no sentido da sua redução, quer no sentido da sua majoração, em conformidade com o denominado modelo de indemnização de acordo com o valor do mercado normativamente entendido[5].
Essencialmente a indemnização justa deverá proporcionar ao expropriado um valor monetário que o coloque em condições de adquirir outro bem de igual natureza e valor.
Nesta conformidade, da conjugação do artigo 62º da CRP com os artigos 22º e seguintes do CE resulta que a fixação, in casu, da justa indemnização deverá assentar nos seguintes parâmetros e princípios:
a) – A indemnização deverá ser fixada com base no valor dos bens expropriados, não visando compensar o benefício alcançado pelo expropriante, mas sim ressarcir o prejuízo que para o expropriado advêm da expropriação.
b) – A indemnização deverá corresponder ao valor corrente ou de mercado do bem expropriado, ou seja, àquele valor que um comprador prudente, em condições normais, pagaria pela coisa para a aplicar ao fim a que se destina.
c) – A indemnização por expropriação deve garantir ao expropriado uma compensação plena da perda patrimonial suportada, em termos de o colocar na posição de adquirir outro bem de igual natureza e valor.
d) – O jus aedificandi deverá ser considerado como um dos factores de fixação do valor dos prédios expropriados.
e) – A justa indemnização deve ainda ter em conta as condições e circunstâncias de facto existentes à data da DUP.
CLASSIFICAÇÃO DA PARCELA EXPROPRIADA
Os planos de urbanização, ao procederem à classificação e qualificação do uso e destino do solo e ao definirem os parâmetros da sua ocupação, uso e transformação (cfr. artigos 72º, 73º e 88º do DL 380/99, de 22/09), constituem o critério primeiro e decisivo para a classificação e valoração dos solos expropriados.
Nesta conformidade, o bem expropriado deve ser classificado e avaliado de acordo com os critérios estabelecidos em sede do PDM de Loures vigente à data da DUP.
Ora, no referido PDM, o terreno expropriado insere-se em “zona industrial a manter e beneficiar”, com predominância de armazéns, pelo que, atendendo ao disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 24º do DL 438/91, de 9 de Novembro, o terreno deve classificar-se como “solo apto para construção”, uma vez que dispõe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de energia eléctrica e de saneamento, ou seja, de todas as infra – estruturas, com as características adequadas para servir as edificações nele existentes ou a construir.
Com efeito, como referido na sentença[6], “encontrando-se o prédio expropriado em local para que está prevista uma zona industrial, havendo nas suas imediações construções diversas com essa finalidade, a potencialidade edificativa para fins industriais configura-se bem definida e próxima, devendo ser tomada em consideração no cálculo indemnizatório, por ser um factor a que atenderiam um vendedor e um comprador de normal prudência, visto implicar um valor bem superior ao que resultaria da mera utilização florestal”.
Assim sendo, a classificação correcta é a de solo apto para construção, no seguimento do que por unanimidade entenderam os árbitros, corroborado depois pelos peritos.
DA JUSTA INDEMNIZAÇÃO DEVIDA AOS EXPROPRIADOS
Para a determinação do valor do crédito indemnizatório, dever-se-á atender ao regime estabelecido no Código das Expropriações, quando dispõe que as indemnizações serão calculadas de acordo com os critérios estabelecidos nos artigos 22º a 31º.
Assim, atendo-nos ao CE, dispõe o artigo 1º que “os bens imóveis e direitos a eles inerentes podem ser expropriados por causa de utilidade pública, compreendida nas atribuições, fins ou objecto da entidade expropriante, mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização, nos termos do próprio Código”.
Significa isto que a exproprição, observados os pressupostos da legalidade, utilidade pública e proporcionalidade, é um acto lícito que simultaneamente obriga a entidade expropriante ao pagamento de contemporânea e justa indemnização.
Sobre o critério de determinação do montante de indemnização devida por acto de expropriação por utilidade pública, e como consequência da licitude do acto expropriativo, estabelece o artigo 22º, n.º 2 do CE que a justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, medida pelo valor do bem expropriado, fixada por acordo ou determinada objectivamente pelos árbitros ou por decisão judicial, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data, segundo os critérios de cálculo desenvolvidos.
