Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
235/13.6YXLSB.L1-2
Relator: TERESA ALBUQUERQUE
Descritores: REVISOR OFICIAL DE CONTAS
DESTITUIÇÃO
JUSTA CAUSA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/14/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – A convocação do Fiscal Ùnico para a assembleia geral de cuja ordem de trabalhos conste a respectiva destituição, há-de-lhe ser enviada com a antecedência mínima de 21 dias, conforme decorre do art 377º/4 do CSCom.
II – A não observância dessa antecedência constitui um vício procedimental cuja consequência é a da anulabilidade da deliberação em causa.
III - Da regra da inamovibilidade do revisor oficial de contas, e por contraposição ao que sucede com os membros do conselho de administração, em que a regra é a da livre destituição a todo o tempo e independentemente de justa causa – cfr arts 403º e 430º/2 CSCom – decorrem duas consequências:
-em primeiro lugar, a de que cabe ao ROC ou SROC destituído sem justa causa e que pretenda ser indemnizado em função desse procedimento, alegar e provar, na acção que interponha para esse efeito contra a sociedade, a ausência de justa causa;
- em segundo lugar, que essa indemnização se deverá ter, na impossibilidade do autor pedir a reintegração (que seria a reparação natural), como correspondendo às anuidades de vencimentos correspondentes ao mandato não cumprido.
IV - A circunstância do art 419º, referente à destituição dos membros do conselho fiscal ou do fiscal único, nada referir de específico quanto à justa causa para essa destituição, autoriza a que se tenham como válidos os critérios usados para a destituição dos administradores/gerentes.
V - Traço obrigatório na ideia de justa causa é o da inexigibilidade – há-de mostrar-se inexigível à sociedade manter a relação orgânica, e a de confiança que esta implica, com o destituído. Seja pela violação grave de obrigações legais ou estatutárias, seja pela incapacidade para o desempenho normal das funções.
VI – As funções do Fiscal Único não se limitam à elaboração da Certificação Legal de Contas e do Parecer relativo a essa fiscalização.

(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:



I-Relatório:


I – A. SROC, LDA, intentou acção declarativa com processo sumário contra P.  S.A., pedindo a  condenação da R. a pagar-lhe a quantia de € 9.890,00, acrescida de juros de mora, a contar da  citação até integral pagamento.

Invoca que é uma sociedade de revisores oficiais de conta e que foi contactada para fazer parte dos órgãos de fiscalização da R., bem como para proceder à certificação das suas contas para o quadriénio de 2009 a 2012. A A. procedeu à certificação legal das contas dos anos de 2009 e 2010, tendo recebido em Outubro de 2011 uma comunicação escrita da R. que referia que os seus serviços seriam dispensados relativamente aos anos de 2011 e 2012, alegadamente por motivo de racionalização económica de custos de auditoria. Esta proposta de demissão foi recusada pela A. mas, posteriormente, em 24/02/2012, a R. convocou o representante da A. para uma assembleia de sócios a realizar no dia 29/02/2012, de cuja ordem de trabalhos constava a destituição com justa causa do fiscal único, ou seja, da A.. A essa convocatória, a A. respondeu que não poderia estar presente por falta de disponibilidade de agenda e atento o facto da convocatória estar a ser feita em cima da hora, tendo no entanto demonstrado disponibilidade para estar presente noutra data a designar. A A. não só não foi notificada de qualquer decisão da referida assembleia, como teve conhecimento que a R. contactou outra SROC para fazer os trabalhos de revisão e certificação de contas. Em Novembro de 2012, a A. solicitou o pagamento do valor correspondente aos anos em que foi nomeada a exercer o cargo de ROC e, em Dezembro desse ano, enviou uma carta à R. com as facturas correspondentes ao ano de 2011 e 2012. No entanto, a R. nada disse, nem pagou qualquer quantia.

A R. contestou, invocando não ter celebrado qualquer contrato, nem ter recebido qualquer prestação de serviços da A. que desse origem às facturas cujo pagamento é peticionado nos autos. Refere que a A.. foi nomeada como fiscal único efectivo da R., para o triénio de 2010/2012, e que em 14 de Julho de 2011 houve uma reunião entre o departamento financeiro da R. e o representante da A. no sentido de ser emitida a competente certificação legal e o parecer do fiscal único, tendo ficado acordado nessa reunião que estes documentos seriam emitidos no prazo máximo de 15 dias após a recepção da versão final das contas de 2010. No entanto, esses documentos foram enviados em 26/07/2011, mas só em 15/09/2011 é que a A. enviou a referida documentação, com excepção do parecer fiscal único, e após insistência da A.. Refere ainda a R. que o seu departamento financeiro, durante todo o ano de 2011, solicitou à A o agendamento de reuniões, mas o seu representante recusou-se sistematicamente a deslocar-se às instalações da R., sem justificação para o efeito. Como, no entender da R., esta postura da A. não permitia a existência de qualquer colaboração no desempenho das funções, decidiu proceder à destituição da A., com justa causa, convocando uma assembleia geral para esse efeito, a qual confirmou essa decisão, tendo sido nomeada outra empresa para exercer essas funções.

Realizado julgamento, foi proferida sentença que julgou improcedente a acção, absolvendo a R. do pedido.

II – Do assim decidido, apelou o A que concluiu as respectivas alegações, nos seguintes termos:

1ª. A Apelada intentou a presente acção pedindo que sejam pagos o valor dos honorários correspondentes aos exercícios de 2011 e 2012, no valor de € 9.840,00, acrescidos de juros de 7,75% juros de mora a liquidar à taxa de 7,75%, cfr aviso n.º 594/2013, sobre o montante em dívida, desde da data da citação, até ao integral pagamento, bem como as despesas, custas de parte e demais encargos a que vier a dar causa, tudo com as demais consequências legais.

2.ª A Apelanda apresentou contestação, alegando que não existiria dívida, contrato ou sequer qualquer prestação de serviços para os anos de 2011 e 2012.

3.ª Julga a Apelante que existiu violação de diversas normas protectoras do papel fulcral da figura dos Revisores Oficiais de Contas/Fiscais Únicos, prestam na sociedade, a saber.

4.ª Violação do artigo 54.º do Estatuto da Ordem dos Revisores Oficias de Contas, do artigo 419.º do Código das Sociedades Comerciais, com o consequente atropelo do princípio da inamovibilidade, e com as devidas consequência legais acima explicitadas.

5.º Assim, conforme ficou demonstrado, entende a Apelante, que a destituição não foi legalmente efectuada, ou sequer, se funda num motivo atendível como justa causa, pelo que, a sentença, ao considerar destituição justificada, enferma de errónea qualificação dos factos e interpretação dos respectivos preceitos e coo tal deverá ser declarada ilegal.

6.ª Mais, entende a Apelante que a sentença violou diversas normas societárias e de regular funcionamento das sociedades comerciais, como são o caso, dos artigos 377.º n.º 4, e 420.º do Código das Sociedades Comerciais.

7.ª Acresce ainda, que a sentença não só violou diversas normas protectoras da inamovibilidade e independência do Fiscal Único/Revisor Oficial de Contas, face à administração da sociedade e da assembleia geral, como não considerou que existiu um mandato, a que correspondeu um mandato que condicionou o ora Apelante, lhe imputou responsabilidade enquanto durou o mandato e determinou que, muito ou pouco, fosse de facto prestado algum trabalho.