Deste modo, tendo ficado assente que o terreno do prédio expropriado reúne condições para legalmente ser classificado como “solo apto para construção”, dever-se-á considerar para efeitos do artigo 25° do CE que o valor do solo se deverá calcular em função do valor da construção nele existente ou, quando for caso disso, do valor provável daquela que nele seja possível efectuar de acordo com as leis e regulamentos em vigor, num aproveitamento economicamente normal, à data da declaração de utilidade pública, devendo ter-se em conta a localização e a qualidade ambiental.
O valor do solo calcular-se-á, então, em função do custo da construção, em condições normais de mercado, nos termos dos n.os 2, 3 do mesmo artigo e que se traduz na seguinte fórmula matemática Vt/m2 = Cc x ic x if.
Desta forma, o Vt/m2 (valor unitário do terreno), é função do cc (custo de construção), do ic (índice de construção), e do if (índice de incidência fundiária).
Para integração destes parâmetros, consideraram os peritos que a área do terreno é de 12.620 m.2, sendo de 50% o índice de ocupação, pelo que a área dos armazéns corresponderá a 6.310 m2  e a dos escritórios a 3.155 m2.
O valor unitário de construção possível para os armazéns será de 80.000$00/m2 enquanto o valor unitário de construção para os escritórios será de 120.000$00/m2, o que perfaz 883.400$00, como valor de construção.
Tratando-se dum aproveitamento economicamente normal, os peritos, para a determinação do índice fundiário, (artigo 25º, n.º 2), partiram dum valor base de 10%, sendo aquela percentagem acrescida nos termos previstos nas alíneas a) a h) do n.º 3 do citado artigo 25º, perfazendo um índice fundiário de 24%.
A sentença acolheu os critérios e parâmetros utilizados pelos peritos, excepto no que alegadamente se refere ao índice de ocupação, procedendo seguidamente à actualização dessa indemnização.
A expropriada entende que a indemnização fixada na sentença peca por defeito, dado que, em seu entender, o índice de ocupação será de 75%, enquanto a expropriante considera que a indemnização peca por excesso devido à utilização de critérios e parâmetros inadequados.
Como se referiu, o valor unitário do terreno é função de três vectores: custo de construção, índice de construção ou ocupação e índice de incidência fundiária.
Quanto ao índice de incidência fundiária acolhido pela sentença, as partes estão de acordo. As divergências reportam-se ao índice de construção e ao custo de construção.
QUANTO AO CUSTO DE CONSTRUÇÃO:
A sentença, aderindo ao laudo unânime dos peritos, incluindo o da expropriante, fixou o valor da construção no prédio expropriado em 80.000$00/m2 para os armazéns e em 120.000$00/m2, para os escritórios, atendendo ao valor da construção na zona.
A expropriante aceita tacitamente que seja esse o valor da construção da zona, pois dele não discorda, considerando apenas que a sentença não fundamentou os valores encontrados.
Mas sem razão.
Tendo ficado provado que, à data da DUP, os armazéns e escritórios da zona tinham o valor unitário de transacção situado no intervalo entre 80.000$00 e 120.000$00 por m2, claro está que a sentença, tal como os árbitros haviam feito, aceitaram o valor unitário de transacção praticado na zona.
Deste modo, a indemnização, em consonância com o disposto no n.º 1 do artigo 25º do CE, é fixada com base no valor dos bens expropriados, não visando compensar o benefício alcançado pelo expropriante, mas sim ressarcir o prejuízo que para o expropriado advêm da expropriação.
Corresponde ao valor corrente ou de mercado do bem expropriado, ou seja, àquele valor que um comprador prudente, em condições normais, pagaria pela coisa para a aplicar ao fim a que se destina.
Garante ao expropriado uma compensação plena da perda patrimonial suportada, em termos de o colocar na posição de adquirir outro bem de igual natureza e valor.
Encontra-se, pois fundamentado o valor de construção.
ÍNDICE DE OCUPAÇÃO:
No acórdão arbitral usou-se para avaliação o índice de construção de 50% (fls. 55).
A expropriada, apesar de nas alegações haver referido que no PDM de Loures o índice de ocupação se fixa no máximo de 60% para aquela zona, podendo atingir 70% no caso de construção como a da expropriada, nos termos do artigo 58, n.º 2, alínea a) do Regulamento do PDM de Loures, o certo é que, nas conclusões, não discorda do índice de ocupação fixado pelos árbitros.
Assim sendo, não pode vir fazê-lo mais tarde, pois que o acórdão arbitral não é nem mais nem menos de que uma sentença, formando-se caso julgado relativamente aos segmentos com os quais os recorrentes se conformaram
Quem discordou deste segmento do acórdão arbitral, confirmado pelos peritos, foi a expropriante, razão por que a sentença se pronunciou sobre o índice de ocupação, confirmando pelas razões nela apontadas que tal índice se deve manter nos 50%, como havia sido fixado no acórdão arbitral.
De facto, além do zonamento do PDM, existe um pedido de viabilidade de construção com despacho de parecer positivo e que confirma como índice de ocupação os 50%: “A área coberta do lote não poderá exceder 50% da sua área total. O volume de construção não deverá exceder os 5 m3/m2 do lote”, como salientam os peritos.
Deste modo, como o terreno tem a área de 12.620 m2 e o índice de ocupação é de 50%, a área total de ocupação/implantação será de 6.310 m 2, subdividida em 50% de armazéns a que corresponde a área de 3.155 m2 e 50% de armazéns mais escritórios (duplo pé direito) a que corresponde a área de construção 3.155 m2.
Atendendo a que o valor unitário da construção possível corresponde a 80 contos/m2 para os armazéns e 120 contos para os escritórios, temos que o valor da construção será de 883.400.000$00, tal como os peritos haviam determinado.
Correspondendo o índice fundiário a 24%, o valor do terreno será de 212.016.000$00.
BENFEITORIAS:
Tal como já havia discordado do relatório dos peritos, na parte em que inclui o valor das benfeitorias no valor da indemnização, a expropriante discorda novamente da sentença pelo facto de as haver também considerado.
A questão consiste em saber se o murete, o pilar de betão, o portão e o armazém a que os peritos aludem, em conformidade com o acórdão arbitral, aumentam o valor do bem expropriado, traduzindo-se, portanto, numa benfeitoria.
Torna-se, assim, necessário apurar se podem ou não ser aproveitáveis, conforme o fim que vier a ser dado ao terreno expropriado, dado que o facto da avaliação do solo o haver considerado apto para construção não exclui automaticamente as benfeitorias nele existentes, mediante a justificação de que seriam, em caso de construção de um prédio, destruídas.
Ficou provado que, no prédio a expropriar foi colocada uma rede metálica com portão, tendo sido edificado um armazém com 120 m2 e construídos muretes de alvenaria com 330 metros de extensão.
Atentos os esclarecimentos prestados pelos peritos, resulta ser entendimento unânime dos mesmos que, na eventualidade de um aproveitamento diverso do actual, o mesmo é compatível com as benfeitorias existentes no mesmo.
Salientam que tais benfeitorias são aproveitáveis e enquadráveis com as construções a prever como possíveis para o local, as quais também têm natureza industrial, ou seja, as benfeitorias são aproveitáveis na construção de novos edifícios cuja utilização será da mesma natureza da actividade desenvolvida pela expropriada.
Face a tal conclusão, concluiu a sentença, e bem, que a indemnização a fixar em virtude da expropriação terá de ter em conta a perda do valor das referidas benfeitorias, por ser manifesta a perda para o expropriado da sua utilidade ou valor.
No que respeita à determinação do valor das benfeitorias atendeu a sentença ao valor atribuído pelos peritos, pelo que também nesta parte nenhuma censura merece, fixando-se, por isso, o valor total das benfeitorias em 4.308.000$00.
Donde o valor total da indemnização ascende a 216.324.000$00, correspondendo a 1.079.020 euros.
ACTUALIZAÇÃO DA INDEMNIZAÇÃO
Calculado o montante da indemnização, importa proceder à sua actualização.