8.ª Que assumiu responsabilidade como Fiscal Único, também, para os anos de 2011 e 2012, tendo prestado as Certificações Legais de Contas.

9.ª A douta sentença recorrida violou o princípio da livre apreciação da prova consagrado no artigo 607º, número 5 do CPC, porquanto procedeu a uma apreciação da prova arbitrária e discricionária sem que tivesse recorrido, também quanto à matéria de facto, a esquemas mentais e lógicos de percepção da realidade através das regras da experiência. Desta violação resultou erro de julgamento quanto à matéria de facto constante dos pontos 5, 6, 11, 12 .º.

Pelo exposto, não poderia o doutro Tribunal a quo considerar como improcedente a pretensão do ora Apelante e por conseguinte, deverá ser dado procedimento ao pedido do Apelante.

Termos em que, Venerandos Juízes Desembargadores, com o mui douto suprimento de Vªs Exªs:

A - Deverá a douta sentença, ser substituído por outra, que julgue provada a matéria de facto seleccionada e constante do capítulo IV da matéria dada como provada, nos termos acima propostos, considerando-se provado, que: – Quanto ao ponto 14, deverá ser dado como provado, que durante todo o ano de 2011, existiram vários reuniões e contactos, entre representantes da A. e da R., em vista a preparar a análise e certificação de contas, como se infere dos seguintes documentos junto aos autos:

i) Relatório do concelho de administração onde textualmente se refere “ 2. Em 14/07/2011 o departamento financeiro da sociedade reuniu-se com o Dr M. L., a fim de ser emitida a competente certificação legal e o parecer do fiscal único da sociedade relativo às contas de 2010” Doc. 2 junto com a Contestação Refª Citius 13241580;
ii) Email do representante da A. M. L. para representante da R. C.F, datado de 13 de Maio de 2011, pelas 18:50 onde expressamente se refere: “ Exmº Senhor Dr. Os meus agradecimentos pela recepção de hoje. Penso, como lhe transmiti. Que já estão dados importantes passos na vida futura da empresa e que existem mais valias nas pessoas seleccionadas...” Cf r requerimento citius refª 16343211, documentos juntos e não impugnados.
iii) A A. comunicou à R. um e-mail datado de 5 de Julho de 2011, na pessoa do Sr. Dr. M. L., informando, que encerraria para férias no dia 22 de Julho de 2011, requerimento citius refª 16343211, documentos juntos e não impugnados, onde se dizia ainda: “tenho marcado o meu período de férias a iniciar no dia 22 de Julho próximo, ou seja praticamente sobre o prazo referido...” E no ponto 4 do mesmo email: “ … ou então, dizia eu, a CLC de 2010 terá que ficar para Setembro próximo. Note-se que apenas tenho uma pequena abordagem de parte dos elementos contabilísticos da empresa, muito insuficiente para o objectivo.”

– Quanto a ponto 22, deverá ser dado como provado que:

i) A R. decidiu efectuar uma assembleia geral, com data de 7 de Fevereiro de 2012, onde terá destituído o A. das funções por que este desempenhava, sem que tivesse dado oportunidade ao interessado para se defender;
ii) Ao aperceber-se da irregularidade, a R. rasurou a data mencionada na acta da assembleia já realizada, passando a constar o dia 29 de Fevereiro de 2012, notificando o A. para uma alegada reunião e sem que tivesse dado oportunidade ao interessado para se defender e sem que tivesse levado em consideração o facto de esta ter sido convocado com tão pouca antecedência, escamoteando ofacto da assembleia já se ter realizado;
iii) Que o registo da deliberação foi efectuado a 3 de Ma io de 2012, com base numa acta datada de 7 de Fevereiro de 2012, como se infere da certidão do registo comercial junta aos autos com a ref .ª Citius 4806070.

B - Deverá a douta sentença, ser substituído por outra, que, fazendo a correcta interpretação dos pressupostos de facto e da interpretação e aplicação dos seguintes normativos, decrete que – Os factos que consubstanciam a destituição do membro do orgão Fiscal Único, não são susceptíveis de integrar o motivo de justa caussa consagrado no artº 419º do Código das Sociedades Comerciais, designadamente porque não são factos objectivos que individualizem situações concretos, de que se possa inferir a violação das obrigações consagradas no Estatuto dos Revisores Oficiais de Contas, nomeadamente o artigo 62º número 1 e no Código das Sociedades, nomeadamente os artigos 420º, 422º e 446º número 3.

– O facto primeiro e principal que motivou a decisão da R. de fazer cessar o mandato para o qual a A. se encontrava nomeada, designadamente de ordem economicista, a saber “ …De forma à R. poupar custos e a tornar os procedimentos de revisão de contas mais céleres e uniformes optou por contratar o serviços de um revisor único para todas as empresas, poupando assim, tempo com reuniões e economizando o pagamento para deslocações dos ROC contratados e unificando o procedimento em todas as empresas do grupo.” viola de forma expressa e clara o principio da inamovibilidade do orgão de fiscalização, designadamente o artº 54.º do Estatuto da Ordem dos Revisores Oficias de Contas e ainda o artigo 419.º do Código das Sociedades Comerciais, com a demais consequências legais, pelo que teremos que concluir, que, a destituição não foi legalmente efectuada, ou sequer, se funda num motivo atendível como justa causa, pelo que, a sentença, ao considerar destituição justificada, enferma de errónea qualificação dos factos e interpretação dos respectivos preceitos.

 – Mais, deverá a sentença ser substituída por outra, que aplique as normas societárias e de regular funcionamento das sociedades comerciais, como são o caso, do artigo 377.º n.º 4, do Código das Sociedades Comerciais quanto à convocação das assembleias, declarando que não foi respeitado o prazo que deve mediar a convocatória das assembleias gerais das sociedades anónimas e a data da sua realização, que deverá ser de 21 dias, declarando a nulidade da decisão.

– Deverá ainda a sentença ser substituída por outra que reconheça que a A. e os seus representantes, aos serem nomeados para o triénio 2010 – 2012 para o orgãos de fiscalização da sociedade assumiram as responsabilidades civis, comerciais, f iscais e criminais inerentes ao exercício da função, não tendo sido inócua, antes pelo contrário o simples facto ed constarem no registo comercial como membros efectivos do mesmo, nomeadamente entre o período de 1 de Janeiro de 2011 e 7 de Fevereiro de 2012 .

– Ainda que assim se não entenda e recorrendo ao princípio da equidade, deverá a sentença a proferir condenar a R. no pagamento do valor dos honorários peticionados, considerando as expectativas criadas, a perda de chance na aquisição e assumpção de responsabilidades com outros potenciais Clientes.

Pelo exposto, não poderia o doutro Tribunal a quo considerar como improcedente a pretensão do ora Apelante e por conseguinte, deverá ser dado procedimento ao pedido do Apelante.

A fim de se poder esclarecer qualquer questão relacionada com a prova testemunhal produzida, se assim se entender, à cautela, e numa perspectiva de análise da prova no seu conjunto, requer a V.Exa. que seja extraída cópia digital dos depoimentos produzidos em audiência de julgamento, a remeter conjuntamente com o presente recurso. Assim decidindo, Venerandos Desembargadores, uma vez mais se fará a costumada e esperada JUSTIÇA!

A R. apresentou contra alegações pugnando pela manutenção do decidido.

III – O tribunal da 1ª instância julgou provados os seguintes factos:

1-A A. é uma sociedade de revisores oficiais de contas cujo objecto social é a auditoria e certificação das contas de sociedades anónimas, funcionando como órgão de fiscalização das respectivas sociedades (art. 1° da petição inicial).

2-A R. é uma sociedade anónima e como tal encontra-se sujeita a revisão oficial de contas (art. 2° da petição inicial).

3-A A. foi contactada para fazer parte dos órgãos de fiscalização da R., bem como para proceder à certificação das suas contas para o triénio de 2010/2012 (art. 3° da petição inicial e art. 5° da contestação).

4-A A. procedeu à certificação legal das contas dos anos de 2009 e 2010 (art. 4° da petição inicial).

5-A A. recebeu uma comunicação da R., em 06/10/2011, referindo que esta tinha decidido atribuir o serviço de auditoria 2011 a um ROC comum a todas as participadas Prebuild, solicitando a rescisão do cargo por parte da A., o que foi recusado pela A. (arts. 5° e 6° da petição inicial).

6-Em 24 de Fevereiro de 2012, a A. recebeu uma carta da R. datada de 22 de Fevereiro de 2012, convocando o representante da A. para uma assembleia de sócios a realizar no dia 29 de Fevereiro de 2012 de cuja ordem de trabalhos faria parte a destituição com justa causa do fiscal único, ou seja, da A. (art. 7° da petição inicial).

7-Por carta datada de 27 de Fevereiro de 2012, a A. respondeu que não iria estar presente, nem fazer-se representar, por falta de disponibilidade de agenda e pelo facto da convocatória estar a ser feita em cima da hora, de 6ª feira à tarde para 3ª feira imediatamente seguinte, não obstante, ter desde logo demonstrado a sua disponibilidade para estar presente em outra data a designar com a devida antecedência (arts. 8° e 9° da petição inicial).

8- A A. teve conhecimento que a R. contactou ama outra SROC para proceder aos trabalhos de revisão e certificação de contas (art. 11° da petição inicial).

9-Em 20 de Novembro de 2012, a A convidou a R. a regularizar a situação, designadamente a liquidar o valor correspondente aos anos em que a A. foi nomeada a exercer o cargo de ROC (art. 12° da petição inicial).

10-Em Dezembro de 2012, por carta, a A. endereçou à R. a factura com o n° 2012000012, de 20/11/2012, correspondente ao ano de 2011, no montante de € 4.000,00, a que acresce IVA de € 920,00, mencionada na alínea a) do referido artigo e a factura n° 2012000013, no valor de € 4.920,00 referente à auditoria relativa ao ano de 2012, não tendo obtido resposta (arts. 13° e 14° da petição inicial).

11- A 14 de Julho de 2011, o departamento financeiro da R. reuniu-se com o Dr. M. L., representante da A., com o objectivo de ser emitida a competente certificação legal e o parecer do fiscal único relativos às contas de 2010.

12- Nessa reunião ficou verbalmente acordado que a Certificação Legal e o Parecer do Fiscal Único relativos às Contas de 2010 seriam emitidos no prazo máximo de 15 dias após a recepção da versão final das contas de 2010 (art 7° da contestação).

13- A 26 de Julho de 2011, o departamento financeiro da R. enviou ao representante da A., o Dr. M. L., todos os documentos contabilísticos necessários à emissão da certidão legal e do parecer do fiscal único relativo às contas de 2010 (art. 8° da contestação).

14- No entanto, apenas a 15 de Setembro de 2011 e após várias insistências por parte da R. foram enviados pelo Dr. M. L.a certificação legal de contas de 2010, mas não o parecer do fiscal único, o que só veio a suceder posteriormente e após várias insistências do departamento financeiro da R. junto do Dr. M. L. não tendo a A. apresentado qualquer justificação para a entrega tardia (arts. 9°, 10° e 11° e 13° parte final da contestação).

15- Durante todo o ano de 2011, o departamento financeiro da R. solicitou várias vezes o agendamento de reuniões com o Dr. M. L., na qualidade de representante da A, o qual recusou-se sistematicamente.

16- Em resposta à comunicação via e-mail que a R. dirigiu à A., em 06 de Outubro de 2011, em que referia a intenção de designar um fiscal único comum a todas as empresas participadas pela R., o representante da A., Dr. M. L. comentou que o objectivo de tal decisão seria a de controlar a independência dos revisores, declaração essa que a R. entendeu como sendo ofensiva para o seu órgão de administração (arts. 20° e 21° da contestação).

17- A R. é uma sociedade gestora de participações sociais e conforme o seu objecto social, detém e gere participações sociais noutras sociedades como forma indirecta de exercício de actividade económica, assim como presta serviços de organização e gestão nas entidades participadas (arts. 34° e 35° da contestação).

18- A R. necessita constantemente de ter perfeita noção da sua realidade financeira, de modo a saber em que medida pode participar financeiramente no capital de outra empresa, sendo fundamental a participação activa do ROC (arts. 37° e 39° da contestação).

19- Em 2010, a R. adquiriu participações em várias empresas (art. 46° da contestação).

20- A maioria das sociedades detidas pela R. são sociedades anónimas e, como tal necessitam de um órgão fiscalizador, seja um conselho fiscal ou um fiscal único (art. 48° da contestação).

21- De forma à R. poupar custos e a tornar os procedimentos de revisão de contas mais céleres e uniformes, optou por contratar os serviços de um revisor único para todas as empresas, poupando assim, tempo com reuniões e economizando o pagamento para deslocações dos ROC contratados e unificando o procedimento de todas as empresas do grupo (arts. 49° e 50° da contestação).

22- A R. entendeu que, face aos comportamentos anteriores da A., não lhe podia confiar estas novas funções (art. 51° da contestação).

23- A R. decidiu convocar uma assembleia geral, constando na ordem de trabalhos a destituição com justa causa da sociedade A. do cargo de fiscal único da A., tendo sido analisado nessa assembleia o relatório do conselho de Administração sobre a actuação do fiscal único efectivo da sociedade e decidida a sua destituição (art. 54` e 55° da contestação).

Factos não provados:

1. Um dos motivos que terá determinado a cessação das funções da A. como revisor oficial de contas da R. foi o facto de constar na certificação das contas desta, relativamente ao ano de 2010, uma reserva relativamente à depreciação de viaturas de representação (facto novo – despacho proferido a fls. 99, em sede de audiência de julgamento).

IV – Em função das conclusões das alegações, constitui objecto do presente recurso, saber:

- Se deverá ser reapreciada a matéria de facto, adicionando-se-lhe factos resultantes de documentos juntos aos autos que não foram considerados (a); se a destituição da A. se mostra inválida, por um lado, por se mostrar nula a correspondente  deliberação da Assembleia Geral da R., atenta a inobservância do prazo a que se refere o art 377º/4 CSCom (b); por outro, porque os factos provados, devidamente concatenados com o teor dos emails juntos aos autos, não permitem concluir pela existência de justa causa (c); se, em todo o caso, se deverá concluir pela procedência da acção atenta a responsabilização da A. que resulta de constar do registo comercial como fiscal único da R. para o triénio de 2010/2012, ou em função das expectativas criadas e perda de chance pela não assunção de outras responsabilidades com potenciais clientes (d).

a)Dispõe o art 640º/1 CPC que «quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: al a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados»; al b) Os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; al c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas».

E dispõe a mesma norma no seu nº 2/al a) que, «quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte,  indicar com exactidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder  à transcrição dos  excertos que considere relevantes».