O momento a partir do qual se deve proceder à actualização da indemnização, quando a esta haja lugar, não é o da data da declaração de utilidade pública mas o da data da publicação dessa declaração, como resulta do n.º 1 do artigo 23º CE e se encontra fixado por acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 7/2001 (STJ, 12 de Julho de 2001, in DR n.º 248, 1ª Série, de 25/10/2001), nos termos do qual a actualização deve ter lugar desde a data da publicação da declaração da utilidade pública.
A sentença procedeu a essa actualização, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor (cfr. artigo 23.º n.º 1), de forma a reflectir no valor da indemnização a desvalorização monetária verificada até à data da prolação da presente decisão, atribuindo deste modo à expropriada uma soma em dinheiro que compense a perda do poder de compra entretanto verificada.
Segundo a expropriante, os índices de inflação aplicados não estão correctos. Para além disso, deveria proceder-se ao somatório desses índices para se determinar a correcta actualização.
Ao contrário do sustentado pela expropriante, os índices aplicados na sentença estão correctos. São os índices publicados pelo INE. Foi também aplicada a metodologia correcta, uma vez que os índices de inflação foram aplicados cada um de per se, sobre o apuramento emergente da taxa anterior, não se somando.
Argumenta finalmente a expropriante que o Tribunal a quo não atendeu ao valor sobre o qual existiu acordo e que respeita ao valor indicado pela expropriante no recurso interposto do acórdão arbitral - € 231.937,22 – já que, desde essa data, deveria ter sido atribuído à expropriada.
Conforme se refere no citado acórdão uniformizador de jurisprudência, em “processo de expropriação por utilidade pública, havendo recurso da arbitragem e não tendo esta procedido à actualização do valor inicial, o valor fixado na decisão final é actualizado até à notificação do despacho que autorize o levantamento de uma parcela do depósito. Daí em diante a actualização incidirá sobre a diferença entre o valor fixado na decisão final e o valor cujo levantamento foi autorizado; Tendo havido actualização na arbitragem, só há lugar à actualização, desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à decisão final, sobre a diferença entre o valor fixado na decisão final e o valor cujo levantamento foi autorizado”.
Ora, compulsando os autos, constata-se que ainda não foi autorizado o levantamento da quantia depositada.
A indemnização deverá pois ser actualizada desde a data da publicação da DUP até ao trânsito em julgado deste acórdão.
Assim, sabendo que as taxas de inflação foram de 3,2 % - 1997; 2,8% - 1998; 2,3% - 1999; 2,9% - 2000; 4,4 % - 2001; 3,6% - 2002; 3,3 % - 2003; 2,4% - 2004; 2,3% - 2005; 3,1% - 2006; 2,1% - 2007; 2,4% - 2008 e 2,6 - 2009 (segundo dados publicados pelo I.N.E.), haverá que começar por multiplicar a taxa de cada ano pelo valor base da indemnização e, após isso, sobre cada um dos resultados, fazer incidir a taxa do ano seguinte.
O valor base da indemnização é de 216.324.000$00, correspondendo-lhe 1.079.020 euros.
Deste modo, consubstanciando as operações efectuadas para a actualização da indemnização, constata-se que:

AnoTaxa de InflaçãoActualização EscudosEscudosActualização EurosEuros
216.324.0001.079.020
19973,20%6.922.368223.246.36834.5291.113.549
19982,80%6.250.898229.497.26631.1791.144.728
19992,30%5.278.437234.775.70326.3291.171.057
20002,90%6.808.495241.584.19933.9611.205.017
20014,40%10.629.705252.213.90453.0211.258.038
20023,60%9.079.701261.293.60445.2891.303.328
20033,30%8.622.689269.916.29343.0101.346.337
20042,40%6.477.991276.394.28432.3121.378.649
20052,30%6.357.069282.751.35331.7091.410.358
20063,10%8.765.292291.516.64543.7211.454.079
20072,10%6.121.850297.638.49430.5361.484.615
20082,40%7.143.324304.781.81835.6311.520.246
20092,60%7.924.327312.706.14539.5261.559.772


o valor total actualizado que a Expropriada terá direito a receber, em resultado da expropriação, será 1.559.772 euros.
Concluindo:
1ª - No cálculo da justa indemnização, devem aplicar-se as normas em vigor à data da publicação do acto de declaração de utilidade pública.