Na situação dos autos a apelante não cumpriu nenhum dos ónus em questão.

Desde logo este último referente à especificação obrigatória dos meios de prova que implicaria que tivesse indicado, com exactidão, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o tivesse entendido, à transcrição dos excertos que considerasse oportunos.

Com efeito, a respeito destas exigências limitou-se a terminar as conclusões do presente recurso nos seguintes termos: «Afim de se poder esclarecer qualquer questão relacionada com a prova testemunhal produzida, se assim se entender, à cautela, e numa perspectiva de análise da prova no seu conjunto, requer a V.Exa. que seja extraída cópia digital dos depoimentos produzidos em audiência de julgamento, a remeter conjuntamente com o presente recurso», endossando, portanto, para o tribunal actividade que a lei lhe faculta, e que, de todo o modo, não supriria a antecedente e obrigatória da indicação, com exactidão, das passagens da gravação relevantes, pois só dessa forma teria motivado concludentemente em função dos depoimentos das testemunhas o seu ponto de vista a respeito da prova produzida.
Se assim é, e se tanto basta para se rejeitar a impugnação da matéria de facto, sucede que de todo o modo não se mostra perceptível nem pelas conclusões em si, nem pela respectiva concatenação com o corpo das alegações, qual a matéria que a apelante pretenderia ter sido mal julgada.

Refere-se a «uma apreciação da prova arbitrária e discricionária» e a erro de julgamento quanto à matéria de facto constante dos pontos 5, 6, 11 e 12 na conclusão 9ª, mas fá-lo em termos absolutamente conclusivos pois, nem antes nem depois, concretiza os erros de julgamento em causa.

Mais adiante, na conclusão “A”, refere pretender uma alteração ao ponto 14 e ao ponto 22.

Ali, devendo «ser dado como provado, que durante todo o ano de 2011, existiram vários reuniões e contactos, entre representantes da A. e da R., em vista a preparar a análise e certificação de contas».

Trata-se de matéria que a A. não alegou.

E que, ao contrário do que a respeito dela refere, tal matéria não se infere dos documentos para que apela.

Sendo que, mesmo que, de tais documentos decorressem contactos vários referentes a períodos de tempo diversos do ano de 2011 com aquele objectivo de análise e preparação das contas de 2010  - e isso não sucede, como já se referiu – visto que não estão em causa documentos autênticos, o respectivo conteúdo não poderia ser tomado em consideração isoladamente, mas apenas em função da demais prova produzida nos autos, o que pressuporia uma correcta impugnação da matéria de facto, ainda que apenas relativamente ao ponto em apreço,  o que não sucedeu.

Igualmente não se mostra alegada a matéria que a apelante pretende que seja dada como provada «quanto ao ponto 22», que é, em resumo, a seguinte: que a Assembleia Geral da R. que a destituiu teve lugar, verdadeiramente, em 7//2/2011 e não em 29/2/2012.

Conclusão a que a A chega – pretendendo que este tribunal a partilhe -  porque, em sede de registo comercial dessa deliberação consta a data de 7/2/2012, que só depois foi rectificada para a de 29/2/2012; e que a R. teria rasurado na acta aquela data de 7/2/2012, porque só posteriormente se apercebera que não dera oportunidade ao interessado para se defender, como o determina a norma do  art 377º/4  CSCom. 

Independentemente do pouco sentido que fazem estas observações da A.  – pois que se a motivação para a rasura a que a A. se refere se prendia com o esquecido contraditório da A., mal se perceberia por que razão, ao tê-la após realizado, não o fez com a antecedência a que se refere a referida norma; e menos ainda se percebe porque é que, ao invés de no dia 3/5/2012 ter registado a deliberação logo com a data de 29/2/2012, o haveria de ter feito com a (que não pretendia) de 7/2/2012 - a verdade é que a A. haveria de ter alegado tal matéria no respectivo articulado e retirado dela as pretendidas consequências jurídicas, mostrando-se agora extemporaneamente inócuas as referidas imputações.

Para todos os efeitos, o que este tribunal pode retirar da certidão de registo comercial referente à R. - que se mostra junta a fls 45 e ss dos autos - é que, em 3/5/2012 foi registada a cessação de funções do fiscal único, tendo por causa a destituição, e por data desta, a de 7/2/2012, e que, em 21/5/2012, foi rectificada a data daquela cessação para a de 29/2/2012.

Constata igualmente este tribunal que a acta referente à Assembleia Geral em causa está rasurada – onde constava “aos sete dias do mês de Fevereiro“, consta “aos vinte e nove…” e que a rasura e entrelinha estão ressalvadas a final.
Nada mais sendo lícito a este tribunal concluir dos factos em causa.

Pelo que se disse, forçoso é que se conclua que nada há alterar na matéria de facto tida como provada.

b) Entende a A que a respectiva destituição é inválida por ser nula a correspondente deliberação da Assembleia Geral da R., atenta a inobservância do prazo a que se refere o art 377º/4 CSCom.
Está em causa no aspecto em apreço o direito do destituendo contraditar o propósito da destituição.

Decorrendo do nº 1 do art 419º CSCom que «a assembleia geral pode destituir, desde que ocorra justa causa, os membros do conselho fiscal ou o fiscal único que não tenham sido nomeados judicialmente», o nº 2 dessa norma dispõe: «Antes de ser tomada a deliberação, as pessoas visadas devem ser ouvidas na assembleia sobre os factos que lhe são imputados».

No art 9º do DL 49 381 de 15/11/1969 que dispunha anteriormente a respeito  desta matéria dizia-se, «devendo conceder aos visados, porém, a oportunidade de, antes da deliberação, esclarecerem perante ela a sua acção».

É evidentemente necessário que se dê conhecimento da proposta de destituição ao destituendo, que há-de ter oportunidade de ser ouvido em assembleia, podendo optar por em vez de ser ouvido expor por escrito as suas razões.

Ponto é que seja convocado para assembleia com a antecedência bastante para esse efeito.

A norma em causa nada diz a respeito dessa antecedência, e por isso se haverá de recorrer ao disposto no art 377º que rege a respeito da convocação da assembleia geral nas sociedades anónimas. E que estabelece no seu nº 4 que, «entre a expedição das cartas registadas referidas no nº 3 e a data da reunião da assembleia devem mediar, pelo menos 21 dias».

Na situação dos autos resulta adquirido (factos 6 e 7): «Em 24 de Fevereiro de 2012, a A. recebeu uma carta da R. datada de 22 de Fevereiro de 2012, convocando o representante da A. para uma assembleia de sócios a realizar no dia 29 de Fevereiro de 2012 de cuja ordem de trabalhos faria parte a destituição com justa causa do fiscal único, ou seja, da A» e, «por carta datada de 27 de Fevereiro de 2012, a A. respondeu que não iria estar presente, nem fazer-se representar, por falta de disponibilidade de agenda e pelo facto da convocatória estar a ser feita em cima da hora, de 6ª feira à tarde para 3ª feira imediatamente seguinte, não obstante, ter desde logo demonstrado a sua disponibilidade para estar presente em outra data a designar com a devida antecedência».

Do que resulta que a A. não foi convocada para a referida assembleia geral com a antecedência legal.

Defende-se a R. deste apontado vício de procedimento referindo que a lei só exige que se dê oportunidade ao fiscal único de ser ouvido, não exige que o seja, e que a dilação temporal a que se reporta a referida norma apenas respeita aos sócios/accionistas.

Como resultará do que acima já se ponderou, não se concorda com este entendimento.

Cabe ao fiscal único cuja destituição esteja em causa ponderar a respeito de comparecer ou não na assembleia, expor ou não por escrito as suas razões, mas, obviamente, a convocação do mesmo para esse efeito tem de lhe permitir que se possa preparar devidamente; consequentemente, há-de ser feita com antecedência que o permita. Não havendo norma a estabelecer período de antecedência específica, há que ter como exigível a de 21 dias constante da referida norma do art. 377º. Seria esse o prazo que a R. deveria ter observado na convocação da A.

Sucede que, pese embora as regras sobre a convocação das assembleias gerais das sociedades, e especialmente das anónimas, sejam regras imperativas, portanto regras que as partes não podem derrogar, há muito que doutrina e jurisprudência se mostram concordantes em qualificar como simplesmente anuláveis as deliberações tomadas na assembleia irregularmente convocada.
«Sempre que se trate de distinguir entre deliberações nulas e anuláveis, é necessário verificar se, contrariando embora a deliberação em causa algum preceito legal de carácter imperativo, a violação respeita ao próprio conteúdo da decisão, ou tão só ao respectivo procedimento. Na primeira hipótese, o vício implicará nulidade verdadeira e própria; na segunda, isto é, quando exista ofensa à norma cogente, perpetrada no processo que efectivamente se adoptou na formação do acto deliberativo, a sanção será a da mera anulabilidade».

Explica António Caeiro [1] porquê, invocando a esse respeito V. Lobo Xavier: «É que só a primeira (a deliberação cujo conteúdo ofende normas imperativas) é susceptível de afectar os interesses de “futuros accionistas“, visto através dela se criar uma situação de caracter permanente, capaz de comprometer definitivamente  aquela protecção que o legislador quis assegurar a quem quer que viesse a fazer parte do grémio colectivo».

Com efeito, e como o anota Abilio Neto [2]«a ideia que está subjacente ao regime característico  das invalidades das deliberações sociais é a de que os actos sociais se produzem em cadeia; por isso há que tentar obter o maior aproveitamento possível dos actos anuláveis, pois estes podem ser a razão de ser (a base) de actos posteriores. A vida social não pode em regra estar dependente da declaração judicial do vício em qualquer momento (isto é, independentemente do prazo) e mediante invocação de qualquer interessado (regime típico da nulidade – art 286º CC).»

É incontroverso que as deliberações que através do seu processo de formação – e não através do seu conteúdo – infringem normas legais – ainda quando se trate de norma imperativas ou cogentes, ou seja, daquelas que se impõem aos sócios por forma que estes não podem adoptar uma regulamentação divergente, quer no pacto social primitivo, quer através de deliberação, embora unânime, que posteriormente a modifique – são, por via de regra, meramente anuláveis[3].

O que significa que a A., aqui apelante, tinha o prazo de um mês para propor a correspondente acção de anulação, nos termos do art 59º CSC.

E a partir do momento em que  foi – ainda que irregularmente – convocada para aquela assembleia geral – de nada lhe serve referir que não foi comunicada a respeito das deliberações que ali tiveram lugar, visto que sempre lhe competiria informar-se a esse respeito (de todo o modo a R. ter-lhe-á enviado carta em 27/9/2012 a comunicar tal deliberação)

c) Entende subsequentemente a A. que a respectiva destituição é inválida, porque os factos provados não permitem que se conclua pela existência de justa causa.

A este respeito impõem-se algumas reflexões a respeito do órgão de fiscalização que está em causa nos autos.

È sabido que a intervenção dos revisores oficiais de contas ou das sociedades de revisores oficiais de contas nas sociedades anónimas é obrigatória – arts 278º/1), 413º/1 e 2 e 446º C. Soc Com - embora o enquadramento orgânico dos ROC nestas sociedades esteja previsto de formas diferentes, consoante optem pelo modelo clássico ou monista (conselho de administração e um conselho fiscal, ou conselho de administração e revisor oficial de contas), ou pelo chamado modelo germânico ou dualista (conselho de administração, conselho geral e revisor oficial de contas) - cfr art 278º CSCom.

O art 413º Com – que foi alterado pelo DL 257/96 de 31/12 e após pelo DL 76-A/2006 de 29/3 - refere-se às sociedades que tenham assumido o modelo de organização monista, de tipo latino.
E nessas sociedades a fiscalização cabe ou, a um fiscal único, que deve ser revisor oficial de contas ou sociedade de revisores oficiais de contas – al a) - ou a um conselho fiscal e a um revisor oficial de contas ou sociedade de revisores oficiais de contas, que não seja membro daquele órgão – al b).

A situação prevista em b) depende do pacto social, mas será obrigatória nos casos do nº 2 do ar 413º.

Na situação dos autos logo se depreende pela opção da R. pela eleição de um fiscal único - órgão unipessoal - que optou pelo modelo monista.

Os membros do conselho fiscal, bem como o fiscal único e os suplentes, são eleitos pela assembleia geral – art 415º/1 e 446º/1 e 50º EROC - por um período previsto nos estatutos, mas não superior a 4 anos – art 415º/1.

A assembleia geral só pode destituir os membros do conselho fiscal ou o fiscal único que não tenham sido nomeados judicialmente e se ocorrer justa causa, como acima já se referiu.

Evidentemente que este tipo de eleição e destituição contribui para o perfil, que se quis independente, das pessoas a quem caiba a fiscalização da sociedade.

 Na mesma lógica refere o respectivo Estatuto (EROC) no seu art 54º, que «os revisores oficiais de contas designados para o exercício da revisão legal das contas são inamovíveis antes de terminado o mandato ou na falta de indicação deste ou de disposição contratual por períodos de quatro anos, salvo com o seu expresso acordo, manifestado por escrito, ou verificada justa causa arguível nos termos previstos no Código das sociedades Comerciais e na legislação respectiva para as demais empresas ou outras entidades».

Ora, salvo melhor opinião, desta regra da inamovibilidade do revisor oficial de contas, por contraposição relativamente ao que sucede com os membros do conselho de administração, em que a regra é a da sua livre destituição a todo o tempo e independentemente de justa causa – cfr arts 403º e 430º/2 CSCom – decorrem duas consequências:
-em primeiro lugar, a de que cabe ao ROC ou SROC destituído sem justa causa e que pretenda ser indemnizado em função desse procedimento, alegar e provar, na acção que interponha para esse efeito contra a sociedade, a ausência de justa causa;
- em segundo lugar, que essa indemnização se deverá ter, na impossibilidade do autor pedir a reintegração (que seria a reparação natural), como correspondendo às anuidades de vencimentos correspondentes ao mandato não cumprido.

É sabido mostrar-se amplamente controvertida no âmbito da (livre) destituição dos administradores/gerentes a questão do ónus de prova referentemente à justa causa de destituição, para uns constituindo a inexistência de justa causa facto constitutivo do direito do A. enquanto pressuposto do direito à indemnização pela destituição, para outros, constituindo a existência da mesma facto impeditivo do direito à atribuição da indemnização, cabendo a sua alegação e prova à sociedade destituente. [4]

Mostra-se dominante o segundo entendimento [5], dizendo-se para assim se concluir: «Decisivo é o argumento de que o direito de indemnização existe, em princípio, como consequência do próprio acto de deliberação da destituição: (…) a sociedade goza, em regra, de inteira liberdade para a destituição de gerentes  (…); essa liberdade da sociedade justifica-se pela necessidade de uma relação de confiança  com os seus gerentes e a obrigação de indemnização apresenta-se como contrapartida desse direito  e compensação pelos prejuízos resultantes da quebra do mandato conferido aos gerentes (…) Assim, sendo o direito à indemnização consequência directa ou imediata da destituição, a existência de justa causa configura-se como circunstância impeditiva desse direito e o ónus da sua prova cabe à sociedade»[6].
 