2ª - Os expropriados devem ser indemnizados de molde a ver ressarcido o prejuízo que lhe advém da expropriação, medido pelo valor do bem expropriado, tendo em consideração todas as circunstâncias e as condições de facto existentes na data da declaração de utilidade pública (artigo 23º, n.º 1 do CE) e, designadamente, o denominado valor de mercado, ou de compra e venda do bem expropriado, mas no sentido de “valor de mercado normal ou habitual” e “não especulativo”.
3ª - Os planos de urbanização, ao procederem à classificação e qualificação do uso e destino do solo e ao definirem os parâmetros da sua ocupação, uso e transformação (cfr. artigos 72º, 73º e 88º do DL 380/99, de 22/09), constituem o critério primeiro e decisivo para a classificação e valoração dos solos expropriados.
4ª - Encontrando-se o prédio expropriado em local para que está prevista uma zona industrial, havendo nas suas imediações construções diversas com essa finalidade, a potencialidade edificativa para fins industriais configura-se bem definida e próxima, devendo ser tomada em consideração no cálculo indemnizatório, por ser um factor a que atenderiam um vendedor e um comprador de normal prudência, visto implicar um valor bem superior ao que resultaria da mera utilização florestal ou rústica.
5ª – Reunindo o terreno do prédio expropriado condições para legalmente ser classificado como “solo apto para construção”, dever-se-á considerar para efeitos do artigo 25° do CE que o valor do solo se deverá calcular em função do valor da construção nele existente ou, quando for caso disso, do valor provável daquela que nele seja possível efectuar de acordo com as leis e regulamentos em vigor, num aproveitamento economicamente normal, à data da declaração de utilidade pública, devendo ter-se em conta a localização e a qualidade ambiental.
6ª - O facto da avaliação do solo o haver considerado apto para construção não exclui automaticamente as benfeitorias nele existentes, mediante a justificação de que seriam, em caso de construção de um prédio, destruídas.
7ª - Sendo as benfeitorias aproveitáveis na construção de novos edifícios cuja utilização seria da mesma natureza da actividade desenvolvida pela expropriada, a indemnização a fixar em virtude da expropriação terá de ter em conta a perda do valor das referidas benfeitorias, por ser manifesta a perda para o expropriado da sua utilidade ou valor.
8ª - O momento a partir do qual se deve proceder à actualização da indemnização, quando a esta haja lugar, não é o da data da declaração de utilidade pública mas o da data da publicação dessa declaração.
9ª - Essa actualização deverá ser efectuada, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor (cfr. artigo 23.º n.º 1), publicados pelo INE, de forma a reflectir no valor da indemnização a desvalorização monetária verificada até à data da prolação da presente decisão, atribuindo deste modo à expropriada uma soma em dinheiro que compense a perda do poder de compra entretanto verificada.
10ª – Os índices de inflação deverão ser aplicados cada um de per se, sobre o apuramento emergente da taxa anterior, não se somando.
5. Pelo exposto, na procedência da apelação, fixa-se, pela expropriação cuja propriedade foi adjudicada à expropriante nos presentes autos, a indemnização a atribuir à Expropriada RENAULT TRUCKS PORTUGAL, L.da em € 1.559.772 (um milhão quinhentos e cinquenta e nove mil setecentos e setenta e dois euros).
Custas pela expropriante.
Lisboa, 11 de Fevereiro de 2010
Manuel F. Granja da Fonseca
Fernando Pereira Rodrigues
Maria Manuela dos Santos Gomes

[1] Prof. Marcelo Caetano, Manual de Direito Administrativo, Vol. II, 1020.
[2] Acórdãos do Tribunal Constitucional, in BMJ n.º 245º, 160 e 395º, 91.
[3] Fernando Alves Correia, A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre Expropriações por Utilidade Pública, in RLJ, ano 132º, n. os 3905 e 3906, pp. 232 e 233.
[4] Acórdão do STJ de 12/01/99, publicado no DR, 1ª Série, de 13-02-99.
[5] Fernando Alves Correia, O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Coimbra, 1989, pp. 540.
[6] Acórdão da RP de 31/01/1991, BMJ, 403º, 483.