Não estando em causa  no mandato do revisor oficial de contas ou da sociedade de revisores oficiais de contas a regra da livre destituição, mas a contrária - a de que a destituição do dos membros do conselho fiscal ou o fiscal único (que não tenham sido nomeados judicialmente) só é possível se ocorrer justa causa -  mostrar-se-á indiscutível que na acção de indemnização proposta pelo fiscal único destituído lhe cabe provar, para além da sua qualidade de fiscal único e a sua destituição, a ausência de justa causa.

Em compensação, não lhe caberá, enquanto segunda consequência do referido princípio de inamovibilidade, e ao contrário do que sucede com o administrador/gerente destituído “ad nutum”, provar os prejuízos decorrentes dessa destituição.

É que, se no caso destes, a indemnização, na falta de estipulação contratual, assenta na real existência de prejuízos, entendendo-se que a existência destes não se verifica pelo simples facto da perda da remuneração de gerência, sendo sempre necessária  a prova de que não se obteve outra remuneração em diversa actividade, ou de que ela é inferior àquela primeira remuneração [7] , no caso da destituição dos membros do conselho fiscal ou do fiscal único sem justa causa, como acima se referiu, na impossibilidade de ser reintegrado nas suas funções, terá de lhes ser devida a remuneração que lhe caberia auferir relativamente ao tempo restante do  mandato que não cumprirem em virtude daquela destituição. O que não impede, naturalmente, a que a sociedade demandada alegue e prove que o destituído nesse período temporal  desempenhou ouros cargos de conteúdo económico, cujas remunerações compensaram, total ou parcialmente, aquelas perdas.  

Cabe ainda referir o que, genericamente, se deve entender por justa causa.

Trata-se de um conceito que o legislador propositadamente não definiu deixando-o indeterminado e por isso a preencher caso a caso.

Não obstante, há normas no CSCom que, de forma exemplificativa, indicam critérios gerais para o preenchimento desse conceito.

Assim, o art 257º/6 relativamente à destituição do gerente nas sociedades por quotas, que refere: «Constituem justa causa de destituição, designadamente, a violação grave dos deveres do gerente e a sua incapacidade para o exercício normal das respectivas funções»; e o art 403º/4, a propósito da destituição dos administradores nas sociedades anónimas, que refere: «Constituem, designadamente, justa causa de destituição, a violação grave dos deveres dos administradores e a ineptidão para o exercício normal das respectivas funções», remetendo o nº 2 do art 430º a respeito da destituição dos administradores executivos nas sociedades anónimas para este nº 4 do art 403º[8].

Traço obrigatório na ideia de justa causa é o da inexigibilidade – há-de mostrar-se inexigível à sociedade manter a relação orgânica, e a de confiança que esta implica, com o destituído.

Seja pela violação grave de obrigações legais ou estatutárias, seja pela incapacidade para o desempenho normal das funções, podendo este conceito de incapacidade ser mais ou menos abrangente relativamente a diversas situações fácticas.

A seu propósito, deve ter-se presente que a justa causa de destituição não é equivalente ou análoga à justa causa de despedimento (laboral), porque nem sempre exige um comportamento culposo. Assim acontecerá, por exemplo, perante manifestações concretas de inépcia para o exercício das funções; perante a (revelada) falta de conhecimentos necessários para uma gestão ordenada; perante desentendimentos frequentes (ainda que não culposos) entre administradores que comprometam a boa marcha dos negócios sociais; a insolvência do administrador  quando se reflicta negativamente na sociedade porque abale seriamente a confiança no caracter do administrador; a impossibilidade física decorrente de doença incurável ou prolongada[9].
 
A circunstância do art 419º, referente à destituição dos membros do conselho fiscal ou do fiscal único nada referir de específico quanto à justa causa para essa destituição autoriza a que se tenham como válidos os critérios usados para a destituição dos administradores/gerentes.

Vejamos agora o que se provou na situação dos autos, revertendo aos factos provados e organizando os relevantes por ordem cronológica:

- A A. foi contactada para fazer parte dos órgãos de fiscalização da R. para o triénio de 2010/2012.
- Procedeu (também) à certificação legal das contas do ano de 2009.
- Durante todo o ano de 2011, o departamento financeiro da R. solicitou várias vezes o agendamento de reuniões com o Dr. M. L., na qualidade de representante da A, o qual se recusou sistematicamente..
 - A 14/7/2011, o departamento financeiro da R. reuniu-se com o Dr. M. L. representante da A.,com o objectivo de ser emitida a competente certificação legal e o parecer do fiscal único relativos às contas de 2010.
 - Nessa reunião ficou verbalmente acordado que a Certificação Legal e o Parecer do Fiscal Único relativos às Contas de 2010 seriam emitidos no prazo máximo de 15 dias após a recepção da versão final das contas de 2010.
- A 26/7/2011, o departamento financeiro da R. enviou ao representante da A., Dr. M. L., todos os documentos contabilísticos necessários à emissão da certidão legal e do parecer do fiscal único relativo às contas de 2010.
- No entanto, apenas a 15/9/2011, e após várias insistências por parte da R., foi enviada pelo Dr. M. L. a certificação legal de contas de 2010.
- Mas não o parecer do fiscal único, o que só veio a suceder posteriormente, e após várias insistências do departamento financeiro da R. junto do Dr. M. L., não tendo a A. apresentado qualquer justificação para a entrega tardia.
 - A R. é uma sociedade gestora de participações sociais e conforme o seu objecto social, detém e gere participações sociais noutras sociedades como forma indirecta de exercício de actividade económica, assim como presta serviços de organização e gestão nas entidades participadas.
- Necessita constantemente de ter perfeita noção da sua realidade financeira, de modo a saber em que medida pode participar financeiramente no capital de outra empresa, sendo fundamental a participação activa do revisor oficial de contas.
- Em 2010, a R. adquiriu participações em várias empresas.
-A maioria das sociedades detidas pela R. são sociedades anónimas e, como tal, necessitam de um órgão fiscalizador, seja um conselho fiscal, ou um fiscal único.
- De forma à R. poupar custos e a tornar os procedimentos de revisão de contas mais céleres e uniformes, optou por contratar os serviços de um revisor único para todas as empresas, poupando assim tempo com reuniões e economizando o pagamento para deslocações dos ROC contratados e unificando o procedimento de todas as empresas do grupo.
- A R. entendeu, em  face aos comportamentos anteriores da A., que não lhe podia confiar estas novas funções.
- Comunicou, por isso à A., em 6/10/2011, via e-mail, que tinha decidido atribuir o serviço de auditoria 2011 a um ROC comum a todas as participadas P., solicitando a rescisão do cargo por parte desta.
- O que esta recusou.
-E em resposta àquela comunicação de 6/10/2011, o representante da A., Dr. M. L., comentou que o objectivo de tal decisão seria a de controlar a independência dos revisores.
 - A R. convocou uma assembleia geral, constando na ordem de trabalhos a destituição com justa causa da sociedade A. do cargo de fiscal único da A.
- Em 24/2/2012, a A. recebeu uma carta da R. datada de 22/2/2012, convocando o representante da A. para uma assembleia de sócios a realizar no dia 29/2/2012 de cuja ordem de trabalhos faria parte a destituição com justa causa do fiscal único, ou seja, da A.
- Nessa assembleia foi analisado o relatório do conselho de Administração sobre a actuação do fiscal único efectivo da sociedade e decidida a sua destituição.
 - A A. teve conhecimento que a R. contactou ama outra SROC para proceder aos trabalhos de revisão e certificação de contas .
- Em 20/11/2012, convidou a R. a liquidar o valor correspondente aos anos em que fora nomeada a exercer o cargo de ROC .
- E em Dezembro de 2012, endereçou à R. a factura com o n° 2012000012, de 20/11/2012, correspondente ao ano de 2011, no montante de € 4.000,00, a que acresce IVA de € 920,00, e a factura n° 2012000013, no valor de € 4.920,00 referente à auditoria relativa ao ano de 2012, não tendo obtido resposta.

São estes os factos que se provaram e que, como acima referido, não lograram ser alterados na presente apelação.

A recorrente apela várias vezes ao longo das alegações de recurso para o teor de emails juntos aos autos.

Como é evidente, provados como estão os factos, o recurso ao conteúdo desses  e-mails apenas pode relevar na medida em que contenham factos instrumentais relativamente aos já provados.

E nessa medida julga-se interessante referir alguns para melhor precisar o ambiente societário em que acabou por ocorrer a destituição da A.

Nesse contexto cabe em primeiro lugar salientar que, como o revelam suficientemente os e-mails em causa, a relação da A. com a R.. ao longo do ano de 2011 - em que aquela procederia à certificação legal das contas do ano de 2010 –  mostrou-se conturbada, tudo indica, pelo facto da R. não concordar com o valor da factura referente aos serviços prestados pela A. relativamente à certificação legal das contas do ano de 2009, prestada, necessariamente que a pedido dela, mas “ad hoc” relativamente ao período de mandato da A., e cujo pagamento foi protelando, sempre pedindo à A. rectificações.

Independentemente das razões que assistam a uma ou outra das partes no maior ou menor valor dessa factura, são vários os emails em que a A, através do seu representante M. L., se refere à factura em causa em tom pouco amistoso –  maxime nos de 13/5/2011, juntos a fls 211.

No e-mail de 13/5/2011, condiciona, expressamente, «à resolução do problema do pagamento da factura» o agendamento de uma reunião (fls 211).

E no de 5/7/2011 condiciona à «resolução do “diferendo” sem nexo», a própria emissão da Certificação Legal de Contas (CLC) antes de Setembro de 2011 (fls 210).

É certo que as partes optaram, ambas, por não fazerem referência explícita nos autos a este aspecto do início da relação entre elas mas, dos emails juntos aos autos,  anteriores a Agosto de 2011, a referência a esse “diferendo” é constante.

Terá sido, decerto, a questão dessa factura, e a atitude da A. de condicionar a sua prestação de serviços ao pagamento da mesma, uma das razões pela qual acabou por resultar provado o facto – que, ainda que muito genérico, se mostra fulcral – de, «durante todo o ano de 2011, o departamento financeiro da R. ter solicitado várias vezes o agendamento de reuniões com o Dr. M. L., na qualidade de representante da A, o qual se recusou sistematicamente».

O pagamento da factura em causa terá sido feito pela R. por volta de 10/7/2011, como resulta do email de fls 210.

Só após essa data é que a A. se terá disponibilizado verdadeiramente a juntar os elementos necessários à elaboração da CLC, mas aí passou a invocar o obstáculo iminente do seu período de férias «a iniciar no dia 22 de Julho próximo» - cfr mail de 5/7/2011, fls 210 – e a dificuldade de, necessitando no mínimo de 15 dias para preparar a CLC da R., a mesma ter de ficar para Setembro próximo.

Tendo as partes conseguido - após algum esforço -  a data de 14/7 para a realização da necessária reunião, foi nela que a A. se comprometeu, ainda que verbalmente, a emitir a Certificação Legal e o Parecer do Fiscal Único relativos às Contas de 2010 no prazo máximo de 15 dias após a recepção da versão final das contas de 2010, bem sabendo que, em função desse compromisso, estaria natural e necessariamente a colocar em causa o indicado início das suas férias para 22/7. O departamento financeiro da R. enviou-lhe em 26/7/2011, todos os documentos contabilísticos necessários à emissão desses documentos, pelo que a A., no respeito pelo compromisso que assumira, os deveria ter entregue até 9/8. Não o fez. No mail de 27/7/2011 – cfr fls 218 – referiu à R que iria nesse dia de férias, procedendo como se não tivesse assumido o compromisso atrás referido. Só em 14/9/2011 a A. enviou «a CLC da PB de 2010» - cfr fls 223, mantendo-se em falta, por um período não definido, relativamente ao Parecer do Fiscal único.

Para além das funções genericamente atribuídas pela lei ao fiscal único e ao conselho fiscal - art 420º–  e das especificas referentes à realização da Certificação Legal das Contas e ao Parecer sobre a fiscalização efectuada, ao revisor oficial de contas são cometidas algumas funções especificas, isto é, que lhe cabem especificamente a ele, enquanto ROC, para além de todas as restantes funções que decorrem da sua qualidade de membro do conselho fiscal ou de fiscal único.

Consistem essas funções especificas em proceder a todos os exames e verificações necessárias à revisão e certificação legal de contas – art 420º/3 e 4 – além de que, no exercício de um dever de vigilância, está obrigado à comunicação à administração de quaisquer sinais de dificuldade no prosseguimento do objecto da sociedade detectados no exercício da sua actividade  - art 420º-A /1 e art 40º/1 EROC .

Verifica-se dos arts 420º a 423º-A que as tarefas de fiscalização societária são variadas e exigentes e não se limitam ao controlo das contas: «no art 420º, apesar da enfase dada à fiscalização contabilística (nº 1 als d) e) e em boa parte c) e g), aparecem outras funções. Compete em primeira linha ao órgão fiscalizador «fiscalizar a administração da sociedade» - al a) e «vigiar pela observância da lei e do contrato de sociedade» - al b) »[10] 
«Fiscalizar a administração da sociedade, não se esgota num controlo de legalidade formal. É certo que os fiscais não têm o direito de se imiscuir, directa ou indirectamente, na administração; não gerem, nem têm legitimidade para dar instruções aos administradores em assuntos de gestão. Mas têm o direito e o dever de vigiar pela observância das regras (procedimentais, sobretudo) de gestão correcta, de controlar a adequação da organização empresarial e a eficácia económica da sociedade – cfr arts 420º-A, 421/1 al b) c) 422º/1 d) »[11]

Do que acima se ponderou relativamente ao ano de 2011, muito longe terá andado a A. destas exigências[12].

Este alheamento da sociedade – resultante, necessariamente, da circunstância provada de «durante todo o ano de 2011, o departamento financeiro da R. ter solicitado várias vezes o agendamento de reuniões com o Dr. M. L., na qualidade de representante da A, o qual se recusou sistematicamente»- implica  necessáriamente grave violação dos deveres do órgão fiscalizador.
Mas implica também a incapacidade da A. para exercer funções de fiscal único da R.

Sobretudo, depois que esta, tendo adquirido durante o ano de 2010 participações em várias empresas – pois que é uma sociedade gestora de participações sociais, detendo e gerindo, no exercício do seu objecto social, participações sociais noutras sociedades como forma indirecta de exercício de actividade económica e prestando serviços de organização e gestão nas entidades participadas – optou, por forma a poupar custos e a tornar os procedimentos de revisão de contas mais céleres e uniformes, pelos serviços de um revisor único para todas as empresas.

O (mau) desempenho da A. das respectivas funções durante o ano de 2011 justificava que a R. não tivesse confiança nela para fiscal único de todas as  empresas  que participava.

Até porque não se coibiu de comentar na resposta que deu ao mail da R. em que esta lhe dava conta da referida opção estratégica – cfr. mail de fls. 19 - que um dos  objectivos dessa decisão seria «a de controlar a independência dos Revisores» («por forma a evitara ênfases e reservas às contas»), comentário ofensivo para a administração da A. 
  
E porque não soube cumprir um compromisso que assumiu, ainda que de forma verbal, procedendo depois como se não o tivesse feito.

Todas estas situações senão de per si, pelo menos conjugadamente, implicam justa causa para a destituição – segundo a boa fé deixou de ser exigível à R. a continuação da relação de confiança que o exercício do cargo em causa implicava.

Concluindo-se pela justa causa da destituição da A., sempre se dirá no entanto, e na sequência do que acima se expendeu, que esta não fez qualquer prova da ausência de justa causa para a sua destituição a que nem sequer se referiu na petição inicial.

d) Havendo justa causa para a destituição, não tem o fiscal único direito a ser indemnizado pela sociedade dos prejuízos que a cessação antecipada do mandato lhe implicou, quer estejam em causa danos emergentes - - referentes às remunerações vincendas até ao termo do mandato – quer estejam em causa lucros cessantes – decorrentes da perda de chance relativa a outras possíveis contratações para esse período. 
 
Tão pouco a circunstância de constar do registo comercial a nomeação da A. como Fiscal Único da R. até 2012 a torna responsável pelas eventuais irregularidades das contas de 2011 e 2012, vista a respectiva destituição e registo da mesma, e tão pouco a responsabiliza em abstracto – isto é, sem factos concretos nesse sentido – até à data da deliberação da destituição, 29/2/2012.

V – Pelo exposto, acorda este tribunal em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela apelante.


Lisboa,14/5/2015 
                
Maria Teresa Albuquerque                                              
José Maria Sousa Pinto
Jorge Vilaça


[1] - Cfr  RDE Ano VIII, nº 2, 1982, 390 e ss
[2] - «Código Comercial Anotado», 3ª ed , Maio de 2005
[3] - Neste sentido, vg, Ac STJ 10/10/90; Ac STJ 19/5/1992; Ac RC 2/12/1992 CJ V -69: «São tão somente anuláveis as deliberações sociais que respeitem a vida da sociedade, a sua organização e as relações entre ela e os seus sócios ou membros, por estarem apenas em causa interesses particulares do ente social ou dos seus sócios ou membros»; Ac STJ 6/10/1993: «Não obstante o disposto no art 56º/1 do CSC, nem sempre a violação de normas imperativas gera nulidade das deliberações: tal efeito só ocorrem, em princípio, quando a contrariedade àquelas normas se traduza no “conteúdo” e não no procedimento, no modo ou processo de formação da deliberação»
[4]- Sustentam  o primeiro ponto de vista -  ser o destituído que tem que provar o facto negativo da ausência de justa causa para ter direito a ser indemnizado – entre outros, Ac STJ 23/6/92, B 418º-793; Ac STJ 20/1/99, B 483º-177; Ac RC 28/5/91 (Recurso nº 1357/90); sustentando o segundo ponto de vista – caber à sociedade a prova da inexistência de justa causa para excluir a indemnização – entre outros, Ac STJ 27/10/94, CJ Ac STJ Ano II –III,112
[5] - Por exemplo:  «O nº 1 do art 257º … estabelece o princípio da “livre revogabilidade“, por acto unilateral da sociedade, da manutenção do mandato de gerência: assiste, porém ao gerente o direito de ser indemnizado  pela destituição sem justa causa, ficando a sociedade desvinculada  do dever de indemnizar  tão somente se justa causa ocorrer  (…) em, acção de indemnização movida pelo gerente destituído contra a sociedade, incumbe a esta o ónus da prova dos factos (impeditivos) integradores da justa causa de destituição » – Ac STJ 10/2/2000 B 494º-353  
«A justa causa é matéria de excepção (…) cumprindo à sociedade ré demonstrar em juízo que os fundamentos que levaram à destituição, e que foram aceites pela assembleia geral, integram justa causa de destituição» - AC STJ 15/2/2000 B 494º- 358
[6] -  Ac STJ 1/6/99, B 488º- 363
[7] - Neste sentido, vg, Ac STJ 25/2/1997, Ac RP 16/3/1998 ,  Ac RL 9/1/97, Ac STJ 18/6/2002; Ac STJ 20/5/2004
[8] -Será curioso mencionar que em redacção anterior – ao DL 75-A/2006 de 29/3 – dizia-se neste nº 2 do art 430º,constituírem «designadamente, justa causa de destituição a violação grave dos deveres do director, a sua incapacidade para o exercício normal das respectivas funções e a retirada de confiança pela assembleia geral».- 
[9]- Cfr Coutinho de Abreu, «Governação das Sociedades Comerciais», p 158/159, que se seguiu na exposição antecedente
[10] - Coutinho de Abreu, obra citada, p 182
[11] -  Autor e obra citados
[12] - No Ac STJ 21/11/2002 (Quirino Soares) diz-se, criticando a decisão da Relação e para concluir pela justa causa da destituição do Fiscal Único:
«No entender da Relação, aquela ausência de cerca de 9 meses das instalações sociais  nada significa enquanto incumprimento ou defeituoso cumprimento dos deveres inerentes à função fiscalizadora da sociedade, que competem ao fiscal único (artº413º, nº1, CSC); seria necessário que, por causa dessa longa ausência, o fiscal (1) não tenha elaborado o relatório sobre a fiscalização efectuada, conforme imposição da alínea a, do nº1, do artº43º, DL 422-A/93, (2) não tenha elaborado o documento de certificação legal das contas, conforme alínea b, do mesmo nº1, (3) não tenha feito qualquer comunicação devida ao presidente do conselho de administração, conforme dispõe o artº420-A, CSC, (4) não tenha cumprido qualquer dos deveres gerais consignados no artº420º, CSC.
Mas, dizemos nós, as coisas não são, não podem ser assim tão lineares e simples, como entende a Relação.
O dever fundamental do fiscal único, assim como do conselho fiscal, é, precisamente, o que está implícito no nome do cargo, isto é, o de fiscalizar, vigiar, verificar (verbos com que, não por acaso, começam grande parte das alíneas do nº1, daquele artº420º, dedicado aos deveres gerais).
Mas, (?) como fiscalizar, vigiar, verificar, sem ir às instalações sociais, sem ter à frente os livros, os registos contabilísticos e documentos que os suportam, a caixa e as existências de qualquer espécie, os contratos, enfim, toda a panóplia de documentos inerentes à administração e aos negócios da sociedade?
(…) É que se certificou as contas naquelas circunstâncias terá feito pouco mais que um pro forma (…)»